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VÍCIOS DO ARTº 410º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
IN DUBIO PRO REO
EXCESSO DE PRONÚNCIA
FUNDAMENTAÇÃO
NULIDADE
MEDIDA CONCRETA DAS PENAS
PENA DE EXPULSÃO
Sumário
- Os vícios previstos nas diversas alíneas do n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal têm de resultar evidente do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência. - A reapreciação da prova por parte do Tribunal de recurso visa corrigir erros pontuais do julgador e não realizar um novo e integral julgamento. - Incumprido o tríplice ónus de especificação exigido pelo artigo 412.º do Código de Processo Penal, não pode o Tribunal de recurso proceder à reapreciação da prova gravada. - O princípio in dubio pro reo apenas é convocado nos casos em que o tribunal de julgamento se depare com uma situação de dúvida razoável e intransponível sobre a realidade dos factos - Verifica-se excesso de pronúncia quando o Tribunal conheça de questões de que não podia conhecer por não caberem no objecto do processo, nem lhe terem sido colocadas pelos intervenientes (artigo 379.º, n.º 1, alínea c) parte final. - O artigo 379º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Penal comina com nulidade a inobservância das exigências do artigo 374.º do mesmo código impondo, entre o mais, “uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.” - A exigência de fundamentação é cumprida quando, no seu conjunto, se perceba a decisão de absolvição ou de condenação em toda a sua amplitude e seja possível questioná-la em sede de recurso. - São de manter as penas fixadas pelo tribunal de julgamento quando não sejam invocadas razões objectivas que sustentem a pretensão de redução destas e quando resulte clara a observância pelo mesmo Tribunal dos critérios legais previstos nos artigos 70.º e 71.º do Código Penal.
Texto Integral
Acordam, na 3ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
I. Relatório
1. Por acórdão de 21 de Janeiro e 2025, foi o arguido AA condenado:
- na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de ofensa à integridade física grave, previsto e punido pelo artigo 144.º, alínea d) do Código Penal;
- na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo artigo 204.º, n.º alínea f) do Código Penal;
- na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de roubo qualificado, previsto e punido pelo artigo 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea b) por referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f) do Código Penal.
Em cúmulo jurídico foi o mesmo condenado na pena única de 5 anos e 6 meses de prisão.
Mais foi condenado na pena acessória de expulsão e interdição de entrada no território nacional por um período de cinco anos, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 134.º, n.º 1, e 151.º, n.º 1, da Lei 23/2007, de 4 de Julho.
2. Inconformado, o arguido interpôs recurso apresentando as seguintes conclusões da motivação:
“(…) II. O Recorrente impugna toda a factualidade dada como provada do ponto 10 ao ponto 36. Ora o que houve aqui foi um desentendimento entre o recorrente e o ofendido, nunca lhe deu um pontapé com o mesmo inconsciente, isso resulta apenas da acusação, o ofendido foi para o hospital e do relatório médico não resulta quaisquer vestígios que tenha sido pontapeado, inclusive o próprio ofendido negou esse fato; Deverá o douto acórdão ser renovado. III. Assim como não se fez qualquer prova como vem vertido no ponto 18º, que o Recorrente, "mediante plano previamente acordado, dirigiram-se a BB (doravante BB), com o propósito de se apoderarem de bens e valores que o mesmo tivesse consigo. E que mediante violência "O arguido AA e o outro indivíduo ausentaram-se do local, levando consigo o telemóvel do ofendido com a marca Xiaomi, modelo Redmi Note 12 Pro, de cor preta e com o IMEI ...33249, no valor de 279,99 € (duzentos e setenta e nove euros e noventa e ove cêntimos), fazendo-o seu." IV. Ora não se fez prova que o Recorrente tenha efectuado este roubo e nada lhe foi apreendido, nomeadamente o referido telemóvel, que sim foi apreendido mas na posse de outra pessoa como resulta do douto Acórdão. Deverá assim o douto acórdão ser renovado e o Recorrente absolvido da prática do crime de roubo a que foi condenado. V. O Recorrente exerceu o direito o silêncio, contudo e não se fazendo prova cabal clara e objectiva contra o Recorrente, existindo aqui reservas ou dúvidas o douto acórdão padece de inconstitucionalidade material por violarem o artigo 32º, nº 1 e 5 da CRP, por violação do in dubio pro reo. VI. Contudo, estamos perante uma nulidade do douto acórdão nos termos do art.º 410, n.º 2, al. a), do cpp que desde já se argui, por insuficiência de prova para a decisão. VII. Violou-se ainda o princípio da inocência previsto no art.º 32º do CRP. VIII. Daí que, por todas as expostas razões haja sido cometida a nulidade de insuficiência do exame crítico da prova, - em relação aos crimes pelo qual foi condenado - nulidade cominada no art.º 379.º n.º 1 alínea a) do CPP dado o não cumprimento integral do disposto, no recorrido acórdão do art.º 374.º n.º 2 do mesmo CPP. O Tribunal a quo não específica, como é sua obrigação, a sua motivação de forma concreta, concisa, objectiva, dos motivos de facto e de direito que levara à condenação do arguido bem como a indicação e exame critico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal e condenar o arguido (exame crítico das provas que serviram de base para formar a convicção do Tribunal). IX. Entendendo-se pela condenação do arguido, as penas parcelares e a pena única de 5 anos de prisão, parece-nos, salvo outro e melhor entendimento, ser tal condenação manifestamente exagerada, atentos os factos apurados, a culpa do agente, à ilicitude, os seus antecedentes, as suas perspectivas de reinserção social, bem como o universo de condenações em Portugal, por estes e outros crimes, forçoso será de concluir pela inadequabilidade de tal condenação. X. A determinação da medida da pena deve ser feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção «ex vi» do disposto no art.º 71º n.º 1 do Código Penal, para o efeito, o tribunal deverá atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo legal de crime, depuserem a favor ou contra o agente, por força do disposto no n.º 2 do mesmo artigo, não podendo a pena, em caso algum, ultrapassar a medida da culpa, sendo violado, por mero erro interpretativo o disposto nos artigos 40.º n.º 2 e 71.º ambos do Código Penal. XI. Mesmo admitindo eventual condenação do recorrente, não deveria a pena cumulatória e em concreto ter ultrapassado os 5 anos de prisão e a pena deverá ser suspensa na sua execução nos termos do art.º 50º do Cód. Penal. XII. Assim como não deve ser aplicada, a sanção acessória de expulsão do território nacional ao arguido AA, interditando-o de entrada no território nacional por um período de cinco anos, nos termos das disposições conjugadas dos art.º 134º, nº1, e 151º,nº 1, da Lei 23/2007, de 4/07, à data dos factos o Recorrente vivia com a sua namorada e encontrava-se a trabalhar, o seu título não foi renovado porque estava no Estabelecimento Prisional, mas tem apoio familiar, residência certa assim que sair em liberdade. XIII. Todos os documentos comprovativos estão juntos aos autos entregues em sede de inquérito, quando foi ponderada aplicação da medida de coação de obrigação de permanência na habitação sob vigilância electrónica. Violaram-se: os artigos, 18º, 32º da C.R.P. 40º, n.º 2, 50º, 70º, 71º e 72º, 144º, 145º, 210º, do C.P. e 127º, 410º, n.º 2, 379º, n.º 1, 374, n.º 2 do Cód. Proc. Penal.
(…).”
3. O Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu ao recurso concluindo nos seguintes termos:
“(…) 1º - O recorrente interpõe o recurso por não se conformar com o Acórdão, datado de 21.01.2025 (fls.372 a 393 e Ref.ª ...5594), que o condenou na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão efectiva e na pena acessória de expulsão de território nacional por 5 (cinco) anos, pelos crimes melhor identificados no ponto III da DECISÃO (fls.392). 2º Como primeira questão suscitada, consideramos que o acórdão recorrido não padece da nulidade por insuficiência/deficiência do exame crítico da prova, nos termos do previsto no art.º 379.º/1 al. a) e 374.º/2 do CPP. 3º- O “exame crítico” das provas consiste na enunciação das razões de ciência reveladas ou extraídas das provas produzidas, a razão de determinada opção relevante por um ou outro dos meios de prova, os motivos da credibilidade dos depoimentos, o valor de documentos e exames, que o tribunal privilegiou na formação da convicção, em ordem a que os destinatários (e um homem médio suposto pelo ordem jurídica, exterior ao processo, com a experiência razoável da vida e das coisas) fiquem cientes da lógica do raciocínio seguido pelo tribunal e das razões da sua convicção. 4º- Face à motivação do acórdão recorrido, verifica-se que, o Tribunal “a quo” fundamentou a sua decisão fáctica de forma suficiente, lógica, racional, clara e transparente, perfeitamente compreensível e inteligível, sendo apreensível o processo da sua convicção, ou seja, permitindo-nos acompanhar, de forma linear, as provas enunciadas, a respetiva análise e, bem assim, os raciocínios explicitados relativamente a tais provas. 5º- Como segunda questão suscitada, entendemos que o acórdão recorrido também não padece de nulidade por excesso de pronúncia, nos termos do previsto no art.º 379.º/1 al. c) e 374.º/2 do CPP, uma vez que, o Tribunal “a quo” se pronunciou sobre todas as questões suscitadas nos autos, designadamente, os factos constantes da acusação, do relatório social e a defesa do recorrente, não tendo extravasado nada do que lhe foi pedido; apesar do arguido não concordar, tal facto não equivale a um excesso de pronúncia, podendo apenas constituir um erro decisório. 6º- Em terceiro lugar, da leitura do acórdão recorrido não se infere, em concreto, que factos relevantes para a boa decisão da causa ficaram por apurar e que resultem do texto da decisão, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum, pelo que, não padece do vício decisória da insuficiência para a decisão da matéria de facto (art.º 410.º/2 al. a) do CPP), 7º- Na verdade,não se pode confundir o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (art.º 410.º/2 al. a) do CPP), com a insuficiência de prova para a decisão de facto proferida, a qual resulta da convicção do julgador e das regras da experiência (art.º 127.º do CPP). 8º- Em quarto lugar, o recorrente considera que existe erro de julgamento (por não existir prova) e impugna a matéria de facto dada como provada nos pontos 10.º a 22.º, 30.º a 33.º e 36.º, todavia, sem dar cumprimento ao ónus previsto no art.º 412.º/3 e 4 do CPP, uma vez que fórmula uma conclusão genérica de discordância por ausência de prova e a violação do princípio do in dúbio pro reo, sem concretizar a prova que impunha decisão diversa; este tipo de sindicância deve conduzir, nesta parte, à rejeição do recurso quanto à impugnação da matéria de facto. 9º- Como quinta questão suscitada, não se vislumbra qualquer incongruência no exame crítico da prova feita pelo Tribunal "a quo" que se mostra pormenorizada, explicando o percurso seguido na formação da sua convicção, em respeito e consonância pelas regras da experiência comum, para dar como provado que o recorrente deu um pontapé no ofendido quando o mesmo estava inconsciente (pontos 13.º e 14.º) e subtraiu o telemóvel (pontos 18.º e 21.º). 10º- O Tribunal “a quo” formou a sua convicção, com base no exame crítico do conjunta da prova produzida, designadamente, da análise dos depoimentos das testemunhas de acusação (ofendidos, motorista de autocarro e Agentes da PSP intervenientes) que depuseram de forma credível e objectiva em conjugação e concatenação com a prova documental e pericial. 11º- O Tribunal “a quo” formou a sua convicção com base na prova documental e pericial dos factos impugnados e teve em consideração, designadamente: auto de notícia por detenção, de fls. 2-6, datado de 25.06.2023; documentação clínica H. ..., de fls. 20-25, de relativa ao ofendido CC; aditamento nº 2, de fls. 46; auto de denúncia, de fls. 51, apresentada em 27.06.2023 reportando os factos de 25.06.2023; auto de notícia por detenção, de fls. 2 datado de 05.09.2023, aditamento de fls. 13 datado de 20.10.2023; auto de apreensão n° 1, de fls. 15-16 relativo ao telemóvel Xiaomi Redmi apreendido na posse de BB e que pertencia a BB; auto de Exame e Avaliação nº 1, de fls. 17 e termo de entrega de fls. 33; aditamento n° 2, de fls. 28; auto de reconhecimento pessoal de fls.46-47. 12º- Ademais, o Tribunal “a quo” para dar como provado os elementos subjectivos dos tipos de ilícitos (pontos 30.º a 32.º e 36.º), baseou-se na factualidade dada como provadas nos pontos 1.º a 22.º, por neles se descreverem as ações voluntárias e conscientes por parte do recorrente, socorrendo-se das máximas da experiência comum, perante o silêncio do recorrente. 13º- Na impugnação da matéria de facto, a recorrente faz uma “outra valoração da prova produzida”, à margem da factualidade provada, sem indicar a prova relevante para alterar o sentido da matéria de facto e da decisão final, cuja pretensão é substituir a convicção do Tribunal "a quo" por aquela que o recorrente defende, o que é admissível, por conduzir à postergação do princípio da livre apreciação da prova (art.º 127.º do CPP). 14º- Em conclusão, o Tribunal “a quo” procedeu, em todo o processo formativo da convicção, dentro da latitude que lhe é conferida pela livre apreciação da prova, servindo-se de provas não proibidas por lei e usando prova por presunção, acolheu a versão que considerou mais plausível e conforme com as regras da experiência comum, cuja violação se não regista, pelo que deve improceder esta parte do recurso. 15º- Em resposta ao sexto argumento colocado, afigura-se-nos que, a apreciação da prova do acórdão recorrido não viola os princípios da presunção da inocência e do in dubio pro reo (art.º 32.º/2 da CRP), porquanto o Tribunal “a quo” não teve quaisquer dúvidas quanto à ocorrência dos factos que considerou provados sendo, pois, irrelevantes as dúvidas que a recorrente, na sua interpretação subjetiva, entende que deveriam subsistir a propósito da matéria fáctica que sustenta a sua responsabilização criminal. 16º- Bem andou o Tribunal “a quo” quando decidiu, depois de valorada toda a prova de forma crítica, dar como assente que a recorrente praticou os factos dados como provados e por via disse, condenou-o pela prática de crimes contra o património (roubo e furto qualificado) e contra a saúde e integridade física (ofensa à integridade física grave), não havendo qualquer razão para o absolver dos crimes praticados, pelo que deve o recurso improceder, nesta parte. 17º- O acórdão recorrido não viola o princípio do in dubio pro reo [que é uma emanação do princípio da presunção de inocência (art.32.º/2 da CRP)] porquanto, o Tribunal “a quo” não teve qualquer dúvida razoável e insanável acerca da culpabilidade ou dos concretos contornos da actuação do recorrente, pelo que não preteriu o consagrado no artigo 32.º/2, da CRP, pelo que não padece de qualquer inconstitucionalidade material. 18º - Além disso, por um lado, o recorrente não concretiza - por falta de motivação e densificação - a violação de qualquer princípio constitucional, qual o segmento da norma ou interpretação normativa, efectuado pelo Tribunal “a quo”, que viole tal princípio; por outro lado, o mesmo baseia a invocada inconstitucionalidade, em termos juridicamente incorrectos, por se referir ao disposto no art.º 32.º/1 e 5 da CRP, que prevê o direito ao recurso e o princípio do contraditório, termos em que deve, também, improceder esta parte do recurso. 19º- Quanto ao sétimo argumento - dosimetria da pena- constata-se que, o Tribunal “a quo” deu como assente (e bem) que o recorrente praticou, em autoria material, na forma consumada, em concurso real os seguintes ilícitos penais: a) um crime de ofensa à integridade física grave, previsto e punido pelos artigos 144º, alínea d) (mas não pelo art.º 145º, nº 2 por referência ao artigo 132º, nº 2, alíneas c), e) e g)) do Código Penal; b) um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo artigo 204º, nº 2, alínea f) do Código Penal e ao artigo 4º do D.L. nº 48/95 de 15-3; c) um crime de roubo qualificado, previsto e punido pelo artigo 210º, nºs 1 e 2, alínea b) por referência ao artigo 204º, nº 2, alínea f) do Código Penal e ao artigo 4º do D.L. n° 48/95 de 15-3. 20º- Na determinação da medida concreta da pena o Tribunal “a quo” ponderou todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depunham a favor ou contra o agente, designadamente: O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; a intensidade do dolo; os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; as condições pessoais do agente e a sua situação económica; a conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando às consequências do crime e por fim, a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena. 21º- Entendeu como justas, adequadas e proporcionais as seguintes penas de: pelo crime de ofensa à integridade física grave, fixou-se a pena de 3 anos e 6 meses; pelo crime de furto (hiper) qualificado, fixou-se a pena de 2 anos e 6 meses e pelo crime de roubo qualificado, fixou-se a pena de 3 anos e 6 meses. 22º- Perante penas parcelares fixadas, o Tribunal “a quo” para determinar a pena única atendeu aos factos provados e à sua imagem global, à personalidade do recorrente neles revelada, às exigências de prevenção geral e especial e às finalidades da punição, em respeito pelo previsto nos art.º 70.º, 71.º e 77.º/1 e 2 do CP, tendo em conta a moldura de conjunto entre 3 anos e 6 meses (limite mínimo) e 9 anos e 6 meses, (limite máximo) considerou justa, adequada e proporcional aplicar ao recorrente a pena única de 5 anos e 6 meses de prisão, decisão que não merece qualquer reparo ou censura, por se encontrar no limite médio da moldura e distante do seu limite máximo. 23º- O Tribunal “a quo” formulou um juízo valorativo ajustado, sustentável, correcto e, procedeu a uma aplicação de penas (parcelares e única) que no seu quantum dão resposta cabal aos fins da punição e respeitam os princípios da prevenção geral e especial ressocializadora, pelo que, diga-se desde, já, deve ser negado provimento ao recurso. 24º- Na verdade, perante a imagem global que a situação fornece, cujas exigências de prevenção são manifestamente bem elevadas e em que inexistem factores de ordem excepcional que as desvalorizem e de forma importante, as finalidades punitivas não ficariam devidamente salvaguardadas com a redução da medida da pena ou a aplicação da suspensão da execução da pena, nos termos do previsto no art.º 50.º do CP. 25º- Quanto à oitava questão suscitada - aplicação da suspensão da execução da pena, após sua redução - parece-nos evidente que, os critérios do art.º 50.º do CP - formal e material- não se mostram preenchidos, uma vez que a pena única fixada é de 5 anos e 6 meses (formal) e dos autos não decorrem elementos de facto de onde se possa concluir que a simples censura do facto e a ameaça da pena bastarão para afastar o recorrente da criminalidade e satisfazer as necessidades de reprovação e de prevenção do crime (material), não sendo o recorrente merecedor de um juízo de prognose favorável, pelo que não há lugar à aplicação do art.º 50.º do CP. 26º- In casu, o recorrente foi condenado por crimes dolosos contra o património e a ofensa à saúde e integridade física em pena (de cúmulo) efectiva de 5 anos e 6 meses de prisão; é natural do país marroquino, não possuindo quaisquer ligações em Portugal e não possui título de residência, o que preenche os pressupostos legais de aplicação da pena acessória. 27º- Por fim e quanto à nono argumento, afigura-se-nos que, bem andou o Tribunal “a quo” ao aplicar ao recorrente a sanção acessória de expulsão e da interdição de entrada no território nacional por um período de 5 anos, nos termos das disposições conjugadas dos art.º 134.º/1, e 151.º/1, da Lei 23/2007, de 4/07(versão actual), que se mostra correcta, justa, adequada e proporcional, não merecendo qualquer censura. 28º- O Ministério Público concorda integralmente com a decisão proferida e defende que o recurso deve ser rejeitado por manifesta improcedência, nos termos do art.º 420.º/1, al. a), do CPP, mantendo-se a decisão recorrida, pelo que falecem todos os fundamentos invocados no recurso interposto. 29º- Não existe, assim, qualquer motivo atendível para alterar as penas aplicadas, uma vez que, o Tribunal “a quo” julgou corretamente e operou uma sensata subsunção jurídica e aplicação do direito, não ocorrendo por isso qualquer violação do previsto nos arts.º 40.º, 50.º, 70.º, 71.º, 144.º, 145.º, 210.º do CP, art.º 127.º, 374.º/2, 379.º/1 al. a) e c) e 410.º/2, al. a), todos do CPP e art.º 32.º/1,2 e 5 da CRP.
(…).”
4. O Senhor Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal pronunciou-se pela improcedência do recurso manifestando concordância com a resposta do Ministério Público junto da 1ª instância.
II. Âmbito do recurso e identificação das questões a decidir
O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões apresentadas, nas quais, de forma sintética e por referência à motivação do recorrente, são expostas as razões da discordância face à decisão recorrida (artigos 402.º, 403.º e 412.º, n.º 1 do Código Processo Penal). Ao Tribunal de recurso cabe ainda apreciar de eventuais questões de conhecimento oficioso designadamente, se existentes, da verificação dos vícios do artigo 410.º do Código de Processo Penal.
No caso, atentas as conclusões apresentadas pela recorrente importa apreciar a) da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; b) da impugnação da decisão da matéria de facto e da violação do princípio in dubio pro reo; c) do alegado excesso de pronúncia e da falta de fundamentação; d) da medida da pena e da suspensão da execução desta; e) da sanção acessória de expulsão.
III. Fundamentação
Vejamos os seguintes segmentos da sentença recorrida relativos à decisão da matéria de facto e respectiva fundamentação.
“(…) Mostram-se provados os seguintes factos (mantendo a numeração utilizada no despacho de acusação): 1.º No dia 01 de setembro de 2021, pelas 23h55, indivíduo não concretamente identificado, juntamente com DD e EE, já acusados no processo nº 83/21.0SHLSB e outro indivíduo não cabalmente identificado, abordaram o ofendido FF, que circulava apeado na Av. …, junto ao parque de estacionamento do antigo Hospital ... da Praça ..., em Lisboa, o qual se encontrava com a sua namorada GG. 2.º De seguida, e na execução de um plano que os três indivíduos tinham delineado,abordaram o ofendido FF pela retaguarda e pediram-lhe cigarros, o que o ofendido recusou. 3.º Perante a recusa do ofendido, os indivíduos surgiram à frente do ofendido e da sua namorada. 4.º Nesse instante, o ofendido, ao aperceber-se que iria ser assaltado, disse à sua namorada para fugir do local e pedir ajuda, o que a mesma fez. 5.º Em acto contínuo, os indivíduos empurraram o ofendido contra uma parede e atiraram-no para o chão. 6.º Nesse momento, os indivíduos agarraram o ofendido, ao mesmo tempo que um deles empunhou uma faca de serrilha, com lâmina de 12 centímetros que utilizaram, em comunhão de esforços e intentos, para o cometimento do crime, de forma a intimidar o ofendido. 7.º De seguida, um dos indivíduos retirou do bolso do ofendido o telemóvel de marca Samsung, modelo A 12, no valor de 159,00€ (cento e cinquenta e nove euros). 8.º E entregou o telemóvel do ofendido aos outros indivíduos, que fugiram apeados do local, com o telemóvel na sua posse, fazendo-o seu. 9.º Em consequência das agressões de que foi alvo o ofendido FF sofreu dores, embora não tenha necessitado de tratamento hospitalar. Processo n° 349/23.4PXLSB (apenso) 10.º No dia 25 de junho de 2023, pelas 18h00, na Praça ..., em Lisboa, o arguido AA encontrava-se na paragem do autocarro número 3721, que ali estava parado, onde também se encontrava, na fila para entrar, o ofendido CC (doravante CC). 11.º Nessas circunstâncias de tempo e lugar, o arguido AA começou a empurrar os passageiros que formavam fila, colocou-se de forma brusca à frente do ofendido CC e, por questões relacionadas com a entrada no autocarro, o arguido AA desferiu-lhe um soco na face direita. 12.º Acto contínuo, no exterior do autocarro, o arguido AA tirou do interior de uma mochila que transportava consigo, um objecto com lâmina corto-perfurante, empunhou-o na direção do ofendido, avançou na sua direção e desferiu-lhe com este vários golpes na zona abdominal esquerda. 13.º A certa altura, o ofendido caiu no solo e ficou inconsciente. 14.º O arguido AA, ao ver o ofendido CC inconsciente no solo e a sangrar, desferiu-lhe pelo menos um pontapé, enquanto lhe revistava os bolsos. 15.º Nesse momento o arguido AA retirou do bolso do ofendido CC um telemóvel no valor de 150,00€, do qual se apoderou e levou consigo. 16.º Foi acionada uma ambulância para socorrer o ofendido, que foi transportado para o Hospital ... onde deu entrada com o episódio clínico nº 36443893. 17.º Em consequência das agressões descritas o ofendido CC sofreu dores causadas por uma ferida incisa na região toraxico-abdominal com cerca de 3 cm e uma ferida na cabeça com hematoma na zona parietoccipital direita. * 18. No dia 15 de setembro de 2023, entre as 00h00m e as 01h30m, na Alameda..., Lisboa, os arguidos AA (doravante AA), e individuo não concretamente identificado, mediante plano previamente acordado, dirigiram-se a BB (doravante BB), com o propósito de se apoderarem de bens e valores que o mesmo tivesse consigo. 19.º Para tanto, o arguido AA, com as mãos colocadas nos bolsos, apontou algo que tinha no interior do bolso na direção de BB e disse-lhe “Dá-me o telemóvel”. 20.º BB, receando pela sua vida e integridade física, até porque se convenceu que o arguido teria nos bolsos um objeto que poderia ser utilizado como arma contra si, retirou o seu telemóvel do bolso e entregou-o ao arguido AA. 21.º O arguido AA e o outro indivíduo ausentaram-se do local, levando consigo o telemóvel do ofendido com a marca Xiaomi, modelo Redmi Note 12 Pro, de cor preta e com o IMEI ...33249, no valor de 279,99 € (duzentos e setenta e nove euros e noventa e ove cêntimos), fazendo-o seu. 22.º No dia 20 de outubro de 2023, pelas 13H00, no Largo ..., em Lisboa, onde foi interceptado por elemento policial, o arguido BB detinha na sua posse o telemóvel, marca Xiaomi, Redmi Note 12 Pro, cor preta, IMEI ...33249, anteriormente pertencente ao ofendido BB. * 30.º Com a prática das condutas supra descritas em 10 a 15, o arguido AA, mediante plano previamente delineado, agiu com o propósito concretizado de, sem motivo para tal, causar dores e lesões no corpo do ofendido CC, o que quis e fez, não se coibindo de utilizar um objecto perfurante para tal, pondo em perigo a vida deste, continuando a agressão mesmo quando o ofendido já estava no solo, inconsciente. 31.º O arguido AA pretendeu subtrair a CC os bens e valores que o mesmo tivesse em seu poder, em concreto o telemóvel, o que conseguiu, bem sabendo que tal bem não lhe pertencia e que não tinha autorização do proprietário para tal ato. 32.º Com a prática das condutas supra descritas em 18 a 21, o arguido AA e outro indivíduo, em comunhão de esforços, mediante plano previamente delineado, agiram com o propósito concretizado de subtrair a BB, com recurso ao uso da força física e pela intimidação da aparência de terem consigo um objeto que poderiam usar naquelas circunstâncias como arma, todos os bens e valores que o mesmo tivesse em seu poder, o que conseguiram, bem sabendo que tais bens e valores não lhes pertenciam e que não tinham autorização do proprietário dos bens para tais actos. 33.º O arguido AA e o individuo não identificado representaram e quiseram, mediante a simulação de terem consigo um objeto de natureza não apurada, anular a capacidade de resistência de BB para o constranger e este não apresentar resistência, por temer pela sua vida e integridade física, à entrega dos seus bens e valores, o que concretizaram. 36.º Em todas as condutas supra descritas, o arguido AA agiu sempre de modo livre voluntário e consciente, com a intenção concretizada de, através de agressões e de objetos, atemorizar os ofendidos como meio instrumental e necessário para alcançar tal desiderato, o que conseguiu, bem sabendo que tais condutas eram proibidas e punidas pela lei penal portuguesa. * 37.º Os arguidos AA e BB são naturais de Marrocos. 38.º O arguido AA não tem qualquer autorização para residir em Portugal, encontrando-se ilegalmente em território nacional, tendo sido indeferido pela AIMA o pedido de asilo por si apresentado. 39.º O arguido BB é titular de cartão de residência em Portugal. 40.º O arguido AA não tem qualquer família em Portugal, em concreto, filhos menores de idade. * 41.º Dos certificados de registo criminal dos arguidos não constam averbadas quaisquer condenações. * 42.º Do relatório social elaborado em relação ao arguido AA resulta que:
“À data dos acontecimentos que motivaram o presente processo, AA, indicou que se encontrava a trabalhar como pescador, em Sesimbra, actividade que desempenhou durante oito meses, até setembro de 2023, recebendo pela mesma entre dois mil e trezentos a dois mil e quinhentos euros mensais. À data da actual reclusão, tinha-se inscrito para começar a trabalhar como distribuidor da Glovo, não tendo chegado a iniciar essa actividade porque, entretanto, foi preso. Segundo o próprio, quer em Portugal quer pelos outros países da europa por onde passou, nomeadamente, Holanda, Alemanha e Itália, sempre trabalhou em áreas indiferenciadas, sem vínculo contratual. Iniciou o seu percurso na construção civil, no seu país de origem, juntamente com o seu progenitor, vindo para Portugal, sozinho, em junho de 2020, em busca de melhores condições de vida. Indicou ainda que terá estado na Suíça e que durante a sua estadia neste país, esteve preso entre três a quatro meses, ao que refere, por se encontrar indocumentado. Em termos habitacionais, à data dos factos, reportou que residia num quarto alugado em ..., na morada constante do processo, juntamente com a namorada, pagando pelo mesmo, quatrocentos euros mensais. Dada a actual situação de reclusão do arguido, actualmente a namorada mantém-se a residir no quarto onde residiam juntos, assegurando o pagamento do mesmo através do que recebe mensalmente do trabalho que faz online. O arguido é o mais novo de uma fratria de quatro irmãos, descrevendo um processo de crescimento e socialização junto dos progenitores em Marrocos, até aos seus vinte e dois anos de idade, onde o progenitor exercia atividade como pedreiro da construção civil e a progenitora como doméstica, relatando a dinâmica familiar como coesa e afetivamente gratificante apesar das dificuldades económicas do agregado de origem. A nível afetivo, tem uma relação de namoro com uma pessoa de nacionalidade espanhola, vivendo juntos há cerca de dois anos, sendo sua pretensão contrair matrimónio com a mesma, aqui em Portugal. O arguido não tem filhos, mas a namorada tem dois filhos, ambos maiores de idade, fruto de um anterior relacionamento e que vivem em Espanha. No que respeita à realidade económica do arguido à data dos alegados factos, esta foi caracterizada como suficiente, assente nos proventos do seu trabalho e no subsídio de desemprego que a namorada recebia, tendo sido reportado o valor pago pelo aluguer do quarto, como a despesa mais significativa, sendo que o arguido ainda enviava algum dinheiro para o seu país de origem para ajudar os progenitores. Ao nível da escolaridade, refere possuir o 9º ano, completado no seu país de origem, através de um curso profissional de soldador. De acordo com o apurado não lhe são conhecidos quaisquer problemas de saúde. Relativamente a problemas de natureza aditiva, o arguido reporta um historial de consumos de haxixe desde os dez anos de idade, encontrando-se aparentemente abstinente desde a sua reclusão, com recurso a medicação diária. Em termos futuros, perspetiva regularizar a sua situação de permanência em Portugal, porque actualmente apenas possui passaporte válido, país onde pretende ficar definitivamente. AA encontra-se preso preventivamente desde 25 de janeiro de 2024, à ordem do presente processo, tendo dado entrada primeiramente no Estabelecimento Prisional instalado na Polícia Judiciária de Lisboa, vindo posteriormente, em 24.06.2024, a ser transferido para o Estabelecimento Prisional de Lisboa, onde se encontra actualmente. Em meio prisional o arguido vem mantendo um comportamento de acordo com as regras institucionais sem registo de infrações ou sanções disciplinares, beneficiando regularmente da visita da namorada que o apoia monetariamente, levando-lhe ainda alimentação e vestuário ao EP. Beneficia de acompanhamento psicológico e faz medicação diária para a dependência aditiva. AA não se encontra integrado em nenhuma actividade laboral ou formativa no Estabelecimento Prisional atendendo à sua actual situação jurídico-penal, mas já solicitou colocação. O impacto da presente situação prisional no arguido aparentemente surge circunscrita às consequências dos efeitos da reclusão para si mesmo, dada a ausência de fontes passíveis de confirmar as informações que prestou. (...) O processo de crescimento e desenvolvimento de AA, decorreu em Marrocos junto da família de origem, vindo a emigrar para a Europa já na fase adulta em busca de melhores condições de vida. Em Portugal desde meados de 2020, apesar de não ter referido períodos de inatividade, não possuía ocupação laboral consistente, tendo trabalhado em diversas áreas, sem qualquer vínculo contratual e encontra-se em situação irregular em território nacional. Apresenta um historial de consumos de haxixe desde muito jovem. Embora refira que em Portugal tem o apoio da namorada, desconhece-se a consistência do mesmo. Neste sentido, a falta de confirmação da existência de suporte em Portugal, a problemática aditiva, a inexistência de ocupação laboral consistente e a situação de permanência irregular em território nacional, bem como, as consequências daí decorrentes, podem revelar-se como factores de vulnerabilidade quanto à sua inserção. Face ao exposto, considera-se que o processo de integração de AA se encontra condicionado pela necessária interiorização dos normativos sociais vigentes, bem como das condições pessoais e sociais que irá encontrar quando em liberdade, pelo que em caso de condenação, considera-se fundamental a necessidade de acompanhamento estruturado e continuado que lhe permita ultrapassar as fragilidades que apresenta.” 43.º O Arguido AA, à data dos factos, trabalhava na pesca da sardinha e pernoitava nesse barco ou no armazém onde o barco ficava guardado, sendo que ao fim de semana deslocava-se para casa da sua namorada, da qual não soube explicar a actividade profissional. Consumia cocaína e necessita de tomar medicação para se tranquilizar (“sofre problemas de nervosismo”).
(…).” A) MOTIVAÇÃO DE FACTO O Tribunal fundou a sua convicção na apreciação crítica do conjunto da prova produzida, devidamente analisada à luz do prudente arbítrio e das regras de experiência, nos termos do art.º 127º do C.P. Penal. Refira-se que liberdade de apreciação não se confunde com apreciação arbitrária da prova, nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova, exigindo-se antes, uma apreciação crítica e racional das provas, fundada nas regras da experiência, da lógica e da ciência. Dispõem os artigos 374º, n.º 2 e 379º, n.º 1, al. a) do Código de Processo Penal que a sentença deve conter, para além da enumeração dos factos provados e não provados, a indicação das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, e uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção. Logo, para apurar a factualidade assente, não basta enumerar os meios de prova, antes se impondo que se expresse o modo como se alcançou essa convicção, descrevendo o processo racional seguido e objetivando a análise e ponderação criticamente comparativa das diversas provas produzidas, para que se conheça a motivação que fundamentou a opção por certo meio de prova em detrimento de outro, ou sobre qual o peso que determinadas provas tiveram no processo decisório, ou proceder à explanação do percurso lógico do Tribunal até chegar à decisão fáctica, para permitir aos destinatários da decisão e aos cidadãos em geral, um controle externo e democrático sobre o exercício da justiça (cfr. Acórdão da Relação de Lisboa de 8 de novembro de 2006, proferido no âmbito do processo n.º 5/14.4GMLSB deste Juízo Central Criminal de Lisboa). A factualidade dada como provada assim resultou da conjugação da prova testemunhal, - podendo desde já afirmar-se que, as testemunhas de acusação inquiridas depuseram de forma credível e objectiva -, com a prova documental e pericial, a saber, por recorte factual-processual: Processo n.º 903/24.7T9LSB 1. GG, relatou que em setembro de 2021, estava com o FF, já tarde, perto da meia noite, e quando iam a passar junto a um parque de estacionamento, foram abordados por dois rapazes que pediram um cigarro, (porque o FF estava a fumar), depois apareceram mais dois indivíduos, foram encurralados e a certa altura o FF empurrou-a e disse lhe para fugir e pedir ajuda e por isso foi para um café, onde estavam pessoas na esplanada, que a acompanharam e quando voltou acompanhada ao local, já alguém estava a ajudar o FF que estava caído ao chão, e dois dos rapazes foram agarrados, mas dois fugiram. O FF ficou sem telemóvel, que era um Samsung, comprado 15 dias antes, reconhecendo que ficaram muito nervosos com a situação. Pensa que o telemóvel não foi recuperado apesar da detenção das duas pessoas. Havia uma faca, que a polícia recuperou no parque de estacionamento, confirmando que seria semelhante à que consta da fotografia de fls. 50 do nuipc 903/24. Recordou que os indivíduos eram todos homens, jovens, mais altos, com cerca de 1,70m, morenos, um tinha cabelo comprido, falavam em inglês. 2. Esclareceu que o FF não sofreu qualquer lesão, não foi ao hospital nem ao médico, tendo falecido pouco tempo depois. 3. HH, Agente da PSP, que fazia parte de uma brigada que andava na rua, recordou que no dia 1 de setembro, antes da meia noite, interveio na detenção de dois indivíduos, junto à Praça ..., e ali havia um conjunto de populares a agarrar dois indivíduos (DD e EE), que foram revistados, e um, o EE, tinha a faca, pelo que procederam a detenção dos mesmos que foram conduzidos à esquadra. Confirmou que o ofendido FF tinha ficado sem telemóvel, um Samsung no valor aproximado de 160€, e não quis tratamento médico. Nessa ocasião, pediram apoio para dar voltas nas imediações mas não localizaram os outros dois indivíduos. Estava acompanhado com o agente II e confirmou o auto de notícia com detenção e apreensão, de fls. 2 a 10 e 50 (faca apreendida). 3. JJ, Agente da PSP, explicou que no âmbito da investigação inquiriu o DD e ele identificou as outras duas pessoas, o AA e outro mas não localizou nenhum. Não foi possível inquirir as testemunhas KK, m.i. a fls. 33 e DD, m.i. a fls. 94, em virtude de não terem sido localizadas, o que, conjugadamente com o óbito do ofendido FF comprometeu o esclarecimento dos factos quanto à intervenção do arguido e daí derivam os factos não provados. Relativamente à prova documental, foram relevantes: - Certidão do nuipc 83/21.0SHLSB, onde consta o auto de notícia datado de 01.09.2021, em que FF (entretanto falecido) apresentou queixa, tendo sido detidos dois suspeitos na Praça ..., EE e DD; o respectivo auto de apreensão relativo à faca de cozinha com serrilha (fls. 9-10), - Fotografia de fls. 50 relativa à faca apreendida; - Cota de fls. 81 (impossibilidade de realização de reconhecimento fotográfico); - Auto de exame e avaliação n° 1, de fls. 108; - Informação do SEF de fls. 161 a 169 relativo ao arguido AA relativa à rejeição do pedido de asilo; - Certidão de registo de assento de óbito da testemunha FF de fls. 255 e ss. dos autos principais. * Processo nº 349/23.4PXLSB (apenso) 4. CC, conhecendo o arguido AA dos factos, recordou que num domingo que foi para Sesimbra, havia uma fila para o autocarro, e enquanto estavam à espera, o arguido que estava agitado mas não estava na fila, entra na fila, atirou-lhe com a mochila pelo que o questionou, e logo o arguido o atingiu com socos, pelo menos um acertou na cara, quando estavam junto à porta do autocarro, admitindo que também lhe deu murros (mas foi para se defender), depois foram separados, e foi novamente da fila. Depois, o arguido foi à mochila e tirou a faca e a testemunha começou a recuar e ele veio atrás com a faca na mão e caiu, (não sabe se tropeçou ou se foi o arguido que o fez cair), e a certa altura foi atingido na barriga, concretamente no abdómen do lado esquerdo, não sabe se quando estava de pé ou já no chão, e recorda que perdeu os sentidos, depois acordou quando os policiais já lá estavam. De seguida foi para o Hospital ..., e permaneceu lá até de madrugada. Ainda hoje tem uma cicatriz no local onde sofreu o corte, e teve dores durante trinta dias, mas hoje já não tem dores. O telemóvel foi-lhe entregue no momento pelos agentes policiais. Apresentou queixa uns dias depois conforme resulta de fls. 51, que confirmou. Tinha o telemóvel na bolsa a tiracolo, tratava-se de um telemóvel Xiaomi, que comprou por €123, e que comprou menos de um ano antes dos factos, e depois dos factos ficou a funcionar mal. Recordou que o arguido para além da mochila, também tinha sacos, e não falava português. 5. LL, motorista na TSP, recordou que no dia 25 de junho de 2023, ia para Sesimbra, por volta do fim da tarde, e estava a encostar o autocarro para estacionar junto a paragem de ..., e o arguido entra com sacos, pousa os sacos no interior, volta ao exterior para ir buscar outros sacos, e quando um outro passageiro estava a subir, envolvem-se em agressões físicas, trocando murros e a testemunha intervém para os separar, depois o arguido sobe para ir buscar um objecto pontiagudo e volta a sair e ataca o outro senhor com um objecto cortante. Recordou que o arguido deu ao outro passageiro um pontapé na cabeça, quando ele já estava inanimado, e revistou-lhe os bolsos, pelo que foi pedir ajuda ao parque municipal e veio o agente que imobilizou o arguido com recurso a arma de fogo. Recordou que a vítima tinha sangue, que viu quando foi transportado para a ambulância, tendo esclarecido que tudo aconteceu fora do autocarro. O arguido estava muito alterado, começou logo aos gritos, pensa que a discussão foi por causa da ordem de entrada no autocarro. O arguido revistou os bolsos das calças do ofendido, e pensa que viu um telemóvel ou carteira a ser retirado, não viu dar mais murros. Depois foi chamado outro autocarro e não foi concluído o trajecto do autocarro por si conduzido. 6. MM, agente da PSP, recordou que estava de serviço na Policia Municipal de ..., em ... e há um pedido de auxilio por parte de vários cidadãos, pelo que sai do parque e vai para o outro lado, onde vê o motorista do autocarro a atrás do arguido AA, por ter discutido com outro senhor que estava estendido no chão, apresentando um ferimento efectuado no abdomén com objecto perfurante, o ferido não estava consciente e havia sangue, pelo que activou os meios de socorro, deteve o arguido, chamou reforços, colocou-lhe as algemas, e este começou a rolar a bater com a cabeça no passeio. A revista do arguido foi feita pelos colegas, pensa que havia uma chave de fendas ou algo semelhante. Não teve intervenção na ulterior investigação. Confirmou elaboração do auto de fls. 4 do nuipc 349/23, em colaboração com o seu colega NN. Pensa que foram cartões bancários apreendidos na posse do arguido. O ferido/ofendido foi transportado para o hospital. 7. OO, recordou que em 2022, foi fazer uma entrega num restaurante junto à Praça ... e quando voltou à sua carrinha já não estava lá a sua mochila que tinha os seus cartões. Algum tempo depois, uma semana, uma pessoa que foi detida tinha na sua posse o seu cartão bancário do Banco Activo (que cancelou), cartão de refeições (que chegaram a utilizar €50), cartão de desconto Repsol do Montepio, cartões estes que não lhe foram entregues. 8. NN, agente da PSP, lembrou que foram contactados, ao fim da tarde, via rádio pela Polícia Municipal, para junto de ..., e quando chegaram o arguido AA já estava manietado, pelo que lhe fizeram revista, encontrando um telemóvel que pertencia à vítima que logo foi devolvido. A vítima estava a ser assistida pelo INEM já dentro da ambulância. Confirmou o auto de notícia de fls. 1 a 3, o auto de apreensão de fls. 11 e 17, o auto de detenção de fls. 4, confirmando que o arguido tinha consigo o passaporte, recordou o alicate e a navalha, bem como a apreensão dos cartões. Explicou que o arguido não estava alcoolizado, mas não estava bem, apresentava-se bastante exaltado, tanto que deu uma cabeçada na parede na esquadra, tendo sido transportado ao hospital nessa sequência. 9. PP, agente da PSP, acompanhava com o agente NN, recordou que quando chegaram ao local dos factos o arguido já estava algemado, o lesado tinha escoriações, todos junto ao autocarro, não se recordando de outros detalhes, referindo que não fez a revista ao arguido. Confirmou que procedeu à identificação do arguido que tinha o passaporte, e este na esquadra estava muito nervoso, deu uma cabeçada na parede na esquadra, foi chamada uma ambulância e o arguido recusou tratamento. Lembrou-se que foi apreendido ao arguido um telemóvel que pertencia ao lesado e lhe foi entregue ainda no local. 10. QQ, tripulante de ambulância, numa data que não recordou, na estação de ..., observa uma altercação e viu uma pessoa prostrada no chão, saiu do carro e vê um senhor, muito alterado, a desferir bofetadas e murros na cara do lado esquerdo a outra pessoa, e viu-o também a tirar um telemóvel do bolso das calças do ofendido, pelo que de imediato ligou para a polícia. O arguido tentou fugir, mas como do outro lado havia polícia …, cujos agentes vierem e o detiveram até chegar a PSP. Entretanto chegou a ambulância, a vítima levantou-se com ajuda, e quando se aproximou estava consciente, mas muito debilitada. Foram também relevantes os seguintes documentos: - Relatório pericial a fls. 80 do Processo n° 349/23.4PXLSB que concluiu que os três objectos apreendidos ao arguido não integram o conceito do RJAM previsto no art.º 2º, n.º 1 al. m), por terem laminas de comprimento inferior a 10 cm, - Auto de notícia por detenção, de fls. 2-6, datado de 25.06.2023; - Auto de apreensão n° 1, de fls. 11, relativo a alicate, navalha e cartões bancários titulados por OO; - Auto de exame e avaliação nº 1, de fls. 12; - Ficha clínica, de fls. 13, relativa ao arguido AA por ter dado “cabeçada contra a parede na esquadra”; - Auto de apreensão de liamba de fls. 17; - Documentação clínica H. ..., de fls. 20-25, de relativa ao ofendido CC; - Aditamento n° 2, de fls. 46; - Auto de denúncia, de fls. 51, apresentada em 27.06.2023 reportando os factos de 25.06.2023. * Processo nº 1401/23.1S5LSB (autos principais) 11. BB, recordou que num dia cuja data não recordou, por volta da 1h15, junto à sua casa na ... foi abordado por duas pessoas, que lhe tiraram o telemóvel (um Xiaomi Redmi 12 Pro, no valor de 269€, e que tinha um mês de uso) que estava no bolso da frente das suas calças. Os indivíduos pediram-lhe tudo o que ele tivesse, ficando um atrás e outro à frente, sendo que o individuo que reconheceu foi o que ficou à frente, e tinha barba, dizendo-lhe “passa tudo o que tem”, como quem tem dificuldades em falar português e puxando o telemóvel. O individuo que estava à sua frente, o que reconheceu, fez um gesto com a mão no bolso como se tivesse uma arma, e que o levou a entregar os seus pertences. Recuperou o telemóvel, três meses depois, em novembro de 2023, porque a polícia encontrou o telemóvel na posse de outra pessoa, o arguido BB, que não reconheceu como estando na situação. O outro individuo, que não soube reconhecer, estava vestido de preto e com boné preto, e ambos eram mais altos que a testemunha, que mede 1,74m. Confirmou auto de denúncia, fls. 2, 31, 33, 46-47, 12. RR, agente da PSP, procedeu aos reconhecimentos fotográficos e pessoais em relação ao arguido AA, cujos autos confirmou. 13. SS, Comandante da PSP, nada esclareceu quanto a concretas diligencias de investigação. 14. TT, agente da PSP, coordenador da equipa, nada esclareceu quanto a concretas diligencias de investigação. 15. UU, agente da PSP, nada esclareceu quanto a concretas diligencias de investigação. 16. VV, agente da PSP, procedeu aos reconhecimentos fotográficos e pessoais, relativos a situações em setembro de 2023 e janeiro de 2024, entre ... e ..., em Lisboa, fls. 10 e ss. e 15 e ss. (este com recurso a Whataspp), do nuipc 46/24.3PFLSB, cujos autos confirmou. 17. WW, agente da PSP, participou nas diligências de reconhecimentos fotográficos e pessoais do nuipc 1401/23 e 46/23.3PFLSB, e também elaborou o relatório final que consta dos autos, elementos que confirmou. 18. XX, agente da PSP, recordou que na data constante dos autos, verificou que estavam os dois arguidos, com um terceiro individuo a tentar mexer num posto de electricidade, e que apesar de tentarem fugir, foram revistados e o arguido BB tinha um telemóvel com uma fotografia que não correspondia à sua pessoa, e verificou que tinha IMEI que constava, na base de dados, como roubado e foi entregue ao titular passados uns dias. Confirmou fls. 13 a 16 do nuipc 1401/23.1, explicando que procedeu à identificação do arguido BB, com cartão de cidadão e o arguido AA já era conhecido e foi a partir do cliché que contém a fotografia, que correspondia aos documentos de identificação. Foram também relevantes os seguintes documentos: - Auto de notícia por detenção, de fls. 2 datado de 05.09.2023, aditamento de fls. 13 datado de 20.10.2023; - Auto de apreensão nº 1, de fls. 15-16 relativo ao telemóvel Xiaomi Redmi apreendido na posse de BB e que pertencia a BB; - Auto de Exame e Avaliação nº 1, de fls. 17 e termo de entrega de fls. 33; - Aditamento nº 2, de fls. 28; - Auto de reconhecimento fotográfico, de fls. 31-32 (arguido AA); - Auto de reconhecimento pessoal de fls.46-47 (arguido AA); Processo nº 46/24.3PFLSB (apenso) * 19. YY, agente da PSP, elaborou e confirmou o auto de notícia lavrado em janeiro de 2024, junto à Rua ..., esclarecendo que foi-lhe transmitida a informação pelo lesado, a quem foi subtraída a carteira com documentos pessoais e dinheiro e o telemóvel no valor de €200, viu o ofendido mas não viu marcas de agressão e que não ia ao hospital.
(…) Apesar da relevância da prova documental, concretamente do auto de notícia, de fls. 2 datado de 06.01.2024 e do auto de reconhecimento fotográfico de fls. 7-8 e do auto de reconhecimento pessoal de fls. 15-17 (relativos ao arguido AA), como não foi possível inquirir a testemunha, o alegado ofendido ZZ, por o mesmo não ter sido localizado, tal dificuldade perturbou a aquisição probatória, na medida em que o mesmo assim não confirmou os autos de reconhecimento nem as declarações que serviram de base ao auto de noticia, pelo que daí resultaram como não provados os respectivos factos. * O arguido AA em sede de primeiro interrogatório, apenas esclareceu sobre as condições pessoais, sendo que nenhum dos arguidos prestou declarações sobre os factos em sede de audiência de julgamento, limitando-se a confirmar os respectivos relatórios sociais, tendo o arguido AA corrigido algumas informações. Foram ainda relevantes os certificados de registo criminal e os relatórios sociais elaborados no âmbito dos presentes autos. Foi também relevante o cartão de autorização de residência do arguido BB, cuja cópia se encontra junta a fls. 342. Em suma, as testemunhas indicadas pela acusação permitiram a reconstituição dos factos, no sentido de conhecer a dinâmica dos factos ocorridos e os pormenores da actuação dos arguidos nas datas referidas no acervo fáctico, sendo que a não realização de reconhecimentos pessoais ou a não confirmação dos mesmos, impossibilitou a confirmação integral do libelo acusatório. Efectivamente e relativamente aos factos não provados os mesmos assim resultaram da insuficiência da prova produzida, pois relativamente ao nuipc 903/24.7T9LSB (apenso), embora confirmada a dinâmica factual, nada foi possível apurar quanto à identidade dos sujeitos intervenientes. Já em relação ao nuipc 349/23.4PXLSB (apenso), resultou integralmente confirmada a factualidade acusatória, face à conjugação da prova testemunhal e documental, com detenção do arguido AA. Relativamente ao nuipc 1401/23.1S5LSB (autos principais), apenas se comprovou a intervenção do arguido AA e a sua actuação concreta, nada se apurando quanto à intervenção do arguido BB, pois que o ofendido não o reconheceu como interveniente nos factos (recorde-se que o segundo individuo permaneceu atrás do ofendido enquanto decorreu o assalto), apesar de ter sido o mesmo detido pelos agentes policiais, mais de um mês após os factos, na posse do telemóvel que havia sido subtraído ao ofendido, em circunstancias que não foram precisamente concretizadas (e que poderiam, quando muito, levar à responsabilização do arguido, por outro crime que não o acusado). Finalmente, no nuipc 46/24.3PFLSB (apenso), atenta a impossibilidade de localizar o ofendido, apesar de todas as diligências efectuadas, não foi possível confirmar a dinâmica factual e nem o reconhecimento do arguido AA.
(…).”
Como referido supra, o recorrente suscitou a nulidade do acórdão recorrido por entender existente o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto, previsto na alínea a) do n.º 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal, mais invocando excesso de pronúncia e falta de fundamentação (artigos 374.º, n.º 1 e 379.º, n.ºs 1, alíneas a) e c) do Código de Processo Penal).
Nos termos do n.º 2 do artigo 410.º, mesmo nos casos em que lei restrinja a cognição do tribunal a matéria de direito, cabe ao tribunal conhecer da existência dos vícios “decisórios” que resultem “do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência”, sendo estes:
“a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto; b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; c) Erro notório da apreciação da prova.”
No que respeita à insuficiência para a decisão da matéria de facto ocorre esta quando “os factos apurados são insuficientes para a decisão de direito, do ponto de vista das várias soluções que se perfilem - absolvição, condenação, existência de causa de exclusão da ilicitude, da culpa ou da pena, circunstâncias relevantes para a determinação desta última, etc. - e isto porque o tribunal deixou de apurar ou de se pronunciar sobre factos relevantes alegados pela acusação ou pela defesa ou resultantes da discussão da causa, ou ainda porque não investigou factos que deviam ter sido apurados na audiência, vista a sua importância para a decisão” (Acórdão do STJ de 20 de Abril de 2006).
Tal como os demais vícios previstos nas diversas alíneas do n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal, a alegada insuficiência da matéria de facto para a decisão, tem de resultar evidente do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência.
Ora, da leitura e análise do acórdão recorrido não resulta qualquer insuficiência da matéria de facto provada para a decisão, apresentando-se esta como consequência daquela.
De resto, na motivação do recurso e respectivas conclusões o arguido limitou-se a invocar a existência do referido vício sem proceder a uma sua qualquer concretização por referência ao texto do acórdão recorrido, autonomamente considerado, pelo que, nesta parte, é de improceder o recurso interposto.
Acresce, que ao invocar o vício em causa o que o recorrente pretendeu foi manifestar a sua divergência relativamente à apreciação da prova efectuada pelo tribunal a quo por entender inexistir prova dos factos provados, o que nos remete para a impugnação da matéria de facto a efectuar nos termos do artigo 412.º, n.º 3.º e 4 do Código de Processo Penal. Neste, estabelece-se que, quando impugne a matéria de facto o recorrente tem o ónus de especificar na motivação do recurso: “a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) As provas que devem ser renovadas.”
E, conforme o n.º 4 do mesmo artigo, “Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação.”, caso em que “o tribunal procede à audição ou visualização das passagens indicadas e de outras que considere relevantes para a descoberta de verdade e a boa decisão da causa.» (n.º 6 do artigo 412º do Código de Processo Penal).
Ora, o recorrente não cumpriu com as exigências de especificação do citado artigo 412.º n.ºs 3 e 4 do Código de Processo Penal, já que não indicou sequer os pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados, limitando-se a impugná-los em bloco fazendo referência a “toda a factualidade dada como provada do ponto 10 ao ponto 36 e seguintes” que transcreveu parcialmente. Do mesmo modo, não indicou a prova que, na sua perspectiva, impunha decisão diversa apenas afirmando, em termos conclusivos, que o que se provou não corresponde à verdade1, apresentando versão alternativa para os factos2, mais invocando a existência de dúvida séria e violação do princípio in dubio pro reo.
Ora, a reapreciação da prova por parte do Tribunal de recurso visa corrigir erros pontuais do julgador e não realizar um novo e integral julgamento.
Assim, incumprido ostensivamente, o tríplice ónus de especificação exigido pelo artigo 412.º do Código de Processo Penal, não pode este Tribunal de recurso proceder à reapreciação da prova gravada.
De todo o modo, sempre se refere que, analisada a prova não existe fundamento para alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto.
Quanto ao princípio in dubio pro reo, este apenas é convocado nos casos em que o tribunal de julgamento se depare com uma situação de dúvida razoável e intransponível sobre a realidade dos factos. No caso, o tribunal a quo não teve dúvidas quanto à actuação do arguido, nem se afigura que, nas circunstâncias, as devesse ter tido, não se configurando, por isso, qualquer situação de violação do alegado princípio constitucional.
No que respeita ao alegado excesso de pronúncia verifica-se o mesmo quando o Tribunal conheça de questões de que não podia conhecer por não caberem no objecto do processo, nem lhe terem sido colocadas pelos intervenientes (artigo 379.º, n.º 1, alínea c) parte final.
Ora, no recurso interposto, o invocado excesso de pronúncia não foi apresentado com o significado que decorre da lei, mas antes feito decorrer da simples condenação por factos que o arguido invocou não ter cometido3, sendo manifesto não se verificar a invocada nulidade já que no acórdão recorrido o tribunal a quo se cingiu ao objecto do processo delimitado pela acusação.
Quanto à invocada nulidade do acórdão por falta de fundamentação da matéria de facto refere-se, desde já, que não assiste razão ao recorrente encontrando-se o acórdão bem fundamentado.
No que respeita às sentenças penais, o artigo 379º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Penal, comina com nulidade a inobservância das exigências do artigo 374.º do mesmo código, exigindo-se, entre o mais, “uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.”
A exigência de fundamentação é cumprida quando é possível ao destinatário perceber as razões de facto e de direito da decisão. Não existe um modelo que importe seguir, nem é, por regra, necessária concretização detalhada do que cada interveniente referiu e do que resulta de cada um dos elementos prova de que o julgador se socorreu. Importa que, no seu conjunto, se perceba - como é o caso -, a decisão de absolvição ou de condenação em toda a sua amplitude e que seja possível questioná-la em sede de recurso, como é também o caso.
No que respeita à matéria de facto subsumível aos crimes pelos quais o arguido foi condenado, o acórdão recorrido expõe o raciocínio seguido pelo tribunal a quo, referindo cada um dos elementos de prova e a forma como foram valorados, explicando, de forma lógica, o que foi e o que não foi provado.
Quanto à medida das penas parcelares e da pena única e modo de execução desta, defendeu o arguido que as primeiras deviam ser reduzidas de modo a que a última pudesse ser fixada em 5 anos e suspensa na sua execução.
A este respeito e quanto à pena acessória de expulsão, consta do acórdão recorrido o seguinte:
“(…) Da dosimetria das penas: Demonstrado que está o preenchimento de vários tipos legais de crime, resta determinar as sanções a aplicar ao arguido AA. Dentro das molduras, o Tribunal reger-se-á, desde logo, pelo artigo 40º do Código Penal, nos termos do qual se preceitua que a aplicação das penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (n.º 1), não podendo, em caso algum, a pena ultrapassar a medida da culpa (n.º 2). Já de acordo como disposto no artigo 71º, n.º 1, do C.Penal, «a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção». A determinação da pena concreta fixar-se-á, portanto, em função:
• da culpa do agente, que constituirá o limite máximo, por respeito do princípio político-criminal da necessidade da pena, e do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana;
• das exigências de prevenção geral, que constituirão o limite mínimo, sob pena de ser posta em risco a função tutelar do direito e as expectativas comunitárias na validade da norma violada;
• e de prevenção especial de socialização, sendo elas que irão fixar o quantum da pena dentro daqueles limites (vide Figueiredo Dias, “Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime”, Lisboa, 1993, pág. 213 e seguintes). Relativamente às exigências de prevenção geral, na ponderação da dosimetria da pena deste tipo de ilícitos criminais não pode perder-se de vista que uma das finalidades das penas é a protecção dos bens jurídicos (arts.50, nº. 1 in fine e 40, n.º 1, ambos do C.Penal). Neste particular, são prementes as razões de prevenção da criminalidade patrimonial que banaliza a agressividade e a falta de respeito do próximo, prevalecendo-se da utilização de facas de utilização quotidiana, mas que se transformam em armas letais. Tais casos suscitam elevado alarme social e causam grandes sentimentos de insegurança junto da comunidade em geral, como dão conta os órgãos de comunicação social. Quanto às exigências de prevenção especial, na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente, ou contra ele, nomeadamente as referidas nas alíneas do n.º 2 do artigo 71º do C.Penal: o grau de ilicitude do facto, o modo de execução, a gravidade das consequências bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; a intensidade do dolo ou da negligência; os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; as condições pessoais do agente e a sua situação económica; a conduta anterior e posterior; a falta de preparação para manter uma conduta lícita manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena. Assim, tomar-se-á em consideração o seguinte conjunto de circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de ilícito, depõem contra ou a favor do arguido: Considerando que o arguido AA, que não mostrando qualquer arrependimento, sem ter demonstrado vontade de reparação do mal causado, não apresentou um projecto de vida estruturado, mas não possui antecedentes criminais registados no respectivo certificado, entendem-se justas, adequadas e proporcionais as penas de:
• pelo crime de ofensa à integridade física grave, punido com pena de prisão de dois a dez anos, tendo em consideração a forma desproporcionada de actuação e as consequências sofridas pelo ofendido, fixa-se a pena de 3 anos e 6 meses;
• pelo crime de furto (hiper) qualificado, punido com pena de prisão de dois a oito anos, cometido com aproveitamento da prévia agressão do ofendido, fixa-se a pena de 2 anos e 6 meses;
• pelo crime de roubo qualificado, previsto e punido pelo artigo 210º, nºs 1 e 2, alínea b) por referência ao artigo 204º, nº 2, alínea f) do Código Penal e ao artigo 4º do D.L. nº 48/95 de 15-3, na pessoa de BB, cuja pena é a de prisão de 3 a 15 anos, fixa-se a pena de 3 anos e 6 meses. Encontradas as diversas penas parcelares cumpre de imediato proceder à determinação da pena única atendendo aos factos e à personalidade do agente e considerando os limites do n.º 2 do art.º 77º do C.Penal. Considerando os limites do art.º 77º, n.º 2 do Código Penal, e tendo em conta a necessidade de fixar uma pena única, cfr. art.º n.º 1 do mesmo preceito legal, encontrada em função das exigências gerais de culpa e prevenção, deve considerar-se a conduta global do arguido, que não se encontra familiarmente integrado, à sua desinserção profissional, à ausência de projecto de vida, e fundamentalmente às prementes razões de prevenção geral inerentes aos crimes de roubo e furto, que são muito intensas atento o alarme social que desencadeiam e a frequência com que ocorrem, e a falta de consciência crítica do seu comportamento, e a não assunção dos factos nem interiorização dos valores perturbados. Assim, e não menosprezando o enfoque das razões de prevenção geral, na moldura de conjunto entre 3 anos e 6 meses (limite mínimo) e 9 anos e 6 meses, (limite que decorre dos art.º 41º, n.º 2 e 77º, n.º 2 ambos do C.Penal) considera-se justa, adequada e proporcional aplicar ao arguido AA a pena única de 5 anos e 6 meses de prisão.
(…) Sanção acessória de expulsão: O Ministério Público requereu que seja decretada a expulsão dos arguidos do território nacional, em conformidade com os arts. do 134.º, n.º 1, al.a) e f), 135.º, 140.º, n.º 3 e 151.º, todos da Lei 23/2007, de 4 de Agosto. Vejamos: O instituto da expulsão está constitucionalmente previsto no Art.º 33º, n.ºs 1 e 2 da C.R.P.. A entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território português encontra-se actualmente regulada pela Lei n.º 23/2007 de 4 de Julho. Estabelecem os arts. 134º, nº 1, 140º e 151º, nº 1, da Lei 23/2007, de 4/07: “Artigo 134.º Fundamentos da decisão de afastamento coercivo ou de expulsão 1 - Sem prejuízo das disposições constantes de convenções internacionais de que Portugal seja Parte ou a que se vincule, é afastado coercivamente ou expulso judicialmente do território português, o cidadão estrangeiro:
a. Que entre ou permaneça ilegalmente no território português;
b. Que atente contra a segurança nacional ou a ordem pública;
c. Cuja presença ou atividades no País constituam ameaça aos interesses ou à dignidade do Estado Português ou dos seus nacionais;
d. Que interfira de forma abusiva no exercício de direitos de participação política reservados aos cidadãos nacionais;
e. Que tenha praticado atos que, se fossem conhecidos pelas autoridades portuguesas, teriam obstado à sua entrada no País;
f. Em relação ao qual existam sérias razões para crer que cometeu atos criminosos graves ou que tenciona cometer atos dessa natureza, designadamente no território da União Europeia;
g. Que seja detentor de um título de residência válido, ou de outro título que lhe confira direito de permanência em outro Estado membro e não cumpra a obrigação de se dirigir, imediatamente, para esse Estado membro;
2. O disposto no número anterior não prejudica a responsabilidade criminal em que o estrangeiro haja incorrido.
3. Aos refugiados aplica-se o regime mais benéfico, resultante de lei ou convenção internacional a que o Estado Português esteja obrigado. “ “Artigo 140.º Entidades competentes
1. - A decisão de afastamento coercivo pode ser determinada, nos termos da presente lei, pelo diretor nacional do SEF, com faculdade de delegação.
2. - Compete ao diretor nacional do SEF a decisão de arquivamento do processo de afastamento coercivo.
3. - A decisão judicial de expulsão é determinada por autoridade judicial competente.
4. - A decisão de expulsão reveste a natureza de pena acessória ou é adotada quando o cidadão estrangeiro objeto da decisão tenha entrado ou permanecido regularmente em Portugal.” Por sua vez, estabelece o art.º 151º, nº 1 da Lei 23/2007, na secção “Expulsão judicial” e subsecção “Pena acessória de expulsão”, (sublinhado nosso): “Artigo 151.º Pena acessória de expulsão 1 - A pena acessória de expulsão pode ser aplicada ao cidadão estrangeiro não residente no País, condenado por crime doloso em pena superior a seis meses de prisão efetiva ou em pena de multa em alternativa à pena de prisão superior a seis meses. 2 - A mesma pena pode ser imposta a um cidadão estrangeiro residente no País, condenado por crime doloso em pena superior a um ano de prisão, devendo, porém, ter-se em conta, na sua aplicação, a gravidade dos factos praticados pelo arguido, a sua personalidade, eventual reincidência, o grau de inserção na vida social, a prevenção especial e o tempo de residência em Portugal. 3 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, a pena acessória de expulsão só pode ser aplicada ao cidadão estrangeiro com residência permanente, quando a sua conduta constitua perigo ou ameaça graves para a ordem pública, a segurança ou a defesa nacional. 4 - Sendo decretada a pena acessória de expulsão, o juiz de execução de penas ordena a sua execução logo que cumpridos:
a. Metade da pena, nos casos de condenação em pena igual ou inferior a cinco anos de prisão;
b. Dois terços da pena nos casos de condenação em pena superior a cinco anos de prisão. 4 - O juiz de execução de penas pode, sob proposta fundamentada do diretor do estabelecimento prisional, e sem oposição do condenado, decidir a antecipação da execução da pena acessória de expulsão logo que cumprido um terço da pena, nos casos de condenação em pena igual ou inferior a cinco anos de prisão e desde que esteja assegurado o cumprimento do remanescente da pena no país de destino.” Por seu turno, o art.º 144º da referida Lei prescreve “ao cidadão estrangeiro sujeito a decisão de afastamento é vedada a entrada em território nacional por período até cinco anos, podendo tal período ser superior quando se verifique existir ameaça grave para a ordem pública, a segurança pública ou a segurança nacional”. De acordo com esta lei, a expulsão tem um carácter instantâneo e não prolongado no tempo.
(…) Ora, são pressupostos processuais específicos da expulsão para o arguido condenado que (1) haja uma condenação judicial devidamente transitada, possibilitante da execução expulsória, (2) que o arguido seja estrangeiro (3) não podendo a interdição de entrada no país ser por tempo superior a dez anos (4) sem prejuízo das regras especiais aplicáveis aos cidadãos comunitários. A estes pressupostos, acrescem os gerais, previstos na parte geral do C. Penal e respectiva legislação complementar, para que subsidiariamente remete a norma (quando se refere “sem prejuízo do Art.º 48º”). Conforme já se referiu os tipos de crime praticados atentam contra o património e contra a integridade física. O arguido foi condenado por crimes dolosos em pena (de cúmulo) efectiva de 5 anos e 6 meses de prisão. O arguido é natural do país marroquino, não possuindo quaisquer ligações em Portugal, só se encontrando em Portugal nas circunstâncias resultantes do acervo fáctico. Ora, do substracto factual resultam factos que consubstanciam tais fundamentos de ordem pública, de segurança pública ou de saúde pública, inerentes àqueles que exalam dos valores protegidos pelos tipos de ilícito em causa, conforme análise expendida a propósito do enquadramento do tipo legal e da dosimetria das penas. Pelo que se afigura justa e adequada a aplicação ao arguido AA da sanção acessória de expulsão, bem como aplicar a interdição de entrada no território nacional por um período de 5 anos, nos termos das disposições conjugadas dos art.º 134°, n°1, e 151°, n°1, da Lei 23/2007, de 4/07.
(…).”
Vejamos.
A mais do arguido não ter invocado quaisquer razões objectivas que sustentem a sua pretensão quanto à redução das penas parcelares e única impostas, da mera leitura do segmento do acórdão recorrido, transcrito supra, resulta clara a observância pelo Tribunal a quo de todos os critérios legais previstos nos artigos 70.º e 71.º do Código Penal, mostrando-se explicitadas as razões pelas quais o mesmo Tribunal considerou necessário impor as concretas penas de prisão que, de resto, se mostram próximas do limite mínimo das respectivas molduras penais.
No que respeita à pena única, a mesma foi fixada ponderando em conjunto a gravidade dos factos e a personalidade do arguido, como impõe o disposto no artigo 77.º n.ºs 1 e 2 do Código Penal, mostrando-se adequada.
De resto, “(…) o tribunal de recurso intervém na pena, alterando-a, quando detecta incorrecções ou distorções no processo aplicativo desenvolvido em primeira instância, na interpretação e aplicação das normas legais e constitucionais que regem a pena. Não decide como se o fizesse ex novo, como se inexistisse uma decisão de primeira instância. O recurso não visa, não pretende e não pode eliminar alguma margem de actuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do acto de julgar”4.
Assim, é de improceder a pretensão do arguido quanto à redução da pena única, não se colocando a possibilidade de suspensão da sua execução porquanto não se verifica sequer o pressuposto formal relativo à medida da pena, previsto no artigo 50.º do Código Penal.
A mais do arguido não ter invocado quaisquer razões objectivas que sustentem a sua pretensão quanto à redução das penas parcelares e única impostas, da mera leitura do segmento do acórdão recorrido, transcrito supra, resulta clara a observância pelo Tribunal a quo de todos os critérios legais previstos nos artigos 70.º e 71.º do Código Penal, mostrando-se explicitadas as razões pelas quais o mesmo Tribunal considerou necessário impor as concretas penas de prisão que, de resto, se mostram próximas do limite mínimo das respectivas molduras penais.
IV. Dispositivo
Pelo exposto, acordam os Juízes desta 3.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar não provido o recurso interposto pelo arguido AA mantendo na íntegra o acórdão recorrido.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC´s.
Notifique.
Lisboa, 04-06-2025
(Acórdão elaborado pela relatora e revisto pelos signatários - artigo 94º, n.º 2 do Código de Processo Penal).
Rosa Vasconcelos
Ana Rita Loja
Carlos Alexandre
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1. “(…) não se fez prova que o Recorrente tenha efectuado este roubo e nada lhe foi apreendido (…)”
2. “(…) Ora não foi isso que resultou da prova produzida na audiência de discussão e julgamento, houve um envolvimento conflituoso entre o Recorrente e o ofendido, nunca quis o Recorrente subtrair seja o que for. Assim como não é verdade que foi o Recorrente que tenha perpetuado o crime de roubo na pessoa de BB.”
3. “(…) O recorrente não praticou os crimes a que veio a ser condenado, não foi visto a praticar crimes, não foi reconhecido e não lhe foi apreendidos objectos fruto dos crimes, consequentemente deverá o aqui Recorrente ser absolvido, nomeadamente, dos crimes a que foi condenado. Por isso foi cometida, pela instância, a nulidade de excesso de pronúncia (…).”.
4. Ac. do STJ de 19.05.2021, proc. 10/18.1PELRA.S1