I - Desde que impostas ou aconselhadas à luz de exigências de socialização, a pena alternativa ou a pena de substituição só não serão aplicadas se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expetativas comunitárias.
II - Significa isto que o tribunal deve apurar, em concreto, entre as várias penas de substituição aplicáveis ao caso, a que melhor e da forma mais adequada realiza as exigências de prevenção especial de socialização que se façam sentir, dando preferência a uma que não seja privativa da liberdade.
Acordam, em conferência, na Primeira Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto
No processo Sumário nº 35/25.0GBFLG., da Comarca do Porto Este, Juízo Local Criminal de Felgueiras foi julgado o arguido AA tendo sido proferida sentença, em 07/02/2025, que o condenou como autor material, e na forma consumada, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3º., nº1 e 2 do Dec.-Lei nº 2/98, de 03.01, na pena de 10 (dez) meses de prisão efectiva, a qual, nos termos do artº 43º do Código Penal (na redacção da Lei 94/017, de 23/8), a cumprir em regime de permanência na habitação com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.
«Conclusões
I. O presente recurso tem como objeto a matéria de direito da sentença proferida nos presentes autos, a qual condenou o arguido, na pena crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo art. 3º., nº1 e 2 do Dec.-Lei nº 2/98, de 03.01, na pena de 10 (dez) meses de prisão efetiva, nos termos do artº43º do Código Penal (na redação da Lei 94/017, de 23/8), determina se que a pena de prisão ora imposta seja cumprida em regime de permanência na habitação com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.
II. O tribunal a quo deu, designadamente, como provado que:
• No dia 08 de janeiro de 2025, pelas 00h20, na via pública denominada Rua ..., ..., Felgueiras, o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de mercadorias com a matrícula ..-..-HQ.
• O arguido conduzia o veículo nas referidas circunstâncias de tempo e lugar sem ser titular de carta de condução ou outro título válido que o habilitasse a conduzir veículos automóveis.
• O arguido tinha pleno conhecimento da necessidade de possuir habilitação legal para conduzir o veículo ligeiro de passageiros.
• Não obstante, o arguido quis conduzir o veículo identificado sabendo que não possuía a necessária carta de condução ou título de substituição, o que efetivamente fez.
• O arguido agiu de forma deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que incorria em responsabilidade criminal.
• O arguido é jardineiro, mas encontra-se desempregado e a receber o RSI, no montante mensal de € 221,80;
• é solteiro, mas vive com a sua companheira, a qual é operária fabril e o ajuda, e faz parte do agregado familiar um filho de 9 anos, da sua companheira;
• habitam em casa arrendada e pela qual pagam a renda mensal de cerca de € 180,00;
• tem o 6º ano de escolaridade;
• o teor do relatório social elaborado pela DGRSP e relativo ao arguido e constante de fls.
• confessou os factos e demonstrou sincero arrependimento;
• o arguido em sede de julgamento deu o seu consentimento para a aplicação de uma pena de prisão com permanência na habitação, com fiscalização através de meios técnicos de controlo à distância.
• do CRC do arguido, junto de fls. 22 a 28, constam as condenações aí melhor descritas, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
III. O tribunal a quo aplicou ao arguido a pena de 10 (dez) meses de prisão efetiva.
IV. De acordo com o princípio do caráter não automático dos efeitos das penas, expressamente consagrado no art. 65º, nº 1, do CP, “nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de direitos civis, profissionais ou políticos”.
V. O tribunal a quo quando, ao condenar o Arguido não optou por pena alternativa ou de substituição mais conforme com as necessidades de prevenção especial de socialização, violando o critério que determina a escolha da medida da pena (art. 70.º do Cód. de Proc. Penal), determinado apenas por considerações de natureza preventiva, importando na aplicação deste preceito, o disposto no art.º 40 º do mesmo Cód. Penal, o qual, atribui à pena, sempre, um fim utilitário.
VI. O art.º 71º do C.P. estabelece no seu nº 1 a orientação base para a medida da pena a aplicar: “A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção” e no nº 2 faz-se referência às “circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuseram a favor do agente ou contra ele.”
VII. Tal andou o tribunal a quo, quando não ponderou de forma criteriosa e adequada as diversas circunstâncias que depõem a favor do agente, em particular as contidas nas alíneas d) a f) do n.º 2 do art.º 71.º do Cód. Penal.
VIII. A pena justifica-se dentro do limite imposto pela culpa do agente, considerando as necessidades de reinserção social reveladas por este, mas também, no que respeita às exigências de prevenção geral positiva, auscultando as expetativas comunitárias de reação a certo crime.
IX. No caso concreto, a ter em consideração os factos dados como provados, o Tribunal “a quo” na determinação da medida da pena não apreciou devidamente as circunstâncias que depõem a favor do arguido.
X. O arguido manifestou, a sua vontade de imigrar para conseguir dar rumo positivo, nomeadamente, arranjar um trabalho estável para ajuda no sustento da casa e família, conseguir dinheiro para tirar a carta de condução, que já havia tentado tirar, mas sem sucesso.
XI. Referir, também, que o arguido, é um indivíduo inserido na sociedade, familiarmente e que está a tentar compor a vida, para ficar profissionalmente, XII. No caso de crimes puníveis, em alternativa, com prisão ou multa, escolhida a primeira destas penas, pode ainda ser substituída por outra não detentiva que seja legalmente admissível, como por exemplo o trabalho a favor da comunidade, desde que a prisão não seja in casu, imposta por razões de prevenção - Prof. Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 363 e Dr.ª Anabela Rodrigues, RPCC, Ano 9º, 4º, 663. Medida essa que atendendo ao caso concreto, alcançaria, com maior sucesso, os fins pretendidos.
XIII. Entre as vozes críticas mais recentes e mais estruturadas estão as recomendações do Relatório da Comissão de Estudo e Debate da Reforma do Sistema Prisional, concluído a 12 de Fevereiro de 2004 [http://www.portugal.gov.pt] em que se pugna pela restrição da aplicabilidade da pena prisão à criminalidade mais grave e pela diversificação das penas não privativas da liberdade.
XIV. A comissão detetou, entre outros "demasiada rigidez nas possibilidades de flexibilização da execução das penas, escassa utilização da pena de prestação de trabalho a favor da comunidade e, em geral, de outras penas e medidas penais não privativas da liberdade".
XV. Ao condenar o arguido na pena de prisão efetiva de 10 meses, a cumprir na habitação, mais não fez o tribunal do que impedir o sustento e contributo, do mesmo, para com a sua companheira, família e sua casa, que por via da condenação fica impedido de granjear o seu sustento e de poder melhorar e dar um novo rumo à sua vida.
XVI. De harmonia com o já citado art.º 70.º, n.º 1 do Código Penal na medida da pena da pena são considerados, os factos e a personalidade do agente, pelo que a pena de prisão efetiva é excessiva.
XVII. A culpa é a medida da pena e esta tem de corresponder às expectativas da comunidade; daí para cima a medida exata da pena é a que resulta das regras da prevenção especial. É a medida necessária à reintegração do indivíduo na sociedade causando só o “mal necessário”.
XVIII. A exigência do critério de determinação da medida da pena exprime a fixação do “quantum da pena” concreto e deve fazer-se com base na culpa e na prevenção, afastando-se assim definitivamente a ideia que o juiz deve partir do meio da moldura penal do crime para encontrar a pena concreta, quer atenuantes e agravantes gerais para encontrar a medida concreta da pena depois de determinado o seu “quantum “em função do critério geral da medida fornecida por lei.
XIX. Por outro lado, a medida da pena, além da sua necessidade terá que ter em conta as exigências individuais e concretas de socialização do agente, sendo certo que na sua determinação ter-se-á que ter em linha de conta que se deve evitar a dessocialização do agente, sendo esta a função ressocializadora da pena.
XX. A análise da douta sentença proferida pelo tribunal a quo, permite concluir pela existência de sérias razões para crer que da suspensão da pena resultaria vantagens não para a reinserção social, bem como, da profissional do arguido, finalidade esvaziada pelo facto de este já se encontrar totalmente inserido a nível social e familiar, mas antes para o não prejuízo dessa integração.
XXI. Mal andou o Tribunal a quo quando atentos os factos provados em audiência de discussão e julgamento e assentes na douta Sentença, na determinação da medida da pena, não tomou devidamente em consideração, o disposto no artº 71, nº 2, al. e) do Cód. Penal e no artº 77.º n.º 1, também do Cód. Penal.
XXII. Ao não fazer a correta ponderação das circunstâncias atenuantes e tudo o mais que se lhe impunha e que em favor do Arguido milita, na fixação da concreta medida da pena, o tribunal a quo violou não só o artigo 70º, 71º, 72º e 40º do CP, como também os mais básicos princípios de justiça, tendo aplicado uma pena excessiva e “castigadora”, que deverá assim ser suspensa na sua execução, de acordo com a totalidade das conclusões aduzidas.
XXIII. Por tudo o supra exposto, a sentença proferida pelo Tribunal a quo no dia 07 de fevereiro de 2025, que condena o arguido a 10 meses de prisão efetiva, deve ser imediatamente reduzida, suspensa a sua execução ou optar pelo caso, de trabalho a favor da prestação comunidade.
XXIV. Conforme V/Exas., Venerandos Desembargadores certamente decidirão, fazendo, como sempre, a habitual e devida Justiça Material.
TERMOS EM QUE E NOS MELHORES DE DIREITO DEVERÃO V/EXAS., VENERANDOS DESEMBARGADORES PROFERIR DECISÃO QUE NESSA CONFORMIDADE:
a) O ARGUIDO DEVE SER ABSOLVIDO DA PENA OU, SUBSIDIARIAMENTE, b) A MESMA SER REDUZIDA OU SUBSTITUÍDA POR PRESTAÇÃO DE TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE...»”
“1 – O recurso interposto incide sobre a douta sentença proferida no âmbito dos presentes autos, a qual condenou o arguido, ora recorrente, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 10 meses de prisão, a cumprir
em regime de permanência na habitação.
2 – As conclusões delimitam o objecto do recurso.
3 - No que se refere à escolha e determinação da medida da pena, nenhum reparo nos merece, o recorrente foi já condenado por seis vezes por este tipo legal de crime, para além do crime de desobediência.
4 - Sendo que que já cumpriu uma pena de 8 meses prisão em regime de permanência na habitação, por factos praticados no período de uma outra pena de
prisão suspensa na sua execução.
5 – As necessidades de prevenção especial e geral são elevadíssimas, o arguido carecesse de forte ressocialização, revela falta de preparação para manter uma conduta lícita, pelo que tal facto tem de ser censurada através da medida da pena, tendo que a suspensão da execução da pena já não se mostrava adequada, pois já foi condenado por duas vezes em penas suspensas na sua execução que não surtiram qualquer efeito, pois o recorrente voltou a praticar o mesmo ilícito criminal.
6 – A sentença ora recorrida nenhum reparo nos merece, devendo a mesma ser mantida, nos seus exactos termos, não se mostrando violada qualquer norma legal nem constitucionalmente protegida.
Em conformidade com o supra exposto, entendemos que deverá ser negado provimento ao presente recurso, e mantida a sentença recorrida.”
2.1-QUESTÕES A DECIDIR
Conforme jurisprudência constante e assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se delimita o objecto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior.
Face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, a questão a apreciar e decidir é a seguinte:
A – Da dosimetria da pena; da suspensão da execução da pena de prisão ou da sua substituição por trabalho a favor da comunidade.
Tendo em conta a questão objecto do recurso, da decisão recorrida importa evidenciar a fundamentação da matéria de facto e de direito, que é a seguinte (transcrição parcial):
“1 - Factos Provados:
1) No dia 08 de janeiro de 2025, pelas 00h20, na via pública denominada Rua ..., ..., Felgueiras, o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de mercadorias com a matrícula ..-..-HQ.
2) O arguido conduzia o veículo nas referidas circunstâncias de tempo e lugar sem ser titular de carta de condução ou outro título válido que o habilitasse a conduzir veículos automóveis.
3) O arguido tinha pleno conhecimento da necessidade de possuir habilitação legal para conduzir o veículo ligeiro de passageiros.
4) Não obstante, o arguido quis conduzir o veículo identificado sabendo que não possuía a necessária carta de condução ou título de substituição, o que efetivamente fez.
5) O arguido agiu de forma deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que incorria em responsabilidade criminal.
Mais se provou:
6) O Arguido:
a) é jardineiro, mas encontra-se desempregado e a receber o RSI, no montante mensal de €221,80;
b) é solteiro, mas vive com a sua companheira, a qual é operária fabril e o ajuda, e faz parte do agregado familiar um filho de 9 anos, da sua companheira;
c) habitam em casa arrendada e pela qual pagam a renda mensal de cerca de € 180,00;
d) tem o 6º ano de escolaridade;
e) o teor do relatório social elaborado pela DGRSP e relativo ao arguido e constante de fls.41 a 43, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
f) confessou os factos e demonstrou sincero arrependimento;
g) O arguido em sede de julgamento deu o seu consentimento para a aplicação de uma pena de prisão com permanência na habitação, com fiscalização através de meios técnicos de controlo à distância.
h) Do CRC do arguido, junto de fls. 22 a 28, constam as condenações aí melhor descritas, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
2- Factos não Provados:
Não se provaram quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa articulados na acusação ou alegados em audiência de discussão e julgamento que não se encontrem descritos como provados ou que se mostrem em oposição aos provados ou prejudicados por estes.
3- Convicção do Tribunal:
- nas declarações do arguido, AA, o qual, de uma forma livre, integral sem reservas, confirmou que era ele quem conduzia o veículo em causa…Demonstrou arrependimento. De facto, o arguido efectuou uma confissão livre, integral e sem reservas do crime e dos factos. Prestou declarações ainda, quanto á sua situação pessoal e económica, as quais foram complementadas pelo relatório social elaborado e constante dos autos.
O arguido prestou o seu consentimento para uma aplicação de pena de prisão em regime de permanência na habitação, com fiscalização através de meios técnicos de controlo à distância; sendo que para esse efeito, foi solicitada a elaboração do competente relatório, o qual consta de fls. 41 a 43.
Teve-se ainda em consideração, o auto de notícia de fls. 5 a 5, informação “print” do IMTT de fls. 7 e o CRC do arguido junto de fls. 22 a 28.
IV – ASPECTO JURÍDICO DA CAUSA
(…)
B) Consequências Jurídicas do Crime
Qualificados os factos, segue-se a escolha da pena a aplicar ao arguido, bem como a determinação da sua medida concreta.
Nos termos do art.3º, nº 1 e 2 do Dec.-Lei nº 2/98 de 03.01, o crime de condução de veículo sem habilitação legal, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.
Uma vez que o citado normativo legal não nos dá os limites mínimos da pena de prisão e da pena de multa, temos que socorrer-nos do art. 41º e do art. 47º do Código Penal, sendo que os mínimos são de 1 mês de pena de prisão e 10 dias de pena de multa.
O art. 70º do Código Penal estabelece que “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa de liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Segundo o art. 71º nº 1 do Código Penal a determinação da pena far-se-á em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
A culpa reflecte a vertente pessoal do crime, assegurando que a pena não irá violar a dignidade da pessoa do arguido.
As exigências de prevenção na determinação da pena reflectem-se em dois domínios:
- no domínio da sociedade, visando restabelecer nela a confiança na norma violada e a sua vigência (prevenção geral positiva);
- no domínio pessoal do agente, tentando a sua reintegração e o respeito pelas normas jurídicas (prevenção especial positiva).
Estabelece o art. 40º do Código Penal que “a aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e reintegração do agente na sociedade”. O nº 2 do mesmo artigo estabelece que “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”.
Estes vectores da medida da pena são concretizados pelos factores de determinação da medida concreta da pena que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele. Alguns desses factores são elencados no art. 71º nº 2 do Código Penal, a título exemplificativo.
Sendo assim, na determinação da medida concreta da pena valorar-se-ão o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste, a gravidade das suas consequências, a intensidade dolosa do agente, as suas condições pessoais, a sua conduta anterior e posterior ao facto, as exigências de prevenção e todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele, tendo em conta as exigências de futuros crimes.
No que concerne ao crime de condução sem habilitação legal, e no caso sub judice, verifica-se que o arguido agiu com dolo directo e com plena consciência da ilicitude.
Acresce que o mesmo tem antecedentes criminais, tendo sofrido já 6 (seis!)condenações anteriores por igual tipo de ilícito, uma em 2014, uma em 2015, uma em 2016, outra em 2020, e outras, bem recentemente, em 2022; sendo que a condenação em 2022 foi em pena de prisão, a cumprir em regime de OPH.
Assim, e atento o facto de o arguido já ter sofrido diversas condenações anteriores pela prática do mesmo ilícito criminal, ou seja, pelo crime de condução de veículo sem habilitação legal, pelo menos por 6 vezes, entende-se que a pena de multa não se afigura suficiente para realizar de uma forma adequada e suficiente as finalidades de punição, e até porque, as penas anteriores, não se mostraram suficientes, atento o comportamento reincidente do arguido, para acautelar as necessidades de prevenção. Por outro lado, o grau de ilicitude é elevado, já que o mesmo sabia, e não lhe era novo, o facto de que conduzir sem carta constituía um ilícito criminal.
Acresce que as necessidades de prevenção especial não se mostraram suficientes e não lograram efeito prático no arguido.
A favor do arguido apenas se vislumbra o facto de, ao que tudo indica, agora ter tomado consciência das asneiras que fez, e, apesar de estar desempregado, e segundo o relatório social, apoia o seu agregado familiar.
Assim só resta optar, atenta as finalidades da punição e as necessidades de prevenção, quer geral, quer especial, por aplicar ao arguido uma pena de prisão.
Assim, e depois de tudo devidamente ponderado e atentos os critérios do art. 71º, do Código Penal, julga-se proporcional e adequado, condenar o arguido, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 10 meses de prisão.
No entanto, estabelece o art. 45º, nº1 do Código Penal que “a pena de prisão aplicada em medida não superior a 1 ano é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes(...)”.
Ora, no caso concreto dos autos, somos do entendimento que, neste caso concreto, e atentas as razões atrás referidas esta substituição não se deve operar. Assim, e como refere o próprio artigo, a substituição, em princípio será obrigatória, excepto, se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes. Conforme já se referiu, e atento o facto de o arguido já ter sofrido pelo menos 6 condenações anteriores por um crime de igual natureza à dos autos, entendemos que a substituição que se operasse não iria ser suficiente e nem sequer iria prevenir a prática de novos crimes.
Mas será que se impõe o cumprimento efectivo da referida pena?
São por demais conhecidas e pacíficas as considerações negativas traçadas em torno das penas curtas de prisão, pelos seus efeitos criminógenos e fortemente estigmatizantes.
É, pois, forte a incidência do legislador nas penas de substituição – sendo certo que a apreciação com vista à aplicação destas penas é um poder-dever que vincula o tribunal sempre que se mostrem preenchidos os pressupostos legais da sua admissão.
A aplicação da pena de suspensão de execução da pena de prisão só pode e deve ser aplicada se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, o tribunal concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição – artº 50, nº1, do CP.
Assim, para aplicação daquela pena de substituição é necessário, em primeiro lugar, que a pena de suspensão da execução da prisão não coloque irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização das expectativas comunitárias, ou seja, o sentimento de reprovação social do crime ou sentimento jurídico da comunidade.
Em segundo lugar, é necessário que o tribunal se convença, face à personalidade do arguido, comportamento global, natureza do crime e sua adequação a essa personalidade, que o facto cometido não está de acordo com essa personalidade e foi simples acidente de percurso, esporádico, e que a ameaça da pena, como medida de reflexos sobre o seu comportamento futuro evitará a repetição de comportamentos delituosos.
Por outro lado, o juízo de prognose sobre o comportamento futuro do condenado deve ter em consideração, como a letra da lei impõe, a personalidade do agente, as suas condições de vida, a sua conduta anterior e posterior ao crime e as circunstâncias deste.
A jurisprudência tem assim vindo a acentuar que “A suspensão da pena é uma medida penal de conteúdo pedagógico e reeducativo que pressupõe uma relação de confiança entre o tribunal e o arguido condenado”, em que na sua base está sempre um juízo de prognose social favorável ao agente, baseada num risco de prudência, em que se deverá “reflectir sobre a personalidade do agente, sobre as condições da sua vida, sobre a sua conduta ante et post crimen e sobre o circunstancialismo envolvente da infracção” (neste sentido, cf. Acórdão do STJ de 9/1/02, divulgado em http://www.stj.pt).
No caso dos autos resulta muito claramente da factualidade assente que as necessidades de prevenção geral e especial impedem a aplicação da suspensão da execução da pena de prisão. A factualidade assente, nomeadamente, o historial delituoso do arguido não alimenta a esperança de que ele sentirá a condenação suspensa como uma advertência e de que não cometerá no futuro qualquer delito.
Por isso, no caso concreto, a suspensão da execução da pena não seria compreensível para o sentimento jurídico da comunidade e para a manutenção da sua confiança no direito e na administração da justiça. Com a suspensão da execução da pena não ficaria acautelada a defesa do ordenamento jurídico.
Por outro lado, a prática do crime é ainda a expressão de um defeito de socialização do arguido, que não consente uma esperança fundada de que a socialização em liberdade possa ser lograda. Perante o comportamento obstinado do arguido de desrespeito e desprezo pelo direito, a repetição de vários ilícitos da mesma natureza pelos quais foi condenado, permite concluir que a suspensão da execução da pena não configuraria um risco prudencial, mas uma imprudência. A reiteração das condutas delituosas não possibilita formular um juízo de prognose de ressocialização favorável.
Sendo, pois, a prisão efectiva a única capaz de assegurar as finalidades de prevenção especial e geral que o presente caso impõe, importa agora avaliar se o seu cumprimento deve ser efectuado em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, face à entrada em vigor, em 23/11/2017, das alterações introduzidas no Código Penal pela Lei nº 94/2017, de 23/8.
Dispõe o artigo 43º do Código Penal, o seguinte:
Regime de permanência na habitação
“1 - Sempre que o tribunal concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir, são executadas em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância:
a) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos;
b) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos resultante do desconto previsto nos artigos 80.º a 82.º;
c) A pena de prisão não superior a dois anos, em caso de revogação de pena não privativa da liberdade ou de não pagamento da multa previsto no n.º 2 do artigo 45.º
2 - O regime de permanência na habitação consiste na obrigação de o condenado permanecer na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, sem prejuízo das ausências autorizadas.
3 - O tribunal pode autorizar as ausências necessárias para a frequência de programas de ressocialização ou para atividade profissional, formação profissional ou estudos do condenado.
4 - O tribunal pode subordinar o regime de permanência na habitação ao cumprimento de regras de conduta, suscetíveis de fiscalização pelos serviços de reinserção social e destinadas a promover a reintegração do condenado na sociedade, desde que representem obrigações cujo cumprimento seja razoavelmente de exigir, nomeadamente:
a) Frequentar certos programas ou atividades;
b) Cumprir determinadas obrigações;
c) Sujeitar-se a tratamento médico ou a cura em instituição adequada, obtido o consentimento prévio do condenado;
d) Não exercer determinadas profissões;
e) Não contactar, receber ou alojar determinadas pessoas;
f) Não ter em seu poder objetos especialmente aptos à prática de crimes.
5 - Não se aplica a liberdade condicional quando a pena de prisão seja executada em regime de permanência na habitação.”
O regime de permanência na habitação tem potencialidades para realizar a tutela do bem jurídico protegido pela norma que pune o crime em causa – assim satisfazendo as exigências de prevenção geral – e facilitar a ressocialização do arguido, sem estender, de forma gravosa, as consequências da punição ao seu agregado, assim se evitando as consequências perversas da prisão continuada, não deixando de, com sentido pedagógico, constituir forte sinal de reprovação para o crime em causa e tem por finalidade limitar o mais possível os efeitos criminógenos da privação total da liberdade, evitando ou, pelo menos, atenuando os efeitos perniciosos de uma curta detenção de cumprimento parcial ou continuado, nos casos em que não é possível renunciar à ideia de prevenção geral.
Em resultado da revisão operada pela Lei nº 94/2017, a aplicação do regime de permanência na habitação foi alargada aos casos de prisão concretamente fixada em medida não superior a dois anos, devendo o tribunal optar por esta forma de cumprimento da pena de prisão efectiva sempre que conclua que assim se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena e o condenado nisso consentir, estabelecendo-se no nº2 do art. 43º do Código Penal que o apontado regime consiste na obrigação de o condenado permanecer na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, pelo tempo de duração da pena de prisão, sem prejuízo das ausências autorizadas.
Por outro lado, a alteração introduzida pela referida lei veio permitir a subordinação do regime de permanência na habitação a regras de conduta destinadas a promover a reintegração do condenado na sociedade, obtido o consentimento prévio do condenado.
Conclui-se, pois, que as finalidades da execução da pena de prisão imposta ao arguido se realizam de forma adequada e suficiente através do regime de permanência na habitação com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância nos termos do previsto no art. 43º do Código Penal na redacção introduzida pela Lei 94/17, de 23/08.
(…)”
2.3.1- Entende o recorrente que a pena de 10 meses de prisão que lhe foi aplicada, a cumprir em OPHVE, deverá ser suspensa na sua execução, isto caso, não se entenda substituir aquela por trabalho a favor da comunidade.
Apreciemos.
No sistema penal português, por imposição constitucional decorrente dos princípios da necessidade/subsidiariedade da intervenção penal e da proporcionalidade das sanções penais (artigo 18º, n.º 2 da CRP e, entre outros, artigos 70º e 98º do CP), a pena de prisão é a ultima ratio da política criminal[1]
Com a redacção actual do artigo 43º do Código Penal, introduzida pela Lei n.º 94/2017, de 23 de Agosto, poderemos acrescentar que o cumprimento da pena de prisão em estabelecimento prisional é a opção derradeira para cumprimento de penas de prisão até dois anos.
Com efeito, nos termos do artigo 43º, n.º 1 do Código Penal «Sempre que o tribunal concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão e o condenado nisso consentir, são executadas em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância:
a) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos;
b) A pena de prisão efetiva não superior a dois anos resultante do desconto previsto nos artigos 80.º a 82.º;
c) A pena de prisão não superior a dois anos, em caso de revogação de pena não privativa da liberdade ou de não pagamento da multa previsto no n.º 2 do artigo 45.º»
É que o regime de execução de privação da liberdade deve ser, também em obediência ao princípio constitucional da proporcionalidade da restrição dos direitos, o menos restritivo possível do direito à liberdade[2].
Daí o advérbio sempre com que se inicia a norma legal, a confirmar peremptoriamente como opção derradeira a execução da prisão intra muros.
Resulta do artigo 43º do Código Penal que são pressupostos da aplicação do regime de permanência na habitação como meio de execução da pena de prisão:
- o consentimento do condenado;
- que a pena de prisão efectiva que o condenado tenha de cumprir não seja superior a dois anos;
- que pelo regime de permanência na habitação se realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão.
Verificando-se no caso concreto, ora em apreço, estes pressupostos, o Tribunal a quo optou por exercer o seu poder-dever de ordenar a execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação.
Cumpre saber se seria oportuno optar antes pela suspensão da execução da pena de prisão tal como o pretende o recorrente.
As finalidades da execução da pena de prisão - o pressuposto material -, no seguimento do disposto no artigo 40º do Código Penal, são a da prevenção especial de ressocialização e a da satisfação das exigências de prevenção geral positiva.
É o que resulta do disposto no artigo 42º, n.º 1 do Código que dispõe: «A execução da pena de prisão, servindo a defesa da sociedade e prevenindo a prática de crimes, deve orientar-se no sentido da reintegração social do recluso, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes.»
Ora, para a ressocialização do condenado é preciso desde logo tentar minimizar os efeitos criminógenos da reclusão e tentar aproximá-lo, tanto quanto possível, das condições de vida dos cidadãos em liberdade. Objectivos esses que o regime de permanência na habitação, enquanto meio de execução da pena de prisão, na perspectiva do legislador português, estará melhor apetrechado para atingir.
Cumpre então aferir se, no caso agora em apreço, a opção pelo cumprimento da pena de prisão em regime de permanência na habitação, com recurso a meios electrónicos de vigilância, é imprescindível, face às demais penas não detentivas, para acautelar as finalidades da execução da pena de prisão.
A questão que se coloca é a de saber se, face ao historial do arguido, a execução da pena de prisão nos termos constantes da sentença recorrida é a única que acautela, efectivamente, essas indicadas finalidades. Ou, inversamente, a opção por uma pena substitutiva, serviria para atingir tais fins.
A este propósito, refere-se na sentença recorrida:
“…no caso concreto dos autos, somos do entendimento que, neste caso concreto, e atentas as razões atrás referidas esta substituição não se deve operar. Assim, e como refere o próprio artigo, a substituição, em princípio será obrigatória, excepto, se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes. Conforme já se referiu, e atento o facto de o arguido já ter sofrido pelo menos 6 condenações anteriores por um crime de igual natureza à dos autos, entendemos que a substituição que se operasse não iria ser suficiente e nem sequer iria prevenir a prática de novos crimes.
Mas será que se impõe o cumprimento efectivo da referida pena?
(…)
No caso dos autos resulta muito claramente da factualidade assente que as necessidades de prevenção geral e especial impedem a aplicação da suspensão da execução da pena de prisão. A factualidade assente, nomeadamente, o historial delituoso do arguido não alimenta a esperança de que ele sentirá a condenação suspensa como uma advertência e de que não cometerá no futuro qualquer delito.
Por isso, no caso concreto, a suspensão da execução da pena não seria compreensível para o sentimento jurídico da comunidade e para a manutenção da sua confiança no direito e na administração da justiça. (…) Perante o comportamento obstinado do arguido de desrespeito e desprezo pelo direito, a repetição de vários ilícitos da mesma natureza pelos quais foi condenado, permite concluir que a suspensão da execução da pena não configuraria um risco prudencial, mas uma imprudência. A reiteração das condutas delituosas não possibilita formular um juízo de prognose de ressocialização favorável.(…)”
Vemos assim que a suspensão da execução da pena de prisão foi arredada, fundamentalmente, por se considerar que o facto do arguido ter repetido a sua conduta delituosa, pelo menos, por seis vezes, correspondendo estas a seis condenações anteriores, não viabiliza um juízo de prognose favorável à aplicação de uma pena de substituição, qualquer que ela seja. Sendo que este historial associado à situação económica do arguido (desempregado a receber €252,80 de RSI, com um agregado familiar de 3 indivíduos, um dos quais menor de idade) revela um elevado grau de risco de que aquelas condutas se repitam na medida em que não se afigura viável que aquele venha a ser titular de carta de condução num futuro próximo.
Face ao supra exposto, nada cumpre apontar ao percurso percorrido pelo tribunal recorrido, adiantando também que, ficando afastada a possibilidade de aplicação do instituto de suspensão da execução da pena de prisão por falência de um juízo de prognose favorável no que toca à não repetição do ilícito, por maioria de razão fica arredada a possibilidade de substituição daquela pena curta de prisão por trabalho a favor da comunidade como o pretende o recorrente.
Apreciemos a redacção dada ao artigo 58º do Código Penal.
Prestação de trabalho a favor da comunidade
1 - Se ao agente dever ser aplicada pena de prisão não superior a dois anos, o tribunal substitui-a por prestação de trabalho a favor da comunidade sempre que concluir, nomeadamente em razão da idade do condenado, que se realizam, por este meio, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.
2 - A prestação de trabalho a favor da comunidade consiste na prestação de serviços gratuitos ao Estado, a outras pessoas colectivas de direito público ou a entidades privadas cujos fins o tribunal considere de interesse para a comunidade.
3 - Para efeitos do disposto no n.º 1, cada dia de prisão fixado na sentença é substituído por uma hora de trabalho, no máximo de 480 horas.
4 - O trabalho a favor da comunidade pode ser prestado aos sábados, domingos e feriados, bem como nos dias úteis, mas neste caso os períodos de trabalho não podem prejudicar a jornada normal de trabalho, nem exceder, por dia, o permitido segundo o regime de horas extraordinárias aplicável.
5 - A pena de prestação de trabalho a favor da comunidade só pode ser aplicada com aceitação do condenado. 6 - O tribunal pode ainda aplicar ao condenado as regras de conduta previstas nos n.os 1 a 3 do artigo 52.º, sempre que o considerar adequado a promover a respectiva reintegração na sociedade.
A este propósito citamos o Acórdao n. º123/17.7PFGMR-A.G1[3] que salienta a posição do Professor Figueiredo Dias, segundo o qual «desde que impostas ou aconselhadas à luz de exigências de socialização, a pena alternativa ou a pena de substituição só não serão aplicadas se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expetativas comunitárias.
Como bem se fez notar no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 21-05-2018, «Em termos de hierarquia legal das penas de substituição, o Código Penal apenas estabelece um critério de preferência pelas penas não detentivas, por não implicarem a privação da liberdade do arguido, ao dispor, no artigo 45.º, que a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano é substituída por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável. Significa isto que o tribunal deve apurar, em concreto, entre as várias penas de substituição aplicáveis ao caso, a que melhor e da forma mais adequada realiza as exigências de prevenção especial de socialização que se façam sentir, dando preferência a uma que não seja privativa da liberdade.»
Ora, nos termos do artigo 58.º, n.º 1, do Código Penal a substituição da pena de prisão não superior a 2 anos por prestação de trabalho a favor da comunidade deve ocorrer sempre que o Tribunal concluir, «nomeadamente em razão da idade do condenado, que se realizam, por este meio, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição».(…)»
Ora, bem andou o tribunal a quo ao considerar que apenas a pena efectiva de prisão, a cumprir na residência do condenado, realizará de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.
Com efeito, começando pelas exigências de prevenção geral, cabe referir que numa situação como a dos autos, em que o grau de ilicitude da conduta é mediano, o sentimento da comunidade na confiança na validade das normas que proíbem a condução sem habilitação legal há-de ficar satisfeito e reforçado com o cumprimento de uma pena de prisão, independentemente do local em que esta é efectivada. A perda da liberdade de movimentação do arguido garantirá o reaparecimento de um sentimento de segurança à comunidade reforçando-se, assim, a confiança no Direito.
Analisando as exigências de prevenção especial que, no caso, são prementes, e dada a verificação das duas premissas em que a decisão recorrida assenta, isto é, a razoável integração familiar e a confissão, na verdade, uma das finalidades da punição, a qual se consubstancia na consciencialização por parte do agente da necessidade de não voltar a delinquir, cremos que os fins da pena apr serão alcançados com a privação de liberdade e de locomoção que a execução da pena de prisão na residência familiar acarreta.
Cero é que já foram concedidas numerosas oportunidades – penas não detentivas - ao arguido, para que este alterasse a sua trajetória de vida, o que, até à data, não sucedeu verdadeiramente. E o certo é que este insucesso das anteriores condenações resultou na repetição do mesmo ilícito por parte do arguido.
Importa ainda salientar que a circunstância do arguido beneficiar de apoio familiar, apoio que nunca lhe faltou no percurso vivencial do mesmo, tal não foi suficiente para que o mesmo optasse por uma vida conforme ao Direito.
Do acima exposto decorre que uma das finalidades da pena, a da prevenção especial, que visa a reintegração do agente na comunidade de modo a que o mesmo não volte a praticar crimes, o que exige uma efectiva tomada de consciência por parte daquele, não será alcançada com a suspensão da execução da pena ou com uma outra pena não detentiva.
Em conclusão, a natureza do crime cometido, o passado do arguido e as suas condições de vida e personalidade impõem e legitimam a opção do juiz a quo, sendo a pena de prisão de 10 meses a cumprir na residência do arguido com recurso a meios electrónicos de vigilância, a única que nos parece eficaz, como “última ratio”, face à ineficácia das penas anteriores.
Assim, cumpre NEGAR provimento ao recurso mantendo-se o teor da sentença recorrida nos seus exatos termos.
Pelo exposto, acordam os juízes desta secção criminal do Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
(Elaborado e revisto – art. 94º n.º 2, do CPP)