INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA
CAUSA DE EXCLUSÃO DA ILICITUDE
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
OFENSA AO BOM NOME
Sumário

– Interpretação restritiva do artigo 31.º, n.º 2, alíneas b) e c) do Código Penal, estabelecendo-se que a exclusão da ilicitude por exercício de um direito ou cumprimento de um dever exige fundamento jurídico expresso e não se satisfaz com meras motivações éticas, cívicas ou associativas.
– Delimitação dos limites constitucionais do direito à liberdade de expressão (artigo 37.º da CRP), em confronto com o direito ao bom nome e reputação (artigo 26.º da CRP), sendo inadmissível o uso de linguagem dolosa e factual imputando crimes sem base probatória, ainda que sob pretexto de crítica política.
– Aplicação dos elementos típicos do crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva (artigo 187.º do Código Penal), exigindo-se a afirmação de factos falsos com consciência da sua falsidade, com aptidão para afectar o prestígio institucional da entidade visada.
– Fundamentação da medida concreta da pena à luz do artigo 71.º do Código Penal, ponderando o grau de ilicitude, intensidade do dolo, ausência de arrependimento e reincidência relevante, sendo adequada a pena de multa fixada.
– Inviabilidade de invocação de erro de proibição ou ausência de culpa, dada a actuação deliberada, reiterada e consciente do agente, demonstrando total domínio dos meios de difusão e conhecimento das consequências ofensivas das suas declarações.

Texto Integral

Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 3ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO
I - Nestes autos, que correram termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, ... - JL Criminal - Juiz 1, em que é Arguido AA, com os restantes sinais dos autos, foi proferida sentença, que decidiu nos seguintes termos: (transcrição)
Pelo exposto, julga-se a acusação pública parcialmente procedente por provada e, em consequência, decide-se:
a) Absolver o arguido AA da prática, em autoria material e na forma consumada, de 1 (um) crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa coletiva, p. e p. pelo Art.º 187.º, n.º 1, do Código Penal (conduta do arguido ao enviar um “email” a diversas entidades);
b) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de 1 (um) crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa coletiva, p. e p. pelo Art.º 187.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 130 (cento e trinta) dias de multa – à luz dos artigos 13.º, 14.º, n.º 1, 26.º, n.º 1, 1.ª parte, 40.º, 47.º, n.º 1, 70.º, e 71.º do Código Penal (conduta do arguido na Assembleia Municipal de ...);
c) Condenar o arguido AA pela prática, em autoria material e na forma consumada, de 1 (um) crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa coletiva, p. e p. pelo Art.º 187.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 130 (cento e trinta) dias de multa – à luz dos artigos 13.º, 14.º, n.º 1, 26.º, n.º 1, 1.ª parte, 40.º, 47.º, n.º 1, 70.º, e 71.º do Código Penal (conduta do arguido ao publicar um texto na rede social “Facebook”);
d) Em cúmulo jurídico, o arguido é condenado pelas penas que antecedem na pena única de 190 (cento e noventa) dias de multa, à taxa diária de 05,00 € (cinco euros), no montante total de 950,00€ (novecentos e cinquenta euros) – artigo 77.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal;
e) Condenar o arguido no pagamento da taxa de justiça, fixada em 2 (duas) UC’s, e dos encargos a que a sua atividade houver dado lugar - cfr. Arts. 374.º, n.º 4, 513.º, n.º 1 e 3, 514.º, n.º 1, do Código de Processo Penal e Arts. 8.º, n.º 9, 16.º e tabela III do Regulamento das Custas Processuais.”
*
II- Não se conformando com esta decisão, dela interpôs recurso o Arguido, com as seguintes conclusões: (transcrição)
1. Somente por extrema necessidade e sentido de Justiça, se apresenta Recurso, que visa a apreciação da Douta Sentença.
2. O presente recurso tem como objeto a reapreciação sobre o sentido em como o Tribunal interpretou e aplicou a norma de direito referente à causa de exclusão da ilicitude e a reapreciação da pena aplicada, por erro na apreciação da culpa.
3. Decidindo como decidiu, a Sentença do Tribunal a quo não faz uma correta interpretação dos factos nem, tão pouco, uma adequada subsunção dos mesmos à norma jurídica aplicada.
4. O Recorrente ao abrigo da sua atividade profissional e na qualidade de ... da Direção da APROSOC – Associação de Proteção Civil, vem desde há vários anos intervindo na Assembleia Municipal de ..., no sentido de sensibilizar o executivo municipal, para a necessidade de cumprir as suas competências e atribuições em matéria de políticas e atividades proteção civil, sendo um dever e obrigação do arguido, alertar para a mitigação das verdadeiras catástrofes, que ano após ano se vêm agudizando, por falta de intervenção das entidades competentes, nomeadamente a própria Câmara Municipal.
5. O arguido é a voz ativa da população oeirense uma vez que é ele que se manifesta diretamente junto dessas entidades, em prol do bem superior que é a defesa e proteção do cidadão.
6. O Tribunal “a quo” não teve em consideração, por entender não se ter verificado, que o arguido atuou ao abrigo de duas causas de exclusão da ilicitude previstas no Art.º 31.º, n.º 2, als. b) e c), do Código Penal, ou seja, não entendeu nem valorou que, o arguido agiu ao abrigo do exercício de um direito, o direito à liberdade de expressão consagrado no Art.º 37.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, no cumprimento de um dever, o dever cívico, pautado pelos interesses dos cidadãos resultante da sua qualidade de ... de proteção civil e ... da associação “APROSCOC ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO CIVIL”.
7. O que salvo melhor opinião, verifica-se no caso em apreço.
8. O Tribunal, tem que levar em consideração tosas as circunstâncias não se plasmando apenas em alguns factos, que por si, não traduzem a realidade.
9. O arguido ao agir como agiu, fê-lo pela voz de todos os munícipes, para evitar mais tragédias.
10. O tribunal “a quo” não pode, de forma alguma, desvalorizar o comportamento do arguido, como tendo agido ao abrigo de uma causa de exclusão da ilicitude.
11. O arguido não agiu unicamente por razões de lógica, mas também de ciência e disso o tribunal “a quo” teve conhecimento, desvalorizando tal prova, ao saber que existe um relatório técnico e científico emitido pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa que refere que “A Câmara de ... podia ter minimizado as consequências das cheias de dezembro, que provocaram prejuízos de quase 20 milhões e a morte de uma munícipe, se tivesse adotado as medidas de mitigação de dois planos de riscos e de alterações climáticas. Em vez disso, a autarquia agravou a situação, permitindo mais impermeabilização de solos com a construção de dezenas de projetos imobiliários. Para os especialistas, é pouco inteligente construir em zonas que, mais cedo ou mais tarde, vão ter mais problemas. É sobretudo desempenhar mal a função de decisor com responsabilidades na gestão e ordenamento do território. E dizem que lei não está a ser cumprida. Autarquia defende-se: cumpre tudo o que tem para cumprir e nada pode fazer quanto aos novos empreendimentos.”
12. Outra não podia ser a atuação do arguido, perante a inércia dos responsáveis pela segurança do município.
13. A douta decisão “a quo” penalizou o Recorrente, ao entender que não se verifica uma causa de exclusão da ilicitude.
14. O arguido agiu ao abrigo do direito de liberdade de expressão, nos termos do art.º 37.º da Constituição da república Portuguesa e do art.º 19.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, contudo não foi esse o entendimento do tribunal “a quo”.
15. O arguido agiu no cumprimento de um dever cívico pautado pelos interesses de todos os cidadãos, como resultado das funções que exerce enquanto ... da APROSOC e ... de proteção civil.
16. Para que se encontre preenchido o crime de que o arguido vem acusado, são necessários dois requisitos cumulativos, que o agente esteja de má-fé na convicção que forma acerca da sua veracidade, e que os factos sejam idóneos a ferir a credibilidade, o prestígio ou a confiança que o ente visado deve merecer.
17. Somente a propalação de factos inverídicos associados a pretensas condutas da pessoa coletiva, com um potencial muito mais lesivo sobre a sua credibilidade e confiança, determinam a tutela penal.
18. Encontram-se reunidos os pressupostos para que o arguido tenha agido sem culpa, não sendo o facto punível, por exclusão da sua ilicitude. O arguido agiu ao abrigo do art.º 31.º n.º 2 al. b) e c) do Código Penal.
19. O juízo de prognose efetuado pela douta sentença e com o devido respeito, carece de nova apreciação, porquanto a pena imposta é excessiva e que, misericordiosamente, espera de V. Exas. a sua reapreciação, concluindo pela não aplicação de qualquer pena uma vez que o arguido agiu sem culpa, ao abrigo do art.º 31.º n.º 2 al. b) e c) do Código Penal.
20. O Recorrente não entende nem pode aceitar, que o tribunal não tenha considerado a sua atuação ao abrigo de uma causa de exclusão da ilicitude, só com a absolvição do arguido se fará justiça.”
*
III- O Ministério Público respondeu ao recurso, pugnando pela sua total improcedência e manutenção integral da sentença recorrida.
*
IV - Neste tribunal o Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu parecer subscrevendo a posição assumida pelo MP na 1ª instância.
*
V - No âmbito do disposto no art.º 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal, o arguido/recorrente não deduziu resposta ao parecer.
*
VI - Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência, por o recurso dever ser aí julgado, de harmonia com o preceituado no art.º 419º, n.º 3, al. c) do citado código.
*
OBJECTO DO RECURSO
I - De acordo com o preceituado nos art.ºs 402º; 403º e 412º nº 1 do CPP, o poder de cognição do tribunal de recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, já que é nelas que sintetiza as razões da sua discordância com a decisão recorrida, expostas na motivação.
Seguindo esta ordem lógica, no caso concreto e atentas as conclusões, as questões a apreciar são:
a. Se o tribunal a quo incorreu em erro de subsunção jurídica, ao não considerar verificadas as causas de exclusão da ilicitude previstas no artigo 31.º, n.º 2, alíneas b) e c), do Código Penal;
b. Se a sentença recorrida aplicou uma medida de pena excessiva, desproporcional à culpa do arguido e às exigências de prevenção penal.
*
FUNDAMENTAÇÃO
I- Na sentença recorrida deram-se como provados e não provados os seguintes factos: (transcrição)
A) FACTOS PROVADOS
Com relevância para a presente causa, expurgados de matéria conclusiva ou de direito, resultaram provados os seguintes factos:
1. O Município de ... – M… é uma autarquia local, na forma de pessoa coletiva territorial pública, com autoridade pública.
2. No dia 10/01/2023, na Assembleia Municipal de ..., realizada em ..., o arguido proferiu as seguintes palavras:
«Boa tarde a todos e a todas e votos de um bom ano em segurança.
Uma vez mais o assunto que me traz, APROSOC - Associação de Proteção Civil, é a proteção civil e desta vez também o ordenamento do território, ou melhor, mais uma vez.
Relativamente às respostas aqui dados pelo Senhor ... na nossa última intervenção, cumpre-nos esclarecer que o direito de intervenção dos cidadãos e das instituições na Assembleia Municipal, não tem necessariamente de ser respondido a quem coloca as questões, é aos munícipes que essas respostas são devidas, é a eles que os Senhores têm que responder. No nosso caso, não procuramos sequer respostas, pois sabemos perfeitamente por que não cumpre o Executivo as suas atribuições em proteção civil. A APROSOC - Associação de Proteção Civil não se integra em grupos de "lobby", e não queremos acreditar que alguém julgue necessário fazer porte do "clube maçónico do Senhor dez por cento", seja lá ele quem for.
Quanto a todas as questões que não foram respondidas ao longo das nossas intervenções neste caso, e desde há alguns anos a esta parte, fica-nos sempre a dúvida se não o são por eventual falto de argumentação válida, não querendo nós acreditar ser por simples falta de interesse ou qualquer défice multivariado.
Os efeitos da desmedida ocupação impermeabilizante dos solos, não acompanhado de infraestruturas de escoamento de águas, aliado à inércia e inépcia do Executivo em matéria de proteção civil, estão à vista de todos!
O que aqui foi por nos denunciado ao longo dos anos, aquilo que anunciamos como possível, está a acontecer e, mas de muito funesto virá inevitavelmente o acontecer, a manter-se este rumo...
Para os munícipes e para a equipa do Ministério Público que agora investiga a ocorrência nas cheias de ... que fez uma vítima que ficou incapacitado após semanas o luto pela vida e sofre agora um dolorosíssimo processo de fisioterapia, bem como a morte ocorrida nas cheias de ..., é nossa convicção de que os autores desses por negligência estão a monte, nesta casa.
A sensibilização em proteção civil para os perigos e vulnerabilidades e recomendação de autoproteção no Concelho de ... é zero. A existência de um Gabinete Municipal de proteção Civil em detrimento de um efetivo serviço municipal de proteção civil (com suas inerentes equipas) em ... que cremos motivada por conluios e "lobbies" vários, parece-nos gritante.
A constituição das Unidades Locais de Proteção Civil previstas na Lei vinte e sete de dois mil e seis e que por nossa iniciativa é reforçado pelo Decreto-Lei quarenta e quatro de dois mi1 e dezanove e que possibilitariam o envolvimento dos cidadãos nas atividades de proteção civil também em ... é uma miragem face à política retrógrada que reina no Concelho.
A figura sobre o qual recaem as atribuições de Autoridade Municipal de Proteção Civil, bem como o seu maior conselheiro conhecido, são em nossa convicção nulidades no que à proteção civil é atinente.
As caves do Baixa de ..., não têm e nunca terão condições de habitabilidade, Senhor ..., não apenas face ao risco de cheias, bem como em relação ao risco de tsunami, tal como no risco sísmico são potenciais sepulturas. Assim sendo, não resta à Autarquia alternativa que não a de, apesar de se tratar de propriedades privados, ao interdito definitivamente e realojar os seus habitantes ou indemnizar os seus proprietários, porque resultam de um erro crasso de ordenamento do território, tantas vezes confundido com "ordenamento do território".
Não, não é apenas ao diretor do gabinetezinho de proteção Civil de ... que imputamos incompetência, é mesmo o todo o Executivo que consideramos absolutamente incompetente no âmbito da proteção civil e ordenamento do território.
Dispensamos respostas cheias de nada – mas exigirmos ações conducentes à segurança coletiva dos cidadãos.
Podem contar connosco para fazer parte das soluções, mas nunca contem connosco para fazer parte do problema que só por si Vossas Excelências representam.
Termino tirando o chapéu ao Senhor ... do Executivo, porque em todas as nossas intervenções o senhor mentiu com uma incomensurável convicção que está documentada através das imagens e das atas absolutamente inarrável.»
3. No dia 12/01/2024, o arguido enviou um email para as seguintes entidades “Mail da Procuradoria” «correiopgr@pgr.pt», “Correio Dciap” «correio.dciap@pgr.pt», “PS” «gp_ps@ps.parlamento.pt», “PSD” «gp_psd@psd.parlamento.pt», “IL” «gabinete@il.parlamento.pt», “PAN” «pan.correio@pan.parlamento.pt», “PCP” «gp_pcp@pcp.parlamento.pt», “CHEGA” «gabinete@ch.parlamento.pt», “BE” «gp_be@be.parlamento.pt», «cig@cig.gov.pt», «assembleia.municipal@cm-....pt», «belem@presidencia.pt», com o assunto “Formalização de denuncia” e o seguinte teor:
«(…) o executivo municipal ignora por completo as suas competências e atribuições em Proteção Civil, recorre a avenças para consultores do Gabinete Municipal de Proteção Civil, nomeadamente BB e CC (Apesar do ... do Executivo ter referido na última Sessão que "avenças não temos"), pessoas que entendemos de nomeação partidária e acreditamos não serem competentes para as funções que desempenham e pelas quais a autarquia lhes paga e, por isso lesando assim em nosso entendimento o erário público, faltando assim uma vez mais o ... do Município à verdade.
Não obstante tudo isto, o ... DD, mente e afirmou mesmo numa sessão de Assembleia Municipal que já tinha recebido o ... desta Associação vários vezes no seu gabinete e estaria sempre à disposição para continuar a acolher as suas propostas, acontece, porém, tal nunca aconteceu sendo totalmente falsa a afirmação produzida.
Contudo, não resta a esta associação a intervenção em assembleia municipal, até porque cremos que a autarquia é responsável pela morte ocorrida nas cheias de ..., bem como pelo ferido ocorrido nas cheias de ... que após semanas a lutar pela vida em coma, luta agora num dolorosíssimo processo de fisioterapia para recuperar a mobilidade de um braço. (…)
Morrem pessoas cuja morte cremos resultar da indiretamente da inércia e inépcia do executivo municipal (…).
(…) a meras palavras para sacudir a água do capote em mortes pelas quais cremos que a autarquia tem responsabilidades indiretas e disso entendemos ser capazes de produzir prova.
(…) apresentando queixa, tantas vezes quanto necessárias para que, todo o executivo compreenda que não está acima da Lei (…).»
4. Em data não concretamente apurada, o arguido colocou uma publicação na rede social “Facebook”, com o seguinte teor:
«... É UM CASO DE CRIME CONTRA A HUMANIDADE NO QUE HÁ PROTEÇÃO CIVIL É ATINENTE ... da Câmara Municipal de ..., disse hoje em Assembleia Municipal que, não depende dele a constituição das Unidades Locais de Proteção Civil e que depende das Juntas de Freguesia, passando assim a “batata quente” para o lado das freguesias. Mas também disse que não é para terem um corpo operacional, ou seja, já se vislumbra que nem voluntários terão, quanto mais ações de sensibilização às populações, naquele que é um dos concelhos do país mais atrasado e retrógrado no que à proteção civil é atinente.
Por sua vez a vereadora da proteção civil em ..., atestou a sua total incompetência para o cargo, já que demonstrou a sua total ignorância ou, interpretação deturpada da legislação de proteção civil e das competências e atribuições do Serviço Municipal de Proteção Civil de ..., no âmbito do próprio plano municipal de emergência de proteção civil e da orgânica dos serviços da autarquia nos quais se inclui o de proteção civil e que não cumpre o esmagadora maioria das suas atribuições.
Continuam portanto, a prevalecer em ... os conluios maçónico-bombeirísticos que obstaculizam um aumento da segurança coletiva dos cidadãos no que do serviço de proteção civil depende, até porque, o Serviço Municipal de Proteção Civil não possui nenhum licenciado ou ... de proteção civil no seu quadro de pessoal, já maçons tem alguns ferimentos graves de outro cidadão em ..., o discurso do executivo continua a denotar por um lado a ignorância do que é a proteção civil, a faltar a verdade e a deturpar as questões que lhe são colocadas e, na sua maioria absoluta, a usar de prepotência, arrogância, autoritarismo próprios dos regimes ditatoriais numa versão rasca da casta de ditadores liderada por Vladimir Putin. Uma postura absolutamente execrável tanto por parte do edil ... da autarquia, como por parte da presidenta da assembleia municipal, como por parte da vereadora da proteção civil, bem como de todos os subservientes, lacaios e “cães de fila” que gratuitamente ou não idolatram o ex. presidiário que preside ao executivo.
Para o ... da APROSOC — Associação de Proteção Civil, estes políticos de hoje serão os responsáveis pela dimensão de catástrofes futuras e, os seus atos e conluios contrários à orientação da legislação vigente, serão as causas de inúmeras mortes e prejuízos avultados em situações de acidente grave ou catástrofe futuras no concelho de .... Ou seja, para este dirigente, se tais catástrofes já tivessem ocorrido, os membros deste executivo ou já estariam presos ou estariam a monte, contudo, como somente ocorreu uma vítima mortal da sua inércia e inépcia, continuam a passar nos intervalos dos pingos da chuva e a cometer os seus crimes que só mais tarde serão reconhecidos pela história como tal, enquanto isso vão se governando ao invés de governar.
Para o ... da APROSOC, o líder do executivo municipal de ... não é um apenas um ex. condenado, é inevitavelmente face às suas políticas, inércia e inépcia, um futuro condenado, ainda que a ou as condenações possam somente ser conhecidas após o seu fim de vida.
..., o concelho cujo Serviço Municipal de Proteção Civil foi legalmente constituído em 3 de novembro de 2022, e cujo seu quadro tem na realidade um funcionário, dois maçons avençados e um militar em comissão de serviço, serve os interesses de muita gente, mas, os interesses que menos serve são os dos cidadãos.
Tal como Benito Mussolini, ou mesmo Al-Capone o homem que também usava chapéu e charuto, também aqui existem idolatrados, contudo a história contará inevitavelmente uma história muito diferente da que hoje foi contada Assembleia Municipal.
Na sociedade moderna a nova geração de ditadores recorre à contra-informação, fake news e, até mesmo à espionagem eletrónica, enviados que se fazem passar por amigos com falsos argumentos para capturar um acesso a uma password de um wi-fi usando uma App para o efeito para assim possibilitar a um "super espião" contratado a peso de ouro antecipar os passos de quem investiga o executivo, tirar nabos da púcara, ou simplesmente lançar manobras dilatórias sobre resultados exigíveis, não sabemos se isto acontece também em ..., mas sabemos que, esta gente crê ter um centro de inteligência municipal capaz de compensar a sua falta de inteligência para servir com verdade os cidadãos de ... no que à sua proteção civil respeita.
Do catadupa incomensurável de boçalidade e arrogância que hoje uma vez mais preconizaram aos intervenções de executivo e grupo político do mesmo na Assembleia Municipal, lamentamos que os eleitores continuem tão pouco esclarecidos sobre o que é e, quais as melhores práticas de proteção civil no país e no mundo e, se deixem ludibriar crendo no “conto do vigário” ou, se preferirem, “indo na canção do bandido”.
Pela minha parte, enquanto ... da APROSOC, só posso ter pena de um povo assim que, mais cedo ou mais tarde chorará a morte de milhares de vítimas, como agora acontece na Turquia e na Síria.
Por falar em Turquia, também ali “as corporações de bombeiros estão bem equipadas”, já do lado da Síria nem tanto, onde por coincidência impera um regime ditatorial. Mas quer num Podem demorar dias, meses, anos, mas um dia alguém lerá este texto e o colocará na história e, apesar de tarde demais, todos ficaram a conhecer a causa de em ... não existir envolvimento dos cidadãos nos atividades de proteção civil como consta do artigo 1º da Lei 27/2006, não existir envolvimento de voluntários das Unidades Locais de Proteção Civil (previstas na mesma Lei e cuja a constituição é instada pelo Decreto Lei 44/2019) organizados e coordenados de modo a evitar mortes como a ocorrida em ... e tantas outras mortes evitáveis, nessa altura saberão quem tinha afinal razão.
Claro que existe aqui algum paralelo com a telenovela festa é festa, numa temos o Bino e noutra o Tino, mas em ambas temos uma "Betinha" claro que o papel da que a representa na telenovela é o mais democrático e respeitador dos direitos liberdades e garantias constitucionalmente consagrados.
Aguardamos ansiosamente que os citados néscios em proteção civil nos processem, para que tenhamos oportunidade de expor toda a verdade, porque muito mais haverá a dizer.»
5. Com as condutas referidas quis o arguido tecer as afirmações supra descritas relativamente ao Município de ..., sabendo que todas as afirmações proferidas não correspondiam à verdade.
6. O arguido decidiu proferir as afirmações descritas em 2. e 4. sabendo que seriam ouvidas/lidas por um grande número de cidadãos, por serem locais públicos e também redes sociais, assim facilitando a sua divulgação e conhecimento pelo público em geral.
7. Ao agir conforme descrito, o arguido atuou com o propósito, concretizado, de ofender a credibilidade, o prestígio, o bom nome, a confiança, a imagem e a reputação do Município de ..., junto da comunidade local, em especial, e do país em geral, bem sabendo que as expressões por si utilizadas eram aptas a alcançar tal resultado, como pretendia e conseguiu.
8. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
***
MAIS SE PROVOU QUE:
9. As Assembleias Municipais de ... são públicas e transmitidas em direto na plataforma online “Youtube”, cujo acesso é livre e gratuito para todos os cidadãos portugueses e de outros países, e são posteriormente transcritas integralmente em atas, aprovadas por unanimidade.
10. No momento descrito em 2., o arguido encontrava-se munido de documentos escritos, que seguiu e utilizou para proferir o seu discurso.
11. A expressão «Senhor dez por cento» é utilizada, neste meio político, para se referir a alguém que recebe, indevidamente, uma quantia monetária ou uma vantagem económica indevida, em virtude do cargo que ocupa ou às funções que exerce.
12. O arguido é membro de órgão estatutário nas seguintes entidades «APROSOC ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO CIVIL» e «ANARPT - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE RÁDIO-OPERADORES E RADIOAMADORES PORTUGUESES», não exerce outra atividade profissional e não aufere qualquer remuneração ou pensão.
13. A «APROSOC ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO CIVIL» possui como atribuições, entre outras, a defesa dos legítimos direitos dos cidadãos no acesso aos serviços de emergência e proteção civil, bem como aos cuidados de saúde, incluindo serviços de emergência médica intra/extra-hospitalar, de qualidade e atempados; a prevenção de riscos coletivos inerentes a emergências, acidentes graves ou catástrofes, atenuar os seus efeitos, proteger e socorrer as pessoas, outros seres vivos e bens em perigo quando aquelas situações ocorram, sem nunca se substituir aos serviços e agentes de emergência e protecção civil; a observação cívica da adequação e condução das políticas estratégicas no âmbito das actividades vocacionais desta Associação (Saúde, Emergência, Proteção Civil e outras conexas) orientada pelos legítimos interesses e direitos dos cidadãos e das organizações, conducente à apresentação de estudos, relatórios e propostas de soluções junto do poder político instituído nos seus diferentes patamares territoriais e das demais entidades competentes.
14. O arguido possui um grau de incapacidade de 64%, auferindo um subsídio de 300,00€ (trezentos euros), aproximadamente.
15. O arguido é ... de proteção civil de nível 4, com equivalência ao 12.º ano de escolaridade.
16. O arguido reside sozinho, em casa própria.
17. O arguido mantém uma relação de namoro com a sua ex-companheira, que se encontra a residir temporariamente na casa da progenitora do arguido, com vista a auxiliar esta última.
18. O arguido possui ... filhos, dois com menos de dezoito anos, sendo a pensão de alimentos dos mesmos suportada pela sua progenitora, face à sua incapacidade financeira.
19. O arguido foi condenado por decisão proferida em 10/11/2010, transitada em julgado em 16/12/2010, pela prática, em 12/10/2005, de um crime de difamação, p. e p. pelo Art.º 180.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa à taxa diária de 07,00€ (sete euros), num total de 700,00€ (setecentos euros), declarada extinta pelo cumprimento em 04/04/2012 - Proc. n.º 1642/05.3TAVIS, que correu termos no Tribunal Judicial de Santa Comba Dão – 2.º Juízo.
20. O arguido foi condenado por decisão proferida em 22/03/2013, transitada em julgado em 30/04/2013, pela prática, em 26/07/2011, de um crime de injúria, p. e p. pelo Art.º 181.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 95 (noventa e cinco) dias de multa à taxa diária de 6,00€ (seis euros), num total de 570,00€ (quinhentos e setenta euros), declarada extinta pelo cumprimento em 30/07/2015 – Proc. n.º 346/04.5242/11.0TDLSB, que correu termos no Tribunal Judicial de Lisboa – 2.º Juízo.
21. O arguido foi condenado por decisão proferida em 14/01/2021, transitada em julgado em 12/01/2022, pela prática, em 21/03/2018, de dois crimes de devassa da vida privada, p. e p. pelo Art.º 192.º, n.º 1, al. b), do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 (um) ano, declarada extinta pelo cumprimento em 12/01/2023 - Proc. n.º 89/18.6JGLSB, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Lisboa – JL Criminal – Juiz 10.
***
B) FACTOS NÃO PROVADOS
i. Antes da Assembleia Municipal de 10/01/2024, o Município de ... não realizou ações de sensibilização e divulgação da atividade de proteção civil, não promoveu campanhas de informação sobre medidas preventivas face a riscos existentes e não difundiu orientações e procedimentos à população na iminência ou ocorrência de acidentes graves ou catástrofes.
ii. As bacias de retenção para evitar cheias e inundações como medida preventiva face à falta de capacidade dos canais de escoamento só foram anunciadas após as intervenções do arguido em Assembleia Municipal e não foram implementadas na sua necessária capacidade.
iii. Em 17/05/2024, as unidades locais de proteção civil previstas na lei haviam sido criadas pelo Município de ..., e ainda não tinham sido materializadas e operacionalizadas.
iv. Na publicação colocada pelo arguido na rede social “Facebook” constavam as seguintes expressões:
“Ações de sensibilização dos cidadãos em proteção civil no concelho de ... realizadas pelo Serviço Municipal de Proteção Civil ou agentes de Proteção Civil de ... ZERO Preparação dos cidadãos para a prevenção, mitigação e comportamentos de autoproteção através de acções desencadeadas pelo município ZERO
Não obstante aos factos, potencialmente à morte evitável de uma cidadã em ... e (…). (…) quer noutro, a impreparação dos cidadãos para a sua autoproteção é por demais evidente, tal como o é em ... e na esmagadora maioria dos concelhos de Portugal.”
v. O arguido decidiu proferir as afirmações descritas em 3. sabendo que seriam ouvidas/lidas por um grande número de cidadãos, por serem locais públicos e redes sociais, assim facilitando a sua divulgação e conhecimento pelo público em geral.
*
II- Quanto à motivação da decisão de facto: (transcrição)
A motivação da decisão de facto pelo Tribunal assentou na ponderação da análise crítica da prova produzida nestes autos, através das regras da experiência comum e da livre convicção do julgador, como previsto pelos Art.ºs 127.º e 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, à exceção dos documentos autênticos juntos, uma vez que os factos que referem como praticados pela autoridade respetiva e os factos que neles são atestados com base nas perceções dessa entidade consideram-se provados (cfr. Art.º 169.º, do Código de Processo Penal).
Para a apreciação dos factos considerados provados, o Tribunal teve em conta a prova documental junta aos autos e examinada em sede de audiência (conforme disposto nos Arts. 355.º, n.ºs 1 e 2, e 362.º, n.º 1, d), do Código de Processo Penal), bem como o depoimento das seguintes testemunhas:
− EE, ... da GNR, atualmente em comissão de serviço como ... do Serviço Municipal de Proteção Civil de ...;
− FF, ... da Câmara Municipal de ...;
− GG, ... da mesa da Assembleia Municipal de ..., desde 2017:
− HH, ... da Assembleia Municipal de ... há 8 anos;
− II, ... da mesa e deputado na Assembleia Municipal de ..., desde 2021;
− JJ, deputada na Assembleia Municipal de ... pelo grupo político ... desde outubro de 2021;
− KK, membro da Associação ...;
− LL, ... da Câmara Municipal de ...;
− MM, deputado na Assembleia Municipal de ... pelo Partido ... há cerca de 4 anos;
− DD, ... da Câmara Municipal de ...;
− NN, ... da Câmara Municipal de ....
Em sede de audiência de discussão e julgamento o arguido prestou declarações sobre as suas condições pessoais e exerceu o seu direito ao silêncio quanto à restante matéria dos autos, em conformidade com os Arts. 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa e 61.º, n.º 1, al. d), do Código de Processo Penal, pelo que não foi possível obter a sua versão quanto aos factos que lhe foram imputados.
A prova do facto 1. consta do conteúdo do documento “Boletim da Propriedade Industrial n.º 2020/02/14”, de 18/04/2023 (ref. Citius 23198697), onde é possível observar que o Município de ... se encontra registado como administração local, com atividades desenvolvidas no âmbito dos seus respectivos poderes autárquicos.
No que respeita à prova dos factos 2. a 4., a sua convicção resulta da prova documental junta a estes autos, designadamente do teor dos documentos “Extrato da Ata da 1.ª Sessão Extraordinária da Assembleia Municipal de ...”, “Email” e “Print do Facebook”, respetivamente, de 18/04/2023 (ref. Citius 23198697).
No referido extrato da ata em questão consta a data em que ocorreu a Assembleia Municipal em causa e a transcrição da intervenção do arguido, identificado pelo seu nome e enquanto representante da associação “APROSOC – Associação de Proteção e Socorro”, contribuindo assim para a prova deste facto.
No “email” indicado é possível observar o remetente do email («geral@aprosoc.pt», que se identifica com o nome da associação em que o arguido figura como ...); a assinatura do remetente, que corresponde ao nome do arguido; os destinatários do mesmo; o dia e hora em que foi enviado; e o seu conteúdo, permitindo a conexão entre o arguido e o “email” enviado e contribuindo para a credibilidade deste facto.
No mesmo sentido, na publicação realizada na rede social “Facebook” é possível visualizar o perfil através do qual foi feita esta publicação, denominado “Aprosoc – Associação de Proteção Civil”, que corresponde ao nome da associação em que o arguido figura como ..., sendo expectável, à luz das regras da experiencia comum, que seja o arguido o gestor desta página online, criando assim a convicção de que foi o arguido que escreveu o texto em causa e o divulgou através desta rede social.
A prova documental mencionada não foi contrariada por qualquer elemento de prova carreado para os presentes autos, o que reforçou a sua credibilidade e veracidade. Estes documentos foram ainda corroborados pelo depoimento das testemunhas GG, HH, II, MM e DD, que se encontravam presentes na dita assembleia e que confirmaram as expressões proferidas pelo arguido e transcritas na referida ata, depoimentos que foram considerados credíveis atenta a razão de ciência destas testemunhas, os seus discursos firmes, convictos, detalhados e coerentes, bem como a linguagem corporal calma que apresentaram, contribuindo para a convicção de que tais factos são verdadeiros.
Em relação à prova dos factos 5. a 8., atinentes ao elemento subjetivo, a sua convicção infere-se da prova dos factos 1. a 4 e 9. a 10., dos factos não provados i. a iii., e da conjugação dos restantes elementos probatórios descritos.
Tais elementos levam à convicção, por meio de ilação, de que o arguido quis tecer e teceu tais afirmações contra o Município de ..., considerando que os seus atos implicaram a preparação e a planificação do seu discurso, pois resultou provado que o arguido preparou e elaborou dois textos que publicou online e enviou por “email” para diversas entidades, e levou o seu discurso organizado, por escrito, para a Assembleia Municipal de .... Dos autos não resultou qualquer prova que motivasse a crença, por parte do arguido, de que tais afirmações correspondiam à verdade, levando a concluir, pelas regras da experiência comum, que o arguido tinha conhecimento de que não possuía razões válidas para as reputar como verídicas, quando as proferiu.
Para além de tal, o arguido proferiu as expressões descritas em 2. numa Assembleia Municipal transmitida em direto na plataforma online “Youtube” e publicou o texto descrito em 4. na rede social “Facebook”, sendo exigível, na perspetiva do homem médio colocado na sua situação, que soubesse que, ao afirmar tais considerações neste tipo de contexto onde existe facilidade de divulgação de conteúdos, as mesmas seriam ouvidas por um grande número de cidadãos, um facto notório e de fácil perceção por qualquer cidadão e, ainda assim, o arguido optou por proferir as expressões em causa nos contextos referidos.
Atento o teor das expressões e afirmações proferidas pelo arguido (imputando ao Município de ... a prática de crimes), considerando que não resultou provado que o arguido possuísse razões para crer que tais afirmações eram verídicas, acrescidos do facto de este ter optado por as proferir de forma a serem lidas e ouvidas por um grande número de cidadãos, infere-se, por meio de ilação, que pretendia colocar em causa a credibilidade, o bom nome, o prestígio, a confiança e a reputação do Município de ... junto da comunidade portuguesa, alcançando tal objetivo a partir do momento em que proferiu tais considerações nestes contextos de fácil divulgação.
Como tal, conclui-se assim que o arguido representou interiormente estas condutas e as consequências a elas inerentes e conformou o seu comportamento de acordo com as mesmas, atuando com vista a concretizá-las, o que logrou fazer, considerando-se tais factos provados.
A prova dos factos 9. e 10. resulta dos depoimentos das testemunhas HH, ... da Assembleia Municipal, II, ... da mesa e deputado na Assembleia Municipal de ..., e DD, ... da Câmara Municipal de ..., cujos depoimentos foram considerados credíveis pelos motivos enunciados, que relataram que as assembleias são públicas, são transmitidas em direto no Youtube e gravadas, sendo depois transcritas integralmente em atas.
Quanto à prova do facto 11., esta assenta nos depoimentos das testemunhas MM e DD, cuja credibilidade resulta dos motivos já evidenciados. Estas testemunhas esclareceram que a expressão é frequentemente utilizada no meio para descrever alguém que recebe “uma migalha das construções e empreendimentos” realizados pelo Município de ... ou para indicar que o ... recebe 10% sobre tudo, pelo cargo que exerce, contribuindo para a convicção deste facto.
No que respeita aos factos provados 12. a 18., a sua credibilidade funda-se no teor do documento “Email” de 28/11/2024 (ref. Citius 26837306), onde é possível observar a informação da Segurança Social, relatando que o arguido apresenta qualificação aberta como membro de órgão estatutário nas entidades descritas e que, atualmente, não apresenta qualquer registo de remunerações; no conteúdo do documento “Alteração Parcial de Estatutos” de 24/09/2024 (ref. Citius 26375944), onde constam os fins e objetivos da associação em causa; e nas declarações prestadas pelo arguido em sede de julgamento que, quanto a tais factos, mostraram-se sinceras, detalhadas e convictas, contribuindo para a sua credibilidade.
No que concerne à prova dos factos 19. a 21., a sua convicção foi extraída do conteúdo do Certificado do Registo Criminal de 21/11/2024 (ref. Citius 26784244) do arguido, prova documental emitida por entidade fidedigna e que se mostra atualizada.
Em relação aos factos não provados i. a v., estes foram assim considerados pela insuficiência da produção de prova quanto aos mesmos. Em sede de contestação, o arguido alegou que a Câmara Municipal de ... não implementou uma série de medidas que a legislação exige; todavia não logrou provar a necessidade e a falta de implementação das mesmas (conforme factos não provados i. a iii.).
Em relação à falta de implementação de medidas, a testemunha JJ referiu que não estão a ser implementadas medidas pelo Município e que não existe informação junto da população, relativamente ao tema da proteção civil. O seu depoimento foi considerado credível, pela sua razão de ciência e dado que a testemunha apresentou um discurso sincero, exprimindo as suas opiniões sobre o assunto em causa, demonstrando espontaneidade e convicção. No entanto, a testemunha não concretizou tais afirmações, referindo apenas que não existe um sistema de sinalização e de alertas de tsunami, o que não se considera relevante atento o escopo das expressões proferidas pelo arguido, que apenas se referem ao risco de tsunami para evidenciar o perigo das caves de ..., por considerar que as mesmas não possuem condições de habitabilidade, e não à sinalização ou a um sistema de alerta para esse risco.
Em sentido contrário ao relatado pela contestação, a testemunha EE esclareceu a este Tribunal que o Município de ... fez tudo aquilo que era da sua competência e da sua capacidade aquando das cheiras de dezembro de 2022, que causaram o falecimento de uma cidadã, relatando ainda que realizaram ações de sensibilização nas escolas do Município na decorrência das inundações provocadas pelas cheias, bem como uma ação para discutir a sensação de risco e de receio junto de todos os fregueses, no dia 13 de Outubro de 2023.
O seu depoimento foi valorado e considerado credível atenta a sua razão de ciência, o seu discurso sincero e isento, afirmando prontamente quando não possuía conhecimento direto dos factos, relatando não os ter presenciado ou desconhecer os mesmos, para além de apresentar um raciocínio coerente, pormenorizado e consistente, e uma linguagem corporal calma.
O documento “Reportagem” de 24/09/2024 (ref. Citius 26375944) junto aos autos com a contestação do arguido não foi valorado por se tratar de um artigo de opinião, pelo que este Tribunal não ficou convicto da veracidade das considerações constantes do mesmo, por não ter sido redigido por especialistas na matéria com competências técnicas especializadas para o efeito, em conformidade com o disposto no Art.º 127.º do Código de Processo Penal.
Face a todas estas considerações, o Tribunal não considerou a prova produzida suficiente para firmar a convicção de que tais factos são verdadeiros e que ocorreram realmente como alegado na contestação do arguido, motivando a sua consideração como não provados.
No que concerne ao facto não provado iv., as expressões imputadas pela acusação, descritas neste facto, não resultam do teor da prova documental junta a estes autos, pelo que o mesmo foi considerado como não provado.
Em relação ao facto não provado v., a sua determinação como tal resulta da prova do facto 3., que demonstra que o “Email” enviado foi endereçado apenas às entidades ali mencionadas, não tendo sido divulgado em qualquer plataforma ou rede social que permitisse a sua disseminação junto de terceiros, pelo que não é possível afirmar que existiu uma facilitação da sua difusão ou que tais expressões seriam lidas por um grande número de cidadãos.”
*
IV- APRECIANDO
I- O artigo 31.º do Código Penal estabelece as situações em que uma conduta típica não é ilícita, por estar justificada por norma jurídica que a autorize. As alíneas b) e c) do n.º 2 desse artigo consagram, respectivamente, o exercício de um direito e o cumprimento de um dever como causas de exclusão da ilicitude.
Estas causas de justificação devem ser interpretadas de forma estrita. Não basta invocar valores morais, motivações subjectivas ou finalidades cívicas. É necessário que a conduta esteja directamente autorizada por uma norma jurídica permissiva (alínea b)) ou exigida por um dever jurídico concreto (alínea c)). A mera pertença a uma associação, mesmo com missão social relevante, não cria, por si só, um dever jurídico de imputar publicamente crimes sem fundamento.
A liberdade de expressão, consagrada no artigo 37.º da CRP, é um direito fundamental estruturante do Estado de direito democrático. Contudo, como expressamente prevê o artigo 18.º, n.º 2 da mesma Constituição, este direito não é absoluto. Pode e deve ser limitado quando colide com outros direitos de igual dignidade, como o direito à honra, à reputação e ao bom nome (art.º 26.º, n.º 1, da CRP).
A imputação de factos ofensivos, desonrosos ou de natureza criminal, sem base factual comprovada, ultrapassa os limites do discurso protegido. A crítica política e institucional é legítima, mas deve obedecer aos princípios da veracidade, proporcionalidade e boa-fé.
A alínea c) do n.º 2 do artigo 31.º do CP exige que o comportamento tenha sido praticado no cumprimento de um dever jurídico concreto e não de uma obrigação ética, política ou moral indeterminada. Trata-se de um conceito técnico, que implica uma norma objectiva, imperativa e vinculativa para o agente.
No plano normativo, é essencial distinguir entre:
i. Denúncia legítima de irregularidades ou riscos, feita nos canais adequados e com base em elementos verificáveis;
ii. Imputação pública e dolosa de factos criminosos a terceiros, sem sustentação fática mínima, difundida por meios de comunicação com o objectivo de humilhar ou desacreditar.
O artigo 31.º, n.º 2, alínea c) do CP não foi concebido para amparar acções dolosas de natureza caluniosa.
A denúncia pública infundada, feita por dirigente associativo ou autarca, sem sustentação factual e com intuito de expor ou descredibilizar o visado, não se integra no âmbito de qualquer dever legal. Trata-se, antes, de comportamento típico e censurável, alheio às prerrogativas do cargo ou função.
In casu, o arguido dispunha de múltiplos canais legais e funcionais para apresentar denúncias sobre a actuação do Município. Tinha, além disso, acesso institucional privilegiado à informação. Não obstante, optou por um discurso público de imputações criminais infundadas, em ambiente de elevada exposição pública, sem prévia verificação dos factos.
A sua actuação revela, pois, abuso de direito de expressão e desvio de qualquer eventual dever funcional, sendo inadmissível a invocação das causas de exclusão da ilicitude.
Acresce dizer que o arguido era dirigente associativo, sendo que tal estatuto não lhe conferia qualquer dever legal de imputar publicamente a prática de crimes a titulares de cargos políticos, nem o habilitava a substituir as autoridades fiscalizadoras ou judiciárias competentes. É que não se pode invocar o “dever cívico” para justificar condutas caluniosas ou objectivamente desonrosas.
O TEDH, no caso Perinçek v. Switzerland (2015), reafirmou que a liberdade de expressão protege a crítica, mas não cobre a imputação de factos falsos nem o discurso dolosamente ofensivo. A protecção é especialmente restringida quando o conteúdo do discurso for de natureza penal e se dirija a autoridades públicas.
Quando se apreciam os limites da liberdade de expressão no âmbito similar ao destes autos, frequentemente se invoca o chamado “direito ao exagero” ou à hipérbole retórica no discurso político. Essa tese tem sido acolhida pelo TEDH em contextos muito específicos, particularmente quando se trata de sátira política, humor ou crítica em fóruns contraditórios. Contudo, essa margem de manobra não é ilimitada, nem se aplica fora dos contextos previstos.
O TEDH, no caso OO v. Portugal (2000), admitiu a protecção de linguagem satírica num artigo de opinião jornalística, mas advertiu que a protecção termina quando o discurso se traduz em imputações factuais falsas. Já no caso Morice v. France (2015), o Tribunal reiterou que o advogado que acusa um magistrado de crime sem base probatória abusa da sua liberdade de expressão.
Neste enquadramento, a conduta do arguido não se limita a retórica acalorada. Vai muito além do admissível, pois atribui a agentes públicos a prática de crimes dolosos, sabendo da falsidade das imputações, e fá-lo num contexto unilateral, deliberado e amplamente difusível. Assim, não há qualquer espaço legítimo para invocar o “exagero” como excludente da ilicitude.
O crime previsto no artigo 187.º, n.º 1 do Código Penal pune quem, dirigindo-se a um organismo, serviço ou pessoa colectiva, afirmar ou propalar factos que, sendo falsos, possam lesar o seu prestígio ou confiança pública.
Os requisitos para preenchimento do tipo são:
i. A existência de afirmação ou propalação de facto determinado (e não mera opinião ou juízo de valor);
ii. A inveracidade objectiva desse facto;
iii. A potencialidade ofensiva para o prestígio da entidade visada;
iv. A consciência da falsidade ou a ausência de fundamento para reputar o facto como verdadeiro (dolo directo ou eventual).
No caso concreto, foram proferidas expressões como “clube maçónico do senhor 10%” e “os autores dessas mortes estão a monte nesta casa”, correspondendo estas a imputações factuais com conotação criminal objectiva (corrupção, homicídio negligente), difundidas em contexto formal e digital, com largo alcance público e com consciência da falsidade.
A tipicidade do crime encontra-se, por isso, plenamente preenchida, tanto nos elementos objectivos como subjectivos. A imputação de tais factos, feita com dolo directo, não pode ser desqualificada como simples opinião ou crítica cívica.
É certo que o discurso político goza, em regra, de protecção alargada no contexto democrático. Porém, como afirmado pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (Erbakan v. Turkey, 2006), essa protecção não cobre expressões que transitem da crítica para a calúnia ou para a imputação infundada de crimes. A fronteira entre opinião crítica e difamação penalmente relevante é traçada pela presença de afirmações de facto verificáveis, cuja falsidade seja conhecida ou reconhecível.
O arguido não se limitou a criticar a actuação política ou administrativa do executivo municipal. Foi mais longe: atribuiu-lhe condutas criminosas, sem base factual, com linguagem intencionalmente destrutiva, com pleno domínio dos meios e das consequências.
Não se está perante crítica democrática, mas perante actuação dolosa que excede os limites da discordância legitima, integrando o ilícito penal.
*
II. A determinação da medida concreta da pena rege-se pelo artigo 71.º do Código Penal, segundo o qual a pena deve ser ajustada à culpa do agente e às exigências de prevenção, tendo em conta factores como:
i. O grau de ilicitude do facto;
ii. A intensidade do dolo;
iii. As condições pessoais e económicas do agente;
iv. A sua conduta anterior e posterior;
v. As exigências de prevenção geral e especial.
Por sua vez, o artigo 70.º estabelece o princípio da preferência pela multa sempre que esta se revele suficiente, como no presente caso. A sentença fixou:
i. 130 dias de multa por cada crime;
ii. 190 dias em cúmulo jurídico, à taxa diária de €5,00;
iii. Valor total da pena: €950,00.
Tendo em conta que a moldura penal abstracta vai até 240 dias por cada crime, esta pena situa-se em patamar moderado, e observa rigorosamente os parâmetros legais e constitucionais.
A alegação de inexistência de culpa não procede. A culpabilidade é avaliada de forma normativa, enquanto juízo de censura pessoal pela violação consciente do dever jurídico de agir de modo lícito. O arguido:
i. Agiu com dolo directo;
ii. Preparou previamente os textos;
iii. Reiterou publicamente as acusações;
iv. Revelou ausência de arrependimento.
Tais circunstâncias demonstram plena intencionalidade, afastando qualquer cenário de erro de proibição ou diminuição de capacidade de autodeterminação.
A culpabilidade do arguido/recorrente justifica a pena aplicada — e, em rigor, permitiria até uma medida mais gravosa, não fosse a ponderação benévola da sua situação económica e ausência de pena de prisão anterior.
A ilicitude da conduta do arguido é grave: imputou, em discurso público e redes sociais, a prática de crimes graves a titulares de cargos políticos, sabendo da falsidade das afirmações, com recurso a linguagem ultrajante e analogias com figuras historicamente associadas à criminalidade e à opressão.
O dolo foi directo, reflectido e reiterado. O arguido agiu com a plena consciência do significado das palavras proferidas e dos seus efeitos, como resulta da prova produzida em sede de julgamento. Não foi demonstrada qualquer tentativa de retractação, reparação ou moderação da linguagem.
Estas circunstâncias agravam o juízo de censura e justificam uma pena dentro da média da moldura penal aplicável. A sentença proferida, ao aplicar uma pena de multa com taxa mínima (€5/dia) e em quantidade ponderada (130 dias), deu já expressão a factores atenuantes subjectivos, sem prejuízo do desvalor objectivo da conduta.
A pena aplicada visa mais do que a punição do agente: serve à protecção da confiança institucional, à estabilidade do espaço público e à dissuasão de práticas de desinformação e difamação em ambiente democrático.
Num tempo em que o discurso público é amplificado por meios digitais, a responsabilização penal por imputações falsas e dolosamente ofensivas torna-se instrumento de defesa da verdade, da legalidade e da convivência jurídica.
A pena aplicada cumpre esta função: não é excessiva, mas suficiente para reafirmar a autoridade da norma violada, dissuadir comportamentos análogos e promover a consciência jurídica da sociedade.
Quanto à fixação da pena única:
Nos termos do artigo 77.º do Código Penal, quando um arguido seja condenado por mais de um crime, o tribunal procede à determinação de uma pena única — em cúmulo jurídico — que substitui as penas parcelares, dentro de certos limites. A pena única:
Não pode ser inferior à mais elevada das penas parcelares aplicadas individualmente;
Nem pode exceder a soma destas, ou, tratando-se de multa, o limite de 900 dias, salvo se a soma das penas ultrapassar este limite (caso em que será esse o máximo).
In casu:
O arguido foi condenado em 130 dias de multa por cada um dos dois crimes de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva;
A pena única fixada foi de 190 dias de multa, representando uma redução de 70 dias face à soma aritmética (260 dias).
Esta fixação respeita plenamente os critérios legais do art.º 77.º, revelando ponderação, moderação e equilíbrio.
A pena única deve reflectir uma avaliação global da personalidade do agente, da unidade dos factos e do contexto global da infracção;
A compressão da pena no cúmulo é um juízo de equidade e prevenção, sem que isso implique desvalorização das condutas.
Assim, a pena de 190 dias é:
i. Proporcional ao grau de reiteração e intensidade dolosa dos actos praticados;
ii. Compatível com o princípio da proporcionalidade (arts. 18.º, n.º 2, CRP e 40.º CP);
iii. E fixada com respeito pelas exigências de prevenção geral e especial.
Como tal, a pena única não é, de modo algum, excessiva, sendo antes uma pena favorável dentro da moldura de cúmulo possível, reflectindo a função pedagógica, dissuasora e retributiva do direito penal.
*
III- Em suma:
A invocação das causas de exclusão da ilicitude previstas no artigo 31.º, n.º 2, als. b) e c) do Código Penal não é admissível no caso concreto, dado que a conduta do arguido não foi exercida no legítimo âmbito da liberdade de expressão nem no cumprimento de qualquer dever jurídico;
A imputação pública e dolosa de factos falsos, de natureza criminal, a titulares de cargos autárquicos, preenche os elementos típicos, ilícitos e culposos do crime previsto no artigo 187.º do Código Penal;
A pena concretamente aplicada — 190 dias de multa à taxa diária mínima — encontra-se dentro dos limites legais, é proporcionada à culpa do agente e responde às exigências de prevenção penal;
Impõe-se, pois, a improcedência do recurso interposto pelo arguido.
*
V- DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes Desembargadores da 3.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso, e confirmar integralmente a sentença sob censura.
Custas a cargo do recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 4UCs.
Notifique.

Tribunal da Relação de Lisboa, 21-05-2025
Processado e revisto pelo relator (art.º 94º, nº 2 do CPP)
Ortografia pré-acordo
Alfredo Costa
Francisco Henriques
Rui Miguel Teixeira