EMBARGOS DE EXECUTADO
TÍTULO EXECUTIVO
ATA DE ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
LEGITIMIDADE PASSIVA
CÔNJUGE DO CONDÓMINO DEVEDOR
FALTA DE COMUNICAÇÃO DAS DELIBERAÇÕES AOS CONDÓMINOS AUSENTES
ABUSO DO DIREITO
DESPESAS E HONORÁRIOS A ADVOGADO
Sumário

I – Constando da acta de assembleia de condóminos a identidade do proprietário/condómino devedor (por indicação do seu nome e por referência à respectiva fracção), nada obsta a que a exequibilidade dessa acta, nos termos previstos no art.º 6.º do Dec. Lei n.º 268/94, – bem como a legitimidade passiva para a execução que, com base nela, seja instaurada – se estenda ao respectivo cônjuge (ainda que o seu nome nela não figure) se, por força do regime de bens do casamento, a fracção corresponde a bem comum que, como tal, é propriedade do casal.
II – A mera constatação de que a executada/embargante não foi convocada, enquanto condómina, para as respectivas assembleias – sem que haja sequer notícia de propositura tempestiva de acção destinada à impugnação das deliberações nela tomadas – não interfere com a exequibilidade das actas que documentam tais deliberações; a força executiva que é atribuída a essas actas pelo art.º 6.º do Dec. Lei n.º 268/94 apenas podia ser afastada ou paralisada pela revogação das deliberações em assembleia, pela anulação dessas deliberações no âmbito de acção instaurada para o efeito ou, em termos provisórios, pela suspensão da respectiva execução decretada no âmbito de procedimento cautelar.
III – A falta (ou irregularidade) da comunicação das deliberações aos condóminos ausentes, nos termos previstos no n.º 9 do art.º 1432.º do CC não afecta a validade da deliberação e a exequibilidade da respectiva acta; a força executiva da acta – que é estabelecida no n.º 2 do art.º 6.º do Dec. Lei n.º 268/94 – emerge directamente da acta e da deliberação que dela consta independentemente do cumprimento de formalidades posteriores, como é o caso da comunicação aos condóminos ausentes.
IV – Inexistindo qualquer deliberação da assembleia de condóminos documentada em acta que tivesse estabelecido/fixado o valor a pagar pelo condómino a título de despesas e honorários a advogado para cobrança da quantia em divida, não há título executivo, à luz do disposto no art.º 6.º do Dec. Lei n.º 268/94, que legitime a propositura de execução para pagamento dessas quantias.
(Sumário elaborado pela Relatora)

Texto Integral

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I.

O Condomínio do Prédio Sito na Quinta ..., ..., ..., veio instaurar execução contra AA e BB, melhor identificados nos autos, pedindo o pagamento da quantia de 13.337,76€ referente a prestações de condomínio correspondentes à fracção “U” do referido prédio da qual são proprietários, juntando como título executivo as respectivas actas da assembleia de condóminos.

A Executada BB veio deduzir oposição à execução, por embargos de executado, invocando:

- a inexistência de título executivo relativamente a si por não figurar no título (actas) como devedora o que conduz à sua ilegitimidade na presente execução;

- a inexistência de título executivo relativamente a si, por omissão de convocatória para a assembleia de condomínio onde se formou o título executivo, o que configura irregularidade no procedimento das convocatórias que tem como consequência a invalidade das deliberações aí tomadas;

- a inexistência de título executivo relativamente a si, porquanto se encontrar em processo de divórcio litigioso com o co-executado e de ambos terem subscrito, em 30/07/2021, um acordo extrajudicial de partilha de bens comuns onde ficaria adjudicado, como pertencendo em exclusivo ao co executado, a fração autónoma, correspondente ao 4º andar direito, fração “U”, desconhecendo, por isso, desde essa data, o estado do imóvel e desconhecendo a existência de qualquer deliberação e a existência de qualquer dívida ao condomínio;

- a inexistência de título executivo relativamente à quota-extra aprovada para a realização de obras nas partes comuns, caso o título corresponda à acta de 17/05/2021, em virtude de a deliberação tomada nessa data ter sido anulada por deliberação da mesma assembleia de 14/07/2022;

- a iliquidez da obrigação exequenda quanto à quota extra aprovada para a realização de obras nas partes comuns, caso o título invocado corresponda à acta de 08/03/2023, na medida em que não resulta dessa deliberação qual a quota-parte referente à fração “U”, sendo certo que esse valor ainda não foi apurado;

- a inexequibilidade do título executivo quanto à quota-extra aprovada para a realização de obras nas partes comuns na medida em que, por não ter sido deliberado na assembleia datada de 08/03/2023 um prazo para o vencimento da obrigação, a obrigação não está vencida;

- a inexequibilidade do título executivo quanto às quotas mensais e fundo comum de reserva relativos aos períodos de Maio de 2021 a Fevereiro de 2023, por não constar de nenhuma das actas de condomínio a data de vencimento das quotas mensais e do fundo de reserva;

- a inexistência de título executivo relativamente à pena pecuniária, por ausência de convocatória para as assembleias de condomínio e de comunicação das actas e em virtude de as penalidades, honorários e taxa de contencioso não configurarem encargos do condomínio e não estarem abrangidas pela força executiva que a lei atribui ao título em causa;

- a inexistência de título executivo quanto à pena pecuniária, em virtude de a deliberação da assembleia de condomínios datada de 17/05/2021, que servia de suporte à aplicação da pena pecuniária, ter sido anulada por deliberação da mesma assembleia de 14/07/2022;

- a inexistência de título executivo quanto a uma parcela da pena pecuniária, concretamente no valor de € 1.150,00, na medida em que o montante deliberado a este título foi de € 750,00 e não os peticionados € 1.850,00;

- a incerteza da obrigação exequenda quanto aos juros peticionados, por ausência de indicação do inicio da contagem dos juros e da forma do cálculo.

O Exequente/Embargado contestou, impugnando alguns dos factos alegados, sustentando a existência e exequibilidade do título em relação à Embargante e dizendo, no essencial:

- Que, estando em causa um bem comum do casal e cabendo a sua administração a qualquer um dos cônjuges, não era necessário constar das actas das assembleias de condóminos os nomes de ambos os cônjuges para haver título executivo contra ambos;

- Que, além do mais, as actas fazem referência ao proprietário da fracção “U” e a propriedade dessa fracção pertence à Embargante e respectivo cônjuge;

- Que todas as convocatórias, assim como as respectivas actas, foram remetidas para a morada do casal na Suíça (morada que foi por estes comunicada ao Embargado) e que corresponde à residência actual da Embargante;

- Que, de qualquer forma, as deliberações não foram impugnadas – tendo caducado o direito de propor acção de anulação –, pelo que são válidas e eficazes em relação à Embargante;

- Que a quota-extra para a realização de obras nas partes comuns foi aprovada em assembleia, permanece válida e eficaz, está vencida (porque deveria ter sido paga até ao final do mês de abril de 2022, independentemente dos orçamentos aprovados e da adjudicação da obra) e é líquida;

- Que, até ao dia 10 de Abril de 2022 – data em que entrou em vigor a Lei n.º 8/2022 – a lei não exigia que constasse das actas de assembleia de condóminos a data de vencimento da obrigação de pagamento das quotas, mas apenas o montante das contribuições devidas ao condomínio;

- Que, no que concerne às penas pecuniárias a nova lei tem natureza interpretativa, o que significa que será aplicável mesmo às actas aprovadas antes da sua entrada em vigor, razão pela qual o título executivo abrange essas penas;

- Que essa pena não foi anulada por qualquer outra deliberação ou decisão judicial (o que foi anulado foi a adjudicação da obra a uma concreta empresa, mantendo-se válidas as deliberações de executar a obra e de pagar uma quota-extra para pagamento dessa obra, tendo sido deliberado mais adiante que as quantias da quota-extra deveriam ficar depositadas na conta do condomínio até à adjudicação a outra entidade).

Conclui pela improcedência dos embargos.

A Embargante veio aos autos impugnar os documentos juntos com a oposição.

Em 23/05/2024, foi proferido despacho que, na parte que aqui releva, tem o seguinte teor:

“Para a eventualidade de se vir a dispensar a realização da audiência prévia, e ao abrigo do disposto nos arts. 3º n.º 3 e 6º n.º 1 ambos do Código de Processo Civil, determina-se a notificação da embargante/executada para, querendo e no mesmo prazo de 10 dias, se pronunciar sobre a eventual matéria de exceção invocada na contestação, tendo em mente que no requerimento por si apresentado em 02/02/2024 se pronunciou exclusivamente sobre os documentos juntos com a contestação, assim se cumprindo cabalmente o principio do contraditório.

(...)

Tendo em vista evitar hipotéticas decisões surpresa mais se determina a notificação das partes para, querendo e em 10 dias, se pronunciarem sobre a possível prolação de decisão que conheça imediatamente do mérito da causa, com a menção de que o Tribunal pondera agir em conformidade, porquanto entender que os autos contém já os elementos documentais relevantes para conhecimento das exceções invocadas”.

As partes foram notificadas e nada disseram a propósito dessa matéria.

Na sequência desses trâmites, foi proferido despacho – em 10/07/2024 – onde se dispensou a realização de audiência prévia, ao abrigo das disposições conjugadas dos arts. 6º n.º 1, 547º, 593º n.º 1 e 597º al. c), do CPC.

De seguida – na mesma data – foi proferido despacho saneador que, além do mais, conheceu do mérito dos embargos, decidindo nos seguintes termos:

“...o Tribunal julga os presentes embargos parcialmente procedentes e, em consequência, decide:

a) Julgar aqui embargante/executada parte legítima.

b) Absolver a aqui embargante/executada dos seguintes pedidos:

i. Da quantia de € 519,36, referente a quotas mensais e fundo comum de reserva relativos ao período de Maio de 2021 a Fevereiro de 2023;

ii. Da quantia de € 444,64, referente a juros de mora vencidos até à data da instauração da execução.

c) Determinar a extinção da execução, relativamente à embargante, no que aos valores referidos em b) i. e b) ii. concerne.

d) Condenar a aqui embargante/executada nos demais pedidos contra si formulados na ação executiva, e que perfazem o valor total de € 12.373,76, acrescido de juros de mora vencidos desde o dia seguinte ao da instauração da execução principal e até integral pagamento, contados sobre o montante da quota extra deliberado na ata n.º 39, assente em 2. dos factos provados, e das quotas mensais e fundo de reserva referentes aos meses de Março de 2023 a Agosto de 2023, no valor de € 23,67 cada.

e) Determinar a prossecução da execução contra a embargante/executada para pagamento da quantia total referida em d)”.

 

Inconformada com essa decisão, a Executada/Embargante, BB, veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:

(…).

Não foi apresentada resposta ao recurso.


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II.

Questões a apreciar:

Atendendo às conclusões das alegações da Apelante – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – as questões a apreciar e decidir são as seguintes:

1. Inexequibilidade dos títulos por falta de convocação da Apelante para as assembleias onde eles se formaram (Conclusões 1.ª a 9.ª das alegações)

2. Abuso de direito (Conclusão 10.ª das alegações)

3. Inexequibilidade do titulo por falta de comunicação das deliberações dele constantes (Conclusões 11.ª a 19.ª das alegações)

4. Inexistência de título executivo relativamente à Embargante/Recorrente – ou respectiva ilegitimidade – por a mesma não figurar no título como devedora (Conclusões 20.ª a 24.ª das alegações)

5. Pretensa anulação da deliberação que servia de suporte ao estabelecimento da pena pecuniária (Conclusões 25.ª e 26.ª das alegações)

6. Inexistência de título executivo relativamente à quantia de 1.150,00€ peticionada a título de pena pecuniária (Conclusões 27.ª e 28.ª das alegações)

7. Falta de convocação da audiência prévia/violação do contraditório/ nulidade da sentença (Conclusões 29.ª e 30.ª das alegações)


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III.

Na 1.ª instância, julgou-se provada a seguinte matéria de facto:

1. O Exequente Condomínio do Prédio Sito na Quinta ..., ... instaurou em 12/08/2023 a execução principal apensa contra AA e BB para pagamento da quantia de €13.337,76, apresentando como títulos executivos as actas do condomínio n.ºs:

- 38, referente à Assembleia Geral de Condóminos realizada em 07/12/2018;

- 39, referente à Assembleia Geral de Condóminos realizada em 17/05/2021;

- 40, referente à Assembleia Geral de Condóminos realizada em 16/05/2022;

- 41, referente à Assembleia Geral de Condóminos realizada em 14/07/2022 e,

- 42, referente à Assembleia Geral de Condóminos realizada em 08/03/2023.

2. Na Assembleia Geral de Condóminos realizada em 17/05/2021 (acta n.º 39) estiveram presentes os condomínios proprietários das fracções G, H, I, J, K, O, S, T, U, V, X, Z, aí tendo sido, além do mais:

a) Aprovado, por unanimidade, o orçamento no valor total de €5.845,56, conforme quadro aí exarado, distribuído pelas fracções A a Z, na razão das respectivas permilagens, sendo de 46 a permilagem da fracção “U” e ascendendo o valor anual, referente à mesma fracção, à quantia de €268,92.

b) Proposto e aprovado, por unanimidade e após análise de todos os orçamentos apresentados pelo Sr. Administrador para a substituição do telhado e requalificação das fachadas, o orçamento da empresa “A...”, no valor de 179575,38, acrescido de IVA, conforme anexo junto, tendo-se fixado em finais de Abril de 2022 a data limite de pagamento das respectivas quotas extras, nas permilagens, prestações, valores unitários por prestação e valor total aí exarados para cada uma das fracções indicadas no quadro denominado “Quotas extras - intervenção edifício Total: 214772,15€ (com iva incluído)”, aí constando, além do mais, o seguinte “(…) Fração: U, Nome: AA; Permilagem: 46; N.º Prestações: 7; Valor Unit.: 1.411,36€; Valor Total: 9.879,52€.”, conforme documento que acompanha o requerimento executivo e que se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

c) Determinado que a obra referida em a) deveria iniciar em Junho de 2022.

d) Mandatada a administração para, em Maio de 2022, fazer um ponto de situação dos pagamentos.

e) Autorizada expressamente a administração a recorrer ao serviço de um advogado e avançar judicialmente contra os condóminos que à data não tenham liquidado as suas quotas extras, mais tendo sido deliberado que os condóminos em falta suportarão uma pena pecuniária no valor de €750,00.

3. Na Assembleia Geral de Condóminos realizada em 16/05/2022 (acta n.º 40) estiveram presentes os condomínios proprietários das fracções F,G, H, I, J, K, N, O, P, S, T, V, X e Z, aí tendo sido, além do mais, tratado, sob o “Ponto quatro”, o seguinte: “O administrador relembrou que na última assembleia os condóminos adjudicaram à empresa “A...” a substituição do telhado e a aplicação de Etic’s (capoto) nas fachadas por um valor de 214772,15€, tendo deliberado que o prazo de pagamento das respectivas quotas extras seria até final do mês de Abril de 2022. Conforme o quadro seguinte, a 30 de Abril, existia um valor em falta de 56561,29€, (…)”. A assembleia autorizou expressamente a administração a contratar os serviços do Advogado CC para instaurar a respetiva acção judicial visando o pagamento coercivo de todo o montante devido ao condomínio, acrescido de juros vencidos e vincendos à taxa legal em vigor, e ainda uma penalização de 750€ ao abrigo e para os efeitos do artigo 1434.º do Código Civil, para o que foi expressamente autorizado o Administrador de Condomínio a contratar os serviços de Advogado. (…)”, conforme documento que acompanha o requerimento executivo e que se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

4. Na Assembleia Geral de Condóminos realizada em 16/05/2022 (acta n.º 40) foi, além do mais, aprovado o orçamento no valor total de €6.174,30, conforme quadro aí exarado, distribuído pelas fracções A a Z, na razão das respectivas permilagens, sendo de 46 a permilagem da fracção “U” e ascendendo o valor anual, referente à mesma fracção, à quantia de €284,04.

5. Na Assembleia Geral de Condóminos realizada em 14/07/2022 (acta n.º 41) estiveram presentes os condóminos proprietários das fracções F, G, H, I, J, K, M, N, O, P, S, T, V, X e Z, aí tendo sido, além do mais, e sob o “Ponto Um”, tratado o seguinte: “ (…) o administrador, …, informou que até a presente data os condóminos proprietários das frações A e U continuavam a dever a totalidade da quota extra relacionada com a obra, e o condómino (…), conforme o quadro seguinte: (…).”, conforme documento que acompanha o requerimento executivo e que se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

6. No seguimento da comunicação da informação referida em 5. a assembleia:

a) Mandatou, além do mais, a administração a propor as respectivas acções judiciais contra os condóminos proprietários das fracções A e U.

b) Decidiu, por unanimidade, anular a adjudicação da obra a empresa “A..., Lda” e mandatou a administração para solicitar outros orçamentos.

c) Decidiu comunicar, por carta registada com aviso de recepção, da deliberação referida em b) à empresa “A..., Lda”.

d) Decidiu, por unanimidade, que os valores pagos relacionados com as quotas extras deveriam ficar depositados na conta do condomínio, de forma a que se possa imediatamente assinar um contrato de empreitada com a empresa que irá realizar a obra e garantir que a obra se realize na próxima primavera.

7. Na Assembleia Geral de Condóminos realizada em 08/03/2023 (acta n.º 42) estiveram presentes, ou devidamente representados, os condóminos proprietários das fracções B, C, D, F, G, H, I, J, M, O, P, S, T, U, V, X e Z, aí tendo sido, além do mais:

a) Aprovado por unanimidade, o orçamento no valor total de €6.174,30, conforme quadro aí exarado, distribuído pelas fracções A a Z, na razão das respectivas permilagens, sendo de 46 a permilagem da fracção “U” e ascendendo o valor anual, referente à mesma fracção, à quantia de €284,04 e à quantia mensal de €23,67, mais se tendo deliberado que as quotas ordinárias têm vencimento mensal, no primeiro dia do mês a que dizem respeito e a pagar até ao dia 8 desse mesmo mês.

b) Sob o “ponto quatro”, tratado o seguinte: “O administrador relembrou que, na última assembleia realizada a 14 de Julho de 2022, os condóminos decidiram anular a deliberação que adjudicava a requalificação do telhado e fachadas do edifício à empresa “A...”, por esta não ter respeitado o prazo de inicio da obra e por não ter dado qualquer justificação. (…) foram então apresentados dois orçamentos para o telhado e fachadas, e outro orçamento só para o telhado. (…).”, conforme documento que acompanha o requerimento executivo e que se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

8. No seguimento do comunicado em 7. a assembleia:

a) Aprovou, por unanimidade, o orçamento da empresa “B...”, no valor total de €182099,39.

b) Solicitou à administração a marcação de uma assembleia extraordinária se o valor do orçamento da empresa que falta ser entregue for inferior a 5%.

c) Mandatou o administrador para contactar o Eng. DD, da empresa “C...” a fim de solicitar uma proposta de para a fiscalização da obra, devendo ser selecionada a proposta mais vantajosa para o condomínio.

d) Decidiu que a despesa da fiscalização da obra a realizar será totalmente suportada com a diferença do valor do orçamento inicialmente aprovado da empresa “A...” que tinha o valor de 214772,15 e do orçamento da empresa “B...” ou da empresa da qual se aguarda orçamento. (…)

9. A Embargante/Executada BB não foi convocada para as assembleias gerais de condóminos acima referidas.

10. As actas referentes às assembleias gerais de condóminos acima referidas não foram comunicadas à Embargante/Executada BB.

11. A fracção “U” do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial, Comercial e Automóveis ... sob o n.º ...13, composto por 4º andar direito, destinado a habitação, constituído por 7 divisões, encontra-se registada a favor de BB, mediante Ap. ...8 de 1999/07/23 e Averb - Ap. ...7 de 1999/10/12.

12. AA e BB casaram entre si no dia ../../1999, com convenção antenupcial, no regime de comunhão geral de bens.

13. Corre termos junto do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu - Juízo de Família e Menores, Juiz 2, proc. n.º 4850/22...., o processo de divórcio litigioso entre AA e BB.

14. AA e BB celebraram, em 30 de Julho de 2021, um documento particular denominado de “Acordo de Partilha de Bens Comuns”, constante de fls. 13 e ss. dos autos, cujo teor se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

15. A administradora do Condómino do Prédio Sito na Quinta ..., ... convocou AA, mediante cartas registadas com AR remetidas para Via ..., ... ... - Suíça, para as assembleias gerais de condomínio acima identificadas.

16. Na Assembleia Geral de Condóminos realizada em 07/12/2018 (acta n.º 38) estiveram presentes, ou devidamente representados, os condóminos proprietários das fracções C, G, H, I, J, K, O, P, T, U, V, X e Z, aí tendo sido, além do mais, aprovado, por unanimidade dos presentes, o Regulamento do Condomínio, aí integralmente transcrito, e cujos artigos 13º e 28º têm os seguintes teores: “(…) Artigo 13º Pagamentos 1. Os pagamentos de quotizações ordinárias deverão realizar-se até ao dia 8 do mês respetivo, por meio de cheque nominativo ou em numerário e contra recibo. 2. As quotizações poderão ser efetuadas trimestralmente, se a Assembleia de Condóminos assim o decidir. 3. As despesas extraordinárias serão liquidadas no prazo de 8 dias após a sua aprovação e contra recibo. 4. No mesmo prazo devem ser pagos os recibos correspondentes aos adiantamentos pedidos para o fundo comum de reserva e para o fundo de maneio. (…). Artigo 28. Penalidades 1. A falta de pagamento de quota ou outros encargos que se prolongue por mais de 10 dias a contar da data do respetivo vencimento faz o condómino inadimplente incorrer na obrigação de pagar um acréscimo de € 750,00 (setecentos e cinquenta euros) a título de pena pecuniária, ao abrigo e para os efeitos do disposto no artigo 1434º do Código Civil. 2. Serão suportadas pelo condómino que dá causa a ação, todas as despesas judiciais e extrajudiciais em que o administrador haja de incorrer para cobrança da quantia em divida, incluindo honorários de advogado, e isto mesmo que o pagamento se verifique antes da propositura da ação.”, conforme acta junta com a contestação e cujo teor se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

17. A Executada/Embargante foi citada no âmbito da execução principal em 02/10/2023.


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IV.

Apreciemos então as questões suscitadas, esclarecendo-se que, por razões lógicas e no sentido de facilitar a exposição, faremos a apreciação das questões por ordem diversa daquela que foi adoptada pela Apelante nas suas alegações.

  

Falta de convocação da audiência prévia/violação do contraditório/ nulidade da sentença (Conclusões 29.ª e 30.ª das alegações)

Insurge-se a Apelante contra a “não convocação da Audiência Prévia”, sustentando que devem ser anulados todos os actos processuais em conformidade com o disposto no art.º 195.º nº 1, do CP Civil, após apresentação da contestação, para que seja marcada audiência prévia para os efeitos previstos nos artigos 591.º, 598.º, nº 1 e 593.º do CPC. Mais sustenta que, por via da omissão dessa audiência, foi violado o contraditório, uma vez que não lhe foi dada a possibilidade de discutir o direito da questão em apreço, razão pela qual a sentença é nula nos termos da alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º.

Antes de mais, cabe esclarecer que – em momento prévio à sentença (ainda que na mesma data) – foi proferido despacho onde expressamente se dispensou a audiência prévia, pelo que, em rigor e no que diz respeito a esta questão, é este despacho – e não a sentença – que a Apelante pretende impugnar.

Esse despacho tem o seguinte teor:

“Mostrando-se já debatidas pelas partes, nos respetivos articulados, todas as questões fácticas e jurídicas suscitadas nos autos, face à simplicidade da causa, ao seu valor, a desnecessidade de adotar qualquer tramitação excecional e a circunstância de, se convocada, se destinar apenas às finalidades previstas no art. 591º n.º 1 al. d) e 595º n.º 1 als. a) e b) do Código de Processo Civil, dispensa-se, ao abrigo das disposições conjugadas dos arts. 6º n.º 1, 547º, 593º n.º 1 e 597º al. c) do Código de Processo Civil, a realização da audiência prévia a que se reporta o mencionado art. 591º”.

Em relação a esta matéria, importa convocar o disposto no art.º 597.º do CPC onde são regulados os termos posteriores aos articulados nas acções de valor não superior a metade da alçada da Relação, uma vez que é aí que se integra a presente acção (cujo valor é inferior a metade da alçada da Relação).

Ora, aquilo que resulta dessa disposição legal é que, nessas acções, a realização da audiência prévia não tem carácter obrigatório, cabendo ao juiz definir, no âmbito do poder de gestão e adequação processual que ali lhe é concedido, os concretos actos a praticar nos termos definidos e regulados na citada disposição legal, tendo em conta a natureza e a complexidade da acção e das questões que nela se debatem e a necessidade ou adequação dos actos ao fim do processo. Ou seja, cabe ao juiz definir se a audiência prévia se apresenta (ou não) como acto necessário e adequado ao fim do processo que, nessa medida, deva ser realizado ou se, pelo contrário, ela se apresenta como acto desnecessário e dispensável.

Na situação dos autos, entendeu-se que a audiência prévia não era necessária, tendo em conta o valor da causa, a sua simplicidade, a desnecessidade de adoptar qualquer tramitação excepcional e a circunstância de as questões fácticas e jurídicas suscitadas nos autos já terem sido debatidas pelas partes nos respectivos articulados. E não encontramos razões para divergir desse entendimento, até porque a Apelante nada diz de concreto no sentido de questionar o juízo feito acerca da necessidade/desnecessidade ou adequação/desadequação da audiência prévia.

E não se diga – como diz a Apelante – que não lhe foi dada a oportunidade de discutir o direito e que, nessa medida, a sentença recorrida constitui uma decisão-surpresa que foi proferida com violação do contraditório, uma vez que, apesar de não ter sido convocada a audiência prévia (circunstância que, aliás, foi anunciada às partes por despacho de 23/05/2024 que lhes foi notificado e que não mereceu qualquer reacção da sua parte), a Embargante (Apelante) foi expressamente notificada (por determinação do referido despacho de 23/05/2024), não só para se pronunciar sobre a eventual matéria de excepção que tivesse sido invocada na contestação, mas também para se pronunciar, querendo, sobre a prolação de decisão sobre o mérito da causa  que o Tribunal tinha em mente por entender que os autos já continham os elementos necessários.

A Embargante teve, portanto, prévio conhecimento de que a audiência prévia iria ser dispensada e que iria ser proferida decisão de mérito e teve a efectiva oportunidade de se pronunciar sobre todas as questões que entendia serem relevantes para essa decisão, sem que o tivesse feito. Não é legítimo, portanto, que venha agora dizer que existiu violação do contraditório e que está em causa uma decisão-surpresa.

Improcede, portanto, esta questão.

A pretensa inexistência de título executivo relativamente à Embargante/Recorrente – ou respectiva ilegitimidade – por a mesma não figurar no título como devedora (Conclusões 20.ª a 24.ª das alegações)

Sobre esta matéria, considerou-se na decisão recorrida que, à luz do disposto no art.º 6.º do Dec. Lei n.º 268/94, a acta da assembleia de condóminos constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, independentemente do nome e do número de pessoas que ali aparece descrito, pelo que, sendo a fracção “U” propriedade da Embargante, a acta constitui contra ela título executivo, ainda que não contenha a sua identificação concreta.

Em desacordo com a decisão, sustenta a Apelante que, para valer como título executivo, a acta tem que conter o nome do devedor pois só assim fica satisfeita a exigência contida no art.º 53.º do CPC, pelo que, não constando o seu nome da acta, a mesma não constitui, contra si, título executivo.

Conforme previsto no art.º 10.º, n.º 5, do CPC, toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva, sendo também em função do título que é apurada a legitimidade das partes, à luz do disposto nos artigos 53.º e segs. do CPC.

O título – que é a base da execução – servirá, portanto, não só para apurar a legitimidade (processual) das partes, mas também para aferir a concreta obrigação a que se reporta e que, naturalmente, se delimita, não só pela identificação da prestação, mas também pela identificação dos respectivos sujeitos (o credor e o devedor).

A exequibilidade do título exige, portanto, a identificação do devedor, seja para o efeito de apurar a legitimidade (processual) para a execução, seja para o efeito de delimitar a obrigação cuja satisfação coerciva – por via da execução – é por ele legitimada. Tal legitimidade é apurada, por via de regra, com base num critério meramente formal (cfr. n.º 1 do art.º 53.º) em função do título, ou seja, o credor e o devedor serão aqueles que figurem no título nessas qualidades. Mas essa regra ou critério tem excepções e, portanto, há situações (cfr. artigos 53.º, n.º 2, 54.º e 55.º do CPC) em que a lei atribui legitimidade para a execução a pessoas que não figuram no título, mas que, a partir dele, podem ser definidas como sendo titulares do direito ou obrigação a que ele se reporta.

No caso dos autos, o título executivo corresponde às actas de assembleia de condóminos cuja força executiva é estabelecida pelo art.º 6.º do Dec. Lei n.º 268/94 de 25/10 e onde se estabelece que tais actas, desde que reúnam os requisitos enunciados no n.º 1 dessa disposição, constituem título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.

À luz do que foi dito, poder-se-á dizer que, em princípio, para ter força executiva contra determinado condómino/proprietário, a acta tem que identificar esse condómino como obrigado ao pagamento de determinadas contribuições ou sanções pecuniárias; só assim se poderá dizer que o título executivo cumpre a função que lhe é inerente, no sentido de delimitar, com a necessária segurança, a obrigação exequenda (seja pela identificação da concreta prestação, seja pela identificação dos respectivos sujeitos) e de “conferir à pretensão substantiva um grau de certeza reportado suficiente para consentir a subsequente agressão patrimonial do devedor[1] em termos que dispensem – como é suposto acontecer, ressalvando as excepções previstas na lei – qualquer outra indagação ou prova complementar no sentido de identificar a pessoa que assume a posição de devedor e em relação à qual está legitimada a instauração da execução.

Daí que o STJ já tenha considerado, em várias decisões[2], que, para que a acta da assembleia de condóminos tenha força executiva contra o condómino devedor, nos termos previstos na citada disposição legal, dela deve constar o nome do condómino/proprietário devedor, sem prejuízo de se considerar – como se considerou no Acórdão da Relação do Porto de 10/07/2024[3] – que tal exigência deve ser interpretada sem excessivo rigor e formalismo por forma a incluir o teor dos documentos anexos à acta (designadamente folhas de presenças ou mapas de prestação a liquidar), sob pena de se dificultar, de forma relevante, o funcionamento destes títulos e de contrariar a vontade do legislador.

Isso não implica, no entanto, que, constando da acta (ou documentos anexos) a identidade do condómino devedor (por indicação do seu nome e por referência à respectiva fracção) – como acontece nos presentes autos –, a exequibilidade da acta não possa estender-se ao respectivo cônjuge (ainda que o nome deste não conste da acta) quando, por força do regime de bens do casamento, ele também é proprietário da fracção por estar em causa um bem comum do casal, conforme se considerou no Acórdão da Relação de Lisboa de 08/11/2012[4]. Refira-se que, apesar de considerar (como acima se mencionou) que a exequibilidade da acta pressupõe que nela tenha sido indicado o nome do condómino/proprietário devedor, o Acórdão do STJ de 19/06/2019 (acima identificado) não deixa de admitir que a exequibilidade da acta se possa estender ao cônjuge ainda que o nome deste não conste da acta, quando afirma que a posição nele defendida “...não é colocada em causa pela posição defendida no Ac. da Relação de Lisboa, de 8/11/2012, proc. 46628/04.0YYLSB-A.L1-6 – é que aí se tratou de alargar a legitimidade para a acção executiva ao cônjuge do condómino. Como se sabe o regime civilista das dívidas dos cônjuges sempre permitiria, com facilidade, alargar a legitimidade do cônjuge”.

Na verdade, contendo a acta a identificação de um dos elementos do casal enquanto condómino devedor, está cumprida a exigência mínima para assegurar a função do título e a identificação da obrigação e respectivos sujeitos e que, sem dificuldade alguma e com base na mera constatação do casamento e regime de bens, permitirá concluir que o proprietário devedor é, em bom rigor, o casal, ou seja, não apenas a pessoa identificada na acta, mas também o respectivo cônjuge quando o bem esteja integrado na comunhão. Exigir que, nessas situações, a acta deva indicar o nome dos dois cônjuges (para o efeito de ser exequível contra ambos) constituirá – pensamos nós – um rigor e formalismo excessivo perfeitamente dispensável que, dificultando as funções da administração do condomínio, também dificulta a formação destes títulos e a concretização da vontade do legislador que, conforme se fez constar no preâmbulo do referido diploma, visou “...procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal...”, tanto mais que, existindo situações (ainda que excepcionais) em que o legislador atribui legitimidade passiva a pessoas que não estão identificadas no título (cfr. artigos 53.º, n.º 2, 54.º e 55.º), nem sequer será possível excluir a possibilidade de o legislador ter pretendido estabelecer – quando criou este título especial (actas das reuniões das assembleias de condóminos) cuja exequibilidade foi especificamente dirigida ao proprietário da fracção –, uma situação semelhante, ou seja, uma situação em que a legitimidade para a execução não tem que ser necessariamente apurada em função do nome do devedor que consta do título, mas sim em função de quem se demonstre ser o efectivo proprietário da fracção à qual se reportam os valores que se pretendem exigir.

Entendemos, portanto, em face do exposto, que nenhuma razão existirá para que, num caso como o dos autos, a exequibilidade do título não possa ser estendida ao cônjuge do condómino que surge identificado no título (acta) e que, apesar de não ter sido identificado na acta, detém (também e em comum com o cônjuge) a qualidade de proprietário que, nos termos da lei (cfr. art.º 6.º do citado Dec. Lei 268/94), confere legitimidade passiva nas execuções instauradas com base nesses títulos.

Improcede, portanto, esta questão.

A pretensa inexequibilidade dos títulos por falta de convocação da Apelante para as assembleias onde eles se formaram (Conclusões 1.ª a 9.ª das alegações)

Insurge-se também a Apelante contra a decisão recorrida no segmento em que considerou que a falta de convocatória para as assembleias (que era invocada pela Embargante) era irrelevante e inócua para a presente execução, uma vez que a força executiva da acta se impõe a todos os condóminos que a não tenham impugnado nos prazos e pela forma legal e que a Embargante não havia sequer alegado que tivesse impugnado essas deliberações, tendo já caducado o respectivo direito.

Em desacordo com essa argumentação, sustenta a Apelante que a posição do Tribunal carece de apoio legal, uma vez que “o que está em causa não são as deliberações tomadas na assembleia de condóminos, mas sim um momento temporalmente anterior a essa reunião, a saber: a convocatória da mesma” e reafirmando que a falta de convocatória de um dos cônjuges titulares de um bem comum (a fracção autónoma) viola a disposição legal prevista no artigo 1432º, nº 1 do Código Civil, tanto mais que a realização de obras de requalificação do edifício do condomínio constitui uma situação de administração extraordinária geradora de elevados encargos financeiros que carece de consentimento de ambos os cônjuges e concluindo que a falta de convocatória determina a invalidade das deliberações tomadas nessa assembleia com a consequente inexequibilidade da respectiva acta.

Salvo o devido respeito não lhe assiste razão.

Na verdade, é irrelevante apurar nos presentes autos se a Embargante foi (ou não) convocada para as assembleias de condóminos, na medida em que essa matéria apenas releva para efeitos de impugnação das deliberações tomadas nas referidas assembleias e não é isso – evidentemente – que está aqui em causa, porquanto os presentes autos não têm como objecto a impugnação das ditas deliberações.

 A falta de convocatória – em violação do disposto no art.º 1432.º do CC – corresponde, naturalmente, a vício de procedimento que afecta a validade das deliberações que aí venham a ser tomadas, determinando, conforme previsto no n.º 1 do art.º 1433.º do mesmo diploma, a respectiva anulabilidade a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado e facultando o exercício, nos prazos estabelecidos, das faculdades previstas na citada disposição legal: pedido de convocação de assembleia extraordinária para revogação das deliberações inválidas ou ineficazes, sujeição da deliberação a um centro de arbitragem e/ou propositura de acção de anulação dentro dos prazos previstos no n.º 4, além de poder ser requerida – como medida cautelar – a suspensão das deliberações (nos termos do n.º 5 do citado art.º 1433.º e art.º 383.º do CPC).

Certo é que, não se impondo aqui apreciar a validade das deliberações em questão – o que tem que ser feito em acção de anulação –, a mera alegação ou constatação da invalidade dessas deliberações (que, eventualmente, se pudesse retirar do facto constante do ponto 9) não retira exequibilidade ao título formado pelas actas das respectivas assembleias; o que retira exequibilidade ao título é a revogação ou anulação dessas deliberações ou, em termos imediatos e provisórios, a suspensão da respectiva execução.

Enquanto não forem anuladas as deliberações ou suspensa a sua execução, elas impõem-se e são vinculativas para os condóminos (como é o caso da Apelante), nos termos previstos no n.º 4 do art.º 1.º do citado Dec. Lei 268/94 (n.º 2 na redacção anterior à Lei n.º 8/2022, de 10/01), e as respectivas actas mantêm a exequibilidade que lhes é concedida pelo art.º 6.º do mesmo diploma legal.

Ora, a Embargante nem sequer alegou – muito menos demonstrou – ter instaurado qualquer acção tendo em vista a anulação daquelas deliberações ou qualquer procedimento cautelar por via do qual pretendesse obter a suspensão da respectiva execução.

Veja-se, aliás, que, conforme previsto no n.º 4 do citado art.º 1433.º, o direito de propor a acção de anulação caduca no prazo de 60 dias sobre a data da deliberação. Ora, ainda que esse prazo se contasse a partir da data em que as actas e respectivas deliberações foram comunicadas à Apelante, é certo – tendo em conta o facto constante do ponto 10 – que, pelo menos com a citação para a presente execução (em 02/10/2023), tal comunicação foi efectuada e, desde então, já decorreu (há muito) o aludido prazo de 60 dias, sem que, até ao momento, a Embargante tivesse dado conhecimento aos autos de que havia instaurado acção com vista à impugnação daquelas deliberações ou qualquer procedimento cautelar tendo em vista a sua suspensão.

Tentando pôr em causa essa conclusão e a afirmação da sentença recorrida quando referiu que a Recorrente deveria ter proposto uma “eventual ação de anulação”, dentro do prazo de 60 dias contados deste a data da citação “no âmbito da execução principal em 02/10/2023”, alude a Apelante à posição de Pires de Lima e Antunes Varela quando referem que há casos em que o vício da deliberação não é uma anulabilidade, mas sim uma nulidade que, como tal, é invocável a todo o tempo. Parece, portanto, que a Apelante pretenderá dizer (é isso que sugere, ainda que não o tenha dito expressamente) que a falta de convocatória para as assembleias determinaria a nulidade das deliberações que nelas foram tomadas e que, como tal, esse vício podia ser aqui invocado por excepção e a todo o tempo (sem dependência de qualquer prazo).

Mais uma vez, não lhe assiste razão.

É certo que Pires de Lima e Antunes Varela[5] sustentam que o citado art.º 1433.º - ao consignar a anulabilidade das deliberações – não abrange as deliberações que violem normas de interesse e ordem pública de natureza imperativa nem as que tenham por objecto assuntos que exorbitam da esfera de competência da assembleia de condóminos; estas, segundo os referidos autores, seriam nulas e, como tal, impugnáveis a todo o tempo.

Certo é, de qualquer forma, que não é esse o caso das deliberações em causa nos autos. O conteúdo dessas deliberações não viola qualquer norma de interesse e ordem pública de natureza imperativa nem versa sobre assunto que exorbite da esfera de competência da assembleia de condóminos. A eventual invalidade dessas deliberações resultaria apenas de um vício de procedimento (falta de convocatória da Apelante) e esse corresponde, indiscutivelmente, a um vício que apenas afecta e viola os interesses particulares do condómino não convocado e cuja invocação deve estar, por isso, na sua disponibilidade, correspondendo, dessa forma e nos termos previstos no citado art.º 1433.º, a uma anulabilidade que o condómino tem que invocar em determinado prazo, caso queira prevalecer-se da invalidade das deliberações.

Concluimos, portanto, em face do exposto, que, não tendo sido alegado – muito menos demonstrado – que as deliberações em causa tenham sido anuladas ou suspensas, tais deliberações impõem-se e são vinculativas para os condóminos (como é o caso da Apelante), nos termos previstos no n.º 4 do art.º 1.º do citado Dec. Lei 268/94, e as actas correspondentes mantêm a exequibilidade que lhes é concedida pelo art.º 6.º do mesmo diploma legal. Tal exequibilidade apenas podia ser afastada ou paralisada pela anulação das deliberações ou, em termos provisórios, pela suspensão da respectiva execução e não foi alegado – nem provado – que tal tivesse ocorrido; tão pouco foi alegado que tivesse sido instaurada, em momento oportuno, qualquer acção com vista à impugnação daquelas deliberações.

Nesse sentido, escreve-se também no Acórdão da Relação do Porto de 24/02/2025[6] que a preterição dessa formalidade (ou seja, a falta de convocatória para as assembleias) “...não faz improceder a execução com base na anulabilidade da deliberação uma vez que o embargante apelante não alegou (nem provou) a propositura de qualquer ação de anulação das deliberações em crise o que, julgamos, que seria absolutamente necessário para que, na oposição à execução, pudesse o executado vir obter a desvitalização do título executivo. Ou seja, tal como se afirma na decisão recorrida, não tendo o embargante/executado, alegado e provado, que propôs ação de anulação tempestiva, os argumentos esgrimidos na oposição à execução, designadamente as irregularidades de falta de assinaturas e falta de convocatória, não têm utilidade defensiva”.

 Improcede, portanto, esta questão: a mera circunstância de a Apelante não ter sido convocada para as respectivas assembleias – sem que tivesse sido alegada a propositura tempestiva de acção destinada à impugnação das deliberações nela tomadas – não interfere com a exequibilidade das actas que documentam tais deliberações.

A pretensa inexequibilidade do titulo por falta de comunicação das deliberações dele constantes (Conclusões 11.ª a 19.ª das alegações)

Sustenta a Apelante, no que toca a esta questão, que, em conformidade com o disposto no n.º 9 do art.º 1432.º do CC (n.º 6 na redacção anterior à Lei 8/2022), as deliberações devem ser comunicadas a todos os condóminos ausentes no prazo de 30 dias e por carta registada com aviso de recepção para o respectivo domicílio e que a preterição dessa formalidade – conforme se julgou provado no ponto 10 – inquina as deliberações tomadas, afectando necessariamente a exequibilidade do título.

Também no que toca a esta questão, falta razão à Apelante.

É certo que, nos termos previstos no n.º 9 do citado art.º 1432.º (n.º 6 na redacção anterior à Lei 8/2022), “As deliberações têm de ser comunicadas a todos os condóminos ausentes, no prazo de 30 dias, por carta registada com aviso de receção ou por correio eletrónico...”.

Conforme resulta do disposto nos n.ºs 8, 10 e 11 do mesmo artigo (n.ºs 5, 7 e 8 na redacção anterior à Lei 8/2022), essa comunicação visa, sobretudo, obter a aprovação (posterior) dos condóminos que estiveram ausentes para efeitos de aprovação de deliberações que careçam de ser aprovadas por unanimidade.

Certo é que, ao contrário do que sustenta a Apelante, não existe nenhuma norma legal da qual se possa extrair a conclusão de que a força executiva das actas estabelecida no art.º 6.º do Dec. Lei n.º 268/94 dependa ou esteja condicionada à comunicação das deliberações dela constantes. A força executiva emerge directamente da acta e da deliberação que dela consta independentemente do cumprimento de formalidades posteriores, como é o caso da comunicação aos condóminos ausentes.

Refira-se que, ao contrário do que sustenta a Apelante, o disposto no citado art.º 1432.º não legitima a conclusão de que toda e qualquer deliberação careça de aprovação posterior dos condóminos ausentes (na sequência da comunicação que lhes deve ser efectuada) e que essa aprovação é necessária para que a deliberação se torne eficaz. Na verdade, conforme resulta do disposto no n.º 8 da citada disposição legal, as deliberações que carecem de aprovação dos sócios ausentes (a obter nos termos previstos nos n.ºs 10 a 12 e na sequência da comunicação referida no n.º 9) são apenas as deliberações que carecem de ser aprovadas por unanimidade. Não era esse, no entanto, o caso das deliberações aqui em causa; conforme previsto no nº 5 do art.º 1432.º as deliberações são tomadas, salvo disposição especial, por maioria dos votos representativos do capital investido e, no caso, não existia qualquer disposição especial que exigisse a unanimidade.

A falta da referida comunicação no prazo legal será relevante para efeitos de contagem do prazo para o pedido de convocação de assembleia extraordinária com vista à revogação de deliberações inválidas ou ineficazes nos termos previstos no n.º 2 do art.º 1433.º do CC (uma vez que, no que toca aos condóminos que estiveram ausentes, o prazo é contado a partir da comunicação da deliberação) e poderá, eventualmente, relevar para efeitos de contagem do prazo para efeitos de propositura da acção de anulação, dilatando para mais tarde o início o prazo para esse efeito (o que, em todo o caso, não é líquido, uma vez que há quem entenda que, mesmo em relação aos condóminos ausentes, o prazo para requerer a anulação conta-se a partir da data da deliberação e não da respectiva comunicação[7]). Certo é que tal omissão não afecta a validade da deliberação[8] e a exequibilidade do título (acta)[9]; esta (a exequibilidade) apenas é afastada por via da revogação da deliberação em assembleia ou por via de sua anulação em acção que, para o efeito, seja instaurada.

Improcede, portanto, esta questão.

A pretensa anulação da deliberação que servia de suporte ao estabelecimento da pena pecuniária (Conclusões 25.ª e 26.ª das alegações)

Sustenta a Apelante, no que toca a esta matéria, que, tendo sido anulada a deliberação que adjudicava a requalificação do telhado e fachadas do edifício à empresa “A..., Lda.” (por esta não ter respeitado o prazo de início da obra e por não ter dado qualquer justificação) e que servia de suporte ao estabelecimento da pena pecuniária, esta pena deixa de ter fundamento, deixando, por isso, de subsistir.

Resultando efectivamente da matéria de facto provada que a adjudicação da obra de substituição do telhado e requalificação das fachadas do edifício à empresa “A..., Lda.” que havia sido deliberada na assembleia de 17/05/2021 (obra em função da qual foi deliberada na mesma assembleia a quota extra a pagar pelos condóminos até Abril de 2022 e o estabelecimento de pena pecuniária no valor de 750,00€ para os condóminos que não pagassem) veio a ser anulada por deliberação tomada em assembleia de 14/07/2022, tal não significa, ao contrário do que pretende a Apelante, que tivesse ficado sem fundamento e deixasse de ser devida a pena pecuniária que havia sido estabelecida.

Na verdade, o que resulta da acta de 14/07/2022 (cfr. pontos 5 e 6 da matéria de facto) é que apenas foi anulada a adjudicação da obra à concreta empresa que havia sido designada, sem qualquer intenção ou vontade – expressa ou implícita – manifestada em deliberação de anular (também) a realização da obra e alterar as quotas extra que, para o efeito, haviam sido estabelecidas, bem como a data do respectivo pagamento e a pena que havia sido estabelecida para o incumprimento. Refira-se, desde logo, que a deliberação de anular a adjudicação da obra àquela empresa foi acompanhada de deliberação no sentido de mandatar a administração “para solicitar outros orçamentos”, sinal evidente de que se pretendia continuar com a realização da obra através de outra empresa a contratar. Por outro lado, ainda na mesma assembleia, foi deliberado que “os valores pagos relacionados com as quotas extras deveriam ficar depositados na conta do condomínio, de forma a que se possa imediatamente assinar um contrato de empreitada com a empresa que irá realizar a obra e garantir que a obra se realize na próxima primavera”, sinal evidente de que não se pretendia eliminar – ou sequer alterar – a deliberação anterior que havia fixado essas quotas que, segundo o deliberado, continuariam a estar destinadas à obra em causa logo que fosse assinado um contrato de empreitada com outra empresa.  E, ainda na mesma assembleia, foi deliberado – na sequência das deliberações anteriores – mandatar a administração para propor as acções judiciais contra os condóminos das fracções A e U, ou seja, os condóminos que continuavam a dever a totalidade da referida quota extra, sinal evidente de que a assembleia não pretendeu alterar nem as quotas extra que haviam sido estabelecidas, nem a data que havia sido estabelecida para o pagamento, nem a pena pecuniária que havia sido estabelecida para o respectivo incumprimento.

Não há, portanto, qualquer fundamento para concluir que o estabelecimento da pena pecuniária tivesse deixado de ter fundamento; a assembleia de condóminos nada deliberou nesse sentido e o que deliberou foi em sentido oposto, ou seja, no sentido de que as quotas extra e a pena estabelecida para o incumprimento se mantinham e já estavam vencidas, razão pela qual mandatou a administração para propor as acções judiciais em relação aos condóminos que estavam em falta.

Improcede também esta questão.

Pretensa inexistência de título executivo relativamente à quantia de 1.150,00€ peticionada a título de pena pecuniária (Conclusões 27.ª e 28.ª das alegações)

Sobre esta matéria, diz a Apelante que o montante que ficou deliberado para efeitos de pena pecuniária foi ali estabelecido em 750,00 € e não nos, muito inflacionados, 1.850,00€ (considerado pela sentença recorrida), sendo que a diferença entre esses valores (1.100,00€ e não 1.150,00€ como diz a Apelante) não tem fundamento legal, nem título executivo que o suporte.

No sentido de enquadrar a questão, importa esclarecer que o Exequente havia pedido – no requerimento executivo e sem outras explicações – a quantia de 1.845,00€ a título de pena pecuniária, tendo vindo a ser esclarecido na contestação aos embargos que a parte da dessa quantia que excedia o valor de 750,00€ se reportava a despesas judiciais e extrajudiciais para cobrança da quantia em dívida em conformidade como o artigo 28º do Regulamento de Condomínio anexo à acta n.º 38 (que foi junta com a contestação).

Ora, neste ponto, pensamos assistir razão à Apelante.

Não está aqui em causa a eventual responsabilidade dos Executados pelo pagamento das referidas despesas em conformidade com o previsto no Regulamento do Condomínio (cfr. ponto 16 da matéria de facto).

O que está aqui em causa é saber se existe (ou não) título executivo que suporte essa obrigação e tendo em conta que – como sabemos – a execução pressupõe necessariamente a existência de um título executivo.

Ora, conforme resulta do disposto no art.º 6.º do citado Dec. Lei o documento a que se atribui a qualidade de título executivo corresponde à acta da reunião de assembleia de condóminos que tenha deliberado o montante das contribuições a pagar ao condomínio e mencione o montante anual a pagar por cada condómino, considerando-se ainda abrangidos pelo título – conforme ficou expresso na lei a partir da entrada em vigor da Lei n.º 8/2022 (o que até aí era controvertido) – os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante, bem como as sanções pecuniárias, desde que aprovadas em assembleia de condóminos ou previstas no regulamento do condomínio.

Não obstante esteja prevista, no regulamento do condomínio, a responsabilidade do condómino que dá causa à acção pelas “despesas judiciais e extrajudiciais em que o administrador haja de incorrer para cobrança da quantia em divida, incluindo honorários de advogado”, isso não é qualificável como sanção pecuniária que, sem mais, se possa considerar incluída no título executivo. As penas pecuniárias visam sancionar os condóminos pelo incumprimento dos seus deveres, funcionando também previamente como forma de os compelir e pressionar ao cumprimento. Não é essa, contudo, a finalidade da responsabilização do condómino pelas despesas (judiciais e extrajudiciais) e honorários de advogado a que dá causa com o seu incumprimento; o que aqui está em causa não é uma sanção pelo incumprimento (como acontece na pena/sanção pecuniária), mas sim a reparação de um prejuízo do condomínio que é provocado pelo condómino incumpridor. Tais despesas e honorários não correspondem, portanto, a pena pecuniária e, portanto, a sua inclusão no título apenas poderia resultar do n.º 1 do citado art.º 6.º.

A inclusão desses valores no título executivo a que se reporta o citado art.º 6.º tem sido controverso: há quem entenda que eles se incluem no âmbito de previsão do citado art.º 6º e que, por isso, ficam abrangidos pela força executiva da acta da assembleia[10] e há quem entenda que não[11].

De qualquer forma e ainda que se entendesse que tais valores podem (em teoria) ser abrangidos pela força executiva da acta da assembleia de condóminos, para que tal acontecesse era necessário, no mínimo, que tivesse existido uma deliberação da assembleia que, conforme previsto no n.º 1 do citado art.º 6.º, tivesse estabelecido/fixado o valor dessas despesas e honorários a pagar pelo condómino.

E é isso que não acontece nos autos, sendo certo que nenhuma das actas juntas aos autos contém qualquer deliberação sobre essa matéria e que fixe, designadamente, o valor dessas despesas e honorários. As actas contêm deliberação sobre a aplicação da pena pecuniária no valor de 750,00€ aos condóminos incumpridores e deliberação a mandatar a administração para propor acções judiciais contra, designadamente, o condómino proprietário da fracção “U” (os Executados), mas não fazem qualquer alusão à responsabilidade pelo pagamento dos honorários e despesas e não fixam, a esse propósito, qualquer valor.

Acrescente-se que, além de não existir qualquer acta ou deliberação nesse sentido, nem sequer se julgou provado (nem consta dos autos qualquer prova) quais as concretas despesas que estão em causa e qual o seu valor.

Concluímos, portanto, em face do exposto, que, no que diz respeito a essa quantia, não existe efectivamente título executivo, o que conduz, nessa parte, à procedência do recurso e à procedência dos embargos, importando clarificar que a quantia em causa ascende, em rigor, ao valor de 1.095,00€: o Exequente havia pedido o valor de 1.845,00€ a título de pena pecuniária (aí englobando a pena pecuniária e os valores que temos estado a analisar), pelo que, deduzindo o valor de 750,00€ da pena pecuniária (para a qual existe título executivo), o remanescente – que não encontra apoio em qualquer título executivo – é de 1.095,00€.

Abuso de direito (Conclusão 10.ª das alegações)

Diz a Apelante – na conclusão 10.ª das suas alegações – que o comportamento da Administradora de Condomínio viola frontalmente os princípios da boa-fé e da tutela da confiança, que consubstancia uma situação de abuso de direito – art.º 334º do Cód. Civil.

Procurando no corpo das alegações, os concretos argumentos da Apelante para legitimar ou justificar esse pretenso abuso de direito, aí se afirma o seguinte:

“Sempre se dirá que a não convocação da embargante para as assembleias e o não notificar as atas à embargante, coartando-lhe o seu direito de defesa e de resposta, constitui uma situação flagrante de abuso de direito, previsto no artigo 334º que é de conhecimento oficioso e que aqui se deixa alegado.

Na medida em o embargado / exequente excede, manifestamente, os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico ao propor uma execução contra a ora embargante sem lhe permitir o correto e atempado contraditório e gerando um amontoar de dívidas sem cumprir com a tramitação legalmente exigida.”.

É certo, portanto, que, na perspectiva da Apelante, o Exequente actua com abuso de direito porque instaurou a presente execução sem a ter convocado para as assembleias e sem lhe ter comunicado as actas e respectivas deliberações, coartando-lhe o seu direito de defesa e de resposta.

Não vislumbramos razões para concluir, em face dessas circunstâncias, que o Exequente tenha actuado com abuso de direito que, como é sabido e resulta do art.º 334.º pressupõe que o exercício do direito exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.

Na verdade, a falta de convocação para a assembleia e a falta de comunicação das deliberações tomadas já foram apreciadas, considerando-se que essas circunstâncias não interferiam com a exequibilidade do título, não obstando, portanto, ao exercício do direito de instaurar a execução para o efeito de exigir as quantias nele incluídas e não resultou provada – não foi sequer alegada – qualquer outra circunstância ou facto concretos que, de algum modo, permitissem concluir que, ao exercer esse direito, o Exequente tivesse excedido, de forma manifesta, quaisquer limites que lhe fossem impostos pela boa fé,  pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.

Improcede, portanto, esta questão.

Analisadas todas as questões suscitadas pela Apelante, impõe-se concluir pela procedência do recurso e dos embargos de executado no que toca à quantia de 1.095,00€ (que havia sido peticionada a título de pena pecuniária, mas respeitante a despesas e honorários com a cobrança da quantia em dívida). Em tudo o mais, o recurso improcede.


******

SUMÁRIO (elaborado em obediência ao disposto no art. 663º, nº 7 do Código de Processo Civil, na sua actual redacção):

(…).


/////

V.
Em face do exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso e em consequência:
Ø Julgam-se procedentes os embargos em relação à quantia de 1.095,00€ (que havia sido peticionada a título de pena pecuniária, mas respeitante a despesas e honorários com a cobrança da quantia em dívida) com a consequente extinção da execução no que toca a essa quantia e revogando-se, nesse segmento, a sentença recorrida;
Ø Confirma-se, em tudo o mais, a sentença recorrida.

Custas a cargo da Apelante e Apelado na proporção dos respectivos decaimentos.
Notifique.

                              Coimbra,

                                             (Maria Catarina Gonçalves)

                                                  (Maria João Areias)

                                                   (Chandra Gracias)


[1] Cfr. José Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1.º, 2.ª edição, pág. 88.
[2] Cfr. Acórdãos do STJ de 10/07/2008 (processo n.º 08A1057), de 19/06/2019 (processo n.º 5859/08.0YYLSB-A.L2.S1) e de 17/10/2024 (processo n.º 5915/13.3YYPRT-C.P1.S1), todos disponíveis em https://www.dgsi.pt.
[3] Proferido no processo n.º 662/10.0TYVNG-S.P1, disponível em https://www.dgsi.pt.
[4] Proferido no processo n.º 46628/04.0YYLSB-A.L1-6, disponível em https://www.dgsi.pt.
[5] Código Civil Anotado, Vol. III, 2.ª edição revista e actualizada, págs. 447 e 448.
[6] Proferido no processo n.º 3320/23.2T8LOU-A.P1, disponível em https://www.dgsi.pt.
[7] Cfr. designadamente os Acórdãos do STJ de 03/10/2002 (processo n.º 02B1816), de 19/06/2019 (processo n.º 3125/17.0T8VIS.C1.S1) e de 11/11/2021 (processo n.º 23757/19.0T8PRT-A.L1.S1) e os Acórdãos da Relação do Porto de 16/06/2020 (processo n.º 10988/19.2T8PRT-A.P1), de 04/12/2017 (processo n.º 26113/15.6T8PRT-A.P1), de 10/10/2022 (processo n.º 1615/19.0T8STS.P2) e de 21/03/2024 (processo n.º 431/22.5T8VCD.P1), todos disponíveis em https://www.dgsi.pt.
[8] Cfr. a propósito o Acórdão da Relação do Porto de 16/06/2020 (processo n.º 10988/19.2T8PRT-A.P1)
[9] Cfr. a propósito, o Acórdão da Relação do Porto de 04/12/2017 (processo n.º 26113/15.6T8PRT-A.P1)
[10] Veja-se, designadamente, o Acórdão da Relação de Guimarães de 17/10/2024 (processo n.º 4032/23.2T8VNF-A.G1), disponível em https://www.dgsi.pt.
[11] Cfr. Acórdãos da Relação de Guimarães de 23/01/2025 (processo n.º 442/22.0T8MNC-B.G1) e de 12/09/2024 (processo n.º 4052/23.7T8VNF-A.G1), disponíveis em https://www.dgsi.pt.