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INVENTÁRIO
PARTILHA
ADJUDICAÇÃO
CRÉDITO DA HERANÇA
Sumário
- Uma partilha justa e igualitária, com respeito pelos direitos de todos os interessados, constitui objetivo primordial do processo de inventário.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
Relatório:
Os presentes autos de inventário foram instaurados por AA, para partilha dos bens deixados por morte de seus pais BB, falecido em ../../2017 e CC, falecida em ../../2020.
Foi nomeada cabeça de casal DD.
A cabeça de casal apresentou relação de bens, da qual consta, entre outras verbas, na parte sob epígrafe “Relação de Bens – Créditos da Herança sobre Herdeiros – Verba 1 – a) sobre o herdeiro EE, Empréstimo feito ao Herdeiro EE, no montante de 10.000,00€ (dez mil euros) feito pelos inventariados, no ano de 2010. Ao qual se atribui igual valor de 10.000,00€ (dez mil euros)”
O interessado EE, aqui recorrente, deduziu reclamação à relação de bens, sustentando a inexistência de qualquer crédito por parte dos inventariados e, consequentemente, pedindo a exclusão dessa verba.
Em 26/05/2022, foi proferido despacho sobre o incidente de reclamação à relação de bens, que na parte que aqui interessa, decidiu o seguinte:
“(…) quanto à reclamação à relação de bens apresentada pelo interessado EE, não tendo o mesmo demonstrado factos que levassem à exclusão da verba em causa, deverá a mesma manter-se relacionada”.
O processo seguiu ulteriores termos, tendo sido proferido despacho determinativo da partilha, datado de 27/10/ 2022, do qual consta o seguinte:
“Modo como deve organizar-se a partilha
Soma-se o valor dos bens relacionados (tendo-se em conta o eventual aumento proveniente das licitações ou alteração de valores em sede de conferência de interessados) e o resultado divide-se em duas partes iguais. Uma metade constitui ameação do cônjuge sobrevivo e a outra metade constitui a meação do inventariado. Herança/Meação do inventariado BB Divide-se a meação do inventariado em três partes iguais, para se encontrar a quota disponível (1/3). Na quota disponível imputam-se os legados feitos pelo inventariado (testamento e doação). O eventual remanescente acrescerá à quota indisponível. As restantes duas partes, que constituem a quota indisponível (2/3) dividem-se em quatro partes iguais, sendo 1/4 a quota do cônjuge sobrevivo, CC, e as restantes três partes subdivididas por sete, por serem sete os filhos. Herança/Meação da inventariada CC Soma-se a sua meação com o quinhão hereditário que lhe pertence na herança do inventariado BB, obtendo-se o total a partilhar. O total divide-se em três partes iguais, para se encontrar a quota disponível (1/3). Na quota disponível imputam-se os legados feitos pela inventariada (testamento e doação). O eventual remanescente acrescerá à quota indisponível. As restantes duas partes, que constituem a quota indisponível (2/3) dividem-se em sete partes iguais, por serem sete os filhos.”.
Em 27/10/2023, foi realizada conferência de interessados, constando da respetiva ata, na parte com interesse para o caso em apreço, o seguinte: “Seguidamente, por todos os interessados foi dito estarem acordados, nos seguintes termos: 1º - Adjudicar a Verba Um (Bens Doados) aos interessados FF e DD, pelo valor de € 47.600,00 (quarenta e sete mil e seiscentos euros) 2º - Adjudicar a Verba UM (Bens Legados) à interessada DD pelo valor de € 13.000,00 (treze mil euros). 3º - Adjudicar a Verba Dois (Bens Legados), à interessada DD pelo valor de € 19.250,00 (dezanove mil duzentos e cinquenta euros) 4º - Adjudicar a Verba 6 (Objectos em ouro Legados) à Legatária GG pelo valor de € 500,00 (quinhentos euros) 5ª – Adjudicar a Verba 7 (Objectos Legados) à interessada DD, pelo valor de € 500,00, (quinhentos euros). Quanto às restantes verbas, não adjudicadas, acordam todos os interessados, neste momento, que fossem licitadas e que se encontram em condições para o efeito, pelo que se passou de imediato a licitações, nos termos do disposto no artigo 1113º do C.P.C.. Pelos Ilustres Mandatários, foi pedida a palavra e no uso dela foi dito que, atendendo a que as verbas nºs 3 e 4 constituem um prédio autónomo, requer-se que seja licitado em conjunto, tendo como base a soma dos valores da avaliação (€13.000,00 + €19.250,00 = € 32.250,00). Mais foi dito, que todos os interessados estão de acordo em reduzir o valor da verba 5 (Lote de bens móveis), para € 250.00 (duzentos e cinquenta euros) Iniciada a licitação, obteve-se o seguinte resultado: Verba UM foi licitada pela interessada DD pelo valor € 1.500,00 (mil e quinhentos euros). Verba 2 foi licitada pela interessada DD pelo valor € 7.250,00 (sete mil duzentos e cinquenta euros). Verbas 3 e 4 foram licitadas pela interessada DD pelo valor de € 41.000,00 (quarenta e um mil euros). Verba 5 foi licitada pelo interessado FF pelo valor de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros).”
Seguidamente, pela Mma. Juíza foi proferido o seguinte despacho: “Concluída a conferência de interessados, notifique os interessados nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 1120º, nº 1 do C.P.C..”.
Em 05/02/2024, foi elaborado pela secretaria judicial o mapa da partilha, através do qual foi adjudicada ao interessado, aqui recorrente, a totalidade da mencionada verba 1 (crédito da herança) no valor de 10.000,00€.
Em 29.02.2024, foi deduzida pelo recorrente reclamação contra o mapa da partilha com fundamento no facto de “não decorrer, quer do teor do despacho com ref. ...27, quer do resultado da conferência de interessados realizada, qualquer determinação quanto à forma de adjudicação desse activo da herança (…) Pelo que se discorda da adjudicação, por inteiro, da verba 1 ao aqui reclamante, conforme resulta do mapa de partilha entretanto elaborado.”.
Sobre essa reclamação incidiu o despacho datado de 13/05/2024, com o seguinte teor: “Reclamação – referência ...76 Veio o interessado EE apresentar reclamação contra ao mapa de partilha pelo requerimento apresentado com a referência ...76 e pelos motivos que aí constam. Invocou o disposto no artigo 1117º do C.P.C., manifestando a sua discordância com a adjudicação do crédito no valor de € 10.000,00 (dez mil euros) ao reclamante. Os interessados AA, HH, II e JJ vieram pronunciar-se quanto à reclamação apresentada, dizendo que não assiste qualquer razão ao reclamante, atendendo a que não efectuou qualquer reclamação sobre a referida quantia na conferência de interessados, sendo o requerido totalmente extemporâneo e sem fundamento. A cabeça de casal DD veio pronunciar-se quanto à reclamação apresentada, dizendo não assistir razão ao interessado reclamante, porquanto este não recorreu da decisão proferida no incidente de reclamação à relação de bens. Além do mais, o requerimento é extemporâneo. O interessado FF veio pronunciar-se quanto à reclamação apresentada, dizendo não assistir razão ao interessado reclamante, atendendo a que não efectuou qualquer reclamação sobre a referida quantia na conferência de interessados, sendo o requerido extemporâneo e sem fundamento. Cumpre apreciar e decidir.
Nos termos do artigo 1120º do Código de Processo Civil: “1 - Concluídas as diligências reguladas nas secções anteriores, procede-se à notificação dos interessados e do Ministério Público, quando este tenha intervenção principal, para, no prazo de 20 dias, apresentarem proposta de mapa da partilha, da qual constem os direitos de cada interessado e o preenchimento dos seus quinhões, de acordo com o despacho determinativo da partilha e os elementos resultantes da conferência de interessados. 2 - Decorridos os prazos para a apresentação das propostas de mapa de partilha, o juiz profere despacho a solucionar as divergências que existam entre as várias propostas de mapa de partilha e determina a elaboração do mapa de partilha pela secretaria, em conformidade com o decidido. 3 - Para a formação do mapa determina-se, em primeiro lugar, a importância total do activo, somando-se os valores de cada espécie de bens conforme as avaliações e licitações efetuadas e deduzindo-se as dívidas, legados e encargos que devam ser abatidos, após o que se determina o montante da quota de cada interessado e a parte que lhe cabe em cada espécie de bens, e por fim faz-se o preenchimento de cada quota com referência às verbas ou lotes dos bens relacionados. 4 - No preenchimento dos quinhões observam-se as seguintes regras: a) Os bens licitados são adjudicados ao respetivo licitante e os bens doados ou legados são adjudicados ao respetivo donatário ou legatário; b) A quota dos não conferentes ou não licitantes é integrada de acordo com o disposto no artigo 1117.º 5 - Os interessados são notificados do mapa de partilha elaborado, podendo apresentar reclamações contra o mesmo.”.
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Compulsados os autos, verifica-se que, além do mais, o interessado reclamante apresentou anteriormente reclamação quanto à relação de bens apresentada nos autos pela cabeça de casal, em concreto, quanto à verba nº 1, a) (crédito da herança sobre herdeiros). Foi proferida decisão no âmbito do incidente de reclamação à relação de bens suscitado, nos termos constantes de fls. 98 e seguintes dos autos (referência ...70), nos termos da qual, além do mais, julgou-se improcedente a reclamação apresentada pelo interessado EE, mantendo-se relacionada a verba nº 1, a). Não foi interposto recurso da aludida decisão, tendo a mesma transitado em julgado. Foi realizada a conferência de interessados, com o resultado constante da acta respectiva (fls. 169 e seguintes dos autos – acordo parcial na adjudicação de verbas e licitações sobre as restantes verbas). Assim sendo, entende-se que a norma invocada não tem aplicação na situação em apreço (o tribunal proferiu decisão definitiva no âmbito do incidente de reclamação à relação de bens), pelo que o ora requerido carece de fundamento legal e é extemporâneo. Nestes termos, por se entender não assistir razão ao interessado reclamante, indefere-se a reclamação apresentada pelo interessado EE. Notifique.”
Em 06/01/2025, foi proferida sentença homologatória da partilha, com o seguinte teor:
“AA veio requerer inventário para partilha dos bens por óbito de seus pais, BB, falecido no dia ../../2017, e CC, falecida no dia ../../2020. Foi nomeada cabeça de casal DD, tendo prestado compromisso de honra e as declarações. Foi junta ao processo a relação de bens respectiva. Foi proferido despacho sobre o modo de organização da partilha. Realizou-se a conferência de interessados. Foi apresentada proposta de mapa de partilha. Foi proferido o despacho a que alude o artigo 1120º, nº 2 do C.P.C. e elaborou-se o respectivo mapa da partilha (referência ...09). O interessado EE apresentou reclamação. As interessadas DD e GG apresentaram reclamação. Foi proferido despacho a apreciar as reclamações apresentadas, tendo as mesmas sido indeferidas.
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Ao abrigo do disposto no artigo 1122º, nº 1 do Código de Processo Civil, homologo, por sentença, a partilha constante do mapa com a referência ...09 e, consequentemente, adjudico aos interessados as verbas que integram os respectivos quinhões. Custas nos termos do artigo 1130º do Código de Processo Civil. Registe e notifique.”
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O Interessado EE, veio recorrer do despacho de 13/5/24 e da sentença homologatória da partilha, tendo concluído o seu recurso da seguinte forma:
1. Do teor do mapa da partilha, elaborado em 05.02.2024, resulta a adjudicação ao interessado, aqui recorrente, da totalidade da verba 1, consubstanciada num crédito da herança, no valor de 10.000,00€, o qual foi julgado manter na relação de bens, por despacho datado de 26.05.2022.
2. O recorrente interpôs reclamação contra o mapa da partilha, em 29.02.2024, a qual foi indeferida pelo despacho, datado de 13.05.2024, com ref. CITIUS 52058138.
3. Em 06.01.2025, foi proferida sentença homologatória da partilha formalizada no mapa da partilha.
4. Entende o recorrente que o despacho, datado de 13.05.2024, com ref. CITIUS 52058138, e a sentença homologatória da partilha, datada de 06.01.2025, através dos quais, respetivamente, se indeferiu a reclamação contra o mapa da partilha e decidiu adjudicar o identificado crédito da herança integralmente ao recorrente, não está de acordo, quer com o despacho determinativo da forma da partilha, quer com o resultante da conferência de interessados realizada, nem encontra fundamento em qualquer despacho judicial exarado pelo Tribunal a quo ou na lei vigente, nomeadamente os artigos 1120.º, n. º1, n. 4, e 1117.º, n.º 2, al. b), todos do Código de Processo Civil.
5. Pelo que, o Tribunal a quo, com o devido respeito, ao decidir como decidiu, violou o os artigos 1120.º, n. º1, e n. 4, e 1117.º, n.º 2, al. b), todos do Código de Processo Civil.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogado deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença homologatória de partilha, datada de 06.01.2025, bem como o despacho, datado de 13.05.2024, com ref. CITIUS 52058138, e consequentemente, determinando-se a reformulação do mapa de partilha de acordo com a lei invocada e em conformidade com o despacho determinativo da forma da partilha e o resultante da conferência de interessados realizada nesses autos de inventário.
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Questão a decidir:
- Verificar se a verba nº 1 da relação de bens, na rúbrica “Créditos da Herança sobre Herdeiros” deve ser adjudicada na totalidade ao Interessado/Recorrente.
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Nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.
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Os factos a ter em conta na presente decisão são os que constam do relatório desta decisão.
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Em 1 de janeiro de 2020 entrou em vigor a Lei nº 117/2019 de 13 de setembro que alterou o regime do processo de inventário.
Este regime é aplicável aos presentes autos uma vez que o presente processo de inventário deu entrada em tribunal, após a sua entrada em vigor.
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Tal como nos dizem Miguel Teixeira de Sousa, Carlos Lopes do Rego, Abrantes Geraldes e Pedro Pinheiro Torres (in O Novo Regime do Processo de Inventário e Outras Alterações na Legislação Processual Civil, Almedina, pág. 8) “O novo modelo do processo de inventário assenta em fases processuais relativamente estanques e consagra um princípio de concentração dado que fixa para cada ato das partes um momento próprio para a sua realização.”
Explicam estes autores que, no modelo ora instituído, o processo de inventário para fazer cessar a comunhão hereditária, comporta as seguintes fases:
- Uma fase dos articulados na qual as partes, para além de requererem instauração do processo, têm de suscitar e discutir todas as questões que condicionam a partilha, alegando e sustentando quem são os interessados e respetivas quotas ideais e qual o acervo patrimonial, ativo e passivo, que constitui objeto da sucessão. Esta fase abrange a subfase inicial (arts. 1097º a 1002º) e a subfase da oposição (arts. 1104º a 1107º).
- A fase de saneamento, na qual o juiz, após a realização das diligências necessárias – entre as quais se inclui a possibilidade de realizar uma audiência prévia – deve decidir, em princípio, todas as questões ou matérias litigiosas que condicionam a partilha e a definição do património a partilhar e também proferir despacho sobre a forma da partilha.
- A fase da partilha onde ocorrerá a conferência de interessados na qual se devem realizar todas as diligências que culminam na realização da partilha.
No caso, após a elaboração do mapa da partilha, o Interessado, ora Recorrente veio reclamar do mesmo, discordando da adjudicação da totalidade do crédito no valor de € 10.000,00 (dez mil euros) ao reclamante.
No despacho de 13/5/24, também objeto deste recurso, a Srª Juiza, resumidamente, vem dizer que, tendo a inclusão da referida verba sido objeto de reclamação relativamente à sua inclusão na relação de bens, reclamação essa apresentada por este interessado e, tendo sido decido que deveria manter-se relacionada, a reclamação em análise deve ser indeferida.
Ora, salvo o devido respeito, uma coisa é a reclamação à relação de bens que, como resulta do acima dito, se insere na “fase dos articulados na qual as partes, para além de requererem instauração do processo, têm de suscitar e discutir todas as questões que condicionam a partilha, alegando e sustentando quem são os interessados e respetivas quotas ideais e qual o acervo patrimonial, ativo e passivo, que constitui objeto da sucessão”. Coisa diversa é a forma de composição dos quinhões que é determinada nas fases seguintes, sendo certo que a adjudicação ou não de determinada verba a determinado interessado, tem a ver com a composição das quotas dos interessados.
Desta forma, a fundamentação do despacho em causa é incorreta.
Vejamos, então, se tal verba deve ou não ser adjudicada na totalidade ao interessado.
Na conferência de interessados apenas se chegou a acordo parcial sobre a adjudicação de verbas aos interessados, nada tendo ficado decidido sobre a verba ora em causa.
Em face desta circunstância, a Srª Juìza, caso não houvesse acordo sobre tal adjudicação (o que nem foi tentado), na conferência ou após a mesma, deveria ter decidido de que forma a mesma deveria ser adjudicada.
Tal como referem Miguel Teixeira de Sousa, Carlos Lopes do Rego, António Abrantes Geraldes e Pedro Pinheiro Torres (in O Novo Regime do Processo de Inventário e Outras Alterações na Legislação Processual Civil, Almedina, pág. 120) “Ao contrário do que acontece com as licitações (em relação às quais o art. 1113, nº 1, dispõe que se realizam na conferência de interessados), o artigo não impõe que a composição dos quinhões dos não conferentes (isto é, dos interessados que não participaram naquela conferência) ou não licitantes (ou seja, dos interessados que não licitaram ou não licitaram de forma vitoriosa) se realize nessa conferência, deixando, assim, ao poder de gestão processual do juiz (art. 6º, nº 1) a escolha do momento adequado para essa composição. Se for possível e conveniente, as diligências referidas no artigo poderão ter lugar na própria conferência de interessados, se isso não for possível e conveniente, caberá ao juiz determinar o momento adequado, sendo certo que ele terá que proceder a notificação dos interessados para apresentação das propostas do mapa da partilha (art. 1120, nº 1).”
Na verdade, tal como dispõe o art. 1120º, nº 1, do mesmo Código, só se passa à elaboração do mapa da partilha, depois de concluídas todas as diligências reguladas nas secções anteriores, que se inserem ainda na fase da conferência de interessados, embora possam ter lugar fora desta.
Tal como explicam Miguel Teixeira de Sousa, Carlos Lopes do Rego, António Abrantes Geraldes e Pedro Pinheiro Torres (ob. cit.pág. 127) “O mapa da partilha – que precede a homologação da partilha pelo juiz (cf. à art. 1122º, nº 1) – visa condensar o que de mais relevante decorre, para a partilha da comunhão hereditária, de toda a anterior tramitação do processo de inventário: a composição do acervo a partilhar, a verificação do passivo, a determinação das quotas ideais de cada interessado, a redução das liberalidades por inoficiosidade e ainda a adjudicação dos bens aos licitantes. Trata-se de uma operação de natureza essencialmente material, na medida em que todas as questões de facto e de direito que são relevantes para a realização da partilha já terão sido discutidas e apreciadas anteriormente no processo.”. (sublinhado nosso).
Com efeito, tem o Recorrente razão ao dizer que tal adjudicação não foi objeto de decisão judicial precedente e deveria tê-lo sido. Com efeito, não é a secretaria que tem competência para tomar tal decisão, pois extravasa as suas competências.
No caso, os bens da herança que não constituem legados, foram todos licitados na conferência de interessados, restando apenas adjudicar o crédito da herança em causa nos autos.
Assim, tal como acima já se referiu, antes da realização do mapa da partilha, a Srª Juiza deveria ter tentado obter, na conferência de interessados, uma solução consensual quanto à forma de adjudicar o crédito da herança (v. art. 1111º, nº 1, do C. P. Civil) e na falta desta, determinado de que forma deveria ser adjudicado esse crédito, mas não o fez, pronunciando-se sobre tal questão apenas após a reclamação do ora Recorrente ao mapa da partilha.
Tal como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/05/2016, proferido no proc. 2862/08.4TBMTS.P1.S1 (in www.dgsi.pt), citando o Acórdão do mesmo Tribunal de 26/10/1976, (BMJ 260º - 113) “O processo de inventário, no essencial, é uma medida de proteção que se destina a evitar prejuízos e a distribuir equitativamente todo o património de uma herança, apurando a verdade para que a partilha seja efetuada com igualdade e justiça”.
O art. 1117º, do C. P. Civil dispõe sobre a forma como se deve fazer a composição dos quinhões na falta de acordo, no entanto, no caso em apreço, só resta adjudicar o crédito da herança em causa nos autos.
Os direitos de crédito – como o que está em causa – correspondem às dívidas ativas de que o falecido é credor e constituem bens da herança.
No caso, o devedor é interessado direto na partilha e o seu quinhão encontra-se totalmente por compor, já que não é beneficiário de qualquer legado ou doação e não procedeu à licitação de qualquer bem.
Ora, sendo o interessado em causa o devedor do crédito, parece-nos justo que a verba em causa seja adjudicada na totalidade ao Interessado que foi beneficiário do empréstimo aí referido, ou seja, este Interessado já recebeu anteriormente à morte dos pais a quantia aí referida, pelo que não faria sentido adjudicar tal verba, por exemplo, em partes iguais a todos os interessados, obrigando-os a posteriormente exigirem daquele devedor o pagamento da quota parte do crédito que lhes coube na partilha.
Deste modo, decide-se adjudicar a verba nº 1 da relação de bens, na rúbrica “Créditos da Herança sobre Herdeiros” na totalidade ao Interessado EE.
Esta é a solução que permite alcançar uma partilha justa e igualitária, com respeito pelos direitos de todos os interessados, como constitui objetivo primordial do processo de inventário.
Acresce dizer que se entende desnecessária a baixa do processo à primeira instância para tentar a conciliação dos Interessados relativamente a este ponto, pois, a discordância entre os mesmos resulta da reclamação do recorrente ao mapa da partilha e das respostas dos restantes interessados a essa reclamação.
Confirma-se assim, a decisão recorrida (datada de 13/5/24), embora com fundamentos diferentes, confirmando-se também a sentença homologatória da partilha
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Decisão:
Pelo exposto, acorda-se nesta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente a apelação, confirmando-se as decisões recorridas.
Custas a cargo do Recorrente.
Guimarães, 15 de maio de 2025
Alexandra Rolim Mendes António Beça Pereira Raquel Batista Tavares