I - Para que constitua título executivo, a ata da reunião da assembleia de condóminos deve conter, obrigatoriamente, a menção do montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações.
II - A falta de alguma destas referências e, no caso, a falta de indicação da data exata de vencimento das obrigações exigidas ao Apelante, determina a falta de título executivo contra o mesmo.
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
I- Relatório
1- Por apenso à execução para pagamento de quantia certa que lhe moveu o Condomínio Edifício Rua ... (Porto), deduziu AA, embargos de executado, alegando, para além do mais sem interesse para este recurso, que as atas que servem de base àquela execução não mencionam o montante anual de contribuições a pagar por cada condómino, nem a data de vencimento das respetivas obrigações. Além disso, ele próprio, Embargante, nunca foi convocado para as assembleias de condóminos a que dizem respeito aquelas atas (datadas de 21/12/2022, 07/02/2023 e 25/10/2023), nem delas foi notificado, bem como dos avisos de pagamento referentes às contribuições aqui em causa.
Assim, tais atas não constituem título executivo, além de que a falta da referida notificação, implica o não vencimento das prestações reclamadas, nem a sua constituição em mora.
2- O Embargado respondeu sustentando a posição oposta, já que as ditas atas cumprem os requisitos legais necessários para serem consideradas títulos executivos, pois especificam as deliberações sobre os orçamentos e quotas extraordinárias e, embora não mencionem explicitamente as datas de vencimento, as mesmas são dedutíveis conforme a prática usual de cobrança e as deliberações anteriores.
Por outro lado, as convocatórias para as referidas assembleias e as demais comunicações foram enviadas para o domicílio conhecido do Embargante, pelo se o mesmo as não recebeu, não foi por culpa da Administração do Condomínio.
Em qualquer caso, a falta de notificação das atas e convocatórias, embora possa ser alegada para fins de anulabilidade, não retira a força executiva às ditas atas.
Por tais razões, pois, termina pedindo a improcedência da oposição.
4- Terminada a fase dos articulados, foi, entre o mais, convidado o Embargado a juntar aos autos os anexos que vêm referidos nas atas exequendas, convite a que o mesmo correspondeu.
5- Seguidamente, foi proferida sentença na qual se julgaram os presentes embargos parcialmente procedentes e, em consequência, determinou-se a extinção da execução quanto à quantia de 500,00€ (referente a despesas relativas ao processo de cobrança coercitiva, nomeadamente a penalidade aprovada na assembleia de 25 de outubro de 2023), reduzindo a execução ao montante remanescente de 5.097,50€.
6- Inconformado com esta sentença, dela interpôs recurso o Embargante, rematando a sua motivação com as seguintes conclusões:
“1. Na petição de embargos, o recorrente alegou, entre outros,
Art. 7º - As actas juntas como títulos executivos não mencionam: o montante anual de contribuições a pagar por cada condómino nem a data de vencimento das respectivas obrigações;
Art. 14º - O oponente nunca foi convocado para as Assembleias de condóminos que se terão realizado em 21.12.2022, 07.02.2023 e 25.10.2023.
Art .15º - O oponente nunca foi notificado das actas ora juntas como títulos executivos, nem dos avisos de pagamento referentes às contribuições aqui em causa;
Arts. 16º, 17º, 18º, 19º – [factos instrumentais relativos àqueles]
Art. 20º - Desde a data que se não pode precisar do ano de 2022, o embargante não mais recebeu qualquer comunicação da Administração do condomínio exequente.
2. Dos aludidos factos alegados concluía-se na petição que a falta daquela notificação ao oponente, implicava
a) a exclusão da força executiva excepcionalmente conferida pelo art. 6º do DL 268/94 àqueles documentos particulares e
b) o não vencimento das prestações reclamadas e a consequente não constituição em mora.
3. Daqueles factos e das questões de direito que, com base neles, foram suscitados não conheceu o tribunal a quo. O que constitui nulidade.
B – O Sentido da decisão omitida – De facto
4. Na falta de impugnação do embargado, tais factos devem ser dados como provados.
C - O Sentido da decisão omitida – De iure
I - Inexistência de título executivo oponível ao embargante por falta de notificação dos actos procedimentais
5. O art. 6º do DL 268/94 de 25/10 que confere força executiva às actas das Assembleias de condóminos, que tiverem deliberado o montante das contribuições a pagar ao condomínio, não refere que a convocatória, a acta e as interpelações para pagamento sejam condições de exequibilidade daqueles instrumentos.
Mas a lei dispõe que aqueles actos procedimentais (instrumentais dos direitos a participar nas deliberações, a conhecê-las e discuti-las) sejam condições da sua validade.
6. Dificilmente se compreenderia que a preterição das condições de validade das deliberações (ou, no mínimo, da sua oponibilidade ao sujeito a quem elas aproveitariam) não influenciasse a natureza de títulos executivos que a lei lhes confere.
7. Nem se diga que elas adquirem aquela natureza se não tiverem sido impugnadas, porque o que aqui ocorre é o completo e absoluto desconhecimento (pelo menos até à citação) da existência das reuniões, das actas, e demais pressupostos da pretensão exequenda.
II- Inexistência de título pela não fixação nos títulos da data de vencimento de cada uma das prestações reclamadas
8. O art. 6º do DL 268/94 de 25 de Outubro, na sua mais recente redacção (Lei 8/2022), dispõe que
1. A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições a pagar ao condomínio menciona o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respectivas obrigações.
2. A acta da reunião da assembleia de condóminos que reúna os requisitos indicados no número 1 constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota parte.
Ora, nem nas actas em causa, nem em documento adicional, nem em alegação feita na petição executiva, nem na contestação deduzida pela embargada, se faz qualquer referência à data de vencimento de cada uma das prestações reclamadas.
E, como se diz inequivocamente no aludido art. 6º, um dos requisitos para que se forme título executivo é mencionar “a data de vencimento das respectivas obrigações”.
E como resulta do nº 2 do mesmo normativo, o título que com aquelas menções se formar, só o é contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo ali estabelecido.
Subsidiariamente,
C- A responsabilidade pelas custas
9. A sentença recorrida imputa as custas ao recorrente, no pressuposto que deu causa à acção (à execução e à oposição a ela deduzida), por aplicação do art. 527º do CPC
10. Uma decisão nesse sentido excluiria todas as consequências da omissão, pelo menos, da oponibilidade dos actos constitutivos da obrigação ao executado.
Conhecer a existência da obrigação há-de ser o último reduto da fonte dessa obrigação.
11. Mesmo que se entendesse (quase por absurdo) que a oponibilidade das deliberações ao executado ocorresse no momento da citação para a execução, que o título se formasse no momento da deliberação ou da elaboração da acta que a corporizasse, que o vencimento das obrigações ocorresse no momento em que o devedor tivesse delas conhecimento (com a citação, portanto), ainda assim, nunca se poderia julgar que o executado teria dado causa à acção, posto que só tomou conhecimento (por omissão legal do credor de comunicar as características e condições da obrigação) dessas circunstâncias em momento posterior ao da propositura.
12. Em qualquer caso, pois, as custas devem ser suportadas por quem deu causa à acção (porque teria obtido o reconhecimento de crédito que só se venceria em momento posterior à propositura dessa acção) e assim tirou proveito dela.
13. Como se referiu no Acórdão da Relação de Lisboa, de 22-01-2019, “o critério de distribuição da responsabilidade pelas custas assenta no princípio da causalidade”. E, no caso em apreço, o embargante não lhe deu causa por todos os motivos acima aludidos, antes sendo o embargado que dela teria tirado proveito”.
Termina pedindo a revogação da sentença recorrida.
7- Não consta que tivesse havido resposta.
8- Recebido o recurso nesta Instância foi determinado que os autos regressassem ao Tribunal recorrido para que aí houvesse pronúncia expressa sobre a nulidade imputada à sentença recorrida, pronúncia essa ocorreu na qual não foi reconhecida tal nulidade.
9- Uma vez regressados os autos a este Tribunal, posto que a deliberação está tomada e a tal nada obsta, cumpre decidir.
A- Definição do seu objeto
O objeto dos recursos é, em regra e ressalvadas designadamente as questões de conhecimento oficioso, delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente [artigos 608º, nº 2, “in fine”, 635º, nº 4, e 639º, nº1, do Código de Processo Civil (CPC)].
Assim, levando em consideração este critério, cinge-se este recurso a saber se:
a) A sentença recorrida é nula, por omissão de pronúncia;
b) Deve haver lugar à requerida modificação da matéria de facto;
c) Inexiste título executivo, por falta de notificação dos atos procedimentais e pela não fixação nos títulos da data de vencimento de cada uma das prestações reclamadas;
d) A responsabilidade das custas não deve ser imputada ao Apelante.
B.1- Na decisão recorrida julgaram-se provados os seguintes factos:
1- No dia 02/10/2023 reuniu-se a assembleia de condóminos do prédio constituído em propriedade horizontal sito na Rua ... da freguesia ..., Concelho do Porto e descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o nº ....
2- O Executado é proprietário da fração designada pela letra «B» do edifício em propriedade horizontal descrito em 1, que adquiriu, por compra registada em 12-03-1986.
3- No dia 21 de dezembro de 2022 reuniu-se a assembleia de condóminos do prédio constituído em propriedade horizontal em que se integra a fracção descrita em 2º, tendo deliberado sobre a seguinte ordem de trabalhos:
4- Na mesma assembleia, quanto ao ponto 3º da ordem de trabalhos, foi deliberado por maioria aprovar o orçamento para o ano de 2022/2023 (outubro de 2022 a setembro de 2023).
5- Desse orçamento consta, quanto ao valor aprovado para as contribuições:
6- Por deliberação tomada na assembleia de condomínio, de 7 de fevereiro de 2023, foi aprovado por maioria o orçamento da empresa A... para reparação do elevador, nos seguintes moldes:
7- Por deliberação tomada por maioria na assembleia de condomínio, de 7 de fevereiro de 2023, foi aprovado uma quota extra para obras no edifício, no valor de 120.000,00€, a ser processada em 4 meses, com início em fevereiro de 2023 e término em maio de 2023.
8- Por deliberação tomada por unanimidade na Assembleia extraordinária de condomínio, de 02/10/2023, foi eleita a sociedade B..., Lda como administradora do condomínio exequente.
9- Por deliberação tomada por unanimidade na assembleia de condomínio, de 25 de outubro de 2023, foi aprovado por unanimidade o orçamento para o ano de 2023/2024 (outubro de 2023 a setembro de 2024), no valor de 25.935,9 Euros, bem como, percentagem de 10% (dez por cento) que se destina o fundo de reserva, no importe de 2.593,60 Euros.
10- Por deliberação tomada por unanimidade na assembleia de condomínio, de 25 de outubro de 2023, foi aprovada uma penalidade no montante de 500,00€, para custear despesas judiciais, sempre que o condomínio tenha que recorrer à via judicial para a cobrança das dívidas dos condóminos.
11- O executado não pagou à exequente as quotizações ordinárias, fundo de reserva, fundo para obras, quotas extra e seguro, no período de 01 dezembro de 2022 a 8 de Fevereiro de 2024.
Está nele em causa, em primeiro lugar, a questão de saber se a sentença recorrida é nula, por omissão de pronúncia. Isto porque o Apelante se queixa de na sentença recorrida não terem sido julgados determinados factos por si alegados e que tem como relevantes para a decisão da causa (mais concretamente, os descritos nos artigos 7.º e 14.º a 20.º, da petição inicial), sendo que também não teriam sido abordadas as questões relativas à alegada à inexistência de título executivo oponível ao Embargante, por falta de notificação dos atos procedimentais por si identificados, bem como a inexistência de título devido à falta de menção nas atas dadas à execução do montante anual de contribuições a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações.
E, a nosso ver, o Apelante, nalguma medida, tem razão.
Efetivamente, estando o juiz obrigado a conhecer de todas as questões que lhe sejam submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, de todas as causas de pedir e exceções invocadas e ainda daquelas que sejam do seu conhecimento oficioso [artigo 608.º, n.ºs 1 e 2, do CPC], facilmente verificamos que, neste caso concreto, na sentença recorrida não foi assumida posição expressa sobre a falta de título executivo invocada pelo Apelante, devido à ausência de menção nas atas exequendas do montante anual de contribuições a pagar por cada condómino, bem como da data de vencimento das respetivas obrigações.
Referiu-se é certo – como se dá nota no despacho subsequente que conheceu da nulidade invocada – o valor de algumas das contribuições aprovadas nos factos provados. Sobretudo, com base nos anexos às atas em questão. Todavia, não se abordou a questão de saber se nessas mesmas atas (e não nos seus anexos) – que foi onde o Apelante situou a sua defesa - aqueles elementos existiam e, na negativa, quais as consequências jurídicas daí decorrentes.
De modo que, tendo em conta o disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. d), do CPC, temos para nós como linear que, neste aspeto, se verifica a indicada nulidade da sentença recorrida.
Já quanto aos demais aspetos, ou seja, quanto à invocada falta de convocação do Apelante para as assembleias de onde emergiram as atas exequendas e da subsequente notificação das mesmas, cremos ser de concluir o contrário.
Efetivamente, o que ressuma de toda a exposição feita naquela sentença é que esses aspetos foram considerados irrelevantes, nesta sede. Como aí se refere, “o embargante não alega que impugnou as deliberações tomadas nas várias assembleias de condóminos realizadas e cujas actas foram dadas à execução, das quais constam as deliberações relativas ao montante das contribuições a pagar pelos condóminos e, bem assim, das devidas pelo proprietário da fracção em causa, sendo que o meio processual próprio para tal impugnação era, como decorre expressamente do artigo 1433º nº 4, a acção de anulação a intentar no prazo ali estabelecido”.
E acrescenta:
“Dependendo a arguição da nulidade da deliberação de invocação do condómino interessado, sob pena de ter de considerar-se o acto válido, sobre embargante, recaía o ónus de alegação e prova da impugnação das deliberações em causa por se tratar de facto impeditivo do direito do exequente, ora embargado.
Pelo que as deliberações lhe são oponíveis”.
Consequentemente, pois, em resumo, apenas se reconhece a nulidade relativa ao aspeto primeiramente indicado. Dele trataremos subsequentemente, em obediência ao disposto no artigo 665.º, n.º 1, do CPC.
Por ora, porém, importa decidir uma outra problemática que se traduz em saber se, como pretende o Apelante, deve haver lugar à requerida modificação da matéria de facto. Isto é, em síntese, se os factos alegados nos artigos 7.º e 14.º a 20.º, da petição inicial, devem ser julgados demonstrados, por pretensamente não terem sido impugnados pela Apelada, na contestação.
E, a nosso ver, a resposta só pode ser negativa.
Com efeito, se percorrermos essa peça processual, verificamos que, para além de nela terem sido impugnados expressamente os artigos 5.º a 22.º da petição de embargos (artigo 15.º), também se contestou a alegada falta de convocatória para as assembleias em causa, alegando, por exemplo, que “[a] Administração do Condomínio procedeu conforme estipulado, enviando as convocatórias para o último endereço conhecido do Oponente, conforme evidenciado pelos registos de envio. A falta de atualização de morada pelo Oponente não pode ser imputada ao Exequente” (artigo 22.º); e que “as comunicações relativas à fracção foram enviadas para o domicílio atualizado do Oponente até 2022, conforme evidenciado pelos documentos juntos. A ausência de recebimento a partir de 2022 não foi por culpa da Administração do Condomínio, mas por possível desatualização da morada por parte do Oponente” (artigo 23.º).
Por conseguinte, tendo em conta o disposto no artigo 574.º, n.º 2, do CPC “à contrário”, bem como o facto de não ter sido realizada outra instrução em julgamento (já que a sentença recorrida foi proferida após a fase dos articulados), bem se vê que os aludidos factos não podem ser julgados demonstrados. Isto, para além de algumas das atas apresentadas à execução mencionarem valores globais a suportar (por exemplo, as de 07/02/2023 e de 25/10/2023).
Neste contexto, portanto, não se introduzirá qualquer alteração na matéria de facto fixada na sentença recorrida.
E é altura de saber se, como alega o Apelante, não há título executivo, em virtude das atas apresentadas à execução não mencionarem as datas de vencimento das obrigações a suportar pelo Apelante.
Sobre esta matéria, importa, antes de mais, ter presente que a lei tem essa menção como obrigatória.
A ata da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições a pagar ao condomínio – prescreve o artigo 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de outubro, na redação que lhe foi dada pelo artigo 4.º, da Lei n.º 8/2022, de 10 de janeiro [que é aqui aplicável por ter entrado em vigor (aparte a alteração ao artigo 1437.º do Código Civil) no dia 10 de Abril de 2022 (artigo 9.º) e as deliberações vertidas nas atas apresentadas à execução são posteriores] – “menciona o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações”[1].
E só se contiver essas menções é que constitui título executivo[2]. O n.º 2 do daquele artigo 6.º, é inequívoco nesse sentido: “A ata da reunião da assembleia de condóminos que reúna os requisitos indicados no n.º 1 constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte”.
A referida data, portanto, é um elemento essencial para conferir força executiva à ata em questão.
E percebe-se que assim seja. Na verdade, como prescreve o artigo 10.º, n.º 5, do CPC, “[t]oda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva”. Significa isto que o âmbito objetivo e subjetivo da execução é delimitado por esse título. E, assim, o objeto da execução, por exemplo, não pode ser diverso do conteúdo do próprio título[3]. Título que, para valer como tal em sede executiva, tem de obedecer às características que a lei lhe assinala. Como refere Rui Pinto[4], citando Anselmo de Castro, “um documento é título executivo por causa de “condições formais predeterminadas na lei, e nas quais a força probatória do título não intervém, qua tale”, condições essas que para o legislador constituem a base da aparência ou da probabilidade do direito”.
Deste modo, portanto, só podemos concluir que, sem a menção da referida data, a ata da reunião da assembleia de condóminos, não pode servir como título executivo. É uma decorrência das características de certeza, exigibilidade e liquidez, que devem revestir a obrigação exequenda[5].
Ora, o que verificamos no caso presente, é que as atas que foram apresentadas como títulos na execução em análise, não mencionam tal data. Ou seja, a data de vencimento das obrigações a cargo de cada um dos condóminos e, particularmente, do Apelante. Até o Apelado o reconhece na sua resposta a estes embargos. Só que, como aí referiu, embora tais atas “não mencionem explicitamente as datas de vencimento, as mesmas são dedutíveis conforme a prática usual de cobrança e as deliberações anteriores” (artigo 2.º).
Acontece que este método não tem, nesta sede, qualquer apoio legal. As atas têm, elas próprias ou associadas a documentos nelas incorporados, de ser autónomas e suficientes para comprovar presumidamente o direito, de acordo com as características que a lei lhes assinala. E uma dessas características é, justamente, a data de vencimento das obrigações dos condóminos, que não podem estar, como sucede no caso presente, de todo, ausentes.
É verdade que já em sede de embargos, depois de concluída a fase dos articulados, o Tribunal recorrido tentou ultrapassar aquele obstáculo e o vício que o Apelante lhe tinha associado, convidando o Apelado a juntar aos autos os anexos das atas em questão. E, nessa sequência, veio mesmo a refletir nos factos provados algumas menções (não alegadas), alusivas a contribuições parcelares exigidas ao Apelante.
Todavia, nem essas contribuições estão, todas, discriminadas, nem as que o estão referem as datas dos respetivos vencimentos.
Quanto às primeiras, estão nessa situação as prestações previstas para o ano de 2023/2024 (outubro de 2023 a setembro de 2024), que apenas estão referenciadas no seu computo global, no valor de 25.935,90€, bem como a percentagem de 10% destinada ao fundo de reserva, no montante de 2.593,60€, sem que esteja discriminada, desde logo, a quota parte que compete ao Apelante (ponto 9 dos Factos Provados).
E, quanto às demais, se é certo que vêm referidos os montantes mensais a suportar pelo Apelante, nada é dito, uma vez mais, sobre as datas concretas de vencimento das prestações a que eles dizem respeito (datas que, obviamente, não se confundem com o mês de processamento dessas prestações, como sucede, por exemplo, com a quota extra para obras no edifício, elencadas no ponto 7 dos Factos Provados).
Poderia, assim, ser-se tentado a colmatar esta falta por recurso às regras gerais que vigoram quanto ao vencimento das obrigações. Por exemplo, as previstas nos artigos 777.º a 782.º, do Código Civil. Só que para além de muitas dessas regras revestirem caráter supletivo em relação à vontade das partes, há um outro obstáculo a que já aludimos e que se traduz na exigência formal de que as atas das assembleias de condóminos, para servirem como título executivo, têm, elas próprias ou associadas a documentos nelas incorporados (ainda que por reprodução) de conter as datas, concretas, de vencimento das obrigações de cada um dos condóminos.
Por conseguinte, em resumo, não sendo esse o caso, há manifesta falta de título executivo, pelo que, com esse fundamento, o presente recurso não pode deixar de ser julgado procedente e revogada a sentença recorrida, com a consequente procedência dos embargos e a extinção da instância executiva (artigo 732.º, n.º 4, do CPC), ficando prejudicada a análise das demais questões suscitadas. Inclusive a referente às custas em que o Apelante foi condenado na 1ª instância, pois que, face a este resultado, as custas em ambas as instâncias são da responsabilidade do Apelado (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
Pelas razões expostas, acorda-se em julgar procedente o presente recurso e, consequentemente, revoga-se a sentença recorrida, julgando extinta a execução à qual estes autos estão apensos
Porto, 13/5/2025
João Diogo Rodrigues
Rodrigues Pires
Márcia Portela
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[1] Os sublinhados são da nossa responsabilidade.
[2] Neste sentido, por exemplo, Ac RP de 30/01/2024, Processo n.º 1304/23.0T8PRT-A.P1, consultável em www.dgsi.pt, bem como toda a doutrina e jurisprudência aí mencionadas.
[3] Neste sentido, parece pronunciar-se Rui Pinto, A Ação Executiva, AAFDL, 2018, pág.140.
[4] Ob. cit., pág. 136.
[5] Neste sentido, Ac. RLx de 04/07/2024, Processo n.º 5251/23.7T8SNT-A.L1-2, consultável em www.dgsi.pt.