1. Em ação fundada em acidente de viação, a circunstância dos dois condutores terem praticado infrações estradais não implica que devam automaticamente ser considerados ambos responsáveis pelo acidente, havendo que apurar se essas infrações foram determinantes da sua ocorrência.
2. Quando se frustre o acordo entre o lesado e a companhia de seguros do lesante e o caso siga para tribunal, não é aqui aplicável o artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21.08, que rege a formulação de uma proposta razoável na fase extrajudicial, antes deve a indemnização ser arbitrada à luz das regras gerais enunciadas nos artigos 562.º e 566.º do Código Civil.
3. A esta luz, o conceito de referência é a excessiva onerosidade, a qual não se afere com base na mera comparação do valor venal do veículo com a estimativa do custo de reparação, devendo ser ponderado o valor de uso do veículo para o lesado, de modo que só deve ser recusada a indemnização in natura quando a desproporção entre aqueles dois valores seja de tal modo sensível que ofenda o princípio da boa fé.
(Sumário da Relatora)
Sumário: (…)
(Sumário da responsabilidade da Relatora, nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil)
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
I - Relatório
1. (…) intentou a presente ação comum contra (…) Seguros, SA, pedindo a condenação da R. a pagar ao A. o valor de € 15.763,31, a título de danos patrimoniais, a que acrescem juros de mora cíveis vincendos desde a data da citação até efetivo e integral pagamento e o valor de € 4.000,00, a título de danos não patrimoniais, a que acrescem juros de mora cíveis vincendos desde a data da citação até efetivo e integral cumprimento, pelos danos sofridos em consequência do acidente de viação em que o segurado na R. teve culpa exclusiva.
2. Citada regularmente, a R. contestou, pedindo a sua absolvição do pedido.
3. Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente e decido condenar a R. (…) Seguros, S.A., a pagar ao Autor (…) no montante de € 2.570,50 (dois mil e quinhentos e setenta euros e cinquenta cêntimos), ao que acrescem os juros de mora a contar do transito em julgado, os quais serão calculados à taxa supletiva vigente para os juros civis contados desde a data da citação até efetivo e integral pagamento; e a pagar ao Autor, a título de danos patrimoniais, a quantia de € 1.000,00 (mil euros), ao que acrescem os juros de mora a contar do transito em julgado, os quais serão calculados à mesma taxa supletiva vigente, até efetivo e integral pagamento.”
4. Inconformado com a sentença, o A. interpôs recurso da mesma, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:
“I. A sentença recorrida julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência condenou a R. (…) Seguros, S.A. a pagar ao A. a quantia de € 2.570,50 (dois mil, quinhentos e setenta euros e cinquenta cêntimos), acrescida de juros, calculados à taxa supletiva legal civil, desde o trânsito em julgado até efectivo e integral pagamento bem como ao pagamento ao A., a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 1.000,00 (mil euros).
II. Das declarações de parte do A. e da análise dos documentos juntos aos autos, não podem deixar de resultar como não provados os factos constantes no ponto 23 na parte em que refere “com o acordo e conhecimento da 3ª R.” e no ponto 25 dos factos assentes da sentença.
III. O Recorrente impugna o quesito 18 dos factos provados bem como impugna os quesitos 1, 5, 9, 11, 13.
IV. O quesito 18 dos factos provados é contraditado quer pelo quesito 1 dado como provado bem como pela documentação junta pela Ré na sua contestação. Já os quesitos 1, 5, 9, 11, 13 dados como não provados são contraditados quer pelo que o Recorrente alegou e não foi contraditado pela Ré, por documentos e bem assim por prova testemunhal produzida na audiência de discussão e julgamento.
V. Há ainda a considerar que factos determinados como não provados apenas o foram pelo Tribunal a quo considerar que a alegação dos mesmos em sede de Petição Inicial não é suficiente, necessitando que a mesma fosse corroborada por declarações de parte, mesmo quando a Ré impugnou mas não contraditou os ditos factos.
VI. Face à errónea qualificação dos factos provados e não provados, é natural que a conclusão de facto e a aplicação do Direita esteja ela própria enfermada de erro.
VII. Desde logo, na fundamentação de facto, entendeu a douta sentença que haveria uma repartição de responsabilidade, colocando o Recorrente e o condutor do veículo seguro pela Ré no mesmo patamar.
VIII. Contudo, como resulta da prova testemunhal, conjugada com a prova documental e bem assim a aplicação das normas legais e regras de experiência, o facto ilícito que determina a existência de danos e que é a mudança de direção promovida pelo condutor da viatura segura pela Ré.
IX. Pese embora se considere que o Recorrente circulava em excesso de velocidade, não é determinado o referido excesso de velocidade. Mas ainda que esse excesso se admita, por mero dever de patrocínio, as condições e extensão da via não oferecem outro resultado que o condutor do veículo seguro pela Ré mudou de direção mesmo tendo a possibilidade de evitar essa ação.
X. O condutor da viatura segura pela Ré agiu com o cuidado e diligência que lhe era exigido, tendo provocado por sua única e exclusiva culpa o sinistro.
XI. Ao invés da aplicação de uma repartição de responsabilidade, a qual carece até de fundamentação, deveria a decisão considerar o condutor do outro veículo, e consequentemente, a Ré, como o único ou responsável maioritário do sinistro.
XII. Mais, determinou o tribunal a quo que o valor venal da viatura do Recorrente seria o referencial para o quantum indemnizatório.
XIII. Não cuidando de considerar que o referido valor venal se encontra enfermado de erro e que é dado como facto assente a estimativa de reparação da própria Ré.
XIV. Deveria a decisão ser enquadrada na aplicação dos artigos 562.º e 566.º, ambos do Código Civil, e que determina que não sendo a reconstituição natural possível, deve ser a indemnização em dinheiro, tendo em conta o dano sofrido.
XV. Em suma, a decisão deveria ser diversa da que ora se impugna, atendendo a errónea qualificação de factos em que assenta a mesma e enferma a fundamentação de facto e direito de erro que influem decisivamente numa tomada de decisão que não se coaduna com o Direito.
Nestes termos, e nos demais de Direito aplicáveis, deverá a decisão ora recorrida ser revogada, devendo ser substituída por outra que condene a R. (…) Seguros, S.A. em todos os pedidos contra si formulados.”
5. A R. apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.
6. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II – Questões a Decidir
O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões da apelação, não sendo objeto de apreciação questões novas suscitadas em alegações, exceção feita para as questões de conhecimento oficioso (artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).
Não se encontra também o Tribunal ad quem obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes, sendo livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil).
Assim, o A. impugna a decisão da matéria de facto, aludindo, no ponto II. das suas conclusões, aos factos assentes na sentença sob 23 e 25.
Porém, só existem 19 factos provados na sentença, e em nenhum deles se encontra a menção “com o acordo e conhecimento da 3ª R.” contida naquele ponto das conclusões, aliás, inexiste 3ª R. nestes autos.
Deste modo, a impugnação da matéria de facto restringe-se ao facto provado 18, e aos factos não provados 1, 5, 9, 11 e 13, conforme enunciado no ponto III das conclusões.
Consequentemente, no caso em apreço importa decidir se deve ser alterada a decisão da matéria de facto e se deve ser alterada a decisão de direito, no sentido de condenar a Ré em todos os pedidos formulados pelo Autor.
III – Fundamentação de Facto
1. No n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil, norma atinente à “modificabilidade da decisão de facto”, prescreve-se que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
E no artigo 640.º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, estabelece-se que:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.”
2. O Tribunal a quo julgou provados e não provados os seguintes factos:
“III. Factos Provados.
Com interesse para a decisão da causa está provado que:
1. O Autor é proprietário do veículo de matrícula (…), marca Seat, modelo Leon, edição limitada (…);
2. No dia 29 de março de 2022, pelas 16h15m, o Autor deslocava-se, no veículo de matrícula (…), marca Seat, modelo Leon, na Rua dos (…), em Sesimbra;
3. Era uma reta, havia boa visibilidade e assim como as condições meteorológicas eram boas;
4. Existe um sinal de trânsito vertical na Rua dos (…);
5. O Autor circulava a mais de 50 quilómetros por hora, sendo que a velocidade máxima no local 50km/hora;
6. Quando o Autor se encontrava já a poucos metros do entroncamento para a Rua dos (…), (…) faz avançar o seu veículo, de forma a entrar na referida Rua dos (…) mudando a sua direção de marcha à sua esquerda;
7. Em ato contínuo, o Autor colocou o pé ao travão de forma a evitar o embate, algo que se revelou infrutífero;
8. O Autor não conseguiu evitar o embate da zona frontal do seu veículo automóvel com a lateral direita do veículo segurado pela Ré;
9. Após o embate o Autor e o condutor do outro veículo imobilizaram os referidos automóveis;
10. Fruto do embate, o veículo propriedade do Autor sofreu diversos danos na zona frontal, designadamente, no para-brisas, chapa e na direção, além do embate ter provocado a utilização dos airbags;
11. O Autor tem, até aos dias de hoje, receio em abordar entroncamentos quando vem algum veículo no sentido oposto;
12. Tal é o receio que por vezes tem de parar o veículo, atendendo o estado de nervosismo em que fica estando assim limitado no que á condução diz respeito;
13. Após o referido acidente de viação, o Autor colocou o seu veículo na (…) – Reparação de Automóveis, Lda., com sede na Azinhaga (…), Lote 1, 1600-774 Lisboa;
14. Entre a Ré, na qualidade de seguradora, e (…) Jardins, Lda. na qualidade de tomadora, foi celebrado contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel sobre o veículo de matrícula (…), titulado pela apólice n.º (…) e regulado pelas condições particulares juntas ao presente processo;
15. No entroncamento entre a Rua dos (…) e a Rua dos (…), em Sesimbra, concelho de Setúbal, o limite de velocidade no local é de 50km/h;
16. Os danos do veículo do Autor foram vistoriados por parte dos serviços técnicos da Ré que concluíram estarmos perante uma perda total;
17. A estimativa de reparação ascendia a € 11.924,35.
18. O valor venal da viatura rondaria entre os € 8.360,00 e os € 8.500,00;
19. O salvado, segundo a R., mereceu a proposta de aquisição no valor de € 3.359,00.
Com interesse para a decisão da causa resultou não provado:
1. Desde que o Autor contornou a última curva até ao entroncamento de entrada na referida rotunda, dista cerca de 345 metros;
2. E desde a entrada da Rua dos (…), de quem circula da rotunda, e o entroncamento para a entrada da Rua dos (…), dista 37 metros;
3. O referido sinal de trânsito vertical, trata-se de um triângulo a obrigar ao A. a ceder a passagem na rotunda;
4. O referido sinal de trânsito vertical, trata-se de um triângulo a obrigar ao A. a ceder a passagem no entroncamento;
5. O Autor circulava a cerca de 50 quilómetros por hora;
6. Continuando a aproximar-se, e atendendo o veículo conduzido por (…) se encontrar parado, o Autor seguia seguro que poderia continuar a sua marcha;
7. Também derivado do embate, o Autor foi transportado para o Centro Hospitalar de Setúbal, onde teve alta por volta das 21 horas e 51 minutos;
8. Nos dias seguintes, o Autor experienciou bastantes dores no corpo, designadamente na zona clavicular direita e no rosto;
9. Atualmente ainda sente algumas dores na zona cervical, quando está sentado durante longos períodos de tempo;
10. Como consequência direta destes episódios, o Autor sente-se deprimido, tendo contado com o apoio de familiares que o ajudaram a debelar essa mesma depressão;
11. Ainda hoje o Autor não pode deixar de se sentir profundamente triste e até como uma pessoa incapaz, em alguns momentos;
12. O orçamento para a reparação do veículo, o qual atinge o valor de € 15.763,31 (quinze mil e setecentos e sessenta e três euros e trinta e um cêntimos);
13. O Autor necessita de conduzir diariamente para o seu local de trabalho, não tendo alternativas em termos de transportes públicos para realizar tais movimentos pendulares.”
3. a) Passando a apreciar a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, insurge-se o A. contra o facto provado sob 18, aduzindo que sendo o seu veículo uma edição especial, como resultou provado sob 1, o seu valor venal é superior ao que foi julgado provado sob 18, o que decorre do doc. 11 junto com a cont..
Ora, compulsando o referido doc. 11 verificamos que do mesmo nada consta relativamente a veículos que constituam edições especiais, nem o A. concretiza o reflexo dessa característica se reflete na avaliação do veículo, não apontando o valor que reputa adequado para o mesmo.
No mais, aquele doc. 11 integra uma pesquisa relativa a veículos com características semelhantes ao veículo sinistrado, com base na qual a R. apurou o seu valor venal, aí se enunciando os seguintes três veículos Seat Leon:
- “Seat leon 2.0 170cv”, por € 8.500,00
- “Seat Leon Fr 2.0 Tdi 170cv”, por € 10.750,00
- Seat Leon 1p Fr 170cv”, por € 11.000,00
Advoga o A. que o primeiro veículo indicado, que foi aquele que suportou o valor máximo referido no intervalo plasmado no facto 18, não é semelhante ao veículo sinistrado, porquanto este não é um 2.0.
Porém, na comunicação de perda total também contida no evidenciado doc. 11 junto com a cont. surge a descrição completa do veículo do A. nos seguintes termos: “Seat Leon FR 2.0 TDI 170CV”.
E analisado o “certificado de matrícula” do veículo do A. junto com a p.i., constata-se que no campo correspondente à “cilindrada” está anotado “(…)”, o que foi vertido no boletim de perda total contido também no doc. 11 junto com a cont., significando que se trata de um veículo com uma cilindrada padrão de 2.0.
Assim, a comparação com o primeiro veículo enunciado na pesquisa é correta, sob a perspetiva de que se trata de um veículo com a mesma cilindrada do veículo sinistrado.
Acentua adicionalmente o A. que o seu veículo é um “Fr”, o que, efetivamente, corresponde à menção contida na comunicação de perda total em apreço, e sublinha que na aludida pesquisa aparecem valores mais elevados para veículos com a especificação “Fr”, o que, efetivamente, também sucede.
Deve, no entanto, assinalar-se que também o primeiro veículo enunciado é um “Fr”, como se retira da leitura da sua descrição pormenorizada, vertida, de igual modo, naquele doc. 11 junto com a contestação.
Deste modo, tanto quanto se pode extrair do teor desse doc. 11 junto com a cont., dos três veículos aí descritos, o mais distinto do veículo do A. é o terceiro, porquanto possui apenas duas portas, enquanto o veículo do A. possui quatro portas.
Por outro lado, apesar de na comunicação de perda total surgir a indicação de um intervalo a respeito do valor venal do veículo do A., lido o boletim de perda total constata-se que daí consta apenas um valor, precisamente aquele que corresponde ao primeiro veículo pesquisado, € 8.500,00, não se encontrando suporte para o outro valor contido no intervalo, € 8.360,00.
Acresce que se desconhecem todas as características do segundo veículo indicado na pesquisa, mas decorre do teor do referido doc. 11 junto com a p.i. que a quilometragem do primeiro veículo pesquisado – 217.855 – é praticamente igual à quilometragem do veículo do A. – 218.876.
Ou seja, o primeiro veículo pesquisado é aquele que maior semelhança apresenta com o veículo do A., e atendendo a que foi esse o critério adotado pela R. para o apuramento do valor venal, deve julgar-se provado que o valor venal do veículo do A. é de € 8.500,00, conforme resulta do boletim de perda total.
Em face de todo o exposto deve ser alterado o facto 18, estimando-se o valor venal do veículo em € 8.500,00.
b) Quanto ao facto não provado 1, sustentou o Tribunal a quo que não se mostra documentado e que não foi afirmado pelas testemunhas ouvidas.
Ex adverso, alega o A. que o facto descrito sob 1 foi afirmado na sua petição inicial e não foi contraditado pela R., para além de que o mesmo “seria de fácil subsunção pelo Tribunal” com base no doc. 4 junto com a cont. (ponto 5 do corpo das alegações), pelo que deveria ser julgado provado.
Ora, o facto em apreço consta do artigo 4º da p.i., porém, no artigo 1º da cont. a R. não declara aceitar o facto aludido, e no artigo 2º da cont. a R. declara impugnar os factos que não enunciou no artigo 1º, onde se integra, portanto, o facto constante do artigo 4º da p.i..
Ou seja, o facto constante do artigo 4º da p.i. mostra-se controvertido, atento o disposto no artigo 574.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, onde se estabelece que se consideram admitidos por acordo os factos que não forem impugnados.
Sublinhe-se que a distinção vertida pelo A. nas suas alegações de recurso entre impugnar um facto e contraditar um facto não encontra suporte legal, pelo contrário, resulta claro do teor do artigo 571.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, que os dois verbos reportam a mesma realidade: “o réu defende-se por impugnação quando contradiz os factos articulados na petição”.
A impugnação consiste, assim, na negação do facto, isto é, o réu impugna o facto quando “se opõe à versão da realidade apresentada pelo autor” (Lebre de Freitas, Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª ed., Coimbra, 2017, pág. 557).
Por outro lado, o doc. 4 junto com a cont. integra, efetivamente, uma fotografia aérea da qual consta a indicação de uma escala, mas o A. não explica de que forma extrai daquela escala o facto alegado no artigo 4º da p.i..
Advoga ainda o A. que não pode entender-se que a prova de um facto apenas pode ser feita por declarações de parte (ponto 8 do corpo das alegações), contudo, não é isso o que se diz na motivação da decisão de facto, onde o Tribunal a quo se limitou a assinalar que “O acidente de viação em análise não foi presenciado pelas testemunhas inquiridas no julgamento, à exceção do condutor Valdemar Gaspar Pinhal Caiado, sendo que o autor não prestou declarações de parte.”
Deve, consequentemente, manter-se inalterado o facto não provado 1.
c) Relativamente aos factos não provados 5, 9, 11 e 13, o A. aludiu apenas de forma vaga, no ponto IV. das conclusões, ao que “o Recorrente alegou e não foi contraditado pela Ré, por documentos e bem assim por prova testemunhal produzida na audiência de discussão e julgamento”.
Os factos referidos provêm, respetivamente, dos artigos 8º, 24º, 29º e 27º da petição inicial.
Porém, no artigo 1º da cont. a R. não declara aceitar os factos aludidos, e no artigo 2º da cont. a R. declara impugnar os factos que não enunciou no artigo 1º, onde se integram, portanto, aqueles factos, os quais devem, consequentemente, julgar-se controvertidos, conforme se explanou já a respeito do facto não provado 1.
No mais, resulta evidente de todo o exposto que o A. não cumpriu as regras impostas no artigo 640.º do Código de Processo Civil para a impugnação da decisão de facto, pois não indicou os meios de prova que determinariam decisão diversa, pelo que nesta parte deve ser rejeitada a impugnação.
Devem, consequentemente, manter-se inalterados os factos não provados 5, 9, 11 e 13.
B) Fundamentação de Direito
1. No caso em apreço cura-se de um acidente de viação, pretendendo o A. ser indemnizado pelos danos dele decorrentes, com fundamento na culpa exclusiva do condutor do veículo seguro na R. na sua ocorrência.
Na sentença decidiu-se, porém, repartir a meio essa responsabilidade, “porquanto o A. circulava com excesso de velocidade e o condutor segurado na Ré, cortou o trajeto do A. que tinha prioridade de passagem, mudou de direção à sua esquerda num entroncamento.”
O dissentimento do A. relativamente à sentença diz respeito a este aspeto da repartição de responsabilidades entre os dois condutores intervenientes no acidente, considerando o A. que não circulava em excesso de velocidade, mas ainda que assim não se entenda, que em virtude de não estar provada a dimensão do excesso de velocidade, deve entender-se ser a responsabilidade do condutor do veículo seguro na R. de 100% ou, pelo menos, de 80%.
A questão em apreço respeita, assim, ao nexo de causalidade, pressuposto da responsabilidade civil versado no artigo 563.º do Código Civil, onde se estabelece que “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.
Henrique Sousa Antunes (Comentário ao Código Civil: direito das obrigações, das obrigações em geral, coord. de José Brandão Proença, Lisboa: Universidade Católica Editora, 2018, pág. 555) discorre nos seguintes termos sobre esta matéria:
“A doutrina da causalidade adequada (…) qualifica como causa de um dano o facto que, sendo em concreto uma condição necessária do resultado, é suscetível de produzir aquele prejuízo, segundo o curso normal dos acontecimentos. (…) Nas hipóteses de responsabilidade civil por factos ilícitos, o facto só não constitui uma causa do dano se for de todo em todo indiferente à produção daquele, verificando-se o resultado pela intervenção de circunstâncias anómalas ou excecionais (formulação negativa, de Enneccerus-Lehmann).”
No Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 29.03.2011 (Jorge Arcanjo) (Processo n.º 1187/05.1TBACB.C1, in http://www.dgsi.pt/) teceram-se as seguintes considerações sobre o mesmo tema:
“A teoria da causalidade adequada, na sua formulação negativa, não pressupõe a exclusividade do facto condicionante do dano, nem exige que a causalidade tenha de ser directa e imediata, admitindo não só a ocorrência de outros factos condicionantes, como ainda a chamada causalidade indirecta, na qual é suficiente que o facto condicionante desencadeie outro que directamente suscite o dano.
Noutra perspectiva, e a propósito da imputação, Claus Roxin refere que quando o legislador permite, à semelhança do que sucede em outras manifestações da vida moderna, ocorra um risco até certo limite, apenas poderá haver imputação se a conduta do autor significa um aumento do risco permitido (Problemas Fundamentais de Direito Penal, pág. 152).
O princípio do incremento do risco adopta o seguinte método: deve, em primeiro lugar, examinar-se qual a conduta que não se poderia imputar ao agente como violação do dever de acordo com os princípios do risco permitido; depois, estabelecer-se uma comparação entre ela e a forma de actuar do agente, para se comprovar, então, se, na configuração dos factos submetidos a julgamento, a conduta incorrecta do autor fez aumentar a probabilidade de produção do resultado em comparação do risco permitido.”
Revertendo ao caso concreto, verificamos que o veículo seguro na R. efetuou uma manobra de mudança de direção à esquerda, entrando no entroncamento do qual se aproximava o A., que se apresentava, assim, pela direita do veículo seguro na R. (facto provado 6).
Ocorreu, então, o embate, apesar do A. ter travado, após avistamento do veículo seguro na R. a entrar no entroncamento (facto provado 7).
Está ainda provado que o A. seguia a uma velocidade superior a 50 km/h, que constituía o máximo permitido no local (facto provado 5).
Ou seja, o veículo seguro na R. não cedeu a passagem ao veículo que se apresentava pela sua direita, infringindo, deste modo, o disposto no artigo 35.º, n.º 1, do Código da Estrada.
Por sua vez, o A. infringiu o disposto nos artigos 25.º, n.º 1, alínea h) e 27.º, n.º 1, do Código da Estrada, por circular acima do limite máximo de velocidade fixado para o local, a que acresce a circunstância de, por se tratar de um entroncamento, ser especificamente imposto aos condutores que moderem especialmente a velocidade.
A diretriz basilar, em matéria de velocidade, que enforma os demais preceitos, está contida no n.º 1 do artigo 24.º do mesmo diploma legal, onde se estabelece que “O condutor deve regular a velocidade de modo a que, atendendo à presença de outros utilizadores, em particular os vulneráveis, às características e estado da via e do veículo, à carga transportada, às condições meteorológicas ou ambientais, à intensidade do trânsito e a quaisquer outras circunstâncias relevantes, possa, em condições de segurança, executar as manobras cuja necessidade seja de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente.”
No entanto, a circunstância dos dois condutores terem praticado infrações estradais não implica que devam automaticamente ser considerados ambos responsáveis pelo acidente, havendo que apurar se essas infrações foram determinantes da sua ocorrência.
Desde logo, afigura-se evidente que o acidente foi provocado pelo veículo seguro na R., que cortou a linha de marcha do A., frustrando a sua prioridade de passagem.
A questão seguinte reside em saber se também o excesso de velocidade do A. foi causador do acidente, por haver impedido uma reação atempada destinada a evitá-lo, ou se, pelo contrário, ainda que o A. circulasse dentro dos limites legais de velocidade impostos no local, não lhe teria sido possível impedir o acidente, em virtude das circunstâncias em que o veículo seguro na R. lhe surgiu, não tendo, por isso, a conduta do A. constituído causa adequada do acidente.
Está provado que o veículo seguro na R. fez avançar o seu veículo “quando o Autor se encontrava já a poucos metros do entroncamento” (facto provado 6) e que “em ato contínuo, o Autor colocou o pé ao travão de forma a evitar o embate” (facto provado 7), mas não logrou obstar à colisão entre a parte frontal da sua viatura e a lateral direita do veículo seguro na R. (facto provado 8).
Por outro lado, ambos os veículos se imobilizaram após a colisão (facto provado 9).
Conjugando estes factos, podemos estimar que o excesso de velocidade do A. não foi substancial, pois, de outro modo, atenta a distância de poucos metros a que avistou o veículo seguro na R., não teria logrado imobilizar o seu veículo após a colisão, mesmo considerando que travou de imediato.
Ainda assim, nada consta da matéria de facto provada que nos permita calcular a velocidade exata a que o A. circulava, o que nos impede de afirmar que o excesso foi indiferente para o resultado, mas as demais circunstâncias permitem concluir que a contribuição do A. para o evento foi significativamente menor do que a contribuição do veículo seguro na R..
Por outro lado, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 20.02.2024 (Luís Filipe Pires de Sousa) (Processo n.º 211/21.5T8ALM.L1-7, in http://www.dgsi.pt/) efetua-se a distinção entre a culpa na produção do acidente e a contribuição para os danos:
“Ocorrendo uma situação de concorrência de culpas de ambos os condutores na produção do acidente (concausalidade necessária), para efeitos de fixação da responsabilidade dos intervenientes, há que averiguar se existe diferença de grau entre a culpa do lesante e o facto culposo do lesado, sendo certo que não existe correlação direta entre a amplitude dos danos e a gravidade da culpa: nem sempre a culpa mais intensa provoca os danos mais extensos.”
Tudo visto, entendemos que da matéria de facto provada decorre que também no plano da contribuição para os danos produzidos pelo embate não podemos afirmar ser equivalente a contribuição dos dois condutores, sendo mais intensamente lesiva a atuação do condutor do veículo seguro na R..
Em conclusão, afigura-se mais adequada a repartição de responsabilidades na proporção de 10% para o A. e 90% para o veículo seguro na R..
2. a) A alteração da decisão atinente à repartição de responsabilidades repercute-se necessariamente na fixação das indemnizações por danos patrimoniais e não patrimoniais.
No que tange aos danos patrimoniais, foi modificada a redação do facto provado 18., em consequência da impugnação efetuada em sede de recurso, do qual passou, assim, a constar o seguinte:
“18. O valor venal da viatura rondaria os € 8.500,00”.
O valor venal constituiu um dos vetores ponderados pela R. para concluir pela perda total do veículo do A. e para formular a correspondente proposta extrajudicial de indemnização ao A., nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21.08.
Segundo o n.º 2 do referido do artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21.08, “o valor venal do veículo antes do sinistro corresponde ao seu valor de substituição no momento anterior ao acidente.”
No entanto, como sublinha Ricardo J. Marques («A perda total do veículo e os limites da sua indemnização: Entre a restauração natural e a indemnização em sucedâneo», Revista Julgar, n.º 49 (janeiro-abril 2023), pág. 234), “o legislador continua a não estabelecer os exactos parâmetros a atender na determinação desse valor”.
Sem prejuízo, tem vindo a sedimentar-se a prática de identificar, no mercado de usados, veículos automóveis para venda que possuam características semelhantes ao sinistrado, o que, para o mesmo Autor, constitui uma abordagem correta do valor venal enquanto valor de substituição (ibidem).
Porém, a jurisprudência tem entendido que quando se frustre o acordo entre o lesado e a companhia de seguros do lesante e o caso siga para tribunal, não é aqui aplicável o normativo indicado, antes deve a indemnização ser arbitrada à luz das regras gerais enunciadas nos artigos 562.º e 566.º do Código Civil, como se decidiu no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 08.02.2018 (Madeira Pinto) (Processo n.º 3385/15.0T8PNF.P1, in http://www.dgsi.pt/):
“IV - É jurisprudência firme e que se aceita, que os limites previstos na alínea c) do artigo 41.º do Decreto-Lei 291/2007, de 21 de Agosto, poderão servir de ponto de partida e como limite mínimo para a análise da questão aqui colocada. Mas, o regime previsto no artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21/08, vale apenas para os procedimentos a adoptar pelas empresas de seguros na fixação de prazos com vista à regularização rápida de litígios e do estabelecimento de princípios base na gestão de sinistros com vista à apresentação de um “proposta razoável”, mas já não na fase judicial, em que regem as regras e princípios gerais da responsabilidade civil e da obrigação de indemnização, podendo quando muito tais normativos considerarem-se como elementos de referência não vinculativos.” (no mesmo sentido, entre outros, os Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 09.01.2012 (Carlos Querido), Processo n.º 153/11.2TJCBR.C1; do Tribunal da Relação de Lisboa de 06.12.2017 (Manuel Rodrigues), Processo n.º 4495/15.0T8LSB.L1-6; do Tribunal da Relação de Guimarães de 18.03.2021 (Barroca Penha), Processo n.º 2970/19.6T8VCT.G1; e do Supremo Tribunal de Justiça de 12.12.2023 (António Magalhães), Proc. n.º 393/17.0T8PVZ.P1.S1, todos in http://www.dgsi.pt/).
Assim, a questão deve ser equacionada nos termos do artigo 566.º, n.º 1, do Código Civil, nos termos do qual “a indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor.”
Na situação vertente ficou provado que a reparação é possível (facto provado 17), pelo que remanesce a dimensão da excessiva onerosidade.
O legislador não define este conceito, que tem sido trabalhado pela jurisprudência, mostrando-se presentemente consensual que não se afere com base na mera comparação do valor venal do veículo com a estimativa do custo de reparação, antes deve ser ponderado também o valor de uso do veículo para o lesado, de modo que só deve recusada a indemnização in natura quando a desproporção entre aqueles dois valores seja de tal modo sensível que ofenda o princípio da boa fé.
Neste sentido pronunciou-se, entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12.10.2023 (Adeodato Brotas) (Processo n.º 7233/20.1T8LRS.L1-6, in http://www.dgsi.pt/):
“2- Os tribunais, lançando mão do regime do artigo 566.º do CC, vêm entendendo que a onerosidade excessiva tem de ter em conta não só o valor venal do veículo, mas ainda o valor que, em concreto, esse veículo teria para o seu proprietário. No fundo, o valor do uso, visto que um valor venal diminuto pode corresponder a uma grande utilidade para o utilizador.
3- Sendo a reparação do veículo excessivamente onerosa, desproporcionada e, apurando-se que as necessidades de uso e de utilização do veículo pelo lesado ficam igualmente asseguradas mediante o pagamento de uma indemnização que lhe possibilite adquirir um outro veículo idêntico ou similar ao acidentado, não pode condenar-se o obrigado (seguradora) a proceder à reparação (excessivamente onerosa), mas tão-só a indemnizar o lesado por equivalente.”
Na situação abordada neste aresto a reparação do veículo sinistrado ascendia, pelo menos, a € 69.977,50, sendo possível adquirir um veículo com características semelhantes por € 21.776,66, pelo que se considerou que a indemnização devia corresponder ao montante necessário para adquirir um veículo semelhante, por se revelar abusiva e contrária à boa fé solução diversa.
No Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 01.07.2021 (Rosália Cunha) (Processo n.º 1135/20.9T8VCT.G1, in http://www.dgsi.pt/) decidiu-se que “Nada mais se tendo provado para além de que o veículo tem o valor de € 850,00 e a sua reparação custa € 2.153,34 não se pode concluir que esta seja excessivamente onerosa para o devedor, devendo a seguradora, de acordo com o princípio geral, ser condenada a proceder à indemnização mediante reconstituição natural.”
No Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 04.05.2022 (Carlos Portela) (Proc. 107/22.3YRPRT, in http://www.dgsi.pt/), entendeu-se assistir ao lesado o direito a ser indemnizado pelo valor da reparação, que se estimou em € 4.275,00, correspondendo o valor venal a € 1.000,00, e estando provado que “com o acidente o (...) deixou de poder circular, sendo este o único veículo da Reclamante utilizado, diariamente, nos seus afazeres, quer profissionais, quer pessoais.”
No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27.02.2025 (Afonso Henrique) (Processo n.º 43/22.8T8PFR.P1.SI, in http://www.dgsi.pt/), perante um caso em que se provou que a reparação do veículo ascendia a € 27.996,80, que na data do acidente o veículo valia € 27.450,00, e que o lesado usava o veículo para efetuar viagens de lazer e as viagens necessárias à gestão do seu dia-a-dia familiar, entendeu-se que “a demonstração do valor de mercado do veículo é, assim, insuficiente para permitir a afirmação da excessiva onerosidade, o que significa que deve ter aplicação a regra geral da reconstituição natural com a condenação da seguradora no pagamento da quantia devida pela reparação.
Acresce não se vislumbrar uma desproporção grave entre o sacrifício imposto ao devedor e o benefício do credor, na medida em que o pagamento do valor de reparação € 27.996,80 importará a manutenção, na esfera do credor, de um veículo com um valor de mercado de € 27.450,00.”
Na situação vertente importa considerar, para além do valor venal do veículo acima indicado, que a reparação foi estimada em € 11.924,35 (facto provado 17), e o salvado foi avaliado em € 3.359,00 (facto provado 19).
Nada ficou demonstrado sobre a utilização que o A. dava ao seu veículo, não se tendo julgado provado que o conduzisse diariamente para o seu local de trabalho (facto não provado 13).
Dos factos expostos decorre que a diferença entre o valor venal do veículo e o custo estimado da reparação é reduzida, não podendo falar-se em desproporção sensível ou significativa, pelo que mesmo sem se ter demonstrado o uso concreto que o A. dava ao seu veículo, atenta a preferência legal pela reconstituição natural, deve a indemnização corresponder ao valor de reparação.
Considerando, todavia, a repartição de responsabilidades acima estabelecida, a indemnização cifra-se em 90% de € 11.924,35, ou seja, € 10.731,91.
b) O Tribunal a quo arbitrou uma indemnização no valor de € 2.000,00, com respeito aos danos não patrimoniais, o que não foi impugnado em sede de recurso.
Assim, operando a redução desse valor em função da repartição de responsabilidades, conclui-se que deve a R. ser condenada no pagamento, ao A., de € 1.800,00.
c) No mais, isto é, quanto à questão dos juros, mantém-se a decisão sindicada, que não foi, nesta parte, objeto de recurso.
C) Custas
A responsabilidade pelas custas do recurso recai sobre ambas as partes, na proporção do respetivo decaimento (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
IV – Dispositivo
Em face do exposto e tudo ponderado, acordam os Juízes da Secção Cível deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação, alterando a decisão recorrida, pelo que condenam a R. (…) Seguros, S.A., a pagar ao A. (…), o montante de € 10.731,91, a título de indemnização por danos patrimoniais, ao que acrescem os juros de mora a contar do trânsito em julgado, os quais serão calculados à taxa supletiva vigente para os juros civis contados desde a data da citação até efetivo e integral pagamento; e a quantia de € 1.800,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, ao que acrescem os juros de mora a contar do trânsito em julgado, os quais serão calculados à mesma taxa supletiva vigente, até efetivo e integral pagamento.
Custas pelas partes, na proporção do respetivo decaimento.
Évora, 08 de Maio de 2025
Sónia Moura (Relatora)
António Fernando Marques da Silva (1º Adjunto)
Ana Pessoa (2ª Adjunta)