ARRESTO
CAUSA DE PEDIR
Sumário

I - A causa de pedir, num procedimento cautelar de arresto, antes de mais é integrada pelo facto jurídico de que emerge o crédito cuja garantia se procura;
II - Invocando o requerente a existência de um acordo negocial entre duas sociedades comerciais, cada uma actuando na prossecução do seu objecto social, deverá indiciariamente demonstrar a harmonização de vontades em que se traduz esse acordo, ainda que nulo por falta de forma, como primeiro pressuposto da tutela que pede;
III - Indicia-se a inexistência de um real acordo negocial, ainda que formalmente inválido, se as obras cujo pagamento é exigido foram realizadas por uma sociedade gerida pela mesma pessoa física que é gerente da sociedade em nome de quem o prédio se encontra inscrito no registo predial, destinando-se essas obras exclusivamente a adequar o imóvel à habitação do agregado familiar dessa pessoa física, e surgindo esta como arrendatária do imóvel por forma a contabilisticamente dotar a sociedade por si gerida de receitas que lhe permitam fazer face ao financiamento bancário contraído com vista à aquisição do mesmo imóvel, aquisição feita com a exclusiva finalidade de afectar o prédio à habitação do referido agregado familiar.

Texto Integral

Processo: 1629/24.7T8AVR.P1

Acordam os Juízes que integram a 3ª secção do Tribunal da Relação do Porto

Relatório:
“A..., Ldª”, com sede na Zona Industrial ..., rua ..., lote ..., ..., Aveiro, instaurou, perante o juízo central cível de Aveiro (J1), o presente procedimento cautelar nominado de arresto contra “B..., Ldª”, com sede social na rua ..., ..., ..., ... e ..., Aveiro, e AA e esposa, BB, residentes na rua ..., ..., ..., ..., Aveiro.
Alegou a requerente, em súmula, no requerimento inicial, que, no exercício da sua actividade comercial de construção civil, prestou e forneceu à requerida “B..., Ldª”, os bens e serviços discriminados na factura que junta, no valor global de € 305.945,53, relativos à reabilitação de uma moradia sita em ..., cujo pagamento a requerida “B..., Ldª”, recusou sem qualquer justificação razoável.
Afirma que, após a interpelação para pagamento, os representantes da requerida “B..., Ldª”, principiaram a levar a cabo actos de dissipação do património daquela, designadamente procederam a alienação por preço muito inferior ao de mercado da quota que a mesma requerida detinha na sociedade “C..., Unipessoal, Ldª”, e estão a diligenciar pela alineação a terceiros dos imóveis pertença da requerida “B..., Ldª”.
Invoca, ainda, que a requerida “B..., Ldª”, cessou os pagamentos aos seus credores, que já a demandaram judicialmente.
Entende que estes actos de dissipação de património, conjugados com a recusa por parte da requerida “B..., Ldª”, em proceder ao pagamento devido à requerente, razoavelmente fazem a requerente temer pela impossibilidade da satisfação do seu crédito.
Invoca a seu favor a norma consagrada no artigo 391º do Código de Processo Civil.
Requer a dispensa da audiência dos requeridos, ao abrigo do disposto no artigo 393º do Código de Processo Civil.
Conclui pedindo o arresto dos bens que identifica, sem audiência prévia dos requeridos.
Foi determinada a produção da prova indicada pela requerente, sem audiência dos requeridos.
Produzida a prova, foi proferida decisão que, na procedência da providência requerida, determinou o arresto de determinados bens, para garantia do valor de € 321 649,34 [decisão de 18 de Junho de 2024, referência nº 133631761].
Levado a cabo o arresto, pelos requeridos foi apresentada oposição, na qual, em súmula, invocam uma situação de proximidade pessoal entre os requeridos e o então gerente da requerida, para concluírem que os trabalhos pela requerente levados a cabo na moradia indicada na petição inicial foram executados gratuitamente ou mediante o pagamento de preços reduzidos.
Invocam que, tendo os trabalhos de remodelação terminado em Novembro de 2021, o então gerente da requerente e a filha dos requeridos AA e BB, à data casados, aí habitaram até Setembro de 2023, no âmbito de contrato de arrendamento celebrado com a requerida “B..., Ldª”.
Invocam que em Setembro de 2023 a filha dos requeridos AA e BB cessou a coabitação com o então gerente da requerente, e instaurou acção com vista ao seu divórcio.
Afirmam ser neste contexto, como retaliação pelo abandono do lar conjugal por parte da filha dos requeridos AA e BB, que é instaurada a presente providência cautelar.
Defendem que os serviços e trabalhos indicados na factura apresentada nos autos não foram prestados.
Invocam a nulidade por falta de forma do eventual contrato de empreitada alegado no requerimento inicial, nos termos do artigo 26º do Decreto-Lei nº 41/2015, de 03 de Junho.
Afirmam a excepção de litispendência face à acção que corre termos sob o nº 42/24.0T8AVR pelo juízo central cível de Aveiro, nos termos da alínea i) do artigo 577º do Código de Processo Civil, ou, pelo menos, a existência de causa prejudicial, nos termos do artigo 272º do Código de Processo Civil.
Defendem que todas as dívidas invocadas no requerimento inicial se integram no mesmo plano de pressão engendrado pelo anterior gerente da requerente.
Negam existir receio de perda e garantia patrimonial do crédito invocado.
Defendem não se preencherem os requisitos de deferimento da providência de arresto consagrados no artigo 391º do Código de Processo Civil.
Concluem pedindo a revogação da decisão que decretou o arresto, ou, se assim se não entender, a redução da providência à apreensão do imóvel sito em ..., freguesia ..., ... e ..., ..., descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ..., e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ....
Para tal notificada, a requerente da providência apresentou articulado de resposta às excepções arguidas na oposição, no qual, em súmula, começa por defender não ocorrer a excepção de litispendência por inexistir identidade de partes, pedido e causa de pedir entre a presente providência cautelar e a acção declarativa nº 42/24.0T8AVR, e entende que esta também não constitui causa prejudicial face à presente providência.
Re-afirma que os trabalhos invocados no requerimento inicial foram prestados, pelo preço aí indicado.
Entende que, a considerar-se nula a empreitada por falta de forma, o crédito da requerente da providência sempre se fundará na obrigação de restituição que decorre da invalidade.
Conclui pedindo a manutenção do arresto.
Foi pedida informação quanto ao estado do processo de insolvência nº 2645/24.4T8AVR do juízo de comércio de Aveiro, sendo o processo informado que aí ainda não havia sido proferida decisão.
No início da audiência final [acta de 11 de Dezembro de 2024, referência nº 136222008] foi proferida decisão que julgou improcedente a excepção dilatória de litispendência, foi indeferido o pedido de suspensão da instância, e, com fundamento no nº 3 do artigo 26º da Lei nº 41/2015, de 03 de Junho, foi declarada a nulidade do contrato de empreitada invocado na petição inicial.
Produzida a prova indicada pelos requeridos, foi proferida sentença que, na procedência parcial da oposição, determinou o levantamento do arresto que incide sobre determinados bens, no demais mantendo a providência.
É desta decisão que, inconformados, os requeridos vêm interpor recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
1- É falso que os serviços constantes da fatura emitida pela Recorrida ascendam ao montante de € 305.945,53 (trezentos e cinco mil, novecentos e quarenta e cinco euros e cinquenta e três cêntimos);
2- O testemunho de CC demonstrou que a quase totalidade dos serviços vertidos na fatura em causa não foram realizados pela Recorrida, ou não o foram na extensão e qualidade invocada.
3- Todos os serviços constantes da referida fatura estão orçamentados muito acima do valor de mercado.
4- A testemunha prestou um depoimento absolutamente coerente, comprovando que os trabalhos descritos no auto de medição que acompanha a fatura em causa são efabulados.
5- Tal depoimento não mereceu credibilidade apenas por se encontrar em contradição com os depoimentos prestados pelas testemunhas apresentadas pela Recorrida e pelo facto de que a testemunha tem interesse na decisão que vai proferida, ignorando-se contudo que as testemunhas arroladas pela Recorrente são trabalhadores, assalariados ou parceiros de negócio.
6- O tribunal a quo ataca a credibilidade do depoimento desta testemunha com base numa petição de princípio, referente ao custo das obras, quando é o próprio gerente da Recorrida, DD, quem afirmou perentoriamente que tais obras não seriam para ser pagas, por tolerância do mesmo, que assim o determinou.
7- Esta passagem é extraída de uma peça processual que o próprio DD apresentou em juízo – 42/24.0T8AVR – documento n.º 15 junto à Oposição;
8- Considera-se um manifesto abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, o legal representante da Recorrida vir dizer que as obras eram para ser pagas, quando confessou judicialmente exatamente o seu oposto.
9- O Auto de Medição que acompanha a fatura é comprovadamente um documento forjado, conforme se pode constatar da análise do documento n.º 12 junto com a Oposição;
10- O Auto de Medição que se fez acompanhar a fatura é datado de 24/05/2021, data esse que vem posteriormente a ser alterada pela Recorrida - documento n.º 5 junto à Petição Inicial tem data de 24/11/2023;
11- Quanto aos factos indiciariamente provados 8, 9, 10 e 11, resultam desmentidos com base nos documentos juntos à Oposição, designadamente o documento n.º 8 e documento n.º 12, bem como refutados pelo do depoimento da testemunha EE, contabilista da sociedade Recorrente;
12- Este depoimento foi esclarecido, coerente e revelador da verdadeira forma como foi emitida e contabilisticamente tratada a fatura em causa nos presentes autos;
13- Está cabalmente demonstrado que a anterior gerência não queria facultar a contabilidade da Recorrente porquanto se encontrava a emitir as faturas elencadas nos presentes autos – não só a da Recorrida, mas também as de FF e a da D..., Lda. – esta última conforme se veio já a comprovar judicialmente – cfr. Sentença junto ao Requerimento datado de 13-09-2024;
14- A intenção do legal representante da Recorrida era inserir as faturas na contabilidade de forma a dar a aparência de que essas mesmas dívidas existem, e são reconhecidas, com o fim último de ver decretado o presente Arresto;
15- Quanto ao facto indiciariamente provado n.º 17,o mesmo foi reduzido ao montante de €305.945,53 (trezentos e cinco mil, novecentos e quarenta e cinco euros e cinquenta e três cêntimos), conforme resulta in fine da Sentença que aprecia a Oposição, valor integral da fatura arrolada pela Recorrida, sem juros, facto que é decorrência da declaração de nulidade do contrato de empreitada;
16- As repercussões da declaração de nulidade não se cingem à desconsideração do montante peticionado a título de juros, mas também na desconsideração do montante invocado a título de IVA, bem como no montante referente à margem comercial que resulta do negócio declarado nulo;
17- O valor da sociedade C... não se pode considerar de €68.500,00 (sessenta e oito mil e quinhentos euros);
18- Foi manifestamente sobrevalorizado o valor atribuído às éguas, como também a égua mais cobiçada ter vindo a falecer, após a prolação da Sentença;
19- O “Proprietário” da égua em causa é GG, conforme CC aventou no seu depoimento, não o Requerido AA ou a sociedade Recorrente;
20- A receita da sociedade é proveniente da sua atividade comercial, dentro da qual se insere a locação de imóveis. Nada impede a sociedade de realizar outro tipo de receitas com a compra e venda de imóveis;
21- O facto indiciariamente provado n.º 51 é desprovido de suporte probatório, sendo tal facto mera alegação de DD: se a sociedade pretendia ou não vender o imóvel é inócuo, atento a atividade comercial da sociedade em causa;
22- Quanto ao facto não provado h), resulta corroborado pelo depoimento da testemunha EE, e pelo documento n.º 8 junto à Oposição;
23- É inconcebível que a Recorrida não tenha juntado aos autos um qualquer documento relativo à remessa da fatura em causa, antes foi ela entregue em mão ao então gerente de facto da Recorrente DD, para a inserir na contabilidade, sendo que a mão de onde veio essa fatura é também ela de DD, na qualidade de gerente da Recorrida;
24- Quanto ao facto não provado i), o depoimento de CC é o reduto onde mora a verdade, sendo que a mesma fez uma exímia desconstrução do auto de medição em causa;
25- O rol de factos indiciariamente provados presente na Decisão que decretou o Arresto sem audição prévia dos Requeridos, julgou erroneamente os números 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 17, 28, 30, 31, 32, 33, 44, 47, 50, 51, 52 e 53 os quais deveriam figurar como Factos Não Provados;
26- Do rol de factos não provados presente na Sentença que aprecia a Oposição, não deveria constar do mesmo as alíneas c), d), e), h), e) e i), as quais deveriam ter sido levados aos factos considerados provados;
27- Essas alterações nos factos provados levariam à conclusão de que um qualquer eventual crédito devido à Recorrida nunca seria devido, porque assim determinado pelo próprio gerente da Recorrida;
28- Mesmo que fosse de considerar que os serviços prestados eram efetivamente para ser faturados, os mesmos nunca foram da ordem de grandeza vertida no auto de medição em crise;
29- O tribunal a quo não retirou a totalidade das consequências jurídicas da declaração de nulidade do contrato, porquanto continuou a considerar que o crédito da Recorrida é do valor de € 305.945,53 (trezentos e cinco mil, novecentos e quarenta e cinco euros e cinquenta e três cêntimos), valor este integralmente constante da fatura que é fundamento do presente arresto;
30- Com a declaração de nulidade do contrato, o valor do IVA nunca poderá ser devido, valor esse que ascende a €57.209,33 (cinquenta e sete mil, duzentos e nove euros e trinta e três cêntimos), facto que é causa de nulidade da Sentença, que justifica a apresentação do presente Recurso, na medida em que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre uma questão que deveria conhecer – al. d) do n.º 1 e n.º 4 do artigo 615.º do CPC;
31- Além do valor do IVA, não foi considerada a margem comercial que a Recorrida logrou na celebração do negócio nulo por vício de forma;
32- Por consulta ao portal de estatística do Banco de Portugal “Análise do setor da construção”, o indicador “margem operacional” do setor para o ano de 2023 foi de 11.47% (onze vírgula quarenta e sete por cento);
33- Esta percentagem sempre será muitíssimo inferior à margem de lucro que a Recorrida efetivamente aplicou na fatura que trouxe aos presentes autos;
34- Utilizando esta percentagem de lucro operacional no negócio aqui declarado nulo, o montante da margem de lucro seria de €35.091,95 (trinta e cinco mil, noventa e um euros e noventa e cinco cêntimos);
35- Ora, fazendo apenas as contas com base na margem de lucro média do setor da construção, somado ao IVA, o tribunal a quo promoveu a desconsideração do montante de €92.301,28 (noventa e dois mil, trezentos e um euros e vinte e oito cêntimos);
36- Conhecida e declarada uma nulidade, deveria ter conduzido à redução de cerca de um terço do montante que serve de base à decretação do Arresto;
37- A testemunha CC depôs que a Recorrida cobrou matéria-prima à Recorrente 6 (seis) vezes mais caro do que o valor do mercado, para o mesmo exato produto, e na mesma exata data;
38- O Arresto como um meio de conservação da garantia patrimonial cujos requisitos se dividem da seguinte forma: i) probabilidade séria da existência do crédito; ii) o fundado receio de o Recorrida vir a perder a garantia patrimonial geral do seu crédito; iii) a proporcionalidade dos bens arrestados ao crédito que se pretende garantir com a providência;
39- Estes requisitos são cumulativos, devendo todos eles ser alegados e provados;
40- Relativamente ao requisito da probabilidade séria da existência do crédito, esta nunca se poderia verificar, muito menos se poderia verificar a probabilidade séria da existência de um crédito no montante aventado pela Recorrida;
41- Quanto ao segundo dos requisitos, o Tribunal a quo procedeu a um absoluto non sequitur, na medida em que não decorre das premissas que elenca a conclusão a que chega;
42- Toda a litigância judicial que existe atualmente entre o legal representante da Recorrida – DD – e CC – filha dos Requeridos deve-se única e exclusivamente à livre iniciativa do próprio DD, que quer pessoalmente, quer através das sociedades de que é gerente – designadamente a Recorrida – apresenta ações tendentes unicamente a prejudicar CC;
43- A premissa da elevada litigância judicial não é conducente à conclusão de se verificar a probabilidade séria de a Recorrida vir a perder a garantia patrimonial do seu crédito;
44- Quanto à probabilidade séria de a Recorrida vir a perder a garantia patrimonial do seu crédito, por consulta da Certidão Permanente da sociedade Recorrente consta o seguinte objeto social: Compra, venda e locação de imóveis, revenda dos adquiridos para qualquer daqueles fins, construção e gestão de imóveis. Prestação de Serviços de Engenharia e consultoria para negócios;
45- É esta a atividade da sociedade Recorrente, razão pela qual a mesma adquiriu o imóvel em causa e posteriormente o arrendou. O facto de tal imóvel estar arrendado não significa que a sociedade não tenha qualquer atividade, porquanto a atividade da sociedade é essa mesma, a gestão de ativos imobiliários, designadamente a compra, venda e locação dos mesmos;
46- Mesmo que a sociedade Recorrente tivesse demonstrado interesse em vender aquele ativo, de que forma é que de tal facto se pode extrair que exista algum tipo de perda de garantia patrimonial de um qualquer hipotético crédito, se essa é exatamente a atividade dessa concreta sociedade?
47- “II - No arresto não constitui diminuição de garantia patrimonial do crédito da Recorrida o facto da Recorrente celebrar contratos promessa de venda das frações a construir, se essa é precisamente a atividade social da mesma.” - Tribunal da Relação do Porto, processo 3913/23.8T8AVR-A.P1;
48- A conclusão de que se verifica uma diminuição da garantia patrimonial do alegado crédito da Recorrida caso não se promova o arresto do imóvel discutido nos presentes autos não tem respaldo Jurisprudencial, e nunca poderá ser fundamento suficiente e autónomo para dar por verificado esse requisito exigido para a procedência de um procedimento cautelar deste tipo;
49- Estando demonstrado que o crédito aqui em causa nunca poderá ser da ordem do invocado pela Recorrente, o requisito da proporcionalidade soçobra, jamais se podendo considerar por provado;
50- A fatura aqui emitida pela Recorrida foi manifestamente empolada, o que pelas regras de experiência significa que a margem comercial é superior à média de mercado;
51- O montante máximo que o crédito da Recorrida poderá hipoteticamente configurar sempre seria apenas de €203.985,25 (duzentos e três mil, novecentos e oitenta e cinco euros e vinte e cinco cêntimos) e nunca os €305.945,53 (trezentos e cinco mil, novecentos e quarenta e cinco euros e cinquenta e três cêntimos) vertidos na Sentença;
52- Somando-se a este valor o crédito relativo à hipoteca do imóvel, de que é hoje titular DD, de €180.000,00 (cento e oitenta mil euros), alcança-se um montante global máximo de €383.985,25 (trezentos e oitenta e três mil, novecentos e oitenta e cinco euros e vinte e cinco cêntimos);
53- O Tribunal a quo veio a determinar que o imóvel valerá, no mínimo, €600.000,00 (seiscentos mil euros), sem prejuízo de existir avaliação realizada por profissional do ramo imobiliário – documento 20 com a Oposição – no montante de €815.000,00 (oitocentos e quinze mil euros);
54- Estas avaliações determinam que o arresto do imóvel aqui em causa ultrapassa o valor máximo computado de hipotética dívida da Recorrente pelo menos na medida do dobro;
55- Jamais se pode considerar que no presente Arresto foi alegado e provado a verificação do requisito da proporcionalidade, mesmo sem atender ao empolamento relativo aos preços dos alegados serviços prestados, os quais deveriam ser todos eles calculados a preços justos de mercado, por força da nulidade do contrato de empreitada;
56- Encontra-se manifestamente demonstrado que não estão reunidos os requisitos legalmente exigidos pelos artigos 619.º do Código Civil e 391.º, n.º 1 do CPC, nem o disposto no n.º 2 do artigo 393.º do CPC;
57- Estes requisitos não resultaram minimamente provados pela Recorrida, conforme obriga o disposto nos artigos 392.º, n.º1 e 393.º, n.º 1, ambos do CPC;
58- Estão assim reunidas todas as condições para o procedência integral do presente Recurso, conduzindo ao levantamento do Arresto sobre todos os bens propriedade dos Recorridas.
Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas. doutamente suprirão, requer-se que o presente recurso seja declarado totalmente procedente, por provado, com o consequente levantamento do arresto, por não se verificarem quaisquer dos requisitos legalmente exigidos para o seu decretamento.
A requerente da providência apresentou contra-alegações, nas quais, em súmula, defende inexistir fundamento para a alteração à decisão sobre a matéria de facto pretendida pela recorrente.
Re-afirma a celebração, entre a recorrente e a requerida “B..., Ldª”, de um contrato de empreitada nulo por falta de forma, havendo lugar à restituição do que foi prestado na pressuposição da validade desse negócio, que, no caso, devido à impossibilidade de restituição in natura quanto à prestação cumprida pela recorrida, corresponde ao direito a haver da recorrida “B..., Ldª”, a quantia global de € 305 945,53.
Defende a verificação dos pressupostos do arresto decretado em 1ª instância.
Conclui pedindo a improcedência do recurso.
O recurso foi admitido [despacho de 06 de Março de 2025, referência nº 137496792] como de apelação, a subir imediatamente e nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo.
No exame preliminar entendeu-se nada obstar ao conhecimento do objecto do recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

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II - Fundamentação
Como é sabido, o teor das conclusões que o recorrente extrai da motivação que apresenta, onde sintetiza as razões da sua discordância com o decidido e resume o pedido (nº 4 do artigo 635º e artigos 639º e 640º, todos do Código de Processo Civil), delimita o objecto do recurso e fixa os limites do horizonte cognitivo do Tribunal Superior, sem prejuízo das questões que devem ser conhecidas oficiosamente.
Assim, atentas as conclusões do recorrente, mostram-se colocadas à apreciação deste tribunal as seguintes questões, enunciadas por ordem de precedência lógico-jurídica:
A) A nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia;
B) A impugnação da decisão sobre a matéria de facto;
C) A existência e montante do crédito invocado como fundamento do arresto;
D) A verificação dos pressupostos do decretamento do arresto.
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Delimitado o objecto do recurso, importa conhecer a factualidade em que assenta a decisão impugnada.
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Factos Provados (transcrição):
Da decisão inicial no processo:
1- A Requerente A..., Lda, é uma sociedade comercial por quotas que tem por objeto e atividade a construção civil e obras públicas, compra, venda e permuta de bens imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim; promoção imobiliária; prestação de serviços de consultoria, orientação e assistência operacional a empresas e/ou organismos públicos ou privados em matéria de planeamento, organização, controlo, informação, gestão e reorganização de empresas; consultoria sobre engenharia e segurança e higiene no trabalho; importação e comercialização de cimento embalado a grossistas, retalhistas e empresas de construção – fls. 18/20v..
2- A 1ª Requerida B..., Lda, é uma sociedade comercial por quotas, e tem por objeto a compra, venda e locação de imóveis, revenda dos adquiridos para qualquer daqueles fins, construção e gestão de imóveis; prestação de serviços de engenharia e consultoria para negócios – fls. 21/22.
3- No exercício da sua atividade comercial, a Requerente prestou serviços e forneceu bens à 1ª Requerida, a pedido desta, cuja especificação, qualidade, quantidade e preço constam da Fatura n.º ..., emitida no dia 02/11/2023, com data de vencimento no dia 02/12/2023, no valor total de € 305.945,53 – fls. 22v./25.
4- A Requerente prestou à 1ª Requerida serviços de reabilitação de uma moradia unifamiliar sita em ... e trabalhos gerais de construção civil, que se realizaram entre 2021 e 2023, designadamente os serviços que melhor constam descritos no auto de medição anexo à referida fatura – fls. 22v./25.
5- A Requerente forneceu ainda à Requerida os bens/materiais necessários à realização daqueles trabalhos.
6- Os serviços foram prestados à Requerida e usufruídos por esta.
7- Os bens foram entregues à Requerida.
8- A Requerida não apresentou qualquer reclamação.
9- O original da fatura foi, em devido tempo, enviado à Requerida.
10- Que a aceitou e integrou na respetiva contabilidade.
11- Mais de cinco meses após, por comunicação recebida no dia 03/04/2024, a Requerida veio devolver a referida fatura.
12- Tendo alegado que a atual gerência não reconhece «(...) terem sido prestados quaisquer serviços, ou fornecidos quaisquer bens (…) pelo que não terá aquela qualquer tratamento contabilístico e fiscal» - fls. 49v..
13- No dia 09/04/2024, a Requerente remeteu novamente a fatura n.º ... à 1ª Requerida – fls. 50/51.
14- E comunicou à 1ª Requerida que não aceita qualquer devolução, e que tal apenas pode ocorrer por má-fé ou com o intuito de se eximir ao respetivo pagamento.
15- A Requerente tem tentado, por diversas formas, receber este seu crédito, instando insistentemente a 1ª Requerida a satisfazer o devido pagamento, contudo, até à presente data, a Requerida não efetuou o pagamento de quaisquer quantias.
16- E declarou que não o fará.
17- A dívida da Requerida à Requerente ascende no presente ao montante global de € 321.649,34, juros incluídos.
18- São sócios da 1ª Requerida AA e BB – fls. 21.
19- E foram gerentes da Requerida DD e CC – fls. 21v..
20- Pela AP ..., de 03/11/2023, foi levada a registo: a) a deliberação dos sócios da Requerida que destituiu DD do cargo de gerente; b) a renúncia ao cargo de gerente apresentada por CC – fls. 21v..
21- Posteriormente, pela Insc. 3 AP. ... de 03/11/2023, foi registada a nomeação dos dois sócios da Requerida como gerentes da sociedade – fls. 21v./22.
22- Até 05/12/2023, a 1ª Requerida detinha a única quota, no valor nominal de € 1.000,00, representativa de 100 % do capital social, da sociedade C..., Unipessoal, L.da, NIPC ..., com sede na Zona Industrial ..., rua ..., lote ..., ..., e que tem por objeto a prestação de serviços de engenharia e consultoria para negócios; e a criação de equinos, asininos e muares – fls. 51v./52v..
23- Nessa data, AA e BB, na qualidade de sócios e gerentes da 1ª Requerida, deliberaram transmitir a AA, casado sob o regime de comunhão de adquiridos com BB, a quota que a 1ª Requerida detinha na sociedade C..., Unipessoal, L.da, pelo preço de € 1.000,00, correspondente ao valor nominal da quota – fls. 53v./54 e 56v./57.
24- O que foi levado a registo no dia 15/12/2023 – fls. 52/52v..
25- O capital próprio contabilisticamente registado da sociedade C..., Unipessoal, Lda, é de € 15.392,60 – fls. 57v./88v. (fls. 59v.).
26- A sociedade C..., Unipessoal, Lda, tem um ativo fixo tangível contabilisticamente registado no valor de € 14.668,16 – fls. 59v..
27- Este valor corresponde, na prática, a dois equinos (designados de HH e II) contabilizados pelo respetivo valor de aquisição.
28- Mas cujo valor atual é de cerca de € 42.500,00 o primeiro, e de cerca de € 26.000,00 o segundo.
29- O sócio da 1ª Requerida deliberou, em 05/12/2023, nomear-se a si mesmo como gerente da sociedade C..., Unipessoal, L.da – vide AP. ... de 14/02/2024 (fls. 52 e fls. 54v./55).
30- A alienação da quota da sociedade C..., Unipessoal, Lda, ao próprio sócio e gerente por contrapartida com o pagamento de € 1.000,00, diminuiu gravemente a possibilidade da Requerente obter a satisfação integral do seu crédito.
31- O crédito da Requerente é anterior ao ato de diminuição da garantia patrimonial que a alienação da quota da sociedade C..., Unipessoal, L.da, representa.
32- AA não ignora – pela posição que ocupa na sociedade Requerida – que a alienação da quota da sociedade C..., Unipessoal, L.da, prejudica os credores da Requerente, e constitui uma diminuição da garantia patrimonial do crédito da Requerente, e dos restantes credores.
33- A alienação da quota da sociedade C..., Unipessoal, L.da, teve lugar apenas com o objetivo de dissipar património da 1ª Requerida.
34- Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Oliveira de Bairro, sob o nº ... da freguesia ..., o seguinte prédio: rústico, situado em ..., com a área total e descoberta de 3790 m2, inscrito na respetiva matriz predial rústica sob o artigo ... – fls. 91v./92.
35- Este prédio encontra-se inscrito, pela AP. ... de 2018/06/21, a favor de B..., L.da, por compra a AA e BB – fls. 91v..
36- O seu valor patrimonial atual, determinado no ano de 1989, é de € 135,25 – fls. 93.
37- Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Oliveira de Bairro, sob o nº ... da freguesia ..., o seguinte prédio: rústico, situado em ..., com a área total e descoberta de 1900 m2, inscrito na respetiva matriz predial rústica sob o artigo ... – fls. 90v./91.
38- Este prédio encontra-se inscrito, pela AP. ... de 2022/12/29, a favor de B..., Lda, por compra a E... Unipessoal, Lda – fls. 90v..
39- O seu valor patrimonial tributário atual, determinado no ano de 1989, é de € 10,94 – fls. 92v..
40- Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Oliveira de Bairro, sob o nº ... da freguesia ..., o seguinte prédio: urbano, situado em ..., com a área total de 5606 m2, á área coberta de 292 m2 e a área descoberta de 5314 m2, a confrontar, do norte, com caminho, do nascente, com JJ, do sul, com estrada, e, do poente, com KK, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... – fls. 89/90.
41- Este prédio encontra-se inscrito, pela AP. ... de 2020/12/03, a favor de B..., Lda, por compra a LL – fls. 89.
42- Foi inscrita, pela AP. ... de 2020/12/03, hipoteca voluntária a favor de Banco 1..., pelo capital de 230.000,00 e o montante máximo assegurado de € 328.900,00, para garantia de empréstimo – fls. 89v..
43- O valor patrimonial tributário atual do prédio identificado em 40- dos Factos Provados, determinado em 2023, é de € 168.632,98 – fls. 93v./94.
44- No imóvel referido nos nºs. 40 a 42 dos Factos Provados foram realizadas as obras melhor descritas no auto de medição anexo à fatura n.º ....
45- O valor do referido imóvel, com o valor incorporado pelas obras realizadas pela Requerente, é hoje não inferior a € 400.000,00.
46- O imóvel identificado em 40- a 42- dos Factos Provados encontra-se arrendado a DD e CC pelo valor mensal de € 2.660,00 – fls. 94v./95v. e fls. 179.
47- A Requerida não efetuou o pagamento dos serviços que lhe foram prestados pela sociedade D..., Lda, razão pela qual esta apresentou requerimento de injunção contra a Requerida, no valor de € 6.194,58, ao qual foi atribuído o n.º de processo 38384/24.2YIPRT – fls. 96v./97.
48- A Requerida também não efetuou o pagamento dos serviços prestados por FF, relacionados com as obras realizadas a pedido da Requerente.
49- No dia 13/03/2024 FF apresentou requerimento de injunção contra a Requerida no valor de € 30.372,46, ao qual foi atribuído o n.º 33883/24.9YIPRT – fls. 97v./98v..
50- O valor da renda do referido bem imóvel é a única receita da Requerida.
51- A Requerida pretende transmitir o imóvel arrendado.
52- A Requerida não possui qualquer património mobiliário e imobiliário capaz de garantir o pagamento de todas as suas dívidas, designadamente quantias pecuniárias, o que faz com que a Requerente receie que não proceda ao pagamento da dívida que tem para consigo.
53- A alienação da quota que detinha na sociedade C..., Unipessoal, L.da, extravasa o âmbito da atividade comercial da Requerida e constitui uma diminuição da garantia patrimonial dos seus credores.

Da decisão proferida em sede de oposição:
54- A sociedade requerente tem como sócios DD, a sua irmã MM, e o seu pai, NN – fls. 18/22.
55- A sociedade requerente é uma de muitas que constituem o grupo F..., nas quais se incluem, além do mais, as seguintes sociedades:
a. G..., Lda, nipc ..., que tem como objeto transportes rodoviários de mercadorias por conta de outrem; comercialização de materiais de construção; aluguer de máquinas e equipamentos para a construção civil; prestação de serviços logísticos e operacionais que inclui o planeamento, controlo, coordenação e direção de operações relacionadas com a expedição, receção, armazenamento e circulação de bens ou mercadorias; e como sócio (entre outros) DD, que é igualmente gerente – fls. 230v./232v.;
b. H..., Lda, nipc ..., que tem como objeto fabricação de betão pronto e de outros produtos de betão, gesso e cimento, e como sócio (entre outros) DD, que é igualmente gerente – fls. 233/234v.;
c. I..., Lda, nipc ..., que tem como objeto comércio de materiais para a construção civil e obras públicas, e como sócia (entre outros) a sociedade H..., Lda, nipc ..., sendo DD o respetivo gerente – fls. 235/236v.;
d. J..., Lda, nipc ..., que tem como objeto a extração, comercialização de saibro, areia e pedra britada, tratamento e eliminação de resíduos inertes, valorização de resíduos metálicos e não metálicos, e como sócio (entre outros) DD, que é igualmente gerente – fls. 237/239v.;
e. K..., Lda. (anteriormente denominada por L... Lda), nipc ..., que tem como objeto a prestação de serviços de laboratório e análises técnicas, nomeadamente ensaios a produtos de construção civil, e como sócio (entre outros) DD, que é igualmente gerente – fls. 240/241.
56- DD e CC contraíram matrimónio católico, sem convenção antenupcial, a 26/12/2009 – fls. 241v..
57- Os trabalhos de reabilitação da moradia unifamiliar existente no prédio urbano sito em ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Oliveira do Bairro sob o nº 3126 da freguesia ..., ... e ..., iniciaram-se no princípio de 2021 e foram orientados por DD e CC.
58- DD e CC começaram a habitar a referida moradia em novembro de 2021.
59- Em setembro de 2023, CC, filha dos Requeridos AA e BB, abandonou a casa do ..., na companhia das filhas, tendo intentado a competente ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge (Processo n.º 3221/23.4T8AVR, Juízo de Família e Menores de Oliveira do Bairro) – fls. 242v./250v..
60- DD e CC não se entendem quanto à partilha do acervo patrimonial do casal, o que deu início a conflitualidade e litigância judicial entre ambos e com os Requeridos AA e BB.
61- Os sócios e atuais gerentes da Requerida apenas tiveram conhecimento da fatura ......, junta com a petição inicial como documento nº 3, em meados de março de 2024, altura em que foi transmitida a contabilidade à nova contabilista certificada por si nomeada em substituição do Dr. OO – após diversas tentativas frustradas –, que anteriormente havia desempenhado tais funções por motivos de comodidade e proximidade, atento ser funcionário do Grupo F... – fls. 251/253.
62- O trabalho de montagem e desmontagem de andaimes foi realizado pela empresa M..., Unipessoal, L.da, e importou em € 5.846,00 – fls. 253v./260.
63- A retirada da telha do telhado e a aplicação de nova telha foi feita pela sociedade N..., L.da, pelo preço de € 3.813,00, com ajuda de um trabalhador da sociedade Requerente e com recurso aos meios elevatórios da sociedade G..., L.da – fls. 260v./261v..
64- DD instaurou contra os ora Requeridos AA e mulher BB a ação de processo comum nº 431/24.0T8CBR, que corre termos no Juízo de Competência Genérica de Oliveira do Bairro, no qual aquele peticiona a condenação daqueles a restituírem-lhe o veículo automóvel da marca Mercedes-Benz, matrícula ..-JI-.. – fls. 269/331v..
65- A ora Requerente A..., Lda, instaurou contra a ora Requerida B..., Lda, o processo de insolvência que corre termos sob o nº 2645/24.4T8AVR no Juízo de Comércio de Aveiro – fls. 332/353v..
66- DD instaurou contra os ora Requeridos AA, BB, Lda, a ação de processo comum nº 42/24.0T8AVR, que corre termos no Juízo Central Cível de Aveiro – Juiz 2 – fls. 354/384v..
67- No processo nº 38384/24.2YIPRT instaurado por D..., Lda, contra a ora Requerida B..., L.da (referido no nº 47 dos Factos Provados da decisão proferida a 18/06/2024), foi proferida sentença, a 08/09/2024, que absolveu B..., L.da, dos pedidos – documento junto com o requerimento de 13/09/2024.
68- As injunções nº 38384/24.2YIPRT e nº 33883/24.9YIPRT (referidas nos nºs. 47 e 49 dos Factos Provados da decisão proferida a 18/06/2024) foram instauradas, respetivamente, a 15/03/2024 e 13/03/2024 – fls. 385/385v. e 386/386v..
69- D..., Lda, e FF mantêm relações comerciais com o Grupo F....
70- Foi inscrito, pelo Averb. AP. ... de 2024/08/20 à descrição predial nº ...-... da Conservatória do Registo Predial de Oliveira de Bairro, a transmissão do crédito da Banco 1..., CRL, no montante de € 182.096,92, a favor de DD, casado com CC na comunhão de adquiridos – fls. 430/431v..
71- O valor deste imóvel é hoje não inferior a € 600.000,00.
72- A Banco 1..., CRL, enviou à gerência de B..., L.da, com conhecimento de DD e CC, a carta junta a fls. 396v. a 398v., datada de 09/08/2024, que indica como assunto “resolução do contrato de empréstimo nº ... correspondente à proposta nº ...”, na qual refere, em resumo, que: a) nos termos do parágrafo 1 da Cláusula Sexta do documento complementar que constitui parte integrante da escritura pública de compra e venda, mútuo com hipoteca e fiança, outorgada no dia 03/12/2020, a Banco 1..., enquanto mutuante, pode resolver o contrato de empréstimo e considerar automática e imediatamente vencidas e exigíveis todas e cada uma das obrigações assumidas pela sociedade mutuária se o imóvel hipotecado foi objeto de execução, penhora, arresto ou outra forma de apreensão (…) – alínea d) da referida cláusula sexta; b) a alínea f) da mesma cláusula prevê que a resolução do contrato de financiamento ocorre sempre que “for declarada ou requerida a insolvência da mutuária e/ou dos fiadores”; c) nos termos da alínea a) do parágrafo 1 da Cláusula Sexta, a Mutuante pode também resolver o contrato se não for paga alguma das prestações, de capital e de juros; d) a Banco 1... constatou que a prestação vencida, em 03/08/2024, foi apenas paga parcialmente, encontrando-se em mora, nesta data, por mais de metade do seu valor. Tudo assim fundamenta a resolução do contrato de empréstimo nº ... correspondente à proposta nº ..., que aqui e desde já se declara. Deverão proceder, no prazo de 3 dias a contar da receção desta comunicação, à regularização imediata de todas as responsabilidades emergentes do referido contrato de empréstimo no valor global atual de € 182.288,10.
*
Factos Não Provados (transcrição):
Da decisão inicial no processo:
Nenhum.

Da decisão proferida em sede de oposição:
a) a maior parte das participações de DD nas empresas do “Grupo F...” serão também bens comuns do casal constituído por aquele e CC;
b) aquando da constituição da sociedade Requerida, os Requeridos AA e BB optaram por nomear a filha e o genro como gerentes atenta a circunstância de ambos serem experientes no que à gestão de empresas concerne, e por confiarem nos mesmos, atentos os laços que os uniam;
c) os gerentes ao tempo do início das obras (2021) determinaram que, uma vez que tinham acesso a uma vasta rede de bens e serviços de construção, por força da sua ligação às empresas do Grupo F..., iriam beneficiar de tal circunstância;
d) aplicando na execução dos trabalhos de reabilitação da casa bens e mão de obra pertencente a outras empresas do Grupo F..., sem qualquer contrapartida económica pela prestação de tais trabalhos, e fornecimento de tais bens, ou por preços reduzidos, como já havia sido feito noutras ocasiões;
e) e com recurso a prestadores e fornecedores de serviços parceiros das empresas do Grupo F..., e que, como tal, acederam em trabalhar com preços reduzidos, ou até gratuitamente, mediante a promessa de adjudicação de trabalhos em obras futuras no Grupo F...;
f) a partir de novembro de 2021 não foram realizadas, muito menos autorizadas, quaisquer obras de construção civil na casa do ...;
g) DD ameaçou quer a esposa, quer os sogros, que se iriam arrepender e que os deixaria sem nada;
h) DD, fazendo-se valer da circunstância de ao tempo ser gerente da sociedade Requerente mas também ainda ter controlo de facto sobre a sociedade Requerida, faz com que aquela emita a fatura junta aos autos como documento n.º 3, a 02/11/2023, no valor de € 305.945,53, por um valor arbitrariamente definido pelo mesmo, com vista a pressionar os Requeridos;
i) distribuindo depois esse valor nos mais diversos serviços efabulados e presentes no auto de medição que acompanha a fatura;
j) FF intentou a ação nº 33883/24.9YIPRT a mando de DD;
k) a Banco 1... aparenta fazer parte do conluio e a própria missiva da Banco 1... enviada aos Requeridos e a DD e CC, estes últimos na qualidade de fiadores, teve a intervenção de DD ou de alguém a seu mando, com vista a ficar titular do crédito da Banco 1... e que a hipoteca sobre o imóvel fique registada a seu favor.
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A)
A decisão judicial que põe fim a um litígio jurídico-privado não só deve limitar-se pelo que foi pedido ao tribunal, como se impõe que esgote a análise e decisão sobre tudo o que foi pedido, porque apenas assim se garantirá que a força socialmente pacificadora do caso julgado se estenda sobre a totalidade da questão trazida a juízo.
E por isso expressamente se impõe ao juiz [nº 2 do artigo 608º do Código de Processo Civil] que resolva todas as questões pelas partes colocadas à sua apreciação, obviamente com excepção daquelas cuja decisão se mostre prejudicada pela solução dada a outras.
Os recorrentes defendem que a consideração da totalidade quantia indicada na factura apresentada como documento nº 3 junto com o requerimento inicial [€ 305 945,53], como valor do crédito indiciariamente demonstrado para fundamento do arresto, traduz omissão de pronúncia, na medida em que da nulidade do contrato de empreitada declarada em plena audiência de julgamento [despacho reproduzido na acta da diligência que teve lugar a 11 de Dezembro de 2024, referência nº 136222008] na sua perspectiva decorre a falta de fundamento para o pagamento do IVA inscrito na factura.
Obviamente não lhes assiste qualquer razão.
Conforme jurisprudência dos nossos tribunais superiores [cfr, por todos, o decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça no seu acórdão de 19 de Março de 2022, processo nº 19655/15.5T8PRT.P3.S1, disponível em www.dgsi.jstj.pt/] e doutrina [cfr, por todos, o ensinamento do Prof. Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado”, Coimbra Editora, 1946, volume V, página 143 – “São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão"] absolutamente pacíficas, as questões processuais cujo conhecimento se impõe seja feito na sentença [artigo 608º do Código de Processo Civil] não se confundem com os argumentos [de facto (designadamente meios de prova) ou de direito] aduzidos pelas partes, ou oficiosamente considerados pelo Tribunal, na resolução de tais questões.
E questões, para este efeito, serão todas as controvérsias de natureza processual ou substantiva que, ou obstam ao conhecimento do mérito da causa [as excepções dilatórias], ou se reconduzem ao próprio mérito da causa [os limites da causa de pedir, do pedido, e das excepções].
Da falta de ponderação de um argumento, de um facto ou de um meio de prova invocados no processo, ou da utilização inovadora de outros, poderá decorrer fundamentação deficiente ou medíocre susceptível de gerar erro de julgamento ou mesmo invalidade nos termos do artigo 662º do Código de Processo Civil, mas não nulidade por omissão ou excesso de pronúncia.

No caso em apreço, a agora recorrida submeteu à apreciação do tribunal a quo, entre o mais, a questão jurídica da quantificação do alegado crédito da requerente do arresto perante a recorrente “B..., Ldª”.
E a essa questão o tribunal deu resposta, na decisão que pôs fim à primeira fase do processo, indiciariamente fixando em € 321.649,34 a quantia devida [€ 305 945,53 de capital e respectivos juros], valor que quanto ao capital re-afirmou na decisão agora impugnada.
Os recorrentes entendem que a quantificação deve ser feita de modo diverso.
Do que facilmente resulta, repete-se, que os próprios recorrentes entendem que a questão jurídica colocada [a quantificação do crédito] foi apreciada e decidida, embora, na sua perspectiva, de forma errada – o que evidentemente basta para constatar não ocorrer omissão de pronúncia.
Nesta parte improcede o recurso.

B)
A discordância dos recorrentes quanto à decisão sobre a matéria de facto reconduz-se à inclusão dos pontos 3-, 4-, 5-, 6-, 7-, 8-, 9-, 10-, 11-, 17-, 28-, 30-, 31-, 32-, 33-, 44-, 47-, 50-, 51-, 52- e 53- na matéria de facto provada [3- No exercício da sua atividade comercial, a Requerente prestou serviços e forneceu bens à 1ª Requerida, a pedido desta, cuja especificação, qualidade, quantidade e preço constam da Fatura n.º ..., emitida no dia 02/11/2023, com data de vencimento no dia 02/12/2023, no valor total de € 305 945,53 – fls. 22v./25; 4- A Requerente prestou à 1ª Requerida serviços de reabilitação de uma moradia unifamiliar sita em ... e trabalhos gerais de construção civil, que se realizaram entre 2021 e 2023, designadamente os serviços que melhor constam descritos no auto de medição anexo à referida fatura; 5- A Requerente forneceu ainda à Requerida os bens/materiais necessários à realização daqueles trabalhos; 6- Os serviços foram prestados à Requerida e usufruídos por esta; 7- Os bens foram entregues à Requerida; 8- A Requerida não apresentou qualquer reclamação; 9- O original da fatura foi, em devido tempo, enviado à Requerida; 10- Que a aceitou e integrou na respetiva contabilidade; 11- Mais de cinco meses após, por comunicação recebida no dia 03/04/2024, a Requerida veio devolver a referida fatura; 17- A dívida da Requerida à Requerente ascende no presente ao montante global de € 321.649,34, juros incluídos; 28- Mas cujo valor atual é de cerca de € 42.500,00 o primeiro, e de cerca de € 26.000,00 o segundo; 30- A alienação da quota da sociedade C..., Unipessoal, Lda, ao próprio sócio e gerente por contrapartida com o pagamento de € 1.000,00, diminuiu gravemente a possibilidade da Requerente obter a satisfação integral do seu crédito; 31- O crédito da Requerente é anterior ao ato de diminuição da garantia patrimonial que a alienação da quota da sociedade C..., Unipessoal, Lda, representa; 32- AA não ignora – pela posição que ocupa na sociedade Requerida – que a alienação da quota da sociedade C..., Unipessoal, Lda, prejudica os credores da Requerente, e constitui uma diminuição da garantia patrimonial do crédito da Requerente, e dos restantes credores; 33- A alienação da quota da sociedade C..., Unipessoal, Lda, teve lugar apenas com o objetivo de dissipar património da 1ª Requerida; 44- No imóvel referido nos nºs. 40 a 42 dos Factos Provados foram realizadas as obras melhor descritas no auto de medição anexo à fatura n.º ...; 47- A Requerida não efetuou o pagamento dos serviços que lhe foram prestados pela sociedade D..., Lda, razão pela qual esta apresentou requerimento de injunção contra a Requerida, no valor de € 6.194,58, ao qual foi atribuído o n.º de processo 38384/24.2YIPRT – fls. 96v./97; 50- O valor da renda do referido bem imóvel é a única receita da Requerida; 51- A Requerida pretende transmitir o imóvel arrendado; 52- A Requerida não possui qualquer património mobiliário e imobiliário capaz de garantir o pagamento de todas as suas dívidas, designadamente quantias pecuniárias, o que faz com que a Requerente receie que não proceda ao pagamento da dívida que tem para consigo; 53- A alienação da quota que detinha na sociedade C..., Unipessoal, Lda, extravasa o âmbito da atividade comercial da Requerida e constitui uma diminuição da garantia patrimonial dos seus credores], e à inclusão dos pontos c), d), e), h) e i) na matéria de facto não provada [c) os gerentes ao tempo do início das obras (2021) determinaram que, uma vez que tinham acesso a uma vasta rede de bens e serviços de construção, por força da sua ligação às empresas do Grupo F..., iriam beneficiar de tal circunstância; d) aplicando na execução dos trabalhos de reabilitação da casa bens e mão de obra pertencente a outras empresas do Grupo F..., sem qualquer contrapartida económica pela prestação de tais trabalhos, e fornecimento de tais bens, ou por preços reduzidos, como já havia sido feito noutras ocasiões; e) e com recurso a prestadores e fornecedores de serviços parceiros das empresas do Grupo F..., e que, como tal, acederam em trabalhar com preços reduzidos, ou até gratuitamente, mediante a promessa de adjudicação de trabalhos em obras futuras no Grupo F...; h) DD, fazendo-se valer da circunstância de ao tempo ser gerente da sociedade Requerente mas também ainda ter controlo de facto sobre a sociedade Requerida, faz com que aquela emita a fatura junta aos autos como documento n.º 3, a 02/11/2023, no valor de € 305.945,53, por um valor arbitrariamente definido pelo mesmo, com vista a pressionar os Requeridos; i) distribuindo depois esse valor nos mais diversos serviços efabulados e presentes no auto de medição que acompanha a fatura].
Mostra-se razoavelmente cumprido o ónus fixado no artigo 640º do Código de Processo Civil.

Antes de verdadeiramente principiarmos por analisar ponto por ponto a matéria de facto sobre a qual os recorrentes manifestam a sua discordância, a complexidade da relação que é trazida à apreciação do tribunal em primeiro lugar impõe a estruturação de alguns vectores essenciais que nortearão o caminho da reapreciação pedida.
Em primeiro lugar, dir-se-á constituírem evidências, tanto a anterior grande proximidade familiar entre o gerente da sociedade requerente do arresto e os requeridos AA e BB, sócios e gerentes [desde Novembro de 2023] da requerida “B..., Ldª”, como o actual litígio aberto entre os mesmos, motivado pela ruptura conjugal entre o gerente da sociedade requerente do arresto e a sua esposa CC, filha dos requeridos AA e BB, que culminou em processo de divórcio litigioso em curso – e estas evidências não podem ser afastadas no momento de sopesar a credibilidade, tanto do declarado pelo gerente da sociedade requerente do arresto, DD, como do depoimento da testemunha CC, verdadeiramente os 2 grandes interessados no destino da sociedade “B..., Ldª”, cuja actividade principal [para não dizer exclusiva] se centra na gestão da utilização da moradia [sita na estrada ..., ..., ..., ..., ... e ...] confessadamente adquirida e remodelada com o exclusivo objectivo de constituir a casa de morada de família da família que o DD e a CC constituíram.
E daqui necessariamente partimos para uma constatação incontornável na definição do contexto em que se desenvolve o litígio a que os presentes autos dão forma, e que obviamente não pode deixar de ser decisiva na concretização da matéria de facto no caso indiciariamente relevante: os negócios jurídicos formalizados com vista à aquisição do imóvel e à execução das obras necessárias à sua afectação à habitação da família ..., pelo menos até ao momento da ruptura do casal, ocorrida no segundo semestre de 2023, não traduziram [ao contrário do que a requerente do arresto pretende fazer crer nos artigos 1º a 28º do seu requerimento inicial] simples e corriqueira contratação entre sociedades comerciais, cada uma prosseguindo o seu interesse no desenvolvimento do respectivo objecto social ao actuar no mercado em livre concorrência, antes foram fruto exclusivo da intenção de criar a aparência de o imóvel ser pertença da requerida “B..., Ldª”, e não do DD e da CC, para com isso procurar afastar a possibilidade de uma eventual crise da actividade profissional em que o DD se encontrava envolvido gerar a afectação do imóvel ao pagamento dos seus credores a título pessoal – é o que linearmente perpassa de todo o declarado pelo DD [cristalinamente, veja-se 7m00s a 8m15s] na audiência que teve lugar na primeira fase do procedimento, reconhecendo que a requerida “B..., Ldª”, foi criada unicamente com o objectivo de construir/adquirir um imóvel para constituir a habitação da sua família; afirmando que os seus sogros assumiram a qualidade de sócios da requerida “B..., Ldª”, a pedido do DD e da CC, mas sem verdadeiramente decidirem seja o que for quanto aos destinos da sociedade, pelo menos até Novembro de 2023 [o DD e a CC (entre Julho de 2018 e Outubro de 2023) eram os gerentes da “B..., Ldª”, e foram estes quem prestou aval no âmbito do contrato de financiamento bancário a que a sociedade recorreu para obter a maioria do dinheiro necessário à aquisição da moradia]; declarando que todo o dinheiro utilizado na compra do imóvel e na realização das obras de remodelação deste proveio das contas bancárias do declarante [«tínhamos que rodar o dinheiro»], que procedia ao seu depósito em contas bancárias dos sogros, daí saindo para fazer face aos custos com a aquisição e com as obras, sendo registado como suprimentos na contabilidade da requerida “B..., Ldª”; esclarecendo que a outorga do contrato de arrendamento [que constitui o documento nº 11 junto com o requerimento inicial] constituiu o mecanismo jurídico escolhido para habilitar a “B..., Ldª”, a fazer face aos encargos que tinha de satisfazer para cumprir o objectivo para que foi constituída [concretamente, pagar a prestação mensal contratada com a instituição bancária que concedeu o financiamento destinado à aquisição da moradia, e pagar os impostos inerentes à propriedade].
Sobre esta matéria também depôs, confirmando-a, a testemunha OO [contabilista que até final de 2023 assegurou a contabilidade da requerida “B..., Ldª”].
Em terceiro e último lugar, não podemos deixar de ter presente que a versão dos factos vertida no requerimento inicial, na sua enganosa simplicidade, estrutura-se e desenvolve-se sobre um suposto acordo de prestação de serviços de construção civil entre requerente e requerida “B..., Ldª”, do qual alegadamente constituiriam mera execução todos os trabalhos prestados e bens fornecidos cujo pagamento a requerente agora reclama [cfr artigos 3º a 8º do requerimento inicial] – tanto assim que o próprio tribunal a quo, em despacho proferido na diligência agendada para produção da prova indicada pelos requeridos [cfr acta de 12 de Dezembro de 2024, referência nº 136222008], declarou: «Por conseguinte, e em resumo: a) o contrato de empreitada dos autos é nulo por inobservância da forma escrita, atento o disposto no art. 26.º, nº 3, da Lei nº 41/2015, de 03/06; b) nos termos do disposto no nº 1 do art. 289.º do C. Civil, um dos efeitos da declaração de nulidade do negócio é a obrigação de restituição (em espécie ou, não sendo esta possível, do valor correspondente) de tudo o que tiver sido prestado; c) nada impede o recurso a documento de menor força probatória, à confissão, a prova testemunhal ou até mesmo a presunções judiciais para a demonstração de que foi celebrado um contrato nulo por falta de forma, bem como o seu conteúdo».
Ou seja, interpretou o alegado nos artigos 3º a 8º do requerimento inicial, como não poderia deixar de ser, como consubstanciando contrato de empreitada nulo por falta de forma nos termos do regime especial fixado na Lei nº 41/2015, de 03 de Junho.
Contrato de empreitada nulo por falta de forma a que a recorrida igualmente se refere nas suas contra-alegações.

Isto posto, analisemos com mais pormenor a impugnação da decisão quanto à matéria de facto, tendo ainda presente que os factos impugnados se podem agrupar sob três conjuntos de questões – (a) a existência de um acordo jurídico (ainda que inválido por falta de forma) entre requerente e requerida “B..., Ldª”, com o óbvio e clássico sentido de existirem duas vontades antagónicas harmonizadas com vista à produção de uma resultado/vinculação comum, no âmbito e sequência do qual a primeira teria prestado serviços e fornecido bens; (b) os concretos bens e serviços prestados; (c) o justificado perigo de diminuição de garantia patrimonial do crédito.
Façamos uma pequena análise preliminar conjunta quanto a esses dois primeiros grupos.

a)
Os trabalhos de remodelação da moradia em causa nos autos indiscutivelmente principiaram em 2021 – é o que linearmente decorre das declarações do gerente da requerente do arresto e do depoimento da testemunha CC, nesse particular aspecto absolutamente coincidentes.
Ora, nessa altura, existia harmonia conjugal entre o DD e a CC, o primeiro presidindo aos destinos tanto da requerente do arresto como da requerida “B..., Ldª” [era gerente tanto da primeira como da segunda], e esta mostrava-se pacificamente afecta ao destino para cuja criação foi pensada – constituir mero veículo protector do direito do casal ... à moradia sita na estrada ..., ..., ..., ..., ... e ....
E, nessa sequência, de absolutamente nenhum dos meios de prova produzidos no processo resulta mínimo indício de, em 2021, 2022 e até pelo menos Agosto de 2023, a requerida “B..., Ldª”, através de qualquer dos seus representantes, ter efectuado à requerente do arresto qualquer solicitação ou pedido que razoavelmente possam ser interpretados como manifestação da intenção de assumir vinculação jurídica [confirmação disso mesmo é o facto de inexistir mínima comunicação escrita entre as duas sociedades a propósito de um suposto negócio relativo aos trabalhos na moradia em questão, e muito menos documento em que sequer se aborde a obrigação de a requerente do arresto realizar determinada obra, e a obrigação da requerida “B..., Ldª”, pagar seja o que for, documento que obviamente seria de esperar existir na hipótese contrária, atenta a integração da “A..., Ldª”, em grupo económico que aparentemente anualmente factura dezenas de milhões de euros em serviços prestados a terceiros, e o conhecimento que por isso é de esperar existir quanto às regras legais reguladoras da sua actividade comercial, designadamente a Lei nº 41/2015, de 03 de Junho] – isto independentemente, como será óbvio, de trabalhos de remodelação incontestavelmente terem sido levados a cabo na moradia em causa.
Mais.
Como linearmente decorre das declarações de parte do gerente da requerente do arresto, dando de barato que o custo dos serviços e trabalhos executados na moradia deveria ser suportado pelo seu beneficiário, e que esse formalmente seria a requerida mas materialmente o DD e a CC, caberia a estes providenciar pelo dinheiro a tal necessário, designadamente para o efeito entregando as correspondentes quantias nas contas bancárias dos requeridos AA e BB, que por sua vez as encaminhariam para a conta bancária da requerida “B..., Ldª”, com vista ao pagamento, na contabilidade registando-se esses valores como suprimentos [veja-se o teor das declarações do gerente da requerente do arresto – 40m45s a 42m00s («tínhamos que rodar dinheiro») e 55m50s a 58m05s].
Logo, consequência necessária, a matéria de facto indiciariamente provada nos autos deve ser expurgada de qualquer elemento que se refira a um tal acordo juridicamente vinculante alegadamente celebrado em 2021 ou 2022, que simplesmente inexistiu, bem como das referências à actuação de requerente e requerida “B..., Ldª”, no simples desenvolvimento das respectivas actividades comerciais - designadamente, quanto aos pontos 3- a 6-, a simples audição das declarações prestadas pelo DD liminarmente afastam a conclusão de a requerente do arresto, actuando no exercício da sua actividade comercial, ter prestado serviços e fornecido bens à requerida a pedido desta, ou que esses bens e serviços tenham sido usufruídos pela requerida enquanto entidade jurídica distinta e autónoma.

b)
As partes, entre muitas outras coisas, estão ainda em dissenso relativamente aos concretos trabalhos de remodelação levados a cabo na moradia em questão, e respectivo custo.
Desde logo realça-se que o essencial da discordância dos recorrentes quanto a esta matéria se alicerça no depoimento da testemunha CC, evidentemente verdadeira interessada no destino da moradia do ... [o outro, obviamente, será o gerente da requerente do arresto, DD], referindo-se aquela ao preço de aquisição dessa moradia [€ 280.000,00 – 1h27m50 do depoimento prestado na manhã de 11 de Dezembro de 2024, valor que é compatível com a menção ao capital para aquisição (€230mil, a que terão acrescido os tais €50mil de capitais próprios), financiado por instituição bancária, indicado no documento nº 10 junto com o requerimento inicial (cópia da descrição e inscrições prediais relativas ao imóvel)], bem como ao seu actual valor [cerca de € 700mil/€800 mil –1h27m10s a 1h27m31s do depoimento prestado na manhã de 11 de Dezembro de 2024)], notoriamente incrementado, face ao valor de aquisição, pelas obras de remodelação levadas a cabo.
A mesma testemunha, se em audiência de julgamento analisou e contestou quase ponto por ponto o documento [orçamento] pela requerente do arresto apresentado com vista a discriminar os trabalhos executados e o seu valor, concluiu afirmando que todos os trabalhos de remodelação levados a cabo mostram-se pagos [embora sem juntar qualquer documentos comprovativos de pagamentos superiores a € 10 000,00], e que o custo global das obras terá ascendido a cerca de € 100 000,00 [34m50s do depoimento prestado na manhã de 11 de Dezembro de 2024].
Com todo o devido respeito, a mera ponderação dos valores em presença com toda a segurança diz-nos não ser de todo crível este segmento do depoimento da testemunha CC – não se pode aceitar, apenas pela simples consideração do declarado por uma das principais interessadas no desfecho do litígio, que a mera execução de trabalhos no valor de € 100.000,00 num imóvel cujo preço de compra ascende a € 280.000,00 redunde numa valorização de cerca de € 500.000,00.
Neste sentido, ainda que se admita que o depoimento das testemunhas PP [técnico de construção civil, funcionário da “A..., Ldª”, desde Setembro de 2017, tendo em audiência declarado ter efectuado a orçamentação e acompanhamento da obra de remodelação], QQ [encarregado da construção civil, funcionário da “A..., Ldª”, há cerca de 9 anos, tendo em audiência declarado ter liderado uma equipe de operários nas obras que foram executadas na moradia em questão nos autos] e FF [electricista, tendo em audiência de julgamento declarado ter prestado na mesma moradia serviços relativos às especialidades de electricidade e águas] em tese possa ter sofrer alguma influência decorrente dos seus especiais vínculos profissionais ao grupo económico administrado pelo DD, essa teórica influência em nada se compara com o óbvio, estrutural e específico interesse da CC no desfecho da lide.
E, mais importante, ouvido o teor dos depoimentos prestados, em concreto afigura-se que as testemunhas PP, QQ e FF, descrevendo os trabalhos em que tomaram parte e o custo que aos mesmos na sua perspectiva lhes deve ser associado, nessa matéria mostram-se indiciariamente credíveis.
Aqui chegados, finalmente entremos, ponto por ponto, na análise dos factos impugnados.

Os pontos 3- e 5- a 7- do elenco dos factos provados
Como acima se referiu, dos meios probatórios produzidos nos autos resulta que os trabalhos que os meios técnicos e humanos da “A..., Ldª”, terão levado a cabo na moradia que constituía a casa de morada de família do DD e da CC não foram, de todo, fruto de um simples pedido da parte da requerida “B..., Ldª”, nem muito menos corresponderam ao mero exercício da actividade comercial das 2 sociedades.
Verdadeiramente, como acima se referiu, não há elementos que permitam afirmar, ainda que indiciariamente, que a “A..., Ldª”, prestou serviços e forneceu bens à “B..., Ldª”, actuando esta enquanto pessoa jurídica autónoma e dotada de um substrato pessoal e patrimonial independente do DD e da CC; pelo contrário havendo, como se referiu, claros indícios da utilização da “B..., Ldª”, para um fim que nada tem que ver com o desenvolvimento de uma actividade comercial, designadamente no que se refere aos trabalhos levados a cabo na moradia.
Logo, quanto mais não seja por aplicação das regras do ónus da prova, toda esta matéria deve ser incluída no elenco dos factos não provados.

O ponto 4- do elenco dos factos provados
Indiscutivelmente, funcionários a mando da “A..., Ldª”, levaram a cabo trabalhos de reabilitação, e de construção civil, numa moradia sita na ..., entre 2021 e 2023, designadamente os descritos no anexo à factura nº ... – é o que resulta, como se referiu, do depoimento das testemunhas PP, QQ e FF.
Mas, remetendo para o que acima se deixou dito a propósito da análise do ponto 3- da matéria de facto provada, deve retirar-se a este ponto dos factos provados qualquer referência que induza a existência de um acordo a esse propósito celebrado entre a requerente e a requerida “B..., Ldª”.
Assim, este ponto deve passar a constar no elenco dos factos provados com o seguinte texto: «Trabalhadores a mando da “A..., Ldª”, levaram a cabo serviços de reabilitação, e trabalhos gerais de construção civil, numa moradia familiar sita na ..., entre 2021 e 2023, designadamente os que se encontram descritos no auto de medição anexo à factura da “A..., Ldª”, n.º ..., no valor total de € 305 945,53».

O ponto 8- do elenco dos factos provados
Não há qualquer notícia de a requerida “B..., Ldª”, ter apresentado seja que reclamação for quanto aos trabalhos de remodelação levados a cabo na moradia de que pelo menos formalmente é proprietária.
E os recorrentes, verdadeiramente, não afirmam o contrário.
Inexiste fundamento para alterar o decidido a este propósito.

O ponto 9- do elenco dos factos provados
A emissão da factura e o seu envio à requerida “B..., Ldª”, constitui uma evidência, que resulta da simples consideração, entre o mais, do documento nº 6 junto com o requerimento inicial, além de, obviamente, se tratar de facto que os recorrentes nem sequer contestam.
Também quanto a este ponto os meios de prova produzidos obviamente impõem a manutenção do decidido.

Os pontos 10- e 11- do elenco dos factos provados
Esta matéria refere-se ao tratamento contabilístico, tanto nos serviços administrativos da requerente do arresto, como nos serviços administrativos da requerida “B..., Ldª”, da factura cujo pagamento a “A..., Ldª”, reclama nestes autos.
Esta factura, como se referiu, reporta-se a trabalhos e bens que verdadeiramente não foram solicitados pela requerida “B..., Ldª”.
A testemunha OO [contabilista que até final de 2023 assegurou a contabilidade da requerida “B..., Ldª”, sendo desde há anos o contabilista responsável pela contabilidade da “A..., Ldª”,] em audiência de julgamento declarou que a factura foi emitida pela “A..., Ldª”, e foi por si registada na contabilidade da requerida “B..., Ldª”, o que os próprios requeridos aceitam, independentemente de entenderem que tal não deveria ter sucedido.
A devolução da factura em Abril de 2024 mostra-se sem qualquer dúvida documentada nos autos.
Logo, estes são os factos objectivos que devem ser vertidos na matéria de facto provada.
Assim, os pontos 10- e 11- da matéria de facto provada devem ser unificados num único ponto, com a seguinte redacção: «Os serviços administrativos da requerida “B..., Ldª”, inicialmente registaram na contabilidade desta a referida factura, posteriormente devolvendo-a à “A..., Ldª”, por comunicação de 03 de Abril de 2024».

O ponto 17- do elenco dos factos provados
Dir-se-ia obviamente, deve excluir-se da reapreciação da decisão sobre a matéria de facto os juízos conclusivos ou que encerram apreciações iminentemente jurídicas.
Embora nem sempre se mostre desprovida de escolhos a tarefa de estabelecer a linha limite entre a matéria de facto e a matéria de direito, afigura-se pacífico na doutrina e na jurisprudência nacionais que, para efeitos processuais, tudo o que respeita ao apuramento de ocorrências da vida real é questão de facto, constituindo apreciação de direito tudo o que diz respeito à interpretação e aplicação da lei.
No âmbito da matéria de facto processualmente relevante inserem-se todos os acontecimentos concretos da vida, reais ou hipotéticos, que sirvam de pressuposto às normas legais aplicáveis: os acontecimentos externos (realidades do mundo exterior) e os acontecimentos internos (realidades psíquicas ou emocionais do indivíduo), sendo indiferente que o respectivo conhecimento se atinja directamente pelos sentidos ou se alcance através das regras da experiência (juízos empíricos) [neste sentido, veja-se o ensinamento de Manuel Andrade, in “Noções Elementares de Processo Civil”, 2ª Edição, Coimbra Editora, 1963, páginas 180/181; e de Artur Anselmo de Castro, “Direito Processual Civil Declaratório”, volume III, Almedina, Coimbra, 1982, página 268].
Em função do concreto objecto do litígio, os juízos valorativos poderão ou não integrar a questão-de-facto do processo – determinante será, em qualquer caso, que não contenham valoração jurídica que esgote a solução final do litígio.
Para dar um exemplo de escola, numa acção de despejo em que autor e réu estão de acordo quanto à titularidade do direito de propriedade sobre o imóvel, centrando-se o dissenso na manutenção/cessação do vínculo locatício, será razoável que se faça constar da matéria de facto provada que o imóvel é propriedade do autor e foi dado de arrendamento ao réu; pelo contrário, discutindo-se a causa jurídica da aquisição do direito de propriedade, não se poderá admitir que do elenco dos factos provados conste que qualquer das partes adquiriu a coisa, sendo aquela sua pertença.
No caso, a requerente do arresto entre o mais invoca ser titular de um crédito perante a requerida “B..., Ldª”, e, alegando fundado receio da perda da garantia patrimonial desse crédito, pede o arresto de determinados bens.
Logo, simplisticamente afirmar que «A dívida da Requerida à Requerente ascende no presente ao montante global de € 321 649,34, juros incluídos» esgota uma parte nuclear do objecto do litígio e da apreciação jurídica a realizar noutro plano – o que obviamente não deve ser permitido.
Assim, por notoriamente encerrar matéria exclusivamente jurídica, deve determinar-se a eliminação da matéria actualmente vertida no ponto 17- do elenco dos factos provados.

O ponto 28- do elenco dos factos provados
Esta matéria refere-se à avaliação do património da sociedade “C..., Unipessoal, Ldª”, designadamente os cavalos denominados de “HH” e “II”.
Em primeiro lugar, recorda-se que, independentemente dos documentos destinados à demonstração dos factos relevantes no processo, a fixação destes deve ser feita por referência à data mais próxima que pode ser atendida pelo tribunal – o encerramento da audiência em primeira instância [parte final do nº 1 do artigo 611º do Código de Processo Civil].
A audiência de julgamento destinada à apreciação da oposição deduzida pelos requeridos concluiu-se a 11 de Dezembro de 2024 [cfr acta desse dia, referência nº 136222008].
Logo, o falecimento do equídeo de nome “HH” a 30 de Dezembro de 2024 constitui facto que, por lei expressa, obviamente aqui não pode ser considerado – do que resulta a total irrelevância para o desfecho dos presentes autos do documento junto com as alegações apresentadas pelos recorrentes.
Assim sendo, como deve ser, afigura-se notório que do depoimento da testemunha RR [gerente de um centro hípico onde habitualmente são treinados os cavalos pertença da sociedade “C..., Unipessoal, Ldª”, confirmando a avaliação que dos mesmos fez e que resulta do último documento junto aos autos através do requerimento de 15 de Maio de 2024 (referência nº 16157129)] resulta indiciariamente apurado o valor de tais cavalos a 11 de Dezembro de 2024, não se vislumbrando absolutamente nenhum motivo para fazer prevalecer sobre a opinião deste aparente especialista na matéria o vagamente declarado pela testemunha CC.
Também aqui não se vislumbra fundamento para alterar o sentido da decisão proferida em 1ª instância.

Os pontos 30- e 31- do elenco dos factos provados
Estes pontos essencialmente possuem 2 segmentos – o primeiro referente à constatação da alienação da quota da sociedade “C..., Ldª”, a um sócio e gerente [o que linearmente resulta do documento nº 7 junto com o requerimento inicial]; o segundo referente ao significado de tal alienação no plano da garantia de satisfação do crédito de que a requerente do arresto se arroga titular.
Ora, como se disse, a afirmação de um crédito da requerente perante a requerida integra o objecto dos presentes autos, e constitui um dos pressupostos de cuja afirmação depende o decretamento/indeferimento da presente providência.
Logo, a afirmação de um tal crédito, o seu montante e as suas características, simplesmente não pode nem deve constar da matéria de facto provada.
Pelo que estes pontos devem ser substituídos pela simples constatação da transmissão da quota, passando a constar do seguinte modo: «Por negócio inscrito no registo comercial a 15 de Dezembro de 2023, a requerida decidiu transmitir ao requerido AA, pela quantia de € 1 000,00, a quota de que era titular na sociedade “C..., Ldª”».

Os pontos 32- e 33- do elenco dos factos provados
A simples constatação da alienação pelo valor de € 1.000,00 de participação numa sociedade em cujo património se integram bens de valor superior a € 65.000,00 naturalmente afecta a garantia geral de satisfação dos créditos que representa o património de um devedor.
E, ainda que se admita que em tese poderão existir boas razões de natureza fiscal para celebrar um negócio com um tal conteúdo, a verdade é que os recorrentes não se dignaram sequer indicar em concreto quais foram – que era o que se lhes exigia.
Consequentemente, a simples e notória disparidade entre o valor da alienação e o valor real do património social, conjugada com o evidente litígio entre os requeridos AA e BB e a testemunha CC, de um lado, e o DD, de outro, afigura-se suficiente para indiciariamente concluir, face ao que se entende constituir a absoluta normalidade do acontecer, e na ausência de qualquer outra explicação, que na origem de tal negócio esteve a intenção de defraudar a garantia patrimonial de terceiros.
É, salvo sempre melhor opinião, quanto basta para manter no elenco dos factos provados o juízo de demonstração de tal intenção, embora expurgando da concreta redacção adoptada, novamente pelos motivos acima indicados, qualquer menção a um crédito da requerente perante a requerida “B..., Ldª”.
Assim, os ponto 32- e 33- da matéria de facto indiciariamente provada deverão passar a constar da seguinte forma:
«AA não ignora – pela posição que ocupa na sociedade Requerida – que a alienação da quota da sociedade “C..., Unipessoal, Ldª”, prejudica os credores da Requerente, e constitui uma diminuição da garantia patrimonial destes»;
«A alienação da quota da sociedade “C..., Unipessoal, Ldª”, teve lugar apenas com o objetivo de dissipar património da “B..., Ldª”».

O ponto 44- do elenco dos factos provados
Estamos aqui perante mera repetição do que acima se afirmou dever ser vertido no ponto 4- da matéria de facto indiciariamente provada.
Pelo que apenas cumpre determinar a eliminação deste ponto 44-.

O ponto 47- do elenco dos factos provados
Não obstante no corpo das suas alegações e nas conclusões os recorrentes expressamente abrangerem esta matéria na sua discordância quanto à decisão sobre a matéria de facto, em ponto algum do seu recurso [alegações e conclusões] sequer se referem aos concretos meios probatórios que, na sua perspectiva, impõe decisão diversa da proferida.
O que, atento o disposto no nº 1 do artigo 640º do Código de Processo Civil, deve implicar a rejeição do recurso nesta parte.
O que se determina.

O ponto 50- do elenco dos factos provados
O único argumento que os recorrentes adiantam para alicerçar a sua discordância face a este ponto da matéria de facto reconduz-se à mera possibilidade de a requerida “B..., Ldª”, angariar outros rendimentos com o desenvolvimento da sua actividade social – mas nem sequer minimamente concretizam qualquer outro concreto negócio susceptível de gerar rendimento em que esta requerida intervenha ou tenha perspectiva de intervir, além do contrato de locação da moradia em causa no processo.
Logo, se em teoria é possível que a requerida “B..., Ldª”, desenvolva outra actividade, na prática e em concreto, e até 11 de Dezembro de 2024, a única actividade susceptível de gerar rendimento em que tem intervenção reconduz-se ao contrato de locação que pelo menos formalmente celebrou com a CC e o DD relativamente à dita moradia.
Não foi produzido meio de prova que imponha decisão diversa da proferida.

O ponto 51- do elenco dos factos provados
O único meio de prova de que se retira mínima referência a esta matéria reconduz-se às declarações de parte do gerente da requerente, DD – que, como por mais de uma vez se referiu, possui um interesse pessoal e directo no desfecho da presente lide, interesse que transcende a simples actuação como legal representante da “A..., Ldª”.
E, tendo presente que o mesmo declarante nada logrou concretizar a propósito dessa suposta intenção de venda, afigura-se claro que a simples aplicação das regras do ónus da prova impõem a alteração do juízo probatório quanto a este facto, que por isso deve ser incluído no elenco dos factos não provados.

Os pontos 52- e 53- do elenco dos factos provados
Encontramo-nos aqui, mais uma vez, perante afirmações notoriamente conclusivas e que esgotam, de per si, uma parte substancial do objecto do processo [a incapacidade de fazer face ao pagamento de dívidas; o justo receio de perda de garantia patrimonial].
Logo, pelos motivos acima referidos a propósito da análise do ponto 17- do elenco dos factos provados, deve simplesmente determinar-se a exclusão desta matéria.

Os pontos c), d) e e) do elenco dos factos não provados
Os únicos meios de prova que os recorridos invocam em favor da sua tese reconduzem-se ao depoimento da testemunha CC e à peça processual pelo DD apresentada no âmbito do processo nº 42/24.0T8AVR, do Juízo Central Cível de Aveiro, Juiz 2 [designadamente nos artigos 171º e 172º da sua petição inicial, onde afirma que as obras em causa nos autos foram executadas «através de umas das sociedades de que o A. é sócio e administrador, A..., Lda., o A. decidiu realizar obras na Casa do ..., de valor não inferior a € 335.342,53 (…), valor que a sociedade Ré não pagou, por tolerância do A., que assim determinou»].
Está em causa a obrigação de pagamento dos trabalhos e obra executados na moradia destinada à habitação do casal CC e DD.
Principiando por analisar o segundo argumento invocado pelos recorrentes, e com todo o devido respeito, de todo não se vê a força que aparentemente lhe atribuem.
É que o autor no processo nº 42/24.0T8AVR não declara que o valor das obras jamais e em qualquer situação deveria ser pago pela ali ré e aqui requerida “B..., Ldª”, mas apenas que, até essa data, não havia sido pago por esta, por tolerância do mesmo DD – o que, se facilmente se compreende perspectivando a requerida “B..., Ldª”, como mero mecanismo ao serviço da protecção de uma parte património do DD [como este, nestes autos, declarou constituir a função da requerida “B..., Ldª”, pelo menos até Outubro de 2023 – se se vê e usa um determinado ente como mera fachada de protecção face à ação de terceiros, obviamente não tem sentido exigir-lhe o cumprimento de uma obrigação de pagamento que no fundo é própria], deixa de possuir razão de ser a partir do momento em que a requerida cessa de estar sob o controlo do mesmo DD, deixando este de ter, por isso, motivo para a «tolerância com o não pagamento».
Ou seja, o afirmado no âmbito do processo nº 42/24.0T8AVR tem um óbvio pressuposto – precisamente o nesse procedimento expressamente invocado direito do DD a obter dos aí réus e aqui requeridos AA e BB as quotas na sociedade “B..., Ldª”, pressuposto que nem sequer foi afirmado nestes autos, em que se parte [também indevidamente, como acima se viu] da total autonomia entre as sociedades “B..., Ldª”, e “A..., Ldª”.
Mas o que neste momento no essencial releva será a total falta de credibilidade, face ao que se considera a absoluta normalidade do acontecer, da alegação de as obras e os trabalhos executados na moradia «do ...» terem sido feitos a preços reduzidos ou gratuitamente, sem qualquer contrapartida além da promessa de adjudicação de obras futuras – considera-se uma evidência que as obras e os trabalhos executados seguramente teriam de ser pagos a quem os realizou e executou, se não pela requerida “B..., Ldª”, pelo menos pelo casal CC e DD a título pessoal [através do mecanismo a que o DD tão expressivamente se referiu no final das suas declarações - «rodar o dinheiro»].
E, por isso, considera-se o em contrário declarado pela testemunha CC notoriamente insuficiente para abalar a regra de normalidade acima enunciada [até porque esta testemunha não logrou concretizar uma única situação em que o que afirmou teria ocorrido].
Do que decorre, ao contrário do defendido pelos recorrentes, não terem sido produzidos meios de prova que imponham a alteração do juízo que determinou a inclusão dos pontos c), d) e e) no elenco dos factos não provados.
Também aqui improcede o recurso.

Os pontos h) e i) do elenco dos factos não provados
A emissão envio da factura cuja cobrança se encontra na base dos presentes autos constitui uma evidência, afigurando-se notório que os recorrentes não o contestam – a discordância antes se centra, notoriamente, nos valores e trabalhos na mesma inscritos, que os recorrentes defendem não corresponder à realidade.
Ora, esta matéria mostra-se já analisada a propósito da fundamentação dos pontos 3- e 4- da matéria de facto provada, para aí se remetendo a tal propósito.
Também aqui não se vislumbra ter sido produzido meio de prova que imponha decisão diversa da proferida.
**
*
Aqui chegados, e por forma a permitir a melhor compreensão do decidido, deixa-se consignado que a matéria de facto relevante nos autos passa a constar da seguinte forma:
Factos Provados
Da decisão inicial no processo:
1- A Requerente A..., Lda, é uma sociedade comercial por quotas que tem por objeto e atividade a construção civil e obras públicas, compra, venda e permuta de bens imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim; promoção imobiliária; prestação de serviços de consultoria, orientação e assistência operacional a empresas e/ou organismos públicos ou privados em matéria de planeamento, organização, controlo, informação, gestão e reorganização de empresas; consultoria sobre engenharia e segurança e higiene no trabalho; importação e comercialização de cimento embalado a grossistas, retalhistas e empresas de construção – fls. 18/20v..
2- A 1ª Requerida B..., Lda, é uma sociedade comercial por quotas, e tem por objeto a compra, venda e locação de imóveis, revenda dos adquiridos para qualquer daqueles fins, construção e gestão de imóveis; prestação de serviços de engenharia e consultoria para negócios – fls. 21/22.
3- Trabalhadores a mando da “A..., Ldª”, levaram a cabo serviços de reabilitação, e trabalhos gerais de construção civil, numa moradia familiar sita na ..., entre 2021 e 2023, designadamente os que se encontram descritos no auto de medição anexo à factura da “A..., Ldª”, n.º ..., no valor total de € 305 945,53.
4- A Requerida não apresentou qualquer reclamação.
5- O original da fatura foi, em devido tempo, enviado à Requerida.
6- Os serviços administrativos da requerida “B..., Ldª”, inicialmente registaram na contabilidade desta a referida factura, posteriormente devolvendo-a à “A..., Ldª”, por comunicação de 03 de Abril de 2024.
7- Tendo alegado que a atual gerência não reconhece «(...) terem sido prestados quaisquer serviços, ou fornecidos quaisquer bens (…) pelo que não terá aquela qualquer tratamento contabilístico e fiscal» - fls. 49v..
8- No dia 09/04/2024, a Requerente remeteu novamente a fatura n.º ... à 1ª Requerida – fls. 50/51.
9- E comunicou à 1ª Requerida que não aceita qualquer devolução, e que tal apenas pode ocorrer por má-fé ou com o intuito de se eximir ao respetivo pagamento.
10- A Requerente tem tentado, por diversas formas, receber este seu crédito, instando insistentemente a 1ª Requerida a satisfazer o devido pagamento, contudo, até à presente data, a Requerida não efetuou o pagamento de quaisquer quantias.
11- E declarou que não o fará.
12- São sócios da 1ª Requerida AA e BB – fls. 21.
13- E foram gerentes da Requerida DD e CC – fls. 21v..
14- Pela AP ..., de 03/11/2023, foi levada a registo: a) a deliberação dos sócios da Requerida que destituiu DD do cargo de gerente; b) a renúncia ao cargo de gerente apresentada por CC – fls. 21v..
15- Posteriormente, pela Insc. 3 AP. ... de 03/11/2023, foi registada a nomeação dos dois sócios da Requerida como gerentes da sociedade – fls. 21v./22.
16- Até 05/12/2023, a 1ª Requerida detinha a única quota, no valor nominal de € 1.000,00, representativa de 100 % do capital social, da sociedade C..., Unipessoal, L.da, NIPC ..., com sede na Zona Industrial ..., rua ..., lote ..., ..., e que tem por objeto a prestação de serviços de engenharia e consultoria para negócios; e a criação de equinos, asininos e muares – fls. 51v./52v..
17- Nessa data, AA e BB, na qualidade de sócios e gerentes da 1ª Requerida, deliberaram transmitir a AA, casado sob o regime de comunhão de adquiridos com BB, a quota que a 1ª Requerida detinha na sociedade C..., Unipessoal, L.da, pelo preço de € 1.000,00, correspondente ao valor nominal da quota – fls. 53v./54 e 56v./57.
18- O que foi levado a registo no dia 15/12/2023 – fls. 52/52v..
19- O capital próprio contabilisticamente registado da sociedade C..., Unipessoal, Lda, é de € 15.392,60 – fls. 57v./88v. (fls. 59v.).
20- A sociedade C..., Unipessoal, Lda, tem um ativo fixo tangível contabilisticamente registado no valor de € 14.668,16 – fls. 59v..
21- Este valor corresponde, na prática, a dois equinos (designados de HH e II) contabilizados pelo respetivo valor de aquisição.
22- Mas cujo valor atual é de cerca de € 42.500,00 o primeiro, e de cerca de € 26.000,00 o segundo.
23- O sócio da 1ª Requerida deliberou, em 05/12/2023, nomear-se a si mesmo como gerente da sociedade C..., Unipessoal, L.da – vide AP. ... de 14/02/2024 (fls. 52 e fls. 54v./55).
24- Por negócio inscrito no registo comercial a 15 de Dezembro de 2023, a requerida decidiu transmitir ao requerido AA, pela quantia de € 1 000,00, a quota de que era titular na sociedade “C..., Ldª”.
25- AA não ignora – pela posição que ocupa na sociedade Requerida – que a alienação da quota da sociedade “C..., Unipessoal, Ldª”, prejudica os credores da Requerente, e constitui uma diminuição da garantia patrimonial destes.
26- A alienação da quota da sociedade “C..., Unipessoal, Ldª”, teve lugar apenas com o objetivo de dissipar património da “B..., Ldª”.
27- Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Oliveira de Bairro, sob o nº ... da freguesia ..., o seguinte prédio: rústico, situado em ..., com a área total e descoberta de 3790 m2, inscrito na respetiva matriz predial rústica sob o artigo ... – fls. 91v./92.
28- Este prédio encontra-se inscrito, pela AP. ... de 2018/06/21, a favor de B..., L.da, por compra a AA e BB – fls. 91v..
29- O seu valor patrimonial atual, determinado no ano de 1989, é de € 135,25 – fls. 93.
30- Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Oliveira de Bairro, sob o nº ... da freguesia ..., o seguinte prédio: rústico, situado em ..., com a área total e descoberta de 1900 m2, inscrito na respetiva matriz predial rústica sob o artigo ... – fls. 90v./91.
31- Este prédio encontra-se inscrito, pela AP. ... de 2022/12/29, a favor de B..., Lda, por compra a E... Unipessoal, Lda – fls. 90v..
32- O seu valor patrimonial tributário atual, determinado no ano de 1989, é de € 10,94 – fls. 92v..
33- Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Oliveira de Bairro, sob o nº ... da freguesia ..., o seguinte prédio: urbano, situado em ..., com a área total de 5606 m2, á área coberta de 292 m2 e a área descoberta de 5314 m2, a confrontar, do norte, com caminho, do nascente, com JJ, do sul, com estrada, e, do poente, com KK, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ... – fls. 89/90.
34- Este prédio encontra-se inscrito, pela AP. ... de 2020/12/03, a favor de B..., Lda, por compra a LL – fls. 89.
35- Foi inscrita, pela AP. ... de 2020/12/03, hipoteca voluntária a favor de Banco 1..., pelo capital de 230.000,00 e o montante máximo assegurado de € 328.900,00, para garantia de empréstimo – fls. 89v..
36- O valor patrimonial tributário atual do prédio identificado em 40- dos Factos Provados, determinado em 2023, é de € 168.632,98 – fls. 93v./94.
37- O valor do referido imóvel, com o valor incorporado pelas obras realizadas pela Requerente, é hoje não inferior a € 400.000,00.
38- O imóvel identificado em 40- a 42- dos Factos Provados encontra-se arrendado a DD e CC pelo valor mensal de € 2.660,00 – fls. 94v./95v. e fls. 179.
39- A Requerida não efetuou o pagamento dos serviços que lhe foram prestados pela sociedade D..., Lda, razão pela qual esta apresentou requerimento de injunção contra a Requerida, no valor de € 6.194,58, ao qual foi atribuído o n.º de processo 38384/24.2YIPRT – fls. 96v./97.
40- A Requerida também não efetuou o pagamento dos serviços prestados por FF, relacionados com as obras realizadas a pedido da Requerente.
41- No dia 13/03/2024 FF apresentou requerimento de injunção contra a Requerida no valor de € 30.372,46, ao qual foi atribuído o n.º 33883/24.9YIPRT – fls. 97v./98v..
42- O valor da renda do referido bem imóvel é a única receita da Requerida.

Da decisão proferida em sede de oposição:
43- A sociedade requerente tem como sócios DD, a sua irmã MM, e o seu pai, NN – fls. 18/22.
44- A sociedade requerente é uma de muitas que constituem o grupo F..., nas quais se incluem, além do mais, as seguintes sociedades:
a. G..., Lda, nipc ..., que tem como objeto transportes rodoviários de mercadorias por conta de outrem; comercialização de materiais de construção; aluguer de máquinas e equipamentos para a construção civil; prestação de serviços logísticos e operacionais que inclui o planeamento, controlo, coordenação e direção de operações relacionadas com a expedição, receção, armazenamento e circulação de bens ou mercadorias; e como sócio (entre outros) DD, que é igualmente gerente – fls. 230v./232v.;
b. H..., Lda, nipc ..., que tem como objeto fabricação de betão pronto e de outros produtos de betão, gesso e cimento, e como sócio (entre outros) DD, que é igualmente gerente – fls. 233/234v.;
c. I..., Lda, nipc ..., que tem como objeto comércio de materiais para a construção civil e obras públicas, e como sócia (entre outros) a sociedade H..., Lda, nipc ..., sendo DD o respetivo gerente – fls. 235/236v.;
d. J..., Lda, nipc ..., que tem como objeto a extração, comercialização de saibro, areia e pedra britada, tratamento e eliminação de resíduos inertes, valorização de resíduos metálicos e não metálicos, e como sócio (entre outros) DD, que é igualmente gerente – fls. 237/239v.;
e. K..., Lda. (anteriormente denominada por L... Lda), nipc ..., que tem como objeto a prestação de serviços de laboratório e análises técnicas, nomeadamente ensaios a produtos de construção civil, e como sócio (entre outros) DD, que é igualmente gerente – fls. 240/241.
45- DD e CC contraíram matrimónio católico, sem convenção antenupcial, a 26/12/2009 – fls. 241v..
46- Os trabalhos de reabilitação da moradia unifamiliar existente no prédio urbano sito em ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Oliveira do Bairro sob o nº 3126 da freguesia ..., ... e ..., iniciaram-se no princípio de 2021 e foram orientados por DD e CC.
47- DD e CC começaram a habitar a referida moradia em novembro de 2021.
48- Em setembro de 2023, CC, filha dos Requeridos AA e BB, abandonou a casa do ..., na companhia das filhas, tendo intentado a competente ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge (Processo n.º 3221/23.4T8AVR, Juízo de Família e Menores de Oliveira do Bairro) – fls. 242v./250v..
49- DD e CC não se entendem quanto à partilha do acervo patrimonial do casal, o que deu início a conflitualidade e litigância judicial entre ambos e com os Requeridos AA e BB.
50- Os sócios e atuais gerentes da Requerida apenas tiveram conhecimento da fatura ......, junta com a petição inicial como documento nº 3, em meados de março de 2024, altura em que foi transmitida a contabilidade à nova contabilista certificada por si nomeada em substituição do Dr. OO – após diversas tentativas frustradas –, que anteriormente havia desempenhado tais funções por motivos de comodidade e proximidade, atento ser funcionário do Grupo F... – fls. 251/253.
51- O trabalho de montagem e desmontagem de andaimes foi realizado pela empresa M..., Unipessoal, L.da, e importou em € 5.846,00 – fls. 253v./260.
52- A retirada da telha do telhado e a aplicação de nova telha foi feita pela sociedade N..., L.da, pelo preço de € 3.813,00, com ajuda de um trabalhador da sociedade Requerente e com recurso aos meios elevatórios da sociedade G..., L.da – fls. 260v./261v..
53- DD instaurou contra os ora Requeridos AA e mulher BB a ação de processo comum nº 431/24.0T8CBR, que corre termos no Juízo de Competência Genérica de Oliveira do Bairro, no qual aquele peticiona a condenação daqueles a restituírem-lhe o veículo automóvel da marca Mercedes-Benz, matrícula ..-JI-.. – fls. 269/331v..
54- A ora Requerente A..., Lda, instaurou contra a ora Requerida B..., Lda, o processo de insolvência que corre termos sob o nº 2645/24.4T8AVR no Juízo de Comércio de Aveiro – fls. 332/353v..
55- DD instaurou contra os ora Requeridos AA, BB, Lda, a ação de processo comum nº 42/24.0T8AVR, que corre termos no Juízo Central Cível de Aveiro – Juiz 2 – fls. 354/384v..
56- No processo nº 38384/24.2YIPRT instaurado por D..., Lda, contra a ora Requerida B..., L.da (referido no nº 47 dos Factos Provados da decisão proferida a 18/06/2024), foi proferida sentença, a 08/09/2024, que absolveu B..., L.da, dos pedidos – documento junto com o requerimento de 13/09/2024.
57- As injunções nº 38384/24.2YIPRT e nº 33883/24.9YIPRT (referidas nos nºs. 47 e 49 dos Factos Provados da decisão proferida a 18/06/2024) foram instauradas, respetivamente, a 15/03/2024 e 13/03/2024 – fls. 385/385v. e 386/386v..
58- D..., Lda, e FF mantêm relações comerciais com o Grupo F....
59- Foi inscrito, pelo Averb. AP. ... de 2024/08/20 à descrição predial nº ...-... da Conservatória do Registo Predial de Oliveira de Bairro, a transmissão do crédito da Banco 1..., CRL, no montante de € 182.096,92, a favor de DD, casado com CC na comunhão de adquiridos – fls. 430/431v..
60- O valor deste imóvel é hoje não inferior a € 600.000,00.
61- A Banco 1..., CRL, enviou à gerência de B..., L.da, com conhecimento de DD e CC, a carta junta a fls. 396v. a 398v., datada de 09/08/2024, que indica como assunto “resolução do contrato de empréstimo nº ... correspondente à proposta nº ...”, na qual refere, em resumo, que: a) nos termos do parágrafo 1 da Cláusula Sexta do documento complementar que constitui parte integrante da escritura pública de compra e venda, mútuo com hipoteca e fiança, outorgada no dia 03/12/2020, a Banco 1..., enquanto mutuante, pode resolver o contrato de empréstimo e considerar automática e imediatamente vencidas e exigíveis todas e cada uma das obrigações assumidas pela sociedade mutuária se o imóvel hipotecado foi objeto de execução, penhora, arresto ou outra forma de apreensão (…) – alínea d) da referida cláusula sexta; b) a alínea f) da mesma cláusula prevê que a resolução do contrato de financiamento ocorre sempre que “for declarada ou requerida a insolvência da mutuária e/ou dos fiadores”; c) nos termos da alínea a) do parágrafo 1 da Cláusula Sexta, a Mutuante pode também resolver o contrato se não for paga alguma das prestações, de capital e de juros; d) a Banco 1... constatou que a prestação vencida, em 03/08/2024, foi apenas paga parcialmente, encontrando-se em mora, nesta data, por mais de metade do seu valor. Tudo assim fundamenta a resolução do contrato de empréstimo nº ... correspondente à proposta nº ..., que aqui e desde já se declara. Deverão proceder, no prazo de 3 dias a contar da receção desta comunicação, à regularização imediata de todas as responsabilidades emergentes do referido contrato de empréstimo no valor global atual de € 182.288,10.
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Factos Não Provados:
a) no exercício da sua atividade comercial, a Requerente prestou serviços e forneceu bens à 1ª Requerida, a pedido desta, cuja especificação, qualidade, quantidade e preço constam da Fatura n.º ..., emitida no dia 02/11/2023, com data de vencimento no dia 02/12/2023, no valor total de € 305.945,53 – fls. 22v./25;
b) a Requerente forneceu ainda à Requerida os bens/materiais necessários à realização daqueles trabalhos;
c) os serviços foram prestados à Requerida e usufruídos por esta;
d) os bens foram entregues à Requerida;
e) a requerida pretende transmitir o imóvel arrendado;
f) a maior parte das participações de DD nas empresas do “Grupo F...” serão também bens comuns do casal constituído por aquele e CC;
g) aquando da constituição da sociedade Requerida, os Requeridos AA e BB optaram por nomear a filha e o genro como gerentes atenta a circunstância de ambos serem experientes no que à gestão de empresas concerne, e por confiarem nos mesmos, atentos os laços que os uniam;
h) os gerentes ao tempo do início das obras (2021) determinaram que, uma vez que tinham acesso a uma vasta rede de bens e serviços de construção, por força da sua ligação às empresas do Grupo F..., iriam beneficiar de tal circunstância;
i) aplicando na execução dos trabalhos de reabilitação da casa bens e mão de obra pertencente a outras empresas do Grupo F..., sem qualquer contrapartida económica pela prestação de tais trabalhos, e fornecimento de tais bens, ou por preços reduzidos, como já havia sido feito noutras ocasiões;
j) e com recurso a prestadores e fornecedores de serviços parceiros das empresas do Grupo F..., e que, como tal, acederam em trabalhar com preços reduzidos, ou até gratuitamente, mediante a promessa de adjudicação de trabalhos em obras futuras no Grupo F...;
k) a partir de novembro de 2021 não foram realizadas, muito menos autorizadas, quaisquer obras de construção civil na casa do ...;
l) DD ameaçou quer a esposa, quer os sogros, que se iriam arrepender e que os deixaria sem nada;
m) DD, fazendo-se valer da circunstância de ao tempo ser gerente da sociedade Requerente mas também ainda ter controlo de facto sobre a sociedade Requerida, faz com que aquela emita a fatura junta aos autos como documento n.º 3, a 02/11/2023, no valor de € 305.945,53, por um valor arbitrariamente definido pelo mesmo, com vista a pressionar os Requeridos;
n) distribuindo depois esse valor nos mais diversos serviços efabulados e presentes no auto de medição que acompanha a fatura;
o) FF intentou a ação nº 33883/24.9YIPRT a mando de DD;
p) a Banco 1... aparenta fazer parte do conluio e a própria missiva da Banco 1... enviada aos Requeridos e a DD e CC, estes últimos na qualidade de fiadores, teve a intervenção de DD ou de alguém a seu mando, com vista a ficar titular do crédito da Banco 1... e que a hipoteca sobre o imóvel fique registada a seu favor.

C) e D)
Aqui chegados, resulta evidente que a decisão que decretou o arresto não se pode manter.
Segundo doutrina e jurisprudência absolutamente pacíficas de há mais de um século, o legislador processual civil português, quanto à exposição dos fundamentos de facto da acção [mesmo da acção cautelar], perfilhou a doutrina da substanciação, exigindo a indicação específica do facto constitutivo do direito de que o autor se arroga, e rotulando de deficiente a mera alusão genérica ao direito que se pretende tornar efectivo [cfr, sobre a matéria, Prof Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado” in Coimbra Editora, 3ª edição, volume II, página 350 e ss; e Prof Antunes Varela in “Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, 2ª edição, página 245, nota 2 (atente-se nas decisões jurisprudenciais referenciadas por este autor); no plano normativo, veja-se o disposto no nº 4 do artigo 581º Código de Processo Civil].
Esse facto jurídico concreto invocado como base do pedido formulado recebe a designação processual de causa de pedir.
A importância da clara apresentação da causa de pedir não é por demais salientar, já que é sobre essa concreta alegação que incidirá o esforço probatório das partes, e será porque o Tribunal a considera demonstrada que o pedido há-de ser julgado procedente.
A causa de pedir constitui, assim, a premissa lógico-jurídica em que simultaneamente o pedido e a decisão de procedência devem assentar.
Repetindo por outras palavras, como corolário do princípio do pedido, na decisão o juiz apenas em casos contados se pode servir de factos não articulados pelas partes [artigo 5º do Código de Processo Civil], sempre sem exceder [em qualidade e/ou quantidade] o pedido pelo autor [artigo 609º do Código de Processo Civil], princípios de que resulta a necessidade de correspondência, quer entre o facto de que o autor pretende fazer emergir o seu direito [nº 4 do artigo 581º do Código de Processo Civil] e o facto considerado como fundamento da condenação, quer entre o concretamente pedido e o concedido [artigo 260º do Código do Processo Civil].
Estas considerações mantêm-se plenamente válidas no âmbito de qualquer procedimento cautelar.
Ora, nestes autos, que facto invocou a requerente do arresto como causa do pedido formulado ?
Desde logo, que o seu crédito perante a “B..., Ldª”, funda-se em acordo juridicamente vinculante com esta celebrado, pelo qual a requerente se obrigou a levar a cabo determinada obra mediante o recebimento de um preço a pagar pela requerida – é o que linearmente resulta da simples leitura dos artigos 3º a 8º do requerimento inicial.
Ainda que se tratasse de um contrato de empreitada nulo por falta de forma [conforme declarado na acta de 11 de Dezembro de 2024, referência nº 136222008, e como a recorrida defende nas suas contra-alegações], o facto jurídico fundamento do pedido de condenação seria sempre esse acordo de vontades inválido.
Ora, manifestamente, não resultou demonstrada a outorga de qualquer acordo de vontades apto a permitir a conclusão, com fundamento na sua validade ou invalidade, pela vinculação da requerida “B..., Ldª”, a efectuar qualquer entrega em dinheiro à requerente – cfr alíneas a) a d) da matéria de facto não provada.
É certo que, a mando da requerente do arresto, foi executada obra num determinado imóvel que, pelo menos formalmente, parece integrar o património da requerida “B..., Ldª”.
Mas a causa da realização de tais obras, como em audiência de julgamento profusamente explicou o legal representante da requerente do arresto, DD, nada teve que ver com algum acordo de vontades entre requerente e requerida no exercício das respectivas actividades comerciais.
Escusado seria recordá-lo, é óbvio fundamento da concreta providência cautelar requerida a demonstração de um crédito do requerente sobre o requerido [nº 1 do artigo 391º do Código de Processo Civil].
Crédito que no caso em apreço não se encontra demonstrado, pelo menos que brote da causa jurídica apresentada.
No provimento do recurso, as decisões que decretaram o arresto [isto é, tanto a decisão proferida ainda antes do cumprimento do contraditório, como a decisão proferida em apreciação da oposição] devem ser revogadas.
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Sumário – nº 7 do artigo 663º do Código de Processo Civil:
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III - Dispositivo
Pelo exposto, acordam os Juízes que integram a 3ª secção deste Tribunal da Relação do Porto em, no provimento do recurso,
A) alterar a decisão sobre a matéria de facto, nos termos acima indicados;
B) revogar as decisões que em primeira instância decretaram o arresto de bens, cujo levantamento se determina.
Custas a cargo da recorrida – artigo 527º do Código de Processo Civil.
Notifique.

Porto, 4/6/2025
António Carneiro da Silva
Paulo Duarte Teixeira
José Manuel Correia