I. Vem sendo entendimento pacífico e sedimentado que o recurso em matéria de pena, não é uma oportunidade para o tribunal ad quem fazer um novo juízo sobre a decisão em revista, sendo antes um meio de corrigir o que de menos próprio foi decidido pelo Tribunal recorrido e que sobreleve de todo espetro decisório.
II. Em sede de medida da pena, o recurso não deixa de reter o paradigma de remédio jurídico, apontando para que a intervenção do tribunal de recurso, se deve cingir à reparação de qualquer desrespeito, pelo tribunal recorrido, dos princípios e regularidade que definem e demarcam as operações de concretização da pena na moldura abstrata determinada na lei.
III. Ante retrato em que relativamente a determinados crimes, há a possibilidade de substituir penas de prisão impostas por pena de multa, concorrendo com outros crimes não o permitindo, o juízo a fazer, sobre a preferência pela aplicação de uma pena de multa, em detrimento da pena privativa da liberdade, é completamente diferente.
IV. Estando o arguido inevitavelmente sujeito a uma condenação em pena de prisão há que fazer uma avaliação e ponderação em globo e não sectorial.
V. Situações ofensivas do património, da segurança de circulação rodoviária - sem qualquer consequência para terceiros - e realização ou administração da justiça, sendo bens de significado e importância a reter, em termos comunitários não assumem a carga / peso que outros e, nessa medida, um posicionamento de exaustivo rigor e severidade.
VI. Ante agente que não sofreu quaisquer condenações, que admitiu a prática dos factos, contribuiu de forma relevante para a descoberta da verdade material, onde emerge o arrependimento da conduta tida, um jovem de 29 anos de idade que exibe hábitos de trabalho, estando social e familiarmente inserido, crê-se que ainda é possível elaborar um juízo de prognose favorável e concluir que a simples censura do facto e que a ameaça da pena será o bastante para o cercear duma eventual tentativa de nova prática delituosa.
I – Relatório
1.No processo nº 1365/21.6... da Comarca de Coimbra – Juízo Central Criminal de ... – Juiz ..., figurando como arguidos,
AA, filho de BB e de CC, natural do Brasil, de nacionalidade brasileira, nascido a .../.../1994, casado, empregado de mesa, titular do Passaporte n.º ......90, com morada na Rua ..., atualmente detido, em prisão preventiva à ordem dos presentes autos, no EP 1;
DD, filho de EE e de FF, natural da freguesia do ..., no concelho de ..., nascido a .../.../1995, solteiro, técnico de eletrodomésticos, titular do Cartão do Cidadão n.º ........ . .X7, com morada na Rua ...;
GG, filho de HH e de II, natural da freguesia de ..., concelho de ..., nascido a .../.../1979, solteiro, estucador, titular do Cartão do Cidadão n.º ........ . .Y6, com morada na Rua da ..., atualmente detido, em prisão preventiva à ordem do inquérito nº 267/24.9..., no Ep 2; e
JJ, filha de KK e de LL, natural da freguesia de ..., no concelho do ..., nascida a .../.../1983, solteira, cabeleireira, titular do Cartão do Cidadão n.º ........ . .W9, com morada na Rua da ..., realizado o julgamento, foi proferido Acórdão em 31 de janeiro de 2025, onde se decidiu, no que a esta demanda concerne:
a - Absolver o arguido DD da prática, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de furto qualificado, um previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nº 2, alínea e), do Código Penal (NUIPC 102/24.8...);
b - Condenar o arguido DD pela prática, em concurso real, de:
- um crime de furto qualificado, em autoria material e na forma consumada, previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nº 2, alínea e), por referência ao artigo 202º, alínea d), todos do CPenal (NUIPC 1949/23.8...), na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão;
- um crime de furto simples, em autoria material e na forma consumada, um previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nºs 2, alínea e) e 4, do CPenal (NUIPC 102/24.8...), na pena de 10 (dez) meses de prisão;
- um crime de furto qualificado, em coautoria material e na forma consumada, previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nº 2, alínea e), por referência ao artigo 202º, alínea d), todos do CPenal (NUIPC 109/24.5...), na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão;
- um crime de furto qualificado, em autoria material e na forma consumada, previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nº 2, alínea e), por referência ao artigo 202º, alínea e), todos do CPenal (NUIPC 229/24.6...), na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão;
- um crime de furto qualificado, em autoria material e na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 22º, 23º, 203º, nº 1 e 204º, nº 2, alínea e), do Código Penal, por remissão do artigo 202º, alínea e), todos do CPenal (NUIPC 237/24.7...), na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão;
- um crime de furto simples, em coautoria material e na forma consumada, previsto e punido pelo artigo 203º, nº 1, do CPenal (NUIPC 251/24.2...), na pena de 1 (um) ano de prisão;
- um crime de furto qualificado, em coautoria material e na forma consumada, previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nº 2, alínea e), por referência ao artigo 202º, alínea e), todos do CPenal (NUIPC 259/24.8...), na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão;
- um crime de furto qualificado, em autoria material e na forma consumada, previsto e punido pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nº 2, alínea e), por referência ao artigo 202º, alínea d), todos do CPenal (NUIPC 258/24.0...), na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão;
- um crime de condução de veículo sem habilitação legal, em autoria material e na forma consumada, previsto e punido pelo artigo 3º, nºs 1 e 2, do Decreto-lei n.º 2/98 de 03/01 (NIUPC 251/24.2...), na pena de 3 (três) meses de prisão;
- um crime de falsas declarações, em coautoria material e na forma consumada, previsto e punido pelo artigo 348º A, nºs 1 e 2, do CPenal (NIUPC 251/24.2...), na pena de 10 (dez) meses de prisão.
Em cúmulo jurídico condenar o arguido DD na pena única de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de prisão.
*
Mais se determinou:
- Condenar os arguidos (…) e DD no pagamento solidário ao Estado da quantia total de €4.352,53 (quatro mil, trezentos e cinquenta e dois euros e cinquenta e três cêntimos), nos termos do artigo 110º, n.ºs 1, alínea b) e 4, do CPenal.
- Condenar o arguido DD no pagamento ao Estado da quantia total de €7.831,18 (sete mil, oitocentos e trinta e um euros e dezoito cêntimos), nos termos do artigo 110º, n.ºs 1, alínea b) e 4, do CPenal.
2.Inconformado com o decidido, o arguido DD (doravante DD) interpôs recurso per saltum para este Alto Tribunal e na sequência da motivação que enuncia, apresenta as seguintes conclusões: (transcrição)
1. O Arguido, ora Recorrente, tendo sido condenado por douto acórdão, em cúmulo jurídico, na pena única de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de prisão, e não se conformando com a mesma, vem expor a V.Exas. as suas razões de discordância.
2. Nesse conformidade, não vem o recorrente em sede de recurso, pôr em causa a factualidade que lhe é imputada até porque nunca a contestou nestes autos, contudo, não pode de todo concordar - por razões de justeza, adequação e proporcionalidade - com a medida e excessividade da pena que lhe foi aplicada.
3. Desde logo, por entender que não foram respeitados os fundamentos legais e filosofias subjacentes aos preceitos legais contidos nos artigos. 40º, 70º, 71º e 77º do Código Penal.
4. Em bom rigor, o circunstancialismo atinente ao arguido, faz com que o mesmo considere que não se ponderou correctamente e adequadamente na escolha, no critério e na determinação da pena única de prisão que lhe foi aplicada, bem como no cúmulo jurídico operado, porquanto, entende que, seria merecedor de uma avaliação e prognose futura, muito mais positiva, favorável e consentânea com a sua realidade pessoal, profissional e social.
5. Desde logo, por ser manifesto que o Tribunal a quo, na escolha da medida e determinação das penas em causa respeitante ao ora recorrente, não considerou e sopesou devidamente e adequadamente todos os elementos dados como provados no douto acórdão, os quais abonam largamente a seu favor e constituem claramente atenuantes, forçando assim a que a condenação fosse em medida mais baixa.
6. Senão vejamos, a grande maioria dos factos dados como provados no que respeita à autoria e execução dos ilícitos perpetrados pelo Arguido DD, resultam das suas próprias declarações em sede de interrogatório perante Magistrado do Ministério Público em 16/04/2024.
7. Ajudando e colaborando de modo inquestionável e essencial na descoberta da verdade nestes autos, mas também demonstrando inequivocamente, um arrependimento sincero e uma autocensura à sua conduta delituosa.
8. O Arguido não só é primário, como os factos ilícitos em causa ocorreram no espaço temporal de 1 (um) mês e meio e nada mais, pelo que não se pode classificar de comportamento reiterado.
9. Inclusive, parece-nos clarividente, que a sua participação nestes factos, resultou de alguma permeabilidade e vulnerabilidade a influências de terceiras pessoas (situação que lamenta profundamente), mormente aos outros arguidos, os quais apresentam um percurso de vida delituosa completamente distinta da do Arguido DD, sendo duas realidades completamente distintas e díspares, pelo que não poderão obviamente ser encaradas e tratadas da mesma maneira.
10.Acresce que, os bens jurídicos atingidos foram sempre bens materiais e monetários, nunca tendo havido qualquer acto de cariz violento ou atentatório contra a integridade física de terceiros, até porque, os factos em causa ocorreram sempre em habitações em construção e sem residentes.
11.Sendo também de realçar, que todos os danos e prejuízos provocados pela conduta por parte do Arguido DD, são passíveis de serem ressarcidos e reparados financeiramente, situação essa que irá totalmente ao encontro do arrependimento demonstrado e postura apresentada pelo mesmo após a prática dos factos.
12.Pelo que, denota-se que o Arguido por sempre ter trabalhado, reúne as condições necessárias para cumprir com tal responsabilidade e obrigação, caso lhe venha a ser dada essa possibilidade, sendo essa a sua firme intenção.
13.Trata-se de um jovem perfeitamente inserido familiarmente, socialmente e profissionalmente. Contribuindo e ajudando, para com as despesas do seu agregado familiar, de quem tem tido sempre todo o apoio necessário, sendo inclusive a sua maior preocupação, a sua avó paterna perante a pena que pende sobre si.
14.Assim, parece-nos, completamente injusto e desajustado que alguém com apenas 29 anos, primário, inserido a todos os níveis, mas que infelizmente prevaricou durante um mês e meio na sua vida atentando unicamente contra bens jurídicos de natureza material; mas que deu provas sérias de arrependimento e que pode de alguma forma reparar os danos causados, seja sancionado com uma privação da liberdade tão brutal na sua vida!
15.É pois manifesto, que na situação em apreço, as penas aplicadas extravasam claramente as necessidades de prevenção geral e de prevenção especial, porquanto não existe peremptóriamente o perigo para a sociedade de o Arguido voltar a delinquir novamente.
16.Colidindo deste modo, com as próprias finalidades das penas, as quais visam não só a protecção de bens jurídicos, mas acima de tudo, visam a reintegração do agente na sociedade, não podendo em caso algum a pena ultrapassar a medida da culpa - art. 40º do Código Penal.
17.Ao que acresce, nessa senda, que o julgador no que concerne ao critério da escolha da pena, se for aplicável em alternativa ao crime em causa uma pena privativa ou uma pena não privativa da liberdade, deve dar sempre preferência à segunda, sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição - art. 70º do Código Penal.
18.Do mesmo modo, deve o julgador na determinação da medida dessa pena, realizar uma ponderação dentro dos limites definidos na lei, não só em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, mas também atendendo a todas as circunstâncias, que não fazendo parte do crime, depõem a favor ou contra o agente - art.º 71 do Código Penal.
19.Deve pois, a Lei Penal, visar sempre acima de tudo, a ressocialização do agente de modo a evitar reincidências.
20.Pelo que, o douto acórdão errou ao não ponderar correctamente os princípios subjacentes ao critério da escolha e determinação das penas aplicadas - consagrados no Código Penal nos artigos 40º, 70º e 71º - uma vez que as circunstâncias atinentes ao caso em apreço e ao seu agente, diminuem significativamente o seu grau de culpabilidade, bem como as necessidades de prevenção geral e especial.
21.Nesse sentido, deverão as penas de prisão aplicadas aos 2 (DOIS) CRIMES DE FURTO SIMPLES, ao CRIME DE CONDUÇÃO DE VEÍCULO SEM HABILITAÇÃO LEGAL e ao CRIME DE FALSAS DECLARAÇÕES, serem substituídas por PENAS DE MULTA, cujo montante deverá fixar-se num patamar médio dentro dos seus limites e tendo em consideração as condições socio-económicas do Arguido.
22.No que respeita ao cúmulo jurídico das penas, nos termos do art. 77º do Código Penal, a relação dos factos ocorridos entre si, bem como a própria personalidade do arguido, deverá ser apreciada e ponderada em conjunto, devendo ter-se em conta, sobretudo, as razões e exigências da prevenção especial e o princípio da culpa do agente.
23.Sendo fundamental nessa avaliação da personalidade unitária, apurar se o conjunto de factos revelam uma tendência (carreira) criminosa do agente, nomeadamente a uma propensão para a prática de crimes, ou tão-só, a uma pluriocasionalidade que não radica na sua personalidade; e do mesmo modo, tentar discernir qual o efeito previsível da pena sobre o seu comportamento futuro – exigências de prevenção especial.
24.Sendo nosso entendimento, que na personalidade do arguido não radica de todo qualquer tendência ou propensão criminosa para continuar com eventuais práticas ilícitas ou desviantes. Antes pelo contrário, todo o seu percurso de vida, exceptuando este curto período temporal, foi sempre pautado pelo respeito pela Lei.
25.Pelo que, em face do supra exposto, se entende que operando o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido nos termos e limites previstos no art. 77º do Código Penal, a sua condenação numa pena única deverá ser a mais adequada, proporcional e justa ao caso em apreço.
26.Neste sentido, entendemos que o cúmulo a operar relativo às PENAS DE PRISÃO dos 5 (CINCO) CRIMES DE FURTO QUALIFICADO E 1 (UM) CRIME DE FURTO QUALIFICADO, deverá ser fixado numa pena única de 4 (anos) de prisão.
27.Devendo o cúmulo das PENAS DE MULTA aplicadas aos 2 (DOIS) CRIMES DE FURTO SIMPLES, ao CRIME DE CONDUÇÃO DE VEÍCULO SEM HABILITAÇÃO LEGAL e ao CRIME DE FALSAS DECLARAÇÕES, ser fixado num patamar médio dentro dos seus limites e tendo em consideração as condições socio-económicas do Arguido.
28.E como corolário e não descurando as necessidades de prevenção e finalidades da punição, DEVERÁ A PENA ÚNICA DE 4 (QUATRO) ANOS DE PRISÃO, SER SUSPENSA na sua execução por igual período, condicionada à obrigação de em igual período ou inferior, o Arguido DD proceder ao pagamento dos valores ao Estado em que foi condenado.
29.Sendo essa a reacção penal por excelência ao caso sub judice, satisfazendo desse modo, simultaneamente, as necessidades de reprovação e prevenção do crime.
3.O Digno Ministério Público, junto do Tribunal de 1ª Instância, respondendo, e pugnando pela improcedência do recurso, vem apresentar as seguintes conclusões: (transcrição)
1.ª – Não merecem qualquer reparo as penas aplicadas ao arguido pelos crimes que cometeu, quer no que concerne às penas individualmente consideradas (natureza e quantum), quer quanto à pena única encontrada resultante do cúmulo jurídico, na exata medida em que foi fixada;
2.ª – Contra o Recorrente militam severamente o elevado grau de ilicitude dos factos, o seu censurável modo de execução, a sua conduta que decorreu no período compreendido entre 30/12/2023 a 16/02/2024, tendo cometido um total de dez crimes, sete dos quais de furto qualificado, no interior de residências, umas vezes sozinho e outras em conjugação de esforços com outro indivíduo, o que aumenta a eficácia na execução dos vários ilícitos, bem como dois crimes de furto simples, um de condução de veículo sem habilitação legal e um crime de falsas declarações, a sua atuação com dolo direto de intensidade acentuada, os muito reprováveis sentimentos manifestados no cometimento do crime, as fortes exigências de prevenção geral e as não despiciendas necessidades de prevenção especial.
3.ª - Tendo presente o número de ilícitos praticados, de onde emerge que não estamos perante uma situação pontual, mas sim um comportamento reiterado, afigura-se-nos que a pena de multa não se mostra adequada, nem suficiente, no que respeita aos crimes de furto simples, de condução de veículo sem habilitação legal e falsas declarações.
4.ª - Não menos importante, o grau elevado de culpa, in caso, a mesma molda-se pelo dolo direto pois o arguido agiu livre e conscientemente, representando os factos que preenchem os tipos de crime, e atuando com a intenção de os realizar (artigo 14.º, n.º 1, do Código Penal).
5.ª – No caso em apreço sobressaem, por um lado as prementes exigências de prevenção geral, decorrentes da proliferação de comportamentos idênticos aos assumidos pelo arguido, atento o elevado número de ilícitos contra o património, estradais, bem como os crimes contra a obstrução da justiça, havendo necessidade de reprimir de forma eficaz estas condutas e de consciencializar para o desvalor das mesmas.
6.ª - O reconhecimento destes fenómenos, o número de ilícitos de idêntica tipologia que tem ocorrido nesta comarca, bem como o alarme social que provocam, fazem sobressair a necessidade de acautelar as finalidades de prevenção geral na determinação das penas como garantia da validade das normas e de confiança da comunidade, mas, do mesmo passo, não podem ser descuradas as finalidades de reinserção dentro do modelo de prevenção especial.
7.ª – Na determinação da medida concreta da pena o tribunal fez adequada aplicação dos critérios contemplados no artº 71.º n.ºs 1, e 2, do C.P. e ponderou judiciosamente as finalidades das penas consagradas no artº 40.º nº 1, do mesmo código, pelo que a pena de cinco anos e quatro meses de prisão deverá ser mantida;
8.ª – Para o caso de a pena de prisão vir a ser reduzida para medida não superior a cinco anos (hipótese que não se admite e apenas por dever de ofício se equaciona), não deverá haver lugar à suspensão da respectiva execução;
9.ª – Com efeito, a ausência de antecedentes criminais não pode ser erigida em critério exclusivo ou preponderante do recurso ao instituto da suspensão da execução da pena, por traduzir tão-só o comportamento conforme ao direito exigido e esperado de qualquer cidadão;
10.ª – Perante as circunstâncias dos crimes cometidos e a personalidade assim revelada – e na falta de qualquer outra circunstância que possa valorada em benefício do Recorrente para além da sua primariedade – é de concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão nunca satisfariam adequada nem suficientemente as prementes exigências de protecção dos bens jurídicos violados e as sensíveis necessidades de reintegração do agente na sociedade.
4. Subidos os autos a este Supremo Tribunal de Justiça, o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que alude o artigo 416º do CPPenal, emitiu parecer aderindo ao posicionamento tomado pelo Digno Ministério Público em 1ª instância, e alinhando na improcedência do recurso interposto pelo arguido, opina: (transcrição)1
(…)
No mesmo sentido vai o presente parecer e pelos motivos constantes naquela resposta que entendemos muito completa e fundamentada, apontando de forma muito assertiva os motivos que justificaram a aplicação das penas parcelares (incluindo a opção pelas de prisão quanto aos crimes relativamente aos quais o recorrente pretende alteração da condenação para multa), pouco mais havendo a acrescentar ao que ali foi referido.
Assim, apenas se acrescenta que, no referente à escolha de penas de prisão para crimes que abstratamente poderiam ser puníveis com pena de multa, nada há a censurar à decisão recorrida, pois que, tal como referido por este Supremo Tribunal de Justiça no processo 122/20.1PAVPV.L1.S1 (acórdão de 29.02.2024, em que foi Relator Jorge dos Reis Bravo) numa situação similar à presente (apenas se alterando o «crime-base» de tráfico para o de furto):
«Convocando aqui a fundamentação a este propósito aduzida no Acórdão do STJ de 04-02-2016, proferido no âmbito do Processo n.º 26/13.4GGIDN.S1, da 5.ª Secção, (onde estava em apreciação um caso de idênticos contornos), o juízo que importa fazer, sobre a preferência pela aplicação de uma pena de multa, em detrimento da pena privativa da liberdade, é completamente diferente quando, em função da prática de outro ou outros crimes, o arguido esteja inevitavelmente sujeito a uma condenação em pena de prisão. Nesta hipótese, como aqui sucede, a ponderação essencial a fazer prende-se com esta de saber se a punição de um dos crimes com pena de multa não redundará, antes, em pura e simples impunidade. Isto porque, convenhamos, ou a pena é tão leve, face ao património do arguido, que não implica para ele um sacrifício, e então não é pena, ou o condenado, em meio prisional, está impossibilitado de angariar fundos para pagar a multa, com as naturais consequências daí resultantes.
E, como ensinam Jescheck e Weigend, «A finalidade político-criminal da pena de multa, isto é, poupar o autor à aplicação de uma pena de prisão, faz com que, por regra geral, aquela não seja imposta junto com esta» (Tratado de Derecho Penal – Parte General, 5.ª ed. (trad. Miguel Olmedo Cardenete, Granada: Comares, 2003, p. 827).
Na mesma linha, e mais afirmativo ainda, ensina também Figueiredo Dias, «uma tal pena «mista» é, numa palavra, profundamente dessocializadora, além de contraditória com o sistema dos dias de multa: este quer colocar o condenado próximo do mínimo existencial adequado à sua situação económico-financeira e pessoal, retirando-lhe as possibilidades de consumo restantes, quando com a pena «mista» aquele já as perde na prisão! O desaparecimento da pena complementar de multa (e portanto da pena mista de prisão e multa) impõe-se, pois, numa futura revisão do CP, como forma de restituir à pena pecuniária o seu sentido político-criminal mais profundo e de aumentar a sua eficácia penal.» (Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra: Coimbra Ed., 2005, p. 154).
Também a esta luz, e tendo desde logo em conta a estreita conexão e acessoriedade que no caso em apreço se verifica entre o crime de condução sem habilitação legal e o crime de tráfico de estupefacientes, destinando-se a prática do primeiro a concretizar e facilitar atos do segundo, cuja necessidade de tutela penal é, como já dissemos, particularmente reclamada pela comunidade, temos por certo que as necessidades de prevenção geral, o mesmo é dizer, as expectativas de punição por parte da mesma comunidade, mal se compadeceriam com uma pena de multa.»
Ou seja, não se justifica a alteração das penas aplicadas de prisão para penas de multa, como pretendido.
Resta a questão da redução da pena aplicada em cúmulo e sua eventual suspensão de execução.
Também quanto a isso pugnamos pela manutenção do decidido.
Na verdade, para além de, atento o atrás referido quanto à manutenção das penas parcelares aplicadas se manterem as balizas da pena única a aplicar (cujo mínimo se situa nos 2 anos e 6 meses e o máximo em 16 anos e 1 mês de prisão), há a lembrar a forma «profissional» com que o arguido atuou, umas vezes só, outras acompanhado pelo coarguido AA, no total de 10 vezes no que se refere aos crimes de furto (tendo os outros crimes sido instrumento para a prática destes, ou para a tentativa de não responsabilização por tal prática), numa atuação reveladora de alta energia criminosa na busca e retirar de bens alheios de elevado valor (lembre-se que o arguido acabou por obter ilícita vantagem patrimonial que ascendeu aos 12.183,71 euros, dos quais 4.352,53 em conjunto com o coarguido AA). E, sendo que, muito embora se tenha entendido no acórdão recorrido pelo seu arrependimento por ter contribuído para a descoberta da verdade, isso apenas ocorreu em sede de inquérito, que não já em sede de audiência de julgamento. Ora, se o arguido não pode ser prejudicado por ter optado por não prestar declarações, certo é igualmente que esse silêncio não o pode igualmente beneficiar em termos de reforço da conclusão de que se mostra arrependido, que interiorizou o desvalor da sua conduta e de, assim, existem fundamentos sérios para concluir – como exige o artº 50º do Código Penal – que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Assim sendo, sem necessidade de maiores considerações, é parecer do Ministério Público que a decisão recorrida não merece censura, devendo ser mantida na totalidade, julgando-se improcedente o recurso interposto pelo arguido DD.
O arguido recorrente DD, respondendo, vem apresentar argumentação em concordância com o seu instrumento recursivo, defendendo (…) existem circunstâncias e fundamentos sérios para se concluir por uma redução e alteração das penas aplicadas ao Recorrente, e que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, devendo nesse sentido o presente recurso ter provimento2.
5. Efetuado o exame preliminar e colhidos que foram os vistos legais, cumpre agora, em conferência, apreciar e decidir.
II – Fundamentação
1.Questões a decidir
Face ao disposto no artigo 412º do CPPenal, considerando a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça nº 7/95, de 19 de outubro de 19953, bem como a doutrina dominante4, o objeto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respetiva motivação, sem prejuízo da ponderação de questões de conhecimento oficioso que possam emergir5.
Posto isto, e vistas as conclusões do instrumento recursivo trazido pelo arguido recorrente, em determinados aspetos pouco claras, entende-se serem as seguintes as questões suscitadas, ordenadas segundo um critério de lógica e cronologia preclusivas:
- penas parcelares aplicadas – sua adequação, proporcionalidade e justeza – tipologia / modalidade;
- pena única imposta – sua redução e possibilidade de suspensão da execução da pena.
2. Apreciação
2.1. O Tribunal recorrido considerou provados e não provados os seguintes factos: (transcrição6)
Factos Provados:
Da acusação pública:
NIUPC 1949/23.8...:
1 - Entre as 18:00 horas do dia 30 de Dezembro de 2023 e as 09:00 horas do dia 31 de Dezembro de 2023, o arguido DD deslocou-se à residência (uma moradia ainda em fase final de construção), sita na Rua do ..., na ..., com o propósito de se apropriar dos bens que aí se encontrassem e que pudesse transportar consigo.
2 - No local o arguido DD introduziu-se no quintal da habitação, o qual já se encontrava murado, trepando o muro, e, deslocou-se para junto da porta que dá acesso à cozinha, partiu os vidros da mesma, logrando dessa forma abri-la, introduzindo-se no interior da residência.
3 – Em acto contínuo, o arguido DD deslocou-se à cozinha e outras divisões de onde retirou e transportou, de modo não concretamente apurado, os seguintes objectos:
a) um micro-ondas de encastre, marca Electrolux, no valor de €351,56;
b) um forno de encastrar, marca Electrolux, no valor de €464,08; e
c) uma placa de indução, marca Electrolux, no valor de €415,54;
Tudo no valor global de €1.231,18 (mil, duzentos e trinta e um euros e dezoito cêntimos).
4 - Na posse dos aludidos objectos, o arguido DD abandonou o local para parte incerta.
5 - O arguido DD representou e quis forçar e inutilizar vidro da porta de correr que dava acesso ao interior da residência sita na Rua do ..., na ..., a qual sabia que permitia a introdução no seu interior, como meio instrumental e necessário para alcançar tal desiderato.
6 - Com a conduta descrita, o arguido DD previu e quis, ao agir do modo descrito, retirar do interior da referida residência os bens que ali se encontrassem, fazendo-os seus, bem sabendo que os mesmos não lhes pertenciam, que agia sem o conhecimento e contra a vontade do respetivo proprietário.
7 - O arguido DD agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.
NIUPC 102/24.8...:
8 - Entre as 03:40 horas e as 04:00 horas, do dia 21 de Janeiro de 2024, o arguido DD deslocou-se à residência (uma moradia), sita na Rua ..., na ..., com o propósito de se apropriar dos bens que aí se encontrassem e que pudesse transportar consigo.
9 - No local o arguido DD deslocou-se para junto de uma das janelas com acesso ao exterior, exerceu força junto do trinco da mesma, com recurso a um cinzel de madeira, e logrou abri-la, introduzindo-se no interior da residência.
10 – Em acto contínuo, o arguido DD fez disparar o alarme de intrusão, tendo, nesse momento, feito sua a câmara de videovigilância, no valor de €100,00 (cem euros).
11 - Na posse do aludido objecto, o arguido DD abandonou o local para parte incerta.
12 - O arguido DD representou e quis forçar e inutilizar vidro da janela que dava acesso ao interior da residência sita na Rua ..., na ..., a qual sabia que permitia a introdução no seu interior, como meio instrumental e necessário para alcançar tal desiderato.
13 - Com a conduta descrita, o arguido DD previu e quis, ao agir do modo descrito, retirar do interior da referida residência os bens que ali se encontrassem, fazendo-os seus, bem sabendo que os mesmos não lhes pertenciam, que agia sem o conhecimento e contra a vontade do respetivo proprietário.
14 – O arguido DD agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.
NIUPC 109/24.5...:
15 - Entre as 06:00 e as 07:00 horas, do dia 22 de Janeiro de 2024, os arguidos DD e AA, na senda de um plano previamente delineado e em comunhão de esforços, deslocaram-se à residência (uma moradia ainda em fase final de construção), sita na Rua ..., na ..., com o propósito de se apropriarem dos bens que aí se encontrassem e que pudessem transportar consigo.
16 - Em execução do plano suprarreferido e agindo sempre em conjugação de esforços e de vontades, no local, os arguidos DD e AA introduziram-se no quintal da habitação, o qual já se encontrava murado, pela porta do mesmo, e, deslocaram-se para junto da porta de correr que se situava na parte traseira da moradia, partiram os vidros da mesma, logrando dessa forma abri-la, introduzindo-se no interior da residência.
17 – Em acto contínuo, os arguidos DD e AA deslocaram-se à cozinha e outras divisões de onde retiraram e transportaram, de modo não concretamente apurado, os seguintes objectos:
a) uma placa de indução 4 zonas, da marca Zanussi, no valor de €326,15;
b) um forno multifunções inox, da marca Zanussi, no valor de €388,46;
c) um micro-ondas inox, marca Zanussi, no valor de €333,08;
d) um exaustor de tecto, da marca AEG, no valor de €788,46;
e) uma máquina de lavar loiça, marca Zanussi, no valor de €455,38;
f) um lava loiça, da marca Rodi, no valor de €273,00;
g) uma torneira misturadora, da marca Rodi, no valor de €158,00;
h) uma serra esquadrias, da marca DeWalt, no valor de €450,00;
i) uma rebarbadora, da marca Bosch 1000w, no valor de €100,00;
j) uma rebarbadora, da marca Bosch 800w, no valor de €80,00;
l) uma máquina de cortar ladrilhos, da marca Dexter, no valor de €120,00;
j) um martelo elétrico, da marca Stanley, no valor de €300,00;
l) um nível de mão 1,50 cm, da marca Dexter, no valor de €60,00; e
m) um Kit de espátulas profissionais, no valor de €220,00;
Tudo no valor global de €4.052,53 (quatro mil e cinquenta e dois euros e cinquenta e três cêntimos).
18 - Na posse dos aludidos objectos, os arguidos DD e AA abandonaram o local para parte incerta.
19 - Os arguidos DD e AA representaram e quiseram forçar e inutilizar vidro da porta de correr que dava acesso ao interior da residência sita na Rua ..., na ..., a qual sabiam que permitia a introdução no seu interior, como meio instrumental e necessário para alcançar tal desiderato.
20 - Com a conduta descrita, os arguidos DD e AA previram e quiseram, ao agir do modo descrito, retirar do interior da referida residência os bens que ali se encontrassem, fazendo-os seus, bem sabendo que os mesmos não lhes pertenciam, que agiam sem o conhecimento e contra a vontade do respetivo proprietário.
21 - Os arguidos DD e AA agiram, em comunhão de esforços, segundo um plano previamente traçado, de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal.
(…)
NIUPC 229/24.6...:
42 - Entre as 17:00 horas do dia 11 de Fevereiro de 2024 e as 08:00 horas do dia 12 de Fevereiro de 2024, o arguido DD deslocou-se à residência (uma moradia em fase final de construção), sita na Rua do ..., na ..., com o propósito de se apropriar dos bens que aí se encontrassem e que pudesse transportar consigo.
43 - No local o arguido DD introduziu-se no quintal da habitação, o qual se encontrava murado, trepando o muro e, deslocou-se para junto de uma janela da moradia, danificou o estore e partiu o fecho da mesma, logrando dessa forma introduzindo-se no interior da residência.
44 – Em acto contínuo, o arguido DD deslocou-se à cozinha e outras divisões de onde retirou e transportou, de modo não concretamente apurado, os seguintes objectos:
a) uma máquina de lavar loiça, da marca Bosch, no valor de €598,00;
b) um exaustor, da marca Bosch, no valor de €158,90;
c) uma placa de indução, da marca Bosch, no valor de €379,00;
d) um forno, da marca Bosch, no valor de €435,00;
e) um frigorífico, da marca Samsung, no valor de €1.239,00;
f) um micro-ondas, da marca Bosch, no valor de €249,00; e
g) uma máquina de lavar a roupa, da marca LG, no valor de €480,00;
Tudo no valor global de €3.539,00 (três mil quinhentos e trinta e nove euros).
45 - Na posse dos aludidos objectos, o arguido DD abandonou o local para parte incerta, danificando o portão da entrada da moradia.
46 - O arguido DD representou e quis forçar e inutilizar vidro da janela que dava acesso ao interior da residência, sita na Rua do ..., na ..., a qual sabia que permitia a introdução no seu interior, como meio instrumental e necessário para alcançar tal desiderato.
47 - Com a conduta descrita, o arguido DD previu e quis, ao agir do modo descrito, retirar do interior da referida residência os bens que ali se encontrassem, fazendo-os seus, bem sabendo que os mesmos não lhes pertenciam, que agia sem o conhecimento e contra a vontade do respetivo proprietário.
48 - O arguido DD agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.
NIUPC 237/24.7...:
49 - Entre as 18:00 horas do dia 13 de Fevereiro de 2024 e as 08:00 horas do dia 14 de Fevereiro de 2024, o arguido DD deslocou-se à residência (uma moradia em fase final de construção), sita na Rua ..., na ..., com o propósito de se apropriar dos bens que aí se encontrassem e que pudesse transportar consigo, em valor não concretamente determinado, mas superior a €102,00 (cento e dois euros).
50 - No local o arguido DD introduziu-se no quintal da habitação, o qual se encontrava murado, trepando o muro e, deslocou-se para junto de uma janela da sala da moradia, danificaram o estore, mas não logrando conseguir aceder ao seu interior, prosseguindo e danificando uma janela que dava acesso à casa-de-banho, que se encontrava localizada na cave da moradia, logrando dessa forma introduzindo-se no interior da residência.
51 – Contudo, como a moradia estava vazia, tendo apenas o quadro elétrico da piscina, no valor de €200,00 (duzentos euros), o arguido DD abandonou o local para parte incerta, sem fazer seu qualquer bem.
52 - O arguido DD representou e quis forçar e inutilizar os vidros das janelas da sala e da casa-de-banho que davam acesso ao interior da residência, sita Rua ..., na ..., as quais sabia que permitia a introdução no seu interior, como meio instrumental e necessário para alcançar tal desiderato.
53 - Com a conduta descrita, o arguido DD previu e quis, ao agir do modo descrito, retirar do interior da referida residência os bens e valores que ali se encontrassem, fazendo-os seus, bem sabendo que os mesmos não lhes pertenciam, que agia sem o conhecimento e contra a vontade do respetivo proprietário, intentos que apenas não logrou atingir por a moradia estar vazia, não tendo encontrado nada que fosse do seu interesse.
54 - O arguido DD agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal.
NIUPC 251/24.2... e 259/24.8...:
55 – Na execução de um plano previamente delineado pelos arguidos DD e AA, os quais necessitavam de um veículo automóvel para transportar os eletrodomésticos que pretendiam subtrair, no dia 15 de Fevereiro de 2024, entre as 00:00 e as 08:30 horas, o arguido AA dirigiu-se à Rua ..., junto ao n.º ..., na ..., na ..., com o propósito de se apropriar de um veículo automóvel.
56 - Aí chegado, o arguido AA deparou-se com o veículo ligeiro de mercadorias, matrícula ..-..-AG, da marca Ford Transit, de cor branca, propriedade da sociedade comercial A..., Lda., representada por MM.
57 – O arguido AA introduziu-se no referido veículo, abandonando de seguida o local ao volante do mesmo, fazendo de ambos os arguidos seus o veículo e os bens que se encontravam no interior do mesmo, designadamente um casaco, no valor de €100,00 (cem euros); quantia não apurada de numerário, mas superior a €100,00 (cem euros); e várias ferramentas, entre as quais uma chave inglesa, no valor de €100,00 (cem euros).
Por sua vez, na execução do referido plano,
58 – Em hora não apurada na noite de 15 de Fevereiro de 2024 para 16 de Fevereiro de 2024, antes das 01:45 horas, o arguido DD deslocou-se ao volante do veículo de marca Opel, modelo Corsa, com a matrícula ..-BJ-.., para as imediações da Rua ..., onde se encontrou com o arguido AA, o qual conduzia o veículo ligeiro de mercadorias, de matrícula ..-..-AG.
59 – O arguido DD introduziu-se no veículo ligeiro de mercadorias, de matrícula ..-..-AG, conduzido pelo arguido AA e deslocaram-se à residência sita na Rua ..., com o propósito de se apropriarem dos objectos que aí se encontrassem e que pudessem transportar consigo.
60 - No local, os arguidos DD e AA introduziram-se no logradouro da habitação, deslocaram-se para junto de uma das janelas com acesso ao exterior, exerceram força junto do trinco da mesma e lograram abri-la, introduzindo-se no interior da residência.
61 – Em acto contínuo, os arguidos DD e AA deslocaram-se à cozinha, de onde retiraram e transportaram para o interior do veículo ligeiro de mercadorias, matrícula ..-..-AG, os seguintes objectos:
a) Um frigorífico, tipo americano, marca Samsung, em inox, de duas portas, com dispensador de água e gelo na porta do congelador, no valor de €1.500,00 (mil e quinhentos euros);
b) Um micro-ondas de encrostar, marca Hot Point, com uma marca de queda junto ao mostrador/LCD do micro-ondas;
c) Um forno de encrostar, marca Hot Point;
d) Uma máquina de lavar a loiça de encastrar, marca Hot Point;
e) Um extrator de fumos em inox, marca Hot Point; e
f) Um rolo emborrachado de cor preta, com relevos circulares;
Tudo no valor global de cerca de €3.000,00 (três mil euros).
62 - Na posse dos aludidos objectos, os arguidos DD e AA abandonaram o local para parte incerta, no interior do veículo ligeiro de mercadorias, de matrícula ..-..-AG, conduzido pelo arguido AA, seguindo o arguido DD no banco do pendura, vindo a ser abordados por um carro de patrulha da G.N.R., pelas 01:45 horas, do dia 16 de Fevereiro de 2024, na Rua ....
63 - O arguido AA, quando questionado pelos militares da Guarda Nacional Republicana - os quais se apresentavam devidamente identificados e uniformizados, no pleno exercício das suas funções - sobre a sua identificação, apresentou-se como sendo NN, nascido a .../.../1997, com o contribuinte n.º ... ... .07.
64 - Identificação que foi confirmada pelo arguido DD aos militares da Guarda Nacional Republicana.
65 - Encaminhados ao subdestacamento da ..., da Guarda Nacional Republicana, os arguidos DD e AA foram uma vez mais questionados sobre a sua identificação.
66 - Ao que o arguido AA voltou a afirmar ser NN, nascido a .../.../1997, com o contribuinte n.º ... ... .07, tendo, inclusive, assinado o Auto de Constituição como arguido e o Termo de Identidade e Residência como “NN”.
67 - Pelas 09:00 horas do dia 16 de Fevereiro, os militares da Guarda Nacional Republicana que deram entrada ao serviço, constataram que o arguido AA se havia identificado com o nome NN, seu irmão, alertando os seus colegas para a incorreta identificação do arguido.
68 – Os arguidos DD e AA actuaram com o propósito concretizado de se apropriarem e utilizarem o veículo ..-..-AG, como meio de transporte dos objectos que posteriormente subtraíram do interior da residência sita na Rua ..., pese embora soubessem que o veículo e os bens existentes no seu interior não lhes pertenciam e que actuavam sem o consentimento e contra a vontade do seu legítimo dono.
69 - Os arguidos DD e AA representaram e quiseram forçar e inutilizar o trinco de uma das janelas da residência sita na Rua ..., a qual sabiam que permitia a sua introdução no seu interior, como meio instrumental e necessário para alcançar tal desiderato.
70 - Com a conduta descrita, os arguidos DD e AA previram e quiseram, ao agir do modo descrito, retirar do interior da referida residência os bens que ali se encontrassem, fazendo-os seus, bem sabendo que os mesmos não lhes pertenciam, que agiam sem o conhecimento e contra a vontade do respetivo proprietário.
71 - O arguido AA conduziu o veículo ligeiro de mercadorias sem ser titular de carta de condução que validamente o habilitasse a conduzir tal veículo.
72 - O arguido AA sabia que não possuía carta de condução, o que o impedia de conduzir qualquer veículo a motor na via pública.
73 - Não obstante, o arguido AA agiu com o propósito concretizado de conduzir aquele veículo nas referidas circunstâncias, bem sabendo que não podia conduzir veículos a motor na via pública sem se encontrar autorizado por título para esse efeito.
74 - O arguido DD conduzia o veículo ligeiro de passageiros, sem ser titular de licença de condução que validamente o habilitasse a conduzir tal veículo.
75 - O arguido DD sabia que não possuía carta de condução, o que o impedia de conduzir qualquer veículo a motor na via pública.
76 - Não obstante, o arguido DD agiu com o propósito concretizado de conduzir aquele veículo nas referidas circunstâncias, bem sabendo que não podia conduzir veículos a motor na via pública sem se encontrar autorizado por título para esse efeito.
77 - Ao declarar ser NN, nascido a .../.../1997, com o contribuinte n.º ... ... .07, o arguido AA fê-lo contra a verdade por si conhecida, pois bem sabia que tal identificação correspondia à do seu irmão.
78 - O arguido AA pretendeu enganar os militares da Guarda Nacional Republicana, ao fazer-se passar pelo seu irmão, com o propósito concretizado de obstar à efetiva administração da justiça e não ser responsabilizado criminalmente por aqueles factos, apesar de ter conhecimento de que incorria em responsabilidade criminal caso não se identificasse corretamente.
79 - Por outro lado, ao assinar “NN” no Auto de Constituição como arguido e Termo de Identidade e Residência, o arguido AA actuou com o propósito concretizado de reforçar a sua mentira, credibilizando-a através da aposição da assinatura do seu irmão.
80 - O arguido DD sabia que o arguido AA não era quem dizia ser, mas, ainda assim, confirmou aos militares da Guarda Nacional Republicana a identificação que este se estava a atribuir, auxiliando-o nos intentos de obstar à efetiva administração da justiça.
81 - O arguido AA ao declarar na G.N.R. que se chamava NN, assinando com tal identificação o Auto de Constituição como arguido e o Termo de Identidade e Residência, e arguido DD, ao atestar no mesmo local tal identificação, bem sabiam que tal não correspondia à verdade, que estavam a declarar e a atestar uma identidade falsa em documento elaborado pela G.N.R. para ser apresentado em tribunal.
82 - Os arguidos DD e AA actuaram sempre de forma livre, voluntária e consciente, em comunhão de esforços para o sucesso do plano entre si previamente gizado.
83 - Os arguidos DD e AA sabiam que as suas condutas eram proibidas por lei e criminalmente punidas.
84 – O veículo ligeiro de mercadorias, de matrícula ..-..-AG, foi apreendido e entregue ao seu proprietário, bem como uma chave inglesa.
85 – Os eletrodomésticos referidos em 61) foram apreendidos e entregues ao seu proprietário.
NIUPC 258/24.0...:
86 - Entre as 18:00 horas do dia 02 de Fevereiro de 2024 e as 10:00 horas, do dia 16 de Fevereiro de 2024, o arguido DD deslocou-se à residência (uma moradia ainda em fase final de construção), sita na Rua ..., na ..., com o propósito de se apropriar dos bens que aí se encontrassem e que pudesse transportar consigo.
87 - N local o arguido DD introduziu-se no quintal da habitação, o qual já se encontrava murado, trepando o muro, e, deslocou-se para junto da porta de correr que se situa na parte traseira da moradia, partiram o estore e, em seguida, os vidros da mesma, logrando dessa forma abri-la, introduzindo-se no interior da residência.
88 – Em acto contínuo, o arguido DD deslocou-se à cozinha e outras divisões de onde retirou e transportou, de modo não concretamente apurado, os seguintes objectos:
a) um exaustor, da marca Meireles, no valor de €560,00;
b) uma máquina de lavar loiça de encastre, marca Whirlpool, no valor de €541,00;
c) um forno de encastre, marca Whirlpool, no valor de €425,00;
d) um micro-ondas de encastre, marca Whirlpool, no valor de €385,00;
e) uma placa de encastre, marca Whirlpool, no valor de €500,00; e
f) um combinado de encastre, marca Whirlpool, no valor de €550,00;
Tudo no valor global de €2.961,00 (dois mil novecentos e sessenta e um euros).
89 - Na posse dos aludidos objectos, o arguido DD abandonou o local para parte incerta.
90 - O arguido DD representou e quis forçar e inutilizar vidro da porta de correr que dava acesso ao interior da residência sita na Rua ..., na ..., a qual sabia que permitia a introdução no seu interior, como meio instrumental e necessário para alcançar tal desiderato.
91 - Com a conduta descrita, o arguido DD previu e quis, ao agir do modo descrito, retirar do interior da referida residência os bens e valores que ali se encontrassem, fazendo-os seus, bem sabendo que os mesmos não lhes pertenciam, que agiam sem o conhecimento e contra a vontade do respetivo proprietário.
92 - O arguido DD agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal.
(…)
131 – O arguido DD não tem antecedentes criminais registados.
132 – O arguido DD:
- Vive com a avó paterna, a qual é reformada, uma irmã, que trabalha como empregada de balcão no ramo da restauração, e dois sobrinhos menores de idade, em habitação descrita com adequadas condições de conforto.
- O seu processo de desenvolvimento foi condicionado pela perda dos pais por motivo de doença em idade precoce, a mãe quando ele contava cinco anos e o pai quando tinha dez anos, tendo-se constituído a avó paterna como a figura de referência a nível afectivo e normativo.
- Tem o 6º ano de escolaridade, num percurso escolar pouco investido, tendo registado a primeira retenção no 5º ano de escolaridade, o que coincidiu com o falecimento do seu pai. Voltou a registar nova retenção nesse ano e posteriormente duas retenções sucessivas no 7º ano de escolaridade motivadas por absentismo e desinteresse pela aprendizagem, não sendo referidos problemas de natureza disciplinar. Com 15/16 anos ingressou no curso profissional de mecânica auto no Instituto de Formação Profissional do ..., o qual abandonou aos 18 anos, não tendo sido certificado com o 3º ciclo.
- Iniciou actividade laboral regular com 18/19 anos, tendo permanecido durante cerca de seis anos como técnico de reparação de eletrodomésticos a recibos verdes. Há cerca de quatro anos exerce as mesmas funções para um indivíduo particular, sem qualquer vinculação contratual, exercendo actividade laboral de segunda a sexta-feira, auferindo €250,00 (duzentos e cinquenta euros) semanais.
- Contribui para as despesas do agregado familiar com valor variável em função dos dias de trabalho.
- Não desenvolve qualquer actividade estruturada nos tempos livres, que ocupa no convívio com familiares ou amigos.
- Consome ocasionalmente haxixe, o que tende a desvalorizar.
2.2. Das questões a decidir
O arguido recorrente como primeiro mote de insurgimento pretende a sindicância da opção tomada pelo Tribunal recorrido, no que tange às penas parcelares encontradas relativamente a determinados crimes pelos quais foi condenado, defendendo que nesse segmento, não se respeitaram as máximas da adequação, proporcionalidade e justeza, decorrentes dos incisos conjugados dos artigos 40º, 70º e 71º do CPenal.
Nesse ensejo, vem pugnar no sentido de que (…) deverão as penas de prisão aplicadas aos 2 (DOIS) CRIMES DE FURTO SIMPLES, ao CRIME DE CONDUÇÃO DE VEÍCULO SEM HABILITAÇÃO LEGAL e ao CRIME DE FALSAS DECLARAÇÕES, serem substituídas por PENAS DE MULTA, cujo montante deverá fixar-se num patamar médio dentro dos seus limites e tendo em consideração as condições socio-económicas do Arguido, ou seja, não questionando o quantum encontrado para cada das situações em causa, apela a que opte por pena substitutiva.
Sustenta-se, para tanto, em argumentos como (…) a grande maioria dos factos dados como provados no que respeita à autoria e execução dos ilícitos perpetrados (…) resultam das suas próprias declarações em sede de interrogatório perante Magistrado do Ministério Público em 16/04/2024 (…) Ajudando e colaborando de modo inquestionável e essencial na descoberta da verdade nestes autos, mas também demonstrando inequivocamente, um arrependimento sincero e uma auto censura à sua conduta delituosa (…) O Arguido não só é primário, como os factos ilícitos em causa ocorreram no espaço temporal de 1 (um) mês e meio e nada mais, pelo que não se pode classificar de comportamento reiterado (…) a sua participação nestes factos, resultou de alguma permeabilidade e vulnerabilidade a influências de terceiras pessoas (situação que lamenta profundamente), mormente aos outros arguidos, os quais apresentam um percurso de vida delituosa completamente distinta da do Arguido (…) os bens jurídicos atingidos foram sempre bens materiais e monetários, nunca tendo havido qualquer acto de cariz violento ou atentatório contra a integridade física de terceiros, até porque, os factos em causa ocorreram sempre em habitações em construção e sem residentes (…) todos os danos e prejuízos provocados pela conduta por parte do Arguido DD, são passíveis de serem ressarcidos e reparados financeiramente, situação essa que irá totalmente ao encontro do arrependimento demonstrado e postura apresentada pelo mesmo após a prática dos factos (…) o Arguido por sempre ter trabalhado, reúne as condições necessárias para cumprir com tal responsabilidade e obrigação, caso lhe venha a
ser dada essa possibilidade, sendo essa a sua firme intenção (…) Trata-se de um jovem perfeitamente inserido familiarmente, socialmente e profissionalmente. Contribuindo e ajudando, para com as despesas do seu agregado familiar, de quem tem tido sempre todo o apoio necessário, sendo inclusive a sua maior preocupação, a sua avó paterna perante a pena que pende sobre si (…) alguém com apenas 29 anos, primário (…).
Olhando à decisão em dissídio, em matéria de penas parcelares, não exultando um particular debruce sobre tal fragmento, pode ler-se (…) O grau de ilicitude mostra-se de média gravidade (…) à culpa, a mesma molda-se pelo dolo directo pois os arguidos agiram sempre de forma livre e conscientemente, representando os factos que preenchem os vários tipos de crime, agindo com a intenção de os realizar (…) As exigências de prevenção geral positiva são elevadas atento o elevado número de ilícitos contra o património, havendo necessidade de reprimir de forma eficaz estas condutas e de consciencializar para o desvalor das mesmas (…) às razões de prevenção especial temos que (…) DD temos que este tem actualmente 29 (vinte e nove) anos de idade e não tem antecedentes criminais registados (…) em sede de inquérito admitiu a prática dos factos, contribuindo de forma relevante para a descoberta da verdade material dos factos quanto a si, de onde emerge o arrependimento pela sua conduta (…) A conduta do arguido foi gravosa pois, entre 30/12/2023 a 16/02/2024, cometeu um total de dez crimes, sete dos quais de furto qualificado, no interior de residências, umas vezes sozinho e outras em conjugação de esforços com outro indivíduo, o que aumenta a eficácia na (…) execução dos vários ilícitos, bem como dois crimes de furto simples, um de condução de veículo sem habilitação legal e um crime de falsas declarações (…) aquando dos factos, o arguido vivia com a avó paterna, pessoa que o criou desde pequeno em virtude da morte dos seus pais, uma irmã e dois sobrinhos menores de idade. Trabalha técnico de reparação de eletrodomésticos para um indivíduo particular, sem qualquer vinculação contratual, exercendo actividade laboral de segunda a sexta-feira, auferindo €250,00 (duzentos e cinquenta euros) semanais. Tem o 6º ano de escolaridade e não tem filhos (…) tudo ponderado, atentas as fortes razões de prevenção geral e especial suprarreferidas, e tendo presente o número de ilícitos praticados, de onde emerge que não estamos perante uma situação pontual, mas sim um comportamento reiterado, o tribunal entende que a pena de multa não se mostra adequada, nem suficiente, no que respeita aos crimes de furto simples, de condução de veículo sem habilitação legal e falsas declarações, pelo que decide aplicar pena de prisão a todos os ilícitos (…).
Considerando todo o explicativo levado a cabo pelo Tribunal a quo e retomando o aduzido pelo arguido recorrente, neste patamar de discordância, observe-se, então, o segmento de questionamento em causa.
Em pronto passo, retenha-se que vem sendo entendimento pacífico e sedimentado que o recurso em matéria de pena, não é uma oportunidade para o tribunal ad quem fazer um novo juízo sobre a decisão em revista, sendo antes um meio de corrigir o que de menos próprio foi decidido pelo Tribunal recorrido e que sobreleve de todo espetro decisório.
Por outro lado, ao que se pensa, exige-se ao recorrente o ónus de demonstrar perante o tribunal de recurso o que de errado ocorreu nesta vertente.
Verdadeiramente, tanto quanto se crê, há muito que a doutrina e jurisprudência se mostram firmadas, no sentido de que em sede de medida da pena, o recurso não deixa de reter o paradigma de remédio jurídico, apontando para que a intervenção do tribunal de recurso, se deve cingir à reparação de qualquer desrespeito, pelo tribunal recorrido, dos princípios e regularidade que definem e demarcam as operações de concretização da pena na moldura abstrata determinada na lei, sendo que observados os critérios globais insertos no artigo 71º do CPenal, a margem do julgador dificilmente pode ser sindicável7.
Vale por dizer que o exame da concreta medida da pena estabelecida, suscitado pela via recursiva, não deve afastar-se desta, senão, quando haja de prevenir-se e emendar-se a fixação de um determinado quantum em derrogação dos princípios e regras pertinentes, cumprindo precaver (desde logo à míngua da imediação e da oralidade de que beneficiou o Tribunal a quo) qualquer abusiva fixação de uma concreta pena que ainda se revele congruente, proporcional, justa e acertada8.
Há, também, que atender que ao que se vem defendendo, no exercício a realizar para se determinar a medida concreta da pena a fixar e, dando cumprimento ao disposto no artigo 70º do CPenal, como primeira operação que urge levar a cabo é, se aplicável, a de optar entre uma pena privativa da liberdade ou uma pena não detentiva - se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Estabelece o artigo 40º do CPenal, no seu nº 1, que a imposição de uma pena visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, refletindo-se neste preceito, o pensamento / ideia / filosofia que enuncia que apenas finalidades relativas de prevenção geral e especial e já não finalidades absolutas de retribuição e expiação, podem alicerçar a intervenção do direito penal e, concomitantemente justificar a aplicação das respetivas sanções9.
Faça-se ainda apelo a JAKOBS que reconhece que a finalidade primária da pena reside na “(…) função preventiva (…) para exercitar a confiança na norma (…) aumentando a probabilidade que esse comportamento seja apreendido pela comunidade de forma a considera-lo que não se deve ter”10 e, bem assim a linha jurisprudencial que firma, quanto aos fins das penas e em termos de prevenção especial estar esta “(…) orientada no sentido de desenvolver uma influência inibitória do delito no próprio autor, subdividindo-se em três fins: intimidação (preventivo-individual), ressocialização (correcção) e segurança11.
Colhe também notar que por força do plasmado no artigo 70º do CPenal deve o aplicador do direito optar, preferencialmente, por pena não privativa da liberdade, em caso de condenação.
Importa igualmente apelar ao que consagra o artigo 71º do CPenal, fixando os parâmetros a que o tribunal deve atender na determinação da medida concreta da pena, consignando-se que este exercício é feito em função da culpa do agente e das necessidades de prevenção.
Em presença destes considerandos surge patente que a escolha da pena é determinada em função da culpa do agente e por razões de ordem preventiva, impondo-se ao tribunal a ponderação das necessidades de prevenção geral e especial, que exorbitem de cada caso concreto.
Na verdade, “(…) a articulação entre estas necessidades deve ser feita do seguinte modo: em princípio, o tribunal deve optar pela pena alternativa ou de substituição mais conforme com as necessidades de prevenção especial de socialização, salvo se as necessidades de prevenção geral (rectius, a defesa da ordem jurídica) impuserem a aplicação da pena de prisão”12, parecendo claro que não emerge do quadro legal vigente qualquer obrigação e / ou imposição em aplicar uma pena não privativa da liberdade, sempre que em tese e em termos abstratos tal se mostre possível.
Olhando os normativos disciplinadores da solução a encontrar como consequência jurídica da prática de um crime, convém sublinhar que, efetivamente, não emerge do ordenamento penal vigente, a obrigação de aplicação de uma pena não privativa da liberdade, sem mais, devendo antes o julgador sopesar, em face de cada situação concreta, qual o caminho sancionatório que realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, sendo, contudo, de dar primazia àquela na altura da avaliação, devendo olhar-se a pena de prisão como a última solução.
Cotejando todo o quadro fáctico dado como assente e não questionado pelo arguido recorrente, importa, apurar da bondade da pretensão primeira do arguido recorrente, ou seja, ponderar se em relação aos figurinos criminais que o mesmo aponta – dois crimes de furto simples (penas de 10 meses e um ano de prisão, respetivamente), crime de condução de veículo sem habilitação legal (10 meses de prisão) e crime de falsas declarações (3 meses de prisão) - se serão alcançadas as finalidades das penas, por via de solução que integre a pena de substituição não detentiva / pena de substituição em sentido próprio ensaiada pelo arguido recorrente - multa.
E nesse ensejo, ao que se pensa, igualmente se impõe, que tal vetor, in casu, não pode ser avaliado e ponderado sectorialmente, ignorando todos os outros ilícitos pelos quais o arguido foi condenado – furtos qualificados, em número de seis – os quais, por força das penas concretas que foram impostas – as quais o arguido recorrente não questiona em termos de quantum - não encerram a possibilidade de aplicação de pena de multa.
Sendo certo que relativamente a determinados crimes, a possibilidade de substituir as penas de prisão impostas ao arguido recorrente, verificados determinados pressupostos, poderiam permitir a utilização do mecanismo inserto no artigo 45º do CPenal, não é menos certo que em caso de concurso efetivo de crimes passíveis de pena de multa e outros não o permitindo, o juízo a fazer, sobre a preferência pela aplicação de uma pena de multa, em detrimento da pena privativa da liberdade, é completamente diferente quando, por causa de determinados ilícitos, o arguido esteja inevitavelmente sujeito a uma condenação em pena de prisão, como é o caso13.
Assim sendo, ainda que se revelem notas de reconhecida vertente positiva, neste particular matiz, não será de acolher a pretensão trazida.
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Recursivamente, apresenta-se, igualmente, como pretensão do arguido recorrente, reagir contra a pena única que lhe foi arbitrada, aspeto este que, como se viu anteriormente, o situou quanto aos crimes de furto qualificado pelos quais foi condenado e, também como se depreende, no pressuposto de que a sua pretensão primeira seria de proceder e, nessa medida, retirando desta ponderação todo o elenco de crimes atrás tratado.
Nesta dimensão, o arguido recorrente mantém como fundamentos todos os que atrás se enunciaram, suportando-se na mesma argumentação.
De seu lado, a decisão revidenda reza (…) Nos termos do disposto nos artigos 77º, n.º 1 e 77º, nº 2, do Código Penal, tendo em atenção as fortes razões de prevenção geral e especial supra descritas, que aqui se dão por reproduzidas, o número de crimes praticados pelo arguido DD e o espaço temporal em que os factos delituosos foram praticados (de 30/12/2023 a 16/02/2024), o tribunal fixa ao arguido a pena única de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de prisão.
Importa então um debruce sobre este vetor de discordância.
A punição do concurso de crimes emergente do artigo 77º do CPenal encara o sistema da pena conjunta, rejeitando uma visão atomística da pluralidade de crimes, e nessa medida, obriga a olhar para o conjunto – para a possível conexão dos factos entre si e para a necessária relação de todo esse bocado de vida criminosa com a personalidade do seu agente.
Nesse trajeto, encontradas as penas parcelares correspondentes a cada um dos singulares factos, cabe ao tribunal, depois de estabelecida a moldura do concurso, encontrar e justificar a pena conjunta, cujos critérios legais de determinação são diferentes dos propostos para a primeira etapa.
Em termos de segundo passo, importa essencialmente atender à unicidade / visão de conjunto, abandonando a ideia de compartimentação em que se fundou a construção de cada uma das molduras singulares que, não apagando a pluralidade de ilícitos perpetrados, antes a converte numa nova conexão de sentido, entendendo-se que a este novo ilícito corresponderá uma nova culpa (que continuará a ser culpa pelo facto) mas, agora, culpa pelos factos em relação.
Ou seja, a pena única deve formar-se mediante uma valoração completa da personalidade do agente e das diversas penas parcelares, sendo por isso necessário que se obtenha uma visão integrada dos factos, a relação dos diversos factos entre si em especial o seu contexto, a maior ou menor autonomia, a frequência da comissão dos delitos, a diversidade ou igualdade dos bens jurídicos protegidos violados e a forma de comissão, bem como o peso conjunto das circunstâncias de facto sujeitas a julgamento14.
Impõe-se o equacionar, em conjunto, a pessoa do autor e os delitos individuais, de modo que a formação da pena global não é uma elevação esquemática ou arbitrária da pena disponível mas deve sempre refletir a personalidade do autor e os factos individuais num plano de conexão e frequência, sendo que na valoração da personalidade do agente deve atender-se antes de tudo a saber se os factos são expressão de uma inclinação criminosa ou só constituem delitos ocasionais sem relação entre si15.
Há a reter, também, que não emergindo do ordenamento penal português o sistema de acumulação material (soma das penas com mera limitação do limite máximo) nem o da exasperação ou agravação da pena mais grave (elevação da pena mais grave, através da avaliação conjunta da pessoa do agente e dos singulares factos puníveis, elevação que não pode atingir a soma das penas singulares nem o limite absoluto legalmente fixado), é forçoso concluir que com a fixação da pena conjunta se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também, e especialmente, pelo seu conjunto, este visto não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto os factos e a personalidade do agente16.
Releva, ainda, a ponderação do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)17.
Toda esta métrica, reclama, por isso, que se fundamente a opção a tomar, por forma a que a medida da pena do concurso não surja como fruto de um ato intuitivo – da «arte» do juiz – ou puramente mecânico e, portanto, arbitrário, pese embora aqui, o dever de fundamentação não assuma nem o rigor nem a extensão dimanados do artigo 71º, podendo, contudo, os fatores enumerados no nº 2 deste inciso servir de mote enformador.
Debruçando um olhar no caso sub judice, em termos de pena única, tem-se como dosimetria a pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão a 16 (dezasseis) anos e 11 (onze) meses de prisão.
Não ignorando / escamoteando / branqueando as necessidades de prevenção geral que os contornos do caso possa exibir, parece indubitável / irrefutável / inquestionável que o palco criminal em presença, desde logo, não reclama, neste segmento, uma intervenção equiparável a tantos outros que os tribunais são chamados a intervir e, nessa medida, um posicionamento de rigor e severidade que parece intuir-se da ponderação exercitada pelo tribunal recorrido.
Com efeito, estão em causa quadros ofensivos do património, da segurança de circulação rodoviária (sendo que não decorreu daqui qualquer consequência para terceiros) e realização ou administração da justiça, que sendo bens de significado e importância a reter, em termos comunitários não assumem a carga / peso que outros, tais como a vida, a liberdade e autodeterminação sexual, a integridade física e que, por isso, podem / aceitam / encaram como solução equilibrada e razoável um outro tipo de enfrentamento, sempre que possível.
Anote-se, também tudo o que assola como notas de valia, a ausência de antecedentes criminais, a contribuição do arguido DD para a investigação (…) de onde emerge o arrependimento pela sua conduta (…), a sua juventude e todo o seu contexto familiar, social e laboral.
Concatenando estes traços ponderativos, e a todo o contexto em presença – tudo aconteceu em período temporal circunscrito -, uma pena única situada no patamar exato dos 5 (cinco) anos de prisão, ainda assim algo superior ao mínimo possível e cabível no primeiro terço da moldura encontrada, se mostra mais adequada, justa e proporcional18.
Em presença deste novo quadro punitivo, em termos de pena única, e repescando todo o argumentário do arguido recorrente, há então que ponderar a possibilidade de utilização da pena substitutiva – suspensão da execução da pena de prisão.
O artigo 50º do CPenal, mormente o seu nº 1, aponta para quais os critérios a seguir / observar para se poder recorrer ao instituto / mecanismo aí tratado.
Nessa senda, parece pacífico que o primeiro se prende com a pena imposta – prisão aplicada em medida não superior a 5 anos -, sendo que o segundo reclama que, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, o tribunal conclua pela formulação de um juízo de prognose favorável ao agente que se traduza no seguinte axioma: a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Por seu turno, assoma que a decisão de aplicação de tal pena de substituição reclama que a mesma não coloque irremediavelmente em causa a tutela da confiança e das expetativas da comunidade na validade da norma jurídica violada.
Haverá, pois, que ter sempre presente e como premente a satisfação das necessidades de prevenção manifestadas no sentimento jurídico da comunidade, pelo que uma pena de substituição da prisão, como o é a suspensão da execução da pena, (…) não poderá ser aplicada, se com ela sofrer inapelavelmente (…) o sentimento de reprovação social do crime (…) o sentimento jurídico da comunidade19.
Importa igualmente referir que indica o artigo 40º, nº1 do CPenal que as finalidades da punição são a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, sendo que por força da revisão do Código Penal, introduzida pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março e, bem assim, a resultante da Lei nº 59/2007, de 4 de setembro, houve um claro intento por parte do legislador em reforçar o princípio da ultima ratio da pena de prisão, valorizando-se o papel da multa como pena principal e alargando-se o tipo e o âmbito de aplicação das penas de substituição.
Por outra banda, certo é que dentre as penas de substituição exorbitam ainda as qualificativas de penas de substituição em sentido próprio – todas aquelas não privativas da liberdade, onde se insere a que ora se examina – e as penas de substituição em sentido impróprio – todas as que assumem caráter detentivo / cerceamento da liberdade.
Sopesando tais premissas, olhe-se ao quadro em presença.
Reitera-se a ideia de que despontando um quadro de alguma preocupação no seio comunitário, em termos de prevenção geral, tal qual se disse, ao que se crê, em termos de gravidade, e considerando que na sua maior parte exultam situações que apenas afetam o património, não parece emergir situação de evidente e notória repulsa.
Mostrando-se claro que o arguido recorrente não sofreu quaisquer condenações até então, igualmente se mostra assente que o mesmo (…) admitiu a prática dos factos, contribuindo de forma relevante para a descoberta da verdade material dos factos quanto a si, de onde emerge o arrependimento pela sua conduta (…) aspeto este que, ao que se pensa, é revelador de alguma capacidade de autocensura e senso crítico.
Acresce que o arguido recorrente se trata de um jovem de 29 anos de idade, exibe hábitos de trabalho, estando social e familiarmente inserido.
Diga-se, também, que todo este processo, certamente o terá feito refletir e pensar sobre os comportamentos tidos e as consequências que os mesmos podem desencadear se ensaiar a sua repetição ou confrontar as regras vigentes.
Na presença de todo este composto, ao que se cogita, ainda é possível elaborar um juízo de prognose favorável, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da pena serão o bastante para o cercear duma eventual tentativa de nova prática delituosa.
Assim, e desde logo, entende-se ser de impor a pena de 5 (cinco) anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 5 (cinco) anos, sujeita a regime de prova baseado em plano a delinear pela DGRSP.
Por seu turno, e como forma de que o arguido recorrente possa sentir na sua esfera de vivência o mal causado com todo o seu agir, e olhando a critérios de proporcionalidade e razoabilidade, tendo sempre presente a ideia de cumprimento de acordo com as normais possibilidades daquele, entende-se que será de lhe impor do dever de pagamento ao Estado, a título de reparação parcial do montante total em que foi condenado, da quantia de 3 (três) mil euros – artigo 51º, nº 1 do CPenal –, a cumprir em (três) anos contados da data do trânsito de presente decisão.
III - Dispositivo
Nestes termos, acordam os Juízes da 3ª Secção Criminal deste Supremo Tribunal de Justiça em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo arguido DD e, consequentemente, decidem.
a. Revogar a decisão recorrida, no que concerne à pena única imposta;
b. Condenar o arguido, em cúmulo jurídico, na pena única de 5 (cinco) anos de prisão, a qual se suspende na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova baseado em plano a delinear pela Direção Geral de Reinserção e dos Serviços Prisionais e ao dever de, no prazo de 3 (três) anos, a contar do trânsito em julgado da presente decisão, proceder ao pagamento ao Estado da quantia de 3 (três) mil euros – artigos 50º, 51º e 53º do CPenal;
c. Manter, no mais a decisão recorrida.
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Sem Custas - artigo 513º, nº 1, a contrario do CPPenal.
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O Acórdão foi processado em computador e elaborado e revisto integralmente pelo Relator (artigo 94º, nº 2, do CPPenal), sendo assinado pelo próprio e pelos Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos.
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Supremo Tribunal de Justiça, 14 de maio de 2025
Carlos de Campos Lobo (Relator)
Horácio Correia Pinto (1º Adjunto)
Maria Margarida Ramos de Almeida (1ª Adjunta)
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1. Consigna-se que apenas se transcrevem as partes do texto que não constituem a reprodução dos diversos articulados existentes e já referidos no Relatório e, bem assim, excertos do Acórdão propalado em 1ª instância e transcrição de jurisprudência que, em momento oportuno, e se necessário, se referirão.
2. Cf. Referência Citius ......67.
3. Publicado no Diário da República de 28 de dezembro de 1995, na 1ª Série A.
4. SILVA, Germano Marques da, Direito Processual Penal Português, vol. 3, 2015, Universidade Católica Editora, p. 335; SIMAS SANTOS, Manuel e LEAL-HENRIQUES, Manuel, Recursos Penais, 8ª edição, 2011, Rei dos Livros, p. 113.
5. Neste sentido, que constitui jurisprudência dominante, podem consultar-se, entre outros, o Acórdão do STJ, de 12/09/2007, proferido no Processo nº 07P2583, que se indica pela exposição da evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial nesta matéria, disponível em www.dgsi.pt.
6. Apenas se transcrevem os factos com interesse e relevância para o arguido aqui recorrente.
7. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ de 11/04/2024, proferido no Processo nº 2/23.9GBTMR.S1 (…) em conformidade com a jurisprudência uniforme do STJ no sentido da abstenção de princípio do tribunal de recurso na definição do quantum concreto das penas fixadas em tais circunstâncias, por não se verificar qualquer desvio daqueles critérios e parâmetros de que resulte uma situação de injustiça das penas, por desproporcionalidade ou desnecessidade -, de 18/05/2022, proferido no Processo nº 1537/20.0GLSNT.L1.S1 – (…) A sindicabilidade da medida concreta da pena em recurso abrange a determinação da pena que desrespeite os princípios gerais respectivos, as operações de determinação impostas por lei, a indicação e consideração dos factores de medida da pena, mas “não abrangerá a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena, excepto se tiverem sido violadas regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada” -, de 19/06/2019, proferido no Processo nº 763/17.4JALRA.C1.S1- (…) justifica-se uma intervenção correctiva quanto à pena aplicada ao arguido, reduzindo-se a pena de (…) para (…) que entendemos adequada e justa e proporcional e que satisfaz as exigências de prevenção, respeitando a medida da culpa - , disponíveis em www.dgsi.pt.
8. Neste sentido, o Acórdão do STJ de 27/05/2009, proferido no Processo nº 09P0484, disponível em www.dgsi.pt, onde se pode ler (…) no recurso de revista pode sindicar-se a decisão de determinação da medida da pena, quer quanto à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, quer quanto à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, salvo perante a violação das regras da experiência, ou a desproporção da quantificação efectuada.
9. Os fins das penas “…só podem ter natureza preventiva – seja de prevenção geral, positiva ou negativa, seja de prevenção especial, positiva ou negativa -, não natureza retributiva. O direito penal e o seu exercício pelo Estado fundamentam-se na necessidade estatal de subtrair à disponibilidade (e à “autonomia”) de cada pessoa o mínimo dos seus direitos, liberdades e garantias indispensável ao funcionamento, tanto quanto possível sem entraves, da sociedade, à preservação dos seus bens jurídicos essenciais; e a permitir por aqui, em último termo, a realização mais livre possível da personalidade de cada um enquanto indivíduo e enquanto membro da comunidade (…)”, DIAS, Jorge Figueiredo - DIREITO PENAL Parte Geral, Tomo I Questões Fundamentais e Doutrina Geral do Crime - Coimbra Editora, p. 75.
10. JAKOBS, Gunter – Derecho Penal, Marcial Pons, 2ª Edição, Parte General, p.11 e ss.
11. Acórdão do STJ de 13/01/2010 .Coletânea de Jurisprudência (CJ), Acórdãos do STJ, Ano XVIII, Tomo I, p. 181.
12. ALBUQUERQUE, Paulo Pinto – Comentário do Código Penal, à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 4ª edição atualizada, 2021, Universidade Católica Editora, p. 227.
13. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 25/09/2024, proferido no Processo nº 2327/22.1PBPDL.S1 – (…) Devendo o tribunal, na opção pela pena de multa (artigo 70.º do CP), guiar-se apenas pelas necessidades de prevenção geral e especial que o caso impõe e tendo em conta que ao recorrente deverá aplicar-se uma pena única, por o crime de ameaça se encontrar numa relação de concurso efetivo com o crime de roubo, a que corresponde uma pena de prisão, a aplicação de uma pena mista de prisão e de multa, afastada das opções do Código Penal, não se revelaria adequada à satisfação das exigências de prevenção que a aplicação da pena única visa realizar (…) -, de 04/02/2016, proferido no Processo n.º 26/13.4GGIDN.S1 – (…) o juízo que importa fazer, sobre a preferência pela aplicação de uma pena de multa, em detrimento da pena privativa da liberdade, é completamente diferente quando, em função da prática de outro ou outros crimes, o arguido esteja inevitavelmente sujeito a uma condenação em pena de prisão (…) – disponíveis em www.dgsi.pt.
14. Neste sentido, entre outros, o Acórdão do STJ de 28/4/2010, proferido no Processo 4/06.0GACCH.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt. - I - Fundamental na formação da pena conjunta é a visão de conjunto, a eventual conexão dos factos entre si e a relação «desse bocado de vida criminosa com a personalidade». A pena conjunta deve formar-se mediante uma valoração completa da pessoa do autor e das diversas penas parcelares. Para a determinação da dimensão da pena conjunta o decisivo é que, antes do mais, se obtenha uma visão conjunta dos factos, ou seja, a relação dos diversos factos entre si em especial o seu contexto; a maior ou menor autonomia; a frequência da comissão dos delitos; a diversidade ou igualdade dos bens jurídicos protegidos violados e a forma de comissão bem como o peso conjunto das circunstâncias de facto sujeitas a julgamento mas também a receptividade à pena pelo agente deve ser objecto de nova discussão perante o concurso ou seja a sua culpa com referência ao acontecer conjunto da mesma forma que circunstâncias pessoais, como por exemplo uma eventual possível tendência criminosa.
II - Será, assim, o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).
III - A substituição daquela operação valorativa por um processo de índole essencialmente aritmética de fracções e somas torna-se incompatível com a natureza própria da segunda fase do processo. Com efeito, fazer contas indica voltar às penas já medidas, ao passo que o sistema parece exigir um regresso aos próprios factos. Dito de outro modo, e como refere Cláudia Santos (RPDC, Ano 16.º, pg. 154 e ss.), as operações aritméticas podem fazer-se com números, não com valorações autónomas.
IV - Por outro lado, importa determinar os motivos e objectivos do agente no denominador comum dos actos ilícitos praticados e, eventualmente, dos estados de dependência. Igualmente deve ser expressa a determinação da tendência para a actividade criminosa revelada pelo número de infracções, pela sua perduração no tempo, pela dependência de vida em relação àquela actividade.
V - Na avaliação da personalidade expressa nos factos é todo um processo de socialização e de inserção, ou de repúdio, pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade que deve ser ponderado.
15. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 27/05/2015, proferido no Processo nº 173/08.4PFSNT-C.S1, de 14/07/2022, proferido no Processo nº 36/15.7PDCSC-A.S1 - para a determinação da medida da pena única, como já acima se disse, há que ponderar o conjunto dos factos que integram os crimes em concurso, procedendo-se a uma avaliação da gravidade da ilicitude global dos mesmos (tendo em conta o tipo de conexão entre os factos em concurso), e a uma avaliação da personalidade do agente (aferindo-se em que termos é que a mesma se projecta nos factos por si praticados), de forma a apurar se a sua conduta traduz já uma tendência para a prática de crimes, ou se a sua conduta se reconduz apenas a uma situação de pluriocasionalidade (…) -, de 24/03/2021, proferido no Processo nº 536/16.1GAFAF.S1 - (…) na determinação da pena única devem considerar-se todos os factos, crimes e penas aplicados, para a obtenção da imagem do “comportamento global” e da personalidade do agente (…), disponíveis em www.dgsi.pt.
16. Neste sentido, DIAS, Jorge de Figueiredo, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Aequitas – Editorial Notícias, pp. 290-292.
17. Neste sentido, DIAS, Jorge de Figueiredo, ibidem, p. 292.
18. Entende-se, na verdade, que todo o palco factual aqui em presença, e comparando com os outros coarguidos, impõe uma intervenção corretiva nesta dimensão, ainda que habitualmente não seja o caminho que se vem seguindo.
19. DIAS, Jorge de Figueiredo, Direito Penal Português- As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Aequitas, Editorial Notícias, p. 334.