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EMBARGOS DE EXECUTADO
PRECLUSÃO DOS MEIOS DE DEFESA
TÍTULO EXECUTIVO
LIQUIDAÇÃO
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
PERSI
Sumário
I - A não utilização pelo executado dos meios de defesa na oposição mediante embargos preclude a sua ulterior invocação no processo executivo, sem prejuízo do conhecimento de questões ainda não apreciadas que, sendo do conhecimento oficioso, pudessem ditar o indeferimento liminar do requerimento executivo. II - A falta de título executivo assim como a inexigibilidade da obrigação só se for manifesta é que conduz ao indeferimento liminar. III - A liquidação que dependa unicamente da regulamentação legal do sector bancário conhecida ou cognoscível para o devedor está abrangida pela segurança do título executivo e, assim, depende de simples cálculo aritmético. IV - O contrato de mútuo em que o devedor se comprometa a pagar a quantia mutuada num determinado prazo e a alegação no requerimento executivo, acompanhada de cartas comprovativas, de que aquele foi interpelado primeiro para pagar as prestações vencidas com a cominação do vencimento antecipado das restantes, e, de seguida, para pagar a totalidade das prestações vencidas e vincendas, satisfaz o pressuposto da exigibilidade de dívida para efeitos da admissibilidade liminar do requerimento executivo. V- A declaração de resolução considera-se eficaz quando chega ao poder do destinatário ou é dele conhecida, ou quando, só por culpa sua, não foi por si recebida. VI- A devolução da carta de resolução do contrato enviada para a morada do devedor que consta do contrato objecto de resolução é imputável a culpa deste. VII- Na falta de impugnação da resolução extrajudicial os seus efeitos extintivos sobre a relação contratual mantêm-se. VIII – A cessação contratual e a instauração da execução em data anterior ao início de vigência do DL n.º 227/2012, de 25/10 e a manutenção dessa cessação aquando da renovação da execução que entretanto havia sido declarada extinta impedem a integração do devedor em regime PERSI estabelecido por aquele diploma legal.
Texto Integral
Proc. n.º 31072/11.1YYLSB-C.P1 – Apelação em separado
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este– Juízo de Execução de Lousada – ...
Relatora: Carla Fraga Torres
1.º Adjunto: Jorge Martins Ribeiro
2.º Adjunto: Ana Paula Amorim
Acordam os juízes subscritores deste acórdão da 5.ª Secção Judicial/3.ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto:
I. Relatório.
Recorrentes: AA e BB
Recorrido: Banco 1..., S.A.
Banco 1..., S.A. instaurou em 8/09/2011 a execução para pagamento de quantia de 11.732,03 € contra os executados AA e BB, alegando para o efeito os seguintes factos que se transcrevem:
“Por contrato de Mútuo n.º ...82, datado de 31.07.2008 o Exequente mutuou aos Executados a quantia global de € 10.337,02 (dez mil trezentos e trinta e sete euros e dois cêntimos) para aquisição de uma viatura marca BMW, modelo ... tds ..., matrícula ..-EO-.., como se infere e prova pelo documento que adiante se junta e aqui se dá por integralmente reproduzido (Doc. Nº 1)
Nos termos da cláusula 2ª desse mesmo contrato, os Executados obrigaram-se a reembolsar a quantia mutuada acrescida dos respectivos juros remuneratórios e demais encargos nos termos previstos nas condições particulares.
Nos termos das condições particulares, do aludido contrato, os Executados obrigaram-se a reembolsar a quantia mutuada em 60 prestações no valor individual de € 314,92, cada, com início em 15.09.2008, acrescida de € 1,5 por cada cobrança realizada, tendo sido fixada uma taxa anual nominal de juro remuneratório de 25,36%
Ficou, igualmente, acordado contratualmente que as despesas, encargos e comissões, nomeadamente, comissões de processamento de prestação em atraso, comissões de alteração de condições aplicáveis ao presente contrato, despesas necessárias à plena eficácia registo e ou cancelamento, seriam pagas pelo Executado nos termos do preçário do Banco Exequente.
Os Executados apenas pagaram 24 prestações, das inicialmente acordadas, pelo que o Exequente interpelou os Executados em 03.12.2010 para o pagamento dos valores vencidos e não pagos, como se infere da carta que adiante se junta e aqui se dá por integralmente reproduzida (Doc. Nº 2)
Como os Executados não procederam à regularização desses valores vencidos, o Exequente considerou vencida a totalidade da dívida nos termos da cláusula 10ª. e exigiu o seu imediato pagamento por carta datada de 30.12.2010, que adiante se junta e aqui se dá por integralmente reproduzida (Doc. Nº 3) onde lhes exigiu o pagamento global de € 10.251,60 (dez mil duzentos e cinquenta e um euros e sessenta cêntimos).
Ora, o Executado não pagou esse valor nessa data nem posteriormente, pelo que, o mesmo permanece em dívida, e é devido ao Exequente, valor ao qual acrescem juros de mora vincendos, às taxas contratualmente convencionadas, desde 30.12.2010 até efectivo e integral pagamento.
Ficou ainda acordado em contrato que para todos os litígios de natureza declarativa ou executiva emergentes do presente contrato, fica estipulado o foro de Lisboa com expressa renúncia a qualquer outro.
Valor Líquido: 10.251,60 €
Valor dependente de simples cálculo aritmético: 1.480,43 €
Valor NÃO dependente de simples cálculo aritmético: 0,00 €
Total: 11.732,03 €
Capital em dívida: € 7.700,64
Juros remuneratórios vencidos e não pagos e respectivo imposto selo: € 628,25 + € 29,79 = € 658,04
Juros de Mora vencidos e não pagos (até à data de resolução): €63,10
Comissões vencidas e não pagas: € 6,00
Despesas vencidas e não pagas: € 234,72
Seguro de vida vencido e não pago: € 12,40
Imposto Único de Circulação: € 276,70
Comissão de entrada em Contencioso vencida e não paga: € 1.300,00
Juros de mora vencidos desde a data de resolução até esta data 26.08.2011, calculados sobre a verba de capital (€ 7.700,64) à taxa de juro anual nominal de 25,36%, acrescida da sobretaxa de 4% a título de cláusula penal nos termos da cláusula 4ª. do contrato de Mútuo, no valor de € 1.480,43.
Assim, os Executados devem ao Exequente, a esta data, a quantia de global de € 11.732,03 (onze mil setecentos e trinta e dois euros e três cêntimos), a que acrescem juros de mora vincendos, calculados sobre o capital em dívida, até efectivo e integral pagamento, às taxas de juro convencionadas e supra referidas”.
Do documento 1 junto pela recorrida com o requerimento executivo, consta, além do mais: a morada dos recorrentes como sendo em Lugar ..., ...; a referência “quantia mutuada 10.337,02 €”, assim como consta que “O(s) mutuários declara(m) ter tomado conhecimento e aceite, sem reservas, as condições particulares e as condições gerais”.
O documento 2 corresponde a duas cartas datadas de 3/12/2010 a interpelar cada um dos recorrentes para efectuar o pagamento do valor em atraso, sob pena de ser declarado o incumprimento definitivo do contrato e de serem exigidas as prestações vencidas e vincendas, acrescidas de juros e despesas.
O documento 3 corresponde a uma carta dirigida pela recorrida aos recorrentes para a morada correspondente a Lugar ..., ..., com o teor seguinte:
A referida carta que constitui o identificado documento 3 está acompanhada de um talão de registo dos CTT e de um A/R dirigido aos recorrentes para a morada “Lugar ..., ...” e devolvido à recorrida por assinar em Janeiro de 2011.
O executado, depois de citado por carta registada com A/R por si assinado a 28/08/2013, deduziu a 6/01/2014 embargos de executado e oposição à penhora de cuja instância veio a desistir a 8/06/2017 e a que na mesma data se seguiu sentença homologatória.
A executada, depois de citada por carta registada com A/R por si assinado a 25/11/2016, deduziu a 8/05/2017 embargos de executado – invocando relativamente à falta de título executivo a falta de reconhecimento por notário ou quaisquer outras entidades das assinaturas do contrato de mútuo - cuja desistência do pedido foi homologada por sentença de 21/11/2017.
A 9/04/2018, a exequente foi notificada da extinção da execução nos termos dos arts. 750.º, n.º 2 e 849.º, n.º 1, al. c) do CPC.
A 19/12/2023, a exequente veio, ao abrigo do art. 850.º do CPC, requerer a renovação da execução extinta, indicando para penhora o vencimento do executado na A..., S.A..
Notificados do requerimento da exequente para renovação da execução extinta, os executados, a 18/01/2024, vieram pedir a recusa do recebimento do requerimento executivo e a remessa do mesmo para despacho liminar, por falta de título executivo.
Para o efeito, invocaram que o documento 1 que serve de base à execução constitui uma mera proposta de contrato e que, a considerar-se que o mesmo contém um acordo de vontades, tal é insuficiente para se considerar concluído o contrato de mútuo e constituída a obrigação dos mutuários restituírem o valor mutuado, porquanto dele não consta que a quantia em causa tenha sido disponibilizada aos mutuários, assim como não consta que seja o montante do crédito exequendo o valor a restituir pelos mutuários que, antes depende da eventual responsabilidade contratual deste últimos a determinar em sede de acção declarativa de condenação. Acrescentam que em relação à quantia de 2.550,96 € pedida a título de juros remuneratórios, juros de mora, comissões e outras despesas o referido documento 1 não tem força executiva na medida em que não se trata de obrigações que dependam de simples cálculo aritmético. Finalmente, defenderam a prescrição da dívida exequenda, dado que, segundo a exequente, o seu vencimento ocorreu no dia 30/12/2010 e a executada foi citada para a execução em 25/11/2016, ou seja mais de cinco anos depois.
Em resposta, de 29/01/2024, a exequente opôs-se à pretensão dos executados em virtude de cada um deles ter já deduzido embargos de executado de que desistiram nos termos sobreditos.
Subsequentemente, a 21/03/2024, os executados pediram a respectiva absolvição da instância por verificação da excepção atípica que decorre da sua falta de integração no PERSI.
Em resposta, o exequente defendeu que, apesar de formalmente não ter adoptado o mecanismo do PERSI, tentou durante mais de 10 meses encontrar soluções para o caso dos executados cuja invocação da falta de formalização exigida pelo DL n.º 227/2012 de 25/10 constitui abuso de direito, tanto mais que à data do incumprimento e da instauração da presente execução o citado diploma legal ainda não estava em vigor.
A 24/04/2024 foi proferido o despacho seguinte:
“Em requerimento junto aos autos a 18.1.2024 vieram os executados – apos serem notificados da renovação da execução e da constituição de mandatário – alegar diversos vícios que entendem que impõe a extinção da presente execução, como seja, e entre outros, falta de titulo executivo, prescrição, entre outros.
A 6 de Janeiro de 2014 o Executado apresentou embargos de Executado e oposição à penhora, sendo que a 8 de Junho de 2017 e a 8 de Maio de 2017, a Executada apresentou embargos de Executado.
As excepções arguidas neste requerimento deveriam tê-lo sido em sede de embargos pelo que consideramos extemporânea a alegação dos vícios que agora apontam à execução.
Notifique.
Em requerimento junto aos autos a 21.302024 vieram os executados alegar que deve ser julgada verificada a excepção atípica ou inominada, de natureza insuprível e de conhecimento oficioso, da falta de integração dos Executados no PERSI e em consequência serem absolvidos da instância, conforme artigos 576.º, n.º 2 e 578.º do Código de Processo Civil.
O Exequente ofereceu resposta pugnando pelo indeferimento.
Cumpre decidir.
De facto, o cumprimento prévio dos deveres impostos pelo regime do PERSI constitui um pressuposto específico da acção executiva cuja ausência se traduz numa excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância e a sua invocação pela parte está subtraída ao prazo concedido para apresentação da defesa, regendo, por isso, a última parte do nº 2 do art.º 573º, do NCPC que descarta a aplicação do princípio da preclusão.
Contudo entendemos não assistir razão aos executados.
O D.L. nº227/12, de 25.10, como se refere no seu preâmbulo, veio “estabelecer um conjunto de medidas que, reflectindo as melhores práticas a nível internacional, promovam a prevenção do incumprimento de contratos celebrados com consumidores que se revelem incapazes de cumprir os compromissos financeiros assumidos perante instituições de crédito por factos de natureza diversa, em especial desemprego e quebra anómala dos rendimentos auferidos em conexão com as atuais dificuldades económicas”.
Dispõe o artigo 40.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro que instituiu o PERSI, que a entrada em vigor do procedimento de regularização de dívidas, entraria em vigor no dia 1 de Janeiro de 2013. Por seu turno, como decorre do artigo 14.º do mesmo diploma, aferido o incumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito, o cliente bancário é obrigatoriamente integrado no PERSI entre o 31.º dia e o 60.º dia subsequentes à data de vencimento da obrigação em causa e a instituição de crédito está obrigada a iniciar o PERSI sempre que o cliente bancário se encontre em mora relativamente ao cumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito e solicite, através de comunicação em suporte duradouro, a sua integração no PERSI, considerando-se, para todos os efeitos, que essa integração ocorre na data em que a instituição de crédito recebe a referida comunicação ou quando o cliente bancário, que alertou para o risco de incumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito, entre em mora, devendo, para todos os efeitos, considerar- se que a integração desse cliente no PERSI ocorre na data do referido incumprimento.
No caso concreto, o incumprimento contratual por banda dos Executados ocorreu em data anterior à entrada em vigor do diploma supra indicado o que deu origem à instauração em 8 de Setembro de 2011 de uma acção executiva contra aqueles, pelo que aquando do incumprimento pelos Executados, do contrato de mútuo celebrado em 31 de Julho de 2008, ainda os mesmos se não se encontravam em vigor, o mesmo acontecendo aquando da instauração da acção executiva, o que ocorreu em 2011.
Pelo exposto, julga-se improcedente a excepção atípica ou inominada invocada”.
Inconformados com esta decisão, dela interpuseram recurso os executados, que a terminar as respectivas alegações, formularam as seguintes conclusões:
(…)
Nas contra-alegações, a exequente pugnou pela manutenção da decisão recorrida.
*
O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, em separado e com efeito suspensivo.
*
Recebido o processo nesta Relação, as partes, notificadas para se pronunciarem sobre a alteração do efeito suspensivo atribuído ao recurso pelo tribunal recorrido para efeito devolutivo, nada vieram dizer, na sequência do que, corrigindo-se em conformidade o seu efeito, proferiu-se despacho a considerar o recurso como próprio, tempestivamente interposto e admitido com o modo de subida adequados.
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II. Questões a decidir.
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações dos apelantes, tal como decorre das disposições legais dos art.ºs 635.º, n.º 4 e 639.º do CPC, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso (art. 608.º, n.º 2 do NCPC). Por outro lado, não está o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e é livre na interpretação e aplicação do direito (art. 5.º, n.º 3 do citado diploma legal).
Assim, as questões que se colocam a este Tribunal são saber:
- da oportunidade da defesa dos recorrentes, e, em caso afirmativo, da sua procedência, e
- da não integração dos recorrentes em PERSI.
*
III. Fundamentação de facto.
Os factos materiais relevantes para a decisão da causa são os que decorrem do relatório supra.
*
IV. Fundamentação de direito.
Da oportunidade da defesa dos recorrentes
Na execução em apreço, instaurada a 8/09/2011, os recorrentes AA e BB foram citados para no prazo de 20 dias se oporem à execução, o recorrente a 28/08/2013 e a recorrente a 25/11/2016, ambos através de carta registada com A/R assinada pelos próprios, na sequência do que um e outro deduziram embargos de executado, o primeiro a 6/01/2014, e a segunda a 8/05/2017, de que desistiram da instância e do pedido, respectivamente.
Entretanto, em Abril de 2018, a execução extinguiu-se e, posteriormente, por requerimento de 19/12/2023, a recorrida requereu a sua renovação, a que os recorrentes responderam num primeiro momento pedindo a recusa do recebimento do requerimento executivo ou a remessa do mesmo para despacho liminar, com fundamentos relativos à invocada falta de título executivo, por um lado, e à prescrição da dívida exequenda, por outro, e num segundo momento pedindo a sua absolvição da instância por falta de integração dos recorrentes no chamado PERSI, Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento estabelecido pelo DL n.º 227/2012 de 25/10.
Do que vem de se dizer colhe-se em primeiro lugar que a invocada falta de título executivo, por o contrato de mútuo não importar a constituição de uma obrigação pecuniária cujo montante seja determinável por simples cálculo aritmético, a invocada inexigibilidade da quantia exequenda e a invocada prescrição da dívida exequenda, de acordo com o art. 729.º, als. a), e) e g) e 731.º do CPC, correspondentes aos arts. 814.º, n.º 1, als. a), e) e g) e 816.º do CPC anterior ao aprovado pela Lei n.º 41/2013 de 26/06 (cfr. art. 6.º deste diploma legal), constituem fundamentos de oposição à execução que podem ser invocados mediante embargos nos termos do art. 728.º, n.º 1 do CPC, correspondente ao art. 813.º, n.º 1 do anterior CPC.
Em segundo lugar, resulta à evidência que há muito que se esgotou o prazo para os executados se oporem à execução, que, de resto, fizeram, sem que, contudo, o recorrente AA tenha invocado para a falta de título os motivos ora invocados e sem que os embargos da recorrente BB tenham sido objecto de decisão de mérito. Assim, reconhecendo-se não terem sido objecto de anterior apreciação mas encontrando-se esgotado o prazo para as partes deduzirem oposição à execução mediante embargos, é legítimo questionar da admissibilidade da arguição dos invocados fundamentos de oposição à execução a propósito da sua renovação.
A oposição à execução mediante embargos prevista no art. 728.º do CPC é o meio que a lei faculta ao executado para, através da apresentação de todos os fundamentos que, nos termos dos arts. 729.º a 731.º do CPC, possam conduzir à extinção da execução, se defender do pedido do exequente. O prazo para tal defesa é de 20 dias após a citação (n.º 1), ou, quando a matéria da oposição for superveniente, a partir do dia em que ocorra o respectivo facto ou dele tenha conhecimento o executado (n.º 2). Esgotado este prazo, fica precludida a possibilidade de o executado invocar mais tarde no processo executivo os fundamentos de defesa que não tenha deduzido por via de embargos.
A este respeito, Abrantes Geraldes salienta que “É controvertida a questão de saber se existe um ónus do executado de deduzir embargos, sob pena de preclusão relativamente aos fundamentos de defesa que não tenham sido invocados. Na jurisprudência tem sido entendido que a não utilização dos meios de defesa na execução não preclude a posterior invocação de excepções ao direito exequendo noutra ação, considerando-se que o efeito preclusivo só opera relativamente ao processo executivo” (in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. II, pág. 79, Almedina).
A sustentar este entendimento, na doutrina, Lebre de Freitas sublinha que “Constituindo petição duma acção declarativa e não contestação duma acção executiva, a dedução da oposição à execução não representa a observância de qualquer dos ónus cominatórios (ónus da contestação, ónus da impugnação especificada) a cargo do réu na acção declarativa…Mas, na medida em que a oposição à execução é o meio idóneo à alegação dos factos que em processo declarativo constituíram matéria de excepção, o termo do prazo para a sua dedução faz precludir o direito de os invocar no processo executivo, a exemplo do que acontece no processo declarativo. A não observância do ónus de excepcionar, diversamente da não observância do ónus de contestar ou do de impugnação especificada, não acarreta uma cominação, mas tão-só a preclusão dum direito processual cujo exercício se poderia revelar vantajoso” (Lebre de Freitas, in “A Acção Executiva”, 4.ª Edição, Coimbra Editora, 2004, pág. 190).
No mesmo sentido, Rui Pinto, reconhecendo a inexistência do “ónus de oposição (como se fora o ónus de contestação, do artigo 567º nº 1), nem o ónus de impugnação especificada do artigo 574º”, clarifica que “Diversamente, a necessidade de segurança jurídica e a autorresponsabilidade do executado justificam que a petição de oposição se reja pelo princípio da concentração da defesa, previsto no art. 573º n.º 1: toda a defesa do executado deve ser deduzida na oposição à execução” (in “A Ação Executiva”, 2023, Reimpressão, AAFDL Editora, pág. 409).
Revertendo para o caso dos autos, surpreende-se a invocação pelos recorrentes da excepção peremptória da prescrição, em virtude de entre o vencimento da dívida e a citação da executada terem decorrido mais de cinco anos. Em face do exposto, e não sendo do conhecimento oficioso (art. 303.º do CC), era em sede de embargos que a recorrente podia e devia ter deduzido aquela excepção da prescrição, que, mesmo tratando-se de uma obrigação solidária, não aproveita ao recorrente, e sempre teria de ser apreciada à luz do art. 323.º, n.º 2 do CC (cfr. art. 521.º do CC e com interesse acórdãos da RC de 2/06/2020; rel. Luís Cravo; Proc. 1990/19.5T8VIS.C1 e da RP de 22/11/2021; rel. Pedro Damião e Cunha; Proc. 4603/14.8T8VNG-A.P1).
Sendo assim em relação à excepção da prescrição, o que dizer em relação à alegada falta de título executivo, se o n.º 1 do art. 734.º do CC permite ao juiz conhecer oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726.º, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo e se o n.º 2, al. a) deste preceito legal prevê justamente o indeferimento liminar do requerimento executivo quando seja manifesta a falta ou insuficiência do título?
A este respeito, são esclarecedoras as explicações de Abrantes Geraldes de que é “sempre admissível apresentar requerimento destinado a confrontar o juiz com situações passíveis de enquadramento no art. 734º, preceito que admite a rejeição oficiosa da execução até uma fase adiantada da instância. A oficiosidade de conhecimento prevista no art. 734º não pode afastar a possibilidade de a iniciativa partir do próprio executado, antes ou depois de ter decorrido o prazo para dedução de embargos. Por conseguinte, a defesa através de simples requerimento será uma via ajustada a enquadrar situações que lidem apenas com questões de natureza processual, dependentes da mera análise do processo, desde que, em qualquer dos casos, o contraditório seja eficazmente salvaguardado” (in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. II, Almedina, pág. 78 e no mesmo sentido acórdão da RC de 26/04/2022; rel. Cristina Neves; Proc. 296/10.0TBPBL-C.C1).
O que sucede é que a falta de título só é do conhecimento oficioso se, nos termos do citado art. 726.º, n.º 2 do CPC, for manifesta. Neste sentido, no acórdão da RL de 30/05/2023 (rel. Ana Rodrigues da Silva; Proc. 22256/09.3T2SNT-B.L1-7), citando jurisprudência diversa, escreve-se que: “A este propósito, pela resenha efectuada, veja-se o Ac. TRL de 12-01-2023, supra referido onde se pode ler que: “tal vício deve ter caráter manifesto: A “rejeição oficiosa nos termos do art.º 734º e 726 nº 2 a) do C.P.C. pressupõe que a falta do título executivo seja evidente e incontroversa, e não uma situação que implique prévias diligências por parte do Tribunal” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 28-01-2021, Pº 7911/19.8T8VNF.G1, rel. MARGARIDA ALMEIDA FERNANDES). E, na mesma linha de entendimento, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24-09-2019 (Pº 35949/11.6TYYLSB-L1-7, rel. CRISTINA SILVA MAXIMIANO) concluindo que, “[a] insuficiência de título executivo prevista na al. a) do nº 2 do art.º 726º do Cód. Proc. Civil, que importa o indeferimento liminar do requerimento executivo, tem necessariamente de apresentar as características de evidente, incontroversa, insuprível, definitiva, excepcional, sendo esse o significado de “manifesta” (in www.dgsi.pt).
O título que serve de base à execução é um documento particular que, nos termos do art. 46.º, n.º 1, al. c) do CPC (na redacção em vigor à data da entrada em juízo do requerimento executivo), para ser título executivo deve estar assinado pelo devedor e importar a constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável por simples cálculo aritmético de acordo com as cláusulas dele constantes. É o que se verifica no caso concreto, com o contrato de mútuo, datado de 31/07/2008, assinado pela recorrida, enquanto mutuante, e pelos recorrentes, enquanto mutuários, e através do qual estes obrigaram-se a reembolsar aquela da quantia de 10.337,02 € que o próprio contrato menciona como mutuada pela recorrida/mutuante para a aquisição pelo recorrentes/mutuários de um veículo automóvel. Do mesmo passo, os recorrentes/mutuantes obrigaram-se a fazer esse reembolso em 60 prestações individuais de 314,92 € cada, com início em 15/09/2008, acrescida de 1,5 € por cada cobrança realizada e de uma taxa anual nominal de juro remuneratório de 25,36%. Outrossim, obrigaram-se os recorrentes a pagar as despesas, encargos e comissões, nomeadamente, comissões de processamento de prestação em atraso, comissões de alteração de condições aplicáveis ao presente contrato, despesas necessárias à plena eficácia registo e ou cancelamento, nos termos do preçário do Banco Exequente.
Do exposto, constata-se que o contrato de mútuo celebrado entre as partes preenche o requisito de forma e o requisito de fundo exigidos pelo apontado art. 46.º, n.º 1, al. c) do CPC (em vigor à data da entrada em juízo do requerimento executivo): o requisito de forma porque o respectivo documento está assinado pelos recorrentes/mutuários (cfr. art. 1143.º, 2.ª parte do CC), e o requisito de fundo porque do documento resulta que estes reconhecem a obrigação de pagar à recorrida uma determinada quantia que aí é mencionada como mutuada, 10.337,02 €, em prestações (60 prestações), cujo valor (314,92 €) e início de pagamento (15/09/2008) ficou desde logo determinado, acrescida de juros remuneratórios a uma taxa de juros então fixada (25,36%), e de comissões e despesas então discriminadas e cujo valor concreto, obedecendo à regulamentação própria da actividade bancária, depende de critérios legais cognoscíveis e, estão, por isso, abrangidos pela segurança do título executivo.
O contrato de mútuo que a recorrida deu à execução é, portanto, um documento particular, assinado pelos devedores que importa o reconhecimento por estes de uma obrigação pecuniária cujo montante é determinado e determinável por simples cálculo aritmético de acordo com as cláusulas dele constantes.
Neste sentido, embora reportando-se à escritura pública de mútuo como de título executivo, Rui Pinto, diz-nos que enquanto “título recognitivo da obrigação – confissão do ato ou facto que constituiu a dívida, nos termos dos artigos 352.º, 358.º, n.º 2 e 364.º do CC, ou reconhecimento de dívida, nos termos do artigo 458.º CC” - a escritura pública de mútuo “em que está previsto o prazo de restituição e as condições do empréstimo, e na qual os mutuários tenham declarado no final “que aceitam o contrato na forma exarada” implica o reconhecimento da obrigação de restituir, pelo que pode ser utilizada como título executivo” (in loc. cit., pág. 182). Acrescenta o mesmo autor, que “Perante a execução do mútuo, incumbirá ao executado/oponente o ónus da prova de que a quantia aí mencionada como tendo sido mutuada não lhe chegou a ser entregue” (in loc. cit., pág. 188, nota 458).
Por sua vez, a propósito da liquidação por simples cálculo aritmético que, nos termos dos arts. 716.º, n.º 1 e 724.º, n.º 1, al. h) do CPC, deve ser feita pelo exequente no requerimento executivo, clarifica este autor que a mesma pode ser impugnada em sede de oposição à própria execução (in loc. cit., pág. 245), não sendo, portanto, matéria passível de ser apreciada oficiosamente nos termos dos arts. 734.º e 726.º do CPC. Com efeito, conforme ensina Lebre de Freitas, se perante um documento particular (art. 46.º, n.º 1, al. c) do CPC antigo), a liquidez da obrigação pecuniária integra o próprio título executivo, importa sempre ressalvar a liquidação por mero cálculo aritmético (in “A acção executiva”, 4.ª Edição, Coimbra Editora, pág. 31).
Para mais, a exequibilidade do contrato de mútuo não depende de prévia acção judicial que aprecie o respectivo incumprimento. Como salienta Rui Pinto, “o mútuo em si mesmo poderá ser título executivo da obrigação de restituição da quantia mutuada, desde que celebrado na devida forma escrita legalmente exigida” (in loc. cit., pág. 188).
Acresce que a recorrida, como lhe competia por força do então art. 810.º, n.º 1, al. e) do CPC, actual art. 724.º, n.º 1, al. e), alegou que, em conformidade com o contrato (cfr. art. 781.º do CC), interpelou os recorrentes para o pagamento dos valores vencidos e não pagos assim como alegou ter-lhes comunicado o vencimento antecipado de todas as prestações em virtude da falta de pagamento das prestações em dívida, juntando, com o objectivo de o comprovar, cartas dirigidas aos mesmos.
Das cartas juntas relativas à interpelação dos recorrentes para pagamento dos valores vencidos está expresso o prazo de 15 dias concedido para o efeito com a cominação do vencimento das prestações vincendas e da sua exigência, juntamente com as vencidas, no caso de falta de pagamento destas últimas. Não consta, porém, qualquer comprovativo de que estas cartas foram remetidas aos recorrentes. Em relação à carta destinada à comunicação do vencimento e exigências das prestações vencidas e não pagas e das prestações vincendas, assim como da resolução contratual consta o seu envio com registo e A/R para a morada que figura no contrato, Lugar ... – ....
Ora, recorrendo uma vez mais às explicações de Rui Pinto, “o título executivo cumpre…, antes de mais, uma função de certificação da aquisição do direito ou poder à prestação pelo exequente. Dito de outro modo, o título executivo cumpre uma função de representação dos factos principais da causa de pedir. A nossa restrição aos factos principais decorre da leitura do artigo 712º: os factos complementares de exigibilidade da obrigação devem ser demonstrados no início da execução, mas não têm de estar representados no título executivo. Por isso, se não há título executivo que não se refira aos factos principais, já os factos complementares podem estar ausentes do mesmo…Em conclusão: o título não é causa de pedir, mas representa-a, como já atrás enunciamos, embora baste que o faça quanto aos factos principais. Essa representação da causa de pedir permite a execução da obrigação: demonstrada a causa de pedir, nos termos formalmente exigidos, pode ser deduzido o pedido de realização coativa da prestação autorizado pelo princípio geral do artigo 817º CC. Como sempre, mesmo esta função é tratada de modo flexível pela lei, de modo a acomodar diferentes cenários de suficiência do teor do título executivo. Assim, se a causa ou fundamento de a obrigação exequenda não constar do título deverá ser alegada no requerimento executivo (cf. o artigo 724º nº 1 al. e)), sob pena de ineptidão do requerimento executivo…Mas quão suficiente deve ser a causa de pedir trazida à execução, seja representada pelo título, seja por alegação no título executivo?
Se for um título executivo negocial, decorre do artigo 726º, nº 2, al. c) que, através do título e dos demais elementos dos autos, o credor tem o ónus de fundamentar o seu pedido numa aparência mínima dos factos principais constitutivos do seu direito, sob pena de indeferimento liminar. A aparência mínima é a que impede um juízo de inexistência manifesta desses factos” (in loc. cit., págs. 137/8).
Na situação dos autos, pese embora não haja comprovativo do envio aos recorrentes das cartas de 3/12/2010 de interpelação dos recorrentes para pagamento das prestações vencidas em dívida, existe a alegação correspondente, assim como existe comprovativo do envio para a morada dos mesmos da carta subsequente que lhes faz referência e que exige a totalidade das prestações em falta. De onde, não sendo seguro que foi efectuada aquela primeira interpelação para tornar exigíveis as prestações vincendas incluídas na quantia exequenda, também não é manifesto que a mesma não tenha sido levada a cabo.
Retomando o caso dos autos, afigura-se-nos que, nos termos sobreditos, o título executivo que serve de base à execução em conjunto com a alegação e documentos juntos com o requerimento executivo, são suficientes para determinar, como se impõe por força do art. 10.º, n.º 5 do CPC, o seu fim e os seus limites, assim como são suficientes para determinar o seu objecto, e afastar a evidência de que a obrigação exequenda não é exigível, em prejuízo da intervenção oficiosa do tribunal ao abrigo dos arts. 734.º e 726.º do CPC.
Conclui-se, pois, que nenhum dos fundamentos invocados pelos recorrentes merecem ser oficiosamente apreciados pelo tribunal e que, como tal, tendo-se esgotada a possibilidade de os mesmos deduzirem oposição mediante embargos, se encontra precludido o direito de invocarem tais fundamentos de defesa.
Improcede, pois, nesta parte o recurso.
Da não integração dos recorrentes em PERSI
Da leitura do preâmbulo do DL n.º 227/2012, de 25/10 extrai-se que com o objectivo de “reforçar a importância de uma atuação prudente, correta e transparente das referidas entidades [de crédito] em todas as fases das relações de crédito estabelecidas com os seus clientes enquanto consumidores na aceção dada pela Lei de Defesa do Consumidor, aprovada pela Lei nº 24/96, de 31 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, se estabeleceu “um conjunto de medidas que, refletindo as melhores práticas a nível internacional, promovam a prevenção do incumprimento e, bem assim, a regularização das situações de incumprimento de contratos celebrados com consumidores que se revelem incapazes de cumprir os compromissos financeiros assumidos perante instituições de crédito por factos de natureza diversa, em especial o desemprego e a quebra anómala dos rendimentos auferidos em conexão com as atuais dificuldades económicas”. Em concreto, além de se prever que cada instituição de crédito crie um Plano de Ação para o Risco de Incumprimento (PARI), definiu-se “um Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), no âmbito do qual as instituições de crédito devem aferir da natureza pontual ou duradoura do incumprimento registado, avaliar a capacidade financeira do consumidor e, sempre que tal seja viável, apresentar propostas de regularização adequadas à situação financeira, objetivos e necessidades do consumidor”.
Assim, o n.º 1, al. b) do citado diploma dispõe que o mesmo estabelece os princípios e as regras a observar pelas instituições de crédito na regularização extrajudicial das situações de incumprimento das obrigações de reembolso do capital ou de pagamento de juros remuneratórios por parte dos clientes bancários, respeitantes aos contratos de crédito referidos no n.º 1 do artigo seguinte, designadamente contratos de crédito ao consumo celebrados ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 359/91, de 21 de setembro (al. d)).
O art. 3.º, al. a) do mesmo diploma define cliente bancário o consumidor, na acepção dada pelo n.º 1 do artigo 2.º da Lei de Defesa do Consumidor, aprovada pela Lei n.º 24/96, de 31 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril, que intervenha como mutuário em contrato de crédito.
Por sua vez, o art. 40.º, sobre a entrada em vigor deste diploma, elege para o efeito o dia 1/01/2013 e o art. 39.º relativo à aplicação no tempo do referido procedimento prescreve, o seguinte:
1 - São automaticamente integrados no PERSI e sujeitos às disposições do presente diploma os clientes bancários que, à data de entrada em vigor do presente diploma, se encontrem em mora relativamente ao cumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito que permaneçam em vigor, desde que o vencimento das obrigações em causa tenha ocorrido há mais de 30 dias.
2 - Nas situações referidas no número anterior, a instituição de crédito deve, nos 15 dias subsequentes à entrada em vigor do presente diploma, informar os clientes bancários da sua integração no PERSI, nos termos previstos no n.º 4 do artigo 14.º
3 - Os clientes bancários que, à data de entrada em vigor do presente diploma, se encontrem em mora quanto ao cumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito há menos de 31 dias são integrados no PERSI nos termos previstos no n.º 1 do artigo 14.º
Na situação dos autos, quando o identificado DL n.º 227/2012 entrou em vigor já a recorrida havia operado a resolução do contrato dos autos, que nos termos do art. 436.º, n.º 1 do CC pode fazer-se mediante declaração à parte contrária, ainda que informal, mas receptícia, porquanto só se torna eficaz quando chega ao poder do destinatário ou é dele conhecida nos termos do art. 224.º, n.º 1 do CC, considerando-se eficaz, por força do n.º 2 deste preceito legal, a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida, o que, no caso, se verifica na medida em que a carta de resolução foi enviada para a morada fornecida pelos próprios devedores no contrato objecto de resolução, sendo-lhes por isso imputável a título de culpa a respectiva devolução em Janeiro de 2011. Para mais, certamente conhecedores da resolução pelo menos antes de 6/01/2014, data dos embargos de executado do recorrente em que o próprio reconheceu que havia entregue a viatura BMW “para posteriormente ser vendida, de forma a que o valor apurado pudesse ser abatido à dívida em apreço” (art. 6.º do requerimento de embargos), os recorrentes não impugnaram essa resolução, e, como tal, os seus efeitos extintivos da relação contratual, já verificados aquando da instauração da acção executiva a 8/09/2011, mantiveram-se.
Do que vem de se dizer, conclui-se que, aquando do incumprimento dos recorrentes, o citado DL n.º 227/2012 ainda não estava em vigor e que quando este diploma entrou em vigor em Janeiro de 2013 já o contrato dos autos havia cessado, e inclusive já a execução tinha sido instaurada em 8/09/2011. Acresce que, à data da renovação da execução, em Dezembro de 2023, a situação de cessação do contrato persistia. Nesta medida, à recorrida não era exigível a integração dos recorrentes no regime de PERSI ali estabelecido.
Neste sentido veja-se, além da jurisprudência aí citada, o acórdão da RL de 19/12/2024 (rel. Rute Sobral; Proc. 6119/11.5TBALM-C.L1-2) em que pode ler-se que “à data da apresentação do requerimento executivo, os contratos de mútuo em causa encontravam-se definitivamente incumpridos, tendo o exequente nomeado à penhora a fração hipotecada (cuja aquisição constituía o objetivo dos financiamentos afiançados pelas executadas). Mostra-se, pois, consensual que, à data da interposição da execução, a exequente não estava vinculada ao cumprimento do regime do PERSI, porquanto operou a resolução do contrato de crédito celebrado com as executadas em data anterior à entrada em vigor do diploma que o instituiu. Ora, tal raciocínio que é válido para o momento da instauração da execução, permanece válido para o momento da renovação da instância executiva. E assim é porquanto os contratos de mútuo, que, repete-se, não subsistiam à data da instauração da execução, não sofreram qualquer vicissitude desde então, mantendo-se extintos por resolução contratual, sendo esse o status quo existente à data da renovação da instância executiva” (in www.dgsi.pt).
Termos em que, também nesta parte, improcede a pretensão recursória.
As custas do recurso são pelos recorrentes por terem ficado vencidos (art. 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC).
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Sumário (ao abrigo do disposto no art. 663º, n.º 7 do CPC):
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V. Decisão
Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso e em confirmar a decisão recorrida.
Custas pelos recorrentes.
Notifique.
Porto, 12/5/2025.
Carla Fraga Torres
Jorge Martins Ribeiro
Ana Paula Amorim