I. Se o arguido não recorre da decisão condenatória, em recurso que venha a interpor - por virtude da procedência do recurso, que anulou a decisão recorrida, interposto pelo Mº Pº limitado a determinados factos e incriminação -, da nova decisão, apenas é admissível recurso no que respeita aos novos factos e à pena que daí resulte e seja consequência.
II. Devem ser expressamente referidos os fundamentos da medida da pena.
III. Não podem ser valoradas expressa e autonomamente contra o arguido as circunstâncias relativas às declarações não confessórias e à ausência de arrependimento.
No Proc. C. C. nº 391/23.5... do Tribunal Judicial da Comarca dos Açores - Juízo Central Cível e Criminal de ... - Juiz ... em que é arguido AA
E interveio como assistente BB, e
demandante civil o Hospital 1
O Ministério Público, pediu a reparação a favor da ofendida e esta deduziu pedido de indemnização civil pelos danos patrimoniais.
Por acórdão de 22/5/2024 foi proferida a seguinte decisão:
“Pelo exposto, julga-se a acusação procedente por provada e em consequência:
I - a) Condena-se o arguido AA, como autor material, na forma consumada e em concurso real, da prática de um crime de violação, p. e p., no artigo 164º/2-a), do CP, em cinco (5) anos de prisão;
- pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p., no artigo 152º/1-b) e 2-a), do CP, em quatro (4) anos de prisão,
- e em cúmulo jurídico vai o arguido condenado na pena única de seis (6) anos e seis (6) meses de prisão, efectiva.
- pela prática de dois crimes de injúrias agravadas, p. e p. nos artigos 181º e 184º ambos do CP, em 50 dias de multa, à taxa diária de 5,50 € cada um,
- em cúmulo jurídico, vai o arguido condenado na pena única de 70 dias de multa,à razão diária de 5,50 €, o que perfaz o total de 385 € (trezentos e oitenta e cinco euros).
b) Absolvo o arguido AA, da acusação como autor material, na forma consumada e em concurso real, da prática de um crime de perseguição, p. e p., no artigo 154º A/1, do CP.
c) Absolvo o arguido AA, da acusação como autor material, na forma consumada e em concurso real, da prática de um crime de roubo, p. e p., no artigo 210º/1, do CP.
d) Mais, condeno o arguido no pagamento de 5 UC’s de taxa de justiça e nas demais custas do processo, conforme artigo 8º do RCP.
II - a) Condeno o ainda o demandado AA, a pagar o valor global a título de indemnização civil de 9.527,16 € (nove mil e quinhentos e vinte e sete euros e dezasseis cêntimos) a ser pago da seguinte forma:
- 6.000,00 € (seis mil euros), a pagar à ofendida CC, a título de danos não patrimoniais por aquela sofridos;
- ao Hospital 1, a título de danos patrimoniais suportados, o valor de 3.027,16 € (três mil e vinte e sete euros e dezasseis cêntimos), e - ao assistente BB, a quantia de 500,00 € (quinhentos euros), a pagar a título de danos não patrimoniais por aquele sofridos, acrescidos os juros de mora à taxa legal para as relações civis, a contar desde a data da notificação do pedido de indemnização cível, até integral e efectivo pagamento.
b) Custas cíveis na proporção do decaimento, para ambas as partes, nos termos do artigo 527º do CPC.”
O Mº Pº recorreu para o STJ visando “a revogação do acórdão proferido, nesta parte, e determinado o conhecimento dos factos atinentes aos inquéritos 502/22.8... e 86/23.0... (pontos 10 e 11 da acusação proferida no Processo 391/23.5...) e respetivo direito aplicável”
Por acórdão de 20/11/2024 o STJ proferiu a seguinte decisão:
3.1 - Pelo exposto, julga-se o recurso do MPº procedente e , em consequência, determina-se a remessa dos autos à 1ª instância, face à nulidade detectada ( art.º 379.º n.º1 alínea c) do CPP) para sanação da omissão de julgamento dos factos contidos na acusação nos artigos 10º e 11º,respectivamente com as consequências supra indicadas face ao que vier a ser provado ou não.”
Foi, após nova audiência de julgamento, em 24/2/2025 proferida a seguinte decisão:
“Pelo exposto, julga-se a acusação procedente por provada e em consequência:
I - a) Condena-se o arguido AA, como autor material, na forma consumada e em concurso real, da prática de um crime de violação, p. e p., no artigo 164º/2-a), do CP, em cinco (5) anos de prisão;
- pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p., no artigo 152º/1-b) e 2-a), do CP, em quatro (4) anos e seis (6) meses de prisão,
- e em cúmulo jurídico vai o arguido condenado na pena única de seis (6) anos e nove (9) meses de prisão, efectiva.
- pela prática de dois crimes de injúrias agravadas, p. e p. nos artigos 181º e 184º ambos do CP, em 50 dias de multa, à taxa diária de 5,50 € cada um,
- em cúmulo jurídico, vai o arguido condenado na pena única de 70 dias de multa, à razão diária de 5,50 €, o que perfaz o total de 385 € (trezentos e oitenta e cinco euros).
b) Absolvo o arguido AA, da acusação como autor material, na forma consumada e em concurso real, da prática de:
- três crimes de violência doméstica agravados, p. e p., no artigo 152º/1-b) e 2-a), do CP;
- dois crimes de dano, p. e p., no artigo 212º do CP;
- um crime de perseguição, p. e p., no artigo 154º A/1, do CP
- um crime de roubo, p. e p., no artigo 210º/1, do CP.
c) Mais, condeno o arguido no pagamento de 5 UC’s de taxa de justiça e nas demais custas do processo, conforme artigo 8º do RCP.
II - a) Condeno o ainda o demandado AA, a pagar o valor global a título de indemnização civil de 12.120,66 € (doze mil e cento e vinte euros e sessenta e seis cêntimos) a ser pago da seguinte forma:
- 8.593,50 € (oito mil e quinhentos e noventa e três euros e cinquenta cêntimos), a pagar à ofendida CC, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais por aquela sofridos;
- ao Hospital 1, a título de danos patrimoniais suportados, o valor de 3.027,16 € (três mil e vinte e sete euros e dezasseis cêntimos), e
- ao assistente BB, a quantia de 500,00 € (quinhentos euros), a pagar a título de danos não patrimoniais por aquele sofridos, acrescidos os juros de mora à taxa legal para as relações civis, a contar desde a data da notificação do pedido de indemnização cível, até integral e efectivo pagamento.
b) Custas cíveis na proporção do decaimento, para ambas as partes, nos termos do artigo 527º do CPC.”
Recorre o arguido AA para este Supremo Tribunal, o qual no final da sua motivação apresenta as seguintes e singelas conclusões:
“A)A decisão proferida pelo tribunal a quo viola o disposto no Art.71º nº1 do CPC, pois não valorou os factos relativos à situação pessoal, social e familiar do arguido, quando da aplicação da medida concreta da pena;
B)A pena de prisão aplicada ao Recorrente é excessiva pois ultrapassa as exigências de prevenção geral e especial, sendo certo que
C) É justa e adequada a condenação do Recorrente, em cúmulo jurídico, numa pena de prisão até 5 anos, suspensa na sua execução, ainda que sujeita a regime de prova.
Nestes termos e nos demais de Direito, sempre com o Douto Suprimento de V. Exas., deverá ser dado provimento ao presente Recurso, tudo nos termos destas conclusões, substituindo-se a decisão proferida por outra em que o Recorrente seja condenado em pena de prisão não superior a 5 anos, suspensa na sua execução, ainda que sujeita e regime de prova…”
Respondeu o Mº Pº defendendo a improcedência do recurso
Não ocorreram outras respostas
Neste Supremo Tribunal o digno PGA foi de parecer que deve improceder, estando apenas em causa a pena única em face das conclusões que apresenta e não haverem sido questionadas em anterior recurso ou apenas a pena do crime de violência doméstica e a pena única.
Foi cumprido o disposto no artº 417º2 CPP
Não foi apresentada resposta
Procedeu-se à conferencia com observância do formalismo legal
Consta dos autos (transcrição):
“II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
FACTOS PROVADOS -
Na sequência do julgamento e discussão da causa resultou assente a seguinte matéria de facto com relevância para os autos:
1 - AA e CC conheceram-se no verão do ano de 2021;
2 - Iniciaram uma relação amorosa de namoro em data não concretamente apurada, mas no verão de 2021, sendo que residiam em casas separadas;
3 - Os encontros ocorriam em casa de CC, sita na Rua da ..., concelho da ...;
4 - Em data não concretamente apurada, mas um mês após o início da relação amorosa, AA iniciou uma discussão verbal com CC;
5 - Nessa discussão, AA dirigiu-se a CC e proferiu as seguintes expressões “puta, velhaca, estás aqui para foder”;
6 - Após, AA, empurrou CC para o quarto de cama, e atirou esta contra a cama e agarrou-lhe nos braços por forma a que esta não conseguisse sair e então baixou as suas calças e cuecas, mas não as retirou;
7 - AA dirigiu-se a CC e proferiu a seguinte expressão “quero foder”;
8 - Em resposta, CC disse que não queria, e pediu a AA para parar e para se ir embora;
9 - AA persistiu nos seus intentos, ignorando o que CC lhe havia pedido, e em seguida rasgou a roupa que CC trajava, da cintura para baixo, enquanto se posicionava em cima daquela tendo introduzido o seu pénis na vagina de CC, e ejaculado no seu interior;
10 - Sendo que enquanto ocorria a relação sexual, CC chorava e pedia, de forma insistente, para que AA parasse porque não queria ter relações sexuais;
11 - Após o término da relação sexual, AA abandonou a residência de CC;
12 - No dia seguinte, AA pediu desculpas pelo sucedido a CC;
13 - Em data não concretamente apurada, mas no inverno de 2021, e na sequência de uma discussão verbal, AA agarrou com as duas mãos o pescoço de CC;
14 - Com o término da relação amorosa, em data não concretamente apurada, mas em Julho de 2022, e com frequência semanal, aos fins-de-semana, entre as 02h00m e as 03h00m, AA dirigia-se à residência de CC, na Rua da ..., e batia na porta de entrada, bem como abria a tampa da caixa de correio, que se encontra inserida na porta de entrada, e gritava para o interior da residência proferindo as seguintes expressões “abre a porta, velhaca”, “porquê que não abres a porta”, “deves ter alguém aí dentro”, “puta, caralha”;
15 - Em data não concretamente apurada, mas após o término da relação amorosa AA, apareceu na Pastelaria onde CC, se encontrava, pedindo para falar com ela;
16 - Em virtude de se sentir incomodada, CC bloqueou o número de telefone de AA, bem como mudou de contacto telefónico;
17 - Em 9 de Outubro de 2022, CC, tinha ido tomar um café pela manhã, por volta das 08H00 e quando regressava a casa pelas 08H30, encontrava-se a estacionar o seu carro em frente àquela, quando de repente e sem que CC esperasse, o arguido AA, abriu a porta do lado do condutor do veículo daquela e colocou-se por cima desta para aceder ao porta luvas, alegando que ela tinha o telemóvel dele ali escondido;
18 - Como o arguido estava muito alcoolizado, partiu a porta do porta-luvas, e de seguida arrancou o telemóvel da ofendida das mãos desta e, acto contínuo deu uma cabeçada no para-brisas, na parte superior do vidro do lado do condutor (lado direito), partindo-o;
19 - Ao tirar o telemóvel das mãos da ofendida, fê-lo de forma brusca e violenta, arrancando integralmente a unha do 3º dedo da mão direita daquela e pôs-se em fuga;
20 - Como consequência direta da atuação do arguido, a vítima CC sofreu:
- Ao nível do «membro superior direito: arrancamento traumático da unha do terceiro dedo da mão direita.»
O processo de cura das lesões determinou para a vítima um período de 8 dias de doença sem afetação para a capacidade geral de trabalho e sem afetação da capacidade de trabalho profissional.
21 - Em consequência destas condutas do arguido, sofreu a ofendida prejuízos no porta-luvas do seu carro que ficou destruído e no para-brisas que ficou partido, num valor orçado em 346,50 € (trezentos e quarenta e seis euros e cinquenta cêntimos;
22 - No dia 4 de fevereiro de 2023, na Rua da ..., casa da ofendida CC, por volta das três da manhã, o arguido começou a gritar pelo nome daquela e ainda chamando-a de “puta e velhaca”, o que fazia através da caixa do correio que se encontra colocada na porta de alumínio da entrada desta casa;
23 - Entretanto, o arguido nessa mesma ocasião, deslocou-se para a porta traseira da casa da ofendida e onde desatou aos pontapés à porta;
24 - Em consequência destas condutas do arguido, sofreu a ofendida prejuízos, quer na porta de alumínio da frente da sua casa referida em 3, quer na porta de alumínio de trás da mesma casa, que ficaram amolgadas e riscadas, num valor orçado em 2.247,00 € (dois mil e duzentos e quarenta e sete euros);
25 - Entretanto chamados ao local pela ofendida, os Agentes Policiais que ali acorreram, ao abordarem o arguido, este dirigiu-lhes as seguintes expressões:
«Hoje teu amanhã meu, isto não vai ficar assim, se és homem encara-me, vou-vos apanhar sem essa farda nas costas, cagalhões do caralho, canalha»;
26 - Com estas expressões, quis achincalhar os senhores Agentes da PSP, BB, e DD, e ofendê-los na sua honra e consideração;
27 - No dia 27 de Abril de 2023, pelas 02h15m, AA dirigiu-se à residência de CC, na Rua da ..., e bateu na tampa da caixa do correio tendo proferido a seguinte expressão “estás a brincar comigo cabra do caralho, vou ficar aqui a noite toda”;
28 - Uma vez que CC não respondeu a AA, este acabou por abandonar o local;
29 - Porém, ainda nessa noite, mas pelas 04h15m, AA dirigiu-se novamente à residência de CC e como esta não lhe respondeu, nem abriu a porta, aquele desferiu um número não concretamente apurado de pontapés na porta, bem como proferiu a seguinte expressão “vais pagar porque chamaste a bófia”;
30 - No dia 24 de julho de 2023, a vítima CC saiu de casa da mãe, a hora não concretamente apurada, e dirigiu-se ao “Snack Bar ...”, sito na ..., para conviver com as amigas, onde permaneceu até aproximadamente as 02h00m;
31 - Seguidamente dirigiu-se para sua casa na morada citada em 3, e ao ali chegar, a ofendida meteu a chave na fechadura da porta de alumínio e, ao rodar a chave a porta abriu-se imediatamente;
32 - Nesse preciso instante, sem se deixar ver e sem qualquer aviso, o arguido AA apareceu de repente, agarrou o braço direito da ofendida e empurrou-a para dentro de casa, atirando-a contra as paredes do corredor e fechando a porta logo de imediato, mantendo agarrado à força o braço da ofendida;
33 - Enquanto assim agia, o arguido em tom de voz alterado dirigia à ofendida as expressões «és uma grande puta, velhaca de merda, eu entro aqui as vezes que eu quiser e faço contigo o que eu quiser sua puta, não vales nada, caralha»;
34 - A vítima, ao sentir fortes dores no braço direito que o arguido mantinha agarrado e, de modo a tentar que o arguido a largasse, agarrou numa peça de decoração que tinha em cima de uma arca em madeira no corredor, mais propriamente «um coral do fundo do mar» com o propósito de se defender do arguido AA;
35 - No entanto, como não tinha força no braço esquerdo, o arguido AA retirou-lhe o coral da mão esquerda e ao fazê-lo, agarrou ainda com mais força a mão esquerda da ofendida e torceu-lhe o braço esquerdo, partindo-o;
36 - A vítima CC ouviu o estalo dos ossos a partirem e sentiu imensas dores, gritando muito alto e em grande aflição, sendo que era visível que o seu antebraço ficou pendurado;
37 - O arguido apercebeu-se do estado em que se encontrava a ofendida, com uma evidente fratura, mas olhou para esta a rir e, mantendo o coral na mão, disse para aquela que o coral passava ser e que o ia levar como recordação, o que fez;
38 - O coral tinha para a ofendida um alto valor estimativo, pois, fora apanhado pelo seu ex-marido, que fazia mergulho e, por vezes trazia peças do fundo do mar que depois oferecia à vítima e decorava a casa;
39 - Após ter ficado com o braço partido e já depois de acionar o botão de pânico por três vezes sem qualquer resultado e ao aperceber-se que o arguido ainda se ria da situação aflitiva que criara e não lhe prestava auxílio, CC pegou no seu telefone e ligou para mãe deixando o telefone em modo de alta voz, e, aflita, gritou por “socorro”;
40 - CC telefonou à mãe à frente do arguido e ao mesmo tempo que este gritava os mesmos impropérios «puta, velhaca, caralha, etc., e dizia para a depoente «liga a tua mãe»;
41 - Enquanto CC, falava com a sua mãe, o arguido continuava a gritar com a aquela, repetindo as ofensas verbais;
42 - A vítima disse à mãe, que pedisse auxílio à PSP, o que esta fez;
43 - O arguido ao perceber que a PSP fora chamada, abandonou o local com o coral nas mãos;
44 - Pouco depois, a mãe de CC e os agentes da PSP chegaram lá a casa e, vendo esta com o braço partido, logo chamaram a ambulância que a conduziu ao Hospital 2, onde ficou internada por umas horas tendo levado oxigénio;
45 - Horas depois, perto do meio dia, a ofendida foi mandada para casa a aguardar o parecer do médico Dr. EE no sentido de aferir a necessidade de ser operada;
46 - CC estava cheia de dores com uma fratura exposta no braço. Meteram-lhe uma tala no braço para o imobilizar até à operação e mandaram-na para casa aguardar;
47 - CC veio assim para sua casa na ... e, cerca de uma hora depois de chegar a casa, recebeu um telefonema do Hospital 2 a dizer que deveria comparecer novamente no Hospital ás 19h00 pois iria ser operada ao braço, na manhã do dia seguinte;
48 - No dia seguinte, logo após ter recebido a anestesia, sofreu um bronco espasmo e só não foi letal porque recebeu imediato apoio médico;
49 - Após a alta médica, CC continuou a precisar de fisioterapia para o braço mantendo grande dificuldade em mover o braço que apresenta ainda grande rigidez;
50 - Como consequência direta da atuação do arguido, CC sofreu ao nível do «membro superior esquerdo: traumatismo do cotovelo com fratura de grau 1, da apófise coronoide do rádio e necessidade de cirurgia para fixação.»;
51 - O processo de cura das lesões durou cerca de 45 dias e determinaram para a vítima um período de 30 dias de afetação para a capacidade geral de trabalho e, um período de 30 dias de afetação da capacidade de trabalho profissional;
52 - CC, esteve internada no Hospital 1, desde as 19h00m do dia 25.07.2023 até às 15h00m do dia 27.07.2023 altura em foi submetida a cirurgia ao braço partido;
53 - Com as condutas supra descritas, o arguido agiu de forma livre, com o propósito concretizado de por meio do emprego de força física manter com CC a prática de acto sexual de cópula, contra a vontade e pondo em causa a liberdade sexual daquela, o que representou;
54 - Com as condutas supra descritas, o arguido agiu com o propósito logrado de maltratar a ofendida, atemorizando-a, ciente que lhe maltratava o corpo e a saúde, infligindo-lhe ofensas à integridade física, bem sabendo que lhe ofendia a honra e consideração ao chamar-lhe os nomes injuriosos que lhe dirigia, agindo ainda ciente que os anúncios que lhe dirigiu eram adequados a fazê-la sentir-se receosa pela sua integridade física e mesmo vida;
55 - Da mesma forma, o arguido agiu com o propósito logrado de maltratar a vítima, atemorizando-a, ciente que danificava o porta-luvas e o para-brisas do carro daquela, causando-lhe um prejuízo de 346,50 € (trezentos e quarenta e seis euros e cinquenta cêntimos);
56 - Bem como, o arguido agiu também com o propósito logrado de maltratar a vítima, atemorizando-a, ciente que danificava as duas portas da casa daquela, causando-lhe um prejuízo de 2.247,00 € (dois mil e duzentos e quarenta e sete euros);
57 - O arguido praticou parte dos factos no interior da residência de CC;
58 - O arguido ao dirigir-se aos senhores Agentes da PSP do modo como o fez, sabia que estava perante agentes de autoridade policial, devidamente uniformizados e em pleno exercício das suas funções, querendo e conseguindo atingir irremediavelmente a sua honra pessoal e profissional;
59 - Agiu AA, em tudo, de forma voluntária, livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram, como são, proibidas e punidas por lei penal;
60 - Factos provados quanto ao pedido de indemnização civil do Hospital 1 -
- na sequência das condutas perpetradas pelo requerido/demandado, a ofendida foi assistida nos Serviços de Urgência em 25.07.2023, tendo dado origem às facturas nºs ... no valor de 2.958,16 € emitida em 23.02.2024, e ... no valor de 69,00 €, por internamento e cirurgia de ortopedia com reparação dos ligamentos do cotovelo, imobilização do braço esquerdo, com gesso, medição sinais de vida, radiografias e terapêuticas intravenosas e mais consultas de seguimento realizadas em 17.08.2023 e em 05.09.2023 e efectuadas radiografias;
61 - Factos provados quanto ao pedido de indemnização civil apresentado pelo assistente e ofendido BB -
- na sequência das condutas perpetradas pelo requerido/demandado, o ofendido sentiu-se humilhado e envergonhado, angustiado e desconfortável;
62 - As palavras proferidas pelo arguido, foram-no em tom de voz alto, audível e de forma hostil;
63 - Condições pessoais quanto ao arguido AA - o mesmo é o segundo de três irmãos; contudo após o falecimento do progenitor, há cerca de 14 anos, tal implicou alguns desentendimentos com as irmãs, mantendo presentemente uma ligação mais próxima apenas com a progenitora;
64 - Beneficiou dum enquadramento familiar estável e harmonioso, com suporte dos progenitores;
65 - O arguido possui o 6º ano de escolaridade, tendo abandonado o percurso escolar por desinteresse pelas atividades escolares, com cerca de 13/14 anos. Iniciou, entretanto, trabalho numa fábrica de blocos, tendo-se posteriormente dedicado a atividades de mecânico e bate-chapas, mas também pontualmente na área da carpintaria e eletricidade;
66 - Detém um percurso profissional integrado como bate-chapas, tendo trabalhado em várias empresas do ramo, sem significativos períodos de desemprego ou dificuldades de inserção laboral. Há cerca de 4 anos, integrou, como mecânico e bate-chapas, uma empresa do ramo automóvel, situação profissional entretanto interrompida por questões de saúde;
67 - AA manteve durante cerca de 21 anos uma relação conjugal, contexto em que tem 3 filhos, com idades compreendidas entre os 23 e os 14 anos de idade, que ficaram entregues aos cuidados da respetiva progenitora aquando do divórcio.
68 - Ainda que mantendo contacto regular com os filhos e com a ex-mulher, a ocorrência do divórcio determinou uma situação de maior isolamento pessoal e social, com relações de convívio algo superficiais, e, em alguns períodos, assumindo consumos de estupefacientes e bebidas alcoólicas, mas desvalorizando o impacto destes comportamentos na gestão do seu quotidiano;
69 - À data dos factos, o arguido residia sozinho em quarto arrendado e mantinha um relacionamento afetivo com a presumível vítima, sem vivência em comum, desde sensivelmente 2021, mas marcado pela instabilidade e por frequentes ruturas e reconciliações e referindo o próprio alguma reserva em assumir socialmente a relação, pelo que situa a ruptura definitiva desta relação no decurso do ano transacto;
70 - O arguido encontrava-se de baixa médica, na sequência duma queda, contexto em que foi já operado ao membro superior direito, aguardando ainda nova intervenção cirúrgica;
71 - Recebia mensalmente cerca de 600€ de subsídio de doença, devido à incapacidade laboral;
72 - Referencia como despesas mensais à data a renda pelo pagamento do quarto, no valor de 300€ e a aquisição duma garrafa de gás;
73 - AA refere naquele período alguma instabilidade pessoal, pontualmente associada a consumos de estupefacientes e de bebidas alcoólicas, contudo sem registo de dependências aditivas, o que é corroborado ao nível social e familiar;
74 - O arguido, natural da ..., onde sempre residiu, apresenta um percurso no essencial integrado, mormente em termos profissionais, pese embora assuma pontuais períodos de desorganização pessoal, com impacto noutras dimensões da sua vida e consequentes dificuldades económicas;
75 - Quanto aos antecedentes criminais relativos a este arguido - Decorre do certificado de registo criminal do arguido conforme fls. 611 e ss., que já respondeu uma vez no P. nº 251/23.0..., por um crime de desobediência, praticado em 01.03.2023, tendo sido condenado numa pena de multa de 100 dias à taxa diária de 5 €, por sentença transitada em julgado em 08.04.2024.
FACTOS NÃO PROVADOS:
Com interesse para decisão da causa, resultaram não provados os seguintes factos:
1 - Que na sequência dos factos provados em 35 a 38, não se prova que o arguido levou o coral consigo com o objectivo de o integrar no seu património contra a vontade e consentimento expresso ou tácito da vítima, causando assim à ofendida um prejuízo patrimonial equivalente ao benefício que extraiu;
2 - Agiu ainda o arguido ciente de que o referido coral não lhe pertencia e que ao se apoderar de modo tão violento do mesmo, o fazia contra a vontade da ofendida, sabendo ainda que integrava um valor no seu património que não era seu, beneficiando este à custa do património da ofendida;
3 - Com as condutas supra descritas, o arguido, desde o término da relação amorosa até ao dia 27.04.2023, agiu com o intuito, concretizado, de seguir e importunar CC, controlando as suas rotinas quotidianas, bem sabendo que com o seu comportamento causava medo e inquietação prejudicando o sentimento de segurança da vítima.
4 - Na sequência do provado em 55 e 56 supra, não se prova mais nada do que ali se diz, designadamente que, ao danificar o porta-luvas e para-brisas do carro pertença da ofendida o fazia contra a vontade desta e destruindo o seu património, bem como, o mesmo se passa quanto aos danos (as amolgadelas e os riscos) que o arguido praticou nas duas portas de alumínio da casa da ofendida (porta da frente e porta de trás), o que tudo fez de modo consciente, deliberado e livre;
5 - Bem sabendo que as suas condutas agora não provadas eram, como são, proibidas e punidas por lei penal.
Todos os restantes factos constantes da acusação ou são juízos conclusivos, ou conceitos abstractos, ou conceitos de direito, ou menção de prova ou factos irrelevantes para os tipos criminais em apreço, pelo que não deveriam constar da acusação e por isso não foram levados em consideração.
Nesta sequência, no artigo 17º da acusação apensa nº 223/23.4... - A formulação de circunstâncias vagas, sem a devida concretização no tempo e no espaço levam-nos a considerá-lo como um “não facto”, atendendo à circunstância de não ser possível à defesa exercer o contraditório.
O mesmo se passa com o artigo 21º dessa mesma acusação apensa - A formulação de circunstâncias vagas, sem a devida concretização no tempo e no espaço levam-nos a considerá-lo como um “não facto”, atendendo à circunstância de não ser possível à defesa exercer o contraditório.
O que se faz de acordo com vários acórdãos designadamente, acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10/02/2016, no processo nº 1244/12.8PWPRT.P1, in www.dgsi.pt ; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15/11/2007 no processo nº 07P3236; outro acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15/06/2016, no processo nº 1170/14.6TAVFR.P1, in www.dgsi.pt, todos neste mesmo sentido, o que acolhemos totalmente.
Motivação -
Fazendo a análise crítica de todas as provas produzidas perante o tribunal, a nossa convicção assentou por um lado, na apreciação de toda a prova documental junta aos autos nomeadamente, na participação de violência doméstica de fls. 3 e ss., do processo nº 391/23.5..., no relatório pericial de dano corporal fls. 258 e ss.; na incorporação do inquérito a fls. 218 e ss.; na incorporação do inquérito nº 86/23.0... de fls. 322 e ss.; no auto de busca e apreensão do coral de fls. 443 e ss., e reportagem fotográfica de fls. 445 e ss.; orçamento de portas de fls. 510 e ss.; orçamento do vidro da frente do carro e do porta luvas de fls. 510 e ss.; facturas o Hospital 1 nºs FT FAS.2024/96 e F FH241/1441, de fls. 567 e ss., certificado do registo criminal do arguido de fls. 611 e ss., e relatório social para determinação de sanção elaborado pela DGRSP de fls. 613 e ss., datado de 30 de Abril de 2024.
No processo apenso nº 223/23.4... (agora 391/23.5... - A), participação de violência doméstica de fls. 3 e ss., reportagem fotográfica de fls. 29 e ss., relatório de avaliação psicológica elaborado à ofendida de fls. 194 e ss., relatório de avaliação psicológica elaborado ao arguido de fls. 202 e ss..
Assentou ainda a convicção do Tribunal na audição do arguido e demais testemunhas ouvidas em sede de julgamento.
O arguido no seu direito de não prestar quaisquer declarações, não quis falar em todo o julgamento.
No entanto e no segundo julgamento, já quis falar e disse que ele não praticou atos de violência doméstica com a Dª. CC, é mentira.
Quanto aos danos nas portas de casa não foi ele que praticou mas sim os senhores Agentes da PSP que acorreram ao local, o que nunca quis dizer para não levantar mais problemas e até foi ele que consertou o carro da ofendida porque ele é mecânico.
Também disse que já está há um ano e seis meses com pulseira electrónica e deste tempo todo, a Dª. CC tem estado com ele cerca de um ano e dois meses.
Perante estas declarações, o tribunal considera que as mesmas não são verdadeiras, porque de modo algum trouxe a prova concreta e objectiva que as coisas são como diz: tem direito a apresentar prova e arrolar testemunhas o que nunca fez até agora.
Também não nos parece nada verosímil estas declarações, apenas prestadas em segundo julgamento e depois de todas as provas produzidas, o que se verifica bem da sua credibilidade, isto é, que não têm.
Todas estas declarações por fim, encontram-se em confronto com os demais meios de prova produzidos em audiência.
Para prova dos factos nºs 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11 e 12 - O tribunal assentou a sua convicção para assim os declarar desde logo, nas declarações prestadas pela ofendida CC, a qual apenas falou a verdade do que viveu e passou por si própria, sendo que durante aquelas declarações foi claramente visível o sofrimento que todas estas situações ainda lhe causavam.
Então em suma disse que, namoraram um com o outro cerca de um ano e houve momentos em que a relação deles era boa; mas depois ele bebia muito e consumia droga e aí as coisas pioravam; no inicio da relação cerca de um mês depois deles começarem a namorar disse que queria ter sexo, vinha com bebida a mais e disse-lhe “eu quero foder; tu estas aqui para foder” então empurrou-a para o quarto, atirou-a para cima da cama rasgou-lhe a roupa, baixou as calças e as cuecas e fez sexo com ela e quando acabou foi embora; no dia seguinte pediu-lhe desculpas e que a culpa por aquilo ter sucedido era dela porque devia ter acedido; quando ele chegou já estava agressivo e transtornado e fora de si e chamava-a de “puta, caralha, velhaca” e quando estava a fazer sexo, prendi-a pelos braços à cama para ela não sair.
Passados 15 dias voltou a fazer o mesmo só não rasgou a roupa. Mas havia momentos de sexo consentido porque ela gostava dele.
Ele não a deixava ir à casa da mãe e eles começavam a discutir e um mês depois do sexo, ele pôs as duas mãos no pescoço dela e apertou.
Outra situação aconteceu no último dia das Festas das Lages, era logo pela manhã e ela foi tomar café e quando estava a estacionar mesmo em frente à sua casa, ele abre a porta, dá uma cabeçada no vidro do lado esquerdo e partiu-o, e meteu a mão para o porta luvas com força e parte também e dizia “eu quero o meu telemóvel”, nisto ela tinha o seu telemóvel na mão e ele puxa-lhe o telemóvel da mão e faz pressão e com isso arranca-lhe a unha do dedo do meio da mão direita e ela telefonou para a policia a contra o que se passou e eles tiraram fotografias.
Então comprou um cartão novo e ele descobriu e voltou a pedir desculpas e quando estava bem uns tempos e bebia e voltava a descontrolar-se.
Ele estava sempre a segui-la, à porta da sua casa, dava a volta à sua porta e pedia para falar com ela, e quando ela foi à Pastelaria ele sentava-se ao pé dela e pedia para falar com ela e ela sentia-se desconfortável porque era num local público.
Então normalmente ele fazia barulho por volta das 2/3 horas da manhã, batia com a tampa da caixa do correio, dava murros na porta da frente e na porta de trás e dava pontapés e dizia pela caixa do correio “abre a porta, velhaca, puta, quero foder, eu não saio daqui enquanto não abrires a porta e no dia 4 de Fevereiro, pelas 2/3 horas bateu novamente na caixa do correio da porta da frente e depois como ela não abriu saltou pelos quintais dos vizinhos e deu pontapés na porta traseira e ela chamou a policia.
No dia 27 de Abril de 2023, já não estavam juntos e ele voltou a bater na porta e começou aos gritos a dizer “abre a porta, velhaca, puta, tens alguém ai dentro”.
Depois disto estava uns dias calmo e depois voltava tudo de novo.
Então em julho de 2023 e foi a casa da mãe jantar e por volta das 11 horas da noite foi para o Snack Bar ..., ter com as amigas e ficou lá até aquilo fechar perto das 2 horas e qualquer coisa.
Quando põe a chave na porta, ele aparece do nada e põe-se atrás de si e dá-lhe um encontrão para ela entrar em casa e fecha a porta e puxa-lhe o braço direito e a dizer “eu quero foder, eu quero foder”; ela para se defender pega num coral que era uma oferta do marido com a mãe esquerda mas ela não tinha muita força nesse braço e ele agarra-a com força nessa mão e torce e sentiu os ossos a estalarem, a partir e largou logo o coral, o braço ficou pendurado e ele ria-se a dizer “eu levo comigo o coral, e tu ligas à tua mãe”; ela já tinha tocado 3 no botão de pânico mas ninguém veio e telefonou à mãe e pôs no mãos livres e gritou “socorro” enquanto ele dizia “velhaca, puta, não prestas para nada e tu estas a ligar à tua mãe e ela pede-lhe para ligar à policia e depois esta apareceu lá em casa junto com a mãe e viram que o braço estava partido, e a ambulância levou-a logo para o Hospital; no dia seguinte foi operada e teve com a anestesia um bronco-espasmos e foi operada e permaneceu no Hospital dois dias internada; ainda está à espessa da fisioterapia: na data a sobrinha ajudava-a na sua recuperação, não conseguia alimentar-se sozinha nem fazer a sua higiene e precisou da ajuda da mãe e da família; ela mexe com o braço mas há movimentos que não consegue fazer.
Para prova dos factos nºs 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23 e 24 - O tribunal assentou a sua convicção para assim os declarar desde logo, nas declarações prestadas pela ofendida CC e acima acabadas de citar em suma, o que aqui se consideram devidamente reproduzidas para os devidos efeitos legais.
Assentou também na análise da prova documental acima referida designadamente, a perícia de dano corporal de fls. 258 e ss., bem como orçamento de portas de fls. 511 e ss.; orçamento do vidro da frente do carro e do porta luvas de fls. 514 e ss..
Assentou também na audição das testemunhas ouvidas em sede de julgamento designadamente FF e mulher GG, os quais são vizinhos da ofendida e vivem na casa ao lado da dela.
E disseram que não ouvem discussões, que se metem na sua vida e não sabem de mais nada; apenas o marido diz que acordou de madrugada numa ocasião e viu a ambulância e a PSP e viu avizinha ir lá e 3 a 4 dias depois, viu a vizinha a entrar em casa e ela conta-lhe que foi ele que lhe partiu o braço; que o Senhor AA para ele sempre foi uma pessoa impecável e nada tem a dizer dele.
Também HH é o vizinho que mora mesmo por cima da Dª. CC e disse que aquilo é uma casa só e não ouviu vozes alteradas; só ouviu algumas discussões mas de madrugada sempre perto das 23 e as 24 horas, em concreto não sabe que expressões são; numa ocasião acorda com o barulho de pontapés na porta e nisto vem a policia i viu que ele fugiu para a rua de baixo e disse isto à policia.
Para prova dos factos nºs 25 e 26 - O tribunal assentou a sua convicção para assim os declarar desde logo, nas declarações prestadas pelos ofendidos DD e BB (assistente) e pela testemunha Agente da PSP II, os quais apenas relataram os que se passou consigo, tendo as respectivas declarações sido consideradas credíveis, todos são Polícias de Segurança Pública.
Então DD, disse em suma que se dirigiu à morada Rua da ..., a casa da ofendida porque tinham na Esquadra recebido uma chamada que o Sr. AA estava a perturbar a ofendida em 4 de Fevereiro de 2023, e ao chegar à esquadra o Sr. AA estava descontrolado e começou a chamar nomes injuriosos enquanto estava na cela detido para protecção da vítima confirmando que ele disse “hoje teu amanhã meu, isto não vai ficar assim, se és homem encara-me vou-vos apanhar sem essa farda nas costas, cagalhões do caralho, canalha”.
Sentiu-se ofendido.
Depois foi ouvido II, que disse em 4 de Fevereiro de 2023 estava com o colega BB, e vieram ter à morada da Rua da ... e quando lá entraram viram a vítima nervosa e disse que ele não estava normal e que estava no quintal da casa e queria entrar ali; ela não deixava.
Então foram ter com ele e disseram-lhe que ele não podia entrar porque a senhora não o queria lá; ele insistia que queria entrar e estava embriagado e tiraram-no dali e pegaram nele e foram mesmo a pé para a Esquadra da PSP; ele estava exaltado e detiveram-no e começou a proferir expressões para o colega BB, palavras injuriosas.
Então o ofendido e assistente BB, falou do que se passou consigo e em suma disse que esta situação ocorreu no princípio de 2023 e receberam uma chamada de violência doméstica na morada da Rua da ... e ele estava na rua em trabalho e foi com o seu colega para lá.
Quando lá chegaram a vítima disse que ele estava no quintal e queria entrar em casa mas ela não o queria deixar entrar e estava com medo e a chorar e não era a primeira vez que acorria àquela morada.
Como foram ter com ele, mas ele insistia que não saía dali e que queria entrar, eles disseram-lhe que não que teria que sair dali e ele disse que não e então foi lai mesmo dada voz de detenção e levaram-no para a Esquadra.
Ele não se calava e começou a dizer em tom de voz alterado “hoje teu amanhã meu, isto não vai ficar assim, se és homem encara-me vou-vos apanhar sem essa farda nas costas, cagalhões do caralho, canalha”, enquanto ele fazia o expediente e sentiu-se ofendido e não gostou do que estava a ouvir.
Sentiu-se injuriado e que lhe estava a faltar ao respeito e as palavras eram dirigidas a si mesmo e sentiu-se ofendido e não gostou.
Para prova dos factos nºs 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51 e 52 - O tribunal assentou a sua convicção para assim os declarar desde logo (e de novo), nas declarações prestadas pela ofendida CC e acima acabadas de citar em suma, o que aqui se consideram devidamente reproduzidas para os devidos efeitos legais.
Assentou também na análise da prova documental acima referida designadamente, nas facturas apresentadas pelo Hospital 1 nºs ... e ..., de fls. 567 e ss..
Assentou também na audição de JJ e KK, que são os pais da ofendida, os quais falaram do que sabiam por si sós e então em suma disseram que a eles o Sr. AA nunca os tratou mal e era bem educado.
E quanto à mãe apenas ouviu a situação quando ele partiu o braço à filha porque ela ligou-lhe e deixou o telefone em alta voz e ouvia ele a chamar à filha “estás a ligar para a tua mãe puta de merda”; quando lá foi chamou a policia e a ambulância e viu que afilha tinha o braço partido; quando ela saiu do Hospital não conseguia fazer as suas refeições e precisou de ajuda dela e da sobrinha; tinha muitas dores e ainda não recuperou totalmente do braço; e vinha com gesso.
Quanto ao pai não viu nada disto; apenas viu a porta amolgada e ela chamou por eles e eles foram para lá porque ela tinha medo dele.
Para prova dos factos nºs 53, 54, 55, 56, 57, 58 e 59 - O tribunal assentou a sua convicção para assim os declarar desde logo, da conjugação de todas as provas produzidas sobre os comportamentos do arguido, os atos concretos e objectivos anteriores sendo estes pontos de factos relativos ao elemento subjectivo dos crimes imputados ao arguido desde logo no primeiro caso o elemento subjectivo do crime de violação cometido na pessoa da ofendida CC; o segundo, relativo com o crime de violência doméstica também praticado na pessoa da mesma ofendida, tendo partido o porta-luvas e para-brisas do carro da ofendida como forma de praticar ainda o crime de violência doméstica que vinha praticando com aquela mas desta feita destruindo bens físicos e materiais, o que inclui os danos nas duas portas de alumínio da casa da ofendida, a porta da frente e a porta de trás, não existindo nenhum crime autónomo de dano, mas sim e ainda violência doméstica e, o terceiro, os crimes de injúrias praticado nas pessoas dos senhores Agentes da PSP DD e BB.
Quanto a todos os demais não se verificam ou porque não provados, ou porque fazem parte da violência doméstica.
Para prova do facto nº 60 - O tribunal assentou a sua convicção para assim o declarar desde logo, da conjugação das declarações prestadas pela ofendida CC e pela análise das facturas emitidas pelo Hospital 1, de fls. 567 e ss., acima mencionadas.
Para prova dos factos nºs 61 e 62 - O tribunal assentou a sua convicção para assim os declarar desde logo, da conjugação das declarações prestadas pelo ofendido BB, acima mencionadas.
Para prova dos factos nºs 63, 64, 65, 66, 67, 68, 69, 70, 71, 72, 73 e 74 - O tribunal assentou a sua convicção para assim os declarar, pela análise do relatório social para determinação de sanção elaborado pela DGRSP quanto ao arguido e que consta de fls. 613 e ss., acima mencionado.
Para prova do facto nº 75 - O tribunal assentou a sua convicção para assim o declarar desde logo, pela análise do certificado de registo criminal do arguido e que consta a fls. 611 e ss., acima mencionado.
Quanto aos factos não provados nº 1 e 2 - O tribunal assentou a sua convicção para assim os declarar como não provados desde logo porque, não foi produzida qualquer prova em tal sentido sendo que, é verdade que o arguido levou o coral consigo e para sua casa mas não porque tenha tido a intenção de o roubar / ou de furtar sequer.
Fê-lo na sequência de actos de agressão mas praticados no âmbito da violência doméstica, na sequência dos quais aliás, acabou por levar o coral consigo, tal como consta dos factos dados como provados supra.
Logo, o elemento subjectivo da prática autónoma de um crime de roubo ou mesmo de um crime de furto, não se prova.
Daí o teor da presente resposta.
De forma semelhante se conclui que para o facto não provado nº 3 - Sendo que aqui, a convicção do tribunal para responder deste modo, assenta precisamente nas declarações da ofendida CC (facto provado nº 15), que realmente ele seguia-a para alguns lugares e designadamente, na pastelaria, mas perturbava-a ou incomodava-a para falar com ela e não para a ameaçar, ou fazer algo ilícito ou típico.
Também aqui não se prova o elemento subjectivo e objectivo do qualquer crime de perseguição.
Daí o teor da resposta dada.
Factos não provados nºs 4 e 5 - O tribunal assenta a sua convicção para assim responder como não provado, precisamente por considerar que não existe um crime autónomo de dano simples, p. e p., no artigo 212º do CP, mas sim os danos que ocorreram, quer no porta-luvas, no para-brisas do carro, quer nas duas portas da casa da ofendida, a porta da frente e a porta de trás, incluem-se nos actos violentos e agressivos e de domínio da ofendida que o arguido pretendia manter ao longo da relação em causa, fruto da sua superioridade física e psíquica quanto à pessoa da ofendida.
Não evidencia qualquer vontade em si mesma, de destruir bens físicos e materiais de terceiros e com isso de os prejudicar.
Não.
Parte e estraga aquelas coisas físicas pertencentes à vítima, como forma de lhe meter medo e de a controlar e isto é violência doméstica.
Este é o sentido das nossas respostas.”
+
O recurso é delimitado pelas conclusões extraídas da motivação que constituem as questões suscitadas pelo recorrente e que o tribunal de recurso tem de apreciar (artºs 412º, nº1, e 424º, nº2 CPP Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98 e Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335), sem prejuízo de ponderar os vícios da decisão e nulidades de conhecimento oficioso ainda que não invocados pelos sujeitos processuais – artºs, 410º, 412º1 e 403º1 CPP e Jurisprudência dos Acs STJ 1/94 de 2/12 e 7/95 de 19/10/ 95 este do seguinte teor:“ é oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410º, nº2 do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito”) e do conhecimento dos mesmos vícios em face do artº 432º1 a) e c) CPP (redação da Lei 94/2021 de 21/12), pelo que em face das conclusões as questões a apreciar traduzem-se em averiguar:
- Se as penas parcelares e única são excessivas e devem ser reduzidas
e esta substituída por pena suspensa
A que acresce a questão prévia suscitada pelo ilustre PGA no seu parecer
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Conhecendo:
Como ponto prévio dado que a decisão de envio do recurso para este Supremo Tribunal por parte do Tribunal da Relação não vincula este Tribunal1 há que averiguar da competência deste Tribunal.
Estabelecendo o artº 432º 1 c) CPP que se recorre para o Supremo Tribunal de Justiça “ c) De acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal coletivo que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito ou com os fundamentos previstos nos n.os 2 e 3 do artigo 410.º;” e tendo o arguido recorrente sido condenado na pena única de 6 anos e 9 meses, pelo tribunal colectivo e pretende ver revista a medida das penas parcelares e da pena única e sua suspensão, ou seja matéria de direito, não ocorre duvidar que este Supremo Tribunal é o competente, tratando-se de um recurso “per saltum” ou seja, directamente para este Tribunal, sendo que nos termos do AFJ nº 5/17 que decidiu: “A competência para conhecer do recurso interposto de acórdão do tribunal do júri ou do tribunal coletivo que, em situação de concurso de crimes, tenha aplicado uma pena conjunta superior a cinco anos de prisão, visando apenas o reexame da matéria de direito, pertence ao Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 432.º, n.º 1, alínea c), e n.º 2, do CPP, competindo-lhe também, no âmbito do mesmo recurso, apreciar as questões relativas às penas parcelares englobadas naquela pena, superiores, iguais ou inferiores àquela medida, se impugnadas.”2 compete a este Supremo tribunal conhecer de todas as questões suscitadas relativas à medida das penas parcelares e única.
Conhecendo.
O arguido questiona apenas as penas de prisão, quais sejam a pena de cinco anos de prisão relativa ao crime de violação e a de quatro anos e seis meses de prisão relativa ao crime de violência domestica e a pena única de 6 anos e 9 meses, restringindo a estas questões o seu recurso, dele excluindo as penas de multa e a pena única de multa relativa aos crimes de injurias.
Na verdade em face da motivação onde questiona as penas de prisão parcelares e a pena única, e das conclusões que menciona a pena de prisão sem as individualizar, poder-se-ia entender que em face da nova decisão subsequente à anulação do acórdão anterior onde se conheceu de novos factos quanto ao crime de violência doméstica, e se pronunciou sobre a determinação da medida das penas de prisão (não excluindo o conhecimento quanto a nenhuma delas) que o recurso poderia abranger a totalidade das penas parcelares e única de prisão (excluindo as penas parcelares e única de multa).
Todavia assim não pode ser entendido.
Na verdade, o arguido não recorreu da decisão constante do acórdão do tribunal a quo, que o condenou pelo crime de violação, p. e p., no artigo 164º/2-a), do CP, em cinco (5) anos de prisão, e pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p., no artigo 152º/1-b) e 2-a), do CP, em quatro (4) anos de prisão, e em cúmulo jurídico vai o arguido condenado na pena única de seis (6) anos e seis (6) meses de prisão, efectiva.
Apenas o fez o Mº Pº que o delimitou no que respeita ao crime de violência doméstica visando o conhecimento de factos que dele haviam sido subtraídos visando o seu agravamento, no que obteve provimento.
Assim sendo, a pena relativa ao crime de violação mostra-se transitada e por isso insuscetível de alteração e de admissibilidade de recurso, donde o conhecimento das questões recursivas se restringem à pena parcelar do crime de violência doméstica e à pena única.
Assim.
Questionando as penas de prisão, sustenta o arguido que a decisão recorrida não faz “qualquer menção à valorização da concreta situação pessoal e social do Recorrente” descrita nos factos provados e que em face da “sua situação pessoal, familiar e social” e “tendo em conta os factos provados nomeadamente no que respeita à sua natureza, grau de culpabilidade, mas também quanto à situação pessoal e social do Recorrente” a pena não devia ter sido tão elevada, pugnando por isso uma diminuição da pena parcelar relativa ao crime de violência doméstica para 3 anos e 6 meses e para a pena única para 5 anos substituída por pena suspensa, pois em seu entender a “ medida da pena aplicada é excessiva, ultrapassando, claramente aquelas que são as necessidades de prevenção especial, no caso concreto, dadas as características pessoais do arguido e a ausência de antecedentes criminais de natureza análoga”
Para encontrar a medida das penas parcelares o tribunal recorrido, após ponderação e relevância das exigências de prevenção, da culpa e das finalidades de ressocialização do arguido, expressou-se do seguinte modo no que às circunstâncias das alíneas do artº 71º CP que expressamente menciona e a considerar respeita:
“No caso dos autos, atenta a gravidade dos factos, o número de crimes praticados desde logo a violência doméstica que durou praticamente mais de um ano que durou a relação amorosa mantida entre arguida e ofendida, com vários actos de agressão cometidos sobre a ofendida sendo um deles muito grave (o ter partido o braço da ofendida), mas também o outro de lhe arrancar a unha, a acrescer o crime de violação sexual praticado apenas um mês após o início da relação amorosa mantida com a ofendida, a posição do arguido em julgamento que primeiro não quis falar e depois quando fala é para dizer que é tudo mentira, pelo que, quanto aos crimes de violência doméstica e violação, vai o arguido condenado unicamente, em pena de prisão, que é a pena mais adequada ao caso concreto.”
Sendo o recurso remédio jurídico, neste caso, em matéria de pena a sindicabilidade da medida concreta da pena abrange a determinação da pena que desrespeite os princípios gerais e as operações de determinação impostas por lei, e a indicação e consideração das circunstâncias do ilícito, mas, não abrangerá a determinação, observados os parâmetros legais, do quantum exacto de pena, salvo se “tiverem sido violadas regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada”3 reconhecendo-se, assim, uma margem de actuação do juiz dificilmente sindicável se não mesmo impossível de sindicar4.
Os factos provados que o arguido questiona como não ponderados pelo tribunal recorrido são os seguintes:
“ - O recorrente detém um percurso profissional integrado como bate-chapas, sem significativos períodos de desemprego ou dificuldades de inserção laboral;
- Viveu no passado uma relação conjugal de 21 anos, mantendo ainda hoje contacto regular com a ex-mulher e com os 3 filhos;
- Na data da prática dos factos, o Recorrente vivia um período de instabilidade pessoal, pontualmente associada e consumos de estupefacientes e de bebidas alcoólicas, contudo sem registo de dependências aditivas;
- Apresenta um percurso integrado profissional e socialmente, pese embora, com alguns períodos de desorganização pessoal.
– Não tem antecedentes pela prática de crimes de idêntica natureza aos dos presentes autos
- Tendo unicamente averbada no seu Registo Criminal uma condenação pela prática do crime de desobediência”
Tais factos relativos à situação profissional do arguido, percurso de vida, antecedentes criminais e modo de vida do arguido constam como provados, e na determinação não há qualquer referencia aos mesmos de modo expresso ou implícito, em inobservância do artº 71º nº 3 CPP5 não podendo nas circunstancias descritas considerar-se que foram ponderados.
Ora tais factos e outros provados, como seja o seu nível educacional e cultural, e o nível do seu relacionamento social incluindo com a ofendida / vitima, traduzido aqueles nos nºs 68 e 69 dos factos e provados e este “marcado pela instabilidade e por frequentes ruturas e reconciliações”, deviam ter sido expressamente ponderados, a que acresce que foi ponderado negativamente “a posição do arguido em julgamento que primeiro não quis falar e depois quando fala é para dizer que é tudo mentira”, quando o arguido tem o direito de prestar declarações ou remeter-se ao silêncio que não o pode desfavorecer ( artº 343º CPP) tal como prestando declarações não impende sobre ele qualquer dever de verdade, o que não o pode prejudicar, sendo apenas de valorar, mas positivamente o facto de falar a verdade ou confessar.
Neste circunstancialismo e ponderando estes novos dados e retirando a carga negativa que é atribuída à sua conduta em audiência e ponderando o relacionamento com a ofendida e o seu nível social e educacional, afigura-se-nos em face das finalidades da punição (artº 40º CP), fixar para o crime de violência doméstica a pena de quatro anos de prisão, face à moldura penal e respetiva danosidade que os factos provados nos transmitem.
Importa, ora ponderar, a medida a pena única, não apenas em face da alteração da pena parcelar, mas também porque o recorrente a considera excessiva.
Neste particular, o acórdão recorrido expressa-se do seguinte modo: “A pena única aplicável no caso de concurso tem como limite máximo a soma material das penas concretamente aplicadas aos crimes cometidos e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos crimes, não podendo ultrapassar os 25 anos, no caso de pena de prisão (…), nos termos do artigo 77º/2, do CP. (…)
Na medida concreta da pena devem ser considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, conforme artigo 77º/1 do CP.
Na consideração da personalidade devem ser avaliados e determinados os termos em que a personalidade se projecta nos factos, isto é, se a personalidade unitária do agente é reconduzível a uma tendência ou eventualmente mesmo “uma carreira” criminosa, ou antes se se reconduzem apenas a uma pluriocasionalidade que não tem raízes na personalidade do agente, só no primeiro caso sendo de agravar especialmente a pena por efeito do concurso, conforme o ensina o professor Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 29.
Assim, no caso deste arguido, atendendo à gravidade dos factos cometidos, à sua posição no julgamento que não demonstra qualquer arrependimento, às necessidades de prevenção geral [sic] serem muito grandes no caso em apreço uma vez que o arguido não demonstra qualquer crítica para os actos cometidos e as razões de prevenção geral também são significativas, pelo alarme social associado, quer ao crime de violência doméstica, quer ao crime de violação sexual, bem como as necessidades significativas em termos de prevenção especial quanto a este arguido que não conhece nenhum tipo de inibição a não ser que seja imposto por autoridade judiciária, então entendemos como justa, equilibrada e satisfazendo as necessidades de reprovação e prevenção que o caso exige, a aplicação ao arguido da pena única de seis (6) anos e nove (9) meses de prisão, efectiva (isto quanto aos crimes de violação e de violência doméstica, atendendo à gravidade dos factos cometidos e à falta de arrependimento do arguido).
No que respeita à pena única as regras, limites e os critérios a observar para encontrar a medida justa, decorrem do artºs 77º nºs 1 e 2 CP6 tendo em conta os fins das penas.
Quanto aos limites, ela deve ser encontrada entre os 5 anos e os 9 anos de prisão, que constitui a moldura do concurso, quanto a estas penas (únicas a apreciar no recurso)
No que respeita aos princípios e critérios da sua determinação, traduzidos na apreciação, em conjunto dos factos e da personalidade do arguido há a considerar que a pena única é fruto “das exigências gerais de culpa e de prevenção”7 a coberto do artº 40º CP, e que se exige uma apreciação dos factos, na sua globalidade, e da personalidade do arguido neles revelada artº 77º1 CP), e como se expressa F. Dias “ tudo deve passar-se… como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global … “8, - o que é interpretado pelo STJ no ac. 18/6/2014 www.dgsi.pt/jstj9 como “A explanação dos fundamentos que, à luz da culpa e prevenção, conduzem o tribunal à formação da pena conjunta, deve ser exaustiva, sem qualquer ruptura, por forma a permitir uma visão global do percurso de vida subjacente ao itinerário criminoso do arguido. Na indicação dos factos relevantes para a determinação da pena conjunta não relevam os factos que concretamente fundamentaram as penas parcelares, mas sim os que resultam de uma visão panóptica sobre aquele “pedaço” de vida do arguido, sinalizando as circunstâncias que consubstanciam os denominadores comuns da sua actividade criminosa o que, ao fim e ao cabo, não é mais do que traçar um quadro de interconexão entre os diversos ilícitos e esboçar a sua compreensão à face da respectiva personalidade.”- e também no ac. STJ de 03/04/2013 www.dgsi.pt10, onde se defende que “…importante na determinação concreta da pena conjunta será, pois, a averiguação sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos e da motivação que lhes subjaz, sem esquecer o número, a natureza e gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando em conjunto com a personalidade do agente referenciada aos factos, tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso, tendo presente o efeito dissuasor e ressocializador que essa pena irá exercer sobre aquele” - e na “avaliação da personalidade – unitária- do agente relevará, sobretudo a questão de saber se o conjunto dos factos é recondutivel a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma carreira) criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade … “11, - sendo que esta (pluriocasionalidade) como se escreve no texto do Ac STJ 12/9/2007 www.dgsi.pt/12 “verifica-se quando a reiteração na prática do crime seja devida a causas meramente fortuitas ou exclusivamente exógenas, que não se radicam na personalidade do agente, em que não se está perante a formação paulatina do hábito enraizada na personalidade, tratando-se antes de repetição, de renovação da actividade criminosa, meramente ocasional, acidental, esporádica, em que as circunstâncias do novo crime não são susceptíveis de revelar maior culpabilidade, em que desaparece a indiciação de especial perigosidade, normalmente resultante da reiteração dum crime.
A pluriocasionalidade fica atestada, certificada, face à mera constatação da «sucessão» de crimes”.
Como em qualquer pena a justa medida, limitada no seu máximo pela culpa,- suporte axiológico de toda a pena - da pena única, há-de ser encontrada, tendo em conta as exigências de prevenção (da reincidência), traduzidas na protecçao dos bens jurídicos e de reintegração social (ressocialização) – artº 40º CP – como finalidades preventivas e positivas de toda a pena – ponderando as penas aplicadas a cada facto, o conjunto desses factos e a personalidade do arguido neles manifestada como um comportamento global 13 a apreciar no momento da decisão.
Assim em termos de prevenção geral há a ponderar a natureza dos crimes, ambos de grande abrangência e relevo social atual (violência sexual, física e moral) com capacidade de produção de nefastos efeitos pessoais e sociais a exigir uma maior atenção preventiva, reafirmando energicamente a validade das normas jurídicas violadas.
Se em termos de integração social e laboral esta se mostra de certo modo efetivada, e que é o que se espera de qualquer cidadão, o certo é sofreu um abalo, pelo seu modo de vida desregrado e de certo modo solitário, estabelecendo com a ofendida um relacionamento (que se revela essencialmente sexual) de natureza conflituosa e não permanente, gerador de factos violentos conexionados com essa vivência e seus efeitos nefastos, fruto de uma compreensão da vida que nos factos se manifesta errada, também fruto do seu nível social e educacional, e por essas razões não podem ser menorizadas as exigências de prevenção especial no que aos factos ilícitos concretos respeita.
Tal modo e condições de vida repercutem-se na personalidade do arguido revelada nos factos, que apesar de tudo constitui uma pluriocasionalidade (fruto do modo de vida que desenvolvia quando da prática destes) e não uma tendência, face aos factos e a não relevância neste âmbito do crime pelo qual já respondeu. Atentos todos estes factores, e tendo em atenção que não pode ser valorado negativamente a ausência de arrependimento14 (que o tribunal recorrido expressou), mas apenas o arrependimento, como imagem potenciadora de uma reinserção poderia ter sido considerado de modo positivo (que não existiu), impõe-se a fixação de uma pena diversa daquele em que vem condenado.
Assim visto o exposto em tendo em conta a moldura do concurso, e apreciando os factos na sua globalidade e a personalidade do arguido neles revelada e as penas parcelares aplicadas, as exigências de prevenção quer geral quer especial, a ilicitude dos factos e a culpa do arguido e sua reinserção social, nível educacional e social afigura-se-nos proporcional, adequada e justa a pena única de seis anos de prisão.
Não há que ponderar a aplicação de qualquer pena substitutiva por ausência desde logo de requisitos formais.
Procede assim, parcialmente o recurso.
+
Pelo exposto, o Supremo Tribunal de Justiça, decide:
Julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo arguido AA e em consequência:
Condena o arguido AA como autor material, na forma consumada e em concurso real pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p., no artº 152 nºs 1-b) e 2-a), do CP, em quatro anos de prisão, e
- em cúmulo jurídico com a pena de cincos anos de prisão pela prática do crime de violação p.p. pelo artº 164º nº2 a) CP condena o arguido na pena única de seis anos de prisão, efectiva.
- Mantém o demais decidido.
Sem custas (artº 513º1 CPP)
Notifique
DN
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Lisboa e Supremo Tribunal de Justiça, 11/6/2025
José A. Vaz Carreto (relator)
Carlos Campos Lobo
Maria Margarida Almeida
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1. Artº 414º3 CPP “3 - A decisão que admita o recurso ou que determine o efeito que lhe cabe ou o regime de subida não vincula o tribunal superior.”
2. De 23/6/20217 in Diário da República n.º 120/2017, Série I de 2017-06-23, páginas 3170 - 3187
3. Neste sentido também os acórdãos do STJ de 15.10.2008 e 11.7.2024, nos proc.s 08P1964 e 491/21.6PDFLSB.L1.S1; e de 17/12/2024 Proc. 158/24.3JACBR.S1, www.dgsi.pt
4. Cfr por todos Ac.s do STJ de 4.3.2004, CJ 2004, 1, pg. 220 e de 20.2.2008, proc. 07P4639; F. Dias Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, 2ª reimpressão, 2009, §255, pg. 197.
5. 3 - Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena.
6. ao estabelecer “1…Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente. 2 - A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.”
7. Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra, 2005, pág. 291,
9. Proc. 585/09.6TDLSB.S1 Conselheiro Santos Cabral
10. Proc. 789/11.1TACBR.C1.S1 Conselheiro Oliveira Mendes
11. Figueiredo Dias, ob. loc. cit.
12. Ac. STJ de 2007-09-12 (Proc. nº 07P2601) Conselheiro Raul Borges
13. Ac. STJ de 16/05/2019, proc. 765/15.5T9LAG.E1.S1 (Conselheiro Nuno Gonçalves), in www.dgsi.pt ;
14. Apenas o arrependimento (e não ausência dele), pode ser tido em conta como imagem potenciadora de uma reinserção a ter em conta, como salienta Figueiredo Dias ao considerar que “De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização.”, pois o quantum exacto da pena deverá ser determinado também em função das exigências de prevenção especial.