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INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA
NULIDADE DA SENTENÇA
EQUIDADE
PROIBIÇÃO DA “REFORMATIO IN PEJUS”
Sumário
I. A liquidação da sentença só tem por fim concretizar o objecto da condenação, com respeito do caso julgado decorrente da acção declarativa. II. E, in casu, só visa quantificar a medida em que o autor contribuiu para a construção da casa de morada de família. III. O Princípio de Proibição da Reformatio in Pejus, traduz-se na proibição de o julgamento do recurso agravar a posição do recorrente, tornando-a pior do que seria se ele não tivesse recorrido, o que, in casu, se verifica no tocante ao início de contagem dos juros de mora.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
AA veio intentar incidente de liquidação de sentença contra BB.
Alega, em síntese, que despendeu em dinheiro seu, com custos de projectos, taxas urbanísticas, remoções de terras e preparação do solo, construção da referida casa de habitação, muros e pavimentos exteriores, compras de materiais ali aplicados, custo de mão-de-obra e pagamentos das prestações relativas ao referido mútuo e juros, pelo menos, o montante de €123.526,36.
Para alcançar esse valor alega que o valor do edifício, muros e pavimentos (betonilha) é de 198.840,00€, e considerando que a percentagem do rendimento do Requerente no total do rendimento do casal foi de 62,1235% e que este contribui para as despesas do casal nessa proporção superior, como decorre da sentença, então o valor da indemnização a pagar pela Requerida é de 123.526,37€ (=198.840,00€ x 62,1235%).
Assim, termina pedindo o seguinte:
NESTES TERMOS e nos mais e melhores de Direito, deve julga-se procedente o presente incidente de liquidação de sentença e, consequentemente, deve:
1. Condenar-se a Requerida a pagar ao Requerente a indemnização no montante 123.526,37€ correspondente á proporção da comparticipação do Requerente na construção da casa de habitação, incluindo muros de vedação e pavimento exterior em betonilha, inscrita na matriz sob o art. ...57, urbano, da extinta freguesia ..., atual art. ...09 da União das freguesias ..., ... e ..., implantada sobre o prédio urbano, composto por terreno para construção, situado no lugar do ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...40, de ..., omisso na matriz, a confrontar pelo norte com CC, pelo sul com DD, pelo nascente com EE e pelo poente com FF e caminho.
2. Condenar-se a Requerida no pagamento dos juros contados á taxa anual de 4%, contados desde a notificação e até ao efectivo e integral pagamento.
Citada, a ré contestou alegando, em síntese, que a casa foi edificada com a totalidade do dinheiro da Requerida e que o Requerente pouco ou “nada” contribuiu para a vida comum do extinto casal, bem como, para a edificação da casa de habitação da Requerida.
O autor exerceu o contraditório.
Foi dispensada a audiência prévia, tendo sido proferido despacho saneador onde se enunciou o objecto do litígio e onde se elencaram os temas da prova (Apurar se o autor contribuiu em 62,1235% para as despesas de construção da casa referida em 16 na sentença supra referida, nelas se incluindo os custos com projectos e administrativos e as obras realizadas na casa, anexo e muros).
Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento da causa.
Realizado o julgamento foi proferida sentença, proferindo-se decisão a julgar o Incidente de Liquidação parcialmente procedente nos seguintes termos:
“Pelo exposto, tendo em atenção as considerações produzidas e as normas legais citadas, decido: a) Condenar a ré a pagar ao autor a quantia de €80.571,50, acrescida dos juros civis, vencidos e vincendos, desde a data da citação até integral e efectivo pagamento; b) Condenar autor e ré nas custas do processo, sendo o autor na proporção de 38% e a ré na proporção de 62%.”
Inconformados vieram recorrer o Autor e a Ré, interpondo recurso de apelação. Os recursos foram recebidos como recursos de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo
Nas alegações de recurso que apresentam, os apelantes formulam as seguintes Conclusões:
A) Recurso de Apelação do Autor
1. O Tribunal recorrido, com recurso à equidade, ao condenar a ré a pagar ao autor a quantia de €80.571,50, acrescida dos juros civis, vencidos e vincendos, desde a data da citação até integral eefectivo pagamento (a) e ao condenar autor e ré nas custas do processo, sendo o autor na proporção de 38% e a ré na proporção de 62% (b), proferiu uma decisão injusta, incorreu em erro de julgamento e violou a lei.
2. Com efeito, ao fixar a indemnização pelo montante de 80.571,50€, correspondente a metade do valor do edifício, no montante de 161.143,00€, deixando de considerar o montante de 2.278,50€, correspondente a metade do valor dos muros e do pavimento exterior em betonilha, no montante de 4.557,00€, em vez de fixar a indemnização no montante de 82.850,00€, correspondente a metade de 165.700,00€, incluindo aqueles 4.557,00€, o Tribunal “a quo”, incorreu em claro erro de julgamento, tendo deixado de fora parte do valor da indemnização a fixar, empobrecendo o autor e enriquecendo a ré.
3. Excluir das obras/benfeitorias a indemnizar o valor correspondente aos muros e ao pavimento exterior em betonilha constitui uma decisão que contraria a história dos autos, pois tal factualidade nem sequer foi objeto de qualquer contraditoriedade ou discussão nos autos.
4. Nem sequer a ré alega na contestação que a parcela de terreno que lhe foi doada tivesse, na data da doação, esses muros e pavimento exterior, antes pelo contrário, a ré, nos artigos 45. e 46. da contestação, alega que a parte exterior da casa (pavimento e muros) foram obras novas (cfr. teor da contestação).
5. Acresce que, o Tribunal na sentença proferida na ação também não excluiu da indemnização esse valor relativo a muros epavimento exterior em betonilha, mas antes, pelo contrário, o incluiuno elenco dos factos julgados provados, tendo-o levado ao ponto 24. dos factos provados.
6. Se o Tribunal tivesse excluído da indemnização a pagar pela ré o valor relativo aos muros e ao pavimento em betonilha então teria,como consequência, de absolver a ré desse pedido.
7. Além de ter incorrido em erro de julgamento ao não incluir no valor da indemnização ou na obrigação de restituição aquele montante2.278,50€, correspondente a metade do valor dos muros e do pavimento exterior em betonilha no montante de 4.557,00€, o Tribunal recorrido incorreu também em erro de julgamento e em violação da lei ao não ter procedido á actualização daquele montante de 82.850,00€.
8. Em conformidade com a disciplina legal do instituto de enriquecimento sem causa dada pelos artigos 473.º e seguintes do Cód. Civil, que constitui o fundamento de direito da presente ação, e cumprindo o disposto nos artigos 358.º a 361.º do CPC que disciplina o presente incidente de liquidação, o Tribunal tinha o dever de fixar o montante indemnizatório ou a obrigação de restituição por valores actualizados á data da sentença ou, pelo menos, á data da instauração do presente incidente.
9. E, no exercício desse dever de actualização do montante da indemnização de 82.850,00€, obtido nos autos com a elaboração do relatório pericial em ../../2018, recorrendo á evolução dos índices dos preços no consumidor do INE ou recorrendo a ajuda técnica para o efeito (cfr. o n.º 4 do art. 360.º do CPC), o Tribunal deveria ter fixado a indemnização no montante de 98.797,61€, ao qual devem acrescer juros contados á taxa legal desde a data da sentença e até ao efectivo e integral pagamento.
10. Ou então, actualizado tal valor desde ../../2018 até á data da notificação á ré do incidente de liquidação (junho de 2023), o Tribunal deveria ter fixado a indemnização a pagar pela ré ao autor no montante de 96.205,06€, ao qual devem acrescer juros de mora, á taxa legal, contados desde a data da notificação do incidente de liquidação á ré e até ao efectivo e integral pagamento.
11. Ao não decidir nos termos referidos sob as conclusões 9. e 10. Deste recurso, o Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento, proferiuuma decisão manifestamente injusta que empobrece o autor no montante de 18.226,11€ (= 98.797,61€ - 80.571,50€) e enriquece semcausa a ré em igual montante e, além disso, violou as normas dos artigos 473.º e seguintes do Cód. Civil, em especial a norma do n.º 2do art. 479.º, bem como violou os artigos 358.º a 361.º do CPC.
12. Alterados os valores da indemnização deve também a condenação em custas ser alterada.
B) Recurso de Apelação da Ré
A. A Recorrente, invoca, para os devidos e efeitos legais, a nulidade da Sentença, motivada pelo facto de o Tribunal a quo, deixar de pronunciar-se sobre as questões suscitadas na Oposição, apresentadas pela Ré.
B. Em 08-09-2023, a Ré, aqui Recorrente, apresentou a respectiva Oposição ao Incidente de Liquidação, nomeadamente nos artigos 10º a 53º, e concretamente nos artigos 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 21º e 24º, 26º e 29º, que para o presente recurso relevam.
C. Tais factos não foram dados como provados, nem dados como não provados.
D. Os referidos factos são bastantes pertinentes para o desfecho do presente incidente de liquidação.
E. O sentido da nulidade prevista na al. d) do artigo 615º, que ocorre quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
F. Assim delimitado o âmbito da invocada nulidade, consistente na TOTAL omissão de pronúncia quanto aos factos supra relatados, ter-se-á de concluir que a alegada circunstância de o facto de Tribunal a quo não ter tido em consideração a matéria em causa – dando-a como provada, ou como não provada, integrará a invocada nulidade.
G. De qualquer modo, atentar-se-á em que o reconhecimento da nulidade com base em tal fundamento importaria, tão-somente, que este tribunal conhecesse da “questão” cuja apreciação foi totalmente omitida pelo Juiz a quo, em conformidade com o disposto no nº1 do artigo 665º do CPC.
H. Pelo que, entende a Recorrente, que se verifica, assim, a invocada nulidade.
I. Verifica-se que a douta decisão proferida em 1ª instância ora em crise viola o disposto nº 4 do artº 607 e a alínea d), nº 1 do art. 615º ambos do C.P.C, porquanto o Tribunal a quo não se pronunciou quanto às questões enunciadas nos artigos 10º a 53º, e concretamente nos artigos 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 21º e 24º, 26º e 29º, que para o presente recurso relevam.
J. Da audição dos depoimentos prestado por TODAS AS TESTEMUNHAS, apresentadas pela Recorrente, e da prova DOCUMENTAL, é lícito concluir pela Recorrente que foram erradamente apreciados e valorados as provas carreadas aos presentes autos, pelo que ocorre notório erro de julgamento.
K. No presente Recurso, a Recorrente, almeja aditar/ampliar a matéria de facto dada como provada:
L. Com o devido respeito por opinião contrária, a Recorrente entende que deverão ser aditados oito (8) factos, ao elenco dos dados como provados, designadamente, os artigos 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 21º e 24º, 26º e 29º.
M. – DOS PONTOS 10º E 12º DA OPOSIÇÃO AO INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO A ADITAR: Resulta do documento nº 2, 3 e 4, junto com a Contestação, que antes do casamento a Recorrente, enquanto solteira possuía, quantia de €21.997,07 (vinte e um mil, 24 novecentos e noventa e sete euros e sete cêntimos), na Banco 1... da qual era única titular, resultante do seu trabalho, como emigrante na ....
N. Para além disso, a Requerida, também era titular de uma conta bancária no Banco 2..., no estado de solteira, no valor de cerca de €4.000,00 (quatro mil euros), cfr. documento nº 24, 25 e 26, junto com a Contestação.
O. Resulta dos referidos documentos que a Recorrente era titular de saldos bancários, que permitiram que a mesma contribuísse para a edificação da casa de morada de família em causa. De acordo com o doc. nº 2, em 07/03/2001, a Recorrente possuía na sua conta bancária, a quantia de €21.997,07, na Banco 1....
P. Para além disso, a Recorrente era titular da conta bancária no valor de €3.861,74, no Banco 2..., conforme documentos nº 24, 25 e 26, juntos com a Contestação.
Q. Face ao exposto, tais factos são relevantes para a boa decisão da causa, uma vez que demonstra que a Recorrente possuía quantias monetárias iniciais para despender com a casa de morada de família.
R. Da prova testemunhal de GG, no dia 05-12-2024, a testemunha refere que as obras começaram com o dinheiro que a Recorrente ganhou na ..., no estado de solteira, sendo que o valor que a Recorrente tinha quatro mil contos na Banco 1... e tinha mais algum dinheiro no Banco 2.... Mais refere que até à montagem da estrutura e antes do empréstimo, o dinheiro da casa foi pago exclusivamente com o dinheiro da Recorrente, sua irmã. Quando acabaram as economias é que Recorrente e Recorrido pediram empréstimo ao banco.
S. E, perante as declarações de parte da Recorrente, no dia 05-12-2024, a Recorrente refere que na Banco 1... possuía €20.000,00, e para começar a casa tinha também dinheiro no Banco 2..., para fazer a montagem da casa, nomeadamente o “grosso da casa”, usando o dinheiro de solteira para o início da casa. Esse dinheiro foi amealhado na ..., antes de casar. Sustenta que o Recorrido nada pagou com o início da edificação da casa de morada de família. Pelo que se pugna que sejam aditados os referidos factos ao elenco dos factos dados como provados.
T. - DO PONTO 11º DA OPOSIÇÃO AO INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO A ADITAR: A Requerida efetuava transferências bancárias da ... para a sua conta nº ...22, domiciliada em Portugal, na Banco 1...:
U. Resulta do teor dos documentos nº 5 a 23 junto com a Contestação, que a Recorrente efetuava transferências bancárias da ... para a sua conta nº ...22, domiciliada em Portugal, na Banco 1....
V. Face ao exposto, tal facto é relevante para decisão da boa causa, uma vez que demonstra que a Recorrente transferia – enquanto solteira - quantias monetárias da sua conta da ... para a sua conta de Portugal, com o objetivo de custear as obras inicias da casa de morada de família. Pelo que se pugna que seja aditado o referido facto ao elenco dos factos dados como provados.
W. - DO PONTO 12º DA OPOSIÇÃO AO INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO A ADITAR: 12º - A Requerida, também era titular de uma conta bancária no Banco 2..., no estado de solteira, no valor de cerca de €4.000,00 (quatro mil euros), cfr. documento nº 24, 25 e 26, junto com a Contestação.
X. Resulta dos documentos nºs 24,25e 26, juntos com a Contestação, que, em 15/12/2000, a Recorrente era titular de uma quantia no valor de cerca de €4.000,00 (quatro mil euros), nomeadamente de 774.209$90, equivalente a €3.861,74:
Y. Face ao exposto, tal facto é relevante para decisão da boa causa, uma vez que demonstra que a Recorrente, além de titular das quantias da Banco 1..., também era titular da quantia de €3.861,74 no ..., que utilizou para custear as obras inicias da casa de morada de família.
Z. - DO PONTO 13º DA OPOSIÇÃO AO INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO A ADITAR: - As referidas quantias bancárias amealhadas pela Requerida, durante o estado de solteira, esta custeou todas as despesas inerentes ao projecto da casa, taxas urbanísticas, licenças, aterros, terraplanagens, estrutura da moradia, etc., cfr. documento nº 27, junto com a
Contestação.
AA. Resulta do documento nº 27, junto com a Contestação, que foi a Recorrente quem procedeu ao pagamento de todas as despesas inerentes ao projecto e administrativos da casa de habitação.
BB. O referido documento, traduz-me em missiva enviada pelo Gabinete de Arquitectura – EMP01... (que elaborou o projecto da casa de habitação), ao pai da Recorrente, para liquidar as despesas referente a projeto e administrativo da casa de habitação.
CC. Pelo que se pugna que sejam aditados os referidos factos ao elenco dos factos dados como provados.
DD.- DO PONTO 21º e 24º DA OPOSIÇÃO AO INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO A ADITAR: No âmbito da edificação da casa de habitação do extinto casal, a Recorrente efectuou o pagamento, da sua própria conta bancária e com o seu dinheiro, os seguintes serviços: Para o aterro, mão-de-obra e material, despendeu a Recorrente a quantia de € 4.121,00 (quatro mil cento e vinte e um euros), cfr. documento nº 28 junto com a Contestação.
EE. Resulta do documento nº 28, junto com a Contestação, que foi a Recorrente quem efetuou o pagamento, da sua própria conta bancária e com o seu dinheiro, do aterro, mão-de-obra e material, despendeu a Recorrente a quantia de € 4.121,00 (quatro mil cento e vinte e um euros), cfr. documento nº 28 junto com a Contestação:
FF. Foi a Recorrente quem liquidou as despesas inerentes a mão-de-obra e material, na qual despendeu a quantia de € 4.121,00, pois que, as facturas e recibos encontram-se emitidas a favor da Ré: “BB”. Pelo que se pugna que seja aditado o referido facto ao elenco dos factos dados como provados.
GG.- DO PONTO 26º DA OPOSIÇÃO AO INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO A ADITAR: Para pagamento ao empreiteiro, referente à estrutura da casa e mão-de-obra da parte interior e respectivo material, a Recorrente despendeu a quantia de € 12.500,00 (doze mil e quinhentos euros).
HH. Resulta do documento nº 28, junto com a Contestação, encontra-se um orçamento de 27 2.500.000$00 (equivalente a € 12.500,00), que foi emitido a favor do pai da Recorrente. Pelo que se pugna que seja aditado o referido facto ao elenco dos factos dados como provados.
II. - DO PONTO 29º DA OPOSIÇÃO AO INCIDENTE DE LIQUIDAÇÃO A ADITAR: Com os serviços de pichelaria e electricista efectuados por HH, despendeu a quantia de € 4.650,00 (quatro mil seiscentos e cinquenta euros), acrescendo a quantia de €1.379,19 (mil trezentos e setenta e nove euros e dezanove cêntimos) cfr. documento nº 32, 33 e 34 juntos com a Contestação.
JJ. Resulta dos documentos nºs 32 a 34, figuram vários orçamentos, também dirigidos à Recorrente: “BB”, referentes a pichelaria e electricista, despendendo a Ré a quantia de € 4.650,00 e € 1.379,19. Pelo que se pugna que seja aditado o referido facto ao elenco dos factos dados como provados.
KK. Perante a prova supra mencionada, resulta que foi a Ré, aqui Recorrente com o seu dinheiro, amealhado enquanto solteira – e com o dinheiro resultante do seu salário enquanto casada no regime da separação de bens com o Autor, que suportou todas as despesas relacionadas com a edificação da casa ref. em 16. dos factos dados como provados – cfr. resulta da prova documental e testemunha.
LL. Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença do Tribunal a quo e é o mesmo apresentado na firme convicção de que o montante indemnizatório arbitrado ao Recorrido é excessivo e desproporcional atenta a factualidade dada como provada.
MM. Salvo o devido respeito, que é muito, a Recorrente entende que o Tribunal a quo fez uma incorreta aplicação do Direito aos factos dados como provados.
NN. Ocorreu erro de julgamento, porquanto: Os factos dados como provados e não provados da Douta Sentença do presente Incidente de Liquidação são idênticos aos factos da Douta Decisão dos autos principais.
OO. - No entender da Recorrente, deveria ter sido produzida prova de forma a identificar qual o concreto montante despendido pelo Recorrido nas benfeitorias da casa de morada de família, de acordo com o ponto 16º do facto dado como provado.
PP. - NÃO OCORREU QUALQUER PROVA OU FACTO DADO COMO PROVADO COMPLEMENTAR AO FACTO 16º DADO COMO PROVADO; Não existindo qualquer prova adicional do facto 16º, o Tribunal a quo deveria julgar improcedente o incidente de liquidação ou ter dado como provado o valor despendido pelo Recorrido.
QQ. Foi dado como provado o ponto 21º na Douta Sentença que: A ré efetuava pagamentos relativos ao empréstimo bancário, a despesas da edificação da casa em Portugal e a vestuário.
RR. Ora, o Tribunal a quo, tendo dado como provado no seu ponto 20º da fundamentação de facto, deveria recorrer, de igual forma, ao previsto no artigo 566.º do Código Civil para determinar de acordo com o princípio da equidade, e fixar um montante que a Recorrente despendeu relativamente ao empréstimo bancário, dinheiro que amealhou no estado de solteira e despesas da edificação da casa de Portugal e vestuário.
SS. Para além disso, o direito a indemnização a título de benfeitorias terá de ser calculado pelo valor do custo das obras à data do divórcio, em ../../2012, importando, também determinar o seu custo e não pelo valor do mercado imobiliário, sendo devido o menor desses valores.
TT. Julga-se que o valor desse custo não se pode considerar esclarecido nos autos, a Perícia determinou o valor da edificação e não o seu custo.
UU. Sendo que o custo da edificação não corresponde ao valor do prédio urbano.
VV. Assim sendo, não estando determinado o valor de custo das benfeitorias seja da moradia, seja dos muros e betonilha e não se provando o montante despendido pelo Recorrido na edificação da casa, muros e betonilha, que fundamente o seu pedido, 29 deverá o presente incidente ser julgado improcedente.
WW. INCUMBIA AO RECORRIDO FAZER PROVA DOS FACTOS EM QUE SE FUNDAMENTA O SEU PEDIDO, designadamente do montante do custo das benfeitorias que foi pago com o dinheiro comum,
XX. O QUE NÃO SUCEDEU!!!
YY. O valor do edifício foi avaliado em € 161.143,00.
ZZ. Contudo, não foi provado que o Autor despendesse o montante de €129.581,83, não foi provado que contribuísse para o empréstimo de €39.903,83, nem foi provado que tivesse enviado a quantia de € 89.678,00 para Portugal – para as despesas com a edificação da casa.
AAA. Nunca se pode olvidar que o Autor, aqui recorrido, na sua petição inicial, não peticionou metade do valor do prédio melhor id. em 16., pelo que, JAMAIS o Recorrido poderá ser-lhe concedido o valor de metade do prédio, até porque, este não formulou tal pedido, pois sabia que não tinha direito, uma vez que foi a Recorrente quem suportou todas as despesas da casa, melhor id. em 16.
BBB. Ser concedido ao Recorrido a quantia de metade do valor da casa de habitação (melhor id. em 23º e 24º dos factos dados como provados), seria um atropelo à Lei processual, nomeadamente violação do art. 609º do CPC (1- A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir).
CCC. Vislumbrando os factos dados como provados e não provados, poderemos concluir que era a Recorrente que efetuava os pagamentos do empréstimo bancário e de todas as despesas da edificação da casa em Portugal, (cfr. ponto 20º dos factos provados) AO INVÉS O Autor efetuava pagamentos relativos à renda mensal da casa de habitação de ..., a veículo automóvel, férias, alimentação, electricidade e impostos (cfr. ponto 21º dos factos provados).
DDD. Quer isto dizer que, de acordo com os pontos 20º e 21º dados como provados pelo 30 Tribunal a quo, a verdade é que o Autor, aqui Recorrido, despendia quantias – do seu salário – para proceder ao pagamento das despesas relativas: - à renda mensal da casa de habitação em ...; veículo automóvel; Férias; Alimentação; Electricidade; Impostos.
EEE. Por outra via, era a Recorrente quem efetuava o pagamento das despesas de edificação da casa em Portugal, do pagamento do crédito bancário e do vestuário.
FFF. Com efeito, a decisão de Primeira Instância condenou a ora Recorrente a pagar ao Recorrido a quantia de €80.571,50, fixando a referida quantia, com apoio ao princípio da equidade, contudo, não deduziu o Tribunal a quo, as quantias despendidas pela Recorrente, que se encontram dadas como provadas na Douta Sentença, no seu ponto 20º da Fundamentação de Facto, tais como: “pagamentos relativos ao empréstimo bancário, a despesas da edificação da casa em Portugal e a vestuário”.
GGG. Destarte, os factos dados como provados e não provados do presente incidente de liquidação são idênticos à fundamentação de facto do processo principal, não sendo provado qualquer outro facto relevante, nem provado qualquer valor custeado pelo Recorrido em benfeitorias com a casa de morada de família, o que levará à improcedência do incidente de incidente de liquidação ou ao erro de julgamento que originará à produção de novos meios de prova.
HHH. A Douta Sentença recorrida violou o disposto nos arts. 566º e 473º a 482º do Código Civil.
III. E, em consequência, deverá ser revogada a Sentença recorrida, julgando-se improcedentes os pedidos formulados na petição inicial ou caso assim não se entenda, ser produzida prova dos gastos concretos por parte do Recorrido nas benfeitorias da casa de morada de família ou caso assim não se entenda, considerar-se – através do princípio da equidade – o valor do dinheiro que a Recorrente possuía no estado de solteira, das despesas com empréstimo bancário, despesas de edificação da casa em Portugal que foi suportado exclusivamente pela Recorrente.
O Autor ofereceu contra-alegações, tendo concluído:
1. Julgando que o Tribunal recorrido não omitiu a pronúncia sobre quaisquer questões colocadas nos autos, não tendo violado o art. 607.º do CPC, nem tendo cometido a nulidade prevista na alínea d), do n.º 1, do art. 615.º do mesmo diploma legal, tudo conforme se deixou alegado sob o ponto I. da presente resposta ao recurso e, em conformidade, julgando improcedentes as conclusões A. a I. da apelação.
2. Julgando rejeitar o recurso quanto á matéria de facto por incumprimento dos ónus previstos na alínea b) do n.º 1 e das alíneas a) e b) do n.º 2, do art. 640.º do CPC, não se apreciando, consequentemente, as conclusões J. a RR. da apelação.
3. A não se decidir pela rejeição do recurso, julgando improcedentes as conclusões J. a RR., pelas razões alegadas sob o ponto II. 2.ª QUESTÃO, designadamente por se tratar de questões que caiem fora do objeto do incidente, por se tratar de factos e questões repetidas, já apreciadas em sede da ação, e por se tratar de factos desprovidos de interesse para a decisão da causa.
4. Julgando improcedentes as conclusões SS. a VV., pois, atenta a disciplina do instituto do enriquecimento sem causa dos artigos 473.º e seguintes do Cód. Civil, para efeitos de fixação do montante da indemnização, o que interessa é apurar o valor das benfeitorias e não o custo ou despesas tidas com as benfeitorias.
5. Julgando que o Tribunal recorrido, tendo julgado como não provado que a percentagem de comparticipação do autor/recorrido para as benfeitorias tivesse sido de 62,1235%, correspondente á percentagem de rendimento por si auferido no rendimento global do extinto casal durante dos anos de 1996 e 2010 e, tendo recorrido á equidade para fixar o montante da indemnização, seguindo o raciocínio consubstanciado na sentença proferida na ação, e tendo julgado, com recurso á equidade, ser mais justa a percentagem de 50% na comparticipação do autor para as benfeitorias, já que o casal, tal como tinha sido decidido naquela sentença proferida na ação, vivia como se o regime de bens do casamento fosse o de comunhão de bens, decidiu correctamente, não merecendo censura ou reparo tal decisão.
6. Julgando improcedentes as conclusões WW. a HHH., já que o Tribunal recorrido sempre teria de fixar uma justa indemnização, face ao disposto na alínea d) do art. 360.º do CPC. Os recursos foram admitidos neste tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Delimitação do objecto do recurso: Questões a decidir.
Atentas as conclusões das apelações deduzidas, e supra descritas, são as seguintes as questões a apreciar, e que se conhecerão pela ordem que se indica:
A) Recurso de Apelação da Ré - invocada nulidade de sentença - reapreciação da matéria de facto - da prova mencionada, resulta que foi a Ré, com o seu dinheiro, amealhado enquanto solteira e com o dinheiro resultante do seu salário enquanto casada no regime da separação de bens com o Autor, que suportou todas as despesas relacionadas com a edificação da casa ref. em 16. dos factos dados como provados ? - do valor do direito à indemnização - do juízo de equidade estabelecido pelo Tribunal “a quo”
B) Recurso de Apelação do Autor - no valor da indemnização deverá considerar-se o montante de 2.278,50€, correspondente a metade do valor dos muros e do pavimento exterior em betonilha, ascendendo a € 82.850,00 o valor da indemnização ? - deverá proceder-se à actualização do valor global da indemnização devida ao Autor, e, por valores actualizados à data da sentença ou, pelo menos, à data da instauração do presente incidente ? - da contagem dos juros de mora - da percentagem da condenação em custas
II) FUNDAMENTAÇÃO:
I) OS FACTOS ( factos declarados provados, e não provados, na sentença recorrida ).
1) O teor da sentença proferida nestes autos, de ../../2020, designadamente que o autor e a ré contraíram casamento entre si, em ../../1996, em ... (...), ..., em primeiras núpcias de ambos, sob o regime da separação de bens.
2) Tal casamento foi dissolvido por divórcio decretado por sentença proferida em 16 de outubro de 2012, pelo Tribunal de Grande Instância de ... – ..., transitada em julgado nessa data.
3) Pelo menos em 2000, o autor e a ré decidiram construir uma casa destinada a habitação, na freguesia ..., concelho ....
4) Os pais da ré permitiram a sua construção em terreno que lhes pertencia.
5) De modo a concretizarem tal propósito contactaram com o Gabinete de Arquitetura, EMP01..., em ..., a fim de elaborar o projeto da obra para ser submetido a aprovação na Câmara Municipal ....
6) O projeto da casa de habitação foi aprovado no âmbito do Processo de Obras n.º ...00, tendo a obra sido construída ao abrigo da Licença de Construção n.º ...00, de 29-11-2000.
7) Em princípios do ano de 2001, foi iniciada a construção de tal casa de habitação.
8) Em virtude de não possuírem dinheiro suficiente para a construção da referida casa de habitação, o autor e a ré, no dia 17 de dezembro de 2001, celebraram com a Banco 1..., S.A., um contrato de mútuo no valor de 8.000.000$00.
9) Por tal contrato, ao autor e à ré foi emprestada a referida quantia de 8.000.000$00.
10) Tal dinheiro foi aplicado na construção da referida casa.
11) Entre ../../2002 e ../../2007 foi enviada para Portugal a quantia de 7.902,00 €.
12) Parte dessa quantia foi enviada via postal, por vales postais, para serem levantados pelo ex-sogro do autor.
13) Os pais da ré, II e EE, no dia 26 de novembro de 2001, por escritura pública de doação celebrada no Cartório Notarial ..., exarada de fls. 10 a 10 verso do Livro ...62-E, doaram á ré, por conta das quotas disponíveis deles doadores, o prédio urbano, composto por terreno para construção, situado no lugar do ..., freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...40, de ..., omisso na matriz, a confrontar pelo norte com CC, pelo sul com DD, pelo nascente com EE e pelo poente com FF e caminho.
14) A casa de habitação foi construída sobre o solo do prédio urbano supra referido.
15) Após ter sido concluída, tal casa de habitação foi inscrita na matriz sob o art. ...57, urbano, da extinta freguesia ..., atual art. ...09 da União das freguesias ..., ... e ..., sendo o ano da sua inscrição na matriz de 2003.
16) Aquele terreno para construção e a construção nele erigida deram origem ao Prédio Urbano situado no lugar do ..., freguesia ..., concelho ..., constituído por uma casa destinada a habitação, de ... e andar, Tipo ..., com anexo, inscrito na matriz sob o art. ...09 da União das freguesias ..., ... e ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...40, de ....
17) O autor contribuiu, em medida não concretamente apurada, para as despesas de construção da casa referida em 16, nelas se incluindo os custos com projetos e administrativos e as obras realizadas na casa, anexo e muros.
18) Tal construção (casa, anexo e muros) não é levantável nem divisível.
19) Enquanto casados, autora e ré dividiam entre si as despesas mensais do agregado familiar.
20) A ré efetuava pagamentos relativos ao empréstimo bancário, a despesas da edificação da casa em Portugal e a vestuário.
21) Para além do referido em 17, o autor efetuava pagamentos relativos à renda mensal da casa de habitação em ..., a veículo automóvel, férias, alimentação, eletricidade e impostos.
22) À data de ../../2018, o valor do prédio onde foi implantada a construção era de 18.400 €.
23) Na mesma data, o valor do edifício era de 161.143,00 €.
24) Na mesma data, o valor dos muros e betonilha era de 4.557,00€.
25) Nessa sequência, foi condenada a ré BB a pagar ao autor AA, a indemnização pelas benfeitorias úteis que o autor realizou no prédio referido em 16 dos factos provados, a liquidar em incidente posterior, e com o limite máximo de 129.581,83 € (cento e vinte e nove mil quinhentos e oitenta e um euros e oitenta e três cêntimos).
Factos não provados:
a) O autor contribuiu em 62,1235% para as despesas de construção da casa referida em 16.
II) O DIREITO APLICÁVEL
A) Recurso de Apelação da Ré 1.- invocada nulidade de sentença
Invoca a apelante a verificação de nulidade de sentença nos termos do artº 615º-nº1-al. d) do CPC, alegando que “a Ré, aqui Recorrente, apresentou a respectiva Oposição ao Incidente de Liquidação, nomeadamente nos artigos 10º a 53º, e concretamente nos artigos 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 21º e 24º, 26º e 29º, e tais factos não foram dados como provados, nem dados como não provados, ocorrendo total omissão de pronúncia quanto aos factos supra relatados, concluindo que a alegada circunstância de o facto de Tribunal a quo não ter tido em consideração a matéria em causa – dando-a como provada, ou como não provada, integrará a invocada nulidade”.
Sem razão, porém, sendo distintas as “Questões” jurídicas a conhecer nos termos do nº2 do artº 608º do Código de Processo Civil, da factualidade material que as baseia.
Nos termos do artº 615.º n.º1-al.d) do Código de Processo Civil, é nula a sentença quando “O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Os vícios previstos no citado art.º 615º do Código de Processo Civil, geradores de nulidade da sentença, são vícios de cariz adjectivo ou processual e que afectam a decisão na sua estrutura processual, invalidando-a ou tornando-a incompleta ou incompreensível, relativamente aos vícios apontados, “Trata-se de um mero vício formal (e não de erro de substância ou de julgamento)” - Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 23/5/2006, Proc. n.º 06A10 90, in www.dgsi.pt. E, assim, e no que à omissão de pronúncia se refere, reporta-se a lei a um desconhecimento absoluto da questão objecto da decisão (Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 6/5/2004, p.04B1409, in www.dgsi.pt),
No caso em apreço a indicada causa de nulidade não ocorre, encontrando-se a decisão devidamente fundamentada e tendo-se procedido ao conhecimento da “Questão” em litígio, como expressamente decorre do teor da sentença recorrida, sendo esta determinar “Qual a medida em que o autor contribuiu para a construção da casa de morada de família”, ainda, tendo sido fixado como “Objecto do litígio”: “apurar se o autor contribuiu em 62,1235% para as despesas de construção da casa referida em 16 na sentença supra referida, nelas se incluindo os custos com projectos e administrativos e as obras realizadas na casa, anexo e muros”.
Nestes termos, reportando-se a nulidade invocada não a vício de natureza processual mas a alegado erro de julgamento da matéria de facto, a conhecer em sede própria.
2.- reapreciação da matéria de facto
Nos termos do artº 662º-nº1 do CPC “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Pretende a Ré/apelante a adição ao elenco dos factos provados da factualidade que indica, respeitante aos artº 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 21º e 24º, 26º e 29º, do articulado de “Oposição”, tendo estes o seguinte teor: “10.º A par disso, e até ao casamento entre a Requerida e Requerente, aquela, enquanto solteira, foi amealhando dinheiro numa conta bancária emigrante, na Banco 1... da qual era única titular, resultante do seu trabalho, como emigrante na ..., em quantia superior a € 20.000,00 (vinte mil euros) 11.º Sendo certo que, a Requerida efectuava transferências bancárias da ... para a sua conta nº ...22, domiciliada em Portugal, na Banco 1... 12.º Para além disso, a Requerida, também era titular de uma conta bancária no Banco 2..., no estado de solteira, no valor de cerca de € 4.000,00 (quatro mil euros) 13.º Sendo que, com as referidas quantias bancárias amealhadas pela Requerida, o estado de solteira, esta custeou todas as despesas inerentes ao projecto da casa, taxas urbanísticas, licenças, aterros, terraplanagens, estrutura da moradia 14.º Porém, o Requerente entre a data do casamento e o início da edificação da casade habitação, não possuía qualquer economia monetária, para fazer face às despesas com a edificação da moradia. 21.º No âmbito da edificação da casa de habitação do extinto casal, a Requerida efectuou o pagamento, da sua própria conta bancária e com o seu dinheiro, os seguintes serviços: 24.º Para o aterro, mão-de-obra e material, despendeu a Requerida a quantia de € 4.121,00 (seis mil trezentos e doze euros), 26.º Para pagamento ao empreiteiro, referente à estrutura da casa e mão-de-obra da parte interior e respectivo material, a Requerida despendeu a quantia de € 12.500,00 (doze mil e quinhentos euros) 29.º Com os serviços de pichelaria e electricista efectuados por HH, despendeu a quantia de € 4.650,00 (quatro mil seiscentos e cinquenta euros), acrescendo a quantia de € 1.379,19 (mil trezentos e setenta e nove euros euros e setenta cêntimos)”.
Mais alegando a apelante que “da prova mencionada, resulta que foi a Ré, com o seu dinheiro, amealhado enquanto solteira e com o dinheiro resultante do seu salário enquanto casada no regime da separação de bens com o Autor, que suportou todas as despesas relacionadas com a edificação da casa ref. em 16. dos factos dados como provados”.
A factualidade que se pretende ver aditada ao elenco factual, não demostra o grau de contribuição de cada um dos ex-cônjuges para a construção da ex-casa de morada de família.
E, a conclusão que a apelante pretende obter contraria a factualidade assente, designadamente, o facto provado nº 17, e, a sentença proferida nos autos principais de acção declarativa, transitada em julgado, e confirmada por acórdão deste TRG, sentença que decidiu condenar a ré BB a pagar ao autor AA, a indemnização pelas benfeitorias úteis que o autor realizou no prédio referido em 16 dos factos provados, a liquidar em incidente posterior, e com o limite máximo de 129.581,83 €.
Resultando, assim a inutilidade, e manifesta improcedência da impugnação deduzida.
Nenhuma outra impugnação tendo sido deduzida ao abrigo do artº 640º do Código de Processo Civil.
Consequentemente, se mantendo inalterado o elenco factual da acção.
3. - do valor do direito à indemnização - do juízo de equidade estabelecido pelo Tribunal “a quo”
a. Relativamente à fixação do valor da indemnização e critérios de aferição encontra-se já decidido na sentença proferida nos autos principais de acção declarativa, transitada em julgado, e cfr. se salienta na decisão ora em recurso: “A construção da casa deve ser qualificada como benfeitoria útil, sendo notório (face à natureza da obra) não poder ser levantada sem detrimento da coisa benfeitorizada, pelo que tendo o autor contribuído para a sua edificação assiste-lhe o correspondente direito de crédito. No caso, ficou demonstrado que o autor contribuiu, em medida não concretamente apurada para as despesas de construção da casa em causa nestes autos, nelas se incluindo as relativas a projetos, custos administrativos, obras de construção da casa, anexo e muros. Há, pois, que reconhecer que lhe assiste o direito de indemnização por benfeitorias. (…)., nas benfeitorias úteis o enriquecimento não consiste na poupança da despesa pelo proprietário, pois poderia nem sequer as realizar, mas antes no correspondente incremento do valor da coisa. Face ao disposto no art. 479.º do CC, não basta provar-se o valor das benfeitorias, sendo necessário ainda demonstrar-se o incremento de valor trazido ao prédio, à data da citação, pois só assim se conseguirá aquilatar do valor com que o proprietário de enriqueceu à custa do possuidor. Acolhe-se, assim, a doutrina do “duplo limite” no caso das benfeitorias úteis, que não possam ser levantadas sem detrimento da coisa (art.1273 CC) - cf. P.LIMA/A.VARELA, Código Civil Anotado, vol.I, pág.440). Por conseguinte, a lei estabelece o critério para apurar a indemnização, não pelo valor económico das benfeitorias- como é pretensão do autor- devendo antes ser calculada pelas regras do enriquecimento sem causa, pois uma coisa é o valor objetivo da vantagem obtida, outra o montante do enriquecimento proporcionado ao beneficiário. Nos autos sabe-se, apenas, o valor do terreno e do prédio à data da realização da perícia. Mais se ignora qual o concreto valor da comparticipação do autor para a construção da moradia, pois que apenas se apurou que pagou uma parte, não apurada. Ora, não se apurando o valor do crédito do autor, impõe-se relegar para incidente posterior, apesar de o autor haver peticionado um valor líquido. (…) Por conseguinte, deverá a indemnização a que o autor tem direito pelas benfeitorias úteis em que comparticipou, ser liquidada em execução de sentença, tendo por limite máximo o valor do pedido principal desta ação, e as regras da sua fixação nos termos do enriquecimento sem causa a que supra se aludiu (…)”.
Consequentemente, e como se conclui na decisão recorrida, cfr. a perícia, “o valor global alcançado foi o de € 184.100,00” – neste valor se incluindo o valor do terreno onde foi implantada a construção (18.400 €) e o valor dos muros e betonilha (4.557,00 €).
“A liquidação da sentença só tem por fim concretizar o objecto da condenação, com respeito do caso julgado decorrente da acção declarativa. A existência do dano não pode ser relegada para o incidente, apenas a sua quantificação” (Ac. do STJ de 07.05.98, proferido no processo 98A1117, acessível em www.dgsi.pt ).
Não estando, assim, em discussão, no presente Incidente de Liquidação e recurso, determinar o valor da construção, mas, tão só, muito distintamente, aferir “Qual a medida em que o autor contribuiu para a construção da casa de morada de família”.
“Em face da insuficiência de elementos para determinar o montante indemnizatório, nada obsta a que se profira condenação ilíquida, com a consequente remissão do apuramento da responsabilidade para momento posterior, desde que essa segunda oportunidade de prova não incida sobre a existência dos danos, mas apenas sobre o respetivo valor (…);
Por outro lado, como se refere no Ac. STJ de 10-12-2013 “não seria curial que, tendo a [parte em questão] provado a existência de uma situação de direito à reparação do dano – art. 562.º do CC –, apesar disso, a ação devesse ser julgada improcedente apenas porque se não provou o exato montante que se encontra, a esse título, em dívida” – (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 30/4/2014, P.593/09.7TTLSB.L1.S1, in www.dgsi.pt).
Nos termos do artº 609º-nº2 do Código de Processo Civil, “Se não houver elementos para fixar o objecto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja liquida”.
“O art. 661º, n.º 2, do CPC, tanto se aplica ao caso do autor ter formulado inicialmente pedido genérico e não ter sido possível convertê-lo em pedido específico, como no caso dele ter logo formulado pedido especifico, mas não se chegarem a coligir dados suficientes para se fixar, com precisão e segurança, o objecto ou a quantidade da condenação, razão pela qual a dedução inicial de pedido líquido não obsta a que a sentença condene em quantia a liquidar em execução de sentença”.- Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 4/5/2010, in www.dgsi.pt.
“Uma vez assente a existência de danos mas não se tendo apurado com precisão o seu montante, e antes de lançar mão da equidade, há que condenar no que se liquidar em execução de sentença” - Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 24/10/2006, in www.dgsi.pt.
Nos termos expostos resultando improcedentes os fundamentos de apelação da Ré, não merecendo censura os fundamentos da decisão.
b. Igualmente se reiterando, por correcto, o juízo de equidade estabelecido pelo Tribunal “a quo”, designadamente:
“Face aos factos provados, o tribunal, de forma inequívoca, considera estabelecer em 50% o valor da comparticipação do autor para a construção da moradia, tal como o da ré.
Repetindo a argumentação expendida na sentença, o autor e a ré decidiram construir em Portugal uma habitação, quatro anos após o seu casamento, e portanto numa ocasião em que vigorava o vínculo conjugal, e enquanto ele perdurou, tendo ambos rendimentos e vivendo em economia comum. (…) Não obstante o regime de bens do casamento, o réu geria as contas bancárias e ordenava transferências de dinheiro próprio e de dinheiro da ré, resultando das declarações da ré que o fazia sem carecer da sua autorização ou confirmação, o que denota que, não obstante tal regime de bens, a gestão dos rendimentos do casal era feita por ambos sem uma verdadeira afectação estanque e individual dos respectivos rendimentos. Tal como qualquer outro casal, vivendo em economia comum, autor e ré encontraram uma forma de equilibrar os contributos de ambos para as despesas do agregado familiar.
Face a isto, não se vê como estabelecer outra medida que não aquela, sendo esta a mais adequada, proporcional e justa.
Passando a calcular o valor devido ao autor”.
E, sendo que a fixação equitativa dos danos não corresponde a juízos de mera discricionariedade do julgador, devendo este seguir-se por critérios de uniformidade existentes e orientadores, encontra-se devidamente fundamentada na decisão.
B) Recurso de Apelação do Autor 1. - no valor da indemnização deverá considerar-se o montante de 2.278,50€, correspondente a metade do valor dos muros e do pavimento exterior em betonilha, ascendendo a € 82.850,00 o valor da indemnização ?
Foi decidido na decisão recorrida fixar em € 80.571,50 o valor da indemnização a fixar a favor do Autor, tendo-se considerado o valor global da construção de € 184.100,00, e a este valor se retirando o valor do terreno onde foi implantada a construção (18.400 €) e o valor dos muros e betonilha (4.557,00 €), alcançando-se, assim, o valor do edifício: 161.143,00 €.
Relativamente a este ponto de discordância do apelante/Autor com o decidido, julga-se procedente a apelação, de acordo com o factualismo provado, designadamente facto provado nº 17, resultando provado que: “O autor contribuiu, em medida não concretamente apurada, para as despesas de construção da casa referida em 16, nelas se incluindo os custos com projetos e administrativos e as obras realizadas na casa, anexo e muros”, e, assim, deve incluir-se no valor a arbitrar metade do valor de muros e betonilha, concretamente € 2278,50, ascendo a € 82.850,00 o valor da indemnização.
2. - deverá proceder-se à actualização do valor global da indemnização devida ao Autor, e, por valores actualizados à data da sentença ou, pelo menos, à data da instauração do presente incidente ?
Relativamente a esta questão, remete-se para os fundamentos já expressos em II.A)-3.a), supra, na apreciação do recurso de apelação da Ré.
Esclarecendo-se, não estar em discussão, no presente Incidente de Liquidação e recurso, determinar o valor da construção, mas, tão só, muito distintamente, aferir “Qual a medida em que o autor contribuiu para a construção da casa de morada de família”.
Estando já fixado na sentença declarativa o valor do “Enriquecimento” correspondente aos valores de construção decorrentes dos factos provados, e ora indicados nos factos provados nº 23 e 24.
3. - da contagem dos juros de mora
1. Relativamente à contagem dos juros de mora (v. Cls. 9 e 10, supra), são os mesmos devidos desde a data da sentença de liquidação nos termos dos artº 806º-nº1 e 805º-nº3, 1ª parte do Código Civil, dado tratar-se de crédito ilíquido, estabelecendo os normativos legais indicados como início da mora o da liquidação.
“A regra in illiquidis non fit mora, expressa no nº3, é correntemente justificada pelo facto de o devedor não poder cumprir, enquanto se apura o objecto da prestação”- P.Lima e A.varela, in Código Civil, anotado, Vol II, notas ao artº 805º.
2. Verificando-se, porém, que na sentença recorrida se procedeu à condenação da Ré no pagamento de juros de mora desde a data da citação no âmbito do presente incidente e até integral pagamento e dessa decisão a Ré não recorreu e a divergência do apelante/Autor no tocante a tal decisão (que lhe é favorável) se prende com a pretendida actualização do valor da indemnização (cfr. Cls. 9 e 10, supra), pretensão que vai indeferida, deverá considerar-se que em via de recurso não poderá proceder-se já, nesta parte, à alteração do decidido em 1ª instância, em virtude da aplicação do Princípio da Proibição da Reformatio in Pejus que vigora no direito processual civil e o qual se traduz na proibição de o julgamento do recurso agravar a posição do recorrente, tornando-a pior do que seria se ele não tivesse recorrido (A. Reis, in Código de Processo Civil, anotado, Vol. V, pg. 311, com referência e citando Prof. Andrade).
Nestes termos, nesta parte se mantendo o decidido.
4. - da percentagem da condenação em custas
Relativamente à condenação em custas a mesma decorrerá das normas aplicáveis dos artº 527º e sgs. do Código de Processo Civil, designadamente da proporção de vencimento estabelecida no nº2 do artº 527º, redefinida em ambas as instâncias atenta a revogação parcial da sentença recorrida (- A. Geraldes, P.Pimenta e Pires de Sousa, in CPC, anotado, I Vol, pg.627, citando Ac. STJ de 20/12/2021, P. 2104/12; Ac. STJ de 17/10/2019, P. 2458/15).
Concluindo-se, nos termos expostos, pela improcedência do recurso de apelação da Ré e parcial procedência do recurso de apelação do Autor, nos termos acima indicados, fixando-se em € 82.850,00 o valor da indemnização.
DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelação da Ré e em julgar parcialmente procedente a apelação do Autor, fixando-se em € 82.850,00 o valor da indemnização, em tudo o mais se mantendo o decidido.
Custas pelos apelantes, Autor e Ré, em 1ª e 2ª instâncias, na proporção dos respectivos decaimentos.
Guimarães, 29 de Maio de 2025
( Luísa D. Ramos ) ( Raquel Baptista Tavares ) ( Paulo Reis )