Quando o valor da coima não permite recurso para o tribunal da Relação, mas o recorrente invoca o disposto no n.º 2, do artigo 49.º, da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, o tribunal de 1.ª instância deve limitar-se a admitir o recurso e encaminhá-lo para o tribunal da Relação onde se apreciará se o recurso é ou não é admissível nos termos requeridos (melhoria da aplicação do direito/ promoção da uniformidade da jurisprudência).
I. Relatório
a) A presente reclamação dirigida ao despacho proferido no pretérito dia 31 de março, o qual não admitiu o recurso da ora Reclamante, relativo à decisão que manteve a coima aplicada pela autoridade administrativa, que foi no montante de 1.100,00 euros, insere-se num processo de recurso de contraordenação laboral – Regime Processual Aplicável às Contraordenações Laborais e de Segurança Social (Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro).
O despacho reclamado tem o seguinte teor:
«Considerando que foi aplicada uma coima de € 1.100,00 e atento o que dispõe o no artigo 49.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3, da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, não admito o recurso interposto pela arguida.
Para que se possa concluir pela admissibilidade do recurso para o Tribunal a título excecional na vertente de que tal se afigura -manifestamente necessário a melhoria da aplicação do direito- têm de estar em causa circunstâncias excecionais das quais resulte que é manifesta a necessidade da melhoria da aplicação do direito não bastando ser conveniente ou necessário. Tem de ter sido cometido um erro grosseiro incomum, ou uma errónea aplicação flagrante do direito, nele não se incluindo a mera discordância quanto a interpretação e aplicação do direito pelo tribunal recorrido (erro de julgamento).
E tal não se verifica manifestamente no caso vertente em que a requerente fundamenta a sua pretensão num erro sobre o julgamento da matéria de facto.
Custas pela arguida fixando-se no mínimo a taxa de justiça.»
A Reclamante argumenta que o fundamento do recurso mostra que o seu conhecimento é «…absolutamente essencial para a melhoria da aplicação do direito e uniformização da jurisprudência…»
Daí que o recurso seja admissível.
O Ministério Público pronunciou-se pela não admissão do recurso com fundamento no facto de não resultar dos autos, como se referiu no despacho reclamado, que o conhecimento do recurso seja essencial para a melhoria da aplicação do direito e uniformização da jurisprudência.
II. Objeto da reclamação
A questão colocada na presente reclamação consiste em saber se é admissível o recurso face à invocação, para esse efeito, da norma constante do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro.
III. Fundamentação
(a) Matéria a considerar
A matéria a considerar é a que consta do relatório que antecede.
b) Apreciação
1 - O n.º 2 do artigo 49.º da Lei n.º 107/2009, diz que «Para além dos casos enunciados no número anterior, pode o Tribunal da Relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público, aceitar o recurso da decisão quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência.»
Do segmento «…pode o Tribunal da Relação, a requerimento do arguido ou do Ministério Público, aceitar o recurso…» resulta que é o Tribunal da Relação quem aceita ou rejeita o recurso.
Por conseguinte, existindo tal requerimento, como existe neste caso, o tribunal de 1.ª instância deve limitar-se a admitir o recurso e encaminhá-lo para o tribunal da Relação, para este decidir se o recurso é ou não é admissível nos termos requeridos, ou seja, se o caso configura, ou não, uma situação em que a admissão do recurso é manifestamente necessária para a melhoria da aplicação do direito ou da promoção da uniformidade da jurisprudência.
Procede, por conseguinte, a reclamação.
IV. Decisão
Considerando o exposto, julga-se a reclamação procedente.
O recurso sobe imediatamente – 407.º, n.º 2, al. a); em separado – artigo 406.º, n.º 2; com efeito não suspensivo – 408.º, n.º 1, a contrario, todos do Código de Processo Penal.
(Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra, por competência delegada - Despacho do Ex.mo Sr. Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra, de 18 de março de 2022)