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CINEMÓMETRO - RADAR
SINALIZAÇÃO VERTICAL
VIGILÂNCIA ELECTRÓNICA
VELOCIDADE EXCESSIVA
Sumário
I - O uso de cinemómetros-radar para deteção da velocidade dos veículos, ainda que fixos, utilizados pelas forças policiais na fiscalização rodoviária, não é equivalente ao uso de “câmaras de videovigilância”. II - A falta de sinalização vertical indicadora de zona sujeita a controlo de velocidade com utilização de cinemómetros-radar (ainda que fixos) não implica a nulidade da prova recolhida com o uso de tais aparelhos. III - Tendo em conta as características dos cinemómetros-radar, e, acima de tudo, porque a sua não sinalização não constitui afronta a qualquer direito à privacidade dos cidadãos (pois apenas é fotografado e visível o veículo e a sua matrícula - e não os seus ocupantes -), a prova da concreta velocidade a que seguia determinado veículo automóvel, recolhida em tais circunstâncias (sem sinalização vertical da existência do “radar”), não enferma de qualquer nulidade ou invalidade. IV - Em nenhum normativo legal se comina como nula, inválida ou proibida a prova obtida através de cinemómetros-radar sem identificação da existência de tais aparelhos, de forma fixa, em determinado local (ou seja, sem sinalização vertical de “zona sob controlo de radar”), pelo que é inteiramente válida a prova da velocidade a que seguia um veículo automóvel assim recolhida.
Texto Integral
I – Relatório:
P veio recorrer da sentença proferida no dia 25 de março de 2025, onde se julgou improcedente o recurso de impugnação da decisão da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), que lhe aplicou a sanção acessória de inibição de conduzir por 30 dias, suspensa na execução por 180 dias, pela prática negligente da contraordenação rodoviária grave prevista e punida pelos arts. 27º nº 2 al. a), 138º, 145º nº 1 al. c) e 147º do Código da Estrada. Para o efeito apresentou as seguintes alegações: 1. Ao abrigo do artigo 16.º número 1 do Decreto-Lei n.º 207/2005, a instalação de meios de vigilância eletrónica fixos por parte de forças de segurança são assinalados com a informação da sua existência, o que não aconteceu no caso em apreço. 2. Também não foi comunicado à Comissão de proteção de dados a recolha desses dados. 3. Derivando necessariamente uma ilegalidade e uma nulidade da prova recolhida. 4. O que aceitar tal facto inquina necessariamente numa inconstitucionalidade. 5. Em causa estão direitos fundamentais do Arguido. 6. Direitos estes relacionados com a proteção e utilização dos seus dados pessoais e previsto constitucionalmente no artigo 35.º. 7. Ainda que a lei não determine expressamente como consequência do seu incumprimento a nulidade, tal é aferido na análise dos direitos em causa. 8. Tratando-se de direitos fundamentais, a sua violação não pode culminarem mera irregularidade. 9. Aceitar esta posição é inquinar quaisquer direitos os direitos do Arguido e aceitar que não teriam qualquer proteção, possibilitando a sua violação constante. 10. A justificação do Tribunal a quo de que a violação ou inobservância das regras da lei de processo penal apenas culminam em nulidade quando expressamente prevista na lei, carece de fundamento e sustentação legal 11. O direito do Arguido encontra-se constitucionalmente consagrado. 12. Atendendo à gravidade de lesão deste direito, é inaceitável que o desrespeito da norma do Decreto Lei n.º 207/2005 não enferme o ato de qualquer invalidada. 13. A leitura do artigo 16.º do referido Decreto-Lei por parte do Tribunal a quo é abusiva e ilegal. 14. Acresce que na decisão condenatória, bem como no auto de contraordenação, não é identificado devidamente o aparelho utilizado, faltando nomeadamente indicar as características do mesmo, assim como os requisitos legais obrigatórios para a utilização do aparelho em causa, não juntando ou fazendo qualquer menção aos documentos que validam a utilização do referido aparelho, reforçando aqui, uma vez mais, o anteriormente defendido na impugnação apresentada. 15. O artigo 15.º do mesmo Decreto-Lei, artigo utilizado pelo Tribunal a quo para rejeitar a impugnação apresentada, determina, expressamente, que “Os dados gravados e os elementos probatórios acompanham os respetivos autos e processos”. 16. Em nada faz sentido o argumentado na Sentença, quando conclui que “não se respiga (...) qualquer obrigação de que o auto de contraordenação mencione qualquer dos documentos cuja falta o Requerente aponta. 17. Resulta expressamente do artigo 15.º do Decreto-Lei em causa que “Os dados gravados e os elementos probatórios acompanham os respetivos autos e processos”. 18. Os elementos probatórios devem acompanhar o auto de contraordenação, o que não se verificou. 19. O Arguido não teve acesso a qualquer elemento probatório, tão-pouco tem conhecimento do seu conteúdo. 20.Não sabe se os elementos de prova foram obtidos através de instrumentos devidamente aprovados nos termos legais e regulamentares, dificultando o exercício do seu direito de defesa. 21. Não sabe também, nem tem a obrigação de saber, se o referido aparelho de controlo metrológico estava, à data da autuação, devidamente aferido e em condições de ser utilizado, sendo certo que esse facto deverá ser provado pela entidade autuante, o que não foi. 22. A decisão sancionatória faz fé de um auto de contraordenação que não se encontra em consonância com as disposições legais vigentes. 23. Pelo que, ao contrário do que é referido, não se sabe se os elementos de prova foram obtidos através de instrumentos devidamente aprovados nos termos legais e regulamentares, porquanto que da decisão sancionatória não consta a devida identificação do aparelho. 24. Não se compreende, também, se o Agente Autuante e o Agente Fiscalizador/Manuseador do aparelho alcoolímetro eram pessoas distintas ou o mesmo individuo. 25. E o militar manuseador do aparelho não se encontrava devidamente habilitado a manusear aquele aparelho. 26. Não se pode aceitar que a evolução dos aparelhos utilizados não seja acompanhada da devida formação por parte dos militares manuseadores. 27. É necessário que os militares manuseadores se encontrem habilitados para manipular aparelhos que serão depois utilizados para acusar ou condenar cidadãos! 28. Assim, existem aqui sérias dúvidas quanto à precisão da taxa de alcoolemia no sangue apurada. 29. Tanto porque desconhecemos se se tratam de dois indivíduos distintos, como porque nenhum deles comprova apresentar formação para o manuseamento e conservação daquele concreto aparelho utilizado. 30. Dir-se-á ainda que é manifestamente excessiva a aplicação de uma pena de multa de 70 dias, por ser mais de metade da pena de multa máxima prevista. 31. O Arguido é primário, não existem comportamentos reincidentes, é um condutor diligente, respeita sempre as normas do Código da Estrada. 32. Não existiu qualquer perigo para terceiros. 33. O Tribunal ad quo não ponderou corretamente todas as circunstâncias concretas do aqui Arguido. 34. O Tribunal ad quo decidiu, erradamente, matéria de facto impugnada por mera adesão à decisão administrativa e sem que tenha produzido prova quanto a esse facto. 35. A decisão administrativa era meramente conclusiva e com adesão como o fez, o Tribunal não tinha como decidir sobre matéria de facto impugnada sem julgamento da matéria. 36. Culminando numa limitação dos direitos do Arguido e numa violação das regras processuais. 37. Fazendo nula a sentença proferida. 38. Faltando-lhe a fundamentação. 39. E aceitar-se que houve fundamentação essa também é nula, porque não houve prova a suportar a decisão. 40.A Sentença recorrida é nula. 41. Devendo assim ser revogada a condenação do Arguido em sanção acessória de inibição de conduzir, bastando-se para o efeito.
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Recebido o recurso por despacho proferido no dia 22 de abril do corrente ano, veio o MP responder, pugnando pelo não provimento do mesmo, tendo apresentado as seguintes conclusões: I - Não ocorreu qualquer nulidade ou invalidade que afete, quer a decisão administrativa quer a decisão por mero despacho proferida pelo Tribunal a quo; II - O tribunal a quo pronunciou-se sobre todas as questões objeto de recurso, apreciando-as; III - A decisão proferida não padece de qualquer vício, nem houve erro na apreciação da prova. Pelo que deverá o presente recurso ser julgado improcedente e manter-se a decisão recorrida, como é de toda a JUSTIÇA.
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O Sr. PGA junto desta Relação apôs Visto.
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II - O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente. Só estas o tribunal ad quem deve apreciar art.ºs 403º e 412º nº 1 CPP sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso - art.º 410º nº 2 CPP.
Questões a decidir:
- Nulidade da decisão administrativa e da sentença condenatória por falta de indicação das características do aparelho utilizado;
- Falta de acesso a documentos probatórios:
- Nulidade da prova recolhida decorrente da falta de sinalização vertical indicadora de zona sujeita a controlo de velocidade através de aparelhos de videovigilância.
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Cumpre decidir já que a tal nada obsta: III - Fundamentação: A - A decisão recorrida é a seguinte: I. RELATÓRIO P interpôs, nos termos de fls. 9 e seguintes, recurso de impugnação judicial da decisão administrativa de 05/02/2023 (fls. 6 e seguintes) da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), que lhe aplicou a sanção acessória de inibição de conduzir por 30 dias, suspensa na execução por 180 dias, pela prática negligente da contraordenação rodoviária grave prevista e punida pelos arts. 27º nº 2 al. a), 138º, 145º nº 1 al. c) e 147º do Código da Estrada. Apresentado o recurso, a autoridade administrativa manteve a decisão (fls. 40) e enviou os autos ao Ministério Público, que os apresentou ao juiz. Os sujeitos do processo manifestaram nada oporem a decisão por despacho.
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O Tribunal é competente e o processo é o próprio. II. FUNDAMENTOS Como é sabido e constitui entendimento pacífico na jurisprudência, é pelas conclusões das alegações dos recursos que se afere e delimita o objeto e o âmbito dos mesmos, exceto quanto àqueles casos que sejam de conhecimento oficioso . Fazendo breve resumo do objecto substantivo do processo, o Recorrente foi condenado em sede administrativa por, com negligência sua, ter conduzido um automóvel com excesso de velocidade. O Recorrente apresentou no requerimento de recurso (arts. 55º e 59º do Decreto-Lei nº 433/82 de 27 de Outubro, Regime Geral das Contra-Ordenações, RGCO) conclusões que se reconduzem aos fundamentos, todos de direito, que a seguir sintetizamos: A inexistência de publicitação in situ (em violação do disposto no Decreto-lei nº 207/2005) da existência de radares fotográficos causa a nulidade da prova obtida pelo cinemómetro radar que mediu a sua velocidade; O auto de contraordenação não está em consonância com as disposições legais vigentes, e em particular o estatuído no art. 15º do DL207/2005; O Recorrente não tem como saber se o aparelho que mediu a sua velocidade estava em condições de ser utilizado (sendo que tal conhecimento não é sua obrigação), tal como desconhece se o cinemómetro radar que mediu a sua velocidade foi notificado à Comissão Nacional de Protecção de Dados; A decisão administrativa foi proferida por quem não tinha poderes para o fazer; Não constam da decisão condenatória documentos que dela deveriam constar, designadamente, documento homologatório do aparelho, documento do IPQ (Instituto Português de Qualidade) que aprova o referido equipamento, documento do IPQ que ateste a verificação periódica do referido equipamento, com referência ao seu prazo de validade, registos de manutenção do referido aparelho, registos dos testes efectuados ao aparelho antes do início da operação, cópia do registo da taxa efectiva de erro daquele efectivo aparelho; A decisão administrativa é nula por ser vaga e imprecisa, ou omissa, quanto aos factos respeitantes ao tipo objectivo e subjectivo do ilícito em causa, dela apenas constando conclusões; A sanção acessória aplicada é excessiva; A entidade administrativa devia ter determinado a suspensão de execução da sanção acessória, por estarem reunidos os pressupostos legais da suspensão. Este, pois, o objecto do recurso, sem prejuízo do mais de que se possa conhecer nos termos do art. 64º do RGCO.
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Alega o Recorrente que a inexistência de publicitação in situ da existência de radares fotográficos gera a nulidade da prova obtida pelo cinemómetro radar que registou a sua velocidade no dia dos factos. Sinteticamente, invoca o Recorrente que a violação do disposto no art. 16º do Decreto-lei nº 207/2005 implica, no que importa ao caso, a nulidade da prova obtida (ou seja, a nulidade do documento de fls. 2). O referido art. 16º do DL 207/2005 (regulamento dos procedimentos dos sistemas de vigilância rodoviária) tem o seguinte teor: Artigo 16º Informação dos locais 1 - Para efeitos da aplicação do presente decreto-lei, as estradas e outros locais onde estejam ou venham a ser instalados meios de vigilância electrónica fixos por parte de forças de segurança são assinalados com a informação, apenas, da sua existência. 2 - As forças de segurança prestam, através da comunicação social e por outros meios, informação regular sobre a utilização de meios de vigilância electrónica em operações de controlo de tráfego. O diploma legal em causa não prevê, todavia, qualquer consequência para a inobservância da publicitação em questão — designadamente, não comina qualquer invalidade (menos ainda o vício de nulidade) à inobservância daquele dever de informação. Ora, lê-se no art. 118º nº 1 do Código de Processo Penal (aplicável ao caso ex vi do art. 41º nº 1 do RGCO) o seguinte: Artigo 118º Princípio da legalidade 1 - A violação ou a inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei. Considerando o que antecede logo se conclui que a falta de publicitação invocada (mesmo admitindo que a citada norma é aplicável ao caso, e que efectivamente se verificou aquela falta de publicitação) não acarretaria a pretendida nulidade do meio de prova obtido pelo cinemómetro radar. Improcede, em consequência, este fundamento do recurso.
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O Recorrente suscita nas suas alegações objecções ao auto de fls. 1 que, no seu entender, contendem com a sua validade. Em síntese, aponta que no auto não é indicada qualquer prova fotográfica específica, e o auto desrespeita o estatuído no art. 15º nº 1 do DL 207/2005. Com interesse para o que ora se trata, lê-se no artigo 170º do Código da Estrada o seguinte: Artigo 170º Auto de notícia e de denúncia 1 - Quando qualquer autoridade ou agente de autoridade, no exercício das suas funções de fiscalização, presenciar contraordenação rodoviária, levanta ou manda levantar auto de notícia, o qual deve mencionar: a) Os factos que constituem a infração, o dia, a hora, o local e as circunstâncias em que foi cometida, o nome e a qualidade da autoridade ou agente de autoridade que a presenciou, a identificação dos agentes da infração e, quando possível, de, pelo menos, uma testemunha que possa depor sobre os factos; b) O valor registado e o valor apurado após dedução do erro máximo admissível previsto no regulamento de controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição, quando exista, prevalecendo o valor apurado, quando a infração for aferida por aparelhos ou instrumentos devidamente aprovados nos termos legais e regulamentares. 2 - O auto de notícia é assinado pela autoridade ou agente de autoridade que o levantou ou mandou levantar e, quando for possível, pelas testemunhas. 3 - O auto de notícia levantado e assinado nos termos dos números anteriores faz fé sobre os factos presenciados pelo autuante, até prova em contrário. 4 - O disposto no número anterior aplica-se aos elementos de prova obtidos através de aparelhos ou instrumentos aprovados nos termos legais e regulamentares. 5 - A autoridade ou agente de autoridade que tiver notícia, por denúncia ou conhecimento próprio, de contraordenação que deva conhecer levanta auto, a que é correspondentemente aplicável o disposto nos n.os 1 e 2, com as necessárias adaptações. Por seu lado o invocado art. 15º nº1 do DL 207/2005 tem o seguinte teor: Artigo 15º Conservação dos dados 1 - Os dados gravados e os elementos probatórios acompanham os respectivos autos e processos e são conservados, nos termos do número seguinte, durante o período estritamente necessário para o fim a que se destinam. (...)
Em face do teor das normas citadas e do auto em questão, logo se conclui que a alegação do Recorrente não tem mérito. Em particular, não se respiga nas normas citadas qualquer obrigação de que o auto de contraordenação mencione qualquer dos documentos cuja falta o Recorrente aponta. Em acrescento, do art. 15º do DL 207/2005 não decorre qualquer imposição que o próprio auto de contraordenação mencione algum dado ou elemento probatório específico. Improcedem, pois, as objecções suscitadas quanto à validade do auto de fls. 1.
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Invoca ainda o Recorrente que não tem como saber se o cinemómetro que mediu a velocidade a que seguia na estrada estava em condições de ser utilizado, bem como desconhece se o cinemómetro radar que mediu a sua velocidade foi ou não notificado à Comissão Nacional de Protecção de Dados. Quanto a estes argumentos recursivos cabe apenas constatar que os mesmos, nos singelos termos formulados, não têm aptidão a influenciar a decisão da causa. Com efeito, o mero desconhecimento do Recorrente sobre tais elementos processuais é totalmente inconsequente para o desfecho do processo, inexistindo norma que a tal desconhecimento do Recorrente atribua qualquer relevância jurídica.
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O Recorrente alega ainda que a decisão administrativa condenatória foi proferida por quem não tinha poderes para o efeito, o que acarreta a sua invalidade. Não sustentou, todavia, a alegação em alguma concreta norma jurídica de onde resulte a pretendida invalidade, nem especificou factos suficientes de onde se possa concluir ter o alegado fundamento. Ora, tomando em consideração o processado, e não se vislumbrando no mesmo qualquer invalidade com aptidão a configurar a invocada (mas não sustentada, nem nos factos nem no direito) invalidade, cabe concluir, sem necessidade outras considerações, pela improcedência deste fundamento do recurso.
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O Recorrente alega que a decisão condenatória não menciona documentos que deveria mencionar obrigatoriamente. Designadamente, aponta o Recorrente que constitui invalidade da decisão administrativa a falta de menção: do documento homologatório do cinemómetro radar, do documento do IPQ (Instituto Português de Qualidade) que aprova o referido equipamento, do documento do IPQ que ateste a verificação periódica do referido equipamento, com referência ao seu prazo de validade, dos registos de manutenção do referido aparelho, dos registos dos testes efectuadas ao aparelho antes do início da operação, e da cópia do registo da taxa efectiva de erro daquele efectivo aparelho. Sobre os requisitos da decisão administrativa que recaia sobre contraordenação rodoviária dispõe o art. 181º do CE: Artigo 181.º Decisão condenatória 1 - A decisão que aplica a coima ou a sanção acessória deve conter: a) A identificação do infrator; b) A descrição sumária dos factos, das provas e das circunstâncias relevantes para a decisão; c) A indicação das normas violadas; d) A coima e a sanção acessória; e) A condenação em custas. 2 - Da decisão deve ainda constar que: a) A condenação se torna definitiva e exequível se não for judicialmente impugnada por escrito, constando de alegações e conclusões, no prazo de 15 dias úteis após o seu conhecimento e junto da autoridade administrativa que aplicou a coima; b) Em caso de impugnação judicial, o tribunal pode decidir mediante audiência ou, caso o arguido e o Ministério Público não se oponham, mediante simples despacho. 3 - A decisão deve conter ainda: a) A ordem de pagamento da coima e das custas no prazo máximo de 15 dias úteis após a decisão se tornar definitiva; b) A indicação de que, no prazo referido na alínea anterior, pode requerer o pagamento da coima em prestações, nos termos do disposto no artigo 183.º 4 - Não tendo o arguido exercido o direito de defesa, a fundamentação a que se refere a alínea b) do n.º 1 pode ser feita por simples remissão para o auto de notícia. Considerando o teor do citado normativo cabe concluir que não assiste razão ao Recorrente. Com efeito, a lei processual não obriga à menção de qualquer dos documentos que o Recorrente invoca faltarem na decisão impugnada. Assim sendo, sem necessidade de ulteriores considerações, improcede este fundamento do recuso.
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O Recorrente alega também que a decisão administrativa é nula uma vez que é omissa quanto aos factos respeitantes ao tipo objectivo e subjectivo do ilícito em causa. O Recorrente não esclarece, todavia, que concretos factos faltarão, no seu entendimento, na decisão em causa para que se preencha a infracção sub iudice. No seu entender, sustenta, da decisão condenatória constam apenas conclusões jurídicas, e por isso a decisão é inválida. Porém, considerando: Que no caso dos autos não houve defesa prévia (e que a decisão administrativa remete quanto aos factos, nos termos do art. 181º nº 4 do CE, para o auto de notícia de fls. 1), e Que não se alcança, nem das alegações do recurso, nem do teor da decisão impugnada, que específica omissão fáctica obstaria ao preenchimento do tipo objectivo ou subjectivo da infracção em causa - pelo contrário, os factos parecem-nos plenamente suficientes para preenchimento da infracção, A conclusão que extraímos é que a decisão impugnada não padece de qualquer omissão relevante quanto a factos. Improcede, nessa medida, este fundamento do recuso.
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Defende ainda o Recorrente que a sanção acessória que lhe foi aplicada é excessiva. Recorde-se, pela prática da contraordenação grave em causa nos autos a inibição de conduzir aplicada (e depois suspensa na execução) na decisão recorrida tem a duração de 30 dias. Decorre do art. 147º do CE o seguinte: Artigo 147.º Inibição de conduzir 1 - A sanção acessória aplicável aos condutores pela prática de contraordenações graves ou muito graves previstas no Código da Estrada e legislação complementar consiste na inibição de conduzir. 2 - A sanção de inibição de conduzir tem a duração mínima de um mês e máxima de um ano, ou mínima de dois meses e máxima de dois anos, consoante seja aplicável às contraordenações graves ou muito graves, respetivamente, e refere-se a todos os veículos a motor. (...) Ora, considerando que a sanção acessória aplicada corresponde à sanção mínima prevista na lei, naturalmente que não se verifica qualquer excesso na sua medida. Improcede, assim o fundamento invocado.
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Por fim, o Recorrente entende que a entidade administrativa devia ter determinado a suspensão de execução da sanção acessória, uma vez que estão reunidas as condições para o efeito. Ora, do teor da decisão impugnada decorre que foi essa precisamente a decisão administrativa —a sanção acessória ficou efectivamente suspensa na execução por 180 dias. Assim sendo, inexistindo discordância relativamente à decisão impugnada, nada há a decidir quanto a esta parte do recurso. III. DECISÃO Pelos fundamentos expostos, e nos termos das normas legais citadas, o Tribunal indefere o recurso e decide manter na íntegra a decisão recorrida.
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Custas pelo Recorrente (artigo 93º nº 3 e 94º nº 3 do RGCO), que se fixam, considerando a gravidade da infracção (grave, mas ainda abaixo do patamar máximo de gravidade do CE) em 3,5 UC (artº 8º nº 7 e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais). Registe, notifique, incluindo a entidade administrativa (art. 70º nº 4 do RGCO), e deposite (artigos 41º nº 1 do RGCO e 372º nº5 e 373º nº 2 do Código de Processo Penal).
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B – Conhecendo e decidindo:
i) Da falta de fundamentação da decisão da autoridade administrativa por falta de indicação das características do aparelho de Radar utilizado para medir a velocidade a que circulava o arguido no dia e hora indicados no auto de notícia.
Analisada a decisão da autoridade administrativa verificamos que na mesma é dado como reproduzido o teor do auto de contraordenação: 1. Conforme auto de contraordenação n. 0 944045545, que aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais, nos termos do disposto no n.º 4 do art.º 181.º Código da Estrada, levantado pela GNR, ó (a) arguido (a) P, portador do Bilhete de Identidade nº (…..), do NIF nº (…..) e da carta / licença de condução nº (…..), residente em (…..), vem acusado (a) do seguinte: (…)
E que do auto de notícia consta: Descrição Sumária O referido veículo circulava, dentro localidade, pelo menos, à velocidade 73 Km / h, correspondente à velocidade registada 78 Km / h, deduzido o valor do erro máximo admissível, sendo o limite máximo e velocidade permitido no local 50 Km / h. A velocidade foi verificada através do cinemómetro Lidar Laser Technology Inc, moaelo LT1 20 / 20 TruCam II n.0 TC008()53, aprovado para controlo e fiscalização pela ANSR através do despacho n.º 7869/2020 de OIJUL e pelo IPQ através do despacho de aprovação de Modelo n.º 11124.19.3.44 DR 07MA120, verificado pelo IPQ em 28 / IO / 2021.com certificado deverificação n.0 1 11.24 / 2041703; op. 850 / 2000713-Silva.
Processo de contraordenação mostra-se instruído com os documentos que dele fazem parte integrante, para além do referido auto, a saber e com relevância para a decisão, a prova fotográfica, sendo visível a matrícula do veículo e não os seu(s) ocupante(s) e o certificado emitido pelo IPQ.
Significa, assim, que ao contrário do defendido pelo recorrente os autos se encontram instruídos com a documentação necessária à verificação da validade da utilização do aparelho em causa e das suas características. Na verdade, estando identificado o aparelho usado, como está, no auto de contraordenação, tal é suficiente para que o arguido possa tomar conhecimento das suas caraterísticas já que as mesmas constam do Despacho n.º 7869/2020, de 12 de agosto, publicado no DR II Série de 12 de agosto de 2020.
A remissão na decisão administrativa para o teor do auto de notícia é admissível como se extrai do disposto no art.º 181.º, n.º 4 do Cód. da Estrada uma vez que o arguido não apresentou defesa após a notificação pessoal do auto de notícia.
Aqui chegados e não exigindo a lei o envio da legislação legal e despachos legitimadores do uso do aparelho de medição da velocidade, a indicação do tipo de aparelho, que está devidamente identificado, as autorizações legais e a sua certificação, constantes do auto de notícia e por força da remissão para este operado, da decisão da autoridade administrativa são mais do que suficientes para que o arguido pudesse exercer a sua defesa, não se verificando qualquer nulidade, nem decorrente de invocada falta ou deficiente fundamentação ou outra.
Termos em que improcede esta questão.
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ii) Da falta de acesso a documentos probatórios.
Salvo o devido respeito pelo recorrente, a alegação em causa não procede pelo simples facto que a notificação que lhe foi enviada após a abertura do processo contraordenacional contém não apenas a fotografia do seu veículo como o documento impresso relativo à velocidade detetada pelo aparelho que se mostra devidamente identificado no auto, igualmente identificado neste documento, onde como já analisamos constam os dados necessários à sindicância por parte do arguido da validação e autorização de utilização do referido aparelho e indicação da verificação por parte do IPQ, estando nos autos os documentos, com exceção dos documentos legais que se encontram publicados em DR e que não carecem de ser juntos aos autos, porque publicados no jornal oficial da República Portuguesa, à disposição do arguido caso os não tivesse recebido e quisesse consultar, pois foram oferecidos como prova no processo contraordenacional, serviram de base à decisão administrativa contra a qual apresentou o competente recurso junto do tribunal de primeira instância.
O desconhecimento invocado pelo arguido sobre se o aparelho se encontrava em condições e se os agentes autuantes tinham ou não o necessário conhecimento para os manusear, como conclui em 23. Pelo que, ao contrário do que é referido, não se sabe se os elementos de prova foram obtidos através de instrumentos devidamente aprovados nos termos legais e regulamentares, porquanto que da decisão sancionatória não consta a devida identificação do aparelho. 24. Não se compreende, também, se o Agente Autuante e o Agente Fiscalizador/Manuseador do aparelho alcoolímetro eram pessoas distintas ou o mesmo individuo. 25. E o militar manuseador do aparelho não se encontrava devidamente habilitado a manusear aquele aparelho. 26. Não se pode aceitar que a evolução dos aparelhos utilizados não seja acompanhada da devida formação por parte dos militares manuseadores. 27. É necessário que os militares manuseadores se encontrem habilitados para manipular aparelhos que serão depois utilizados para acusar ou condenar cidadãos! não tem qualquer fundamento. No que ao aparelho concerne, o mesmo encontrava-se devidamente validado, verificado e em condições de ser utilizado, como é patente desde logo do auto de notícia. No que ao mais que invoca acaba o recorrente por se contradizer sobre o tipo de aparelho utilizado e relativamente aos quais é necessária a sinalética vertical cuja falta acusa e que em seu entender afeta a validade da prova, de que infra se conhecerá. É que como resulta de forma clara do texto, enquadramento, histórico e razão de ser da norma invocada, e sustentado por é jurisprudência pacífica, do art.º 16.º do Decreto-Lei n.º 207/2005 de 29/11, esta sinalética respeita apenas aos meios de vigilância eletrónica fixos e não aos que sejam utilizados pelos agentes de autoridade na fiscalização de trânsito, que utilizam aparelhos móveis.
Termos em que igualmente improcede esta questão.
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iii) Nulidade da prova recolhida decorrente da falta de sinalização vertical indicadora de zona sujeita a controlo de velocidade através de aparelhos de videovigilância.
Está assente que o aparelho utilizado na medição da velocidade a que seguia o veículo conduzido pelo arguido se mostrava devidamente identificado e validado pelo IPQ. O mesmo foi aprovado pelo já identificado Despacho n.º 7869/2020, publicado no DR II Série de 12 de agosto, cujas caraterísticas constam do Despacho 5304/2020, de 31-03-2020, publicado no DR n.º 89/2020, Série II de 2020-05-07.
A questão relacionada com a validade ou não da prova recolhida por aparelhos adequados e capazes de proceder à medição da velocidade de deslocação dos veículos automóveis, vulgo radares, e a análise detalhada do tipo de aparelhos foi já objeto de decisão por parte deste Tribunal da Relação de Évora, no Acórdão de 06/06/2017 no Proc. 1485/16.9T8PTG.E1, in www.dgsi.pt. Deste modo, com a devida vénia, porque concordamos com o ali analisado e decidido, transcreve-se a parte pertinente: B.2 – Da identificação do instrumento de medição e da integração na legislação metrológica. A razão de inconformidade do recorrente exige que se defina com rigor o aparelho utilizado. Definição não quer significar apenas identificação, mas algo mais, a clarificar infra. Afirma-se no artigo 2º, nº 2, al. f) do Decreto Regulamentar n.º 28/2012, de 12 de Março, que aprova a orgânica da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, que cabe a esta entidade «Uniformizar e coordenar a ação fiscalizadora das demais entidades intervenientes em matéria rodoviária, através da emissão de instruções técnicas e da aprovação dos equipamentos de controlo e fiscalização do trânsito, e exercer as demais competências que a lei, designadamente o Código da Estrada e respetiva legislação complementar, lhe cometam expressamente». Naturalmente, por exigência da respectiva legislação metrológica, esta entidade só pode aprovar para uso das forças policiais os equipamentos técnicamente aprovados pelo IPQ, Instituto Português da Qualidade, segundo dispõe o artigo 8.º, nº 1, al. b) do Decreto-Lei 291/90, de 20 de Setembro («Compete ao Instituto Português da Qualidade: proceder à aprovação de modelos de instrumentos de medição a que se refere o artigo 2.º e à aprovação e verificação dos meios de medição a que se referem os artigos 6.º e 7.º») Esta é matéria de “Controlo Metrológico Legal”, cujo regime não nos interessa analisar no seu todo mas que vem regulada em vários diplomas facilmente identificáveis. [1] Para além do sabido enquadramento geral do Regime Geral do Controlo Metrológico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 291/90, de 20-09, e da Portaria n.º 962/90, de 9-10, que aprova Regulamento Geral do Controlo Metrológico, no que nos interessa assume bastante relevo o Regulamento de Controlo Metrológico dos Cinemómetros, aprovado pela Portaria nº 1542/2007, de 06-12. E assume relevo porquanto – e esse é um dos primeiros mal entendidos nos presentes autos - não estamos perante o uso de câmaras de videovigilância tout court. Aquilo que foi usado foi um cinemómetro. Um instrumento de medição associado a uma determinada câmara de captação de imagens. Coisas diversas e com diverso enquadramento legal. E segundo o artigo 2.º do supra referido Regulamento de Controlo Metrológico dos Cinemómetros, aprovado pela Portaria nº 1542/2007, de 06-12, existem os seguintes tipos de cinemómetros: 1) «Cinemómetros-radar» - cinemómetros que utilizam, como princípio de medição, o efeito Doppler; 2) «Cinemómetros de sensores estáticos» - cinemómetros que utilizam, como princípio de medição, a variação do sinal em sensores, instalados dentro ou sobre as bermas das faixas de rodagem; 3) «Cinemómetros-laser a tempo de voo designados por lidares» - cinemómetros que utilizam, como princípio de medição, os tempos dos impulsos de um feixe laser na reflexão no veículo alvo; 4) «Cinemómetros de perseguição» - cinemómetros que utilizam, como princípio de medição, a velocidade do veículo perseguidor; 5) «Cinemómetros instalados em aeronave» - cinemómetros que utilizam, como princípio de medição, a fixação e o seguimento do veículo alvo com câmaras de vídeo e receptores georreferenciais; 6) «Cinemómetros-vídeo fixos» - cinemómetros, instalados em posições conhecidas, que utilizam como princípio de medição, a fixação e o seguimento do veículo alvo com câmaras de vídeo. Portanto – e esse é o segundo mal entendido – os vulgarmente designados “radares” não se definem apenas pela forma de uso (fixo/móvel), também pela forma de medição da velocidade. Aliás, não é também, é essencialmente, pois que o uso fixo ou móvel está dependente, principalmente, da forma de medição. Os Cinemómetros de perseguição, que utilizam como princípio de medição a velocidade do veículo perseguidor e os Cinemómetros instalados em aeronave, que utilizam como princípio de medição a fixação e o seguimento do veículo alvo, não são - por natureza - radares fixos. Outros - Cinemómetros de sensores estáticos – serão por natureza fixos. Outros ainda poderão assumir ambas as características, o que nos parece ser o caso dos autos. No caso em consideração os requisitos de aprovação das qualidades técnicas pelo IPQ (metrologia legal) e de autorização de uso para fiscalização (controlo legal estradal) acabam por fornecer a completa identificação do instrumento utilizado e suas características técnicas, partindo da sua identificação no auto de notícia, que é clara e completa. O auto identifica o cinemómetro como de marca Multanova modelo 6F MUVR6FD n.º 111.20.12.3.09 (fls. 6). [2] Tal modelo foi aprovado pelo Despacho n.º 8334/2012 (DR, 2ª série, nº 119, de 21-06-2012, pag. 21844) como modelo complementar n.º 111.20.12.3.09. As características deste cinemómetro-radar entendem-se como complementares do modelo – naturalmente da mesma marca - n.º 111.20.11.3.23, aprovado pelo Despacho nº 1515/2012 (no Diário da República 2.ª série n.º 23, de 1 de fevereiro de 2012, pag. 3939). Os despachos identificam dois modelos básicos do instrumento complementar, um o MUVR-6FD, outro o MR-6FD, fixo o primeiro, móvel o segundo. A descrição sumária do modelo MUVR-6FD consta do próprio despacho: “é um cinemómetro-radar fixo com funcionamento em: tripé, viatura estacionada, cabina no solo, cabina em pórtico ou pontes, cabinas laterais à estrada ou pórticos, segundo as especificações do fabricante”. Este modelo de cinemómetro-radar fixo apresenta-se em duas versões: “a versão MUVR-6FD (SCI), encontra-se associada à unidade de câmara vídeo digital Smartcamera I e a versão MUVR-6FD (SCIII) está relacionada com a unidade de câmara vídeo digital Smartcamera III” – de ambos os despachos. A unidade dos autos é a primeira, a SCI associada à câmera vídeo digital Smartcamera (fls. 7 dos autos). Assim, tem o arguido razão quanto à subsunção dos factos ao direito metrológico legal. Trata-se de cinemómetro radar “fixo”.
B.3 – Da subsunção às normas pertinentes de fiscalização estradal. A conclusão a que se chegou no primeiro ponto não é suficiente para determinar a sorte do recurso. Para esse desiderato é forçoso proceder a uma interpretação sistemática que determine, com rigor, as normas aplicáveis ao caso sub iudicio. Para o recorrente tais normas são as Leis 1/2005 e 9/2012, artigo 16º do Dec-Lei nº 207/2005 e Portaria nº 373/2012. Não nos parece que esse seja o acervo de normas aplicáveis ao caso, tal como exposta a pretensão. Há cambiantes sistemáticas que são esquecidas nessa conclusão. São variadíssimos os diplomas que regem a captação de imagens, seja por forças de segurança, por privados, incluindo empresas. Assim, a Lei nº 1/2005 (que regula a videovigilância pelas forças de segurança em locais públicos de utilização comum), a Lei nº 51/2006 (que regula a utilização de sistemas de vigilância rodoviária pela EP e pelas concessionárias rodoviárias), a Lei nº 33/2007 (que regula a instalação e utilização de sistemas de videovigilância em táxis), a Portaria nº 1164-A/2007 (que aprova o modelo de aviso de videovigilância em táxis), a Lei nº 34/2013 (que regula a utilização de sistemas de videovigilância pelos serviços de segurança privada e autoprotecção) e a Portaria nº 273/2013 que a regula. Entre outras. De forma mais específica para o caso em análise, o Decreto-Lei 207/2005, de 10-01, regula os meios de vigilância eletrónica rodoviária utilizados pelas forças de segurança. Temos assim – pela simples apreciação superficial do seu objecto - que dois destes diplomas devem ser analisados, a Lei nº 1/2005, alterada e republicada pela Lei nº 9/2012, de 23-02, e o Decreto-Lei 207/2005, de 10-01. Quanto à primeira - Lei nº 1/2005 e suas alterações - claramente um regime geral, é necessário recorrer a alguns dos seus dispositivos para determinar com maior precisão o seu objecto. Assim é importante constatar que o seu artigo 1.º (Objecto e âmbito de aplicação) determina que o diploma «regula a utilização de sistemas de vigilância por câmaras de vídeo pelas forças e serviços de segurança em locais públicos de utilização comum, para captação e gravação de imagem e som e seu posterior tratamento». A previsão do artigo 2.º é essencial para determinar os fins ligados à possibilidade de utilização de videovigilância, no âmbito dessa lei. Apenas para um dos seguintes fins, conforme determinado pelas alíneas do seu nº 1 na sua versão inicial: a) Protecção de edifícios e instalações públicos e respectivos acessos; b) Protecção de instalações com interesse para a defesa nacional; c) Protecção da segurança das pessoas e bens, públicos ou privados, e prevenção da prática de crimes em locais em que exista razoável risco da sua ocorrência. Estas normas são reveladoras, também, por aquilo que não prevêm, as infracções estradais. No que dizia respeito ao direito estradal este diploma – na sua versão original – apenas continha dois preceitos. O nº 3 do artigo 2º que permitia, e apenas, às forças de segurança “para efeitos de fiscalização de infracções estradais … aceder a imagens captadas pelas entidades que controlam o tráfego rodoviário, devendo a respectiva captação, para esse efeito, ser objecto da autorização devida”. Quanto aos seus próprios meios as forças de segurança unicamente viram prevista no artigo 13.º (uma disposição transitória) a consagração de um «prazo de seis meses para proceder à adaptação dos sistemas às disposições da presente lei, contado a partir da data da respectiva entrada em vigor, com submissão à CNPD de toda a informação necessária.» * Será com a entrada em vigor do artigo 23º da Lei nº 39-A/2005, de 29-07 (Alterações ao Orçamento de Estado para 2005), naquilo que constituiu a primeira alteração à Lei nº 1/2005, que vem a ser prevista como objecto da previsão legal numa nova alínea, a d), no nº 1 do artigo 2º do diploma, como segue: «Artigo 2.º [...] 1 - ... a) ... b) ... c) ... d) Prevenção e repressão de infracções estradais. 2 - ... 3 - ... E a ser fixado um regime especial na alteração ao artigo 13º da lei acabada de citar, transformando-se esse preceito de disposição transitória na previsão, antecipação e autorização de um regime especial para as infracções estradais, da seguinte forma: Regime especial Artigo 13.º Utilização de sistemas de vigilância rodoviária 1 - Com vista à salvaguarda da segurança das pessoas e bens na circulação rodoviária e à melhoria das condições de prevenção e repressão das infracções estradais é autorizada a instalação e a utilização pelas forças de segurança de sistemas de vigilância electrónica, mediante câmaras digitais, de vídeo ou fotográficas, para captação de dados em tempo real e respectiva gravação e tratamento, bem como sistemas de localização, instalados ou a instalar pela entidade competente para a gestão das estradas nacionais e pelas concessionárias rodoviárias, nas respectivas vias concessionadas. 2 - Os sistemas de registo, gravação e tratamento de dados referidos no número anterior são autorizados tendo em vista o reforço da eficácia da intervenção legal das forças de segurança e das autoridades judiciárias e a racionalização de meios, sendo apenas utilizáveis em conformidade com os princípios gerais de tratamento de dados pessoais previstos na Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro, em especial os princípios da adequação e da proporcionalidade e de acordo com as regras previstas no artigo 8.º, nos n.os 1 e 2 do artigo 9.º e no artigo 11.º, por forma a assegurar: a) A detecção, em tempo real ou através de registo, de infracções rodoviárias e a aplicação das correspondentes normas sancionatórias; b) A realização de acções de controlo de tráfego e o accionamento de mecanismos de prevenção e de socorro em matéria de acidentes de trânsito; c) A localização de viaturas para efeitos de cumprimento de normas legais, designadamente de carácter penal, tais como as referentes a veículos furtados ou à detecção de matrículas falsificadas em circulação; d) A utilização dos registos vídeo para efeitos de prova em processo penal ou contra-ordenacional, respectivamente nas fases de levantamento de auto, inquérito, instrução e julgamento ou nas fases administrativa e de recurso judicial.» 2 - Fica o Governo autorizado a aprovar, no prazo de 60 dias, ouvida a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD), nos termos e dentro dos limites decorrentes do número anterior, legislação que: a) Regulamente os procedimentos a adoptar na instalação de sistemas de vigilância rodoviária; b) Tipifique os procedimentos a adoptar para o tratamento da informação recolhida e o eficaz registo de acidentes, infracções ou quaisquer ilícitos; c) Estabeleça o regime de transição para a utilização dos sistemas existentes e as formas de coordenação das forças de segurança. Por isso que se possa e deva afirmar que nunca a Lei nº 1/2005 regulou o uso, pelas forças de segurança, de sistemas de vigilância electrónica, mediante câmaras digitais, de vídeo ou fotográficas. Ao invés, anunciou e preparou um regime especial para tal fim. Esse regime especial veio a ser publicado a 29-11-2005 consistindo no Dec-Lei nº 207/2005, escassos meses após a publicação da Lei nº 39-A/2005, de 29-07. Em sede de alterações o artigo 142.º da Lei n.º 53-A/2006, de 29-12 (Orçamento do Estado para 2007) apenas veio aditar à Lei n.º 1/2005, o artigo 14.º, com o acrescentar da possibilidade de as forças de segurança utilizarem os “sistemas de vigilância electrónica criados, nos termos legais, pelos municípios”. Em que medida vem a Lei nº 9/2012, de 10-01, alterar este estado de coisas? Em nada pois que não alterou o artigo 13º daquela, mantendo-se o regime especial. Aliás até o reforçou na medida em que a alteração sistemática a que procedeu – o seu artigo 3ª – criou um capítulo - o V - dedicado a regimes especiais nos quais se inclui o artigo 13º (e o aditado 14º). Desta forma o regime geral da Lei 1/2005 determina que as infracções estradais se regem pelos seus artigos 13º e 14º e exclui essa matéria, estradal, do resto dos seus normativos. E como se relacionam esse regime geral (Lei nº 1/2005) e esse regime especial (Dec-Lei nº 207/2005)? Neste ponto estamos dispensados de complexas interpretações que confirmem o brocardo lex specialis derogat legi generali. A literalidade do corpo do artigo 1º e nº 3 do artigo 2º do Dec-Lei nº 207/2005 basta, como se evidencia: Artigo 1.º Objecto O presente decreto-lei visa regular o regime especial autorizado pelo artigo 13.º da Lei n.º 1/2005, de 10 de Janeiro, na redacção decorrente da Lei n.º 39-A/2005, de 29 de Julho, Artigo 2.º Utilização de meios 1 – (…) 3 - Nos termos do n.º 2 do artigo 13.º da Lei n.º 1/2005, de 10 de Janeiro, na redacção dada pela Lei n.º 39-A/2005, de 29 de Julho, o presente regime especial prevalece sobre o regime geral previsto na referida lei. Assim a querela câmaras fixas/câmaras móveis, sinalética tal como prevista na Lei nº 1/2005, só faz sentido fora dos regimes especiais ali previstos. E é para esse regime geral que existe a Portaria nº 373/2012. E, consequentemente, não é imputável ao tribunal recorrido a prática de nulidade por omissão na produção de prova tal como requerida pelo recorrente em sede de impugnação judicial. Resta saber se faz sentido no Dec-Lei nº 207/2005.
B.4 – Da subsunção dos factos ao regulamento dos meios de vigilância eletrónica rodoviária utilizados pelas forças de segurança. O Dec-Lei nº 207/2005, o regulamento dos meios de vigilância eletrónica rodoviária utilizados pelas forças de segurança, surge pois como o diploma que complementa os artigos 13º e 14º da Lei nº 1/2005. Quanto à questão radares fixos/móveis ela é facilmente resolvida pelo artigo 4º no qual os «equipamentos de vigilância electrónica», sem distinção de tipo, são tratados de forma meramente descritiva como usados “em veículos” e “em áreas onde decorram operações”. Do nº 3 do citado preceito resulta, também sem distinções, que os “dados obtidos através dos equipamentos de vigilância, em tempo real ou em diferido, podem ser usados, a partir dos respectivos registos, para efeitos de prova em processo penal ou contra-ordenacional, respectivamente nas fases de levantamento de auto, inquérito, instrução e julgamento ou nas fases administrativa e de recurso judicial”. A única consequência resultante da muito pouco clara terminologia legislativa nesta área da recolha de imagem reside na previsão do artigo 5º do diploma com o dever de comunicação à CNPD, as “fixas” previstas no nº 1, as “móveis” no nº 2. Como em lado algum o diploma define o que sejam câmaras fixas e móveis, devemos supor que a referência só faz sentido por referência à previsão das alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 4º: «a) Em veículos; b) Em áreas onde decorram as operações previstas no número seguinte». Assim, sem relevantes distinções de regime, sem exigências acrescidas e remetendo-se a necessidade de comunicação à CNPD a um mero dever administrativo. O mesmo se diga quanto à informação dos locais onde tais instrumentos fixos venham a ser colocados, limitando-se o nº 1 do artigo 16º do Dec-Lei nº 207/2005 a afirmar que a “transparência” se limita à «informação, apenas, da sua existência». Corresponde ao usual placard de informação de fundo branco “velocidade controlada”. Mas tal “informação” ou sua ausência, sendo um dever de transparência que a norma faz recair sobre a administração pública com responsabilidade na sinalização estradal, que não sobre as forças de segurança, não tem uma específica sanção. A insatisfação do recorrente centra-se numa potencial mas não provada omissão das entidades administrativas com competência para a sinalização das estradas nacionais quanto ao seu dever de transparência, que não a uma omissão da força policial autuante. Trata-se de norma com uma clara previsão informativa mas sem estatuição sancionadora. Seguramente que se não trata de consagração de um direito à impunidade por falta de pré-aviso. O recorrente centra a sua argumentação na invocação de ilicitude na obtenção da prova mas é certo que a prova foi adquirida sem que tivesse ocorrido qualquer ilicititude no processo da sua produção ou obtenção. Apesar de se tratar de prova alcançada através de imagem (e medição) esta obtenção da identificação do veículo por imagem não viola qualquer direito do recorrente e é prevista e permitida por lei. Sequer as normas legais que prevêm e protegem a imagem e privacidade do cidadão se mostram beliscadas. O mesmo se diga quanto às normas sobre protecção de dados. Certo é que não constituindo tal facto elemento do tipo contra-ordenacional ou condição de punibilidade, arguir com a sua falta revela-se inútil.
Munidos dos ensinamentos recolhidos do Acórdão identificado e transcrito parcialmente, tendo em conta as características do aparelho usado na medição da velocidade e, acima de tudo, porque a sua não sinalização não constitui qualquer afronta a qualquer direito à privacidade do recorrente, apenas é fotografado e visível, o veículo e sua matrícula, e não os seus ocupantes, nenhuma nulidade se verifica.
Ademais, como consta da decisão recorrida e é igualmente abordado com mestria no invocado Acórdão, o nosso sistema processual penal consagrou o princípio da taxatividade das nulidades processuais, o que determina que apenas constitui nulidade a falta que como tal assim seja qualificada por lei – cf. art.º 118.º e 119.º. Como se extrai da análise das normas convocáveis ao presente caso, em nenhuma delas se comina como nula, inválida ou proibida a prova recolhida através de radar de velocidade não identificado, nem a norma invocada pelo arguido constitui norma imperativa ou fixa como pressupostos de validade da fiscalização de velocidade a identificação da existência de aparelho ou sinalização de zona sob controlo. Assim, não constando do elenco de qualquer norma que a qualifique como tal, e não afetando direitos pessoalíssimo, a prova recolhida é válida.
Do exposto, resulta não se verificar qualquer inconstitucionalidade nem tão pouco invalidade incidente sobre a decisão tomada.
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Termos em que se julga improcedente o recurso, já que a decisão se mostra devidamente fundamentada, não existe qualquer nulidade que a afete, e a prova constante dos autos foi recolhida de forma válida.
Nada mais cumpre conhecer, mostrando-se abrangidas pela análise e decisão supra as questões suscitadas ou prejudicadas.
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IV - Decisão:
Pelo exposto, decide-se nesta Relação de Évora:
Julgar manifestamente improcedente o recurso interposto pelo recorrente P, mantendo-se integralmente o decidido em 1ª instância.
Custas a cargo do recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC.