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OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA QUALIFICADA
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
CONFISSÃO
PREVENÇÃO GERAL
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
DEVERES QUE PODEM CONDICIONAR A SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO
Sumário
I. Os crimes perpetrados, designadamente os de ofensa à integridade física e em especial o qualificado, reclamam, por veementes razões de prevenção geral, rigor punitivo. II. Porém, não tendo o legislador excluído a possibilidade de suspensão de execução da pena a concretos tipos criminais, afigura-se que, sob pena de violação do princípio da legalidade, ao julgador não assiste a faculdade de automaticamente, sem avaliação do concreto circunstancialismo, excluir tal possibilidade. III. A valoração da não confissão do arguido - seja na vertente daquilo que, supostamente, evidencia da sua personalidade ou naquela atinente à ausência de arrependimento – encerra, desde logo, sérias dificuldades na compatibilização com o direito ao silêncio e com o corolário direito de prestar declarações sem estar obrigado a dizer a verdade. Ademais, muito embora se reconheça que corresponde a uma prática judiciária que, amiúde, se mantém, estamos em crer que, bule com os fins das penas tal qual se mostram definidos no C.P. vigente. IV. Em face da facticidade atinente às condições pessoais que foi dada como assente, é indesmentível que estamos perante um jovem que evidencia fragilidades no percurso de vida, nomeadamente ao nível da escolaridade, da estabilidade familiar e das relações de afectividade com as figuras parentais de referência, mas que, no intermeio - no período que decorreu entre a prática dos factos, Junho de 2023, e o encerramento do julgamento em primeira instância, Janeiro de 2025 - denota ter efectuado um assinável percurso de amadurecimento e de (re)inserção, ademais motu proprio, que não deve ser descurado. V. Se é certo que às finalidades da pena subjazem, também, necessidades de protecção dos bens jurídicos, o nosso sistema penal insere-se, de forma inequívoca, na denominada perspectiva de prevenção geral de integração. VI. Inexistem, concretamente, razões de prevenção geral ou especial que obstem à suspensão de execução da pena de prisão aplicada e a simples ameaça de execução da pena será, ainda, suficiente para afastar o arguido da criminalidade, «ponderando-se que uma pena de prisão, suspensa na sua execução, mediante regime de prova (…) – artigos 50.º, 51.º e 53.º, do CP – responde com adequado vigor, ao sentimento de justiça, mas também de esperança, da comunidade». VII. Com vista ao reforço da interiorização do desvalor das condutas perpetradas e à reparação, ainda que parcial, dos assistentes/demandantes civis, impõe-se, adicionalmente, sujeitar a suspensão da execução da pena ao cumprimento do dever de indemnizar os assistentes/demandantes civis, conforme art.º 51º, n.º 1, al. a) do C.P.
Texto Integral
Acordam, em conferência, na 9ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. RELATÓRIO
1. Nos autos em referência, precedendo audiência de julgamento, as Senhoras Juízas e o Sr. Juiz do Tribunal a quo, por acórdão de 15 de Outubro de 2024, para o que agora releva, decidiram: «Condenar o Arguido AA: i. pela prática, em coautoria material, de 1 (um) crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, n.º 1, e 204º, n.º 1, al. d), do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e (dois) meses de prisão; ii. pela prática, em coautoria material, de 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos art.ºs 143º, n.º 1, 145º, n.ºs 1, al. a), e 2, por referência ao art.º 132º, n.º 2, al. h), Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão; iii. pela prática, em coautoria material, de 2 (dois) crimes de injúria, p. e p. pelo art.º 181º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 (um) mês e 20 (vinte) dias de prisão por cada um desses dois crimes; iv. pela prática, em autoria material, de 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas, p. e p. pelo art.º 199º, n.º 2, al. a), do Código Penal, na pena de 9 (nove) meses de prisão; v. pela prática, em autoria material, de 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas agravado, p. e p. pelos art.ºs 199º, n.ºs 2, al. b), e 3, e 197º, n.º 2, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão; vi. Em cúmulo jurídico das penas parcelares descritas em i. a v., nos termos do art.º 77º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, condenar este Arguido na pena única de 4 (quatro) anos de prisão (efetiva); vii. sob a condição resolutiva de não praticar infração dolosa no ano subsequente à entrada em vigor da Lei n.º 38º-A/2023, de 02.08, e do pagamento das indemnizações arbitradas aos Assistentes BB e CC, no prazo de 90 (noventa) dias, a contar do trânsito em julgado do presente Acórdão, declarar perdoado 1 (um) ano de prisão na pena única de 4 (quatro) anos de prisão em que este Arguido vai condenado nestes autos; Condenar o DD: i. pela prática, em coautoria material, de 1 (um) crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, n.º 1, e 204º, n.º 1, al. d), do Código Penal, 4º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73º do Código Penal, na pena de 10 (dez) meses de prisão; ii. pela prática, em coautoria material, de 1 (um) crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelos art.ºs 143º, n.º 1, do Código Penal, 4º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73º do Código Penal, na pessoa do Assistente BB, na pena de 9 (nove) meses de prisão; iii. pela prática, em coautoria material, de 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos art.ºs 143º, n.º 1, 145º, n.ºs 1, al. a), e 2, por referência ao art.º 132º, n.º 2, al. h), Código Penal, 4º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73º do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; iv. pela prática, em coautoria material, de 2 (dois) crimes de injúria, p. e p. pelos art.ºs 181º, n.º 1, do Código Penal, 4º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73º do Código Penal, na pena de 1 (um) mês e 10 (dez) dias de prisão por cada um desses dois crimes; v. em cúmulo jurídico das penas parcelares descritas em i. a iv., nos termos do art.º 77º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, condenar este Arguido na pena única de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão; vi. Ao abrigo do disposto nos art.ºs 50º, n.ºs 1 e 5, 53º e 54º do Código Penal, suspender a execução da pena de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão em que este Arguido vai condenado, pelo período de 3 (três) anos, com regime de prova a executar pela D.G.R.S.P».
2. O arguido AA interpôs recurso do acórdão condenatório. Aparta da motivação as seguintes conclusões: «1 – A confissão do Recorrente, embora considerada pelo Tribunal como irrelevante, constitui uma inequívoca manifestação de culpabilidade e arrependimento, devendo ser valorada como uma circunstância atenuante nos termos do artigo 72.º do Código Penal, extraindo-se daí as legais consequências. 2 - Não se encontram preenchidos os elementos constitutivos do crime de furto agravado, nomeadamente a intenção ilegítima de apropriação, conforme exige o artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal, uma vez que não está preenchido o dolo específico, ou seja, a intenção por banda do aqui recorrente. Crime esse que o mesmo não confessou, extraindo-se daí as legais consequências. 3 - A pena aplicada é desproporcional, excessiva e injusta, desrespeitando os princípios e critérios orientadores previstos nos artigos 40.º, 50.º, 71.º e 77.º, todos do Código Penal, nomeadamente, a ausência de antecedentes criminais do arguido, no que concerne aos crimes nos autos imputados, a sua confissão e colaboração com a justiça e a sua situação laboral estável e comportamento posterior aos factos. 4 - A aplicação de pena de prisão efetiva contraria o princípio consagrado no artigo 70.º do Código Penal, sendo mais ajustada a substituição da pena poroutra menos gravosa, como a suspensão da execução da pena, que permitirá cumprir os objetivos de prevenção geral e especial. 5 - Deve ser considerado que penas privativas de liberdade de curta duração têm efeitos criminógenos negativos, dificultando a reinserção social do arguido, o que vai contra a finalidade das penas previstas no artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal. 6 - Pugna pela suspensão da pena única cuja “execução acompanhada de regime de prova”, nunca superior a 3 anos, suspensa na sua execução».
3. O arguido DD interpôs, também, recurso do acórdão. Extrai da respectiva motivação as seguintes conclusões: «A. O presente Recurso é motivado pela falta de concordância do DD, ora Recorrente, quanto à apreciação da matéria de facto levada a cabo pelo Tribunal a quo, o qual considerou provados determinados factos relativamente aos quais não existe evidência da sua veracidade, bem como não logrou justificar devidamente as suas conclusões. B. Quanto ao crime de furto qualificado pelo qual se condenaram os quatro Arguidos em coautoria material, importa referir que foi confirmado pelas Declarações prestadas pelo EE, bem como pelos depoimentos das Testemunhas FF e GG, que terá sido o próprio EE a apanhar, do chão, o telemóvel do Assistente CC, e, apercebendo-se que não pertencia a nenhum dos coarguidos, terá diligenciado, por intermédio daquelas testemunhas, pela entrega do referido telemóvel no estabelecimento do pai do Assistente CC. C. Mais, no que concerne à carteira de borracha do Assistente CC, não ficou cabalmente demonstrado que tenha sido qualquer um dos Arguidos a apanhar e ficar com a mesma. D. Deverá ainda acrescentar-se que o DD, ora Recorrente, não teve qualquer intenção de se locupletar ou apropriar daqueles bens. Aliás, no que respeita ao telemóvel do Assistente CC, o ora Recorrente desconhecia o seu proprietário e o destino que lhe foi conferido pelo EE. E. Razão pela qual, salvo melhor opinião, não ficou demonstrado que o DD tenha contribuído para a apropriação do telemóvel do Assistente CC, seja na fase de delineação do alegado plano de apropriação, seja na fase da sua eventual execução. F. Quanto ao crime de ofensa à integridade física simples do Assistente BB, é de referir que é absolutamente contrário às regras da experiência e da lógica que duas pessoas, neste caso os Arguidos EE e DD tenham dado um, único, pontapé na perna esquerda do Assistente BB. G. Ainda que se admita que um dos Arguidos deu um pontapé ao Assistente, o que somente por mero exercício académico se equaciona, é de admitir que o Tribunal a quo não consegue determinar, sem sombra de dúvida, qual dos Arguidos deu esse pontapé. H. Se assim é, a única possibilidade legal do Tribunal a quo deveria ter sido a absolvição de ambos os Arguidos, por não ter sido provado ou demonstrado, em sede de Audiência de Discussão e Julgamento, qual dos dois desferiu tal pontapé. I. Quanto ao crime de ofensa à integridade física qualificada ao Assistente CC, cumpre referir que nunca deveriam ter sido considerados provados os factos constantes do ponto 12), isto porque, em sede de declarações prestadas pelo próprio Assistente CC, o mesmo afirmou que “tem ideia que não chegou a perder a consciência enquanto esteve a ser pontapeado.”. J. Mais, no que concerne à sucessão de eventos, no momento em que os Arguidos EE e DD chegam ao pé do Assistente CC, quando este se encontra a ser molestado pelos outros dois Arguidos, importar esclarecer que não ocorreram quaisquer agressões por parte do DD ao Assistente CC, na medida em que, conjugando os factos provados e não provados considerados pelo Tribunal a quo, as agressões pararam no momento em que foi proferida a frase “já chega, já chega, vais matá-lo”, altura em que o Assistente CC se encontrava consciente, sem que tenham existido quaisquer outras agressões posteriores. K. Sendo certo que, em momento algum, das suas declarações, é indubitavelmente afirmado pelo Assistente CC que os Arguidos EE e DD tenham também participado nas agressões, limitando-se o mesmo a presumir tal facto, em virtude da intensidade das agressões, sem nunca confirmar, sem sombra de dúvidas, tal facto. L. Acresce que, não obstante as Declarações dos Arguidos AA e HH não terem sido levadas em linha de conta pelo Tribunal a quo, e tenham sido descredibilizadas, a verdade é que os mesmos foram perentórios quanto ao envolvimento de cada um nas agressões ao Assistente CC, assumindo para si a total responsabilidade por estes factos. M. É, portanto, inconcebível a extrapolação feita pelo Tribunal a quo, quando considera que o Assistente CC foi agredido pelos quatro Arguidos, facto este que não resulta da prova produzida, nem foi corroborado por qualquer outro meio de prova, nem mesmo pelo próprio Assistente. N. Desta feita, aplica-se também nesta situação o princípio do in dubio pro reo, pelo que, não sendo possível confirmar a participação do HH nas agressões infligidas ao Assistente CC, deveria o Tribunal a quo, ter absolvido o mesmo da prática deste ilícito criminal, na medida em que não foi demonstrada ou confirmada qualquer agressão da sua parte, nem, tão pouco, se demonstrou que teve qualquer intenção, em molestar o Assistente CC. O. Por fim no que respeita ao crime de injúrias, também se deverá referir que não foi possível imputar aos Arguidos a expressão que cada um terá, individualmente, proferido, não se sabendo se todos proferiram exatamente aquelas expressões, se apenas alguns proferiram tais expressões, ou se apenas um proferiu tais expressões, pelo que, em última instância, não podiam todos os Arguidos ser condenados por tais crimes. P. Assim sendo, requer-se, com o mui douto suprimento de V. Exas., que seja o presente Recurso julgado procedente, por provado e, em consequência seja a sentença proferida pelo Tribunal a quo parcialmente revista no que diz respeito a todas as condenações aplicadas ao DD, ora Recorrente, devendo mesmo ser absolvidos de tais crimes; ou, caso assim não se entenda, que sejam aplicados os limites mínimos legais ao DD, por cada ilícito imputado, em virtude da sua inexistente participação nos factos que motivaram os presentes Autos, nos termos acima descriminados. Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá o presente Recurso ser julgado procedente, por provado e, em consequência: a) Ser a sentença proferida pelo Tribunal a quo parcialmente revista no que diz respeito a todas as condenações aplicadas ao DD, ora Recorrente, devendo mesmo ser absolvidos de tais crimes; ou, caso assim não se entenda, b) Sejam aplicados os limites mínimos legais ao DD, por cada ilícito imputado, em virtude da sua inexistente participação nos factos que motivaram os presentes Autos, nos termos acima discriminados».
4. Os recursos foram admitidos, por despacho de 22 de Novembro de 2024.
5. A Ex.ma Magistrada do Ministério Público em 1.ª instância respondeu aos recursos interpostos pelos arguidos. Propugna pela confirmação do julgado e extrai das respostas as seguintes conclusões: «1. O arguido/Recorrente AA foi condenado pela prática, em coautoria material, de: ● 1 (um) crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts.º 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, al. d), do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e (dois) meses de prisão; ● 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts.º 143.º, n.º 1, 145.º, n.ºs 1, al. a), e 2, por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. h), Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão; ● 2 (dois) crimes de injúria, p. e p. pelo art.º 181.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 (um) mês e 20 (vinte) dias de prisão por cada um desses dois crimes; ● 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas, p. e p. pelo art.º 199.º, n.º 2, al. a), do Código Penal, na pena de 9 (nove) meses de prisão; ● 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas agravado, p. e p. pelos arts.º 199.º, n.ºs 2, al. b), e 3, e 197.º, n.º 2, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão. ➡ Em cúmulo jurídico das referidas penas parcelares, na pena única de 4 (quatro) anos de prisão (efetiva). 2. O Recorrente não impugna a factualidade dada como provada – pontos 13), 29) e 30) - e cuja actuação integra a prática do crime de furto qualificado p. e p. pelos arts.º 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, al. d), do Código Penal 3. Pelo que há que considerar tal factualidade como assente. 4. Assim, assente que a conduta dada como provada integra a prática de um crime de furto simples (subtracção de um telemóvel no valor de, pelo menos, € 400,00 e da carteira de borracha, com numerário, pertencentes ao Assistente CC, agindo com ilegítima intenção de apropriação para si), p. e p. no art.º 203º CP, importa agora determinar se a mesma é ou não subsumível à circunstância agravante ou modificativa prevista na alínea d), do nº 1, do art.º 204º, como se conclui no acórdão recorrido. 5. Ora, duvidas não existem que os bens referidos foram retirados ao Assistente quando este se encontrava caído e inanimado no chão, após ter sido agredido pelo Recorrente e pelos coarguidos, pelo que a referida conduta integra a prática do crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts.º 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, al. d), do Código Penal. 6. De salientar, ainda, que o recorrente, na sua motivação do recurso apresentado, desvalorizou o facto de ter chamado “mofino” a CC, alegando que tal palavra não constitui uma injúria, ao contrário do entendido pelo tribunal, dado que “mofino”, de acordo com o “dicionário da Priberam: “Que ou quem mostra tristeza ou infelicidade (ex.: estava numa prostração mofina; sintome um mofino). = INFELIZ, TRISTE "mofina", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008- 2024, https://dicionario.priberam.org/mofina.”. 7. Porém, tal palavra tem outros significados, como, por exemplo “mesquinho”, “covarde”, “medroso”, “fraco” – cfr. Dicio, Dicionário Online de Português. 8. Ora, certamente que o Recorrente, ao dirigir-se ao Assistente e ao chamá-lo de “mofino”, não se quis compadecer do mesmo por estar triste, mas sim insultá-lo e provocá-lo. 9. Pelo que não é “necessária muita bondade para se perceber que tal expressão é injuriosa”. 10. Os crimes pelos quais o Recorrente foi condenado são puníveis com as seguintes penas: ● O crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts.º 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, al. d), do Código Penal, é punido com pena de prisão de 1 (um) mês até 5 (cinco) anos ou com pena de multa de 10 (dez) dias até 600 (seiscentos) dias (cfr. ainda arts.º 41.º, n.º 1, e 47.º, n.º 1, do Código Penal). ● O crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts.º 143.º, n.º 1, 145.º, n.ºs 1, al. a), e 2, por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. h), Código Penal, é punido com pena de prisão de 1 (um) mês até 4 (quatro) anos (cfr. ainda art.º 41.º, n.º 1, do Código Penal). ● O crime de injúria, p. e p. pelo art.º 181.º, n.º 1, do Código Penal, é punido com pena de prisão de 1 (um) mês até 3 (três) meses ou com pena de multa de 10 (dez) até 120 (cento e vinte) dias (cfr. ainda art.ºs 41.º, n.º 1, e 47.º, n.º 1, do Código Penal). ● O crime de gravações e fotografias ilícitas, p. e p. pelos arts.º 199.º e 197.º, n.º 2, do Código Penal é punido com pena de prisão de 1 (um) mês até 1 (um) ano ou com pena de multa de 10 (dez) dias até 240 (duzentos e quarenta) dias (cfr. ainda arts.º 41.º, n.º 1, e 47.º, n.º 1, do Código Penal). ● O crime de gravações e fotografias ilícitas agravado, p. e p. pelos art.ºs 199º e 197º, n.º 2, do Código Penal é punido com pena de prisão de 1 (um) mês e 10 (dez) dias até 1 (um) ano e 4 (quatro) meses ou com pena de multa até 320 (trezentos e vinte) dias (cfr. ainda art.º 41.º, n.º 1, do Código Penal). 11. Verificando-se que os crimes de furto qualificado, injúria, gravações e fotografias ilícitas e gravações e fotografias ilícitas agravado são puníveis com pena de prisão ou pena de multa, há que ponderar da suficiência e adequação da pena de multa à realização das finalidades da punição, quais seja, a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. 12. Assim, será de salientar que, no caso sub-judice, as necessidades já algo relevantes de prevenção geral atenta a frequência deste tipo de crimes na nossa sociedade e, em particular, nesta comarca, bem como as circunstâncias em que esses factos ocorreram – apoderarem-se dos bens do Assistente, quando este se encontrava caído no chão, inanimado, e filmar as agressões de que este estava a ser vitima, não para produzir prova desses factos, mas sim com o intuito de “humilhar” e divulgar os mesmos, sendo que o Recorrente já tinha antecedentes criminais, levaram a que o tribunal tenha optado pela aplicação de uma pena de prisão em detrimento da pena de multa. 13. Com relevância para a determinação da medida da pena há a considerar que: ◾ a intensidade do dolo, elevada, pois existiu na modalidade de dolo direto; ◾o modo de execução do facto, ou seja, que o Recorrente agrediu violentamente o Assistente, sendo que posteriormente se apropriaram dos seus bens quando CC já encontrava inanimado, no chão, sem possibilidade de defesa; que filmou tais agressões, enquanto obrigava o ofendido a pedir desculpa e as divulgou pretendendo humilhar aquele; que abandonou a vitima no local, deslocando-se posteriormente, com os coarguidos, para o “Clube”, onde foi comer e beber, como se nada de grave se tivesse passado. Efectivamente não se pode ignorar que estamos perante um ato de violência extrema, exercida de forma gratuita contra alguém com intenção de o molestar física e psicologicamente; ◾ o grau de ilicitude do facto, que se mostra muito elevado; ◾ as consequências dos crimes praticados; ◾as elevadíssimas exigências de prevenção geral, no sentido de repor a confiança dos cidadãos na validade das normas jurídicas violadas, especialmente no que respeita ao crime de ofensa à integridade física qualificada, que, pelas circunstâncias em que foi cometido e o local onde foi cometido (uma pequena vila) gera um elevado alarme social, urgindo repor um sentimento comunitário de segurança, necessário à vivência em sociedade. As exigências de prevenção geral igualmente se mostram elevadíssimas relativamente aos crimes de gravações ilícitas, atentas as imagens registadas e forma como estas foram captadas, expondo de forma completamente desnecessária e sem qualquer sentido o Assistente CC. E não se diga que se tratou, apenas de fotografias, selfies e vídeos usados pelos jovens nas redes sociais, tão banais, designadamente as selfies que até são “apadrinhadas por Sua Exa. o Presidente da República”. Não satisfeito com a humilhação já causada, este Arguido ainda difundiu essas mesmas imagens por terceiros, aumentando ainda mais o sentimento de vexação provocado no Assistente, e de insegurança e de alarme social por parte daqueles que as visionaram e souberam da sua existência, mostrando-se premente que estes tipos de comportamentos sejam exemplarmente punidos, por forma a repor o sentimento de segurança necessário à vivência em sociedade; ◾ os seus antecedentes criminais, sendo que já havia sido condenado pela prática de um crime de injúria agravada, ainda que sancionado com pena não privativa da liberdade, o que é elucidativo de que o Recorrente ainda não assimilou a necessidade de adotar um comportamento conforme ao Direito e às regras de vivência em sociedade, com respeito pelos demais, que não se coíbe de insultar e molestar, como se verificou na situação em apreço nos autos; ◾ a idade do Recorrente e que se encontra inserido laboralmente; ◾ que confessou parcialmente os factos, o que fez apenas após a produção de prova e tentando justificar as suas condutas com provocações por parte do Assistente. 14. Sopesadas estas circunstâncias, julgou o tribunal a quo adequado e equitativo aplicar ao Recorrente: ↪ a pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão, pela prática, em coautora material, de 1 (um) crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts.º 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, al. d), do Código Penal; ↪ a pena de 3 (três) anos de prisão pela prática, em coautoria material, de 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts.º 143.º, n.º 1, 145.º, n.ºs 1, al. a), e 2, por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. h), Código Penal; ↪ a pena de 1 (um) mês e 20 (vinte) dias, pela prática, em coautoria material, de cada um dos 2 (dois) crimes de injúria, p. e p. pelo art.º 181.º, n.º 1, do Código Penal; ↪ a pena de 9 (nove) meses de prisão pela prática, em autoria material, de 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas, p. e p. pelo art.º 199.º, n.º 2, al. a), do Código Penal; ↪ a pena de 1 (um) ano de prisão pela prática, em autoria material, de 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas agravado, p. e p. pelos arts.º 199.º, n.ºs 2, al. b), e 3, e 197º, n.º 2, do Código Penal. 15. Em cúmulo jurídico das referidas penas parcelares, na pena única de 4 (quatro) anos de prisão. 16. Numa moldura penal abstracta de 3 anos de prisão (limite mínimo) a 6 anos, 2 meses e 10 dias de prisão, a pena concreta fixada no acórdão, é inteiramente justa, equilibrada e não merece reparo, mostrando-se conforme aos parâmetros gerais e concretos de fixação, segundo os arts.º 40.º e 71.º, respectivamente, do CP. 17. No caso dos autos, atenta a pena aplicada – 4 anos -, é legalmente possível suspender a execução da pena. 18. No entanto, atento o que ficou dito, tendo em conta os tipos de crime em causa, não só as exigências de prevenção geral positiva, atento o forte alarme social das condutas praticadas, como as exigências de prevenção especial positiva, consubstanciadas no facto de não se afigurar como suficiente a simples ameaça da pena, dado que a Recorrente já havia sido condenada em pena de multa, o que não se revelou suficiente para a impedir de vir a praticar novos crimes, há que concluir pela necessidade de aplicação de uma pena de prisão efetiva. 19. No mais, não se mostrará violado qualquer preceito legal nem desrespeitado qualquer direito. 11. Nesta conformidade, negando-se provimento ao recurso e mantendo-se o douto acórdão recorrido, será feita justiça»; e «1. O Arguido/Recorrente DD foi condenado pela prática, em coautoria material, de: ● 1 (um) crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts.º 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, al. d), do Código Penal, 4.º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73º do Código Penal, na pena de 10 (dez) meses de prisão; ● 1 (um) crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelos arts.º 143.º, n.º 1, do Código Penal, 4º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73.º do Código Penal, na pessoa do Assistente BB, na pena de 9 (nove) meses de prisão; ● 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts.ºs 143.º, n.º 1, 145º, n.ºs 1, al. a), e 2, por referência ao art.º 132º, n.º 2, al. h), Código Penal, 4.º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73.º do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; ● 2 (dois) crimes de injúria, p. e p. pelos arts.º 181.º, n.º 1, do Código Penal, 4.º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73º do Código Penal, na pena de 1 (um) mês e 10 (dez) dias de prisão por cada um desses dois crimes; ➡ Em cúmulo jurídico das referidas penas parcelares, na pena única de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 (três) anos, com regime de prova a executar pela D.G.R.S.P. 2. “A jurisprudência define a co-autoria como envolvendo um acordo prévio com vista à realização do facto, acordo esse que pode ser expresso ou implícito, a inferir razoavelmente dos factos materiais comprovados, ao qual se pode aderir inicial ou sucessivamente, não sendo imprescindível que o co-autor tome parte na execução de todos os actos, mas que aqueles em que participa sejam essenciais à produção do resultado. No plano objectivo, o co-autor torna-se senhor do facto, que domina globalmente, tanto pela positiva, assumindo um poder de direcção, preponderante na execução conjunta do facto, como pela negativa, podendo impedi-lo, sem que se torne necessária, para a comparticipação estabelecida, a prática de todos os actos que integram o iter criminis. No plano subjectivo, é imprescindível, à comparticipação como co-autor, que subsista a consciência da cooperação na acção comum.” (neste sentido, vd. Ac STJ, de 05.06.2012, disponível em www.dgsi.pt). 3. Na coautoria o acordo prévio, expresso ou tácito basta-se com a existência da consciência e vontade de colaboração dos vários agentes na realização do crime, e a actuação de cada agente embora parcial integra-se no todo planeado que conduz à produção do resultado (neste sentido, vd. Ac TRC, 08.05.2018, disponível em www.dgsi.pt). 4. No caso dos autos, face à factualidade dada como provada, não existem dúvidas que o Recorrente acompanhou, desde o início, os restantes arguidos, nunca os tendo abandonado. 5. Efectivamente esteve presente aquando da abordagem, pelo grupo onde se integrava, aos Assistentes CC e BB, quando os perseguiram, sendo que o Recorrente, juntamente com o arguido EE, seguiu no encalço do Assistente BB, a quem desferiram um pontapé. 6. Logrando BB fugir, estes regressaram para junto dos restantes arguidos, que rodeavam o Assistente CC ao mesmo tempo que o agrediam, com murros e pontapés, estando este deitado no chão e filmavam tal comportamento. 7. Foi nessa altura que o arguido EE retirou o telemóvel do Assistente que lhe caíra do bolso. Sendo que um deles retirou a carteira de borracha, com cerca de € 5,00, que aquele igualmente trazia consigo. 8. Não tendo o Recorrente impedido que o fizessem. 9. Pelo que há que concluir que o Recorrente deu o seu acordo prévio, tácito, ao colaborar com os restantes arguidos, na apropriação dos bens em causa, bem como nas agressões de que os Assistentes foram vítimas. 10. Efectivamente, ao ir no encalço do Assistente BB, juntamente com o arguido EE, fê-lo com a intenção de o atingir na sua integridade física. 11. Assim, é indiferente que tivesse sido o Recorrente a desferir o pontapé ou que tivesse sido o arguido EE. 12. Ou que tivesse sido o Recorrente a retirar o telemóvel e a carteira ou que tivesse sido outro dos arguidos. 13. Ou que tivesse sido o recorrente a proferir as palavras injuriosas aos Assistentes ou tivesse sido outro ou outros dos arguidos. 14. O que releva, de facto, é que o Recorrente se tornou “senhor do facto”, dominando-o e assumindo um poder de direcção dado que, podendo ter impedido toda a actuação levada a cabo, não só a impediu (retirada dos objectos) como comparticipou na perseguição do Assistente BB com o objectivo de o atingir na sua integridade física, independentemente de ter sido a pessoa que desferiu o pontapé. 15. Efectivamente, como se decidiu no acórdão do STJ supra referido, para a comparticipação não se torna necessária a prática de todos os actos que integram o iter criminis. 16. De salientar que o comportamento do Recorrente após terem abandonado o Assistente CC no local, caído no chão e bastante ferido, demonstra o quanto aderiu ao plano do grupo. 17. De facto, não demonstrando qualquer preocupação com as consequências que pudessem advir das suas condutas, designadamente com o estado de saúde do Assistente, bem elucidativo na fotografia captada por um dos telemóveis dos arguidos e constante de fls. 84 dos autos, seguiu, juntamente com o restante grupo, para o bar do “Clube”, como se nada se tivesse passado. 18. Nenhuma dúvida se suscitou ao tribunal a quo quanto aos factos que deveria dar como provados ou não provados, tendo a prova sido reputada suficiente para a decisão da causa, isto é, foi considerada bastante e não dando margem para dúvidas quanto à autoria, por parte do Recorrente, dos crimes por cuja prática se encontra condenado. 19. E, atenta a fundamentação da decisão, explanada de forma clara e pormenorizada, é perfeitamente consequente e lógico o raciocínio seguido pelo tribunal e conducente à condenação do Recorrente, dado ter considerado provados os factosintegradores dos elementos objectivos e subjectivos constitutivos dos tipos legais dos crimes em causa. 20. Pelo que não tem base de sustentação a imputação de violação do princípio in dubio pro reo como pretende o Recorrente. 21. Tendo em consideração a idade do Recorrente à data da prática dos factos, o tribunal a quo entendeu ser de aplicar o regime do DL n.º 401/82, de 23.09, que estabelece o regime penal especial para jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos, que tenham praticado um facto qualificado como crime. 22. Assim, os crimes cometidos pelo Recorrente passam a ter as seguintes molduras penais: ● O crime de furto qualificado passa a ser punido com pena de prisão de 1 (um) mês até 3 (três) anos e 4 (quatro) meses ou com pena de multa de 10 (dez) dias até 400 (quatrocentos) dias; ● O crime de ofensa à integridade física simples passa a ser punido com pena de prisão de 1 (um) mês até 2 (dois) anos ou com pena de multa de 10 (dez) dias a 240 (duzentos e quarenta) dias; ● O crime de ofensa à integridade física qualificada passa a ser punido com pena de prisão de 1 (um) mês até 2 (dois) anos e 8 (oito) meses; ● O crime de injúria passa a ser punido com pena de prisão de 1 (um) mês até 2 (dois) meses ou com pena de multa de 10 (dez) até 80 (oitenta) dias. 23. Com relevância para a determinação da medida da pena há a considerar que: ◾ a intensidade do dolo, elevada, pois existiu na modalidade de dolo direto; ◾o modo de execução do facto, ou seja, que o Recorrente agrediu violentamente o Assistente, sendo que posteriormente se apropriaram dos seus bens quando CC já encontrava inanimado, no chão, sem possibilidade de defesa; que filmou tais agressões, enquanto obrigava o ofendido a pedir desculpa e as divulgou pretendendo humilhar aquele; que abandonou a vitima no local, deslocando-se posteriormente, com os coarguidos, para o “Clube”, onde foi comer e beber, como se nada degrave se tivesse passado. Efectivamente não se pode ignorar que estamos perante um ato de violência extrema, exercida de forma gratuita contra alguém com intenção de o molestar física e psicologicamente; ◾ o grau de ilicitude do facto, que se mostra muito elevado; ◾ as consequências dos crimes praticados, especialmente no que respeita ao crime de ofensa à integridade física qualificada, revelam-se de intensidade elevada, pela violência utilizada e forma como o Assistente CC é abordado e molestado fisicamente, em superioridade numérica e com uma agressividade muito acentuada, pelos Arguidos, pese embora este Arguido, que inicialmente seguiu em perseguição do Assistente BB, tenha tido um papel menor nas agressões efetuadas ao Assistente CC, que já se mostravam em curso quando chegou junto dos Arguidos HH e AA; ◾as elevadíssimas exigências de prevenção geral, no sentido de repor a confiança dos cidadãos na validade das normas jurídicas violadas, especialmente no que respeita ao crime de ofensa à integridade física qualificada, que, pelas circunstâncias em que foi cometido e o local onde foi cometido (uma pequena vila) gera um elevado alarme social, urgindo repor um sentimento comunitário de segurança, necessário à vivência em sociedade; ◾ que não tem antecedentes criminais; ◾ a idade do Recorrente e que se encontra inserido familiar e laboralmente. 24. Assim, sopesadas estas circunstâncias, julgou o tribunal a quo adequado e equitativo aplicar ao Recorrente, ↪ pena de 10 (dez) meses de prisão, pela prática de 1 (um) crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts.º 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, al. d), do Código Penal, 4.º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73.º do Código Penal; ↪ pena de 9 (nove) meses de prisão, pela prática de 1 (um) crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelos arts.º 143.º, n.º 1, do Código Penal, 4.º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73.º do Código Penal, na pessoa do Assistente BB, que, tendo estelogrado posteriormente fugir e refugiar-se no seu veículo automóvel, não assumiu contornos mais graves; ↪ pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão pela prática de 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts.º 143.º, n.º 1, 145º, n.ºs 1, al. a), e 2, por referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. h), Código Penal, 4.º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73º do Código Penal, na pessoa do Assistente CC; ↪ a pena de 1 (um) mês e 10 (dez) dias por cada um dos 2 (dois) crimes de injúria, p. e p. pelos arts.º 181.º, n.º 1, do Código Penal, 4.º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73º do Código Penal. ➡ Em cúmulo jurídico das referidas penas parcelares, na pena única de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, sujeita a regime de prova. 25. Numa moldura penal abstracta de 1 ano e 6 meses de prisão (limite mínimo) a 3 anos 3 meses de prisão, a pena concreta fixada no acórdão, é inteiramente justa, equilibrada e não merece reparo, mostrando-se conforme aos parâmetros gerais e concretos de fixação, segundo os arts.º 40.º e 71.º, respectivamente, do CP. 26. No mais, não se mostrará violado qualquer preceito legal nem desrespeitado qualquer direito. 27. Nesta conformidade, negando-se provimento ao recurso e mantendo-se o douto acórdão recorrido, será feita justiça».
6. Os assistentes/demandantes CC e BB responderam, outrossim, aos recursos interpostos. Sintetizaram da resposta apresentada as conclusões que seguem: «I. O Acórdão proferido pelo Juízo Central Criminal de Sintra é o culminar de um processo de investigação penal exemplar, conduzido pelo Ministério Público e executado, no terreno, pelos Agentes da GNR de ... que, de forma lesta, dedicada e eficaz, levaram a cabo uma investigação que deu origem à acusação do MP e à Sentença ora injustamente em crise. II. O Acórdão proferido é, também, a afirmação plena da Justiça num Estado de Direito democrático: respeitadora dos direitos dos Arguidos na sala da Audiências e sem tibiezas na afirmação das regras que norteiam a Sociedade e cuja violação se pretende ver punida pelo sistema penal. III. Elemento essencial e prévio da decisão acerca dos recursos interpostos, será o visionamento pelos Srs. Juízes-Desembargadores das filmagens de algumas das ofensas, realizadas pelos próprios Arguidos, ora como realizador, ora como protagonistas, enquanto as perpetravam: pontapés, socos, insultos sobre um dos Assistentes, bem como as fotos e a sucessão de fotogramas que constam dos autos e que culminam nos arguidos reunidos no Clube, depois das agressões, antes de rumarem a casa para um sono retemperador enquanto os lesados iam para o hospital e as pessoas iam trabalhar. IV. Sinal dos tempos, os Agressores não apenas quiseram agredir, mas também quiserem imortalizar a sua vaidade bárbara em suporte digital. Foi o que aconteceu. (Declarações Ofendido BB dia ........2024; 01: 32:00; a difusão e propagação foi tal que familiares do ofendido tiveram conhecimento antes deste ter transmitido algo). A – Do Recurso interposto pelo DD V. Os factos que o Recorrente pretende que não sejam dados como provados resultam do seu desejo, e não da prova. VI. Da prova produzida, dos elementos e das regras da experiência a que o Arguido alude quando lhe é conveniente, resulta que o mesmo teve um papel ativo e relevante na sucessão dos factos praticados sobre os ofendidos: injúrias, ofensas corporais e furto qualificado. VII. Quando um dos elementos pertence ao grupo sabe perfeitamente quem tem telemóvel, e de quem é o telemóvel que está ao lado de uma pessoa inanimada no chão, abundantemente sangrando, e com um telemóvel a seu lado. VIII. Chama-se a esta função a recolha dos despojos. IX. A regra da experiência e da lógica leva a concluir que da mesma maneira que os Arguidos levaram o telemóvel levaram a carteira. X. Não ficou demonstrada que o Recorrente não tivesse a intenção de se apropriar dos bens, pelo contrário, ficou demonstrado que o Arguido fazia parte do grupo, do condomínio em que cada um assumiu a sua função, direcionada a determinado ofendido, e quando um deles escapou-se por correr mais, o Recorrente voltou para terminar e ajudar a terminar as ofensas. XI. Pelos resultados físicos e pelo depoimento do ofendido foi o Recorrente em conjunto com o outro Arguido a socar, pontapear e empurrar de forma violenta o ofendido. XII. Os Ofendidos foram perentórios nos contributos e autores das ofensas, injúrias, do cerco. Os Ofendidos atestaram que forma todos os Arguidos que, galvanizados entre si, procuraram provocar, lançar um rastilho, chamando paneleiros e larilas, o que fosse necessário para dar largas à vontade de bater, de se divertirem. XIII. O Tribunal a quo teve oportunidade de ouvir os depoimentos dos ofendidos, das testemunhas que presenciaram o antes e o depois, tendo aliás como referência o relato filmado pelos próprios Arguidos. XIV. Naturalmente valorando todos os elementos, nomeadamente os movimentos de encobrimento e solidariedade grupal. XV. Talvez para o Recorrente o que fez mais impressão foi a experiência, conhecimento, a sensibilidade do Tribunal a quo, não se deixando levar pelas tentativas de fuga, de desresponsabilização e falta de hombridade dos Arguidos. XVI. Deverá improceder o Recursos pois foi graças a este Arguido, e os demais, actuando em grupo, em consonância, qual matilha que presentearam os ofendidos com o maior inferno da sua vida. XVII. Não sabendo comportar-se em comunidade, os Arguidos têm de perceber que há consequências por tal conduta, logo devem ser punidos. B – Do Recurso interposto pelo AA XVIII. O arguido não demonstrou qualquer centelha de arrependimento que não fossem meras palavras vazias que apenas pretenderam buscar a possibilidade de invocação formal no momento de interposição do recurso. XIX. Sendo este inexistente, não poderia ser considerado como uma atenuante. XX. A alegada confissão do Arguido é inexistente e sem valor algum, tendo em conta que foi feita no final do processo, após a produção de toda a prova, o visionamento das suas filmagens das agressões, dos relatos dos ofendidos, da sucessão dos fotogramas, dos depoimentos de quem se cruzou com os arguidos após as ofensas barbaramente infligidas. XXI. O Arguido não demonstrou ter absorvido o desvalor das suas condutas, pelo contrário. XXII. O Arguido através do seu registo criminal, revela que uma condenação anterior sem privação de liberdade de nada lhe serviu para alterar a sua conduta, entendendo e confundindo os mecanismos legais (de aposta na recuperação do ser humano), com impunidade, liberdade de tudo poder fazer a qualquer outro ser humano, de poder ofender, bater, magoar… XXIII. Atenta a sucessão dos factos praticados pelo arguido é evidente que estamos perante uma conduta sedimentada, amadurecida, com características interiorizadas de desrespeito, de impunidade, de um percurso que até ao momento apenas não teve mais manifestações formais, o que não significa que no plano material não tenha tido comportamentos similares ou que não tenham ocorrido. XXIV. O Arguido-Recorrente considera que não se encontram preenchidos todos os elementos do tipo crime de fruto agravado, pois, entende que para tal teria que ter pegado e levado o telemóvel e a carteira (que imputa a outro co-Arguido). XXV. O Arguido omite que a sua atuação foi determinante na queda do ofendido, na permanência deste no chão e perda de sentidos. O Arguido omite que foi essa sua atuação que levou a que o ofendido não se pudesse defender, reagir ou de algum modo impedir o furto do telemóvel e da carteira. XXVI. É que, contrariamente, ao que alega, não se exige que todos os agentes intervenham em todos os atos delitivos, destinados a produzir o resultado típico pretendido, bastando que a atividade de cada um dos agentes seja parcela do conjunto da ação, desde que indispensável á produção do fim e do resultado a que o acordo se destina. XXVII. A decisão e definição da pena não foi desproporcional, nem excessiva, e muito menos injusta, mas sim assertiva, equilibradas e adequada às condutas do Arguido que preencheram em pleno os tipos criminais XXVIII. Nenhum princípio de direito Criminal, critério ou orientações foram postos em causa ou desrespeitados. XXIX. O Tribunal a quo limitou-se a aplicar o Direito ao cidadão que assumindo de modo consciente uma conduta desviante, alertado para a mesma, condenado por anteriores condutas, entende que estará acima da lei e que a comunidade lhe permite ter todo e qualquer tipo de actuação. XXX. Preocupações intensas de prevenção geral, em que a falta de responsabilização do Arguido é percebida como permissão e autorização para tudo poder fazer. XXXI. Os atos dos Arguidos tiveram uma extrema repercussão na Vila da ... por terem sido infligidos aos “filhos da terra”, a filhos de pessoas que têm estabelecimentos comerciais, que são conhecidas e com as quais existem relações. XXXII. A não punição com pena efectiva, é dizer à comunidade que estes Arguidos, na ..., tudo podem fazer, tudo lhes é e será permitido … XXXIII. Para o exterior, para a população, nada aconteceu aos Arguidos que continuam a frequentar os mesmos locais, as mesmas ruas, etc. XXXIV. Mas também é dizer aos Ofendidos que o seu sofrimento durante e após os factos não tem qualquer valor, é alimentar um sentimento de insegurança, de desrespeito pela ordem e pelo Direito. É dizer aos ofendidos que enfrentar os seus medos de levar os Arguidos a julgamento não valeu a pena. XXXV. A reincidência do Arguido na prática de crimes é por si só a demonstração que o mesmo não interiorizou o desvalor das condutas, pois, em tão curto espaço de tempo após a sua primeira condenação, não hesitou em praticar novos crimes. XXXVI. O Arguido não intuiu na primeira condenação o sentido e a razão de ser da suspensão da execução da pena. A prática de novos crimes – como ficou demonstrado nestes autos e, a final, acabou por confessar – é a evidência de que a mera ameaça não cumpre os objectivos de prevenção especial, e muito menos geral. XXXVII. Pelo que o Arguido Recorrente não deverá beneficiar de qualquer suspensão do cumprimento da pena definida».
7. Nesta instância, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta, louvada nas respostas, é de parecer que os recursos devem ser julgados improcedentes. Aduz, ademais e em síntese, que: «(…) afigura-se-nos que o recorrente DD não cumpriu o ónus a que estava obrigado, nos termos do art.º 412.º n.ºs 3 e 4 do Código de processo Penal. Na verdade, tanto no corpo da sua motivação como nas conclusões, limita-se a discordar da forma como o tribunal recorrido formou a sua convicção, não indicando as concretas provas que sustentam decisão diversa relativamente aos concretos pontos que considera incorretamente julgados, nem especificando as passagens da gravação em que se funda a discordância. O convite para o aperfeiçoamento está inviabilizado por ser legalmente admissível apenas para as conclusões que constituem o resumo da motivação. Faltando o cumprimento do ónus no corpo da motivação, não será possível resumir o que não existe».
8. Cumprido o artigo 417.º, n.º 2 do C.P.P., respondeu, apenas, o recorrente AA, reiterando as razões aduzidas no recurso por ele interposto.
9. Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos foram os autos à conferência, cumprindo, agora, decidir.
II. FUNDAMENTAÇÃO
1. Delimitação do objeto do recurso
Atento o teor das conclusões das motivações dos recursos, importa fazer exame das questões (alinhadas segundo um critério de lógica e cronologia) atinentes:
a) Recorrente AA - ao erro do Colectivo a quo no julgamento da matéria de direito relativo à subsunção dos factos ao crime de furto qualificado, à medida da pena única e à decisão de não suspensão de execução da pena;
b) Recorrente DD – ao erro do Colectivo a quo no julgamento da matéria de facto e ao erro no julgamento da matéria de direito quanto à medida das penas.
2. A decisão trazida da instância sobre a matéria de facto e respectiva motivação, para o que agora importa, é do seguinte teor: «A – Da Acusação deduzida pelo Ministério Público e da Acusação deduzida pelos Assistentes: 1) No dia ... de ... de 2023, cerca das 05h00m, os Assistentes CC e BB encontravam-se a conversar no ..., na ..., quando ali apareceram os Arguidos HH, AA, DD e EE; 2) Ao aperceberem-se da presença dos Assistentes, os Arguidos dirigiram-se àqueles, rodearam-nos e chamaram-nos de paneleiros e larilas; 3) Para evitar conflitos os Assistentes CC e BB saíram do local e dirigiram-se para a Rua ...; 4) De imediato, os Arguidos seguiram no encalço daqueles e, após uma troca de palavras, o AA, em tom alto e sério, disse-lhes “têm 20 segundos para correr”; 5) Prontamente, CC e BB começaram a correr em direção à Travessa ... perseguidos por todos os Arguidos que, em conjugação de esforços e de intentos, foram movidos pelo mesmo ânimo persecutório de os molestar; 6) Na Travessa ..., junto ao estabelecimento “...”, um dos Arguidos desferiu um murro em CC, atingindo-o na face o que fez com que caísse no solo; 7) Aí, de imediato, os Arguidos HH e AA dirigiram-se a CC e, com o uso de força física, desferiram-lhe murros e pontapés atingindo-o na cabeça, no olho direito, no pescoço, no tronco e nas pernas; 8) Enquanto isso, os Arguidos DD e EE seguiram no encalço de BB e desferiram-lhe um pontapé na perna esquerda; 9) BB conseguiu afastar-se dos referidos Arguidos e refugiar-se no interior da sua viatura que estava estacionada no Largo ..., na ...; 10) Após a perseguição a BB, os Arguidos DD e EE regressaram para junto de CC a quem desferiram, igualmente, murros e pontapés enquanto este permanecia deitado no solo; 11) O AA dirigindo-se a CC disse-lhe que era um “mofino” e, enquanto o filmava deitado no chão sem a sua autorização, ordenou-lhe que pedisse desculpa, o que este fez repetidas vezes, com receio pela sua integridade física e mesmo pela sua vida; 12) A dado momento, CC ficou inanimado no solo e sem qualquer capacidade de reação; 13) Enquanto desferiam pontapés no Assistente CC, o EE disse “já chega, já chega, vais matá-lo” o que fez com que abandonassem o local, levando consigo o telemóvel, no valor de, pelo menos, €400,00 (quatrocentos Euros) e a carteira de borracha com numerário do Assistente CC, que havia caído do bolso deste, que os Arguidos fizeram seus; 14) Nesse mesmo dia, pessoa não identificada entregou o referido telemóvel no estabelecimento de restauração denominado ..., sito na ..., pertencente ao pai de CC; 15) Nesse mesmo dia ........2023, o arguido AA divulgou o vídeo que efetuou de CC deitado no solo mencionado em 12., pelo menos, entre os seus amigos na rede social WhatsApp, o que fez sem o consentimento deste; 16) JJ, mãe de CC recebeu no seu telemóvel, via WhatsApp, o vídeo efetuado pelo AA que circulava na referida rede social; 17) Como consequência direta e necessária da descrita conduta dos Arguidos, CC sofreu um ferida no courocabeludo da região parieto-temporal esquerda, sagital, com cerca de 4cm, equimose arroxeada periorbital à direita, com marcado edema, derrame hemático subconjuntival nos quadrantes externos do olho direito, fratura coronal ângulo “superior” direito do dente incisivo central superior esquerdo com cerca de 0,4cm, fratura coronal ângulo “superior” esquerdo do dente incisivo central superior esquerdo com cerca de 0,1cm, lesões estas que lhe demandaram para cura um período de doença de 10 (dez) dias, com 8 (oito) dias de afetação da capacidade para o trabalho; 18) Como consequência direta e necessária da descrita conduta dos Arguidos, CC ficou com uma cicatriz no couro cabeludo e discretas irregularidades no esmalte dos bordos coronais de corte dos dentes incisivos centrais superiores, ambas de caracter permanente; 19) Como consequência direta e necessária da descrita conduta dos Arguidos, BB sofreu contusão avermelhada na face antero-medial da metade proximal da perna esquerda (edamaciada), de eixo maior vertical com 9cm x 8cm, contusão avermelhada na face medial do teço médio da perna esquerda de eixo maior vertical com 9cm x 5cm, aquimose azulada na face medial do retropé esquerdo, de eixo maior vertical com 8cm x 2,5cm, lesões estas que lhe demandaram para cura um período de doença de 5 (cinco) dias, sem afetação da capacidade para o trabalho geral; (…) 26) Ao dirigirem aos Assistentes CC e BB as expressões descritas no ponto 2) os Arguidos agiram com o propósito, concretizado, de ofender a dignidade, a honra e a consideração daqueles; 27) Os Arguidos agiram em conjugação de esforços e de intentos e em execução de um plano a que todos aderiram de imediato, determinados pelo propósito, concretizado, de molestarem o corpo e a saúde do Assistente CC; 28) Os Arguidos DD e EE agiram com o propósito, concretizado, de molestarem o corpo e saúde do Assistente BB; 29) Os Arguidos, também em conjugação de esforços e vontades, aproveitando-se da circunstância de terem colocado CC na impossibilidade de lhes opor resistência e explorando a sua especial debilidade física enquanto jazeu, por instantes, inanimado no chão, apoderam-se dos descritos bens e dinheiro que sabiam não lhes pertencerem; 30) Mais sabiam os Arguidos que, ao apoderarem-se de tais bens e dinheiro com o propósito, concretizado, de os fazer coisas suas, agiam contra a vontade e sem autorização do respetivo dono; (…)32) O AA filmou CC nos termos supra descritos e divulgou publicamente esse registo audiovisual sabendo que não estava autorizado pelo mesmo a fazê-lo e que agia contra a sua vontade, não obstante não se inibiu de agir como descrito; 33) Bem sabia ainda o AA que, ao partilhar tal vídeo numa rede social, estava a difundir tal conteúdo através da Internet e que aumentava significativamente o acesso do sobredito conteúdo a terceiros, o que logrou; 34) Todos os Arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que as suas descritas eram proibidas e punidas por lei e tinham capacidade para se determinar de acordo com esse conhecimento; B – Da acusação particular deduzida pelos Assistentes: 35) Os Assistentes não eram, nem são amigos dos Arguidos; 36) Os Assistentes são amigos um do outro e cresceram e sempre viveram na ...; 37) O HH antes de molestar fisicamente o Assistente CC cuspiu em direção ao mesmo; C – Do Pedido Cível deduzido pelo Assistente CC: 38) Enquanto era molestado fisicamente pelos quatro Arguidos o Assistente CC não ofereceu resistência, limitando-se a encolher-se e proteger-se das sucessivas investidas dos Arguidos, que, em grupo e superioridade numérica, sabiam que o mesmo não tinha como reagir; 39) O Assistente CC foi deixado caído no chão, sem que lhe fosse prestado qualquer tipo de socorro pelos Arguidos; 40) O Assistente temeu pela sua vida em consequência da atuação dos Arguidos, na forma supra descrita; 41) O Assistente, receoso de vir a cruzar-se com os Arguidos, procurou ajuda, dirigindo-se em direção ao parque de estacionamento onde o seu amigo BB tinha deixado o automóvel; 42) No parque de estacionamento (junto ao mercado) encontrou o BB, ainda em estado de choque, que o levou aos ...; 43) Após ser aí observado, o Assistente CC foi conduzido para o Hospital de ...; 44) Durante o período em que permaneceu no Hospital o Assistente CC sentiu-se revoltado, indignado e triste; 45) Durante aquelas horas e nos dias seguintes, cada dor e cada vez que se via ao espelho o Assistente CC relembrou-se daquilo a que tinha sido sujeito pelos Arguidos; 46) O Assistente sentiu-se humilhado com os factos a que foi sujeito pelos Arguidos; 47) Nos dias seguintes aos factos dos autos o Assistente CC teve o olho direito negro e inchado, dificultando-lhe a visão; 48) Quando procurava descansar e encostava a cabeça na almofada, esta ficava com sangue, o que o fazia reviver aquilo por que passou; 49) O Assistente CC sentiu dores na cabeça, na cara e no corpo e pernas em consequência da conduta dos Arguidos; 50) O Assistente CC após os factos objeto dos presentes autos quis fugir da ... e deixou de caminhar de forma tranquila na ...; 51) Nas semanas e meses subsequentes aos factos dos autos o Assistente CC sentiu e sente ansiedade; 52) O Assistente CC sente-se mal por ver os seus familiares preocupados e a sofrer por si; 53) O Assistente CC teme voltar a encontrar-se com os Arguidos e ser novamente atacado; 54) A situação por si vivenciada, supra descrita, espalhou-se pela vila da ...; 55) Durante as semanas subsequentes aos factos dos autos o Assistente CC procurou não sair de casa, limitando as saídas aos tratamentos necessários; 56) Após os factos dos autos o Assistente CC deixou de se encontrar com os seus amigos, na vila da ..., à noite; 57) Antes dos factos objeto dos presentes autos o Assistente CC confraternizava com amigos e colegas, sem qualquer receio, na vila da ...; 58) O Assistente CC trabalha com o pai num restaurante, na ...; 59) O Assistente CC suportou a quantia de €280,00 (duzentos e oitenta Euros) com o arranjo do dente incisivo esquerdo, em virtude da conduta dos Arguidos; 60) O Assistente CC suportou a quantia de €17,00 (dezassete Euros) a título de consulta de oftalmologia, em consequência da conduta dos Arguidos; 61) O Assistente CC suportou a quantia de €17,00 (dezassete Euros) com consulta de neurologista em virtude da conduta dos Arguidos; 62) O Assistente CC suportou a quantia de €15,00 (quinze Euros) com a remoção de pontos / agrafos, em consequência da conduta dos Arguidos; 63) O Assistente suportou quantia não inferior a €25,00 (vinte e cinco Euros) com calmantes e analgésicos, em virtude da conduta dos Arguidos; 64) Quando o telemóvel foi entregue, nas circunstâncias descritas no ponto 14) dos Factos Provados, este não tinha o cartão SIN; 65) O Assistente CC suportou €7,50 (sete Euros e cinquenta cêntimos) com a aquisição de um novo cartão SIN, em consequência da conduta dos Arguidos; 66) Em consequência da conduta dos Arguidos, o Assistente tomou “Sedoxil”, suportando com a sua aquisição a quantia de €3,73 (três Euros e setenta e três cêntimos); 67) O Assistente CC suportou a quantia de €24,60 (vinte e quatro Euros e sessenta cêntimos) a título de consulta de medicina geral, em consequência da conduta dos Arguidos; 68) Em consequência da conduta dos Arguidos o Assistente CC sentiu-se humilhado, enxovalhado e denegrido; 69) O sofrimento e angústia do Assistente CC em consequência da conduta dos Arguidos perdura; 70) Antes dos factos objeto dos presentes autos o Assistente CC era uma afável, comunicativa, serena, pacífico e alegre; 71) Nas duas semanas seguintes aos factos dos autos o Assistente CC não trabalhou; 72) O Assistente CC auferia, em média, €60,00 (sessenta Euros) por cada dia de trabalho prestado; D – Do Pedido Cível deduzido pelo Assistente BB: 73) Ao ser molestado fisicamente pelos Arguidos DD e EE nos termos supra descritos e ser por estes perseguido o Assistente BB temeu pela vida; 74) Tendo corrido com a única preocupação de abandonar aquele local, só tendo parado quando chegou ao seu carro, que estava estacionado no largo junto ao mercado; 75) Momento em que se virou para trás e se apercebeu que já não era seguido pelos Arguidos; 76) Nesse momento, em pânico, só pensou em refugiar-se no seu carro, trancando-se, sem saber o que estava a acontecer ao seu amigo CC; 77) De imediato, em desespero, resolveu ligar para a polícia, chamando por socorro; 78) Em consequência dos factos objeto dos autos o Assistente BB sentiu revolta, humilhação, tristeza e incredulidade pelo sucedido e culpa por não ter conseguido ajudar o amigo CC; 79) O Assistente BB sentiu-se denegrido e vexado com as expressões que os Arguidos lhe dirigiram; 80) Só após várias semanas decorridas dos factos dos autos é que o Assistente BB voltou a sair na vila da ...; 81) Antes do descrito no ponto antecedente e após os factos dos autos o Assistente BB sentiu-se inseguro, receoso e angustiado com a possibilidade de se deslocar à vila da ... e de se cruzar com algum dos Arguidos; 82) A ... sempre foi o local onde se reunia com colegas e amigos, em especial nas noites de fim de semana e em período de férias, e onde se sentia em segurança; 83) Após os factos objeto dos autos o Assistente BB tornou-se receoso, desconfiado, preocupado, deixando de socializar e de se sentir seguro na vila da ..., passando a conviver com os amigos em casa destes; 84) Antes dos factos dos autos o Assistente BB era uma pessoa tranquila, afável, comunicativo, sereno, pacífico e alegre;
(…) 99) O AA nasceu de uma relação afetiva pouco consistente entre os pais, tendo integrado o agregado paterno com aproximadamente 3 (três) meses de idade; 100) A madrasta KK, a quem chama de “mãe”, foi quem assumiu o papel da figura materna, tendo estabelecido com a mesma uma relação afetiva que se mantém, apesar da separação do pai e da madrasta, quando o Arguido tinha 10/11 anos de idade; 101) Este Arguido é oriundo de uma família em que ambos os progenitores estabeleceram várias relações afetivas, com nascimento de vários meios irmãos, proporcionando-lhe um ambiente marcado pela instabilidade vivencial e afetiva; 102) O Arguido não tem contactos com a mãe biológica; 103) Este Arguido apresenta um percurso escolar marcado por dificuldades de adaptação escolar, tendo abandonado os estudos com 18 anos de idade, concluindo o 9º ano de escolaridade; 104) Exerceu trabalhos em regime de part time, a partir dos 16 anos de idade; 105) Tem exercido trabalhos indiferenciados, apresentando um percurso laboral revelador de alguma instabilidade, evidenciando algumas dificuldades ao nível da manutenção das colocações laborais; 106) Iniciou na adolescência hábitos de consumo, ocasional, de substâncias estupefacientes e álcool, com consequente repercussão no estilo de vida adotado, evidenciando também dependência por videojogos e revelando dificuldades em gerir o seu quotidiano de forma estruturada e responsável, registando-se, consequentemente, conflitos com alguns familiares e no meio social; 107) Este é o segundo contacto com a justiça penal, tendo tido o seu primeiro contacto no âmbito do Proc. n.º 208/18.2..., no qual lhe foi aplicada a suspensão provisória do processo, pelo período de 24 meses, na condição de o Arguido cumprir injunções, o que veio a concretizar, embora com algumas dificuldades; 108) À data dos factos em apreço nos autos, AA integrava, temporariamente, o agregado da “irmã” LL (filha da madrasta) e cunhado, encontrava-se desempregado, e exercendo funções, ocasionalmente, na montagem de palcos e bancadas; 109) Após a ocorrência dos factos que deram origem ao presente processo, os familiares de AA recusaram-se a recebê-lo, tendo este ficado sem lugar para viver, desempregado e sem rendimento para a sua subsistência; 110) No contexto descrito no ponto antecedente, que a mãe de um amigo de infância/adolescência – MM – ao tomar conhecimento da sua situação, acolheu-o em sua casa, tendo o Arguido vivido de ... a ... neste núcleo familiar; 111) Numa fase inicial e até este conseguir colocação laboral, o que viria a acontecer em agosto de 2023, asseguram a sua subsistência; 112) AA exerce, desde então, a atividade de ajudante de ..., possuindo, desde janeiro de 2024, contrato de trabalho, com termo certo, com a empresa de panificação - NN, mostrando-se assíduo e empenhado no exercício das funções que lhe são confiadas; 113) Os patrões asseguram o seu transporte e a alimentação no período laboral; 114) Este Arguido aufere €830,00 (oitocentos e trinta Euros) mensais, suportando €350,00 (trezentos e cinquenta Euros) mensais a título de renda pelo quarto onde reside desde ... ano, €100,00(cem Euros) mensais com telecomunicações e televisão e €100,00 (cem Euros) referentes ao pagamento mensal da playstation; 115) O Arguido pretende arrendar um apartamento e tirar a carta de condução; 116) Este Arguido mostra-se muito vulnerável à influência dos pares; 117) Embora AA mantenha contactos com a figura paterna e ex-madrasta, não possui apoio familiar consistente. 118) Este Arguido beneficia do apoio de amigos, que o conhecem desde criança; 119) DD, de 21 anos de idade, é fruto de uma relação pontual entre os progenitores, não tendo o progenitor, quando este nasceu, assumido a paternidade, vindo esta a ser reconhecida mais tarde, não tendo o Arguido mantido uma relação próxima com o mesmo; 120) Posteriormente, quando o Arguido tinha 4 anos de idade, a progenitora estabeleceu relação conjugal, da qual nasceram dois irmãos germanos, de 7 e 14 anos de idade, respetivamente; 121) O Arguido e restante família residiram na ..., até ..., tendo a progenitora e o padrasto optado por mudar de residência para a aldeia de origem daquela, em busca de um estilo de vida que permitisse outra disponibilidade para a família; 122) O Arguido integrou, desde sempre, o núcleo familiar da progenitora, enfermeira no Centro de Saúde de ..., e do marido desta, empresário em nome individual (na área da eletricidade); 123) DD exibe um percurso escolar regular até ao 9º ano, sem registo de retenções, tendo ainda frequentado o ensino profissional, que lhe daria a equivalência ao 12º ano, que não concluiu; 124) Este Arguido padece de perturbação de hiperatividade e défice de atenção (PHDA), com as inerentes consequências ao nível da capacidade de concentração/atenção e desempenho escolar; 125) Este Arguido iniciou o seu enquadramento profissional, aos 18 anos de idade, na empresa do padrasto, ..., com contrato de trabalho, desempenhando tarefas indiferenciadas e auferindo o salário mínimo nacional; 126) O Arguido continua a integrar o agregado nuclear, sendo as despesas fixas deste assumidas, na sua maioria, pela mãe e padrasto; 127) À data dos factos em apreço nos autos DD encontrava-se em período de férias, em casa de um amigo residente na ...; 128) Tanto a progenitora como o padrasto do Arguido mostram-se atentos e colaborantes quanto às necessidades pessoais/emocionais do filho/enteado. 129) Na comunidade, o agregado familiar e o Arguido são conotados com adequados hábitos de trabalho e comportamentos pró sociais; 130) O OO é o mais novo de três irmãos germanos; 131) Após a rutura da relação dos pais, quando este tinha 4 anos de idade, integrou o agregado da mãe, com quem desenvolveu forte vinculação afetiva; 132) Em consequência da Pandemia Covid-19 a progenitora encerrou os dois estabelecimentos de restauração que explorava, após o que o agregado (mãe, jovem e irmão mais novo) se fixou na ..., zona onde se encontrava a irmã do Arguido; 133) Os irmãos mais velhos do Arguido já se encontram autonomizados; 134) O Arguido manteve contacto com o pai, emigrado, em ..., essencialmente por telefone/videochamada, tendo, inclusive, permanecido com ele durante umas férias de verão, há dois ou três anos; 135) Durante esse período trabalhou na mesma empresa onde trabalhava o pai, no setor do isolamento de coberturas, experiência que não repetiu por a considerar fisicamente exigente; 137) O percurso escolar do Arguido foi marcado por alguma instabilidade comportamental, evidenciando alguma rebeldia, tendo registado uma retenção no 7.º ano de escolaridade; Com grande interesse pela área do desporto, que praticava, regularmente, por iniciativa própria, nomeadamente no Ginásio, iniciou curso profissional de desporto, que abandonou por verificar não se identificar com a atividade de técnico desportivo; 138) Ingressou no ensino noturno, conciliando os estudos com algumas atividades laborais de carácter temporário; 139) Nos períodos de férias escolares, além da experiência que teve em ..., realizou alguns trabalhos no setor agrícola (apanha de fruta) e da restauração (numa gelataria, e num bar de praia), o que lhe permitiu custear a sua carta de condução, emitida em ........2023; 140) À data dos factos em apreço nos autos, este Arguido residia com a mãe e o irmão uterino, atualmente com 7 anos de idade, e mantinha contacto próximo com os irmãos mais velhos, enquadramento familiar que mantém. 141) O agregado familiar, constituído pela mãe, o Arguido e o irmão de 7 anos, reside em apartamento de tipologia 3, arrendado pela mãe, pelo valor mensal de €450,00 (quatrocentos e cinquenta Euros), sito numa urbanização mais antiga da ...; 142) A mãe do Arguido trabalha, atualmente, num estabelecimento de comércio, auferindo pouco mais de mil euros, dispondo da prestação familiar e da pensão de alimentos relativas ao filho mais novo, e, com alguma comunicação com o pai do Arguido, conta com apoios ocasionais por parte deste, em situações excecionais; 143) O Arguido concluiu o 12.º ano de escolaridade em ..., e frequentou, por via eletrónica, um curso de ...; 144) Este Arguido foi, entretanto, admitido na ..., no Curso Técnico Superior Profissional em ... Digital – ..., para o ano letivo 2024/2025; 145) No seu quotidiano tem tido a responsabilidade de dar apoio ao irmão mais novo e de colaborar nas tarefas domésticas, o que realiza com satisfação; 146) Não são conhecidos problemas aditivos a este Arguido; 147) Passa os seus tempos livres com a namorada, de 19 anos, que conheceu através da sua irmã (relação iniciada recentemente, sendo o seu primeiro relacionamento de namoro); 148) Convive com a irmã e com um amigo de 24 anos (ambos inseridos profissionalmente); 149) Tem manifestado ansiedade com o desfecho dos presentes autos, com necessidade de recurso a medicação para controlar a ansiedade/dormir. 150) O Arguido expressa vergonha por estar envolvido no presente processo judicial, não tendo deste dado conhecimento ao pai, nem à sua entidade patronal (optando por cessar a sua atividade profissional na gelataria onde trabalhava para cumprir a medida de coação de apresentações no Posto da GNR da sua área de residência, já que desconhecia que a hora fixada podia ser alterada). 151) Reportou os factos em apreço nos autos à mãe e aos irmãos mais velhos, com cujo apoio, quer económico, quer no aconselhamento e acompanhamento no seu quotidiano contou; 153) O AA foi condenado por decisão de ........2022, transitada em julgado em ........2022, proferida no âmbito do Proc. n.º 528/22.1..., do Juiz 2, do Juízo Local de Pequena Criminalidade de Loures, pela prática, em ........2022, de factos consubstanciadores da prática de 1 (um) crime de injúria agravada, p. e p. pelos art.ºs 181º e 184º, com referência ao art.º 132º, n.º 2, al. l), do Código Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de €5,00 (cinco Euros), num total de €400,00 (quatrocentos Euros); 154) O DD não tem antecedentes criminais registados; 3.3. Motivação da decisão de facto Serviram de base para formar a convicção do Tribunal a análise crítica e conjugada dos vários elementos probatórios abaixo discriminados, apreciados segundo as regras de experiência comum e a livre convicção do julgador, nos termos do art.º 127º do Código de Processo Penal: - no teor do auto de notícia constante de fls. 174 a 175 dos presentes autos no que respeita à data, hora e local dos factos denunciados; - no teor do auto de apreensão de fls. 68 dos presentes autos (das imagensrecolhidas junto dos estabelecimentos comerciais próximos do local onde ocorreram os factos objeto dos presentes autos); - no teor do vídeo da agressão, constante da pen junta a fls. 85 dos autos, e respetivo auto de visionamento e fotogramas constantes de fls. 77 a 83, concatenado com a fotografia constante de fls. 84 dos presentes autos, que nos permite ter a perceção da dinâmica com que as agressões decorreram e do estado em que o Assistente CC ficou em consequência de tais agressões, corroborando o relato por este efetuado da forma como foi barbaramente molestado. Nas imagens captadas são visíveis os ténis que os Arguidos traziam calçados (e que lhe vieram a ser apreendidos); - no teor das imagens recolhidas pela câmara instalada no estabelecimento comercial denominado “...”, constantes do CD junto a fls. 91 dos presentes autos, concatenadas com o auto de visionamento das mesmas, constante de fls. 86 a 90 dos presentes autos, onde é visível os Assistentes a passar, pelas 05:28:45, e os Arguidos a aí passarem, mais tarde, juntos, pelas 05:46:22. Às 05:54:03 é visível o Assistente CC, rodeado, acreditando-se pelos movimentos empreendidos pelos Arguidos, concatenado com as declarações que o Assistente veio a prestar em audiência de julgamento, nos termos infra descritos, tratar-se do momento em que lhe é desferido o primeiro soco. Às 05:54:07 é visível o Assistente CC, a passar sozinho, correspondendo, pela descrição que veio a ser feita pelo mesmo em audiência de julgamento, ao momento em que este procurou afastar-se dos Arguidos. Às 05:54:10 são visíveis o Assistente BB e os Arguidos, que seguiam ligeiramente atrás do Assistente CC. Às 05:58:35 é visível os Arguidos a passar, em sentido inverso àquele em que anteriormente tinham passado com os Assistentes; - no teor das imagens recolhidas pela câmara instalada no estabelecimento comercial denominado “...”, constantes da pen junta a fls. 85 dos presentes autos, concatenadas com o auto de visionamento das mesmas, constante de fls. 101 a 105 dos presentes autos, onde é visível, a fls. 102, o Assistente BB a ser perseguido por dois indivíduos, seguindo um atrás do outro, que, entretanto, param de o perseguir, e regressam juntos, a fls. 103, em sentido inverso ao da perseguição que levavam a cabo. A fls. 104 e 105 é visível os quatro Arguidos juntos, que pela roupa que trajavam, concatenada com as imagens recolhidas no “Clube”, constantes do CD de fls. 118 dos presentes autos, facilmente conseguimos identificar; - no teor das imagens recolhidas pela câmara instalada bar do Clube, constantes do CD junto a fls. 118 dos presentes autos, concatenadas com o auto de visionamento das mesmas, constante de fls. 106 a 117 dos presentes autos, onde são visíveis os quatro Arguidos juntos e que nos permite identificar as roupas que vestiam e ténis que calçavam nessa ocasião (que vieram a ser apreendidos nos autos – cfr. auto de apreensão de fls. 294 a 295 e autos de exame de fls. 319 a 320, 321 a 322, 323 a 324 e 325 a 326 dos presentes autos; auto de apreensão de fls. 347, fotografias de fls. 349, auto de exame de fls. 352 a 353, 354 a 355, 356 a 357, auto de apreensão de fls. 368, auto de exame de fls. 370, 371 e 372, auto de apreensão de fls. 396 e autos de exame de fls. 406 a 407, , 412 a 413 e 414 a 415 dos presentes autos), o que se mostrou determinante para que, nos vídeos anteriormente captados e supra mencionados, percecionássemos o papel que cada um deles teve nos factos em apreço nos autos, corroborando, no seu essencial, a descrição desses mesmos factos efetuada pelos Assistentes em audiência de julgamento; - no teor da informação clínica referente ao Assistente CC, constante de fls. 72 a 74, 184 a 185 dos presentes autos, concatenada com o relatório da perícia de avaliação do dano corporal constante de fls. 223 a 225 dos presentes autos, que, concatenado com as declarações prestadas pelo Assistente CC (que nos mereceram total credibilidade, pelas razões que infra exporemos) e vídeo efetuado pelo AA, se mostraram determinantes para prova da factualidade descrita nos pontos 17) e 18) dos Factos Provados, nos termos aí exarados; - no teor do relatório da perícia de avaliação do dano corporal, referente ao Assistente BB, determinante para prova das lesões por este sofridas e para que estabeleçamos relação entre os factos praticados pelos Arguidos DD e EE, nos termos que infra explicitaremos, e essas mesmas lesões, tendo sido, concatenado com as declarações prestadas pelo Assistente BB (que nos mereceram totalcredibilidade), valorado para prova da factualidade descrita no ponto 19) dos Factos Provados; - no teor dos autos de reconhecimento pessoal constantes de fls. 416, 417, 418, 419, 420, 421 e 422 a 424 dos presentes autos, em que os Assistentes reconheceram os Arguidos como sendo os indivíduos que os molestaram aquando dos factos objeto dos presentes autos - nas declarações prestadas em audiência de julgamento, sem a presença dos Arguidos (cujo afastamento da sala foi determinado, pelo Tribunal, nos termos do art.º 352º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Penal, na sequência de requerimento para o efeito apresentado pelos Assistentes) pelo Assistente CC, em que este, de forma coerente, clara e segura, descreveu a situação por si vivenciada na madrugada de ... de ... de 2023, em hora que situou próxima das 05:00 horas. Começou por relatar que se encontrava com o seu amigo e igualmente Assistente nos autos BB, junto ao muro das ..., na ..., quando foram abordados por quatro pessoas, que identificou como sendo os quatro Arguidos dos autos, que os começaram a apelidar de “paneleiros”, “larilas”. Salientou que não os conheciam, não tendo percebido a razão de tal abordagem, a que não reagiram. Referiu que estes, entretanto, começaram a questioná-los quanto ao nome e ao que estavam ali a fazer àquelas horas. Afirmou que, pese embora não tenha percebido o motivo de tais perguntas, acabou por lhes responder, frisando ter-lhes indicado um nome distinto do seu verdadeiro nome. Realçou que estes eram agressivos a falar, precisando que os Arguidos EE e DD se colocaram à sua volta. Narrou que, entretanto, abandonou o local, com o BB, em direção ao “Jogo da Bola”, no que foram seguidos pelos Arguidos, que lhes diziam que podiam voltar para junto destes, que não lhes fariam mal. Contou que após voltarem atrás, o AA lhes disse que tinham 20 segundos para correr, no seguimento do que o HH cuspiu, na direção do Declarante, tendo-o atingido na zona do peito. Expôs que, face ao sucedido, decidiram acelerar o passo e, apercebendo-se que os Arguidos os seguiam, começaram a correr, em direção ao restaurante “...”. Precisou ter, entretanto, sentido um soco na cara, caindo no chão, não tendo percebido qual dos Arguidos é que desferiu tal soco. Enquanto se encontrava caído no chão foi, então, pontapeado pelos Arguidos AA e HH, na zona da cabeça, pernas e tronco. Referiu ter tentado proteger a cabeça com os braços e esperado que parassem de o molestar. Precisou ter ouvido os passos dos outros dois Arguidos a aproximarem-se e um deles a dizer que já chegava. Narrou que, enquanto estava caído no chão, o AA gravou um vídeo, que veio a visualizar mais tarde, onde o Declarante aparece ensanguentado e em que o AA o apelida de “PP” e em que lhe determina que peça desculpa, o que fez, por medo, desconhecendo a razão pela qual estava a pedir desculpa. Salientou que, com o medo que estava (inclusive de perder a vida), teria feito tudo o que lhe pedissem, para sair de tal situação. Declarou que tem ideia que não chegou a perder a consciência enquanto esteve a ser pontapeado. Frisou que o Assistente BB passou por si a correr, tendo deixado de o ver. Contou que, após os Arguidos abandonarem o local, conseguiu levantar-se e procurar ajuda, seguindo em direção ao local onde o BB tinha deixado o seu veículo automóvel estacionado (perto do mercado do peixe, na ...), onde o veio a encontrar. Referiu ter entrado no veículo e terem, de seguida, seguido para os Bombeiros, que distava cerca de 100 metros de tal local. Quando já se encontrava nos Bombeiros surgiram as autoridades policiais, que tinham sido anteriormente contactadas pelo seu amigo BB. Daí seguiu para o ..., onde foi assistido, mencionando ter levado 16 pontos na cabeça. Referiu que quando o pontapearam lhe partiram um dente. Contou que, quando estava caído no chão, o seu telemóvel (de marca Oneplus, cujo valor quantificou em pelo menos €400,00), deslizou do seu bolso, tendo sido apanhado e levado do local por um dos Arguidos. Relatou ter igualmente desaparecido uma carteira, de borracha, de cor vermelha, que continha no seu interior uma nota de €5,00, que trazia consigo nessa ocasião. Salientou que o telemóvel (sem o cartão SIN) foi, entretanto, entregue, na noite seguinte, num dos estabelecimentos do pai do Declarante (denominado ...). Realçou que o vídeo realizado pelo AA foi, entretanto, partilhado na rede WhatsApp, sendo visualizado por muitas pessoas, inclusive por um senhor que trabalha próximo da mãe do Declarante, que o mostrou à mãe do Declarante. Confidenciou que a divulgação do vídeo ainda agravou o sentimento de humilhação que já sentia. Descreveu o estado em que ficou físico (com muitas dores) e psicológico após os factos descritos, frisando sentir-se frustrado, com vontade de mudar de casa e de país, sendo que, não mais voltou a ser o mesmo, não se sentindo seguro na própria vila onde reside e tendo perdido a vontade de conviver e de frequentar locais públicos, sobretudo em período noturno, passando a ir direto de casa para o trabalho e vice versa. Esteve uma semana sem trabalhar, por não estar física e emocionalmente capaz de o fazer, semana esta em que sentia dores (sobretudo na perna), tinha agrafos na cabeça (ficando a almofada cheia de sangue), não conseguia dormir, não se conseguia ver ao espelho (pois estava desfigurado) e em que teve que reconstituir o dente que lhe partiram. Foi categórico ao afirmar não conhecer os Arguidos antes dos factos que descreveu, não tendo tido qualquer diferendo com qualquer um deles e não mais os tendo visto, precisando que nunca lhe foi pedido desculpa pelo sucedido por estes. Mencionou que atualmente (desde ...) é acompanhado, quinzenalmente, por um psicólogo, suportando €60,00 (sessenta Euros) por consulta. Embora tenha afirmado ter tomado medicação para a ansiedade, salientou que atualmente já não o faz. Confrontado com o teor de fls. 120 dos presentes autos (tapadas as respetivas legendas), afirmou tratar-se do HH, que afirmou tê-lo pontapeado e dando-lhe socos quando se encontrava caído no chão, no circunstancialismo que anteriormente descreveu. Sendo-lhe exibido o teor de fls. 121 dos presentes autos (tapadas as respetivas legendas), afirmou tratar-se do AA, indivíduo que proferiu as expressões que descreveu na abordagem inicial, que igualmente lhe deu socos e o pontapeou enquanto esteve caído no chão e que fez o vídeo que descreveu.Confrontado com o teor de fls. 122 dos presentes autos (tapadas as respetivas legendas), afirmou tratar-se do DD, que sentiu que igualmente o pontapeou enquanto esteve caído no chão. Sendo-lhe exibido o teor de fls. 123 dos presentes autos (tapadas as respetivas legendas), afirmou tratar-se do OO, que sentiu que igualmente o pontapeou enquanto esteve caído no chão. Foi perentório ao afirmar que ninguém impediu outrem de lhe bater, tendo os Arguidos atuado em grupo e procurando causar confusão, sendo que os Arguidos HH e AA eram os que se mostravam mais alterados. Trataram-se de declarações coerentes, pormenorizadas, em que o Assistente CC, sem artifícios e com um estado emocional concordante com o que narrava, descreveu ao Tribunal a situação por vivenciada e as consequências desta decorrentes, que foi notório, ainda hoje pesarem na vida do mesmo, condicionando-o quando sai da sua zona de conforto (da convivência com aqueles que lhe são mais próximos e que sabe não lhe desejarem mal algum); - nas declarações prestadas em audiência de julgamento, sem a presença dos Arguidos (cujo afastamento da sala foi determinado, pelo Tribunal, nos termos do art.º 352º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Penal, na sequência de requerimento para o efeito apresentado pelos Assistentes) pelo Assistente BB, que, de forma clara, segura e coerente descreveu o circunstancialismo em que, estando a conversar com o Assistente CC, na madrugada de ... de ... de 2023, cerca das 05:00 horas, foram abordados pelos quatro Arguidos, que os apelidaram de “paneleiro” e “larilas”, após o que, aproximando-se da zona em que estavam, com uma postura agressiva e intimidatória, lhes começaram a perguntar o nome. Frisou que procuraram afastar-se dos Arguidos, mas que estes seguiram no seu encalce, com o AA a chamá-los e a dizer-lhes que não lhes ia acontecer nada. Salientou que, em face disso, acabaram por parar, ocasião em que o AA, dirigindo-se ao Declarante e ao seu amigo CC, lhes disse que tinham vinte segundos para correr, o que fizeram. Realçou que, ainda assim, os Arguidos seguiram-nos, tendo o HH cuspido em direção do CC, bem como desferido um murro neste. Referiu ter seguido atrás destes, dizendo para não fazerem isso, mas que, assim que virou a esquina, viu o Assistente CC caído no chão e os Arguidos AA e HH (que identificou como sendo o que tem tatuagens) a bater, com as mãos, no CC. Contou que, entretanto, os dois outros Arguidos, que tinham ficado para trás de si, o abalroaram, fazendo com que batesse na parede, ocasião em que lhe deram socos nas mãos e, quando ia a fugir, um pontapé, na perna. Referiu ter conseguido chegar ao seu carro (que se encontrava a cerca de 300 metros do local onde o Assistente CC se encontrava a ser molestado fisicamente) e abrigar-se no seu interior, momento em que percebeu que já não estava a ser seguido pelos Arguidos. Afirmou ter ligado logo de seguida para a polícia. Declarou que, passados alguns minutos, viu o Assistente CC, completamente atordoado, cheio de sangue e com a cara inchada, dirigir-se para o veículo onde se encontrava, após o que seguiram para os Bombeiros, onde o CC foi assistido. Mencionou que quando estavam nos Bombeiros surgiu a polícia, tendo o CC sido, de seguida, conduzido para o Hospital. Contrariamente ao CC, não necessitou de assistência hospitalar. Expôs que, nos dias seguintes, com o auxílio das redes sociais, conseguiram identificar os agressores. Embora tenha afirmado ter tido conhecimento da existência de um vídeo com as agressões ao CC, precisou que não esteve presente quando as imagens foram captadas, não o tendo chegado a visualizar posteriormente. Descreveu o stress e a angústia vivenciados, precisando que, desde então, não mais se sentiu confortável, estando sozinho, na ..., sobretudo à noite, tendo mudado os seus hábitos e deixado de sair e frequentar locais públicos, mantendo, ainda hoje, receio de se voltar a cruzar com os Arguidos na .... Relatou o estado em que encontrou o CC quando o foi visitar, frisando que este se encontrava assustado e mal. Foi categórico ao afirmar não encontrar explicação para o sucedido. Dos quatro Arguidos apenas conhecia o AA, de vista, da ..., não tendo tido, anteriormente, qualquer problema nem com este, nem com os demais Arguidos. Confrontado com o teor de fls. 120 dos presentes autos (tapadas as respetivas legendas), afirmou tratar-se do HH, que afirmou ter dado um primeiro soco e cuspido em direção do CC.Sendo-lhe exibido o teor de fls. 121 dos presentes autos (tapadas as respetivas legendas), afirmou tratar-se do AA, indivíduo que lhes disse que tinham vinte segundos para correr e que molestou o CC quando este se encontrava caído no chão. Confrontado com o teor de fls. 122 dos presentes autos (tapadas as respetivas legendas), afirmou tratar-se do DD, sendo este um dos Arguidos que ficou para trás e que o veio a molestar. Sendo-lhe exibido o teor de fls. 123 dos presentes autos (tapadas as respetivas legendas), afirmou tratar-se do OO, sendo este o outro Arguido que ficou para trás e que o veio a agredir. Precisou ter sido um dos que lhes chamou “paneleiro”, recordando-se do ar de ódio que este exibia. Trataram-se de declarações claras e seguras, revelando, ao longo das mesmas, pela coerência do que relatou com as suas expressão facial e atitude corporal e com o que se extrai das regras da experiência e da lógica, que estava a narrar os factos por si vivenciados tal como estes ocorreram; - no testemunho prestado por QQ, que, pese embora não tenha presenciado os factos objeto dos presentes autos, ainda assim se mostrou esclarecedora quanto ao facto de, em hora que situou próxima das 05:50 horas (e em que se dirigia para o seu local de trabalho, no “...”, na ...), quando se encontrava próximo da ..., do “Jogo da Bola”, ter ouvido pessoas a correr na sua direção e ter visto duas pessoas a correr atrás de uma outra. Frisou que era de noite, não tendo conseguido ver a cara dos referidos indivíduos e não os tendo ouvido dizer o que quer que seja. Referiu ter tido posteriormente conhecimento, pelos funcionários da ..., que havia muito sangue no local onde tinha visto as pessoas a correr, o que confirmou, quando se dirigiu ao local, em hora que situou próxima das 07:30 desse mesmo dia. Confrontada com os fotogramas constantes de fls. 93 a 97 dos presentes autos (com as legendas devidamente tapadas, correspondente às imagens captadas através de câmara de vigilância existente no estabelecimento comercial denominado “...”, constantes do CD junto a fls. 100 dos presentes autos) reconheceu-se nos mesmos,salientando que não viu ninguém bater em ninguém, nem ninguém lhe pediu ajuda, tendo pensado, na altura, que se tratava de uma brincadeira, tendo, ainda assim, corrido, assustada, tendo ficado convencida que se aperceberam da sua presença. Questionada quanto a tal, confirmou que o restaurante “...” se situava próximo do local onde viu os indivíduos a correr. Tratou-se de um testemunho claro, seguro e coerente; - no testemunho prestado por JJ, mãe do Assistente CC, que, pese embora não tenha presenciado os factos objeto dos autos, descreveu ao Tribunal a forma como deles veio a ter conhecimento. Precisou ter sido acordada, em hora que situou próxima das 06 da manhã, por um telefonema, dum número que não conhecia, em que o filho lhe contou que estava nos ..., que tinha sido agredido e que ia seguir para o .... Descreveu a forma como encontrou o filho quando, finalmente, o pôde ver, no ...: com a cabeça aberta, um olho que parecia uma bola, um dente partido, a face aberta, cheio de dores e incrédulo com o que lhe tinha acontecido. Confidenciou que as horas em que aguardaram que lhe fizessem mais exames foram horas de sofrimento. Relatou que após saírem do hospital de dirigiram à esquadra da ..., onde o filho apresentou queixa. Frisou que o CC não tinha o telemóvel, já que este lhe tinha sido subtraído, assim como uma carteira com €5,00. Frisou que o local onde o filho foi agredido se encontrava cheio de sangue, tendo sido os comerciantes da zona a limpar esse local. Salientou ter sido abordada nesse dia e nos dias seguintes por diversas pessoas a questioná-la sobre o que tinha acontecido, o motivo para tal ter acontecido e a oferecerem-lhe ajuda para identificar os agressores. Passado um / dois dias foi-lhe entregue, por uma pessoa que lhe pediu anonimato, uma fotografia (onde se via o filho desmaiado) e um vídeo (onde era visível o filho a ser agredido, com pontapés na cabeça). O telemóvel do filho (sem o cartão) foi, entretanto, entregue num estabelecimento do pai do Assistente CC. Descreveu o estado emocional do Assistente CC: perturbado, magoado,frustrado, revoltado, sem saber o que é que podia ter feito para ter sido agredido daquela forma por quatro indivíduos. Realçou que o CC não mais recuperou do sucedido, tendo estado uma semana sem conseguido ir trabalhar, tendo alterado as suas rotinas (passando a sair menos na ...), tendo medo de retaliações (para o próprio e restante família) por ter apresentado queixa e continuando, ainda hoje, a ser acompanhado, quinzenalmente, por psicólogo. Tratou-se de um testemunho sofrido, mas, ainda assim claro, objetivo e coerente, sendo notória a revolta que a testemunha ainda hoje sente pelo que sucedeu ao filho e pela sensação de insegurança que passaram a sentir por uma agressão tão bárbara e sem motivo que a justifique; - no testemunho prestado por RR, sócia gerente do restaurante “...”, que se mostrou esclarecedora quanto ao circunstancialismo em que lhe foi entregue, no dia seguinte ao da agressão, por uma rapariga e um rapaz (cuja faixa etária situou nos vinte e poucos anos) o telemóvel pertencente ao Assistente CC. Precisou que a rapariga lhe disse que tinha sido um rapaz, com uma tatuagem no pescoço, que lhes pediu para fazer tal entrega e que o telemóvel se encontrava acondicionado dentro de um saco plástico (semelhante aos utilizados para a fruta nos supermercados). Referiu ter posteriormente entregue o telemóvel ao pai do CC, que o identificou como sendo deste. Foi categórica ao afirmar que o rapaz que lhe entregou o telemóvel não foi nenhum dos Arguidos, que visualizou na sala de audiências. Tratou-se de um testemunho claro, seguro e coerente; - no testemunho prestado por SS (que se identificou como tendo a alcunha de “TT”), que descreveu o circunstancialismo em que tomou conhecimento que o filho da UU, o aqui Assistente CC, tinha sido agredido. Frisou que tendo, na madrugada anterior, quando ia para a pesca, em hora que situou próxima das 05 da manhã, ouvido dois rapazes a dizerem que tinham dado uns pontapés, sendo um deles o AA (que conhece, desde criança, como “...”), de imediato estabeleceu ligação entre as duas situações. Precisou que os rapazes seguiam em direção ao “Clube”. Confrontado com o teor de fls. 107 a 117 dos presentes autos, prontamente aí identificou o estabelecimento comercial “Clube”, bem como o AA.Tratou-se de um testemunho claro e seguro, inexistindo fundamento para colocarmos em causa a credibilidade que nos mereceu; - no testemunho prestado por VV, militar da ..., que, por força das funções que exerce, se mostrou esclarecedor quanto ao facto de a queixa ter sido apresentada no posto da ..., bem como quanto às diligências realizadas nos dias seguintes, com vista a identificar os agressores. Referiu que recolheram imagens junto dos estabelecimentos comerciais existentes nas imediações do local onde os factos decorreram, identificaram os suspeitos e as roupas que trajavam. Precisou ter estado presente aquando da busca realizada à residência do HH, onde foram apreendidas roupas idênticas às utilizadas na madrugada dos factos em apreço nos autos. Foi categórico ao afirmar que, além de se terem identificado como sendo da ..., trajavam coletes com tal identificação e dois dos seus colegas estavam totalmente uniformizados. Foi perentório ao afirmar que o HH, que se encontrava a dormir, num beliche superior, assim que acordou, de imediato lhes começou a desferir murros e pontapés, o que fez com que um dos militares da ... (guarda Pereira) tivesse que subir para o beliche onde o Arguido se encontrava, para o imobilizar. Precisou que, ainda assim, o colega quase caiu do beliche, atentos os pontapés e murros que este Arguido lhe desferiu. Confrontado com o teor de fls. 294 a 295 dos presentes autos (auto de busca e apreensão, datado de ........2023) reconheceu como tendo sido por si aposta a assinatura deste constante, e, ao serem-lhe exibidas as fotografias constantes de fls. 296 a 298 dos presentes autos, identificou, a fls. 297, o beliche onde o HH se encontrava, e onde decorreram os factos que relatou, e a fls. 298 a roupa e ténis apreendidos, a que se reportava. Tratou-se de um testemunho claro, seguro e convincente, inexistente fundamento para colocarmos em causa a credibilidade que nos mereceu; (…)- no testemunho prestado por WW, namorado do Assistente CC, que, pese embora não tenha presenciado os factos objeto dos autos, se mostrou totalmente esclarecedora, até pela proximidade afetiva que mantém como o CC, relativamente às consequências destes decorrentes para o mesmo, quer a nível físico, quer, sobretudo, a nível psicológico. Descreveu o estado em que encontrou o Assistente, na manhã seguinte aos factos em apreço nos autos, ainda no Hospital: com a cara completamente desfigurada, sem conseguir abrir o olho, a faltar-lhe um dos dentes da frente, a chorar. Precisou que o CC só dizia “Porque é que me fizeram isto? Porquê eu?”, em evidente sofrimento e verbalizando medo com o que se lhe podia seguir e receio por andar na ..., por ir trabalhar, chegando a dizer que tinham que sair dali. Frisou que o CC lhe confidenciou ter tido medo de morrer, que foi deixado sozinho, caído no chão. Salientou que a auto estima do CC estava muito em baixo, pois este sempre viveu e fez a sua vida na ... e nem sequer se conseguiu defender. Realçou que o Assistente não queria falar sobre o sucedido e que, como estava desfigurado, não queria sequer sair de casa, só tendo saído para ir arranjar o dente partido. Mencionou que após o sucedido o Assistente teve algum tempo sem trabalhar, tendo acabado por acompanhar o pai, que ia de férias. Precisou que o sucedido fez com que o Assistente alterasse as suas rotinas, tendo deixado de sair com amigos na ..., de ir à praia, passando a ir e vir do trabalho sempre acompanhado. Confidenciou que o CC nunca mais voltou a ser o mesmo, sendo que este nunca se vai esquecer daquilo por que passou. Embora inicialmente não tenha querido apoio psicológico, pois não queria falar sobre o sucedido, frisou que vem a ser acompanhado, desde .... Embora tenha referido ter tido conhecimento da existência de um vídeo, pela mãe do CC, foi perentória ao afirmar nunca o ter visualizado. Realçou que a existência de um vídeo do Assistente a ser agredido e o facto de este ter sido partilhado, como se tratasse de um troféu, ainda abalou mais o CC, que é uma pessoa extremamente reservada. Foi categórica ao afirmar não ter tido conhecimento que o CC tivesse algum problema por resolver, com quer que seja, antes dos factos em apreço nos autos.Tratou-se de um testemunho emocionado, claro e coerente, que nos permitiu ter a perceção das consequências dos factos dos autos quer no Assistente CC, quer naqueles que o rodeiam, e a sensação de insegurança que trouxeram para aqueles que residem e frequentam a ...; - no testemunho prestado por XX, amigo dos Assistentes CC e BB, que se mostrou esclarecedor quanto aos efeitos os factos objeto dos presentes autos e tiveram e têm na vida dos Assistentes. Tendo estado com o Assistente CC nos dias seguintes aos dos factos dos autos mostrou-se, ainda, esclarecedor quanto ao estado físico (com muitos hematomas na zona das costelas e na cara e com a cabeça aberta atrás) e psicológico (extremamente abalado, nervoso, ainda em estado de choque com o que tinha vivenciado) em que o encontrou. Descreveu a forma como decorria a vida do Assistente CC antes dos factos dos autos (trabalhando num estabelecimento comercial da área da restauração pertencente ao pai, e frequentando com regularidade a vila da ..., onde ia beber café, conviver com os amigos, ver jogos de futebol…) e alterações que esta teve em decorrência dos factos dos autos (deixando de querer sair com os amigos, só tendo voltado a sair à noite com o Declarante, passado cerca de um ano dos factos dos autos, quando antes o faziam mais do que uma vez por semana e passando a fazê-lo fora da ..., o que antes não faziam). Salientou que inicialmente o CC lhe dizia que tinha medo que voltasse a suceder uma situação semelhante e que, com o passar do tempo, pese embora este o tenha deixado de verbalizar, sentia que este continuava a ter o mesmo receio. Mencionou que o BB voltou a sair com os amigos mais cedo que o CC, não tendo notado tantas alterações na personalidade do BB (que descreve como forte) quanto as que verificou no CC (que se tornou mais ansioso e a isolar-se). Embora tenha admitido ter ouvido falar num vídeo com as agressões, reconheceu não ter visualizado tal vídeo. Foi categórico ao desconhecer a existência de qualquer litígio anterior entre os Assistentes e os Arguidos. Tratou-se de um testemunho claro, seguro, coerente e espontâneo; - no testemunho prestado por YY, amiga dos Assistentes há 8 anos, que, não tendo presenciado os factos objeto dos autos, se mostrou esclarecedora quanto ao estado físico e emocional em que encontrou o Assistente CC quando o acompanhou (com a anterior testemunha, XX, seu namorado) à ..., para este efetuar identificações (precisando que não se tratava de reconhecimentos presenciais, mas sim de dar conhecimento às autoridades de que tinham conseguido identificar os agressores). Salientou que o CC tinha a cara toda negra, com agrafos na cabeça. Realçou que o CC se isolou, não querendo sair de casa, tendo que se deslocar a casa deste para o verem. Precisou que este só saiu de casas quando retomou o trabalho, sendo que, ainda assim, tanto quanto este lhes disse, ia e regressava sempre acompanhado, por ter medo de andar sozinho. Referiu que tentaram que este voltasse a sair com os amigos, chegando a combinar fazê-lo fora da ..., e que, embora o CC tenha aceite acompanhá-los, da primeira vez que o fez este estava apenas fisicamente presente. Só recentemente, em data que situou no mês de ..., é que o CC voltou a acompanhá-los à vila da ..., evidenciando que não se sentia seguro. Frisou que com o Assistente BB só voltou a estar bastante tempo depois dos factos em apreço nos autos, o que justificou com o facto de este se ter isolado e ter demorado bastante tempo a querer voltar a estar com os amigos. Frisou que embora este tenha recuperado mais rápido que o CC, ainda não se encontra totalmente recuperado. Foi categórica ao afirmar não ter tido conhecimento que os Assistentes – que descreveu como duas pessoas “super calmas”, que não se metem com os outros – tivessem qualquer tipo de problema por resolver com quem quer que seja antes dos factos em apreço nos autos. Declarou ter tido conhecimento da existência de um vídeo com as agressões, que não visualizou, tendo falado sobre o mesmo com o CC e ficado convencida que a existência desse vídeo ainda agravou mais o estado psicológico do CC. Tratou-se de um testemunho seguro, objetivo e convincente; - no testemunho prestado por AAA, pai do Assistente CC, que, de forma notoriamente emocionada e pesarosa, descreveu a forma como tomou conhecimento das agressões ao filho (pela ex cônjuge) e estado em que encontrou o CC na tarde seguinte aos acontecimentos dos autos: com uma lesão na cabeça, escoriações no rosto e muito abatido, tendo levado 14 pontos atrás da orelha direita. Precisou que o CC não trabalhou nos dias seguintes a estes acontecimentos (cerca de vinte dias), não querendo, sequer, sair do quarto, e passando a ir trabalhar sempre acompanhado (ora pelo Declarante, ora pelo sócio deste, BBB, com quem o CC trabalha). O CC recebe em função dos turnos realizados, fazendo em média 12 turnos e recebendo €30,00 por turno. Mencionou que o restaurante onde o CC trabalha fica a cerca de cem metros do local onde o filho lhe contou ter sido molestado. Frisou que tinha umas férias programadas para tal período e que acabou por levar o CC consigo. Salientou que o CC se tornou uma pessoa muito receosa, tendo medo de sair à noite e não tendo conseguido ainda recuperar a sua autoestima. No início não quis apoio psicológico, mas que, entretanto, em data que situou em ..., passou a ter tal apoio. Relatou que, antes dos factos em apreço nos autos, o CC gostava de sair à noite, de frequentar bares, de sair com os amigos, na .... Era uma pessoa super calma, responsável, divertido, amigo dos seus amigos, divertido, brincalhão, prestável, muito educado e, apesar de não ser muito extrovertido, era uma pessoa agradável. Com os factos dos autos tornou-se introvertido, triste, evitando contactos com quem não reconhece (o que é notório no trabalho, em que passou a optar por fazer o apoio do bar no restaurante, evitando ajudar nas mesas e ter direto contacto com os clientes). Afirmou ter visto o vídeo, que lhe foi enviado pela ex-mulher, e ter chorado, como há muito não fazia, em virtude do que visualizou e ouviu. Confirmou que o telefone que tinha sido subtraído aquando das agressões foi, entretanto, entregue num seu estabelecimento comercial. Tratou-se de um testemunho claro e coerente, onde transpareceu a angústia que sente por o filho ter vivido uma experiência tão dolorosa e a crença em que este, com o apoio da família e dos amigos, vai voltar a ser o CC anterior a estes factos; - no testemunho prestado por CCC, namorada do Assistente BB e amiga do CC, que se mostrou esclarecedora relativamente aos efeitos que os factos objeto dos presentes autos tiveram na vida dos Assistentes, que nunca mais foi igual, passando estes a viver com medo, frisando que o BB não queria sequer que a Declarante fosse testemunha nos autos, com receio que lhe pudessem vir a fazer mal. Relatou que teve conhecimento do sucedido aproximadamente uma hora depois, logo que o BB chegou a casa e lhe contou o sucedido. Salientou que o BB estava em choque. Foi categórica ao afirmar que os Assistentes nunca tiveram problemas com quem quer que seja, tendo sido sempre pessoas bem comportadas. Tratou-se de um testemunho claro e seguro; - no testemunho prestado por DDD, mãe do Assistente BB, que descreveu o filho e o CC, amigo de longa data do primeiro, como pessoas pacificas, nunca a violência tendo estado presente na vida destes. Relatou os efeitos que os factos dos autos tiveram na vida do filho, à data bolseiro e com prazos para cumprir (que, ainda, assim, cumpriu), que se tornou uma pessoa fechada, passando a ter medo de sair e de se cruzar com os indivíduos que os molestaram. Foi categórica ao afirmar que pese embora acredite que o filho vai recuperar, até porque tem uma personalidade forte, o sucedido vai deixar marcas neste para sempre. Frisou que o BB sente muita mágoa e raiva pelo que lhes fizeram, mas simultaneamente culpa por não ter ficado com o amigo, que com a violência de que foi alvo podia ter morrido. Expôs que o sucedido gera uma grande insegurança. Foi perentória ao afirmar não ter conhecimento que os Assistentes tivessem qualquer tipo de problema, com quem quer que seja. Pese embora os laços familiares que a unem ao Assistente BB seja notório que sente carinho pelo Assistente CC, que conhece desde os 13 anos de idade deste, prestou um testemunho claro e objetivo, inexistindo fundamento para colocarmos em causa a credibilidade que nos mereceu; - nos testemunhos prestados por EEE, padrasto e patrão do DD, que o descreveu como um bom moço, colaborador, de bom trato, apaziguador, estimado pelos colegas, que ajuda na educação dos irmãos mais novos; - no testemunho prestado por FFF, amiga da família e do DD há 10 (dez) anos, e que o descreveu como uma pessoa meiga, atenciosa, cuidador, nunca tendo presenciado qualquer atitude agressiva por parte do mesmo; - no testemunho prestado por GGG, amigo da família e do DD há cerca de 15 /16 anos, que o descreveu como sendo excelente para os irmãos, não tendo tido conhecimento de qualquer atitude incorreta por parte deste; - no testemunho prestado por GG, amigo do EE há 5 anos, que relatou ao Tribunal a forma como tomou conhecimento dos factos em apreço nos autos e o que o EE lhe contou sobre o sucedido. Tendo tido direta intervenção na entrega do telemóvel dos autos mostrou-se esclarecedor quanto ao circunstancialismo em que, acompanhado pela irmã do OO, diligenciou por tal entrega, não sabendo esclarecer como é que relacionou o estabelecimento comercial em que procederam à entrega do telemóvel com o Assistente CC. Afirmou que após os factos dos autos o OO passou a ter medo de represálias e a tomar medicação para controlar a ansiedade; - no testemunho prestado por FF, irmã do EE, que descreveu o circunstancialismo em que tomou conhecimento, pelo irmão, dos factos em apreço nos autos, e da descrição que este lhe fez desses mesmos factos, relatando-lhe que os Arguidos AA e HH bateram no Assistente, ao ponto do próprio EE lhes pedir para pararem, pois o Assistente já se encontrava inconsciente. Declarou que o EE lhe contou que anteriormente a estas agressões o Assistente CC o tinha humilhado, brincando com o seu apelido Leite. Tendo-lhe sido exibido o vídeo constante dos autos, onde são visíveis as agressões de que o Assistente CC é alvo, a solicitação da defesa do EE, prontamente identificou como sendo a voz do irmão a voz audível no vídeo a dizer “Já chega”. Reconheceu, ainda, como sendo a voz do AA aquela que apelida o Assistente CC de “mofino”. Referiu que o irmão lhe contou que ainda voltou ao local onde as agressões decorreram, mas que já aí não encontrou o Assistente, só uma poça de sangue. Frisou que o irmão quis falar com os pais das vítimas, para lhes explicar o sucedido, tendo-se deslocado, inclusive, à polícia para relatar o sucedido, só aí não tendo prestado declarações por lhes ter sido dito que iriam agendar uma data para o efeito, data essa que meio a ser desmarcada pelas autoridades policiais. Assumiu ter sido quem procedeu à entrega do telemóvel dos autos, frisando não ter sido o EE a fazê-lo por terem tido receio de represálias, e ter dito, em tal ocasião, que foi encontrado e lhe pediram para o devolver. Afirmou que após os factos em apreço nos autos o OO deixou de ir trabalhar e passou a ir acompanhado para a escola, por receio. Foi notório ao longo do testemunho prestado a falta de espontaneidade do mesmo, e uma clara preparação para vir narrar ao Tribunal a versão trazida aos autos pelo irmão, que, pelas razões já expressas, não nos mereceu a credibilidade desejada pela defesa apresentada por este Arguido; - no testemunho prestado por HHH, amigo do OO há 4 / 5 anos, que o descreveu como sendo uma pessoa alegre, otimista, que foi uma grande ajuda para si quando passou por um processo de separação, e que atualmente este lhe parece triste, abalado e receoso; - no testemunho prestado por III, amiga do OO há 10 anos, e que o descreveu como uma pessoa amiga, esforçada, prestável e pacata, não o imaginando associado a atos de violência. Salientou que o OO se mostra mais receoso, o que associa ao receio que este possa ter das consequências decorrentes dos presentes autos; - nas declarações prestadas pelo EE em sede de audiência de julgamento, em que este, procurando justificar os insultos e agressões de que os Assistentes foram alvo, tentou convencer o Tribunal que foram os Assistentes que encetaram conversa com os mesmos e, que, no decurso da mesma, começaram a gozar com o seu apelido “Leite”. Embora tenha reconhecido ter-se verificado uma “grande confusão”, na sequência da qual apanhou um telemóvel que se encontrava no chão, segundo o mesmo, por pensar que pertencia a um dos coarguidos e que, tendo tomado conhecimento que não pertencia a nenhum deles, pediu à irmã que o entregasse no ..., estabelecimento comercial onde o Assistente CC trabalhava. Reconheceu como sendo o Assistente CC a pessoa que aparece no vídeo das agressões junto aos autos, visionado em audiência de julgamento. Pese embora tenha sido notório ao longo das várias sessões o desconforto deste Arguido pelas consequências dos factos praticados, o que interpretamos como um sinal de ter assimilado o desvalor da sua conduta e a exteriorização de arrependimento pelos factos praticados, a verdade é que as declarações prestadas por este Arguido não nos mereceram credibilidade. Com efeito, a versão por este apresentada de que os dois Assistentes é que se foram meter com os quatro Arguidos, em clara desproporção numérica e física (notória na robustez dos Arguidos AA e DD, em contraponto com os Assistentes, de fisionomia bem menos robusta) e que estes, do nada, começaram a gozar com o seu apelido não se nos afigura minimamente verosímil, sendo contrariada pelas próprias regras da experiência, que nos levam a afirmar que quem se encontra em desproporção numérica e física não desafia aqueles que se mostram em maior número, em grupo e com maior capacidade física. A explicação apresentada por este Arguido para ter levado consigo o telemóvel do Assistente CC igualmente não se mostra credível. A ser verdade que este levou o telemóvel convencido que este pertencia a um dos coarguidos teria, logo de seguida, facilmente desfeito tal mal entendido e abandonado o telemóvel, até junto do local onde o tinha agarrado, evitando ser acusado de deste se ter apropriado, o que não sucedeu. Com efeito, o telemóvel só veio a ser devolvido no dia seguinte, quem sabe, talvez, com receio que pudesse ser localizado e comprometer a posição deste Arguido; - nas declarações prestadas pelo AA em sede de audiência de julgamento, em que este declarou ao Tribunal que estava à espera de uma boleia quando encontrou os coarguidos na madrugada dos factos dos autos. Reconheceu terem sido os Arguidos a abordar os Assistentes, segundo este, para pedir um cigarro, ao que estes responderam que não tinham. Corroborando, nesta parte, as declarações já prestadas em audiência de julgamento pelo EE e o afirmado pela testemunha FF, irmã deste, igualmente procurou convencer o Tribunal que foram os Assistentes que, do nada, começaram a gozar com o apelido do EE, o que motivou que reagisse em defesa deste.Assumiu ter desferido um soco no Assistente CC, bem como ter gravado um vídeo em que o apelida de “mufino” e lhe determina que peça desculpa, não apresentando justificação para tal comportamento. Contou que o HH igualmente molestou fisicamente o Assistente CC, que caiu ao chão após lhe ter sido desferido um soco. Admitiu que após tal filmagem e do EE ter dito para parar se deslocaram ao Clube, local que ainda se encontrava aberto e onde costumam ir comer. Frisou que o OO quis voltar a passar pelo local onde deixaram o Assistente, sublinhando que este foi o único que demonstrou preocupação pelo estado do Assistente. Reconheceu ter divulgado o vídeo que gravou, precisando que só o enviou a um amigo, a quem pediu ajuda, e que foi este que o divulgou por terceiros. - nas declarações prestadas pelo HH em audiência de julgamento em que este declarou querer pedir desculpa pelas duas chapadas e um pontapé que desferiu no Assistente CC, visíveis no vídeo visionado em audiência de julgamento. Afirmou ter-se deixado levar pelo calor do momento, sendo que nesse dia tinha exagerado nos consumos de álcool (whisky) e estupefacientes (MDMA). Reconheceu que os Arguidos DD e EE foram, num primeiro momento, atrás do Assistente BB, após o que voltaram para o local em que se encontrava, acompanhado do AA e onde molestavam fisicamente o Assistente CC. Frisou que pararam quando o OO disse para o fazerem, tendo, de seguida, seguido para o Clube, para comer, local onde o OO lhes perguntou se o telemóvel lhes pertencia e em que este disse que não sendo destes o ia devolver. Frisou que o OO foi o único que quis regressar ao local para ver como é a vítima estava, por ter ficado preocupado com esta. Salientou que o DD nada fez, que só o próprio e o AA é que bateram. Referiu ter ouvido ambos os Assistentes a gozar com o apelido do EE, bem como a falarem mal com o AA. Relativamente à busca realizada a sua casa declarou recordar-se de acordar a ser agredido e de dizerem que estava a mexer-se muito e a dar pontapés. Em suma, face à prova produzida, supra elencada, designadamente às declarações prestadas pelos Assistentes CC e BB (que pela forma coerente, pormenorizada, sem artifícios e com um estado emocional concordante com o que relatavam, nos mereceram total credibilidade), que não só se mostraram coerentes entre si, como, sobretudo, se mostram consentâneas com as imagens recolhidas junto dos estabelecimentos próximos do local onde decorreram as agressões ao CC e com o próprio vídeo efetuado pelo AA, não ficámos com a menor dúvida de que os factos objeto dos presentes autos se verificaram nas circunstâncias exaradas nos pontos 1) a 13) dos Factos Provados. Pelo contrário, as declarações prestadas pelos Arguidos, em que os Arguidos AA e HH assumiram o inegável, face ao vídeo e estado em que o Assistente CC ficou, não nos mereceram credibilidade. Com efeito, não só a explicação, coordenada, por estes apresentada em audiência de julgamento para a reação do AA, de que os Assistentes (ou apenas o Assistente CC, pois nesta parte as versões divergem) é que começaram a gozar com o apelido do EE não colhe, pelas razões já supra explicitadas, como, ainda assim, não se compreenderia a perseguição levada a cabo pelos Arguidos relativamente aos Assistentes. Os Arguidos dividindo-se inicialmente em dois grupos: um primeiro, composto pelos Arguidos HH e AA, que perseguem e molestam o Assistente CC; e, um segundo, composto pelos Arguidos DD e EE que perseguem e molestam, com pelo menos um pontapé, o Assistente BB. Igualmente não se perceberia a razão pela qual estes últimos regressam para junto dos primeiros e colaboram com estes nas agressões levadas a cabo relativamente ao Assiste CC. E, se é certo que os Arguidos AA e HH negam que os demais coarguidos igualmente tenham molestado fisicamente o Assistente CC, a verdade é que tal realidade não só se mostra demonstrada pelas declarações prestadas pela própria vítima, que afirmou ter sentido o aproximar dos Arguidos EE e DD e ser por estes pontapeado, que a própria reação de grupo em que os Arguidos se encontravam o proporcionava.Ainda que resulte da prova produzida que os Arguidos DD e EE tiveram menor intervenção nas agressões, violentíssimas (até pelas zonas visadas, em especial a cabeça do Assistente CC), a verdade é que estes colaboraram em tais agressões, só tendo parado, por indicação do EE, quando este se apercebeu da gravidade das lesões infligidas e de poderem estar a colocar em risco a vida do Assistente CC. Embora em julgamento tenha sido afirmado que o EE se encontrava preocupado com o estado em que deixaram o Assistente CC, não só este não providenciou por ajuda ao mesmo ou sequer ficou junto a este, como, ainda, seguiu com os demais coarguidos para o bar do “Clube”, para comer, o que é elucidativo da importância que deram ao estado em que deixaram o Assistente CC, que nem sequer lhes tirou a vontade de aí se dirigirem, vangloriando-se da forma como tinham atuado (e foi ouvido pela testemunha JJJ, que com estes se cruzou, quando os Arguidos seguiam em direção ao dito Clube). Para prova da factualidade descrita no ponto 14) dos Factos Provados ativemo-nos aos testemunhos prestados por RR e FF, que, tendo sido quem recebeu e quem entregou o telemóvel se mostraram quanto a tal esclarecedoras. Para prova da factualidade exarada nos pontos 15) e 16) dos Factos Provados valorámos as declarações prestadas pelo AA em audiência de julgamento, em que este assumiu ter enviado o vídeo, concatenadas com o testemunho prestado por KKK, mãe do Assistente CC, que teve acesso a esse mesmo vídeo, permitindo que este viesse a ser junto aos autos. (…) Para prova da factualidade exarada nos pontos 35) a 37), 39) a 58), 64), 68) a 72) e 73) a 84) dos Factos Provados mostraram-se igualmente determinantes as declarações prestadas pelos Assistentes, que quanto a tal se mostraram totalmente esclarecedores, e que, de resto, foram corroboradas pelo pai do Assistente CC (que com este trabalha) e demais familiares e amigos que têm com estes vivenciado o sofrimento que os factos dos autos lhes trouxeram, nos termos supra descritos. Não podemos ainda deixar de salientar que parte da convicção que se forma em relação às declarações e aos testemunhos prestados alavanca-se precisamente na imediação do interrogatório, ou seja, pelos seus gestos, tom de voz, atitude corporal, forma como se referem aos factos, a qual nos permite percecionar a realidade do seu depoimento e testemunhos de forma diferente do que seria caso esta fosse descrita sem a mencionada imediação.E tais fatores adicionais reforçam a nossa convicção sobre a matéria de facto considerada provada nos termos supra exarados e a credibilidade que as declarações prestadas pelos Assistentes, em sede de audiência de julgamento, nos mereceram para prova dessa mesma factualidade. Para prova da factualidade descrita no ponto 38) dos Factos Provados mostrou-se determinante o supra mencionado vídeo, onde é visível a postura corporal do Assistente e a forma como este se procura proteger das sucessivas investidas dos Arguidos. Os recibos juntos pelo Assistente CC com o pedido cível deduzido, constantes de fls. 755, verso, a 758 dos presentes autos, concatenados com as declarações prestadas pelo Assistente CC, mostraram-se determinantes para prova da factualidade descrita nos pontos 59) a 67) dos Factos Provados. (…) - no teor do relatório social referente ao AA, junto aos autos em ........2024, complementado pelas declarações por este prestadas em audiência de julgamento, no que respeita às condições pessoais deste Arguido (pontos 99) a 118) dos Factos Provados); - no teor do relatório social referente ao DD, junto aos autos em ........2024, no que respeita às condições pessoais deste Arguido (pontos 119) a 129) dos Factos Provados); (…) - no teor dos certificados de registo criminal referentes ao Arguido, emitidos e juntos autos em ........2024, no que respeita aos antecedentes criminais dos Arguidos HH e AA (pontos 152) e 153) dos Factos Provados) e à ausência de antecedentes criminais por parte dos Arguidos DD e EE (pontos 154) e 155) dos Factos Provados)».
3. Dos recursos interpostos
Por uma questão de lógica, cronologia (em tese até, eventualmente, preclusivas) e, também, por motivos de economia processual, faremos a apreciação dos recursos interpostos debruçando-nos, primeiramente, sobre o alegado erro de julgamento quanto à matéria de facto (invocado pelo arguido DD) e, depois, sobre os imputados, por ambos os recorrentes, erros de julgamento quanto à matéria de direito (quer em sede subsuntiva, quer no que respeita à escolha e medidas das penas).
3.1. Do erro de julgamento da matéria de facto
Neste segmento, o recorrente DD defende, nas conclusões recursivas, que: «O presente Recurso é motivado pela falta de concordância do DD, ora Recorrente, quanto à apreciação da matéria de facto levada a cabo pelo Tribunal a quo, o qual considerou provados determinados factos relativamente aos quais não existe evidência da sua veracidade, bem como não logrou justificar devidamente as suas conclusões. Quanto ao crime de furto qualificado pelo qual se condenaram os quatro Arguidos em coautoria material, importa referir que foi confirmado pelas Declarações prestadas pelo EE, bem como pelos depoimentos das Testemunhas FF e GG, que terá sido o próprio EE a apanhar, do chão, o telemóvel do Assistente CC, e, apercebendo-se que não pertencia a nenhum dos coarguidos, terá diligenciado, por intermédio daquelas testemunhas, pela entrega do referido telemóvel no estabelecimento do pai do Assistente CC. Mais, no que concerne à carteira de borracha do Assistente CC, não ficou cabalmente demonstrado que tenha sido qualquer um dos Arguidos a apanhar e ficar com a mesma. Deverá ainda acrescentar-se que o DD, ora Recorrente, não teve qualquer intenção de se locupletar ou apropriar daqueles bens. Aliás, no que respeita ao telemóvel do Assistente CC, o ora Recorrente desconhecia o seu proprietário e o destino que lhe foi conferido pelo EE. Razão pela qual, salvo melhor opinião, não ficou demonstrado que o DD tenha contribuído para a apropriação do telemóvel do Assistente CC, seja na fase de delineação do alegado plano de apropriação, seja na fase da sua eventual execução. Quanto ao crime de ofensa à integridade física simples do Assistente BB, é de referir que é absolutamente contrário às regras da experiência e da lógica que duas pessoas, neste caso os Arguidos EE e DD tenham dado um, único, pontapé na perna esquerda do Assistente BB. Ainda que se admita que um dos Arguidos deu um pontapé ao Assistente, o que somente por mero exercício académico se equaciona, é de admitir que o Tribunal a quo não consegue determinar, sem sombra de dúvida, qual dos Arguidos deu esse pontapé. Se assim é, a única possibilidade legal do Tribunal a quo deveria ter sido a absolvição de ambos os Arguidos, por não ter sido provado ou demonstrado, em sede de Audiência de Discussão e Julgamento, qual dos dois desferiu tal pontapé. Quanto ao crime de ofensa à integridade física qualificada ao Assistente CC, cumpre referir que nunca deveriam ter sido considerados provados os factos constantes do ponto 12), isto porque, em sede de declarações prestadas pelo próprio Assistente CC, o mesmo afirmou que “tem ideia que não chegou a perder a consciência enquanto esteve a ser pontapeado.”. Mais, no que concerne à sucessão de eventos, no momento em que os Arguidos EE e DD chegam ao pé do Assistente CC, quando este se encontra a ser molestado pelos outros dois Arguidos, importar esclarecer que não ocorreram quaisquer agressões por parte do DD ao Assistente CC, na medida em que, conjugando os factos provados e não provados considerados pelo Tribunal a quo, as agressões pararam no momento em que foi proferida a frase “já chega, já chega, vais matá-lo”, altura em que o Assistente CC se encontrava consciente, sem que tenham existido quaisquer outras agressões posteriores. Sendo certo que, em momento algum, das suas declarações, é indubitavelmente afirmado pelo Assistente CC que os Arguidos EE e DD tenham também participado nas agressões, limitando-se o mesmo a presumir tal facto, em virtude da intensidade das agressões, sem nunca confirmar, sem sombra de dúvidas, tal facto. Acresce que, não obstante as Declarações dos Arguidos AA e HH não terem sido levadas em linha de conta pelo Tribunal a quo, e tenham sido descredibilizadas, a verdade é que os mesmos foram perentórios quanto ao envolvimento de cada um nas agressões ao Assistente CC, assumindo para si a total responsabilidade por estes factos. É, portanto, inconcebível a extrapolação feita pelo Tribunal a quo, quando considera que o Assistente CC foi agredido pelos quatro Arguidos, facto este que não resulta da prova produzida, nem foi corroborado por qualquer outro meio de prova, nem mesmo pelo próprio Assistente. Desta feita, aplica-se também nesta situação o princípio do in dubio pro reo, pelo que, não sendo possível confirmar a participação do HH nas agressões infligidas ao Assistente CC, deveria o Tribunal a quo, ter absolvido o mesmo da prática deste ilícito criminal, na medida em que não foi demonstrada ou confirmada qualquer agressão da sua parte, nem, tão pouco, se demonstrou que teve qualquer intenção, em molestar o Assistente CC. Por fim no que respeita ao crime de injúrias, também se deverá referir que não foi possível imputar aos Arguidos a expressão que cada um terá, individualmente, proferido, não se sabendo se todos proferiram exatamente aquelas expressões, se apenas alguns proferiram tais expressões, ou se apenas um proferiu tais expressões, pelo que, em última instância, não podiam todos os Arguidos ser condenados por tais crimes».
Atentemos.
Como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 22 de Setembro de 2015, processo n.º 2619/12.8GBABF.E1, in www.dgsi.pt., «(…) o juiz que, em 1.ª instância, julga de facto, goza de ampla (conquanto vinculada) liberdade de movimentos ao erigir os meios de que se serve na fixação dos factos provados, de harmonia com o princípio da livre convicção e apreciação da prova.
Nos termos expressamente prevenidos no artigo 127.º, do CPP, as provas são livremente valoradas pelo juiz sem obediência a regras pré-fixadas.
Ora, há-de conceder-se, essa liberdade de apreciação com base no conjunto do material probatório recolhido pela percepção global, traduzido numa síntese decisória, é insindicável por este Tribunal.
Como assim, o Tribunal de recurso só em casos excepcionais de manifesto erro de apreciação da prova poderá comutar a decisão levada na instância – será, por exemplo e caricatura, o caso de o depoimento de uma testemunha ter um sentido diametralmente oposto ao que foi considerado na sentença recorrida.
Vale dizer que, por força do referido princípio da livre apreciação da prova (não estando em causa, como, no caso, não está, prova tarifada ou legal), o processo de formação da livre convicção do julgador na apreciação da prova não é questionável pelo tribunal de recurso.
A esta instância caberá apenas indagar se tal apreciação e julgamento são contrariados pelas regras da experiência comum ou pela lógica do homem médio (diga-se mesmo, do julgador médio) suposto pela ordem jurídica.
Por outro lado, há que sublinhar, a lei é exigente quanto ao modo de impugnação do recurso em matéria de facto, de harmonia com o disposto no artigo 412.º n.ºs 3 e 4, do CPP, sendo que a modificabilidade da decisão da 1ª instância apenas ocorre nos termos apontados no artigo 431.º do mesmo Código, entre os quais a impugnação da matéria de factos nos termos do artigo 412.º n.º 3, do mesmo diploma.
E aqui devem ser indicados não (apenas) os pontos de facto ou provas dissonantes, mas os concretos pontos de factos e as concretas provas que impõem decisão diversa.
Por isso, o tribunal de 2.ª instância, apesar de ter poderes de cognição em matéria de facto, não pode, sem mais, apreciar quais os meios de prova de que se socorreu o tribunal da 1ª instância para ter dado como provados os factos que veio a dar como provados ou para julgar não provados os factos que sedimento como tal.
Torna-se necessária a indicação expressa dos concretos pontos de facto e concretas provas que, para esses concretos pontos de facto, impõem solução diversa.
Tendo em conta o princípio da apreciação da prova nos termos do art.º 127.º do CPP, uma coisa é a valoração da prova efectuada pelo tribunal e outra, o modo da sua impugnação em recurso sobre a matéria de facto, de forma processualmente válida, que não se traduz em mera exposição pelo recorrente como em seu entendimento faz a valoração da prova, sob pena de se limitar a impugnar a convicção do tribunal recorrido.
O que a lei pretende ao vincular o recorrente à indicação das provas que impõem decisão diversa, não é, certamente, que este formule uma outra versão da prova produzida.
Por outro lado, ainda, não é suficiente especificar, de forma sectorial, algum ou outro, elemento da prova.
Só a especificação de todos eles, os indicados pelo tribunal e os que se entende não foram tidos em conta, pode impor decisão diversa.
E as provas que impõem essa diversa decisão são as provas relevantes e decisivas que não foram analisadas e apreciadas, ou, as que tendo sido, ponham em causa ou contradigam o entendimento decantado para a decisão recorrida.
Se a tais provas faltam esses pressupostos, não conduzem a outra decisão».
Volvendo ao caso, percorrida toda a motivação e as conclusões recursivas, constata-se que o arguido/recorrente especificou alguns dos factos alegada e incorrectamente julgados, mas não explicitou, nos termos legalmente exigidos, os motivos que determinariam decisão diversa da proferida pelas Sras. Juízas e pelo Sr. Juiz do Tribunal a quo, desde logo e, inexoravelmente, porque omitiu a exigida concretização quanto às provas subjacentes ao putativo erro de julgamento.
Na verdade, e rigorosamente, o que se constata é que o arguido/recorrente, por um lado, alude genericamente às declarações e depoimentos prestados e, por outro, e em mesclado, transcreve trechos dos depoimentos prestados pelas testemunhas em julgamento (refutando a convicção adquirida pelo tribunal recorrido sobre os factos dados como provados e contrapondo a sua própria convicção), em jeito de petitório para avaliação de toda a prova, no equívoco, de resto, que o tribunal de recurso procede a um novo julgamento.
Vale por dizer que, não tendo o recorrente especificado (todos) os pontos que pugna como tendo sido incorrectamente julgados, as concretas provas que imporiam decisão diversa da revidenda, nem indicado (de forma completa) as passagens em que se funda a impugnação, (limitando-se, no âmago, a fazer menção difusa às provas produzidas em julgamento), nos termos prevenidos no art.º 412º, n.º 1 e 2, al. a) e b) e 4 do C.P.P. o escrutínio da matéria factual apenas poderá ser realizado pela via a que alude o art.º 410º, n.º 2 do C.P.P.1
Porém, in casu, é patente, do texto da decisão recorrida não resulta qualquer dos vícios a que alude o art.º 410.º n.º 2, do C.P.P.
Na verdade, não se vislumbra (nem em rigor é invocado) que sobressaia da decisão, por si só e/ou com recurso às regras da experiência comum, qualquer falha evidente na análise da prova ou qualquer juízo ilógico ou arbitrário, nem se vê que o Tribunal a quo se tenha debatido com qualquer estado de dúvida e que o tenha resolvido violentando o princípio in dubio pro reo.
Como se constata da motivação transcrita, o Tribunal a quo procedeu a um exame detalhado da prova produzida, concatenando-a num percurso de apreciação pautado pela normalidade e racionalidade e em consonância com as regras da lógica e da experiência comum.
Procedeu, de resto, e em concreto, ao detalhado exame e avaliação dos depoimentos e declarações prestadas, à explicitação das razões subjacentes à triagem da facticidade em assente e não assente e ao iter lógico e racional que a tal operação presidiu.
Atente-se que «(…) a censura quanto à forma de formação da convicção do tribunal não pode assentar, de forma simplista, no ataque da fase final da formação de tal convicção, isto é, na valoração da prova; tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade de formação da convicção. Doutra forma seria uma inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão.
Neste sentido vai a jurisprudência uniforme dos tribunais superiores, ao explicitar que quando a atribuição de credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear numa opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção é inadmissível face às regras da experiência comum, e, consequentemente, que a crítica à convicção do tribunal a quo sustentada na livre apreciação da prova e nas regras da experiência não pode ter sucesso se se alicerçar apenas na diferente convicção do recorrente sobre a prova produzida.
Efectivamente, o julgador é livre, ao apreciar as provas, embora tal apreciação seja vinculada aos princípios em que se consubstancia o direito probatório e às normas da experiência comum, da lógica, regras de natureza científica que se devem incluir no âmbito do direito probatório»2
Ademais, no âmbito dos vícios de procedimento, tem sido repetidamente afirmado na jurisprudência que não resultando da decisão que o tribunal ficou num estado de dúvida sobre os factos e que ultrapassou essa dúvida, dando-os por provados contra o arguido, fica vedada, neste espectro, a possibilidade de decidir sobre a violação do princípio in dubio pro reo.
Por fim, é de aditar que, o recorrente DD, pelo menos em parte, ainda que sob a égide do erro de julgamento quanto à matéria de facto, centra a sua discordância não propriamente na facticidade provada, mas na sua condenação pela prática dos tipos legais que lhe foram imputados, partindo de - e pressupondo - uma compreensão coarctada e deficitária da figura da co-autoria.
Com efeito:
Nos termos do art.º 26º do C.P «É punível como autor quem executar o facto, por si mesmo ou por intermédio de outrem, ou tomar parte directa na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros, e ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto, desde que haja execução ou começo de execução».
São fundamentalmente dois os requisitos exigidos para que se possa falar de co-autoria: um acordo, no sentido de uma decisão conjunta; e uma execução conjunta da decisão.
Para que se considere a existência de uma decisão conjunta (verdadeiro elemento constitutivo da unidade da co-autoria) é necessário que todos os co-autores tenham uma incondicional vontade de realização do tipo.
A co-autoria não pode bastar-se com o elemento subjectivo da decisão conjunta, mas exige, ainda, uma contribuição objectiva conjunta para a realização típica, uma execução conjunta, um exercício conjunto do domínio do facto.
O ponto de vista essencial parece ser o do domínio do processo que conduz à realização do tipo.
A este respeito, no acórdão do S.T.J. de 6 de Outubro de 2004, proferido no processo n.º 1875/04, consignou-se o seguinte: «II - A execução conjunta, neste sentido, não exige que todos os agentes intervenham em todos os actos, mais ou menos complexos, organizados ou planeados, que se destinem a produzir o resultado típico pretendido, bastando que a actuação de cada um dos agentes seja elemento componente do conjunto da acção, mas indispensável à produção da finalidade e do resultado a que o acordo se destina.
III - Tal como o autor deve ter o domínio funcional do facto, também o co-autor tem que deter o domínio funcional da actividade que realiza, integrante do conjunto da acção para a qual deu o seu acordo, e que, na execução desse acordo, se dispôs a levar a cabo. O domínio funcional do facto próprio da autoria significa que a actividade, mesmo parcelar, do co-autor na realização do objectivo acordado se tem de revelar indispensável à realização desse objectivo».
A propósito, no texto Autoria e Comparticipação Tráfico de Estupefacientes, Abril de 2019, Centro de Estudos Judiciários, ficou consignado que: «Ainda que a grande maioria das incriminações da parte especial descrevam condutas construídas de acordo com o modelo do autor individual e que seja evidente que, na elaboração da teoria geral do crime, se tenha partido da realização singular do ilícito, mesmo assim – e isso é um dado da experiência – o agente não actua sempre sozinho, mas fá-lo, frequentemente, em conjunto com outro ou outros, quer dizer: em comparticipação.
Na co-autoria, para que possa falar-se em domínio do facto por todos os que tomam parte na acção, é necessário que haja uma decisão conjunta (componente subjectiva) e uma execução conjunta dessa decisão (componente objectiva). A forma mais nítida, comum e normal, dessa decisão conjunta – enquanto adesão de vontades na realização de uma figura típica – é a do acordo prévio, que pode ser expresso ou tácito, e que exige que haja uma consciência de colaboração com carácter bilateral e uma vontade de colaboração de várias pessoas na realização de um tipo legal de crime segundo elemento, de natureza objectiva – execução conjunta – consiste na participação na execução do facto criminoso, conjuntamente com outro ou outros, num exercício conjunto do domínio do facto, ou numa contribuição objectiva para a consumação do tipo legal visado. A execução conjunta, neste sentido, não exige que cada um dos agentes cometa integralmente o facto punível, que execute todos os factos correspondentes ao preceito incriminador, que intervenha em todos os actos a praticar para obtenção do resultado pretendido, bastando que a actuação de cada um, embora parcial, seja elemento componente do todo e indispensável à produção do resultado.
Como tal, verificando-se ter existido um acordo prévio para a execução integral do crime ou, por parte de cada co-agente, uma consciência de colaboração na actividade dos demais para essa integral realização, cada um dos agentes é responsável pela totalidade da conduta criminosa, ainda que a sua actividade haja executado parcialmente o crime. Vale aqui o princípio da imputação recíproca de esforços e contribuições (…)
Como refere José de Faria Costa (in Formas do Crime, Jornadas de Direito Criminal, CEJ, 1983, p. 170): “Para definir uma decisão conjunta parece bastar a existência da consciência e vontade de colaboração de várias pessoas na realização de um tipo legal de crime (“juntamente com outro ou outros”). É evidente que na sua forma mais nítida tem de existir um verdadeiro acordo prévio – podendo mesmo ser tácito – que tem igualmente que se traduzir numa contribuição objectiva conjunta na realização típica. Do mesmo modo que, em princípio, cada coautor é responsável como se fosse autor singular da respectiva realização típica».
E assim sendo, pese embora as contrariedades expostas pelo recorrente, como aduz a Ex.ma Magistrada do Ministério Público na resposta ao recurso interposto: «No caso dos autos, face à factualidade dada como provada, não existem dúvidas que o Recorrente acompanhou, desde o início, os restantes arguidos, nunca os tendo abandonado. Efectivamente esteve presente aquando da abordagem, pelo grupo onde se integrava, aos Assistentes CC e BB, quando os perseguiram, sendo que o Recorrente, juntamente com o arguido EE, seguiu no encalço do Assistente BB, a quem desferiram um pontapé. Logrando BB fugir, estes regressaram para junto dos restantes arguidos, que rodeavam o Assistente CC ao mesmo tempo que o agrediam, com murros e pontapés, estando este deitado no chão e filmavam tal comportamento. Foi nessa altura que o arguido EE retirou o telemóvel do Assistente que lhe caíra do bolso. Sendo que um deles retirou a carteira de borracha, com cerca de € 5,00, que aquele igualmente trazia consigo. Não tendo o Recorrente impedido que o fizessem. Pelo que há que concluir que o Recorrente deu o seu acordo prévio, tácito, ao colaborar com os restantes arguidos, na apropriação dos bens em causa, bem como nas agressões de que os Assistentes foram vítimas. Efectivamente, ao ir no encalço do Assistente BB, juntamente com o arguido EE, fê-lo com a intenção de o atingir na sua integridade física. Assim, é indiferente que tivesse sido o Recorrente a desferir o pontapé ou que tivesse sido o arguido EE. Ou que tivesse sido o Recorrente a retirar o telemóvel e a carteira ou que tivesse sido outro dos arguidos. Ou que tivesse sido o recorrente a proferir as palavras injuriosas aos Assistentes ou tivesse sido outro ou outros dos arguidos. O que releva, de facto, é que o Recorrente se tornou “senhor do facto”, dominando-o e assumindo um poder de direcção dado que, podendo ter impedido toda a actuação levada a cabo, não só a impediu (retirada dos objectos) como comparticipou na perseguição do Assistente BB com o objectivo de o atingir na sua integridade física, independentemente de ter sido a pessoa que desferiu o pontapé».
Assim, nos termos expostos, rejeitando-se o recurso quanto à impugnação da matéria de facto, pela via do erro de julgamento e ante a inexistência dos vícios de procedimento a que alude o art.º 410º, n.º 2 do C.P.P., não pode, pois, nesta parte, proceder o recurso interposto pelo arguido DD.
3.2. Do erro de julgamento da matéria de direito.
3.2.1. Da subsunção jurídico-penal
A este respeito, o arguido/recorrente AA invoca, em sede conclusiva, somente que: «Não se encontram preenchidos os elementos constitutivos do crime de furto agravado, nomeadamente a intenção ilegítima de apropriação, conforme exige o artigo 203.º, n.º 1, do Código Penal, uma vez que não está preenchido o dolo específico, ou seja, a intenção por banda do aqui recorrente».
E percorrida a motivação do recurso constata-se que se limita a aditar a este propósito que: «Refira-se e remetendo para os factos provados que o tal telemóvel referido em sede de dolo específico e de mais carreado no presente recurso, foi entregue a quem de direito não estar preenchido o elemento subjetivo de tal crime que aqui aferimos e cingimos à medida de pena».
No que concerne ao enquadramento jurídico-penal quanto ao crime de furto qualificado, as Sras. Juízas e o Sr. Juiz do Tribunal a quo consignaram no acórdão recorrido o seguinte: «No caso em apreço, pese embora tenha ficado demonstrado que os Arguidos se apropriaram do telemóvel (no valor de, pelo menos €400,00) e da carteira de borracha (com numerário) pertencentes ao Assistente CC, da prova produzida não resultou que a violência levada a cabo pelos Arguidos relativamente a CC fosse por forma a constrangê-lo a entregar tais objetos ou sequer a colocá-lo na impossibilidade de resistir para depois lhe subtraírem esses mesmos objetos. Os Arguidos apropriaram-se, efetivamente de bens pertencentes ao Assistente CC e que ainda se encontravam na esfera de domínio de facto deste, quebrando a detenção originária contra a vontade do mesmo e constituindo uma nova detenção, mas fizeram-no sem uso da força para o efeito. Assim, não estando preenchido um dos aludidos elementos do crime de roubo (mais precisamente o meio utilizado, in casu a violência contra o seu detentor) têm os Arguidos de ser necessariamente absolvidos da prática de 1 (um) crime de roubo agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art.º 210º, n.ºs 1 e 2, al. b), por referência ao art.º 204º, n.º 1, al. d), todos do Código Penal, por que vinham acusados. Tendo ficado, no entanto, demonstrado que os Arguidos se apropriaram do telemóvel (no valor de, pelo menos, €400,00) e carteira com numerário pertencentes ao Assistente CC, que levaram consigo, fazendo-os seus, é irrefutável que, com a conduta descrita, os Arguidos preencheram integralmente os elementos objetivos e subjetivos do crime de furto, p. e p. pelo art.º 203º, n.º 1, do Código Penal. E, estando o Assistente CC incapaz de reagir à apropriação, por se encontrar caído e inanimado no solo, dúvidas não há que se mostra igualmente preenchida a circunstância qualificativa prevista no art.º 204º, n.º 1, al. d), do Código Penal. Face ao exposto, inexistindo causa que exclua a ilicitude ou dirima a respetiva responsabilidade do Arguido (cfr. art.ºs 31º a 39º do Código Penal), dúvidas não restam que, com a conduta adotada, os Arguidos incorreram na prática, em coautoria material, e na forma consumada, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, n.º 1, e 204º, n.º 1, al. d), do Código Penal».
Por fim, não tendo este recorrente impugnado, por alguma via, a matéria de facto dada como provada, em face da improcedência do segmento recursivo apresentado pelo arguido DD quanto ao erro de julgamento da matéria de facto, mostra-se, a propósito, estabilizada a seguinte facticidade: «12) A dado momento, CC ficou inanimado no solo e sem qualquer capacidade de reação; 13) Enquanto desferiam pontapés no Assistente CC, o EE disse “já chega, já chega, vais matá-lo” o que fez com que abandonassem o local, levando consigo o telemóvel, no valor de, pelo menos, €400,00 (quatrocentos Euros) e a carteira de borracha com numerário do Assistente CC, que havia caído do bolso deste, que os Arguidos fizeram seus; 14) Nesse mesmo dia, pessoa não identificada entregou o referido telemóvel no estabelecimento de restauração denominado ..., sito na ..., pertencente ao pai de CC; 29) Os Arguidos, também em conjugação de esforços e vontades, aproveitando-se da circunstância de terem colocado CC na impossibilidade de lhes opor resistência e explorando a sua especial debilidade física enquanto jazeu, por instantes, inanimado no chão, apoderam-se dos descritos bens e dinheiro que sabiam não lhes pertencerem; 30) Mais sabiam os Arguidos que, ao apoderarem-se de tais bens e dinheiro com o propósito, concretizado, de os fazer coisas suas, agiam contra a vontade e sem autorização do respetivo dono».
Vejamos, então.
O arguido/recorrente, daquilo que nos é possível extrair do invocado, centraliza a discordância na alegação de que não se mostra preenchido o dolo específico - a ilegítima intenção de apropriação – aludindo simultaneamente à circunstância de o telemóvel ter sido recuperado.
Todavia, ante a matéria factual provada - em especial o ponto 30 atrás transcrito - e o tipo legal em crise, não se vislumbra, de todo em todo, que as Sras. Juízas e o Sr. Juiz tenham incorrido em erro subsuntivo.
Ao invés, afigura-se que os factos apurados preenchem, inolvidavelmente, todos os elementos objectivos e subjectivos, do crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.º 204º, n.º 1, al. d) do C.P., pelo qual os arguidos foram condenados, em co-autoria, tal qual decidido.
Em abreviada síntese, dir-se-á que: a intenção de apropriação ilegítima mostra-se provada e o advento atinente à posterior recuperação do telemóvel em nada bule com o preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos do tipo.
Tanto basta, pois, para se julgar improcedente o recurso nesta parte.
3.2.2. Da medida das penas parcelares e únicas
Nesta parte, o recorrente DD insurge-se contra as penas que lhe foram aplicadas e pugna pela aplicação dos «limites mínimos legais (…), por cada ilícito imputado, em virtude da sua inexistente participação nos factos que motivaram os presentes Autos», sem aduzir, contudo, qualquer concreta circunstância em abono.
Por seu turno, o recorrente AA invoca, em síntese, que: «A pena aplicada é desproporcional, excessiva e injusta, desrespeitando os princípios e critérios orientadores previstos nos artigos 40.º, 50.º, 71.º e 77.º, todos do Código Penal, nomeadamente, a ausência de antecedentes criminais do arguido, no que concerne aos crimes nos autos imputados, a sua confissão e colaboração com a justiça e a sua situação laboral estável e comportamento posterior aos factos».
Ou seja, como se extrai das conclusões apresentadas, os recorrentes pretendem ver mitigadas as penas em que foram condenados, concluindo que o Tribunal a quo incorreu em erro de jure, por deficiente interpretação do disposto nos art.º 40.º, 71.º e 72.º, do C.P.
Relembremos que, em sede de escolha e medida da pena, o Colectivo a quo, quanto aos arguidos/recorrentes ponderou, em suma, nos seguintes termos:
«Relativamente ao AA: - o grau de ilicitude dos factos é muito elevado; - as consequências dos crimes praticados, especialmente no que respeita ao crime de ofensa à integridade física qualificada, revelam-se de intensidade elevada, pela violência utilizada e forma como o Assistente CC é abordado e molestado fisicamente, em superioridade numérica e com uma agressividade muito acentuada, pelos Arguidos; - a forte intensidade do dolo, manifestada no dolo direto; - as elevadíssimas exigências de prevenção geral, no sentido de repor a confiança dos cidadãos na validade das normas jurídicas violadas, especialmente no que respeita ao crime de ofensa à integridade física qualificada, que, pelas circunstâncias em que foi cometido e o local onde foi cometido (uma pequena vila) gera um elevado alarme social, urgindo repor um sentimento comunitário de segurança, necessário à vivência em sociedade. As exigências de prevenção geral igualmente se mostram elevadíssimas relativamente aos crimes de gravações ilícitas, atentas as imagens registadas e forma como estas foram captadas, expondo de forma completamente desnecessária e sem qualquer sentido o Assistente CC. Não satisfeito com a humilhação já causada, este Arguido ainda difundiu essas mesmas imagens por terceiros, aumentando ainda mais o sentimento de vexação provocado no Assistente, e de insegurança e de alarme social por parte daqueles que as visionaram e souberam da sua existência, mostrando-se premente que estes tipos de comportamentos sejam exemplarmente punidos, por forma a repor o sentimento de segurança necessário à vivência em sociedade; - as necessidades de prevenção especial relativamente a este Arguido são igualmente muito expressivas, não tendo este demonstrado empatia pelas vítimas ou arrependimento sincero pelos factos praticados e consequências destes decorrentes para os Assistentes, em especial no que respeita aos crimes de ofensa à integridade física qualificada e de gravações ilícitas praticado na pessoa do Assistente CC, que, atento o grau de violência empreendido não só podia ter tido um desfecho ainda bem mais grave, sobretudo tendo presente a zona do corpo do Assistente (cabeça) onde foram infligidos os pontapés, como podia ter desencadeado consequências ainda mais graves na vítima (que se viu ser exposto de forma completamente desnecessária e desumana). À data da prática dos factos este Arguido já registava antecedentes criminais, pela prática de um crime de injúria agravada, ainda que sancionado com pena não privativa da liberdade, o que é elucidativo de que este Arguido ainda não assimilou a necessidade de adotar um comportamento conforme ao Direito e às regras de vivência em sociedade, com respeito pelos demais, que não se coíbe de insultar e molestar, como se verificou na situação em apreço nos autos. Em benefício deste Arguido não podemos deixar de ter presente a sua relativa jovialidade e que este se mostra atualmente ativo laboralmente, o que, ainda assim, tendo presente a sua vulnerabilidade à influência dos pares, se nos afigura não ser suficiente para que possamos concluir que este Arguido não mais vai praticar factos como os dos autos; - Relativamente ao DD: - o grau de ilicitude dos factos, que é muito elevado; - as consequências dos crimes praticados, especialmente no que respeita ao crime de ofensa à integridade física qualificada, revelam-se de intensidade elevada, pela violência utilizada e forma como o Assistente CC é abordado e molestado fisicamente, em superioridade numérica e com uma agressividade muito acentuada, pelos Arguidos, pese embora este Arguido, que inicialmente seguiu em perseguição do Assistente BB, tenha tido um papel menor nas agressões efetuadas ao Assistente CC, que já se mostravam em curso quando chegou junto dos Arguidos HH e AA; - a forte intensidade do dolo, manifestada no dolo direto; - as elevadíssimas exigências de prevenção geral, no sentido de repor a confiança dos cidadãos na validade das normas jurídicas violadas, especialmente no que respeita ao crime de ofensa à integridade física qualificada, que, pelas circunstâncias em que foi cometido e o local onde foi cometido (uma pequena vila) gera um elevado alarme social, urgindo repor um sentimento comunitário de segurança, necessário à vivência em sociedade. - as necessidades de prevenção especial relativamente a este Arguido mostram-se menos expressivas, não tendo este antecedentes criminais registados e tendo demonstrado (embora em silêncio) algum respeito pelo sofrimento das vítimas, tudo levando a crer que este atuou envolvido num sentimento de grupo e que sozinho não teria praticado os factos dos autos. Em benefício deste Arguido não podemos deixar ainda de ter presente a sua relativa jovialidade, que este beneficia de apoio familiar e que tem hábitos de trabalho. (…) Por tudo o exposto, considerando as circunstâncias e gravidade dos factos e a personalidade violenta do Arguido neles espelhada, e sem esquecer a culpa e as elevadíssimas necessidades de prevenção geral e especial que se fazem sentir, entende o Tribunal como ajustada e adequada a aplicação: - ao AA: - da pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão, pela prática, em coautora material, de 1 (um) crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, n.º 1, e 204º, n.º 1, al. d), do Código Penal; - da pena de 3 (três) anos de prisão pela prática, em coautoria material, de 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos art.ºs 143º, n.º 1, 145º, n.ºs 1, al. a), e 2, por referência ao art.º 132º, n.º 2, al. h), Código Penal; - da pena de 1 (um) mês e 20 (vinte) dias, pela prática, em coautoria material, de cada um dos 2 (dois) crimes de injúria, p. e p. pelo art.º 181º, n.º 1, do Código Penal; - da pena de 9 (nove) meses de prisão pela prática, em autoria material, de 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas, p. e p. pelo art.º 199º, n.º 2, al. a), do Código Penal; - da pena de 1 (um) ano de prisão pela prática, em autoria material, de 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas agravado, p. e p. pelos art.ºs 199º, n.ºs 2, al. b), e 3, e 197º, n.º 2, do Código Penal; - ao DD: - da pena de 10 (dez) meses de prisão, pela prática de 1 (um) crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, n.º 1, e 204º, n.º 1, al. d), do Código Penal, 4º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73º do Código Penal; - da pena de 9 (nove) meses de prisão, pela prática de 1 (um) crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelos art.ºs 143º, n.º 1, do Código Penal, 4º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73º do Código Penal, na pessoa do Assistente BB, que, tendo este logrado posteriormente fugir e refugiar-se no seu veículo automóvel, não assumiu contornos mais graves; - da pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão pela prática de 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos art.ºs 143º, n.º 1, 145º, n.ºs 1, al. a), e 2, por referência ao art.º 132º, n.º 2, al. h), Código Penal, 4º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73º do Código Penal, na pessoa do Assistente CC; - da pena de 1 (um) mês e 10 (dez) dias por cada um dos 2 (dois) crimes de injúria, p. e p. pelos art.ºs 181º, n.º 1, do Código Penal, 4º do DL n.º 401/82, de 23.09, e 73º do Código Penal; Tendo-se encontrado as penas parcelares relativas aos ilícitos referidos, cumpre agora proceder à determinação de uma pena única, considerando em conjunto os factos e a personalidade do agente, nos termos do art.º 77º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal. Assim, o limite mínimo da pena aplicável corresponde à pena máxima concretamente aplicada, e o limite máximo corresponde à soma das penas parcelares encontradas. Como entende o Supremo Tribunal de Justiça, face ao disposto no art.º 77º do Código Penal (cfr., por todos, Acórdãos de 11 de janeiro de 2001, Processo n.º 3095/00-5, de 4 de março de 2004, Processo n.º 3293/04-5, e de 12 de julho de 2005, todos in www.dgsi.pt), a pena única a estabelecer em cúmulo deve ser encontrada numa moldura penal abstrata, balizada pela maior das penas parcelares abrangidas e a soma destas, e na medida dessa pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, com respeito pela pena unitária. Na verdade, o elemento aglutinador da pena aplicável aos vários crimes é, justamente, a personalidade do delinquente, a qual tem, por força das coisas, carácter unitário, mas a personalidade traduzida na condução de vida, em que o juízo de culpabilidade se amplia a toda a personalidade do autor e ao seu desenvolvimento, também manifestada de forma imediata a ação típica, isto é, nos factos. Esse critério, conforme salienta Figueiredo Dias, consiste em apurar se “numa avaliação da personalidade – unitária - do agente”, o seu percurso de delinquência “é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo uma «carreira») criminosa” e não a uma “pluriocasionalidade que não radica na personalidade (…)” (in Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Editorial de Notícias, pág. 291). Assim, temos como moldura legal abstrata do concurso: - uma pena de limite mínimo de 3 (três) anos e de limite máximo uma pena de 6 (seis) anos, 2 (dois) meses e 10 (dez) dias de prisão relativamente ao AA; - uma pena de limite mínimo de 1 (um) ano e 6 (seis) meses e de limite máximo uma pena de 3 (três) anos, 3 (três) meses e 20 (vinte) dias de prisão relativamente ao DD; Ora, considerando as circunstâncias e gravidade dos factos, o contexto em que estes ocorreram, o papel de maior ou menor preponderância que os Arguidos nestes tiveram, as consequências que estes tiveram para os Assistentes e a personalidade (violenta) dos Arguidos neles espelhada, e sem esquecer a culpa e as necessidades de prevenção geral e especial (bem consideráveis no caso dos Arguidos HH e AA, em que nem os anteriores contactos que tiveram com o sistema de justiça e as condenações sofridas, ainda que em penas não privativas da liberdade, os demoveu da prática de novos ilícitos criminais), entende o Tribunal como ajustada a aplicação: - ao AA da pena única de 4 (quatro) anos de prisão; e - ao DD da pena única de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão».
A medida da pena deve ser determinada em função da culpa do agente, tendo em atenção as exigências de prevenção geral e especial, de acordo com os critérios estabelecidos no art.º 71º do C.P.
«As finalidades de aplicação de uma pena assentam, em primeira linha, na tutela de bens jurídicos e na reintegração do agente de sociedade. Contudo, em caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa (artigo 40.º, n.º 1 e 2, do CP).
Logo, num primeiro momento, a medida da pena há-de ser dada pela medida de tutela dos bens jurídicos, no caso concreto, traduzindo a ideia de prevenção geral positiva, enquanto «reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida; em suma, na expressão de Jakobs, como estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade e vigência da norma infringida» [Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pp. 72-73].
Valorada em concreto a medida da necessidade de tutela de bens jurídicos, a culpa funciona como limite máximo da pena, dentro da moldura assim encontrada, que as considerações de prevenção geral, quer positiva ou de integração, quer negativa ou de intimidação, não podem ultrapassar.
Por último, devem actuar considerações de prevenção especial, de socialização ou de suficiente advertência.
Os concretos factores de medida da pena, constantes do elenco, não exaustivo, do n.º 2 do artigo 71.º do C.P., relevam tanto pela via da culpa como pela via da prevenção»3,
«(…) a finalidade de tutela e protecção de bens jurídicos há-de constituir, por isso, o motivo fundamento da escolha do modelo e da medida da pena; de tutela da confiança das expectativas da comunidade na validade das normas, e, especificamente, na validade e integridade das normas e dos correspondentes valores concretamente afectados.
Por seu lado, a finalidade de reintegração do agente na sociedade há-de ser, em cada caso, prosseguida pela imposição de uma pena cuja espécie e medida, determinada por critérios derivados das exigências de prevenção especial, se mostre adequada e seja exigida pelas necessidades de ressocialização do agente, ou pela intensidade da advertência que se revele suficiente para realizar tais finalidades.
Nos limites da prevenção geral de integração e da prevenção especial de socialização há-de ser encontrado o modelo adequado e a medida concreta da pena, sempre de acordo com o princípio da culpa como seu limite inultrapassável».4
Como decorre claramente dos trechos atrás transcritos, o Colectivo, em primeira instância, ponderou assertivamente todas as circunstâncias na determinação das penas parcelares aplicadas ao arguido DD.
Na verdade, na sequência da atenuação especial (art.º 1º e 4º do D.L. n.º 401/82, de 23 de Setembro - Regime Especial para Jovens- e art.º 73º, n.º 1, als. a) e b), 41º, n.º 1, e 47º, n.º 1, do C.P. ) estando em causa, respectivamente, molduras penais de 1 (um) mês até 3 (três) anos e 4 (quatro) meses5, 1 (um) mês até 2 (dois) anos6, 1 (um) mês até 2 (dois) anos e 8 (oito) meses7 e 1 (um) mês até 2 (dois) meses8 de prisão, afigura-se inexistirem razões atenuativas que sequer consintam e muito menos que reclamem concretizar as penas parcelares ainda abaixo do estabelecido pelo Tribunal a quo.
Destarte, ante o tipo de criminalidade, particularmente os crimes de ofensa à integridade física e em especial o qualificado, são indesmentíveis, ademais, o alarme social e a perturbação da ordem e tranquilidade públicas associados, sabendo-se, também, da frequência com que ocorrem, o que, naturalmente, conduz à asserção de que, sendo fortes e intensas as razões de prevenção geral, urge reestabelecer a confiança da comunidade e reforçar a garantia da validade das normas.
E assim sendo, nas concretas penas fixadas, todas ainda visivelmente distantes do meio das respectivas molduras legais, mostram-se já devidamente valoradas, pelo Tribunal a quo, as circunstâncias abonatórias, designadamente a inserção e a ausência de condenações registadas.
A respeito das penas únicas:
Tal como se refere no Acórdão do S.T.J. de 16 de Junho de 2016, processo n.º 119/12.5GDPTM.E1.S1, in www.dgsi.pt., «(…) a lei elegeu como elementos determinadores da pena conjunta os factos e a personalidade do agente, elementos que devem ser considerados em conjunto.
A determinação da medida concreta da pena única deve atender, como qualquer outra pena, aos critérios gerais da prevenção e da culpa (artigo 71.º do Código Penal) e ainda a um critério especial: a consideração do conjunto dos factos e da personalidade do agente, na sua inter-relação.
«Ao tribunal – lê-se no acórdão deste Supremo Tribunal, de 28 de Maio de 2014, proferido no processo n.º 959/06.4PBVIS.C2.S1 – 3.ª Secção – impõe-se uma apreciação global dos factos, tomados como conjunto, e não enquanto mero somatório de factos desligados, na sua relação com a personalidade do agente. Essa apreciação indagará se a pluralidade de factos delituosos corresponde a uma tendência da personalidade do agente, ou antes a uma mera pluriocasionalidade, de carácter fortuito, não imputável a essa personalidade».
Como refere JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, a determinação da «pena conjunta do concurso», dentro dos limites da moldura penal do concurso, far-se-á «em função das exigências gerais da culpa e de prevenção (…), como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique». Na avaliação da personalidade do agente «relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma “carreira”) criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente exigências de prevenção especial de socialização).
O Código rejeita uma visão atomística da pluralidade de crimes e obriga a olhar para o conjunto – para a possível conexão dos factos entre si e para a necessária relação de todo esse bocado de vida criminosa com a personalidade do seu agente, estando em causa a avaliação de uma «unidade relacional de ilícito», portadora de um significado global próprio, a censurar de uma vez só a um mesmo agente.
Acompanhando o acórdão deste Supremo Tribunal, de 9 de Maio de 2012, proferido no processo n.º 418/08.0PAMAI.S1 – 3.ª Secção), na determinação concreta da pena conjunta interessa averiguar se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, bem como a indagar da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando em conjunto com a personalidade do agente referenciada aos factos, tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso, tendo presente o efeito dissuasor e ressocializador que essa pena irá exercer sobre aquele.
Em sede de considerações de prevenção geral, cumprirá ponderar no significado do conjunto dos actos praticados, valorar a perturbação da paz e segurança dos cidadãos e atender às exigências de tutela dos bens jurídicos e de defesa do ordenamento jurídico que ressaltam do conjunto dos factos.
De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente por forma a corresponder a exigências de prevenção especial de socialização, ponderando os seus antecedentes criminais e a sua personalidade expressa nos factos, perscrutando-se ainda a existência de um processo de socialização e de inserção na comunidade»
«Constatando assinalável diversidade na determinação da pena conjunta, geradora de incerteza jurídica, desigualdade nas consequências jurídicas do concurso de crimes, e fonte, a jusante, de considerável litigância recursória, designadamente perante o STJ, desenhou-se entendimento que faz intervir, na confeção da pena conjunta, operações aritméticas. Resumidamente, na sua veste mais recente, sustenta que na determinação da medida da pena única, se deve adicionar à pena parcelar mais grave, que fixa o limiar inferior da moldura penal do concurso de crimes, uma fração proporcional das restantes penas, sendo a partir deste valor, consideradas as especificidades do caso. Atendendo à regra ínsita no art.º 77º nº 1 do Código Penal. A fração é determinada em função do tipo de criminalidade e da dimensão das penas parcelares e, complementarmente, a personalidade do arguido que os factos revelam.
A. Lourenço Martins, (…), defende a adição de uma proporção das penas parcelares que oscila, conforme as circunstâncias de facto e a personalidade do agente, por via de regra, entre 1/3 (um terço) e 1/5 (um quinto).
(…) Sustenta-se no Ac. de 27/01/2016 deste Supremo Tribunal que “não repugna que a convocação dos critérios de determinação da pena conjunta tenha como coadjuvante, e não mais do que isso, a definição dum espaço dentro do qual as mesmas funcionam. Na verdade, como se referiu, a certeza e segurança jurídica podem estar em causa quando existe uma grande margem de amplitude na pena a aplicar, conduzindo a uma indeterminação. Recorrendo ao princípio da proporcionalidade não se pode aplicar uma pena maior do que aquela que merece a gravidade da conduta nem a que é exigida para tutela do bem jurídico. Para evitar aquela vacuidade admite-se o apelo a que, na formulação da pena conjunta e na ponderação da imagem global dos crimes imputados e da personalidade, se considere que, conforme uma personalidade mais, ou menos, gravemente desconforme com o Direito, o tribunal determine a pena única somando à pena concreta mais grave entre metade e um quinto de cada uma das penas concretas aplicadas aos outros crimes em concurso”.
Fração de compressão que deve relacionar-se, diretamente, com a destrinça que importa estabelecer ao nível das consequências jurídicas em função de cada fenomenologia criminal. Considerando a necessidade de um tratamento diferenciado para a criminalidade em função da sua definição legal, designadamente de acordo com a sua classificação categorial como bagatelar, média ou grave, de tal modo que, como referia Carmona da Mota, a “representação” da parcela que deve acrescer à pena mais elevada se possa saldar por uma fração de idêntico grau. Não é raro ver um tratamento uniforme, destituído de qualquer opção valorativa do bem jurídico, - que pode assumir uma diferença substantiva abissal impondo a destrinça clara da resposta entre a ofensa de bens jurídicos mais ou menos fundamentais para preservação de valores vitais e pessoais indisponíveis e a ofensa de bens jurídicos de outra índole e entidade jurídico-criminal.
Este é o entendimento prevalente, que nos casos de elevada pluralidade de crimes em concurso pode ainda ser temperado através da intervenção do princípio da proporcionalidade, implícito no critério que vem de citar-se. Designadamente convocando a interpretação de que “na formação da pena única, quanto maior é o somatório das penas parcelares, maior é o fator de compressão que incide sobre as penas que se vão somar à mais elevada, pois, se assim não fosse, muito facilmente se atingiria a pena máxima em casos em que a mesma não se justifica perante a gravidade dos factos”, de modo a impedir que o agente do concurso de crimes resulte condenado numa pena conjunta inadequada à gravidade dos crimes e que muito dificultaria a sua reintegração na comunidade (…)»9.
Traçado o paradigma e volvendo ao caso, em vista do disposto nos artigos 71º e 77º do C.P., conforme resulta da transcrição acima efectuada, verifica-se que as Sras. Juízas e o Sr. Juiz concluíram pela aplicação de penas únicas a ambos os recorrentes AA e DD próximas de um factor de compressão de 1/3.
Ou seja, à semelhança do constatado quanto às penas parcelares, à míngua, aliás, de concreta argumentação por banda dos arguidos/recorrentes no sentido propugnado, não se vislumbram razões atenuativas que imponham concretizar as penas únicas abaixo do estabelecido pelo Tribunal a quo.
«Importa ademais ter presente (faz doutrina e jurisprudência de há muito sedimentadas) que, em sede de escolha e medida da pena, o recurso não deixa de reter o paradigma de remédio jurídico (na expressão de Cunha Rodrigues), no sentido de que a intervenção do tribunal de recurso, (também) neste particular, deve cingir-se à reparação de qualquer desrespeito, pelo tribunal recorrido, dos princípios e normação que definem e demarcam as operações de concretização da pena na moldura abstracta determinada na lei.
Vale por dizer que o exame da concreta medida da pena estabelecida na instância, suscitado pela via recursiva, não deve aproximar-se desta senão quando haja de prevenir-se e emendar-se a fixação de um determinado quantum em derrogação dos princípios e regras pertinentes, cumprindo precaver (desde logo à míngua da imediação e da oralidade de que beneficiou o Tribunal a quo) qualquer abusiva evicção relativamente a uma concreta pena que ainda se revele congruente e proporcionada»10
Termos em que se conclui, outrossim, pela improcedência destes segmentos recursivos.
3.2.3. Da suspensão de execução da pena
Por fim, neste conspecto, aduz, em suma, o recorrente AA que: «A aplicação de pena de prisão efetiva contraria o princípio consagrado no artigo 70.º do Código Penal, sendo mais ajustada a substituição da pena poroutra menos gravosa, como a suspensão da execução da pena, que permitirá cumprir os objetivos de prevenção geral e especial. Deve ser considerado que penas privativas de liberdade de curta duração têm efeitos criminógenos negativos, dificultando a reinserção social do arguido, o que vai contra a finalidade das penas previstas no artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal. Pugna pela suspensão da pena única cuja “execução acompanhada de regime de prova».
As Sras. Juízas e o Sr. Juiz, a este respeito e para o que agora importa, decidiram nos seguintes termos: «Considerando que se trata de penas de prisão não superiores a cinco anos, o Tribunal pode suspender a execução das mesmas, verificados que sejam os pressupostos a que alude o art.º 50º, n.º 1, do Código Penal. Assim, nos termos da disposição legal citada, “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime, e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”. Ou seja, o Tribunal, perante a determinação de uma medida da pena de prisão não superior a cinco anos, terá sempre de fundamentar especificamente a denegação da suspensão da execução da pena de prisão nomeadamente no que toca: a) ao carácter desfavorável da prognose (de que a censura do facto e a ameaça da prisão não realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição); e b) às exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico (na base de considerações de prevenção geral) – neste sentido v.g. Figueiredo Dias, in “As Consequências Jurídicas do Crime”, § 523. A finalidade político-criminal que a lei visa com o instituto da execução da pena de prisão é clara e terminante: o afastamento do delinquente, no futuro, da prática de novos crimes, e não qualquer “correção”, “melhora” ou – ainda menos – “metanoia” das conceções daquele sobre a vida e o mundo. Decisivo é aqui o “conteúdo mínimo” da ideia de socialização, traduzida na “prevenção da reincidência”. Havendo, porém, razões sérias para duvidar da capacidade do agente de não repetir crimes, se for deixado em liberdade, o juízo de prognose deve ser desfavorável e a suspensão negada. (…) Relativamente aos Arguidos HH e AA, tendo presente o papel preponderante que estes assumiram nos factos em apreço nos autos e a agressividade gratuita por estes evidenciada, especialmente relativamente ao crime de ofensa à integridade física qualificada, na pessoa do Assistente CC, e a postura por estes assumida em julgamento, não demonstrando arrependimento sincero ou empatia pelos Assistentes e pelo sofrimento que lhes provocaram e àqueles que os rodeiam e não deixando de ter presente que este não é o primeiro contacto que estes têm com o sistema de justiça, entendemos não mais ser possível fazer esse juízo de prognose favorável. Com efeito, não só os factos praticados são muito graves, como as exigências de prevenção geral e especial relativamente a estes Arguidos são muito expressivas. As exigências de prevenção geral de intimidação e de prevenção especial de dissuasão mostram-se, assim, elevadíssimas, existindo razões sérias para duvidar da capacidade destes Arguidos de não voltarem a cometer ilícitos criminais se deixados em liberdade. Em face do exposto, o Tribunal entende não estarem preenchidos os requisitos materiais de suspensão da execução das penas de prisão aplicadas aos Arguidos HH e AA.
A respeito da suspensão de execução da pena, no Acórdão do S.T.J. de 11/2/2021, processo n.º 381/16.4GAMMC.C1.S1, in www.dgsi.pt., consignou-se que: «77. Para a aplicação da suspensão da execução da pena (artigo 50.º, do CP), a lei define um requisito objectivo (condenação em pena de prisão não superior a 5 anos) e estabelece pressupostos subjectivos, determinados por finalidades político-criminais – os que permitam concluir pelo afastamento futuro do delinquente da prática de novos crimes, através da sua capacidade de se reintegrar socialmente.
78. Trata-se de alcançar a socialização, prevenindo a reincidência.
79. Assim, sempre que o julgador puder formular um juízo de prognose favorável, à luz de considerações de prevenção especial sobre a possibilidade de ressocialização do arguido, deverá deixar de decretar a execução da pena.
80. Estão em causa, não considerações sobre a culpa, mas prognósticos acerca das exigências mínimas de prevenção.
81. Pretende-se, como sublinha, com incontornável autoridade, o Professor Figueiredo Dias, «o afastamento do delinquente, no futuro, da prática de novos crimes e não qualquer correcção, melhora ou – ainda menos – metanoia das concepções daquele sobre a vida e o mundo. É, em suma, como se exprime Zipf, uma questão de legalidade e não de moralidade que aqui está em causa. Ou como porventura será preferível dizer, decisivo é aqui o conteúdo mínimo da ideia de socialização, traduzida na prevenção da reincidência».
82. Depois de se optar por uma pena detentiva, à luz das considerações e com os critérios legais sobre-expostos, importa, pois, determinar se existe a esperança fundada de que a socialização em liberdade pode ser alcançada, a partir de razões fundadas e sérias que levem a acreditar na capacidade do delinquente para a auto-prevenção do cometimento de novos crimes, devendo negar-se a suspensão sempre que, fundadamente, seja de duvidar dessa capacidade.
83. Nos termos prevenidos no artigo 50.º, do CP, a averiguação de tal capacidade deve ser feita em concreto, através da análise da personalidade do arguido, das suas condições de vida, da conduta que manteve antes e depois do facto e das circunstâncias em que o praticou.
84. Se, dessa análise, resultar que é possível esperar que a ameaça da pena de prisão e a censura do facto são idóneos a permitir a formulação do referido juízo de confiança na capacidade do arguido para não cometer novos crimes, deverá ser decretada a suspensão da execução da pena».
No caso, afigura-se indiscutível que os crimes perpetrados, designadamente os de ofensa à integridade física e em especial o qualificado, reclamam, por veementes razões de prevenção geral, rigor punitivo.
Porém, não tendo o legislador excluído a possibilidade de suspensão de execução da pena a concretos tipos criminais, afigura-se que, sob pena de violação do princípio da legalidade, ao julgador não assiste a faculdade de automaticamente, sem avaliação do concreto circunstancialismo, excluir tal possibilidade.
Por outro lado, assente que o arguido/recorrente AA tinha, à data dos factos, 23 (vinte e três) anos de idade, é acrescidamente de ponderar que: «(…) nas sociedades modernas o acesso à idade adulta não se processa como antigamente, através de ritos de passagem, como eram o fim da escolaridade, o serviço militar ou o casamento que representavam um "virar de página" na biografia individual. O que ocorre, hoje, é uma fase de autonomia crescente face ao meio parental e de dependência crescente face à sociedade que faz dos jovens adultos uma categoria social heterogénea, alicerçada em variáveis tão diversas como são o facto de o jovem ter ou não autonomia financeira, possuir ou não uma profissão, residir em casa dos pais ou ter casa própria (…) Este período de latência social — em que o jovem escapa ao controlo escolar e familiar sem se comprometer com novas relações pessoais e profissionais — potencia a delinquência, do mesmo modo que, a partir do momento em que o jovem assume responsabilidades e começa a exercer os papéis sociais que caracterizam a idade adulta, regride a hipótese de condutas desviantes»11
«Na nossa cultura, considerada complexa, existem muitos papéis sociais e a adolescência é uma época para os experimentar, para ver qual se adapta melhor: que vocação, que ideologia, que grupo. “A principal questão do adolescente é “quem sou eu?” e, para responder, assume uma série de atitudes, em parte em benefício dos outros, que servem depois como um espelho em que ele se pode rever a si próprio.” (Erikson, 1963 citado por Gleitman, Fridlund & Reisberg, 2011, p.844). Relativamente à afirmação da personalidade, Erikson considera a adolescência como a fase mais crítica do ciclo vital. Porém, a crise da identidade pode ocorrer em qualquer fase da vida do indivíduo, manifestando-se por sentimentos incomodativos que se evidenciam por um mau estar típico de quem “não se sente bem na sua pele”. Erik Erikson afirmava que um indivíduo tinha de construir a sua personalidade durante a adolescência, porém essa construção não era feita de um mesmo modo para todos os adolescentes, visto não existir um modo padronizado e linear. Durante esta fase da vida há sempre procura de algo mais, há crises, indecisões, situações conflituosas que têm de ser resolvidas de um modo ou de outro. Como se sabe, os adolescentes não têm sempre o mesmo tipo de atitudes, ou seja, vacilam entre vários tipos de identidade (…)
De salvaguardar que uma vez construída a personalidade, isso não lhe confere um caráter rígido de acordo com a mesma, continuando o indivíduo a reorganizar, a cada momento, os elementos integrantes da sua personalidade, ajustando-a, portanto às diversas circunstâncias, do quotidiano, de acordo com as vivências experimentadas (…).
A adolescência é considerada a etapa que impulsiona o indivíduo a redefinir a sua própria identidade, ao avaliar a sua inclusão no plano espaciotemporal, tendo sempre em conta o passado, as suas identificações e conflitos, e pensando num futuro, com suas perspetivas e antecipações»12
Por outro lado, a valoração da não confissão do arguido - seja na vertente daquilo que, supostamente, evidencia da sua personalidade ou naquela atinente à ausência de arrependimento – encerra, desde logo, sérias dificuldades na compatibilização com o direito ao silêncio e com o corolário direito de prestar declarações sem estar obrigado a dizer a verdade.
Ademais, muito embora se reconheça que corresponde a uma prática judiciária que, amiúde, se mantém, estamos em crer que, bule com os fins das penas tal qual se mostram definidos no C.P. vigente.
Como já então alertava o S.T.J. no acórdão de 11 de Outubro de 2006, processo 6P2545, in .: «I - O entendimento de que a confissão e o arrependimento são condições necessárias ou adequadas para a aplicação do art.º 50.º do CP, correspondente a uma prática judiciária comum há algumas décadas, no domínio do CP86, não se coaduna com os fins das penas consagrados no CP vigente.
II - A confissão do crime, acompanhada ou não por manifestações de arrependimento, releva de modo particularmente significativo a nível da medida da pena; para efeitos de suspensão da execução da pena de prisão é apenas um dos elementos a ter em consideração conjuntamente com os outros a que alude o art.º 50.º, n.º 1, do CP, não sendo conditio sine qua non.
III - A aplicação de uma pena suspensa na sua execução não constitui um prémio ou privilégio concedido ao agente do crime que assume em julgamento a prática do mesmo, mas antes, como qualquer outra, uma forma de punição no interesse da comunidade, visando a protecção de bens jurídicos, sendo que a «reintegração do agente na sociedade», referida no art.º 40.º, n.º 1, do CP, não é senão um dos meios de realizar esse fim do direito penal (ao contribuir esta reinserção social para evitar a reincidência - prevenção especial positiva).
IV - A ausência de confissão do crime não significa necessariamente que não houve interiorização do mal do crime e que o agente não reconheceu que a sua conduta merece ser censurada; o agente não pode ser penalizado por não confessar o crime - apenas lhe fica vedado o aproveitamento de uma circunstância atenuativa.
V - Assim, admitindo-se que a protecção dos bens jurídicos se mostra suficientemente assegurada com a aplicação de uma pena de prisão suspensa na sua execução, a ausência de confissão do crime não impede a aplicação da pena de substituição, desde que se verifiquem os requisitos materiais previstos no art.º 50.º, n.º 1, do CP.
IV - A ausência de confissão do crime não significa necessariamente que não houve interiorização do mal do crime e que o agente não reconheceu que a sua conduta merece ser censurada; o agente não pode ser penalizado por não confessar o crime - apenas lhe fica vedado o aproveitamento de uma circunstância atenuativa». In casu, em face da facticidade atinente às condições pessoais que foi dada como assente, é indesmentível que estamos perante um jovem que evidencia fragilidades no percurso de vida, nomeadamente ao nível da escolaridade, da estabilidade familiar e das relações de afectividade com as figuras parentais de referência, mas que, no intermeio - no período que decorreu entre a prática dos factos, ..., e o encerramento do julgamento em primeira instância, ... - denota ter efectuado um assinável percurso de amadurecimento e de (re)inserção, ademais motu proprio, que não deve ser descurado.
Na verdade, resultou provado que: «Após a ocorrência dos factos que deram origem ao presente processo, os familiares de AA recusaram-se a recebê-lo, tendo este ficado sem lugar para viver, desempregado e sem rendimento para a sua subsistência; No contexto descrito no ponto antecedente, a mãe de um amigo de infância/adolescência – MM – ao tomar conhecimento da sua situação, acolheu-o em sua casa, tendo o Arguido vivido de junho de 2023 a janeiro de 2024. neste núcleo familiar; Numa fase inicial e até este conseguir colocação laboral, o que viria a acontecer em ..., asseguram a sua subsistência; AA exerce, desde então, a atividade de ajudante de ..., possuindo, desde ..., contrato de trabalho, com termo certo, com a empresa de panificação - NN, mostrando-se assíduo e empenhado no exercício das funções que lhe são confiadas; Os patrões asseguram o seu transporte e a alimentação no período laboral; Aufere €830,00 (oitocentos e trinta Euros) mensais, suportando €350,00 (trezentos e cinquenta Euros) mensais a título de renda pelo quarto onde reside desde janeiro do corrente ano».
Por outro lado, e tendo este sido um dos motivos invocados pelo Tribunal a quo, é ainda de ressaltar que a única condenação anteriormente sofrida por este arguido/recorrente respeita à prática de um crime de injúria e em pena de multa.
«É sabido que só se deve optar pela suspensão da pena quando existir um juízo de prognose favorável, centrado na pessoa do arguido e no seu comportamento futuro. A suspensão da pena tem um sentido pedagógico e reeducativo, sentido norteado, por sua vez, pelo desiderato de afastar, tendo em conta as concretas condições do caso, o delinquente da senda do crime.
Também importa acrescentar que esse juízo de prognose não corresponde a uma certeza, antes a uma esperança fundada de que a socialização em liberdade se consiga realizar. Trata-se pois de uma convicção subjectiva do julgador que não pode deixar de envolver um risco, derivado, para além do mais, dos elementos de facto mais ou menos limitados a que se tem acesso (Cfr. Figueiredo Dias, ob. loc. citados, pág. 344).
De resto, se é certo que às finalidades da pena subjazem, também, necessidades de protecção dos bens jurídicos, o nosso sistema penal insere-se, de forma inequívoca, na denominada perspectiva de prevenção geral de integração.
«(…) no que respeita à pena de prisão deve referir-se que é inequívoca a assumpção legislativa (com suporte constitucional) de que a pena de prisão se assume como última ratio no leque de penas aplicáveis.
Ora esta dimensão de última ratio tem implicações em todo o sistema penal tanto na escolha da pena, como na medida concreta, nomeadamente quando estão em causa a determinação do quantum da pena de prisão já escolhida como adequada, em função da culpa, ao agente. É essa imposição que decorre do artigo 70º.
Como refere Anabela Rodrigues, «a prisão – se cumprido o programa de alargamento de margens legais no âmbito das quais se pode recorrer a penas de substituição e se a tipologia destas penas, por sua vez, também for suficientemente ampla – deve ver a sua aplicação reduzida aos casos de cometimento de crimes mais graves, em que uma reacção através de outras formas de pena não poderia assegurar o efeito essencial de prevenção geral desejado», cf. «Sistema punitivo português. Principais alterações ao Código Penal Revisto», Sub Júdice, nº 11 p. 32»13
Na verdade, «No ordenamento jurídico português a suspensão da execução da pena de prisão é uma verdadeira pena (e não uma simples modalidade da execução da pena de prisão). Tendo por isso um conteúdo autónomo de censura, medido à luz de critérios gerais de determinação da pena concreta (artigo 71.º), assente em pressupostos específicos, sendo na sua categorização dogmática uma pena de substituição, isto é, uma pena que se aplica na sentença condenatória em vez da execução de uma pena principal concretamente determinada. Assenta em dois pressupostos básicos, sendo um de natureza formal (a medida concreta da pena imposta ao agente não pode ser superior a cinco anos de prisão); e outro de cariz material, constituído por um juízo de prognose favorável acerca da ressocialização do arguido em liberdade (de desnecessidade de cumprir efetivamente a pena de prisão), a realizar no momento da condenação, quando se tem de escolher e fixar a medida da pena.
Constitui, matricialmente, uma solene advertência ao condenado, que agrega à condenação e ao cumprimento dos deveres a ela ligados a ameaça da prisão efetiva (como a espada de Dâmocles pendendo sobre a sua cabeça), preconizando um efeito sobre o seu comportamento futuro, em benefício da reintegração social do agente. A sua aplicação assenta, pois, num risco prudencial sobre a personalidade do arguido, as condições da sua vida, a sua conduta anterior e posterior à prática do crime e as circunstâncias deste, concluindo-se que a simples censura do facto e a ameaça da execução da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. E constitui um poder-dever, i. e. um poder vinculado do julgador, o qual deverá decretar a suspensão da execução da pena, na modalidade e com os matizes que se afigurarem mais convenientes para a realização daquelas finalidades, sempre que se verifiquem os respetivos pressupostos, impregnando esta pena um conteúdo reeducativo e pedagógico. Ao Tribunal de julgamento exige-se, pois, a ponderação de todos os elementos disponíveis que possam sustentar a conclusão de que o facto ilícito praticado terá sido como que um acidente de percurso e de que a solene advertência, que constitui a condenação e a ameaça da prisão, terá inevitável reflexo sobre o comportamento futuro do agente, em benefício da sua reintegração social.
Fatores essenciais são: a capacidade da pena concreta apontar ao arguido o rumo certo no domínio dos valores prevalecentes na sociedade, impondo-lhe num sentido pedagógico e autorresponsabilizante o seu comportamento futuro; e a capacidade dele para sentir e compreender a ameaça da prisão, de molde a que ela exerça sobre si efeito contentor. O seu ponto fulcral é o prognóstico favorável de que o condenado encetará um modo de vida afastado da prática de crimes, assentando este num juízo de probabilidade fundada; em cujo contraponto surge o prognóstico desfavorável, o qual emergirá quando num juízo quase seguro puder predizer-se a reincidência.
(…) De acordo com o princípio vertido no artigo 40.º, § 1.º do CP, o juízo final exige que se acautelem as razões de prevenção geral positiva, isto é, que a suspensão da pena não comprometa a manutenção da confiança da comunidade na ordem jurídica e na norma penal que foi violada».14
Por assim ser, a situação em crise, sabidas as vicissitudes do desenvolvimento da personalidade a que atrás se aludiu e que, naturalmente e com intensa acuidade, ocorrem na fase da adolescência lato sensu15, estamos em crer, não reclamará a aplicação de pena de prisão efectiva.
«(…) qualquer das formas de substituição da pena clássica não deixa de envolver a inflição de um “mal”, que comporta um efeito mais ou menos penoso para quem a sofre, constituindo, nesse sentido, uma pena (…) [a]s medidas alternativas à prisão melhoram as possibilidades de reintegração na sociedade e de aceitação de valores sociais do condenado; ademais, sua execução, no seio da comunidade, incentiva a maior participação desta na administração da Justiça penal, melhorando a compreensão e aceitação das medidas não privativas de liberdade»16
Consabidamente, a prisão «(…) segrega o indivíduo do seu estatuto jurídico normal, atinge a personalidade, favorece a aprendizagem de novas técnicas criminosas e propõe valores e normas contrários aos «oficiais»17
Concluímos, pois, que inexistem, concretamente, razões de prevenção geral ou especial que obstem à suspensão de execução da pena de prisão aplicada e que a simples ameaça de execução da pena será, ainda, suficiente para afastar o arguido AA da criminalidade, «ponderando-se que uma pena de prisão, suspensa na sua execução, mediante regime de prova (…) – artigos 50.º, 51.º e 53.º, do CP – responde com adequado vigor, ao sentimento de justiça, mas também de esperança, da comunidade»18.
Não obstante, com vista ao reforço da interiorização do desvalor das condutas perpetradas e à reparação, ainda que parcial, dos assistentes/demandantes civis, impõe-se, adicionalmente, sujeitar a suspensão da execução da pena ao cumprimento do dever de indemnizar (parcialmente) os assistentes/demandantes civis, conforme art.º 51º, n.º 1, al. a) do C.P.
No acórdão recorrido foram julgados, respectivamente, procedente e parcialmente procedente, os pedidos de indemnização civil nos seguintes termos: «Julgar procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelo Assistente CC e, consequentemente, condenar os Arguidos no pagamento ao mesmo da quantia de €20.000,00 (vinte mil Euros) a título de danos não patrimoniais, acrescida da quantia de €1.050,48 (mil e cinquenta Euros e quarenta e oito cêntimos) a título de danos patrimoniais; Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelo Assistente BB, condenando os Arguidos no pagamento ao mesmo da quantia de €5.000,00 (cinco mil Euros) a título de danos não patrimoniais, e absolvendo-os do mais peticionado a tal título por este Assistente».
Tendo os factos ilícitos geradores de danos sido praticados pelos demandados, em co-autoria, todos são solidariamente responsáveis pelo pagamento das indemnizações fixadas e «nas relações entre si, presume-se que os devedores ou credores solidários comparticipam em partes iguais na dívida», como decorre conjugadamente do preceituado nos art.º 497.º, n.º 1 e 516º do C.C.
Vale tudo por dizer que, o recorrente AA é responsável presumivelmente pelo pagamento de um quarto do valor total das indemnizações fixadas.
Assim e ponderadas as condições económicas do recorrente dadas como provadas, determina-se, ainda, que a suspensão de execução da pena fique subordinada ao pagamento da quantia total de €3.256,31 (três mil, duzentos e cinquenta e seis euros e trinta e um cêntimos), equivalente a metade do valor que se presume da sua responsabilidade, no prazo máximo de 3 (três) anos, a que corresponderá um pagamento mensal, a efectuar por depósito autónomo, até ao último dia útil de cada mês, o primeiro no valor de €90,51 (noventa euros e cinquenta e um cêntimos) e os trinta e cinco seguintes no valor, cada um, de €90,48 (noventa euros e quarenta e oito cêntimos).
Termos em que se conclui pela procedência, nesta parte, do recurso interposto pelo arguido AA, revogando-se o acórdão recorrido, na parcela atinente à efectividade da pena única de 4 (quatro) anos, que se substitui pela decisão de suspensão da mesma na sua execução por igual período, mediante regime de prova, o qual deverá obrigatoriamente incluir a frequência de um programa de prevenção de violência (no mais a definir no Tribunal a quo) e com a obrigação de proceder ao pagamento da quantia total de €3.256,31 (três mil, duzentos e cinquenta e seis euros e trinta e um cêntimos), no prazo máximo de 3 (três) anos, a que corresponderá um pagamento mensal, a efectuar por depósito autónomo à ordem do Tribunal a quo, até ao último dia útil de cada mês, o primeiro no valor de €90,51 (noventa euros e cinquenta e um cêntimos) e os 35 (trinta e cinco) seguintes no valor, cada um, de €90,48 (noventa euros e quarenta e oito cêntimos)19.
III. DISPOSITIVO
Nestes termos e com tais fundamentos, decide-se:
a) Negar provimento ao recurso interposto pelo arguido DD;
b) Condenar o recorrente DD no pagamento de taxa de justiça que se fixa em 3 UC;
c) Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido AA revogando-se, na parcela atinente à efectividade da pena, o acórdão recorrido, que se substitui pela decisão de condená-lo na pena única de 4 (quatro) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, mediante regime de prova, o qual deverá obrigatoriamente incluir a frequência de um programa de prevenção de violência (no mais a definir no Tribunal a quo) e com a obrigação de proceder ao pagamento da quantia total de €3.256,31 (três mil, duzentos e cinquenta e seis euros e trinta e um cêntimos), no prazo máximo de 3 (três) anos, a que corresponderá um pagamento mensal, a efectuar por depósito autónomo, à ordem do Tribunal a quo, até ao último dia útil de cada mês, o primeiro no valor de €90,51 (noventa euros e cinquenta e um cêntimos) e os 35 (trinta e cinco) seguintes no valor, cada um, de €90,48 (noventa euros e quarenta e oito cêntimos), no mais se confirmando o decidido.
Comunique e notifique, de imediato.
Lisboa, 22 de Maio de 2025
Ana Marisa Arnêdo
Ivo Nelson Caires Rosa
Paula Cristina Bizarro
______________________________________________________
1. Derradeiramente, tendo por referência o cumprimento do triplo ónus constata-se que o mesmo não se mostra verificado, na sua plenitude, em relação a qualquer dos factos apontados como incorrectamente julgados.
2. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 9/1/2012, processo n.º 102/10.5TAANS.C1, in www.dgsi.pt.
3. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 1 de Março de 2006, JTRP00038895, in www.dgsi.pt.
4. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de de 22 de Setembro de 2015, processo n.º 2619/12.8GBABF.E1, in www.dgsi.pt.
5. Crime de furto qualificado.
6. Crime de ofensa à integridade física simples.
7. Crime de ofensa à integridade física qualificada.
8. Crime de injúria.
9. Acórdão do S.T.J. de 15/12/20212, processo n.º 5402/20.3T8LRS.S1, in www.dgsi.pt.
10. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21/5/2021, processo n.º 88/16.2PASTS.S2, in www.dgsi.pt.
11. Exposição de Motivos constante do preâmbulo do D.L. n.º 401/82, de 23 de Setembro.
12. Daniela Filipa Coelho Moreira, A PERTURBAÇÃO DO COMPORTAMENTO NA ADOLESCÊNCIA E ESTRATÉGIAS DE INTERVENÇÃO, Dissertação de Mestrado, Porto, Setembro de 2017.
13. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21/9/2011, processo n.º 310/09.1GAPVZ.P1, in www.dgsi.pt.
14. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 8/11/2022, processo n.º 25/21.2PEEVR.E1, in www.dgsi.pt., em que estava em causa crime de tráfico de estupefacientes.
15. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) a adolescência é dividida em três fases: a pré-adolescência, que vai dos 10 aos 14 anos, a adolescência em si, abrangendo dos 15 aos 19 anos, e a juventude, dos 15 aos 24 anos, concluindo o ciclo que liga a infância à adultez.
16. Anabela Miranda Rodrigues, As sanções penais clássicas e alternativas na legislação portuguesa, O direito penal em acção numa sociedade em evolução, Cadernos do CEJ, Lisboa, p. 116.
17. Anabela Miranda Rodrigues, Novo olhar sobre a questão penitenciária: estatuto jurídico do recluso e socialização, jurisdicionalização, consensualismo e prisão, p. 46.
18. Acórdão do S.T.J. de 11/2/2021, processo n.º 381/16.4GAMMC.C1.S1, in www.dgsi.pt.
19. Em face da decisão de aplicação de pena suspensa na sua execução, com regime de prova, só deverá ser equacionada a aplicação do perdão quanto a este arguido, em caso de revogação da suspensão, conforme art.º 3º, n.º 2, al. d) e n.º 3 da Lei n.º 38º-A/2023, de 2 de Agosto.