CONTRATO PROMESSA
INCUMPRIMENTO DEFINITIVO
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
Sumário

I - Só a falta absoluta de fundamentação, jurídica ou factual, constitui causa de nulidade da sentença.
II - Por contrato-promessa entende-se a convenção pela qual ambas as partes (ou apenas uma delas) se obrigam a celebrar determinado contrato.
III - O contrato promessa de compra e venda deve ser pontualmente cumprido, obrigando-se as partes dele outorgantes à celebração do contrato definitivo, por meio da respectiva escritura, na data para tal convencionada.
IV - Em caso de incumprimento do contrato-promessa, a lei concede ao contraente não faltoso dois meios distintos de reacção:
a) A execução específica do contrato, nos termos do artigo 830.º do Código Civil;
b) A resolução do contrato.
A primeira ocorre em situações de simples mora.
A segunda, por iniciativa da parte cumpridora, exige que o incumprimento seja definitivo.
V - O incumprimento definitivo pode revelar-se por diversos meios:
a) - A impossibilidade da prestação, por destruição da coisa ou pela sua alienação a terceiro, sem qualquer reserva;
b) - Pelo decurso de prazo fixado contratualmente como absoluto ou improrrogável, o que equivale àquela perda de interesse;
c) - Pela recusa peremptória do devedor em cumprir, comunicada ao credor, não se justificando então a necessidade de nova interpelação ou de fixação de prazo suplementar; ou ainda
d)- Pela perda do interesse do credor na prestação, em consequência de mora do devedor ou a sua inexecução dentro do prazo razoável que lhe for fixado por aquele (interpelação admonitória - artigo 808.º, n.º 1, do Código Civil).
VI - A aplicação da sanção prevista no n.º 2 do artigo 442.º do Código Civil pressupõe que o incumprimento definitivo se deva a culpa (seja imputável) do contraente que não cumpriu a prestação ou que tornou esta impossível.
VII - A litigância de má fé visa punir a instrumentalização do direito processual em diversas vertentes: quando os litigantes pretendam alcançar um objectivo considerado ilegítimo pelo direito substantivo, quando a sua actuação constitua um meio de impedir a descoberta da verdade, como forma de obstruir a actividade da máquina judiciária, com a colocação de obstáculos ou com a promoção de expedientes meramente dilatórios, ou com o objectivo de impedir o trânsito em julgado da decisão e, deste modo, prejudicar a parte contrária na tutela ou na realização do direito substantivo que através da decisão lhe seja reconhecido.
VIII - Demonstrar-se realidade diferente da alegada por uma das partes não significa necessariamente que esta tenha agido com má fé. É necessário que a sua conduta recaia num dos modos de actuação como tal tipificados pelo artigo 542.º do Código de Processo Civil.

Texto Integral

Processo n.º 2719/22.6T8PRD.P1

Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este

Juízo Local Cível de Paredes – ...

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I. RELATÓRIO.

AA, divorciada, NIF ...90, cartão de cidadão nº ..., válido até 02-04-2028, residente na Rua ...., ... ..., propôs acção declarativa com processo comum contra BB, solteiro, maior, natural da freguesia ..., portador do cartão de cidadão nº ..., com contribuinte fiscal nº ...08 e CC, solteira, maior, natural de ..., portadora do cartão de cidadão nº ..., com contribuinte fiscal nº ...53, ambos residentes na Travessa ..., em ..., pedindo que a acção seja julgada procedente, por provada, e consequentemente os réus condenados:

A) Reconhecerem que não houve incumprimento definitivo da Autora no contrato promessa melhor identificado no artigo 1.º da petição inicial;

B) Que os Réus nunca interpelaram admonitoriamente a Autora, como estava previsto contratualmente no n.º 3 da Cláusula Quinta do Contrato Promessa;

C) Os Réus não tinham fundamento para resolver o contrato de forma unilateral;

D) Tendo-o resolvido, sem fundamento, e já tendo vendido o imóvel a terceiros, o seu incumprimento é definitivo e culposo.

E) Tendo como consequência a devolução à Autora o sinal recebido em dobro, no valor de 47.000,00 € (quarenta e sete mil Euros).

F) No pagamento dos juros de mora à taxa legal civil, a contar da data da condenação até efectivo e integral pagamento.

Ou subsidiariamente, acaso não proceda o Pedido Principal:

G) A reconhecerem a redução equitativa do sinal à quantia de 10.000,00 € e a devolver à Autora a quantia de 13.500,00 €, tudo acrescido dos respectivos juros de mora a partir da citação.

Alega, para tanto, que, no passado dia 6 de Abril de 2021, foi celebrado entre a autora e os réus um contrato promessa de compra e venda em que a Autora, na qualidade de promitente compradora prometeu comprar aos Réus, promitentes vendedores, a fracção autónoma designada pela letra “I” composta por cave, rés-do-chão e andar, a nona a contar desde o lado sudoeste, para habitação do tipo T5, com entrada pela Travessa ..., nº. ...3, com acesso directo desde o arruamento público a sudeste para um logradouro propriedade da fracção e um pátio de entrada na habitação ao mesmo nível, respectiva fracção integrada no prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal sito na mesma morada; o preço final da compra e venda acordado entre as partes foi de € 235.000,00, conforme cláusula 3ª., tendo, a título de sinal e princípio de pagamento, a autora entregue, nessa data de 16.04.2021, aos réus, através de transferência bancária, a quantia de 23.500,00 €, através de transferência bancária proveniente da conta com o IBAN  ...05 do Banco 1... para a conta dos réus com o IBAN  ...51 do Banco 2..., sendo o remanescente do preço pago na data da outorga do contrato definitivo de compra e venda – escritura pública, através de cheque visado ou bancário – conforme cláusula 3.ª.

Ficou estabelecido que a escritura de compra e venda seria outorgada no prazo de 90 dias, contados da data da assinatura do contrato promessa, susceptível de poder ser prorrogado por mais 90 dias, e que seria a promitente compradora a marcar a escritura, avisando os promitentes vendedores por carta registada com aviso de recepção ou outro meio passível de confirmação, com a antecedência mínima de 15 dias.

Era do conhecimento dos réus que o valor remanescente do preço estava pendente da venda duma casa da mãe da autora, e do próprio apartamento da autora, tendo para o efeito sido contratado um arquitecto conhecido da agência imobiliária que tratou do assunto, o que justificou a celebração do aditamento ao contrato promessa celebrado em 16.07.2021.

Não obstante, a autora alega que, apesar da supracitada prorrogação do prazo para celebrar a escritura, os réus não tinham fundamento legal para resolver unilateralmente o contrato como fizeram em 31.01.2022, seguindo-se respostas recíprocas, na medida em que a autora tudo fez para cumprir com a sua prestação, mantendo interesse na celebração do contrato ou na restituição do sinal prestado, refutando a acusação de incumprimento definitivo do contrato, alegando que, quando muito, só estaria em mora.

Acrescenta que os réus para converterem a mora em incumprimento definitivo teriam de ter interpelado a autora, intimando-a a cumprir a prestação dentro dos 15 dias estipulados, com a advertência expressa, de que a falta de prestação no prazo estabelecido para o efeito a faria incorrer em incumprimento definitivo da obrigação.

Os Réus, regularmente citados, deduziram contestação, tendo, no essencial, alegado que não assiste razão à autora porquanto as partes acordaram que a celebração do contrato definitivo seria marcada decorridos 90 dias após a celebração do contrato promessa, competindo à promitente-compradora, a aqui Autora, a marcação da escritura de compra e venda, sendo obrigação da promitente compradora comunicar aos réus a data, hora e local, com pelo menos 15 dias de antecedência, mantendo que a prorrogação do prazo verificada para a realização da escritura do contrato prometido ocorreu a pedido da autora e no seu exclusivo interesse, por não estarem reunidas todas as condições económicas.

No entanto, foi esgotado o prazo para a identificada promitente-compradora marcar e realizar a escritura pública de compra e venda da aludida fracção, que lhes comunicou a desistência do negócio, tal como veio a suceder com a agência imobiliária.

Tendo ainda comunicado a Autora que, uma vez que lhe era impossível realizar a compra da fracção, tentaria encontrar um terceiro que assumiria o negócio, de modo a não perder o sinal já entregue, e foi nesse pressuposto que os réus não resolveram de imediato o contrato-promessa, ficando a aguardar a celebração do contrato de compra e venda com um terceiro, apesar do contrato não prever a possibilidade de cessão da posição contratual, o que, não obstante os réus terem aguardado, nunca veio a suceder.

E apesar de terem decorrido sempre visitas, os réus defendem que o contrato promessa se extinguiu no passado dia 14 de Outubro de 2021, por desistência da autora.

Mais invocam a excepção do abuso de direito decorrente da comunicação feita pela autora aos réus e à sociedade imobiliária de haver uma impossibilidade superveniente de celebrar o negócio prometido.

Finalmente, imputa à autora uma actuação como litigante de má-fé, nos termos e fundamentos constantes da referida contestação.

Foi elaborado despacho saneador, que afirmou a validade e regularidade processuais, foi identificado o objecto do litígio e enunciados os temas de prova.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:

“Em conformidade com o acima exposto, julgo parcialmente procedente, por provada a presente acção e, por consequência, condeno os réus BB e CC nos seguintes pedidos:

- (B) A reconhecerem que nunca interpelaram, admonitoriamente, a autora AA como estava previsto contratualmente no nº. 3 da cláusula quarta (4) do contrato promessa celebrado em 16 de Abril de 2021;

- (E) Condenando-os, por conseguinte, a restituírem à autora AA, o valor do sinal em singelo recebido, correspondente ao valor de € 23.500,00 (vinte e três mil e quinhentos euros), acrescido dos juros contados à respectiva taxa legal desde a data da citação até integral pagamento,

julgando-se improcedentes os demais pedidos formulados, respectivamente, nas alíneas (A), (C), (D), (F) e (G), deles se absolvendo os réus BB e CC

Custas a cargo de ambas as partes, na proporção de ½ para cada uma das partes, nos termos do disposto no artigo 527º nºs. 1 e 2 do CPC.

Registe e Notifique”.

C. Condena-se a autora/reconvinda AA, nas custas da acção”.

Inconformados com tal sentença, dela interpuseram os Réus recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões:

“A- A sentença recorrida apresenta-se desprovida de qualquer fundamentação de direito ou motivação, e da melhor e mais correta interpretação e aplicação do Direito pertinente ao caso concreto.

B- O tribunal a quo assentou, erradamente, na opinião dos recorrentes, a sua decisão nos seguintes factos que deu como provados:

1. No passado dia 6 de abril de 2021, foi celebrado um contrato-promessa de compra e venda entre a Autora/recorrida, na qualidade de promitente compradora, que prometeu comprar aos Réus/recorrentes, os promitentes vendedores, a fração autónoma designada pela letra “I” composta por cave, rés-do-chão e andar, a nona a contar desde o lado sudoeste, para habitação do Tipo T5, com entrada pela Travessa ..., nº ...3, com acesso direto desde o arruamento público a sudeste para um logradouro propriedade da fração e um pátio de entrada na habitação, ao mesmo nível, integrada no prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Travessa ..., nº.s 1, 5, 9, ...3, ...7, ...1, ...5, ...9, ...3, ...7, ...1, ...5, ...9, ...3 e ...7, freguesia ..., Concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Paredes, sob a descrição nº ...01 da freguesia ..., e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...77, (…)

2. O preço final de compra e venda acordado entre as partes foi de 235.000,00€, conforme a cláusula 3ª que se dá aqui por integralmente por reproduzida.

3. A título de sinal e princípio de pagamento, a Autora entregou, nessa data de 16.04.2021, aos Réus, através de transferência bancária, a quantia de 23.500,00 €, correspondente a 10% do valor total convencionado para a compra do imóvel, através de transferência bancária (…);

4. O remanescente do preço de 211.500,00 € seria pago na data da outorga do contrato definitivo de compra e venda – escritura pública, através de cheque visado ou bancário;

5. Na cláusula 4ª, nº 1, ficou estabelecido que a escritura de compra e venda era outorgada até um prazo de 90 dias contados da data da assinatura do Contrato-Promessa tendo logo estabelecido que o prazo previsto no número anterior, podia ser objeto de uma prorrogação de mais 90 dias (nº 2 da cláusula 4ª) e que seria a promitente compradora a marcar a escritura, avisando os promitentes vendedores, por carta registada com aviso de receção ou outro meio passível de confirmação, com a antecedência mínima de 15 dias, nº 3 da cláusula 4ª.

6. Estabeleceram na cláusula quinta que titularam de incumprimento que: “1. Se a escritura não for realizada no prazo referido na cláusula anterior por facto imputável aos Primeiros outorgantes, a Segunda outorgante deverá notificá-los de novo, em data posterior, por carta registada com aviso de receção com pelo menos 15 (quinze) dias de antecedência; 2. Se os Primeiros outorgantes não comparecerem na nova data referida no ponto anterior, constituir-se-ão no incumprimento definitivo, obrigando-se à devolução do sinal em dobro. 3. Decorrido que esteja o prazo referido na cláusula anterior sem se ter realizado a Escritura Pública e Definitiva por facto imputável à Segunda outorgante, os Primeiros outorgantes têm a faculdade de reverter para si a obrigação de notificá-la, em data posterior, por carta registada com aviso de receção com pelo menos 15 (quinze) dias de antecedência, a comparecer no dia, hora e local determinado por estes, para a celebração do referido ato. 4. Se a Segunda Outorgante não comparecer à celebração do contrato de compra e venda, marcado nos termos do número anterior, constituir-se-á no incumprimento definitivo e culposo das respetivas obrigações contratuais, sujeitando-se à perda da quantia até então entregue, sem direito a qualquer indemnização ou reclamação.

7. Era do conhecimento dos Réus que o valor remanescente do preço estava pendente duma casa da mãe da Autora, que ia ser vendida e do próprio apartamento da Autora;

8. A 16 de julho de 2021, a Autora e os Réus subscreveram um Aditamento ao contrato promessa de 16 de abril de 2021, onde estabeleceram na cláusula 2ª, uma prorrogação de mais 90 dias, até ao dia 4 de outubro de 2021, para a realização da escritura definitiva de compra e venda, mantendo-se válidas e inalteradas as restantes cláusulas;

9. Por carta datada de 31.01.2022, mas registada em 02.02.2022 e recebida a 07/02/2022, os Réus comunicaram à Autora que “vimos pela presente resolver o contrato-promessa de compra e venda da fração autónoma designada pela letra “I”, inscrita na matriz predial urbana da freguesia ..., sob o artigo ...77 que foi celebrado entre nós e V.Ex.as a 16 de abril de 2021;

10. Que o prazo tinha terminado no passado mês de outubro de 2021 e para concluir que “Assim porque não foi celebrada a escritura e nem sequer marcada, como deveria ter ocorrido dentro do dito prazo, comunicamos a resolução do referido contrato";

C- A sentença recorrida, deu como provado que:

a. A autora e os Réus, na qualidade de outorgantes estabeleceram, consensualmente, que condições constituiriam o incumprimento definitivo e a perda do sinal ou devolução em dobro.

b. Apesar dos esforços da Autora, até 14.10.2021, ainda não tinha conseguido as vendas referidas, que lhe permitiriam pagar o remanescente do preço aos Réus.

c. O imóvel objeto do contrato promessa foi vendido pelos Réus, por escritura outorgada em 11.04.2022, pelo valor de 240.500,00 €, por um valor ainda superior em 5.500,00 € àquele que tinham acordado com a Autora, conforme se pode ver da cópia da escritura de compra e venda junta como documento nº. 9 para os devidos e legais efeitos.

d. A Autora informou a agência mediadora "A... Lda", com sede na Rua ..., ..., ..., ... que, por sua vez, informou os Réus do atraso na venda do imóvel da mãe.

e. A prorrogação do prazo para a realização do contrato prometido ocorreu a pedido da Autora e no seu exclusivo interesse pois alegou que o seu pai tinha falecido e que a sua mãe já não queria vender a sua casa, sendo essa uma das condições para que a autora pudesse comprar aquela fração.

f. Os Réus foram aguardando a realização da escritura de compra e venda, mesmo depois de esgotado o prazo de prorrogação concedido no aditamento, que terminava a 14 de outubro de 2021 e esperaram mais de dois meses, até ao fim do ano de 2021.

g. E, nessas circunstâncias mantiveram contato com a imobiliária, que a pedido da Autora foi tentando também encontrar outro interessado na cessão de posição contratual.

h. Que decorrido o prazo concedido, a Autora não marcou a escritura de compra e venda, nem antes nem depois do dia 14 de outubro.

i. Que os Réus voltaram a colocar à venda o imóvel nessa mesma imobiliária, que tinha angariado a sua cliente (a Autora).

j. No contrato-promessa celebrado não previa a possibilidade de cessão de posição contratual.

k. A sociedade de mediação imobiliária iniciou de imediato a procurar novo cliente.

l. Em 9 de junho de 2021, a Ré mulher perguntou por mensagem escrita ao representante da dita imobiliária (DD), na sequência da comunicação da Autora se “A outra senhora já assinou o papel para pôr a venda a casa novamente?”

m. Tendo o DD respondido “Sim” 32). Ao que a Ré mulher perguntou “não tenho de ficar com cópia disso??” e que o dito DD respondeu “É um e-mail a dar essa autorização”, conforme teor do documento 1 – print das mensagens trocadas entre a Ré mulher e o Sr. DD.

n. O DD iniciou novamente o agendamento de visitas à fração dos Réus, com outros interessados, agendando reuniões e abrindo as suas portas, tendo a Ré mulher comunicado que tinha outro cliente interessado.

o. O contrato-promessa que os Réus e Autora celebraram tinha prazo máximo previsto para a realização do contrato prometido.

p. Foi a imobiliária que tratou da celebração do primitivo contrato, do aditamento e da sua cessação.

D- A sentença colocada em crise, errou ao concluir que “a atuação das partes não foi de acordo com o clausulado a que de forma voluntária, livre e expressa as mesmas se vincularam e, por isso, integrando os factos provados ao direito importa referir que na cláusula 4, ponto 1, as partes estipularam um prazo em que a escritura de compra e venda seria outorgada, no caso concreto até um prazo de 90 dias a partir da data de assinatura do presente contrato promessa que ocorreu, em 16 de abril de 2021 e, por isso, em 16 de julho de 2021 foi celebrado e assinado pelas partes um aditamento ao contrato precisamente por corresponder essa data ao termo do prazo para celebração da escritura do contrato definitivo, sendo que nessa data ainda a autora tentava, por um lado, regularizar o licenciamento da casa de seus pais e, por outro lado, convencer a sua mãe a reconsiderar e alterar a sua vontade de não vender.”.

E- A sentença recorrida errou quando concluiu que “aos réus era-lhes exigível maior diligência, nomeadamente, na conversão da mora da autora em incumprimento definitivo, por via da interpelação admonitória da ré para em prazo razoável para realizar a sua prestação e, não o tendo feito, optaram por resolver o contrato promessa em 31 de janeiro de 2022, na sequência das informações fornecidas pelo consultor DD”.

F- A não celebração da escritura pública de compra e venda do imóvel não pode ser imputado aos recorrentes, como concluiu a sentença recorrida, pois a matéria que deveria ser dada por provada impunha decisão diversa.

G- Foi a própria recorrida quem desistiu no negócio, por falta de capacidade económica da mesma, factualidade que resultou cabalmente provada em sede de audiência e julgamento, e que a própria confessou, tendo solicitado que a imobiliária colocasse a fração novamente à venda, por manifesta impossibilidade financeira em realizar o negócio. Facto confesso.

H- O contrato-promessa em causa extinguiu-se a 14.10.2021, após uma prorrogação do prazo, por desistência da recorrida, em virtude da falta de capacidade económica da mesma.

I- As declarações prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento, pela própria recorrida, resultou provado que a recorrida declarou expressamente que não pretendia cumprir a prestação a que estava adstrita; que tal impossibilidade adveio da falta de capacidade financeira em virtude de não ter logrado vender a casa de habitação propriedade de sua mãe; e que mesma desistia do negócio prometido e que iria, contudo, tentar que um terceiro adquirisse o imóvel para que não se verificasse a perda do sinal.

J- O contrato-promessa de compra e venda não admitia a cessão e posição contratual).

K- Depois de verificada a impossibilidade financeira da recorrida, a sociedade imobiliária voltou a colocar o imóvel à venda, a pedido e com o consentimento da recorrida.

L- Os Recorrentes recorrem também da decisão proferida sobre a matéria de facto, nomeadamente – por incorreta apreciação da matéria de facto - quanto aos seguintes factos dados como não provados: 10 a 15, 21, 22, 24, 25, 26, 27, 29 a 31, 35, 40, 43, 44, 49, 61, 69, 70, 71, 73 a 78, 81 a 83, 85, 86, 96, 100 a 104 da contestação apresentada.

M- A Mma. Juiz a quo apresentou a sua fundamentação para a decisão ora em recurso com absoluto desprendimento da realidade fáctica e em desconformidade com os elementos carreados para os autos, assim como com desconsideração da prova produzida e relevante para a presente causa.

N- A decisão do Tribunal a quo fez uma ponderação errada da provada carreada para os presentes autos, considerando na decisão a quo, factualidades que nunca deveriam ter sido valoradas e desconsiderando outras que possuíam força probatória plena.

O- Os factos n.º 15, 21, 22, 24, 25, 26, 27, 29 a 31, 35, 40, 43, 44, 49, 61, 69, 70, 71, 73 a 78, 81 a 83, 85, 86, 96, 100 a 104 da contestação apresentada deveriam ter sido julgados provados

P- A recorrida não alegou um único facto que pudesse comprovar a posição por si assumida.

Q- O meio de prova que implicaria a prolação de decisão em inverso sentido, e que aqui se deixa consignado nos termos e para os efeitos do preceituado pela alínea b) do n.º 1 e pelo n.º 2 do art. 640.º do Código de Processo Civil, é o depoimento de parte da recorrida cuja transcrição segue infra, nos termos e para os efeitos do preceituado pela parte final da alínea a) do n.º 2 do referido artigo 640.º do Código de Processo Civil – e, essencialmente, os documentos juntos aos presentes autos, nomeadamente todas as comunicações escritas e que foram trocadas pelas partes e respetiva imobiliária,

R- A recorrida declarou:

Gravação Áudio do Depoimento de parte da Autora

Horas: 10h44min a 11h:17min

Minuto 1:33

Autora AA:” alongou-se um bocadinho mais o prazo por causa do processo de legalização da casa da minha mãe. Os meus pais iam viver comigo, e foram, estão agora a viver comigo.”

Minuto 3:11

Autora AA: Claro que eu tinha o processo da legalização da casa da minha mãe a decorrer. E foi falado isso no ato de assinatura do cpcv. E eu falei, para me salvaguardar. Eu gostava de comprar a casa mas queria uma salvaguarda, caso as coisas corressem mal, pudesse o dinheiro ser-me ressarcido. Pode demorar-se mais tempo que o previsto que estas coisas às vezes não dependem da nossa boa vontade.

Minuto 7:40

Mma Juiz: Ambas as partes podiam marcar a escritura? E se marcassem as duas ao mesmo tempo o que é que acontecia?

Minuto 7:57

Autora AA: Primeiro tinha que ser comunicado. Se eles marcassem primeiro eu tinha que ser comunicada. Digo eu. Agora, o acordo era comprar Mma, não era estar aqui a negociar. O negócio para mim estava feito.

Eu tinha interesse na casa, e eu só disse que a licença não estava pronta, que eu não podia realizar o negócio sem a casa da minha mãe. Porque eu não precisava de empréstimo, porque com a venda da casa da minha mãe e da minha eu não precisava de empréstimo.

Minuto 8:39

Autora AA: Eu não tinha o dinheiro de momento.

Minuto 8:41

Mma. Juiz: A finalidade dos aditamentos era prorrogar a celebração da escritura definitiva?

Autora AA: Sim.

Mma. Juiz: Porquê?

Autora AA: Prolongar por causa da licença de habitabilidade.

Para eu fazer a escritura eu tenho que ter dinheiro.

Minuto 9:26

Mma. Juiz: Quanto é que a senhora informou os réus que não tinha condições para seguir com a celebração e natureza dessas condições que comunicou?

Autora AA: Eu no CPCV, foi falado esta realidade. Para eu prosseguir com o contrato havia esta condição. E foi aceite. Eu não falei nunca que não queria celebrar o contrato.

Minuto 9:58

Mma. Juiz: Mas alguma vez a senhora falou aos Reus que não tinha condições para celebrar o contrato?

Autora AA: Não.

Mma. Juiz: Nem de natureza económica?

Autora AA: Não.

Minuto 11:40

Mma. Juiz: Porque é que decorrido o prazo a senhora não marcou a celebração da escritura definitiva?

Autora AA: Referindo-se à eventual cessão da posição contratual, disse: Eu nunca pus em causa desistir da casa. Era por exemplo, imagine que aparecesse um comprador ou alguém que quisesse comprar mais cedo que aquilo que eu estava disponível.

Mma. Juiz: Alguma vez referiu que tendo o seu pai falecido a senhora sua mãe já não pretendia vender a casa?

Autora AA: Não. A minha mãe ficou foi na altura, acho que tive essa conversa mas não no sentido de ela não querer, ela ficou alterada. Foi um momento de choque. Mas ela depois quis sempre a casa. Não era em casa em si mas o choque.

Mma. Juiz: Portanto não comunicou que já não tinha dinheiro?

Autora AA: Não. A minha mãe tinha dinheiro. Nós tínhamos dinheiro. Património eu tinha.

Minuto 17:30

Autora AA: O Património que eu tinha era com a minha casa e a casa da minha mãe. Eles sabiam perfeitamente que era com o dinheiro dessas duas casas que eu ia realizar o próximo negócio. Só assim. Mais vantajoso era porque eu não precisava de crédito.

Minuto 21:23

Autora AA: Quando eu falei desta posição de haver cedência de posição caso encontrassem um possível interessado mais cedo que o que eu estava a fazer, ele informou que as vezes ia um possível comprador ou visita.

Minuto 23:19

Autora AA: Eu tinha assumido que punha a minha posição no sentido de ser ressarcida do dinheiro mas nunca disse que prescindia do contrato. Como não estavam a encontrar ninguém eu pensava que ia conseguir realizar o negócio que queria, porque eu depois tinha dinheiro.

Minuto 25:30

Autora AA: O meu pai faleceu em abril.

Mandatário dos RR.: Após a celebração do cpcv?

Autora AA: Foi.

Minuto 26:40

Mandatário dos RR.: Não colocou nenhuma condição no sentido de só celebrar a escritura definitiva se conseguir vender a casa da minha mãe.

Autora AA: Não fui eu que fiz o contrato.

Mandatário dos RR.: Leu o contrato?

Autora AA: Li.

Mandatário dos RR.: Não tem lá isso?

Autora AA: Não.

Mandatário dos RR.: E a Sra. Dra. Não pediu para colocar lá essa cláusula?

Autora AA: Não pedi.

Minuto 28:57

Autora AA: O que faz sentido é eu ter falado no período do aditamento. Se eles tivessem pressa, quisessem por à venda, ou arranjassem que era possível comprador e se me devolvessem o sinal, eu aceitaria.

Minuto 31:45

Autora AA: Ele disse que estavam a arranjar, que havia um possível comprador. Mas depois ou as pessoas não reuniam condições para seguir em frente.

S- A sentença recorrido deveria ter dado como PROVADOS os factos vertidos no ponto “o” das conclusões, face ao depoimento prestado pela recorrida.

T- O sentido decisório da sentença a quo vem inquinado por erro de julgamento e que mereciam resposta em sentido diametralmente oposto.

U- A própria sentença declarou que “a autora vendo dificultada e demorada a obtenção da licença camarária referente à casa dos seus pais, sustentada na desnecessidade de pedir um financiamento para realizar o contrato definitivo demonstrou ambiguidade e incongruência, quando negou que a falta de concretização do negócio se devia a problemas financeiro, no entanto, prontamente propôs a cessão da sua posição contratual”. Tal facto impunha considerar os factos vertidos no ponto 23 desta peça como provados.

V- Devem ser alterados os factos, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, a resposta aos factos da contestação tidos como não provados (nomeadamente 10 a 15, 21, 22, 24, 25, 26, 27, 29 a 31, 35, 40, 43, 44, 49, 61, 69, 70, 71, 73 a 78, 81 a 83, 85, 86, 96, 100 a 104 dos factos não provados), cujo sentido decisório vem inquinado por erro de julgamento e que mereciam resposta em sentido diametralmente oposto.

W- A recorrida alegou factos falsos cuja falta de fundamento não pode desconhecer – e não desconhecia – e deduziu uma pretensão cuja falta de fundamento não desconhece, alterando a verdade dos factos, e omitindo factos relevantes para a boa decisão da causa, tentando iludir o tribunal, de modo a conseguir um objetivo ilegal, tendo litigado com manifesta má-fé processual, devendo ser condenada como litigante de má-fé.

X- A douta sentença está ferida de patente e ostensiva nulidade por completa falta de fundamentação, de acordo com a alínea b) do nº 1 do artigo 615º do Cód. Proc. Civil.

Y- A decisão recorrida não explicita, nem imediata nem mediatamente, o entendimento que estará subjacente à improcedência da pretensão dos Recorrentes, sendo certo que o mesmo é dizer que o julgador não deu a conhecer na sentença em causa a subsunção jurídica e factual que terá sido levada a cabo, sendo, por isso, absolutamente impossível ao Recorrente conhecer e, eventualmente, questionar o processo cognitivo do julgador.

Z- A sentença recorrida é omissa quanto aos motivos da decisão, porque não tem motivos nenhuns explicitados, inexistindo a eventual motivação respetiva e as razões da decisão que não só não foram expressas como nem tão pouco se encontram implícitas na sentença recorrida.

AA- Os Recorrentes não sabem por que razão se decide como se decide em tal sentença que não compreendem porque absolutamente nada ali é referido a esse respeito. Na douta sentença o Tribunal a quo apenas se limitou a referir que não os recorrentes deveriam ter notificado admonitoriamente a recorrida para converter a sua mora em incumprimento definitivo, não invocando um único facto que permitisse aos recorrentes compreender o motivo pelo qual não foi valorada a desistência do negócio pela recorrida.

BB- Os recorrentes ficam sem saber o motivo pelo qual a sentença a quo não considerou como assente o facto vertido nos pontos 10, 11, 12, 13, 14, 15, 21 22 24 e 25, 26, 27, 29 a 31 da contestação apresentada pelos mesmos.

CC- A decisão em causa é ostensivamente nula por absoluta falta de fundamentação (cfr. art.º 615º, nº 1, al. b) do Cód. Proc. Civil), o que expressamente se invoca e se requer seja deferido, julgando-se nula a mesma e anulando-se os ulteriores termos processuais.

DD- A apreciação crítica da prova trazida aos autos, como a prova documental que foi junta, impunha que a decisão sobre a matéria de facto que supra foi já individualizada o fosse em sentido diverso.

EE- Foi a recorrida quem desistiu do negócio em virtude da sua falta de capacidade económica para adquirir o imóvel em causa. Foi a recorrida quem comunicou tal facto à imobiliária e aos recorrentes, motivo pelo qual autorizou a eventual cessão da posição contratual.

FF- O contrato promessa celebrado se extinguiu a 14.10.2021, uma vez que a recorrida não possuía condições financeiras de o celebrar, porquanto não havia ainda logrado vender a casa da senhora sua mãe.

GG- O contrato-promessa de compra e venda que ora se discute, não foi celebrado sob condição resolutiva.

HH- Ocorre incumprimento definitivo nos casos em que o devedor adota qualquer outra conduta manifestamente incompatível com o cumprimento.

Nos casos em que a conduta do contraente é manifestamente incompatível com o cumprimento do contrato, torna-se inexigível ao credor que fixe um prazo suplementar para que se verifique incumprimento definitivo.

II- Face à matéria que resultou cabalmente provada em sede de audiência de julgamento, sempre se deveria entender que a recorrida declarou expressamente não pretender cumprir a prestação. Quem pretende cumprir o negócio não projeta ceder a sua posição contratual.

JJ- A sentença a quo violou os artigos 406.º, 798.º e 799.º do CC.

KK- A sentença recorrida incorre em erro de julgamento.

LL- A sentença recorrida julgou in abstrato, de forma desadequada à lei e à justiça do caso.

MM- A sentença em crise padece de erro de julgamento, bem como de erro na aplicação do direito, sendo certo que no presente caso o erro de julgamento verifica-se na interpretação e subsunção dos factos e também na aplicação de matéria de direito.

NN- O artigo 442.º n.º 2 do CC deve ser aplicado in casu, devendo considerar-se que ocorreu a resolução do contrato, por desistência da recorrida.

OO- As partes do contrato-promessa (Recorria e recorrentes), entenderam prever duas formas diversas em caso da não celebração da escritura pública de compra e venda do imóvel, conforme a parte incumpridora: se a escritura não tivesse sido realizada por facto imputável aos recorrentes, a “Segunda Outorgante deverá notificá-los de novo, em data posterior, por carta registada com avido de receção com, pelo menos 15 (quinze) de antecedência. Se os primeiros outorgantes não comparecerem na nova data referida no ponto anterior, constituir-se-ão no cumprimento definitivo…”

PP- As partes contratuais previram que para que ocorresse incumprimento por banda dos promitentes vendedores (recorrentes) estes teriam de ser interpelados por escrito pela recorrida com a designação de nova data. As partes previram uma condição (interpelação escrita) para ocorrência do incumprimento definitivo; se não fossem interpelados por escrito, nunca ocorreria o incumprimento definitivo.

QQ- A recorrida obrigou-se, através do referido contrato, a notificar por escrito os recorrentes para a designação de nova data, para se verificar, eventualmente, o incumprimento definitivo.

RR- Nos termos do nº 3º da referida cláusula quinta, ficou escrito o seguinte: “decorrido que esteja o prazo referido na cláusula anterior sem se ter realizado a escritura pública definitiva por facto imputável à segunda outorgante, os primeiros outorgantes, tem a faculdade de reverter para si

obrigação de notificá-la, em data posterior, por carta registada com aviso de receção, com pelo menos 15 (quinze) de antecedência, a comparecer no dia, hora e loca determinado”.

SS- No caso da escritura não tiver sido celebrada dentro do prazo previsto, assistia aos recorridos a faculdade, o direito, a possibilidade de marcar a escritura de compra venda. Os recorrentes não estavam obrigados a notificar por escrito a recorrida, pois tal não resultava direitamente do contrato. AS partes conferiram o direito aos recorrentes de, querendo, marcar a escritura de compra e venda; não impuseram uma obrigação. Uma “faculdade” não é uma “obrigação.

TT- Do texto do contrato, resulta um comportamento obrigatório para a recorrida de notificar por escrito os recorrentes (vendedores) e só em caso de incumprimento, de faltarem à nova data designada é que ocorreria o incumprimento definitivo.

UU- Os recorrentes não estavam obrigados a notificar a recorrida para designar nova data. Em lado nenhum do texto do contrato-promessa se previu essa obrigação para os recorrentes. E não se pode defender que, apesar do texto nada dizer, ocorria para si essa obrigação. Se as partes quisessem, poderiam tê-lo previsto, como fizeram para a recorrida.

VV- É ilegal uma interpretação do contrato-promessa que defenda resultar uma obrigação para os recorrentes de notificar a recorrida, para que ocorresse o incumprimento definitivo, como fez a sentença recorrida.

WW- A sentença recorrida violou claramente o artigo 9.º n.º 2 do código civil, pois o tribunal não pode retirar do texto do contrato-promessa uma interpretação que não tenha um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expressa.

XX- A sentença em crise deve ser revogada e, assim, e serem os pedidos formulados pela recorrida totalmente improcedentes, por não provados, devendo os recorrentes ser absolvidos de todos os pedidos contra eles formulados.

YY- A sentença recorrida violou os artigos 9.º n.º 2, 442.º n.º 2, 406.º, 798.º e 799.º do código civil, 615º, nº 1, al. b) do Cód. Proc. Civil, da alínea a) e b) do n.º 2 do referido artigo 640.º do Código de Processo Civil, e o artigo 615º, nº 1, al. b) do Cód. Proc. Civil.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e revogada a sentença recorrida e ser julgada improcedente a ação que condenou os recorrentes, absolvendo-os dos pedidos contra si formulados, fazendo-se justiça”.

A recorrida apresentou contra-alegações, a interpôs recurso subordinado, formulando as seguintes conclusões:

I - Se no contrato promessa as partes convencionaram que para haver incumprimento definitivo era necessário que decorrido o prazo fixado para a outorga da escritura se deve notificar a parte contrária por carta registada com pelo menos 15 dias de antecedência a comparecer no dia e hora e local determinado por esta para a celebração do referido acto.

II - Para logo se determinar que "se a segunda outorgante (ora A.) não comparecer à celebração do contrato de compra e venda marcado nos termos do número anterior constituir-se-á no incumprimento definitivo e culposo das respectivas obrigações contratuais, sujeitando-se à perda da quantia então entregue sem direito a qualquer indemnização ou reclamação.

III - Tudo isto quer dizer que o prazo fixado não era absoluto e fixo, estando o incumprimento definitivo dependente da interpelação admonitória com 15 dias de antecedência com local, dia e hora para a outorga da escritura.

IV - Ora, tendo os RR. optado por resolver o contrato promessa em 3 de Janeiro de 2022, sem ter feito interpelação admonitória da A. para num prazo razoável realizar a sua prestação, verifica-se que a mora nunca foi convertida em incumprimento definitivo.

V - Constatado que está que os RR. nunca interpeleram admonitoriamente a A., isso impede que se dê como verificada a conversão da mora em incumprimento definitivo.

VI - Que tem como consequência que a resolução é intempestiva e não havia fundamento para a resolução do contrato promessa em 31/01/2022 por parte dos RR..

VII - E que é devida à A. restituição do sinal em dobro, ou seja a quantia de 47.000,00 €.

Termos em que, por erro de interpetação e aplicação do diposto nos artºs 808 e 442 nº 2, ambos do C.C., deve Sentença ser alterada no sentido que os RR. têm de pagar à A. o sinal em dobro, ou seja, 47.000,00 € (quarenta e sete mil Euros), com o que se fará a sempre esperada JUSTIÇA”.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II. OBJECTO DO RECURSO

A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.

B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelos recorrentes, no caso dos autos cumprirá apreciar:

B.1.: recurso dos Réus:

- se a sentença padece de nulidade;

- se ocorreu erro na apreciação da matéria de facto;

- se ocorrem os pressupostos necessários ao pedido de condenação da Autora por litigância de má fé.

B.2.: recurso dos Réus e da Autora:

- se existia fundamento para a resolução do contrato-promessa por parte dos promitentes vendedores (Réus);

- dever de restituição da quantia entrega a título de sinal e sua medida.

III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

III.1. Pelo tribunal recorrido foram considerados provados os seguintes factos:

Por confissão, mostram-se provados:

1). No passado dia 6 de Abril de 2021, foi celebrado um contrato promessa de compra e venda entre a Autora, na qualidade de promitente compradora, que prometeu comprar aos Réus, os promitentes vendedores, a fracção autónoma designada pela letra “I” composta por cave, rés-do-chão e andar, a nona a contar desde o lado sudoeste, para habitação do Tipo T5, com entrada pela Travessa ..., nº ...3, com acesso directo desde o arruamento público a sudeste para um logradouro propriedade da fracção e um pátio de entrada na habitação, ao mesmo nível, integrada no prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Travessa ..., nº.s 1, 5, 9, ...3, ...7, ...1, ...5, ...9, ...3, ...7, ...1, ...5, ...9, ...3 e ...7, freguesia ..., Concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Paredes, sob a descrição nº ...01 da freguesia ..., e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...77, com o valor patrimonial de 92.477,10€, conforme a cláusula 1.ª que se dá aqui por integralmente por reproduzida.

2). O preço final de compra e venda acordado entre as partes foi de 235.000,00 €, conforme a cláusula 3.ª que se dá aqui por integralmente por reproduzida.

3). A título de sinal e princípio de pagamento, a Autora entregou, nessa data de 16.04.2021, aos Réus, através de transferência bancária, a quantia de 23.500,00 €, correspondente a 10% do valor total convencionado para a compra do imóvel, através de transferência bancária proveniente da conta com o IBAN  ...05 do “Banco 1...” para a conta dos Réus com o IBAN  ...51 do “Banco 2...” – cláusula 3ª.

4). O remanescente do preço de 211.500,00 € seria pago na data da outorga do contrato definitivo de compra e venda – escritura pública, através de cheque visado ou bancário, conforme a cláusula 3.ª que se dá aqui por integralmente por reproduzida.

5). Na cláusula 4.ª, n.º 1, ficou estabelecido que a escritura de compra e venda era outorgada até um prazo de 90 dias contados da data da assinatura do Contrato-Promessa tendo logo estabelecido que o prazo previsto no número anterior, podia ser objecto de uma prorrogação de mais 90 dias (nº 2 da cláusula 4ª) e que seria a promitente compradora, ora Autora, a marcar a escritura, avisando os promitentes vendedores - ora Réus, por carta registada com aviso de recepção ou outro meio passível de confirmação, com a antecedência mínima de 15 dias, nº 3 da cláusula 4.ª, conforme a cópia do contrato promessa que ora se junta para os devidos e legais efeitos como doc. 1.

6). Mais estabeleceram na cláusula quinta que titularam de incumprimento que: 1. Se a escritura não for realizada no prazo referido na cláusula anterior por facto imputável aos Primeiros outorgantes, a Segunda outorgante deverá notificá-los de novo, em data posterior, por carta registada com aviso de recepção com pelo menos 15 (quinze) dias de antecedência. 2. Se os Primeiros outorgantes não comparecerem na nova data referida no ponto anterior, constituir-se-ão no incumprimento definitivo, obrigando-se à devolução do sinal em dobro. 3. Decorrido que esteja o prazo referido na cláusula anterior sem se ter realizado a Escritura Pública e Definitiva por facto imputável à Segunda outorgante, os Primeiros outorgantes têm a faculdade de reverter para si a obrigação de notificá-la, em data posterior, por carta registada com aviso de recepção com pelo menos 15 (quinze) dias de antecedência, a comparecer no dia, hora e local determinado por estes, para a celebração do referido acto. 4. Se a Segunda Outorgante não comparecer à celebração do contrato de compra e venda, marcado nos termos do número anterior, constituir-se-á no incumprimento definitivo e culposo das respectivas obrigações contratuais, sujeitando-se à perda da quantia até então entregue, sem direito a qualquer indemnização ou reclamação “, conforme resulta do contrato junto como doc. 1 cujo teor se dá aqui por integralmente por reproduzido.

7). Era do conhecimento dos Réus que o valor remanescente do preço estava pendente duma casa da mãe da Autora, que ia ser vendida e do próprio apartamento da Autora.

8). Para a venda da casa da mãe da autora foi contratado um arquitecto conhecido da Agência Imobiliária que tratou de licenciar a casa da mãe da Autora, para a prometida venda.

9). Por este motivo, em 16 de Julho de 2021, a Autora e os Réus subscreveram um Aditamento ao contrato promessa de 16 de Abril de 2021, onde estabeleceram na cláusula 2.ª, uma prorrogação de mais 90 dias, até ao dia 4 de Outubro de 2021, para a realização da escritura definitiva de compra e venda, mantendo-se válidas e inalteradas as restantes cláusulas, conforme Aditamento junto como documento nº. 2 que se dá integralmente por reproduzido.

10). Por carta datada de 31.01.2022, mas registada em 02.02.2022 e recebida a 07/02/2022, os Réus comunicaram à Autora que “vimos pela presente resolver o contrato-promessa de compra e venda da fracção autónoma designada pela letra “I”, inscrita na matriz predial urbana da freguesia ..., sob o artigo ...77 que foi celebrado entre nós e V.Ex.as a 16 de Abril de 2021”.

11). Que o prazo tinha terminado no passado mês de Outubro de 2021 e para concluir que “Assim porque não foi celebrada a escritura e nem sequer marcada, como deveria ter ocorrido dentro do dito prazo, comunicamos a resolução do referido contrato", conforme cópia da referida carta que se junta e dá por integralmente reproduzida como doc. 3.

12). Os Réus, na qualidade de vendedores, assinaram um contrato promessa em 18.02.2022, tendo recebido de sinal a quantia de 24.500,00 €.

13). Em resposta, a Autora, no dia 09.02.2022, comunicava aos Réus que por meio da missiva por estes enviada em 21.01.2022, não estavam cumpridas as condições para considerar o contrato promessa resolvido e, por isso, considerava-o não resolvido, tendo em vista a manutenção da promessa, conforme a cópia da carta ora junta como doc. 4, que ora se dá por reproduzida para os devidos e legais efeitos.

14). Na mesma carta, a Autora informou os Réus que, caso fosse vontade destes resolver o contrato promessa, estaria disponível para um acordo.

15). Porque não houve qualquer resposta por parte dos Réus, é enviada pela Autora nova carta, datada de 08.03.2022, onde notifica os Réus que poderiam solucionar a questão se lhe fosse devolvido em singelo o sinal por ela pago, ou seja 23.500,00 €, no prazo de 10 dias, conforme a cópia da carta junta como documento nº. 5 e dá por reproduzido.

16). No dia 11.03.2022, os Réus acusam o recebimento da carta previamente enviada pela Autora do dia 8 de Março, informando-a de que consideravam o contrato promessa celebrado “definitivamente resolvido por manifesto incumprimento da Autora, e que por isso entendem nada dever à promitente adquirente” e, como tal, “nada é devolvido pelos mesmos a título de devolução do sinal", conforme a cópia da carta junta como documento nº. 6 e dá por reproduzido.

17). A Autora ainda ripostou por carta registada datada de 21.03.2022, referindo, mais uma vez, que não havia incumprido definitivamente o contrato, e que, uma vez que era iniciativa dos Réus a resolução do contrato, deveriam estes devolver-lhe o sinal pago no valor de 23.500,00 €, sob pena de recorrer aos meios judiciais, conforme a cópia da carta junta como documento nº. 7 e dá por reproduzido.

18). Mas, recebe a Autora nova carta datada de 25.03.2022, mas registada em 28.03.2022, desta vez endereçada pelo Mandatário dos Réus, Ex.mo Sr. Dr. EE, invocando que em 31.01.2022, por carta registada com aviso de recepção os seus constituintes resolveram o contrato promessa de compra e venda do imóvel, "fundando-se no manifesto incumprimento por parte de V.Ex.a".

Da produção de prova resultaram provados os seguintes factos:

19). A autora e os Réus, na qualidade de outorgantes estabeleceram, consensualmente, que condições constituiriam o incumprimento definitivo e a perda do sinal ou devolução em dobro.

20). Apesar dos esforços da Autora, até 14.10.2021, ainda não tinha conseguido as vendas referidas, que lhe permitiriam pagar o remanescente do preço aos Réus.

21). O imóvel objecto do contrato promessa foi vendido pelos Réus, por escritura outorgada em 11.04.2022, pelo valor de 240.500,00 €, por um valor ainda superior em 5.500,00 € àquele que tinham acordado com a Autora, conforme se pode ver da cópia da escritura de compra e venda junta como documento nº. 9 para os devidos e legais efeitos.

22). A Autora informou a agência mediadora "A... Lda", com sede na Rua ..., ..., ..., ... que, por sua vez, informou os Réus do atraso na venda do imóvel da mãe.

Contestação:

23). A prorrogação do prazo para a realização do contrato prometido ocorreu a pedido da Autora e no seu exclusivo interesse pois alegou que o seu pai tinha falecido e que a sua mãe já não queria vender a sua casa, sendo essa uma das condições para que a autora pudesse comprar aquela fracção.

24). Os Réus foram aguardando a realização da escritura de compra e venda, mesmo depois de esgotado o prazo de prorrogação concedido no aditamento, que terminava a 14 de outubro de 2021 e esperaram mais de dois meses, até ao fim do ano de 2021.

25). E, nessas circunstâncias mantiveram contacto com a imobiliária, que a pedido da Autora foi tentando também encontrar outro interessado na cessão de posição contratual.

26). Sucede que decorrido o prazo concedido, a Autora não marcou a escritura de compra e venda, nem antes nem depois do dia 14 de Outubro.

27). Os Réus voltaram a colocar à venda o imóvel nessa mesma imobiliária, que tinha angariado a sua cliente (a Autora).

28). No contrato-promessa celebrado não previa a possibilidade de cessão de posição contratual.

29). E a sociedade de mediação imobiliária iniciou de imediato a procurar novo cliente.

30). Em 9 de junho de 2021, a Ré mulher perguntou por mensagem escrita ao representante da dita imobiliária (DD), na sequência da comunicação da Autora se “A outra senhora já assinou o papel para por a venda a casa novamente?”

31). Tendo o DD respondido “Sim

32). Ao que a Ré mulher perguntou “não tenho de ficar com cópia disso??” e que o dito DD respondeu “É um e-mail a dar essa autorização”, conforme teor do documento 1 – print das mensagens trocadas entre a Ré mulher e o Sr. DD.

33). O DD iniciou novamente o agendamento de visitas à fracção dos Réus, com outros interessados, agendando reuniões e abrindo as suas portas, tendo a Ré mulher comunicado que tinha outro cliente interessado designadamente nas seguintes datas como consta do print das mensagens trocadas entre a Ré mulher e o DD:

- no dia 11 de junho de 2021;

- no dia 16 de junho de 2021;

- no dia 21 de junho de 2021;

- no dia 28 de junho de 2021;

- no dia 5 de julho de 2021;

- no dia 6 de julho de 2021.

34). Durante o período de prorrogação do prazo do contrato, o DD, continuou a procurar novos interessados na aquisição da fracção dos Réus e que assumisse a posição contratual da Autora e tal ocorreu a pedido desta.

35). O DD marcou com a Ré mulher uma nova visita à fracção no dia 5 de Agosto de 2021 que ocorreu no dia seguinte e voltou a marcar visitas ao imóvel dos Réus durante o mês de Setembro de 2021, com o conhecimento e a pedido da Autora.

36). O DD confirmou com a Ré mulher que o contrato-promessa tinha como prazo limite o dia 14 de outubro, como se verifica pela mensagem escrita que enviou à Ré mulher datada do dia 7 de outubro de 2021.

37). E o DD, depois de ter ocorrido o termo do prazo de prorrogação solicitado pela Autora continuou a marcar visitas ao imóvel, tendo marcado uma visita para o dia seguinte.

38). Em 28 de janeiro de 2022, o mesmo DD comunicou por escrito com a Ré mulher a disse-lhe: “o meu compromisso é tentar arranjar alguém para substituir a outra cliente e não cobrar nada por isso.”

39). O contrato-promessa que os Réus e Autora celebraram tinha prazo máximo previsto para a realização do contrato prometido.

40). Foi a imobiliária que tratou da celebração do primitivo contrato, do aditamento e da sua cessação.

III. 2. E julgou não provados os seguintes factos:

“Todos os demais factos que se mostrem conclusivos, contrários aos supracitados, nomeadamente:

Da petição inicial: 20; 21; 22; 23; 24, 25; 26; 27; 29, 31; 33; 34; 35; 36; 37; 38; 39; 40; 41; 42; 43; 44.

Da contestação Ré: 1, 10; 11; 12; 13; 14; 15; 16; 17; 21; 22; 24; 25; 26; 27; 29; 30; 31; 32; 34; 35; 39; 40; 41; 43; 44; 49; 61; 69; 70; 71; 73; 74; 75; 76; 77; 78; 81; 82; ; 83; 85; 86; 96; 100; 101; 102; 103; 104; 105; 106; 107; 108; 109; 110; 111; 112; 113; 114.

Resposta: 6º: 6; 7; 14; 16; 20; 21; 22”.

IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

1. Nota prévia.

Dispõe o n.º 1 do artigo 639.º do Código de Processo Civil: “o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”.

De acordo com o preceito citado, as alegações de recurso distinguem-se em corpo das alegações e conclusões.

No primeiro, o recorrente expõe os fundamentos ou argumentos através dos quais procura convencer o tribunal de recurso da sua razão; nas segundas, sintetiza as concretas questões que pretende que o tribunal de recurso aprecie e o sentido com que as deverá decidir.

Esclarece, a propósito, o acórdão desta Relação, de 27.01.2020[1]: “...como resulta do disposto no citado artigo 639º, n.º 1 do CPC, quando o apelante interpõe recurso de uma decisão jurisdicional passível de apelação fica automaticamente vinculado à observância de dois ónus, se pretender prosseguir com a impugnação de forma válida e regular.

O primeiro é o denominado ónus de alegação, no cumprimento do qual se espera que o apelante analise e critique a decisão recorrida, imputando as deficiências ou erros, sejam de facto e ou de direito, que, na sua perspectiva, enferma essa decisão, argumentando e postulando as razões em que se ancora para divergir em relação à decisão proferida.

O ónus de alegação cumpre-se, assim, através da exposição circunstanciada das razões de facto [incluindo, a eventual impugnação da decisão de facto proferida pelo tribunal recorrido] e de direito da divergência do apelante em face do julgado.

Trata-se, pois, de o recorrente explicitar, de forma mais ou menos desenvolvida, os motivos da sua impugnação da decisão, explicitando as razões por que entende que a decisão recorrida é errada ou injusta, através de argumentação sobre os factos, o resultado da prova, a interpretação e a aplicação do direito, para além de especificar o objectivo que visa alcançar com o recurso.

O segundo ónus, denominado de ónus de concisão ou de conclusão, traduz-se na necessidade de finalizar as alegações recursivas com a formulação sintética de conclusões, em que resuma ou condense os fundamentos pelos quais pretende que o tribunal ad quem modifique ou revogue a decisão proferida pelo tribunal a quo”.

Impõe, assim, a lei que o recorrente finde as alegações de recurso com as respectivas conclusões, onde, de forma sintética, identifique as questões que devam ser apreciadas pela instância de recurso e que sirvam de fundamento ao pedido de alteração, revogação ou de anulação da decisão.

Como explica o acórdão da Relação de Guimarães de 29.06.2017[2], “Concluir significa, ao cabo de um percurso analítico-argumentativo criteriosamente orientado e validado por um raciocínio lógico, extrair deste, em proposições sintéticas e resumidas, a essência dos fundamentos de uma tese.

A tese de um recorrente que se não conforma com certa decisão judicial há-de ser a da anulação, modificação ou revogação.

Os fundamentos hão-de assentar nas razões, factualmente sustentadas e juridicamente consequentes, substanciadoras da sua invalidade ou erro.

Para discorrer sobre estas, servem as alegações. Para expor aquelas, as conclusões”.

As conclusões destinam-se a sintetizar os argumentos do recurso, a identificar as questões a apreciar e as razões que servem de suporte à decisão pretendida. Delimitando as conclusões o objecto do recurso, é através delas que a parte contrária é alertada para as questões suscitadas pelo recorrente – assegurando-lhe, desta forma, a possibilidade de um efectivo exercício do contraditório – e o tribunal de recurso fica plenamente elucidado quanto às mesmas questões e os argumentos utilizados para fundamentar a decisão recursivamente reclamada, procurando-se assim evitar que alguns escapem na exposição das alegações, necessariamente mais extensa, mais pormenorizada, mais dialéctica, mais rica em aspectos instrumentais, secundários, puramente acessórios ou complementares.

Como destaca o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09.07.2015[3], “A lei exige que o recorrente condense em conclusões os fundamentos da revogação, modificação ou anulação da decisão.

Rigorosamente, as conclusões devem corresponder aos fundamentos que justificam a alteração ou a anulação da decisão recorrida, traduzidos na enunciação de verdadeiras questões de direito (ou de facto), sem que jamais se possam confundir com os argumentos de ordem jurisprudencial ou doutrinário apresentados no sector da motivação.
As conclusões exercem a importante função de delimitação do objecto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art. 635º, nº 3, devendo corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que se pretende obter do Tribunal Superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo. Incluindo, na parte final, aquilo que o recorrente efectivamente pretende obter (revogação, anulação ou modificação da decisão recorrida), as conclusões das alegações devem respeitar na sua essência cada uma das als. do nº 2, integrando-se as respostas a tais premissas essenciais no encadeamento lógico da decisão pretendida”.

E mais recentemente, defende o acórdão desta Relação de 10.07.2024[4]:

“I - Em consonância com o regime plasmado na lei adjetiva, as conclusões das alegações correspondem às ilações ou deduções lógicas terminais de um raciocínio argumentativo, propositivo e persuasivo, em que o alegante procura demonstrar a consistência das razões que invoca contra a decisão recorrida.

II - Porque são o resultado e não o desenvolvimento do raciocínio alegatório, as conclusões têm, pois, necessária e legalmente de ser curtas, claras e objetivas [...].

Segundo o acórdão do STJ de 16.12.2020[5], “O ónus de formulação de conclusões recursórias tem em vista uma clara delimitação do objeto do recurso mediante enunciação concisa das questões suscitadas e dos seus fundamentos, expurgadas da respetiva argumentação discursiva que deve constar do corpo das alegações, em ordem a melhor pautar o exercício do contraditório, por banda da parte recorrida, e a permitir ao tribunal de recurso uma adequada e enxuta enunciação das questões a resolver”.

Ignorando a função das conclusões recursórias e, sobretudo, o imperativo traçado pelo n.º 1 do artigo 639.º do Código de Processo Civil, os Réus/Recorrentes apresentam, sob a designação de “conclusões”, um extenso rol de argumentos, que nem se coíbe de reproduzir parte da sentença que impugnam e de transcrever parte das declarações da Autora/Recorrida prestadas em audiência.

Não podendo os Réus/Recorrentes desconhecer o significado da expressão “sintética” usada no n.º 1 do artigo 639.º do Código de Processo Civil, a prolixidade do texto que formulam como forma de conclusões revela desrespeito não só pelo determinado no citado normativo, como ainda pela função do tribunal de recurso e pela parte contrária, a quem, com tal atitude, é sobremaneira dificultado o exercício do contraditório.

Permite a lei que, nestas circunstâncias, seja formulado convite ao aperfeiçoamento das conclusões, de forma a que o recorrente as apresente de forma adequada à exigência formal do citado dispositivo legal.

Porém, a prática judiciária também vem ensinando que de tal iniciativa resultam respostas pouco satisfatórias e de duvidosa eficácia.

Opta-se, por isso, pela não formulação de tal convite.

2. Da nulidade da sentença.

Imputam os Réus/Recorrentes à sentença que recursivamente impugnam vício de nulidade que enquadram na previsão do artigo 615.º, n.º, b) do Código de Processo Civil.

Sobre a nulidade da sentença – aplicável aos despachos ex vi do artigo 613.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, dispõe o n.º 1 do artigo 615.º do mesmo diploma legal:

“ É nula a sentença quando:

a) Não contenha a assinatura do juiz;

b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;

c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;

d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;

e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.

A nulidade da sentença - ou de despacho - constitui vício intrínseco da decisão, desde que ocorra alguma das circunstâncias taxativamente previstas no artigo 615.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, que, pela sua gravidade, comprometem a sentença ou o despacho qua tale.

Como o n.º 1 do artigo 668.º do anterior diploma, também o n.º 1 do artigo 615.º do actual Código de Processo Civil contém uma enumeração taxativa das causas de nulidade da sentença[6], nelas não se inserindo o designado erro de julgamento, que apenas pode ser atacado por via de recurso, quando o mesmo for legalmente admissível[7].

Como já se anotou, o erro de julgamento não se confunde com a invalidade da sentença: a sentença é nula quando ocorra algum dos circunstancialismos taxativamente previsto no citado artigo 615.º, n.º 1; ocorrendo erro de julgamento, de facto ou de direito, esse erro não colide com a validade da sentença, podendo, todavia, a parte prejudicada com esse erro impugná-la pela via do recurso, quando preenchidos os necessários pressupostos processuais.

A falta de fundamentação, de facto ou de direito, constitui circunstância tipificada na alínea b) do referido normativo que, a ocorrer, dita a nulidade da sentença afectada por essa omissão.

É pela fundamentação que a decisão se revela um acto não arbitrário, traduzindo a concretização da vontade abstracta da lei ao caso particular submetido à apreciação jurisdicional.

É por ela que as partes tomam conhecimento das razões que ditaram o desfecho da acção e das pretensões que nela formularam, permitindo-lhes ajuizar da viabilidade de recurso aos meios processuais de impugnação.

Compreende-se, assim, que a falta de fundamentação da decisão, quando seja devida, gere a sua nulidade. Tal falta, quer se trate de um mero despacho ou de uma sentença, há de revelar-se por ininteligibilidade do discurso decisório, por ausência total de explicação da razão por que se decide de determinada maneira

Como esclarecem Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora[8], a propósito do vício previsto no citado dispositivo, “para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta embora esta se possa referir aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito.

[…] Para que haja falta de fundamentação, como causa de nulidade da sentença, torna-se necessário que o juiz não concretize os factos que considera provados e coloca na base da decisão. Relativamente aos fundamentos de direito, dois pontos importa salientar:

Por um lado, o julgador não tem que analisar todas as razões jurídicas que cada uma das partes invoque em abono das suas posições, embora lhe incumba resolver todas as questões suscitadas pelas partes: a fundamentação da sentença contenta-se com a indicação das razões jurídicas que servem de apoio a solução adoptada pelo julgador.

Por outro lado, não é indispensável, conquanto seja de toda a conveniência, que na sentença se especifiquem as disposições legais que fundamentam a decisão; essencial é que se mencionem os princípios, as regras, as normas em que a sentença se apoia[9].

O dever de fundamentação da sentença basta-se com a simples indicação das razões de facto e de Direito que servem de apoio à solução adotada pelo julgador.

Como é entendimento pacífico na doutrina e na jurisprudência, só a falta absoluta de fundamentação penaliza com nulidade a sentença afectada por tal omissão[10]. Como já o Prof. Alberto dos Reis[11] esclarecia, “o que a lei considera causa de nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou a mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz a nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto”.

Note-se que “da falta absoluta de motivação jurídica ou factual - única que a lei considera como causa de nulidade —há que distinguir a fundamentação errada, pois esta, contendendo apenas com o valor lógico da sentença, sujeita-a a alteração ou revogação em recurso, mas não produz nulidade[12].

Uma errada, insuficiente ou incompleta fundamentação não afecta o valor legal da decisão, não gerando a sua nulidade: “o vício de insuficiência da decisão de facto é equacionável com base no artigo 662.º, n.º 2, alínea c), parte final, do CPC, sendo de conhecimento oficioso e suscetível de implicar a ampliação daquela decisão, pelo que a sua eventual invocação pelo apelante não está sujeita aos requisitos impugnativos prescritos no artigo 640.º, n.º 1, do mesmo Código, os quais só condicionam a admissibilidade da impugnação, com fundamento em erro de julgamento, dos juízos probatórios concretamente formulados”[13].

Do vício de nulidade, por falta de fundamentação, não padece a sentença recorrida, na qual estão mencionadas razões que motivam a decisão relativa à matéria de facto, com indicação das provas atendidas, assim como os fundamentos jurídicos que suportam a decisão de mérito da acção.

Improcedem, pois, as alegações recursórias dos apelantes quanto à invocada nulidade da sentença.

3. Reapreciação da matéria de facto.

Pugnam os recorrentes/réus pela alteração da decisão relativa à matéria de facto, imputando erro de julgamento na parte em que julgou não provados os artigos 10 a 15, 21, 22, 24, 25, 26, 27, 29 a 31, 35, 40, 43, 44, 49, 61, 69, 70, 71, 73 a 78, 81 a 83, 85, 86, 96, 100 a 104 da contestação, que, no seu entender, devem ser considerados provados, convocando, como meio probatório que impunha decisão diversa da proferida, o depoimento de parte da autora/recorrida prestado em audiência.

Satisfatoriamente cumpridos os ónus impostos pelo artigo 640.º do Código de Processo Civil, importa proceder à reapreciação da matéria de facto na parte em que a respectiva decisão foi impugnada.

A pretensão dos Recorrentes/Réus de que seja dado como provado o alegado nos artigos 21.º, 74.º, 78.º, 101.º, 102.º, 103.º equivaleria, a obter provimento, que não fossem aditados factos aos já elencados como provados, mas antes afirmações conclusivas e matéria de direito, o que, consabidamente, não é legalmente admissível.

Outros dos factos que os recorrentes pretendem que sejam incluídos nos factos dados como provados mais não são do que meras repetições do que deles já consta como definitivamente assentes (designadamente, artigos 22.º, 40.º, 44.º, 61.º, 76.º, 77.º da contestação).

Quanto à restante factualidade pela qual os recorrentes pugnam que seja considerada provada – como já antes se precisou, os mesmos apenas convocam o depoimento da Autora prestado em audiência de julgamento para sustentar a reclamada alteração.

Ora, desse depoimento, em parte transcrito pelos recorrentes, não resulta minimamente confirmado o quadro factual que eles pretendem ver adicionado aos factos já considerados provados. Com efeito:

A Autora justifica o “alongamento” do prazo inicialmente estabelecido no contrato promessa com a necessidade de legalização da casa da mãe, que procedimento que estava a decorrer, questão que, segundo afirma, foi falada no acto de assinatura do referido contrato.

Acrescenta a mesma ainda que na altura não tinha o dinheiro necessário ao pagamento do remanescente do preço acordado, mas que com a venda da sua casa e a da mãe teria esse dinheiro, sem necessidade de recorrer a empréstimo, precisando que o prolongamento do prazo foi por causa da licença de habitabilidade, precisando que não marcou a escritura porque a referida licença de habitabilidade ainda não estava pronta, o que só veio a ocorrer em Janeiro.

Nega que alguma vez tenha desistido do negócio, que alguma vez tenha informado os Réus que não tinha condições, designadamente de natureza económica, para celebrar o contrato.

Esclarece, finalmente, que se os Réus tivessem pressa e quisessem por a casa à venda ou arranjassem um possível comprador, devolvendo-lhe o sinal, a mesma aceitaria.

É, assim, manifesta a falta de suporte probatório que permita a alteração da decisão da matéria de facto nos termos reclamados pelos recorrentes, não deixando, também aqui, de ser particularmente ilustrativa a postura processual dos mesmos ao arrimarem-se exclusivamente no depoimento da Autora para fundamentarem o alegado erro de julgamento, pedindo a alteração do decidido com base num meio de prova que, quanto à questão nuclear em debate, afirma precisamente o contrário da tese por eles sustentada.

Improcede, como tal, nesta parte, o recurso, mantendo-se sem alterações a decisão relativa à matéria de facto.
4. Do mérito da sentença – Direito.

Tal como resulta comprovado nos autos, no dia 6 de Abril de 2021 foi celebrado um contrato promessa de compra e venda entre a Autora, na qualidade de promitente compradora, que prometeu comprar aos Réus, os promitentes vendedores, pelo preço total de € 235.000,00, a fracção autónoma designada pela letra “I” composta por cave, rés-do-chão e andar, a nona a contar desde o lado sudoeste, para habitação do Tipo T5, com entrada pela Travessa ..., nº ...3, com acesso directo desde o arruamento público a sudeste para um logradouro propriedade da fracção e um pátio de entrada na habitação, ao mesmo nível, integrada no prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Travessa ..., nº.s 1, 5, 9, ...3, ...7, ...1, ...5, ...9, ...3, ...7, ...1, ...5, ...9, ...3 e ...7, freguesia ..., Concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Paredes, sob a descrição nº ...01 da freguesia ..., e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...77, com o valor patrimonial de 92.477,10 €.

A título de sinal e princípio de pagamento, a Autora entregou, nessa data de 16.04.2021, aos Réus, através de transferência bancária, a quantia de 23.500,00 €, correspondente a 10% do valor total convencionado para a compra do imóvel, sendo que o remanescente do preço de € 211.500,00 seria pago na data da escritura pública de compra e venda, através de cheque visado ou bancário.

Na cláusula 4.ª, n.º 1 do dito contrato ficou estabelecido que a escritura de compra e venda era outorgada até um prazo de 90 dias contados da data da assinatura do Contrato-Promessa tendo logo estabelecido que o prazo previsto no número anterior, podia ser objecto de uma prorrogação de mais 90 dias (nº 2 da cláusula 4ª) e que seria a promitente compradora a marcar a escritura, avisando os promitentes vendedores por carta registada com aviso de recepção ou outro meio passível de confirmação, com a antecedência mínima de 15 dias, conforme nº 3 da cláusula 4.ª.
Por contrato-promessa entende-se a convenção pela qual ambas as partes, ou apenas uma delas, se obrigam a celebrar determinado contrato.
Os contraentes obrigam-se, assim, a celebrar, oportunamente, o contrato que, de momento, não podem ou não querem celebrar.
Ou seja, o contrato promessa “é um acordo preliminar que tem por objecto uma convenção futura, o contrato prometido, mas em si é uma convenção completa que se distingue do contrato subsequente. Reveste a natureza de contrato obrigacional, ainda que diversa seja a índole do contrato definitivo. Gera uma obrigação de prestação de facto, que tem apenas de particular consistir na emissão de uma declaração negocial. Trata-se de um facto de contrahendo”[14].
Está-se, deste modo, perante uma obrigação que tem por objecto uma prestação de facto positivo, um “facere”: duas pessoas obrigam-se a fazer, mais tarde, um certo contrato, diferindo, não já o cumprimento deste, mas a sua própria celebração[15].
Como ensina Calvão da Silva[16], “o cumprimento da obrigação de estipular o contrato definitivo é um acto devido, como o é o cumprimento do comum das obrigações, e a vontade das partes, relativamente à conclusão do contrato definitivo, manifestada no contrato-promessa, está formada na base de uma avaliação, que consideram já definitiva, dos seus interesses e conveniências”.
Nas palavras de Coviello[17], “trata-se de um negócio de segurança, destinado a conferir garantias às partes quanto à relação substancial em vista. A sua função consiste em vincular as partes a uma prestação futura, isto é, em as obrigar à conclusão de um contrato futuro, sendo certo que o seu objecto é um facere que consiste em assentir a prestar-se a tudo o mais necessário para dar vida ao contrato tido em vista”[18].
O contrato-promessa - como qualquer outro contrato - deve ser pontualmente cumprido, isto é, o solvens deve efectuá-lo ponto por ponto e cumprir a obrigação nos precisos termos em que esta foi constituída. A recusa de outorga do contrato prometido constitui incumprimento do contrato-promessa, acto ilícito civil, motivo por que o promitente incorre em responsabilidade.
De facto, o contrato-promessa, envolve obrigações para ambas as partes, e assenta num conjunto de circunstâncias sem as quais não teria sido celebrado ou não o teria sido nos termos em que o foi. Através dos contratos e das cláusulas acordadas, as partes estabelecem quais os interesses, de uma e de outra, que vão prevalecer e quais os que serão sacrificados, de uma forma que, tendencialmente, equilibra os sacrifícios de interesses de cada uma delas com as vantagens que vai receber por força do contrato.
Com vista a assegurar a correta satisfação dos interesses dos contratantes, impõe a lei civil que os contratos sejam negociados (art.º 227º, nº 1, do Código Civil), integrados (art.º 239º do Código Civil), alterados (art.º 437º do Código Civil) e cumpridos (art.º 762º, nº 2, do Código Civil) de harmonia com os ditames da boa fé, sendo ainda certo que, se estes forem violados de modo manifesto, podem vir a tornar ilegítimo o exercício do direito assegurado contratualmente (art.º 334º do Código Civil). A ideia de procedimento de boa fé está ligada a fidelidade, lealdade, honestidade e confiança no cumprimento dos negócios jurídicos e impõe às partes, quer nas negociações preliminares, quer na formulação das cláusulas definitivas, quer no cumprimento das obrigações (quer em relação ao devedor, quer em relação ao credor), que ajam sem embuste, nem dolo, para que os interesses de todas elas tenham a equilibrada solução prevista por cada uma delas e subjacente ao contrato.
Assim sendo, as partes devem obediência ao princípio da pontualidade, o qual, na opinião da maioria dos autores, exprime a regra basilar de que o cumprimento deve ajustar-se inteiramente à prestação, isto é, de que o solvens deve efectuá-la em todos os seus sentidos, nos precisos termos em que foi constituída[19].
O n.º 1 do artigo 410.º do Código Civil consagra o princípio da equiparação ou princípio da correspondência, segundo o qual, por regra, ao contrato-promessa é aplicável o regime (requisitos e efeitos) do contrato prometido, sendo-lhe geralmente aplicáveis as regras gerais dos contratos e as regras específicas do contrato prometido[20].
O devedor cumpre quando realiza a prestação a que se vinculou. Tratando-se contrato-promessa, o devedor cumpre essa obrigação através da emissão da declaração de vontade correspondente ao contrato prometido.
Em caso de incumprimento do contrato-promessa, a lei concede ao contraente não faltoso dois meios distintos de reacção:
- A execução específica do contrato, nos termos do artigo 830.º do Código Civil;
- A resolução do contrato.
A primeira ocorre em situações de simples mora: apesar do atraso no cumprimento, a parte não incumpridora mantém interesse na prestação, sendo tal interesse avaliado de acordo com critérios objectivos, sendo que a parte incorre em mora quando, por causa que lhe seja imputável, não realiza no tempo devido a prestação, ainda possível, a que se vinculou[21].
A execução específica, que se traduz na possibilidade de uma parte obter sentença que produza os efeitos da declaração negocial em falta, desde que a tal não obste a natureza da obrigação assumida, pressupõe a inexistência de convenção em contrário, entendendo-se existir esta quando haja sinal ou quando tenha sido fixada pena para o não cumprimento, como se extrai do nº 2 do artigo 830º do Código Civil.
Segundo o artigo 441º do Código Civil, presume-se ter natureza de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador a título de antecipação do pagamento do preço, determinando o n.º 2 do mesmo dispositivo legal: “se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente a faculdade de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele a faculdade de exigir o dobro do que prestou, ou, se houver tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, o seu valor, ou o do direito a transmitir ou a constituir sobre ela, determinado objectivamente, à data do não cumprimento da promessa, com dedução do preço convencionado, devendo ainda ser-lhe restituído o sinal e a parte do preço que haja pago”.
A resolução do contrato por iniciativa do credor não se compadece com a simples mora, antes exigindo o incumprimento definitivo. Este deriva de uma situação de mora, ou atraso no cumprimento por uma das partes, consumando-se pela perda do interesse do credor na prestação, avaliada essa perda de interesse em termos objectivos e não na perspectiva dos interesses subjectivos do credor em causa, ou pela omissão de cumprimento pelo devedor em prazo razoável que lhe haja sido fixado e comunicado pelo credor – interpelação admonitória -, tudo como decorre dos artigos 801º e 808º do Código Civil.
Sendo de aplicar ao contrato promessa o regime geral do incumprimento, estabelece o artigo 808.º, n.º 1, do Código Civil, que “se o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação, ou esta não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor, considera-se para todos os efeitos não cumprida a obrigação”.
A perda do interesse na prestação é apreciada objectivamente (n.º 2 daquele preceito legal).
A mora - que traduz, não uma falta definitiva de realização da prestação debitória, mas um simples retardamento ou dilação no cumprimento da obrigação -, apenas constituirá o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor. O devedor só se pode considerar constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada em tempo devido[22] e fica, como tal, constituído depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir[23].
O citado artigo 808.º pressupõe a existência de uma situação de mora que se transforma ou converte em incumprimento definitivo, mediante, desde logo e além do mais, a perda (subsequente à mora) do interesse do credor, apreciada objetivamente.
Para constituir fundamento de resolução do contrato, o incumprimento culposo, equiparável à impossibilidade da prestação imputável ao devedor, tem de ser definitivo . Só na hipótese de inadimplemento definitivo se justifica a resolução do contrato promessa, com os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 442.º do Código Civil, designadamente a sanção da perda do sinal ou da restituição do sinal em dobro .
Como, desde há muito, vem sendo entendimento pacífico na doutrina e na jurisprudência, o incumprimento definitivo pode revelar-se por diversos meios:
a) - A impossibilidade da prestação, por destruição da coisa ou pela sua alienação a terceiro, sem qualquer reserva[24] ;
b) - Pelo decurso de prazo fixado contratualmente como absoluto ou improrrogável, o que equivale àquela perda de interesse;
c) - Pela recusa peremptória do devedor em cumprir, comunicada ao credor, não se justificando então a necessidade de nova interpelação ou de fixação de prazo suplementar; ou ainda
d) - Pela perda do interesse do credor na prestação, em consequência de mora do devedor ou a sua inexecução dentro do prazo razoável que lhe for fixado por aquele (interpelação admonitória - artigo 808.º, n.º 1, do Código Civil).
A interpelação admonitória traduz-se numa interpelação ao faltoso para, em prazo fixado, cumpra a obrigação omitida, sob pena de se considerar o seu não cumprimento como incumprimento definitivo.
A perda do interesse na prestação, a apreciar objectivamente, não se confunde com a fixação de um prazo razoável admonitório ao devedor para cumprir a sua prestação, sob pena de incumprimento definitivo. Esta recusa de cumprimento convive na referida norma legal como alternativa à perda do interesse, objectivamente apreciada; uma e outra constituem fundamentos autónomos de incumprimento definitivo.
O direito de ver resolvido o contrato, previsto nos artigos 432.º e seguintes do Código Civil, é um direito potestativo extintivo dependente de um fundamento que é “o facto do incumprimento ou a situação de inadimplência”. Daí que inexista direito de resolução sem o “juízo de inadimplemento”.
Quanto à resolução do contrato, a lei substantiva nacional optou por um sistema declarativo, o que significa que a resolução opera por simples declaração à parte a quem é direccionada, sem necessidade, por conseguinte, de intervenção constitutivo-condenatória do tribunal.
Ou seja: a resolução opera ope voluntatis e não ope judicis, como flui do artigo 436.º, nº 1 do Código Civil).
Por outro lado, a natureza potestativa da declaração de resolução confere-lhe características da unilateralidade recipienda, da irrevogabilidade, da incondicionalidade e da concretização dos respectivos fundamentos, tudo como decorre dos artigos 224.º, n.º 1, 1.ª parte e 230º, n.º 1 do mesmo diploma legal.
Finalmente, a declaração negocial que traduza a resolução do contrato não está sujeita a forma especial, ainda que o contrato que, por intermédio dela, se pretenda destruir, o esteja, podendo mesmo operar de forma tácita, nos termos do artigo 217.º do Código Civil.
No caso em apreço, convencionaram as partes no contrato promessa que entre si celebraram a 6 de Abril de 2021 que a escritura de compra e venda seria outorgada até um prazo de 90 dias contados da data da assinatura do mesmo contrato, tendo acordado que o referido prazo poderia ser objecto de uma prorrogação por mais 90 dias.
Em 16 de Julho de 2021, ou seja, no termo do prazo inicialmente previsto para a celebração da escritura de compra e venda do imóvel, Autora e Réus subscreveram um aditamento ao contrato promessa de 16 de Abril de 2021, onde estabeleceram, na cláusula 2.ª, uma prorrogação de mais 90 dias, até ao dia 4 de Outubro de 2021, para a realização da referida escritura.
A escritura não se realizou nem na data aprazada, nem posteriormente, nenhuma das partes tendo diligenciado pela sua marcação.
O prazo estabelecido para a celebração do contrato definitivo pode assumir distinta natureza.
Tratando-se de prazo essencial, final ou peremptório, o seu decurso determina de imediato o incumprimento definitivo do contrato. Quando o prazo não revele tal natureza, o seu esgotamento apenas conduz à constituição do devedor em mora, hipótese em que, como adiante se verá, esse retardamento poderá ser convertido em incumprimento definitivo por meio da fixação de um novo prazo admonitório ou com fundamento na perda objectiva de interesse do credor.
Como sustenta Ana Prata[25], “se o prazo essencial for objectivo, isto é, se se integrar caracterizadoramente na própria prestação, de tal modo que a realização desta fora do prazo já não pode ser considerada a mesma prestação, mas um aliud, o seu vencimento sem cumprimento desencadeia imediata impossibilidade de cumprimento. Se se tratar de prazo essencial subjectivo - quer expresso quer tácito -, depende da interpretação da convenção de atribuição de carácter essencial ao prazo a determinação dos efeitos do seu esgotamento sem que tenha havido cumprimento: pode ele significar o automático incumprimento definitivo da obrigação, caso em que se qualificará como absoluto, ou pode, constituindo para o credor o direito de resolução e de recusa da prestação, ser compatível com uma exigência de cumprimento tardio pelo credor, caso em que será qualificado como relativo”.
Explica, a propósito Calvão da Silva[26]: “Por vezes, as partes, no momento da celebração do contrato, determinam, expressa ou tacitamente, como essencial o termo fixado; outras vezes, a essencialidade do termo deriva da natureza ou modalidade da prestação, sendo inútil para o credor a sua tardia realização (...). Nestes casos, é objectiva a essencialidade do termo, transcorrido o qual a prestação se torna impossível; nos primeiros, a essencialidade é subjectiva. Na essencialidade subjectiva, a vontade das partes pode ser: 1º no sentido de ver no termo fixado o prazo-limite, improrrogável (termo subjectivo absoluto) para o adimplemento, findo o qual há incumprimento definitivo, fundamento imediato da resolução; 2° no sentido de o vencimento do termo conferir ao credor o direito de resolução, sem, contudo, significar renuncia ao direito de exigir o cumprimento retardado e possível indemnização moratória (termo subjectivo relativo) – hipótese-regra, a valer em caso de dúvida”.
Para Brandão Proença[27], “em regra, o prazo essencial não é «absolutamente fixo» (não há por parte dos promitentes um interesse temporalmente delimitado), mas apenas «relativamente fixo». Pode, no entanto, concluir-se pela essencialidade absoluta (em regra, subjectiva ou pacticia) ou, até, por uma «finalidade» essencial sempre que aos promitentes só interesse celebrar o contrato dentro do prazo fixado (normalmente o maior interessado será o promitente-comprador ou o promitente-arrendatário), por razões jurídicas (necessidade de serem observados outros prazos), materiais (carência absoluta do bem em causa ou do preço em dívida) ou quando certas circunstâncias coenvolventes o imponham (p.ex., caducidade do empréstimo bancário deferido, se a escritura de compra e venda não for realizada dentro de certa data)”.
Refere o acórdão do STJ de 14.04.2015[28]: “1) O contrato-promessa de compra e venda assume a natureza de negócio fixo, absoluto, quando as partes acordaram num prazo peremptório, improrrogável e determinante da celebração do negócio, para a outorga do contrato prometido (salvo se a essencialidade resultar da natureza ou da modalidade da prestação).
2) A cláusula a fixar o prazo essencial deve ser clara, inequívoca e explícita, sob pena do incumprimento do prazo se traduzir apenas em mora.
3) Havendo prazo fatal é dispensada a interpelação.
4) No negócio fixo não absoluto a translação da mora (incumprimento transitório) em incumprimento (definitivo) impõe uma interpelação admonitória, com fixação de um prazo suplementar cominatório (peremptório) para a outorga do contrato prometido”.
Consta da cláusula 5.ª do contrato promessa celebrado entre as partes:
“1. Se a escritura não for realizada no prazo referido na cláusula anterior por facto imputável aos Primeiros outorgantes, a Segunda outorgante deverá notificá-los de novo, em data posterior, por carta registada com aviso de recepção com pelo menos 15 (quinze) dias de antecedência.
2. Se os Primeiros outorgantes não comparecerem na nova data referida no ponto anterior, constituir-se-ão no incumprimento definitivo, obrigando-se à devolução do sinal em dobro.
3. Decorrido que esteja o prazo referido na cláusula anterior sem se ter realizado a Escritura Pública e Definitiva por facto imputável à Segunda outorgante, os Primeiros outorgantes têm a faculdade de reverter para si a obrigação de notificá-la, em data posterior, por carta registada com aviso de recepção com pelo menos 15 (quinze) dias de antecedência, a comparecer no dia, hora e local determinado por estes, para a celebração do referido acto.
4. Se a Segunda Outorgante não comparecer à celebração do contrato de compra e venda, marcado nos termos do número anterior, constituir-se-á no incumprimento definitivo e culposo das respectivas obrigações contratuais, sujeitando-se à perda da quantia até então entregue, sem direito a qualquer indemnização ou reclamação”.
Cabia à Autora, promitente compradora, marcar a escritura, avisando os promitentes vendedores - ora Réus, por carta registada com aviso de recepção ou outro meio passível de confirmação, com a antecedência mínima de 15 dias, nos termos do n.º 3 da cláusula 4.ª do contrato promessa.
A Autora não procedeu à marcação da escritura e, consequentemente, não avisou os Réus dessa marcação, como estava vinculada contratualmente.
Também os Réus, promitentes vendedores, perante a atitude omissiva da Autora, se abstiveram de providenciar pela marcação da escritura, avisando, por sua vez, a Autora, conforme previsto no n.º 3 da cláusula 5.ª.
Como igualmente não notificaram a Autora para, em prazo razoável fixado para o efeito, cumprir a obrigação em falta, sob pena de não o fazendo, se considerar a mesma definitivamente incumprida. É nisto que se traduz a designada interpelação admonitória.
Tal interpelação consiste numa declaração receptícia, composta de três elementos: a intimação para o cumprimento; fixação de um termo peremptório, com determinação de um prazo para o cumprimento; cominação (declaração admonitória) de que a obrigação se terá como definitivamente não cumprida se não ocorrer o cumprimento dentro daquele prazo.
No caso em análise, estando a Autora, promitente compradora, em mora relativamente à celebração do contrato prometido, tinham os Réus, promitentes vendedores, a faculdade de converter aquela mora debitoris em incumprimento definitivo. E verificado este, poderiam então proceder à resolução do contrato promessa, como acabaram por fazer por carta datada de 31.01.2022.
De facto, segundo entendimento largamente dominante na doutrina e na jurisprudência, a simples mora não autoriza o contraente fiel a, sem mais, proceder à resolução do contrato. A mora na prestação não confere direito à resolução do contrato sem que previamente se proceda à sua conversão em incumprimento definitivo. Com efeito, à semelhança do que ocorre com os demais contratos, também a resolução legal do contrato-promessa pressupõe uma situação de incumprimento stricto sensu que resultará da conversão de uma situação de mora através de uma das vias previstas no artigo 808.º do Código Civil.
De igual modo, a aplicação das sanções previstas no artigo 442.º do Código Civil depende da verificação do incumprimento definitivo do contrato-promessa, não bastando a simples mora[29]. Como precisa o acórdão do STJ de 19.09.2024[30], “A resolução do contrato-promessa e as sanções da perda do sinal ou da sua restituição em dobro só têm lugar, no entanto, em caso de incumprimento definitivo da promessa, que pode resultar da conversão da mora em incumprimento definitivo, por actuação do promitente comprador.”
Não tendo os Réus convertido a mora da Autora em incumprimento definitivo por meio de interpelação admonitória e inexistindo factos objectivos que permitam revelar perda de interesse na prestação por parte dos Réus[31], a resolução unilateral por estes comunicada à Autora por carta de 31.01.2022 mostra-se infundada e extemporânea.
Essa declaração unilateral de resolução, a que a Autora, de resto, expressamente se opôs, não teve efeito operante, subsistindo, como tal, o contrato-promessa celebrado entre as partes.
E não havendo então incumprimento definitivo do contrato por parte da Autora, mas apenas uma situação de mora ou retardamento na prestação a que estava vinculada, não convertida naquele incumprimento definitivo, não existe fundamento para a perda do sinal por ela prestado[32].
Em contrapartida, achando-se em vigor o contrato-promessa celebrado entre Autora e Réus - porquanto, como se viu, sendo inoperante a sua resolução, este não se extinguiu -, estes voltaram a colocar o imóvel à venda na mesma imobiliária que angariara a Autora, como cliente, acabando por concretizar a sua venda a um terceiro, por escritura outorgada em 11.04.2022, pelo valor de € 240.500,00 – cfr. pontos 21.º e 27.º dos factos provados.
Como já anteriormente afirmado, pode o incumprimento definitivo do contrato promessa revelar-se por diversos meios, nomeadamente por impossibilidade da prestação em virtude da venda do imóvel a terceiro.
O que significa, retornando ao que nos autos se discute, que, tendo os Réus procedido à venda do imóvel objecto do contrato promessa a terceiros, tal atitude determinou o incumprimento definitivo do contrato por impossibilidade da prestação.
O que, por sua vez, poderia fazer supor a aplicação da sanção prevista na 2.ª parte do n.º 2 do artigo 442.º do Código Civil, ou seja, a restituição do sinal em dobro.
O referido normativo pressupõe, porém, que o incumprimento definitivo se deva a culpa (seja imputável) do contraente que não cumpriu a prestação ou que tornou esta impossível.
Ora, no caso, embora se comprovado que os Réus procederam à venda do imóvel a terceiros, tornando, assim, impossível a celebração do contrato prometido no contrato promessa que celebraram com a Autora, também resultou demonstrado que, ainda no período de prorrogação do contrato promessa, o DD continuou a procurar novos interessados na aquisição da fracção dos Réus e que assumisse a posição contratual da Autora e tal ocorreu a pedido desta (cfr. ponto 34.º dos factos provados), e ainda que, esgotado o prazo para a celebração da escritura de compra e venda do imóvel (14 de Outubro de 2021), os Réus “mantiveram contacto com a imobiliária, que a pedido da Autora foi tentando também encontrar outro interessado na cessão de posição contratual (cfr. ponto 25.º dos factos provados).
Ou seja: se é certo que os Réus venderam a fracção a terceiro, tornando impossível a prestação a que se vincularam, não é menos certo que não o fizeram à revelia da Autora, ou contra a vontade desta, a qual, de resto, revelou interesse nesse desfecho, pedindo à imobiliária que procurasse novos interessados para a aquisição da fracção objecto do contrato promessa, com cujas dificuldades de cumprimento já se confrontava.
Neste concreto contexto, não se pode imputar aos Réus culpa pelo incumprimento definitivo do contrato promessa, ao procederam à venda do imóvel que haviam prometido vender à Autora, pois a venda a terceiro não afrontou os interesses desta, que manifestou vontade em que a imobiliária procurasse quem pudesse assumir a sua posição contratual, embora o contrato não previsse a possibilidade de cessão da posição contratual.
E não existindo culpa dos Réus pelo incumprimento definitivo do contrato promessa, não pode os mesmos ser sancionados com a restituição do sinal em dobro, nos termos fixados pelo n.º 2 do artigo 442.º, nem a Autora pode reclamar a devolução em dobro do sinal prestado, pois que, perante o circunstancialismo relatado, isso corresponderia a um verdadeiro abuso de direito.
Se a impossibilidade superveniente não proceder de culpa do devedor, extingue-se o vínculo contratual, com direito de a parte fiel reaver o que prestou.
Com efeito, como decorre do artigo 790.º, n.º 1 do Código Civil, a obrigação extingue-se quando a prestação se torna impossível por causa não imputável ao devedor.
Por outro lado, “quando no contrato bilateral uma das prestações se torne impossível, fica o credor desobrigado da contraprestação e tem o direito, se já a tiver realizado, de exigir a sua restituição nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa” – artigo 795.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
Assim, não procedendo a impossibilidade superveniente, determinante do incumprimento definitivo do contrato promessa, de culpa dos Réus, a extinção de tal contrato não ocorreu por facto que a estes possa ser imputável. Nestas circunstâncias, tem a Autora direito a reaver o que prestou, segundo as regras do enriquecimento sem causa, ou seja, a quantia de € 23.500,00 entregue aos Réus, acrescida dos juros legais, nos termos decididos na sentença recorrida.
5. Da imputada litigância de má fé da Autora.
Alegam os Réus/Recorrentes que “A recorrida alegou factos falsos cuja falta de fundamento não pode desconhecer – e não desconhecia – e deduziu uma pretensão cuja falta de fundamento não desconhece, alterando a verdade dos factos, e omitindo factos relevantes para a boa decisão da causa, tentando iludir o tribunal, de modo a conseguir um objetivo ilegal, tendo litigado com manifesta má-fé processual, devendo ser condenada como litigante de má-fé” – alínea W das conclusões.
De acordo com o n.º 1 do artigo 542.º do Código de Processo Civil, “tendo litigado de má fé, a parte é condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir”.
Por sua vez, o n.º 2 do mesmo dispositivo legal delimita o conceito de litigante de má fé nos seguintes termos: “diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
a)Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b)Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d)Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão”.
Os pressupostos da litigância de má fé encontram-se, assim, regulados no artigo 542.º do Código de Processo Civil, podendo distinguir-se aqueles que têm natureza subjectiva daqueles que têm natureza objectiva. Há litigância de má fé quando estão simultaneamente reunidos pressupostos das duas mencionadas naturezas.
Relativamente aos pressupostos subjectivos da litigância de má fé, exigiam tradicionalmente a actuação dolosa de uma das partes para o seu preenchimento e para justificar a condenação a esse título.
Depois de 1 de Janeiro de 1997 - e como corolário da maior relevância atribuída aos deveres de cooperação aquando das alterações introduzidas pela Reforma de 1995/1996 - os pressupostos subjectivos da litigância de má fé alargaram-se, passando a abarcar também a actuação a título de negligência grosseira.
Como se afirma no Acórdão da Relação do Porto de 15.12.2010[33], “o regime instituído após a última reforma do direito processual civil traduz uma substancial ampliação do dever de boa fé processual, alargando-se o tipo de comportamentos que podem integrar má fé processual, quer substancial, quer instrumental, tanto na vertente subjectiva como na objectiva. A condenação por litigância de má fé pode fundar-se, além de, numa situação de dolo, em erro grosseiro ou culpa grave”.
Quanto aos pressupostos objectivos da condenação por litigância de má fé, é de distinguir a má fé substancial da má fé instrumental: existe má fé substancial se "o litigante usa de dolo ou má fé para obter decisão de mérito que não corresponde à verdade e à justiça" e má fé instrumental se "a parte procura sobretudo cansar e moer o seu adversário, ou somente pelo espírito de fazer mal, ou na expectativa condenável de o desmoralizar, de o enfraquecer, de o levar a uma transacção injusta"[34].
Como elucidam Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto[35], “é corrente distinguir má fé material (ou substancial) e má fé instrumental. A primeira relaciona-se com o mérito da causa: a parte, não tendo razão, actua no sentido de conseguir uma decisão injusta ou realizar um objectivo que se afasta da função processual. A segunda abstrai da razão que a parte possa ter quanto ao mérito da causa, qualificando o comportamento processualmente assumido em si mesmo”.
A litigância de má fé pode levar à aplicação de duas sanções: a multa e a indemnização.
Dará lugar à aplicação de uma multa processual, que pode ser decidida oficiosamente ou a requerimento da contraparte.
Tal multa deve ser fixada pelo juiz, ponderando, designadamente, os efeitos sancionatórios por ela prosseguidos em função da violação da lei na regular tramitação do processo, a situação económica do sujeito passivo e as repercussões da sanção no seu património.
Por outro lado, a litigância de má fé pode também conduzir à condenação no pagamento de uma indemnização.
A indemnização atribuída pode assumir duas modalidades distintas.
Numa primeira modalidade, usualmente designada por indemnização simples, quem for condenado como litigante de má fé deverá liquidar à contraparte o valor das despesas originadas pela litigância de má fé, incluindo os honorários dos advogados e dos técnicos; e
Numa segunda modalidade, normalmente designada por indemnização agravada, a indemnização deverá abarcar essas despesas e os demais prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência directa ou indirecta da má fé[36].
Tanto num caso como noutro só serão indemnizáveis as despesas e os prejuízos em que se tenha incorrido em virtude de um comportamento gravemente negligente ou doloso da contraparte.
O juiz deve optar entre as duas modalidades de indemnização referidas com base na gravidade da infracção perpetrada, sendo irrelevante nesta sede a condição económica do litigante de má fé.
Quando haja negligência grosseira, o juiz deve atribuir a indemnização simples e quando se demonstre que houve dolo, o juiz deve optar pela indemnização agravada[37].
A litigância de má fé não constitui uma expressão de responsabilidade civil, visando a reparação de danos, ilícita e culposamente causados a terceiros através de certas actuações processuais, tratando-se antes de um mecanismo sancionatório específico, de âmbito limitado, visando assegurar o uso regular e leal dos mecanismos processuais postos ao dispor dos que pretendam exercer o direito de acção que a lei a todos garante.
A litigância de má fé visa punir a instrumentalização do direito processual em diversas vertentes, quando os litigantes pretendam alcançar um objectivo considerado ilegítimo pelo direito substantivo, quando a sua actuação constitua um meio de impedir a descoberta da verdade, como forma de obstruir a actividade da máquina judiciária, com a colocação de obstáculos ou com a promoção de expedientes meramente dilatórios, ou com o objectivo de impedir o trânsito em julgado da decisão e, deste modo, prejudicar a parte contrária na tutela ou na realização do direito substantivo que através da decisão lhe seja reconhecido[38].
A responsabilidade pela conduta processual deve sempre ser objecto de análise casuística, ponderando-se o princípio da culpa na actuação dos litigantes, não podendo essa ponderação obedecer a critérios rígidos e puramente formais, sob pena de com isso criar nos interessados temor no recurso aos tribunais para fazerem valer os direitos de que se julgam titulares, sem esquecer que a incerteza da lei, a dificuldade de apurar os factos e de os interpretar, podem até levar consciências honestas a afirmarem um direito de que não são titulares ou a impugnar uma obrigação que devessem cumprir.[39]
Como esclarece Pedro Albuquerque[40], “a proibição de litigância de má fé apresenta-se, assim, como um instituto destinado a assegurar a moralidade e eficácia processual, porquanto com ela se reforça a soberania dos tribunais, o respeito pelas suas decisões e o prestígio da justiça. O dolo ou má fé processual não vicia vontades privadas nem ofende meramente interesses particulares das partes envolvidas. Também não se circunscreve a uma violação sem mais do dever geral de actuar de boa fé. A virtualidade específica da má fé processual é outra diversa e mais grave: a de transformar a irregularidade processual em erro ou irregularidade judicial”.
Uma lide temerária e a ousadia de uma construção jurídica manifestamente errada não revelam, por si só, que o seu autor delas se serviu como simples cortina de fumo da inanidade da sua posição processual. Aconselha-se, por isso, o uso de critérios de prudência na avaliação do juízo sobre a má fé processual, apenas devendo ser sancionada a actuação processual da parte, como litigante de má fé, quando, em concreto, surja com clamorosa evidência a natureza dolosa ou gravemente negligente dessa actuação, pois como refere o acórdão desta Relação de 7.6.2011[41], “não obstante as alterações introduzidas ao art.º 456° do Código de Processo Civil pelo Decreto-Lei n° 180/96, de 25/09, que visaram alargar o conceito de litigância de má fé e o âmbito da sua aplicação, sobretudo como reflexo do princípio da cooperação e dos inerentes deveres impostos às partes (art.º 266° do C. P. Civil[42]) permanece válido o entendimento de que a condenação por litigância de má fé tem por pressuposto uma actuação consciente das partes contrárias à verdade material e/ou obstrutiva da realização da justiça”. Demonstrar-se realidade diferente da alegada por uma das partes não significa necessariamente que esta tenha agido com má fé. É necessário que a sua conduta recaia num dos modos de actuação como tal tipificados pelo artigo 542.º do Código de Processo Civil.
Ou seja: a não prova dos factos fundamentadores do pedido do Autor ou dos factos invocados pelo Réu como defesa não pressupõem, por si só, que o Autor ou o Réu tenham agido com má fé[43]. Como se escreveu no Acórdão do STJ, de 28.05.2009[44], citando o Acórdão do mesmo STJ, de 11.12.03, “…não é, por exemplo, por se não ter provado a versão dos factos alegada pela parte e se ter provado a versão inversa, apresentada pela parte contrária, que se justifica, sem mais, a condenação da primeira como litigante de má-fé.
A verdade revelada no processo é a verdade do convencimento do juiz, que sendo muito, não atinge, porém a certeza das verdades reveladas. Com efeito, a verdade judicial é uma verdade relativa, não só porque resultante de um juízo em si mesmo passível de erro, mas também porque assente em provas, como a testemunhal, cuja falibilidade constitui um conhecido dado psico-sociológico. Por outro lado, a ousadia de uma construção jurídica julgada manifestamente errada não revela por si só, que o seu autor a apresentou como simples cortina de fumo da inanidade da sua posição processual, de autor ou réu”.
Não concretizam os recorrentes quais os factos que foram falseados pela Autora, e quais os que omitiu, relevantes para a boa decisão da causa.
Também este tribunal não logrou descortiná-los.
E claramente não deduziu a Autora pretensão cuja falta de fundamento não pudesse desconhecer. E tanto assim é que vê judicialmente reconhecida, ainda que apenas em parte, essa pretensão.
Não se vê, assim, fundamento para a reclamada condenação da Autora por litigância de má fé.
6. Do recurso subordinado da Autora/recorrida.
A Autora/Recorrida interpôs recurso subordinado pretendendo que a sentença seja alterada, condenando-se os Réus a pagar-lhe a quantia de € 47.000,00, correspondente à restituição do sinal em dobro.
Como fundamento da pretensão deduzida apenas alegam que, não tendo os Réus interpelado admonitoriamente a Autora, a mora não se converteu em incumprimento definitivo, pelo que a resolução do contrato em 31.01.2022 foi intempestiva e infundada.
A questão da falta de interpelação admonitória e consequências jurídicas dela resultantes foi já objecto de tratamento detalhado no conhecimento do objecto do recurso interposto pelos Réus, pelo que nos abstemos de aqui repetir os fundamentos, para os quais se remete, que conduziram à conclusão de que a Autora tem apenas direito a reaver o que prestou, ou seja, a quantia de € 23.500,00 que entregou aos Réus aquando da celebração do contrato promessa, nos termos do enriquecimento sem causa, sem direito à indemnização sancionatória prevista no artigo 442.º, n.º 2 do Código Civil.
Improcede, como tal, o recurso subordinado da Autora.

Em conclusão: improcedem ambos os recursos, confirmando-se, ainda que com distintos fundamentos, a sentença recorrida.

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Síntese conclusiva:

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Nestes termos, acordam os juízes desta Relação, em julgar improcedente o recurso dos apelantes BB e CC, bem como o recurso subordinado da recorrida AA, confirmando a sentença recorrida.

Custas das apelações: a cargo dos respectivos recorrentes – artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
Notifique.

Porto, 22.05.2025

Acórdão processado informaticamente e revisto pela 1.ª signatária.

Judite Pires

Ana Vieira

Aristides Rodrigues de Almeida

_____________________________
[1] Processo n.º 2817/18.0T8PNF.P1, www.dgsi.pt.
[2] Processo n.º 413/15.3T8VRL.G1, www.dgsi.pt.
[3] Processo 818/07.3TBAMD.L1.S1, www.dgsi.pt.
[4] Processo n.º 527/21.0T8MCN.P1, www.dgsi.pt.
[5] Processo n.º 2817/18.0T8PNF.P1.S1, www.dgsi.pt.
[6] Cf. Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil anotado”, vol. V, pág. 137.
[7] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, 2ª ed., pág. 686.
[8] “Manual de Processo Civil”, 2ª ed., pág. 687 e seguintes.
[9] Cf. em idêntico sentido, Acórdão STJ de 19/03/02, “Rev. nº 537/02-2ª sec., Sumários, 03/02”; Acórdão Relação de Coimbra de 16/5/2000, www.dgsi.pt; Acórdão STJ de 13/01/00, “Sumários, 37-34”; Acórdão Relação Lisboa, de 01/07/99, BMJ 489-396.
[10] Cf., entre outros, Pais do Amaral, Direito Processual Civil”, 7ª ed., pág. 390, e os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 27.4.2004 e de 10.4.2008, o acórdão da Relação de Lisboa de 17.1.1999, BMJ 489/396, e ainda os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 13.1.2000, de 26.2.2004, de 12.5.2005 e de 10.7.2008, o primeiro in Sumários, 37º, pág. 34 e, os restantes, em www.dgsi.pt.
[11] “Código de Processo Civil anotado”, vol. 5º, pág. 140.
[12] Anselmo de Castro, “Direito Processual Civil Declaratório”, vol. III, pág. 141.
[13] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22.03.2018, processo 290/12.6TCFUN.L1.S1, www.dgsi.pt.
[14] Galvão Telles, “Direito das Obrigações”, 3.ª ed., 76
[15] Abel Delgado, “Do contrato-promessa”, 1985, 14
[16] “Sinal e Contrato Promessa”, Coimbra, 1987, pág. 181.
[17] “Contrato Preliminar, Enciclopédia Giuridica Italiana, Vol. III, parte III, 68)
[18] Cf. Antunes Varela, “Obrigações”, 2ª ed., I, 242.
[19] Cfr. Antunes Varela, «Das Obrigações em Geral», 692; Galvão Telles, «Direito das Obrigações», 106; M. Andrade, «Teoria Geral das Obrigações», 265.
[20] Cfr., neste sentido, J. Calvão da Silva, ob. cit., pág. 29.
[21] Artigo 804º, nº2 do Código Civil.
[22] Artigo 804.º, n.º 2 do Código Civil.
[23] Artigo 805.º, n.º 1 do Código Civil.
[24] Artigo 801.º, n.º 1 do Código Civil.
[25] O Contrato-Promessa e o seu Regime Civil, pág. 637.
[26] Sinal e Contrato-Promessa, pág. 94.
[27] Do Incumprimento do Contrato-Promessa Bilateral, 1996, pág. 112.
[28] Processo n.º 2733/10.4TBLLE.E1.S1, www.dgsi.pt.
[29] Cfr. Galvão Telles, Direito das Obrigações, 5ª edição, pág. 95; Calvão da Silva, Sinal e contrato- promessa, 4.ª edição, pág. 85 e seguintes; Brandão Proença, Do incumprimento do contrato-promessa bilateral, BFDC, 2.ª edição, pág. 125 e seguintes, Ana Prata, O Contrato-Promessa e o seu regime civil, pág. 780, Almeida Costa, Contrato-Promessa, pág. 54, Januário Gomes, Tema de Contrato Promessa, 1990, AAFDL, pág. 55, entre outros.
[30] Processo n.º 885/22.0T8VCT.G1.S1, www.dgsi.pt.                 
[31] A perda de interesse é, de resto, desmentida pela factualidade fixada nos pontos 24.º e 25.º dos factos dados como provados.
[32] Só podendo os promitentes vendedores reclamar indemnização pelos prejuízos que o atraso no cumprimento da prestação lhes tenha causado, indemnização que, no caso, não reclamaram.
[33] Processo nº 225/08.0TBVLC-A.P1, www.dgsi.pt.
[34] Cfr. Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil anotado”, vol. II, págs. 263-264.
[35] “Código de Processo Civil anotado”, Coimbra Editora, vol. 2º, 2ª ed., págs. 220, 221.
[36] Artigo 543º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil.
[37] Cfr. Abrantes Geraldes, “Temas Judiciários”, vol. I, pág. 335.
[38] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.9.2013, Colectânea de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, T. III, pág. 71.
[39] Castanheira Neves, ob. e vol. cit., pág. 263.
[40] “Responsabilidade Processual por Litigância de Má Fé, Abuso de Direito e Responsabilidade Civil em Virtude de Actos Praticados no Processo”, Almedina, pág. 56. 
[41] Proc. n.º 73/07.5TBBGC.P1,  www.dgsi.pt.  
[42] Então em vigor.
[43] Cfr. Acórdão da Relação do Porto, 13.03.2008, processo nº 0831101, www.dgsi.pt.
[44] Processo nº 09B0681, www.dgsi.pt.