I - Poderá constituir fundamento de recusa da execução do Mandado de Detenção Europeu a violação do disposto no artigo 3º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos (segundo o qual «Ninguém pode ser submetido a torturas, nem a penas ou tratamentos desumanos ou degradantes»), de acordo com a jurisprudência consolidada do TEDH e do TJUE - apesar de a Decisão Quadro 2002/584/ JAI do Conselho, de 13 de Junho de 2002 e a Decisão-Quadro 2009/299/ JAI, do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2009, que a altera, não contemplar nenhuma causa explícita de recusa nesse sentido, o mesmo acontecendo com a Lei n.º 65/2003 de 23/8.
II - No acórdão Dorobantu, de 15 de outubro de 2019 (processo C-128/18), o TJUE afirmou que o caráter absoluto da proibição de tratamentos desumanos ou degradantes obsta a que possam sobrepor-se-lhe considerações relativas à eficácia da cooperação judiciária em matéria penal, pelo que a necessidade de garantir que a pessoa em causa não será sujeita a tais tratamentos justifica, excecionalmente, uma limitação dos princípios da confiança e do reconhecimento mútuos.
III - Daí que, de acordo com a jurisprudência do TJUE, perante elementos objetivos, fiáveis, precisos e atualizados que confirmem a existência de deficiências, sistémicas ou generalizadas, nas condições de detenção no Estado-Membro de emissão, a autoridade judiciária de execução deve pedir informações complementares para verificar, de maneira concreta e precisa, se existem motivos sérios e comprovados para considerar que a pessoa objeto do mandado correrá um risco real de tratamento desumano ou degradante em caso de entrega (casos Aranyosi e Cãldãraru - processos C-404/15 e C-659/15 PPU).
(Sumário da responsabilidade da Relatora)
Mandado de detenção europeu
Acordam, em conferência, na 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto.
I. Relatório
A Ex.ma Sra. Procuradora-Geral Adjunta neste Tribunal promoveu o cumprimento do mandado de detenção europeu, emitido pelo Tribunal de Cuneo, República da Itália, relativo ao requerido AA, cidadão de nacionalidade Portuguesa e atualmente residente em …, nos termos do disposto nos artigos 15.º, n.º 1 e 16.º, n.º 1 da Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto, visando a sua detenção, nos termos do art.º 16.º, n.º 5 do referido diploma legal, e subsequente entrega à justiça da República da Itália, como Estado-Membro de emissão, para procedimento criminal.
Procedeu-se à audição a que se reporta o artigo 18.º da Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto, com a comparência do requerido neste tribunal, o qual, após ser esclarecido sobre a existência e o conteúdo do mandado de detenção europeu, bem como sobre o direito que lhe assiste de se opor à execução, os termos em que o pode fazer e as consequências de um eventual consentimento e sobre a faculdade de renunciar ao princípio da especialidade, declarou não renunciar a este princípio e não consentir na sua entrega às autoridades de emissão.
Pediu ainda prazo para apresentar, por escrito, a sua oposição, o que lhe foi concedido, nos termos do art.º 21.º, n.ºs 3 e 4, da Lei n.º 65/2003, de 23/8.
Na mesma diligência foi determinado que o requerido aguardasse os ulteriores termos do processo sujeito a detenção no estabelecimento prisional, por forma a garantir a efetivação da entrega.
Os factos que consubstanciam tal pedido formulado pelo Estado da República da Itália são, em síntese, os seguintes:
No dia 3/3/2023, «com o objetivo de obter um lucro injusto, em cumplicidade com outros coautores do crime, entrou furtivamente na casa da vítima» [situada na via ..., ..., em ...] «e, depois de a imobilizar violentamente com uma toalha molhada e uma arma, roubou 3500 euros e um anel de ouro».
«A pessoa procurada, com o papel de promotor e organizador, identificou o material necessário para a prática do crime e atribuiu várias tarefas a serem executadas pelos parceiros.
A pessoa procurada, antes do roubo, fez uma busca na casa da vítima e obteve informações sobre o paradeiro do dinheiro e das joias da vítima” – cf. formulário do MDE, redigido na língua portuguesa, constante dos autos (referência citius 416835).
«AA, requerido no mandado de detenção europeu, NÃO CONSENTINDO NA SUA ENTREGA AO ESTADO MEMBRO DE EMISSÃO, no caso, ITÁLIA, vem mui respeitosamente, apresentar a sua OPOSIÇÃO nos termos do artigo 21º da Lei n.º 65/2003, nos termos e com os seguintes fundamentos:
1) O Requerido não consente na sua entrega ao abrigo do MDE, o que desde logo se declara expressamente.
2) O Requerido é pai de um recém-nascido, tendo o filho nascido há cerca de 15 dias, estando por isso no exercício ativo de responsabilidades parentais e em contexto familiar delicado.
3) Pertence à etnia cigana, grupo historicamente marginalizado e alvo de discriminação em diversos contextos institucionais, incluindo os sistemas de justiça penal e prisional em vários Estados-Membros.
4) Nunca esteve em Itália, o que torna ainda mais inexplicável a emissão do MDE.
5) O MDE em causa tem como único objetivo a execução de atos de investigação (instrução), e não de condenação ou cumprimento de pena. A jurisprudência nacional e europeia admite maior exigência na avaliação da proporcionalidade e necessidade de entrega nestes casos.
6) O aqui requerente teme pela violação dos seus direitos humanos, pela sua vida, pela sua saúde, pela sua dignidade humana.
AUSÊNCIA OU INSUFICIÊNCIA DE ELEMENTOS FACTUAIS E PROBATÓRIOS
7) O Mandado de Detenção Europeu emitido pela autoridade judiciária italiana, com vista à entrega do Requerido, não contém elementos factuais e probatórios suficientes que permitam aferir, com segurança, a alegada participação do detido nos factos que lhe são imputados.
8) O MDE não veio acompanhado de impressões digitais ou exames biométricos que provem que o detido corresponde ao indivíduo procurado.
9) Entendemos, salvo melhor opinião, que o MDE carece dos elementos indiciários mínimos que sustentem a emissão do MDE, conforme o artigo 8.º da Decisão-Quadro 2002/584/JAI, transposto para o direito português pela Lei n.º 65/2003 é obrigatório conter, a descrição dos factos imputados, a qualificação jurídica dos mesmos, a moldura penal aplicável e os elementos indiciários mínimos que sustentem a emissão do MDE.
10) No caso em apreço, o MDE apresenta apenas uma referência genérica à prática de um ilícito, sem qualquer descrição concreta dos factos, local, data ou envolvimento específico do requerido, o que compromete gravemente o exercício do contraditório e a defesa.
11) Faz uma descrição generalizada dos factos e nem foi entregue totalmente traduzida ao requerente.
12) Aliás, naquele período, o aqui requerente não se encontrava no país em questão, mas sim a trabalhar como servente na empresa A... no período de novembro de 2022 a julho de 2023, conforme declaração de honra que se junta.
13) Assim, requer-se a este Tribunal que, ao abrigo do disposto no artigo 17.º, n.º 2, da Lei n.º 65/2003, determine que seja solicitado à autoridade judiciária italiana o envio, com urgência, das seguintes informações complementares:
a) A descrição detalhada dos factos imputados ao requerido;
b) Os elementos de prova ou indícios que fundamentam a suspeita ou acusação.
14) Dado que o processo que decorre em Itália esta ainda numa fase instrutória ou de investigação.
15) O aqui requerente, tem sérias dúvidas sobre um julgamento justo na Itália, acredita que pode haver o risco de prisão preventiva prolongada sem acusação formal.
16) Teme a ausência de garantias processuais, tais como: a falta de direito à defesa adequada.
17) Atento ao princípio da proporcionalidade o MDE deve ser um último recurso.
18) Pode, salvo melhor entendimento, a Itália obter a cooperação do requerente por meios menos restritivos, mesmo cumprindo a medida de prisão preventiva em Portugal ou outras.
DO RISCO DE VIOLAÇÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS
19) A entrega do requerente à República Italiana, para cumprimento de pena ou para fins de processo penal, comporta sério risco de violação do seu direito fundamental à dignidade humana e à integridade física e psíquica, em razão das precárias condições do sistema penitenciário italiano.
20) O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), no caso Torreggiani e outros vs. Itália (2013), condenou a Itália por violação do artigo 3º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH), considerando que a superlotação crônica em suas prisões constitui tratamento desumano e degradante.
21) Naquele caso, verificou-se que os reclusos dispunham de menos de 3 m² de espaço individual, além da carência de ventilação, iluminação e acesso adequado a instalações sanitárias.
22) Tal decisão foi vinculada ao mecanismo de decisão-piloto, forçando o Estado italiano a adotar medidas estruturais.
23) Ainda assim, relatórios recentes de organizações como o Comité para a Prevenção da Tortura (CPT) e o Antigone Report continuam a apontar falhas sistemáticas em diversos estabelecimentos prisionais italianos, inclusive em aspetos relacionados à:
• Superlotação e celas insalubres;
• Falta de acesso a cuidados médicos e psicológicos adequados;
• Violência institucional e suicídios em prisão preventiva.
24) Nos termos do Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia nos processos C-404/15 e C-659/15 PPU, os tribunais nacionais devem verificar, caso a caso, se existem razões sérias e comprovadas para crer que o indivíduo em causa será exposto, no Estado de emissão do MDE, a um risco real de violação dos seus direitos fundamentais. (acórdão disponível em CURIA - List of results e CURIA - Case information).
25) Relatórios recentes de organizações independentes, como o Comité Europeu para a Prevenção da Tortura (CPT) e a associação italiana Antigone, CONTINUAM A APONTAR FALHAS SISTEMÁTICAS em diversos estabelecimentos prisionais italianos, inclusive em aspetos relacionados à:
• Superlotação constante e sistemática, com celas que não oferecem o espaço mínimo recomendado por pessoa presa/detida (menos de 3 m²), em violação das orientações estabelecidas pelo TEDH;
• Falta de acesso adequado a cuidados médicos e psicológicos, especialmente no tratamento de doenças mentais e dependências, o que coloca em risco a integridade física e psíquica das pessoas presas ou detidas;
• Má condição sanitária, com instalações degradadas, falta de ventilação, chuveiros e acesso limitado à luz natural;
• Violência institucional e uso excessivo da força por parte de guardas prisionais, conforme documentado em investigações internas e denúncias públicas;
• Tratamento discriminatório e ineficiência na proteção de pessoas presas ou detidas em situação de vulnerabilidade, como estrangeiros, pessoas LGBTQIA+ e portadores de deficiência.
26) O Relatório Antigone de 2023, por exemplo, destaca que “a superlotação voltou a níveis críticos em diversas regiões, particularmente no sul da Itália”, e que “há falhas persistentes no respeito aos direitos dos detentos à saúde, à integridade pessoal e à dignidade humana”, para consulta: Nodo alla gola - XX Rapporto di Antigone sulle condizioni di detenzione.
27) Já o Comité Europeu para a Prevenção da Tortura e das Penas ou Tratamentos Desumanos ou Degradantes, na sua visita mais recente à Itália (cujo relatório foi publicado em dezembro de 2024), expressou preocupação com a persistência de práticas incompatíveis com os padrões europeus de detenção, incluindo relatos de tratamento degradante e negligência médica sistemática em determinados estabelecimentos, incluindo relatos de tratamento degradante e negligência médica sistemática em determinados estabelecimentos. Para consulta: Anti-torture Committee publishes report on ad hoc visit to Italy – CPT.
28) No relatório podemos ler um trecho que refere ”o CPT também condenou a “prática generalizada” de administração de drogas psicotrópicas não-prescritas aos detidos em Potenza, um dos quatro centros visitados. Pode-se consultar notícia no Observador: Conselho da Europa critica Itália por abusos na detenção de migrantes – Observador.
29) Indicam ainda que a situação nas prisões italianas continua preocupante, especialmente em relação à superlotação e falta de assistência médica adequada.
30) O CPT observou que as prisões italianas operavam com uma taxa de ocupação de 114% da capacidade oficial de 50.863 lugares, indicando superlotação significativa.
31) Essa situação compromete as condições materiais e o tratamento dos detidos.
32) O relatório enfatizou a necessidade de uma estratégia abrangente para abordar a superlotação e melhorar as condições materiais nas prisões visitadas, conforme documento 1 que se junta.
33) O relatório documentou casos de maus-tratos físicos e uso excessivo de força por parte de policias contra estrangeiros detidos.
34) Além disso, foi criticada a prática generalizada de administração de psicotrópicos não prescritos aos detidos, particularmente no CPR de Potenza.
35) O CPT também destacou o ambiente carcerário dos CPRs, com elementos como telas de malha metálica tripla nas janelas e áreas externas semelhantes a gaiolas, além da falta de atividades significativas para os detidos, conforme documento 2 que se junta.
36) Foram relatados casos de maus-tratos físicos por parte de agentes penitenciários, incluindo agressões em áreas não cobertas por câmaras de vigilância, conforme documento 4 que se junta.
37) Assim, podemos concluir com estes relatórios recentes do Conselho da Europa e do Comitê Europeu para a Prevenção da Tortura (CPT) INDICAM QUE O PROBLEMA PERSISTE, COLOCANDO QUALQUER DETENTO EM RISCO DE TRATAMENTO DEGRADANTE.
38) Além disso, HÁ UM RISCO REAL E CONCRETO de que o requerente seja submetido a tais condições caso seja extraditado.
39) De acordo com a Decisão-Quadro 2002/584/JAI do Conselho da União Europeia, a execução do MDE pode ser recusada se houver risco de violação dos direitos fundamentais do requerido.
40) O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) já decidiu que um MDE pode ser recusado quando houver risco de que a pessoa fique detida em condições que violem o Artigo 3º da CEDH.
41) Nos termos da jurisprudência do TEDH, a ITÁLIA TEM UM HISTÓRICO DE PRISÕES SUPERLOTADAS E SEM INFRAESTRUTURA ADEQUADA, E A ENTREGA DO REQUERENTE VIOLARIA SEUS DIREITOS FUNDAMENTAIS, O QUE JUSTIFICA A NÃO EXECUÇÃO DO MDE.
42) Em suma, no pelo exposto demonstramos o seguinte:
i. Falta de consentimento à entrega: o Requerido não consente na sua entrega ao abrigo do MDE, o que desde logo se declara expressamente.
ii. Circunstâncias pessoais e vulnerabilidade agravada: o requerente pertence à etnia cigana, grupo historicamente marginalizado e alvo de discriminação em diversos contextos institucionais, incluindo os sistemas de justiça penal e prisional em vários Estados-Membros.
iii. Finalidade meramente instrutória do MDE: O MDE em causa tem como único objetivo a execução de atos de investigação (instrução), e não de condenação ou cumprimento de pena.
iv. Risco real de violação de direitos fundamentais na Itália: nos termos do artigo 4.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e do artigo 3.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH), a entrega de uma pessoa não pode ser autorizada se existir risco sério de tratamento desumano ou degradante no país requerente.
• JURISPRUDÊNCIA EUROPEIA APLICÁVEL:
i) TJUE – Acórdãos Aranyosi e Căldăraru (C-404/15 e C-659/15 PPU):
ii) Os tribunais devem suspender a execução do MDE se existirem indícios sérios, objetivos e devidamente comprovados de que há um risco real de violação de direitos fundamentais.
• RELATÓRIOS RECENTES CONFIRMAM FALHAS SISTEMÁTICAS NAS PRISÕES ITALIANAS
iii) Relatório Antigone 2023.
iv) “A superlotação voltou a níveis críticos em diversas regiões, particularmente no sul da Itália, comprometendo seriamente os direitos fundamentais dos detidos.”
“Persistem falhas na assistência médica e psicológica, acesso à higiene, ventilação deficiente e celas com menos de 3 m² por pessoa.”
v) Relatório CPT – Conselho da Europa (2024)
vi) “Foram documentados casos de maus-tratos físicos, uso excessivo da força, e administração de psicotrópicos sem prescrição adequada em centros de detenção italianos.”
“A infraestrutura permanece inadequada, e o espaço vital oferecido em muitas celas não respeita o limiar mínimo de dignidade exigido pelo TEDH.”
Perante o exposto, requer-se a Vossa Excelência que:
I. Recuse a execução do Mandado de Detenção Europeu, nos termos do Artigo 3º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos e da jurisprudência consolidada do TEDH e do TJUE;
II. Subsidiariamente, solicite garantias diplomáticas à Itália, comprovando que o requerente não será detido em condições degradantes;
III. Requer-se, ainda, que Vossa Excelência promova, com caráter urgente, nos termos da jurisprudência firmada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia nos processos C-404/15 e C-659/15 PPU (Aranyosi e Căldăraru), o pedido de informação complementar à autoridade judiciária emissora do MDE, de forma a esclarecer:
O estabelecimento prisional concreto onde o Requerido seria detido; As condições físicas da cela atribuída (incluindo área útil, número de ocupantes, ventilação e luz natural); A existência de garantias mínimas de dignidade e acesso a cuidados médicos adequados; Qualquer medida prevista para evitar discriminação étnica ou institucional.
IV. Face à gravidade dos factos invocados, e nos termos da jurisprudência citada, requer-se ainda que seja suspensa a tramitação do processo de execução do MDE até à receção e apreciação da resposta por parte da autoridade italiana.
V. Requer-se, ainda, que Vossa Excelência promova, com caráter urgente, o pedido de informação complementar à autoridade judiciária emissora do MDE, ao abrigo do disposto no artigo 17.º, n.º 2, da Lei n.º 65/2003, determine que seja solicitado à autoridade judiciária, das seguintes informações complementares:
a) A descrição detalhada dos factos imputados ao requerido;
b) Os elementos de prova ou indícios que fundamentam a suspeita ou acusação; suspendendo-se a tramitação até à resposta da mesma».
«Assim, E CONCLUINDO, parece-me que A OPOSIÇÃO DEVERÁ IMPROCEDER, na totalidade, e que deverá ser proferida decisão de execução do presente MDE, com entrega do requerido às autoridades judiciárias italianas, para procedimento criminal, porque:
- O MDE preenche todos os requisitos, quer quanto ao seu conteúdo, quer quanto à forma, previstos no art.º 8º, nº 1 alíneas, a) a g), da Decisão-Quadro do Conselho, de 13 de Junho de 2002 (que corresponde art.º 2º, alíneas a) a g) da Lei nº 65/2003), já que dele consta, nomeadamente, a natureza e qualificação jurídica das infrações (alínea d)), bem como a descrição das circunstâncias em os factos foram cometidos, incluindo o momento, lugar e o grau de participação da pessoa procurada (alínea e), ambas da Lei nº 65/2003), que permitem o controlo pela autoridade judiciária de execução dos factos que motivaram a emissão do MDE;
- Os factos que deram origem à emissão do presente MDE integram a prática dos crimes, de roubo, sequestro de pessoa e posse de arma, previstos pelos art.ºs, 81, 61, 110, 605, 628C.1-3, todos do Código Penal italiano e art.ºs 2-4-7 da Lei italiana n.º 895/1967, e punidos com penas de prisão de máximo de, 20, 8 e 5 anos e 8 meses, respetivamente e o procedimento criminal não se encontra prescrito;
- Sendo igualmente previstos e puníveis, pelo menos, como crime de roubo qualificado, p. e p. pelos art.ºs, 210º, n.ºs 1 e 2, als., a) e b), esta com referência ao art.º 204º, n.º 2, als. e) e f), ambos do Código Penal, com pena de 3 a 15 anos de prisão, não se encontrando, também, prescrito o procedimento criminal à face da lei portuguesa;
- E não existe nenhum motivo para se recusar o cumprimento do MDE, nomeadamente, erro na identidade do detido ou a existência de causa de recusa do MDE.
IV - Em todo o caso, o Ministério Público não se opõe a que seja solicitada, com urgência, às autoridades judiciárias italianas a GARANTIA de que o detido, AA, com nacionalidade portuguesa, não será objeto de um tratamento desumano ou degradante no caso de este Tribunal da Relação do Porto se decidir pela sua entregue e quando for colocado num dos estabelecimento prisionais italianos.
V- Quanto ao demais requerido na oposição – conforme pontos III, IV e V da parte final do requerimento de oposição - parece-me irrelevante para a decisão a proferir, sobre a execução do presente MDE - decisão que terá de se proferida no prazo estabelecido no artigo 26º, n.º 2 da Lei n.º 65/2003, de 23/8, ou seja, 60 dias após a detenção do requerido –, não constitui motivo válido para suspensão da tramitação do processo de execução do MDE nos termos do disposto no art.º 29º, n.º 4 da Lei n.º 65/2003 ou já se encontra junto aos autos, conforme resulta do teor do MDE traduzido para língua portuguesa, com a referência 416835, pelo que deverá ser indeferido».
«[…] Deste modo, e em obediência à jurisprudência do TJUE, com reflexos na recente jurisprudência do STJ nacional (cf. o acórdão do STJ de 19/9/2024, relatado pelo Conselheiro Jorge Gonçalves, in www.dgsi.pt), determina-se que sejam solicitadas informações complementares à autoridade judiciária de emissão, com vista a determinar as concretas condições de encarceramento a que seria sujeito o requerido, e á obtenção de compromisso e garantia de que não será submetido, caso haja de lhe ser entregue, a tratamento degradante ou desumano, considerando, para além do mais, a circunstância de pertencer a um grupo populacional minoritário («roma», vulgo «cigano»).
A entidade judiciária de emissão do presente MDE prestou a garantia que lhe havia sido solicitada, relacionada com a devolução da pessoa alvo do presente MDE ao Estado membro de execução (isto é, ao Estado Português), se nisso consentir, para cumprimento da pena ou a medida de segurança privativas da liberdade a que seja eventualmente condenada, não se pronunciando, porém, quanto à garantia relacionada com as condições dignas, com respeito pelos direitos humanos, do encarceramento preventivo a que a mesma seria temporariamente sujeita.
Na sequência do despacho datado de 24/4/2025 (referência citius 19311519), foi prestada nova informação pela autoridade judiciária de emissão do MDE (cf. o ofício de 7 de maio e documentos anexos – ref.ª citius 19349445), promovendo a Exma. Procuradora- Geral Adjunta nos seguintes moldes:
«Do que me foi possível entender do expediente enviado pelo Tribunal de CUNEO (que traduzi diretamente de italiano para português através do Google tradutor), a Juíza de Instrução refere que, porque se está numa fase de investigação preliminar e a fase de tomada de decisão final e sua execução não serão da sua competência, não pode prestar a garantia solicitada – agora reportada, apenas, à garantia relacionada com as condições dignas, com respeito pelos direitos humanos, do encarceramento preventivo a que o requerido AA seria temporariamente sujeito -, porque “foge à competência e às funções deste juiz prestar qualquer tipo de garantia quanto à situação prisional – área de competência do Departamento de Administração Penitenciária –, cabendo à autoridade judiciária, com base no que dispõe a regulamentação do MAE e nos limites da mesma, garantir a proteção das garantias processuais indisponíveis do acusado exclusivamente no âmbito do processo jurisdicional”.
Assim, em face do informado – e apesar de não terem sido reveladas pela autoridade judiciaria italiana as concretas condições de encarceramento a que será sujeito o requerido, nem obtido o compromisso e garantia de que o mesmo não será submetido, caso lhe seja entregue, a tratamento degradante ou desumano -, tendo em conta que as autoridades judiciárias italianas já prestaram, anteriormente, a garantia da devolução da pessoa alvo do presente MDE ao Estado Português, se nisso consentir, para cumprimento da pena ou da medida de segurança privativas da liberdade a que seja eventualmente condenado o AA, parece-me que tal será suficiente para que se possa proferir decisão sobre a eventual execução do presente MDE, com entrega do requerido às autoridades judiciarias italianas».
Colhidos os vistos, seguiu o processo para conferência, cumprindo apreciar e decidir.
Foi em cumprimento da Decisão-Quadro (DQ) nº 2002/584/JAI do Conselho, de 13 de junho de 2002, que a Lei nº 65/2003, de 23 de agosto, publicada no Diário da República I Série - A, nº 194 de 23 de agosto de 2003, veio aprovar o regime jurídico do mandado de detenção europeu.
O objetivo que a União proclamou de se tornar um espaço de liberdade, de segurança e de justiça conduz à supressão da extradição entre os Estados-Membros e à substituição desta por um sistema de entrega entre autoridades judiciárias, embora as decisões sobre a execução do mandado de detenção europeu devam ser objeto de um controlo adequado, o que implica que deva ser a autoridade judiciária do Estado-Membro onde a pessoa procurada foi detida a tomar a decisão sobre a sua entrega (ponto 8 da DQ).
O mecanismo do mandado de detenção europeu é baseado num elevado grau de confiança entre os Estados-Membros. A execução desse mecanismo só poderá ser suspensa no caso de violação grave e persistente, por parte de um Estado-Membro, dos princípios enunciados no n.º 1 do artigo 6.º do Tratado da União Europeia, verificada pelo Conselho nos termos do n.º 1 do artigo 7.º do mesmo Tratado e com as consequências previstas no n.º 2 do mesmo artigo (ponto 10 da DQ).
Como é salientado no acórdão do STJ de 9/8/2013 [1], o princípio do reconhecimento mútuo é fundado na premissa de que os Estados membros confiam mutuamente na qualidade dos seus procedimentos penais nacionais, justificando uma cooperação alargada no combate ao crime que adquiriu uma dimensão nova: “expandiu-se, corporativizou-se e globalizou-se” (cf. Anabela Miranda Rodrigues, “Um sistema sancionatório penal para a União Europeia – entre a unidade e diversidade ou os caminhos da harmonização”, in RPCC, Ano 13, Janeiro-Março 2003, pág. 34).
O princípio do reconhecimento mútuo reúne as ideias de convergência e de proximidade, pressupondo o princípio da confiança mútua, que, não sendo criado por decreto, assenta nos princípios da liberdade, da democracia, do respeito pelos direitos do homem e pelas liberdades fundamentais, bem como do Estado de Direito (cf. António L. Santos Alves, in RMP, Ano 103, pág. 68, nota 11). Por isso, o controle indiciário da prática do crime pela autoridade judiciária do Estado da execução não tem cabimento no mandado de detenção europeu.
Nesta ordem de ideias, veio dispor o art.º 1.º da Lei 65/2003, de 23 de agosto, que:
1. O mandato de detenção europeu é uma decisão judiciária emitida por um Estado membro com vista à detenção e entrega por outro Estado membro de uma pessoa procurada para efeitos de procedimento criminal ou para cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativa de liberdade.
2. O mandado de detenção europeu é executado com base no princípio do reconhecimento mútuo e em conformidade com o disposto na presente lei e na Decisão Quadro n.º 2002/584/JAI, do Conselho, de 13 de junho.
O princípio do reconhecimento mútuo traduz-se em que uma decisão judicial tomada por uma autoridade judiciária de um Estado membro com base na sua legislação interna será reconhecida e executada pela autoridade judiciária de outro Estado membro, produzindo efeitos pelo menos equivalentes a uma decisão tomada por uma autoridade judiciária nacional.
Não obstante, é possível ou imposta a recusa de execução do MDE, intervindo aqui uma reserva de soberania do Estado de execução, sendo imposta nos casos previstos no artigo 11.º do citado diploma legal ou permitida nos casos dos artigos 12.º e 12.º-A.
No presente caso, a entrega do requerido foi solicitada para efeito de prossecução de procedimento criminal por crimes de roubo, sequestro e detenção de arma, puníveis, segundo a lei do Estado membro de emissão, com penas de prisão de máximo de 20, 8 e 5 anos e 8 meses, respetivamente.
Assim, face ao disposto no art.º 2.º da Lei n.º 65/2003, de 23/8, os ilícitos imputados à pessoa procurada englobam-se no âmbito do MDE (factos puníveis, pela lei do Estado membro de emissão, com pena ou medida de segurança privativas da liberdade de duração máxima não inferior a 12 meses ou, quando tiver por finalidade o cumprimento de pena ou de medida de segurança, desde que a sanção aplicada tenha duração não inferior a 4 meses). Além disso, tratando-se de crimes previstos no nº 2 do artigo 2º da Lei 65/2003 – concretamente, crimes de sequestro e de roubo, incluídos nas alíneas q) e s) – fica dispensado o controlo da dupla incriminação.
Não se verifica, ainda, nenhum dos motivos previstos no art.º 11.º (motivos de não execução obrigatória do mandado de detenção europeu) [2] ou no n.º 1 do art.º 12.º (motivos de não execução facultativa do mandado de detenção europeu) [3]como fundamento de recusa de execução do mandado de detenção europeu.
A pessoa procurada pode não consentir na sua entrega ao Estado membro de emissão, mas essa oposição só pode fundar-se em erro na identidade do detido ou na existência de causa de recusa de execução do mandado de detenção europeu (cf. o art.º 21.º, n.º 2, da Lei n.º 65/2003) – e nenhuma destas circunstâncias se verifica no caso concreto.
Como na teleologia essencial do MDE não cabe qualquer juízo de mérito sobre a decisão da autoridade judiciária de proceder criminalmente contra a pessoa procurada, não constitui causa de recusa de execução do MDE o suposto erro na apreciação das provas oferecidas pelo recorrente com vista a demonstrar não poder ter sido ele o autor dos crimes por que é pedida a sua detenção e entrega às autoridades estrangeiras. Esta matéria tem a sua sede no âmbito do próprio processo crime em que é pedida a detenção e a entrega do recorrente [4].
Mostra-se, assim, irrelevante argumentar, como faz o requerido na oposição, que «o Mandado de Detenção Europeu emitido pela autoridade judiciária italiana, com vista à entrega do Requerido, não contém elementos factuais e probatórios suficientes que permitam aferir, com segurança, a alegada participação do detido nos factos que lhe são imputados». Ou, ainda, que «o MDE não veio acompanhado de impressões digitais ou exames biométricos que provem que o detido corresponde ao indivíduo procurado», pois, como bem assinala a Exa. Procuradora-Geral Adjunta, o MDE contém a correta identificação da pessoa cuja detenção provisória se pretende e tal identificação corresponde exatamente à correta identificação do requerido AA, não existindo, por isso, qualquer erro de identidade.
É certo, porém, que poderá constituir fundamento de recusa da execução do Mandado de Detenção Europeu a violação do disposto no artigo 3º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos (segundo o qual «Ninguém pode ser submetido a torturas, nem a penas ou tratamentos desumanos ou degradantes»), de acordo com a jurisprudência consolidada do TEDH e do TJUE - apesar de a Decisão Quadro 2002/584/ JAI do Conselho, de 13 de Junho de 2002 e a Decisão-Quadro 2009/299/ JAI, do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2009, que a altera, não contemplar nenhuma causa explícita de recusa nesse sentido, o mesmo acontecendo com a Lei n.º 65/2003 de 23/8, como bem faz notar a Exma. PGA na contestação à oposição.
No acórdão Dorobantu, de 15 de outubro de 2019 (processo C‑128/18), o TJUE afirmou que o caráter absoluto da proibição de tratamentos desumanos ou degradantes obsta a que possam sobrepor-se-lhe considerações relativas à eficácia da cooperação judiciária em matéria penal, pelo que a necessidade de garantir que a pessoa em causa não será sujeita a tais tratamentos justifica, excecionalmente, uma limitação dos princípios da confiança e do reconhecimento mútuos.
Daí que, como se assinala no acórdão do STJ de 19/9/2024 [5], «Segundo jurisprudência do TJUE, perante elementos objetivos, fiáveis, precisos e atualizados que confirmem a existência de deficiências, sistémicas ou generalizadas, nas condições de detenção no Estado-Membro de emissão, a autoridade judiciária de execução deve pedir informações complementares para verificar, de maneira concreta e precisa, se existem motivos sérios e comprovados para considerar que a pessoa objeto do mandado correrá um risco real de tratamento desumano ou degradante em caso de entrega (casos Aranyosi e Cãldãraru - processos C-404/15 e C-659/15 PPU)».
No presente caso, o requerido invoca que relatórios recentes confirmam a subsistência de falhas sistémicas nas prisões italianas (como acontece, de resto, noutros países da UE, Portugal incluído, levando recentemente o TEDH a condenar o Estado Português, no acórdão proferido no dia 22/2/2024 - caso MARQUES ÂNGELO C. PORTUGAL -, por violação, não só do art.º 3.º, mas também do art.º 13.º da CEDH [6]), apontando o Relatório Antigone de 2023 que «A superlotação voltou a níveis críticos em diversas regiões, particularmente no sul da Itália, comprometendo seriamente os direitos fundamentais dos detidos» e, ainda, que «Persistem falhas na assistência médica e psicológica, acesso à higiene, ventilação deficiente e celas com menos de 3 m² por pessoa».
Analisado o teor do referido Relatório Antigone, constatamos que, efetivamente, tais deficiências são assinaladas, ali se referindo também que «o crescimento da superlotação leva a condições de detenção cada vez mais desumanas».
Contudo, e como bem salienta a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, no presente caso não se comprova a verificação de um risco real e sério de violação dos direitos fundamentais do requerido AA, nomeadamente um risco efetivo de tratamento degradante e desumano, sendo entregue às autoridades judiciárias italianas para efeitos de procedimento criminal e colocado num dos seus estabelecimentos prisionais.
Com efeito, a invocação deste risco pelo requerido, na oposição deduzida, baseia-se unicamente nas informações contidas no Relatório ANTIGONE 2023 e no Relatório CPT – Conselho da Europa (2024). Ora, se é verdade que o Relatório ANTIGONE 2023 documenta, efetivamente, deficiências no sistema prisional Italiano, designadamente sobrelotação de alguns estabelecimentos prisionais, tal sucede particularmente com aqueles situados no sul da República da Itália - sendo que o requerido deveria ser entregue às autoridades judiciárias junto do Tribunal de CUNEO, situado no norte de Itália -, parecendo-nos, para além disso, que as situações mais críticas ali descritas relacionam-se com os centros de detenção de migrantes, posição em que não se encontra, naturalmente, o requerido, cidadão português e, consequentemente, da União Europeia.
Finalmente, e como se observa no acórdão do STJ de 9/8/2013, importa ter presente que “O regime jurídico do MDE, em cumprimento da Decisão-Quadro n.º 2002/584/JAI do Conselho, de 13-06-2002, permite no seu art.º 5.º que cada Estado membro de execução possa sujeitar a execução do MDE a condições, como a prevista no n.º 3, que se refere à sujeição da entrega para efeitos de procedimento penal de nacional ou residente do Estado membro de execução, à condição de que a pessoa, após ter sido ouvida, seja devolvida ao Estado membro de execução para nele cumprir a pena ou medida de segurança privativas de liberdade proferida contra ela no Estado membro de emissão. [...] A entrega da pessoa procurada ao Estado de emissão tem natureza temporária, é apenas para efeitos de procedimento penal (e não para cumprimento de pena) e apenas ocorrerá se o Estado de emissão prestar a garantia de que após ser ouvida, será devolvida ao Estado membro de execução para nele cumprir a pena ou a medida de segurança privativas da liberdade a que seja eventualmente condenada”.
No presente caso, o Estado da República da Itália prestou previamente a garantia de que a pessoa procurada será devolvida ao Estado membro de execução, se nisso consentir, para nele cumprir a pena ou a medida de segurança privativa da liberdade a que seja eventualmente condenada.
É, pois, de autorizar a entrega do requerido ao Estado membro de emissão, nos termos da condição prevista na alínea c) do art.º 13.º, da Lei 65/2003, de 23/8, tendo sido prestada previamente a correspondente garantia por aquele Estado (como aliás dispõe o n.º 3 do art.º 5.º da referida Decisão-Quadro) e não se comprovando que a sua entrega às autoridades judiciárias italianas para efeitos de procedimento criminal e subsequente colocação temporária num estabelecimento prisional colocaria, efetivamente, o requerido em risco de tratamento degradante e desumano.
Pelo exposto, acordam os juízes da segunda secção criminal do Tribunal da Relação do Porto em deferir a execução do mandado de detenção europeu emitido pela autoridade judiciária da República da Itália contra o requerido AA, de nacionalidade portuguesa e residente em Portugal, sem prejuízo de posterior observância do disposto no art.º 5, n.º 3 da Decisão-Quadro n.º 2002/584/JAI do Conselho, de 13/6/2002.
Sem custas.
Notifique os sujeitos processuais e comunique à autoridade judiciária de emissão, ao Gabinete Nacional da Interpol e ao EP.
Após trânsito, proceda-se às diligências necessárias com vista à entrega do requerido às autoridades judiciárias italianas no prazo de dez dias (artigo 29.º, n.º 2 da Lei n.º 65/2003, de 23/8).
Liliana Páris Dias (Desembargadora Relatora)
Maria Deolinda Dionísio (Desembargadora 1ª adjunta)
José Castro (Desembargador 2º adjunto)
____________________________
[1] Relatado pelo Conselheiro Pires da Graça e disponível em www.dgsi.pt.
[2] Norma com o seguinte teor:
«A execução do mandado de detenção europeu é recusada quando:
a) A infração que motiva a emissão do mandado de detenção europeu tiver sido amnistiada em Portugal, desde que os tribunais portugueses sejam competentes para o conhecimento da infração;
b) A pessoa procurada tiver sido definitivamente julgada pelos mesmos factos por um Estado-Membro desde que, em caso de condenação, a pena tenha sido integralmente cumprida, esteja a ser executada ou já não possa ser cumprida segundo a lei do Estado-Membro onde foi proferida a decisão;
c) A pessoa procurada for inimputável em razão da idade, nos termos da lei portuguesa, em relação aos factos que motivam a emissão do mandado de detenção europeu;
d) (Revogada.)
e) (Revogada.)
f) (Revogada.)»
[3] Norma com o seguinte teor:
1 - A execução do mandado de detenção europeu pode ser recusada quando:
a) (Revogada.)
b) Estiver pendente em Portugal procedimento penal contra a pessoa procurada pelo facto que motiva a emissão do mandado de detenção europeu;
c) Sendo os factos que motivam a emissão do mandado de detenção europeu do conhecimento do Ministério Público, não tiver sido instaurado ou tiver sido decidido pôr termo ao respetivo processo por arquivamento;
d) A pessoa procurada tiver sido definitivamente julgada pelos mesmos factos por um Estado-Membro em condições que obstem ao ulterior exercício da ação penal, fora dos casos previstos na alínea b) do artigo 11.º;
e) Tiverem decorrido os prazos de prescrição do procedimento criminal ou da pena, de acordo com a lei portuguesa, desde que os tribunais portugueses sejam competentes para o conhecimento dos factos que motivam a emissão do mandado de detenção europeu;
f) A pessoa procurada tiver sido definitivamente julgada pelos mesmos factos por um Estado terceiro desde que, em caso de condenação, a pena tenha sido integralmente cumprida, esteja a ser executada ou já não possa ser cumprida segundo a lei do Estado da condenação;
g) A pessoa procurada se encontrar em território nacional, tiver nacionalidade portuguesa ou residir em Portugal, desde que o mandado de detenção tenha sido emitido para cumprimento de uma pena ou medida de segurança e o Estado Português se comprometa a executar aquela pena ou medida de segurança, de acordo com a lei portuguesa;
h) O mandado de detenção europeu tiver por objeto infração que:
i) Segundo a lei portuguesa tenha sido cometida, em todo ou em parte, em território nacional ou a bordo de navios ou aeronaves portugueses; ou
ii) Tenha sido praticada fora do território do Estado-Membro de emissão desde que a lei penal portuguesa não seja aplicável aos mesmos factos quando praticados fora do território nacional.
[4] Cf., neste sentido, o acórdão do STJ de 14/7/2014, relatado pela Conselheira Isabel Pais Martins, consultável em www.dgsi.pt.
[5] Relatado pelo Conselheiro Jorge Gonçalves e disponível para consulta em www.dgsi.pt.
[6] Como observa Inês Almeida Costa (in «As condições das prisões portuguesas, a jurisprudência do TEDH e o seu reflexo prático» - https://www.mfalegal.pt/xms/files/VIDAJUDICIARIA_marcoabril2024_02.pdf), o parque prisional português é antigo e carente de obras de reabilitação. À falta de recursos materiais e humanos soma-se a sobrelotação crónica, que em nada contribui para a garantia de condições mínimas de habitabilidade. Por tudo isto, não raras vezes, os reclusos encontram-se alojados em condições precárias, não minimamente compagináveis com o tratamento condigno que a nossa Constituição exige, o que tem levado o TEDH a múltiplas condenações do Estado Português no pagamento de indemnizações aos reclusos.
Em casos onde haja risco de violação do art. 3.º da CEDH por más condições das prisões, o Estado Requerido deve pedir mais informações e garantias ao Estado Requerente, podendo, no limite, negar o pedido de extradição por considerar que os direitos fundamentais do extraditando não seriam respeitados se o mesmo cumprisse pena em estabelecimento prisional do Estado Requerente, acrescentando que semelhante lógica pode ser aplicada, e.g., à transferência de pessoas condenadas a penas privativas da liberdade na União Europeia, ao abrigo da Decisão-Quadro 2008/909/JAI.