CONTRATO DE EMPREITADA
OBJECTO DO CONTRATO
ALTERAÇÃO DO CONTRATO
DESISTÊNCIA PARCIAL DA EMPREITADA
Sumário


I - A causa de nulidade prevista na alínea b) do nº1 do art. 617º do C.P.Civil respeita apenas à falta absoluta de fundamentação, e não quando a fundamentação se mostra deficiente, errada ou incompleta (como tem sido unanimemente defendido pela Doutrina e pela Jurisprudência).
II - A causa de nulidade prevista na 1ª parte da alínea c) do nº1 do art. 617º do C.P.Civil («fundamentos estão em oposição com a decisão») só se verifica quando a contradição reside entre os fundamentos exarados pelo juiz na fundamentação da decisão e a própria decisão, já não se verificando quando a contradição reside entre os factos provados e a decisão (porque a errada interpretação e valoração jurídica de facto envolve um erro de natureza jurídica, o qual, embora coloque em causa o acerto da fundamentação nessa parte, apenas se repercute no mérito da decisão, mas sem «beliscar» a sua regularidade formal), ou quando essa contradição seja apenas atinente à própria matéria de facto (oposição entre os factos provados ou oposição entre os factos provados e os factos não provados), uma vez que, neste caso, estamos perante um vício que recai sobre o próprio enunciado do juízo probatório (e não sobre o silogismo lógico-jurídico da própria decisão) e configura um vício formal mas apenas da decisão de facto que está previsto na alínea c) do nº2 do art. 662º do C.P.Civil.
III - A causa de nulidade prevista na 1ªparte da alínea d) do nº1 do art. 617º do C.P.Civil («omissão de pronúncia») verifica-se quando o Tribunal deixe de apreciar alguma das questões que lhe são submetidas pelas partes, questões essas que são todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas, cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão, mas não se confundem com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os fundamentos, os motivos, os juízos de valor ou os pressupostos em que as partes fundam a sua posição na controvérsia.
IV - A decisão da matéria de facto pode apresentar «patologias» que não correspondem verdadeiramente a erros de apreciação ou de julgamento, sendo que em tais «patologias» enquadra-se a deficiência da decisão de facto decorrente da falta de apreciação e de inclusão, na matéria de facto provada ou não provada, de algum (ou alguns) facto essencial (ou principal) da causa que tenha sido alegado pelas partes.
V - Verificada a existência do vício da deficiência da decisão de facto, os poderes conferidos ao Tribunal da Relação cometem-lhe o dever de dele conhecer oficiosamente (independentemente da existência ou não de impulso da parte interessada) e o poder de o suprir imediatamente, desde que, constem do processo (ou da gravação) os elementos probatórios indispensáveis para esse suprimento.
VI - Estritamente conexionada com a decisão de facto está o ditame legalmente consagrado no art. 607º/4 do C.P.Civil de 2013: o Tribunal só deve responder aos factos que julga provados e não provados, não envolvendo esta pronúncia aqueles pontos que contenham matéria conclusiva, irrelevante e/ou de direito.
VII - Os factos conclusivos, ou a matéria de direito, não devem relevar (não podem integrar a matéria de facto) quando, porque estão diretamente relacionados com o thema decidendum, impedem ou dificultam de modo relevante a percepção da realidade concreta, seja ela externa ou interna, ditando simultaneamente a solução jurídica, normalmente através da formulação de um juízo de valor.
VIII - A inclusão na fundamentação de facto constante da sentença de matéria de direito ou conclusiva configura uma deficiência da decisão, vício que é passível de ser conhecido, mesmo oficiosamente, pelo Tribunal da Relação, tal como decorre do art. 662º/2c) do C.P.Civil.
IX - Os “factos essenciais nucleares” devem ser alegados pelas partes, e só por estas, como obrigatoriamente impõe o disposto no art. 5º/1 do C.P.Civil, estando vedado ao Tribunal servir-se de factos essenciais que não foram alegados pelas partes.
X - A desistência da empreitada por parte do dono da obra, prevista no art. 1229º do C.Civil, constitui uma situação sui generis, cujo objectivo é apenas o de conceder ao dono da obra a faculdade de, a todo o tempo (quer a obra ainda não tenha sido iniciada, quer a obra já esteja a ser executada), decidir que não quer prosseguir com a empreitada para o futuro, decisão essa que pode alicerçar-se nas mais variadas causas (mudança de vida, ou alteração das condições económicas, ou prosseguir mas com outro empreiteiro, ou realizar a obra por outra forma, etc), mas sendo certo que não tem necessidade de indicar a causa (razão ou justificação) para tal e que não tem efectuar qualquer aviso prévio.
XI – Como o citado art. 1229º não consagra a exigência de uma forma especial ou de formalidade específica, a desistência do dono da obra é uma declaração negocial que pode ser feita por qualquer dos meios previstos no art. 217º do C.Civil e, por via disso, pode depreender-se da adopção de uma conduta reveladora de desinteresse na prestação e é aferível mediante apelo às regras legais da interpretação da declaração negocial estabelecidas no art 236º do C.Civil.
XII – Resulta do art. 1214º do C.Civil que o empreiteiro não tem a faculdade de introduzir unilateralmente alterações ao «plano convencionado» para a obra, ou seja, as alterações da sua iniciativa não podem ser feitas sem a autorização do dono da obra. Se o empreiteiro as fizer sem essa autorização, a obra é considerada como defeituosa e o empreiteiro fica sujeito a que o dono da obra exerça os direitos estipuladas nos arts. 1221º e ss. do C.Civil, concedendo-se, porém, a este a opção de, querendo, aceitar a obra com as alterações introduzidas pelo empreiteiro, sendo que esta opção não implica nem o aumento do preço a pagar nem a obrigação de indemnização com fundamento em enriquecimento sem causa (no caso de ter aumentado o valor da obra).
XIII - As alterações necessárias ao «plano convencionado» previstas no art. 1215º do C.Civil advêm de razões objectivas estritamente conexionadas com direitos de terceiro ou com as regras técnicas aplicáveis na execução da obra.
XIV - Verificada a necessidade de alterar o plano de obra convencionado, colocam-se duas hipóteses: ou as partes acordam quanto às alterações, quanto à modificação do preço, e quanto a prazo de execução, sendo que, neste caso, estar-se-á perante uma modificação do negócio jurídico derivada do mútuo consenso (cfr. art. 406º/1 do C.Civil) e que segue as regras gerais, designadamente da liberdade de forma (cfr. arts. 219º e 222º/2 do C.Civil); ou, não alcançando acordo, compete ao Tribunal determinar as alterações que, por necessárias, devem ser introduzidas no plano convencionado e fixar as inerentes modificações do preço e do prazo de execução.

Texto Integral


ACÓRDÃO[1]
(Proc. nº27045/23.0YIPRT.G1)

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ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES,
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1. RELATÓRIO

1.1. Da Decisão Impugnada

A Autora FUROS DE ÁGUA EMP01..., LDA apresentou requerimento de injunção contra a Ré AA pedindo a «condenação da Requerida no pagamento da quantia de € 11.297,97, sendo € 10.870,74 referente a capital, sendo € 325,23 referente a juros de mora até à presente data, e sendo € 102,00 referente a taxa de justiça paga».
Fundamentou a sua pretensão, essencialmente, no seguinte: «em inícios de maio de 2022 a Requerida contactou a Requerente para que lhe fornecesse orçamento para a execução de um furo de captação de água e instalação da parte eléctrica, a executar no prédio sitio na freguesia ..., na Travessa ..., ..., ...; em 17/05/2022 a Requerente apresentou orçamento datado de 16/05/2022, com a descrição dos preços unitários, com uma previsão para perfuração e revestimento para 150 metros e isolamento para previsão de 9 metros e parte eléctrica para 150 metros de perfuração, e caso fosse necessário perfurar mais metros para atingir o caudal mínimo de água garantido ou o bom funcionamento do furo, seriam os metros perfurados e os materiais, que ultrapassassem a previsão dos 150 metros, pagos aos preços unitários apresentados no orçamento; de acordo com o orçamento provisional a requerida, na pessoa do seu marido BB, contratualizou verbalmente a requerente para a execução do furo para captação de água; a Requerente executou entre os dias 13 e 18 de outubro de 2022, perfuração com 205 metros; foi necessário perfurar mais metros do que estava no orçamento provisional, para obter o caudal mínimo garantido, colocar mais metros de isolamento, face à natureza do terreno, tudo por ser necessário para atingir o caudal mínimo garantido e o bom funcionamento do furo, tendo a Requerente informado a Requerida, na pessoa do marido, dessa necessidade, e que o valor dos trabalhos seriam superiores ao orçamento provisional, face a necessidade de acréscimo dos metros de perfuração, revestimento e isolamento, e que os metros, de perfuração, de revestimento e isolamento, acima dos 150 metros, seriam pagos aos preços unitários especificados no orçamento, o que foi aceite pela requerida; face ao acordado a requerente perfurou até aos 205 metros, tendo atingido o caudal mínimo garantido, tendo informado a Requerida, na pessoa do seu marido, dos metros perfurados e que o furo debitava acima do mínimo de água garantida, 6.000 litros dia; a Requerente emitiu em 25/10/2022 a fatura n.º ...39 no valor de € 10.870,74, referente aos trabalhos dos 205 metros de perfuração, revestimento e isolamento, que foi entregue à Requerida em 25/10/2022; a Requerida informou que contestava a fatura porque apenas pretendia pagar o valor que estava no orçamento com previsão para 150 metros de perfuração».
A Ré deduziu oposição, pugnando por: «a - julgar-se procedente por provada a exceção perentória arguida em b.1.1) desta oposição, com todos os devidos e legais efeitos; b - julgar-se procedente por provada a exceção perentória arguida em b.1.2) desta oposição, com todos os devidos e legais efeitos; e c - caso assim não se entenda, julgar-se o procedimento de injunção oponido improcedente por não provado, com todas as consequências legais».
Fundamentou a sua defesa, essencialmente, no seguinte: «a oponente e o seu namorado BB decidiram comprar o prédio urbano sito na Travessa ..., freguesia ..., concelho ..., inscrito na matriz sob o artigo ...50 e descrito na CRP ... sob o n.º ...14; em 10/05/2022, a oponente e o referido BB contactaram com a oponida, solicitando orçamento para captação de um furo de água e instalação dos sistemas necessários à obtenção de “água na torneira”; por diversas vezes, BB foi perentório ao afirmar, perante o sondador CC que não poderiam existir surpresas com orçamentos ou trabalhos mal executados e que os preços eventualmente em causa teriam já de prever o resultado pretendido; os trabalhos contratados previam não só a execução do dito furo de captação de águas, mas também a execução da parte elétrica do mesmo, de modo que o prédio pudesse beneficiar do resultado pretendido, o que nunca sucedeu; a oponida procedeu apenas à perfuração do solo para captação de águas, sem ter procedido à referida instalação elétrica que permitiria à oponida e seu namorado beneficiarem de “água na torneira”; os trabalhos contratados junto da oponida não se encontram ainda devidamente concluídos, pelo que a fatura reclamada não se encontra vencida; como consequência da não conclusão definitiva dos trabalhos contratados, a oponente e o seu namorado BB terão de contratar terceiros para tal efeito, suportando todos os custos inerentes, o que resulta num acréscimo compreendido entre os € 5.000,00 e os € 6.000,00; para além do valor de € 36,00, quaisquer outras divergências de valores referentes ao orçamento de 16.05.2022, nunca foram comunicadas pela oponida e/ou aceites pela oponente ou pelo seu namorado; sempre lhes foi referido que mediante um furo de captação de água, com profundidade de 150 metros, o caudal mínimo de água diário de 6 (seis) litros seria garantido; um terceiro, supostamente responsável pela execução da parte elétrica dos serviços em questão, compareceu no prédio e transmitiu-lhes que as medições em questão teriam sido efetuadas de forma deficiente, solicitando-lhes que voltassem a contactar com o CC para solucionar o problema; o CC deslocou-se ao prédio referindo à oponente e seu namorado que por efeito dessas erradas medições, seria necessário alterar a bomba elétrica do referido furo para uma “bomba membrana”, surpreendendo-os para o efeito com uma fatura no valor total de € 15.350,00, que foi recusada e contestada pela oponente e BB, após o que, e sem que nada o fizesse prever, a oponida emitiu e remeteu à oponente a fatura n.º ...39, de 25.10.2022, no valor de € 10.870,74; a oponida nunca executou os trabalhos da “parte elétrica até à boca do furo”, a que se havia comprometido com a oponente, pelo que a oponente e BB encontram-se impedidos de obter o fornecimento de água diretamente nas torneiras, chuveiros, entre outros, do prédio; a fatura reclamada nestes autos não corresponde à verdade porque o furo de águas não tem a profundidade de 205 metros; pela existência de água até 184 metros de profundidade conclui-se que, a perfuração de mais metros, tal como preconizado pela oponida, demonstra-se desnecessária».
Perante a dedução de oposição, os presentes autos passaram a seguir termos como acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato.
Após ter sido notificada para se pronunciar sobre a matéria de excepção vertida na oposição, a Autora apresentou articulado de resposta, pugnando pela improcedência das excepções invocadas pela Ré.
Na data de 22/11/2023, o Tribunal a quo proferiu despacho a afirmar, em termos tabulares, a verificação dos pressupostos processuais, a fixar o valor da causa em € 11.297,97 e a designar data para a realização da audiência final.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença com o seguinte decisório:
“Pelo exposto, julgo procedente a presente acção e, em consequência:
a) Condeno a Ré AA., a pagar à autora Furos de Água EMP01..., Lda a quantia de €10.870,74, acrescida de juros de mora comerciais, desde a data de vencimento da fatura até efectivo e integral pagamento.
(…)”.
*
1.2. Do Recurso da Ré

Inconformada com a sentença, a Ré interpôs recurso de apelação, pedindo que “de harmonia com as razões expostas deve conceder-se provimento à apelação, revogando-se a sentença proferida e por tal efeito: - declarar-se a nulidade da sentença recorrida, conforme alegado na alínea d.1) das presentes alegações de recurso, com todos os devidos efeitos legais; - declarar-se a nulidade da sentença recorrida, conforme alegado na alínea d.2) das presentes alegações de recurso, com todos os devidos efeitos legais; - declarar-se a nulidade da sentença recorrida, conforme alegado na alínea d.3) das presentes alegações de recurso, com todos os devidos efeitos legais; - decidir-se conforme expresso nas conclusões deste recurso, com todos os devidos e legais efeitos; - em todo o caso, julgar-se improcedente por não provada a ação objeto dos autos”, e formulando as seguintes conclusões no final das respectivas alegações:
1.ª - As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente devem ser fundamentadas, sendo nula a sentença que não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão
- vd. n.º 1, art.º 205.º CRP
- vd. n.º 1, art.º 154.º CPC
- vd. n.º 4, art.º 607 e al. b), n.º 1, art.º 615.º CPC
2.ª - A motivação da decisão de facto da sentença recorrida é omissa em relação aos pontos 13. a 21. dos factos provados, bem como é omissa em relação às alíneas A) a C) dos factos não provados pelo tribunal “a quo”
3.ª - Tal impossibilita a revelação das razões que levaram o tribunal recorrido a considerar cada um dos referidos pontos de facto como provados e não provados, pelo que a sentença recorrida é ilegal e nula, nulidade que se invoca com todos os devidos efeitos legais
- vd. n.º 4, art.º 607 e al. b), n.º 1, art.º 615.º CPC
- vd. Ac. STJ, de 18.04.2006, proc. n.º 06A871
4.ª - O juiz deve conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, sendo nula a sentença quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar
- vd. n.º 2, art.º 608.º CPC
- vd. al. d), n.º 1, art.º 615.º, ex vi n.º 2, art.º 608.º CPC
5.ª - Em sede de oposição, a recorrente peticionou, concreta e especificamente, que se julgassem procedentes por provadas duas exceções perentórias, sendo que a lei impõe que o tribunal “a quo” conheça oficiosamente das mesmas
- cfr. ref.ª Citius 185134889
- vd. art.º 579.º CPC
6.ª - Todas as pretensões processuais das partes, nas quais se incluem, pedidos, exceções e reconvenção têm de ser apreciadas, contudo, a sentença recorrida é omissa quanto à apreciação das exceções perentórias peticionadas pela recorrente nos autos
- vd. Ac. TR de Lisboa, de 22.06.2023, proc. n.º 12225/21.0T8SNT.L1-2
7.ª - A sentença recorrida é, por isso, ilegal e nula, nulidade essa que se argui com todos os devidos efeitos legais
- vd. al. d), n.º 1, art.º 615.º, ex vi n.º 2, art.º 608.º CPC
- vd. art.º 579.º CPC
8.ª - A recorrida peticionou nos autos o pagamento da fatura n.º ...39, no valor de € 10.870,74, da qual se pode ler que as quantidades concretamente faturadas foram de 205 metros perfurados
- cfr. ponto 16.º do procedimento inicial de injunção
- cfr. pedido do procedimento inicial de injunção
- cfr. doc. n.º 3 junto à oposição da recorrente
9.ª - Em sede de oposição, a recorrente alegou que o furo em questão não tem 205 metros de profundidade e que a fatura reclamada nos autos não corresponde à verdade, tendo sido fraudulentamente emitida pela recorrida, o que consubstancia exceção perentória
- cfr. pontos 68.º a 72.º da oposição da recorrente
- cfr. pontos 73.º e 74.º da oposição da recorrente
- cfr. al. b), pedido da oposição da recorrente
10.ª - Seguindo o entendimento do tribunal “a quo”, nomeadamente, nos pontos 13. a 16. da matéria de facto provada na sentença recorrida, nunca se poderá concluir que a recorrida haja perfurado 205 metros de profundidade, nem que haja perfurado 55 metros a mais, uma vez que:
a) 149m + 30m= 179m
b) 179 x 10% = 17,9m
TOTAL: 179m + 17,9m = 196,9 metros
c) 30m + 17,9m = 47,9 metros
11.ª - Os fundamentos da decisão relativa aos pontos 13. a 16. da matéria de facto encontram-se em oposição expressa com a decisão recorrida, pelo que, a sentença recorrida é nula, nulidade essa que se invoca com todos os legais efeitos
- vd. al. c), n.º 1, art.º 615.º CPC
12.ª - O fim último de qualquer processo judicial é a busca pela verdade material e a justa composição do litígio, pelo que, a matéria de facto provada e não provada pelo tribunal “a quo” deve ser alterada, visto que, nos autos foi produzida prova mais do que suficiente para sustentar determinados pontos de facto considerados não provados e de afastar ou, pelo menos, modificar certos pontos de facto considerados provados pelo tribunal recorrido
- vd. n.º 2, art.º 5.º CPC
13.ª - O tribunal “a quo” julgou provados os pontos 10. e 11. da matéria de facto provada na sentença recorrida, pois que considerou os mesmos aceites por acordo das partes, atenta a posição vertida nos respetivos articulados, o que não se verifica e resulta de erro de julgamento e de incorreta interpretação e apreciação, quer dos articulados das partes, quer da prova produzida nos autos
- cfr. motivação da sentença recorrida
14.ª - A recorrente alegou especificamente nos autos que os trabalhos contratados previam não só a execução do furo de captação de águas, mas também a execução da parte elétrica do mesmo, peticionando, inclusive, a procedência da exceção perentória referente à não conclusão dos trabalhos contratados
- cfr. ref.ªs Citius 185134889 e 15244422
15.ª - A recorrente solicitou à recorrida um orçamento para a execução de um furo de captação de água e instalação da parte elétrica até à boca do furo, tendo esse orçamento, e não apenas o referido em 5. da matéria de facto provada na sentença recorrida, sido lido, aceite e assinado pela recorrente e pelo seu companheiro BB
- cfr. ponto 2. da matéria de facto provada na sentença recorrida
- cfr. doc. n.º 1 junto à oposição da recorrente
16.ª - Os pontos 10. e 11. da matéria de facto provada encontram-se em contradição com o ponto 2. da matéria de facto provada na sentença recorrida, encontram-se em contradição com o documento n.º 1 junto à oposição da recorrente e, ainda, com o teor dos articulados carreados para os autos pela recorrente
17.ª - A prova testemunhal produzida nos autos foi inequívoca a sustentar que os trabalhos contratados pela recorrente à recorrida incluíam quer a execução do dito furo, quer a instalação da parte elétrica
- cfr. inquirição testemunha BB, realizada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 11:35 horas e fim às 12:10 horas, gravada no sistema Citius, com
interesse, 04:38min a 06:40min
- cfr. inquirição da testemunha DD, realizada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 12:11 horas e fim às 12:17 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 01:54min a 02:11min e 02:17min a 02:31min
18.ª - A recorrente ficou legitimamente convencida que os trabalhos contratados junto da recorrida incluíam quer a execução do dito furo, quer a instalação da parte elétrica
19.ª - Caso contrário, o objetivo do contrato nunca seria alcançado, pois que, sem a referida “parte elétrica”, o furo de captação de águas não é apto a atingir o resultado pretendido - “água na torneira” -, o que também resulta da inquirição das testemunhas arroladas nos autos pela própria recorrida
- cfr. inquirição da testemunha CC, realizada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 10:37 horas e fim às 11:10 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 15:37min a 16:53min, 16:59min a 17:32min, 17:38min a 17:50min e 28:11min a 28:25min
- cfr. inquirição da testemunha EE, realizada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 11:12 horas e fim às 11:35 horas, gravadas no sistema Citius, com interesse, 09:56min a 10:10min, 10:25min a 10:40min, 10:45min a 11:18min e 11:23min a 11:27min
20.ª - As testemunhas arroladas pela recorrida, CC e EE, admitiram expressamente nos autos que as únicas condições contratuais transmitidas à recorrente e por ela aceites foram as que constam do orçamento descrito em 5. e 6. da matéria de facto provada na sentença recorrida, do qual resulta a previsão para a execução de um furo de captação de água, mas também, para a instalação da parte elétrica até à boca do furo
- cfr. pontos 5. e 6. da matéria de facto provada na sentença recorrida
- cfr. inquirição da testemunha CC, realizada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 10:37 horas e fim às 11:10 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 15:37min a 16:53min, 16:59min a 17:32min, 17:38min a 17:50min e 28:11min a 28:25min
- cfr. inquirição da testemunha EE, realizada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 11:12 horas e fim às 11:35 horas, gravadas no sistema Citius, com interesse, 09:56min a 10:10min, 10:25min a 10:40min, 10:45min a 11:18min e 11:23min a 11:27min
21.ª - Nenhumas outras condições contratuais foram estabelecidas entre as partes, pelo que, de acordo com o princípio do cumprimento pontual dos contratos, a recorrida assumiu a obrigação de executar ambos os referidos trabalhos
- vd. n.º 1, art.º 406.º CC
22.ª - Atenta a importância de tal questão no objeto do litígio e na boa decisão da causa, devem os pontos 10. e 11. da matéria de facto provada da sentença recorrida ser alterados nos seguintes termos:
“10. A ré e o seu companheiro BB leram e assinaram o orçamento referido em 5. e 6.;
11. A ré e o seu companheiro BB, tendo por base o orçamento referido em 5. e 6., adjudicaram à autora a execução do dito furo e a instalação da parte elétrica até à boca do furo.”
23.ª - A lei, o sentido da lei, os articulados das partes e toda a prova produzida nos autos impõem conclusão diversa daquela a que chegou o tribunal recorrido ao dar como provados os pontos 13. a 16. da matéria de facto provada na sentença recorrida
24.ª - A redação dos pontos 13. a 16. da matéria de facto provada na sentença recorrida deveu-se a erro de julgamento e errónea interpretação e aplicação da lei aplicável in casu, bem como a errónea valoração de prova produzida nos autos
25.ª - No caso concreto, estamos no âmbito da responsabilidade civil contratual cujos pressupostos são:
i) o facto ilícito, constituído pela omissão do zelo exigível
ii) a culpa, que se presume
iii) o dano
iv) o nexo de causalidade entre o facto e o dano
- vd. Ac. TR de Coimbra, de 19.12.2012, proc. n.º 298/10.6TBAGN.C1
26.ª - In casu, estamos perante um contrato de empreitada, mediante o qual o empreiteiro encontra-se adstrito a uma obrigação de resultado, devendo a obra ser executada em conformidade com o que foi acordado, sem vícios que reduzam o seu valor ou a sua aptidão para o fim pretendido
- vd. art.º 1208.º CC
27.ª - Incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de sua culpa, pelo que, contrariamente ao decidido na sentença recorrida, era à recorrida que incumbia provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procedeu de sua culpa
 - vd. art.º 799.º CC
28.ª - Àquele que invoca um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do mesmo, pelo que, cabia à recorrida demonstrar nos autos, entre o mais, que procedeu à perfuração de 205 metros, que o caudal mínimo contratado surgiu aos 149 metros de perfuração e que por razões técnicas houve necessidade de perfurar 55 metros a mais
- vd. n.º 1, art.º 342.º CC
29.ª - À recorrente nunca foi transmitido da alegada necessidade de perfurar mais 30 metros para a caixa de água e mais 10% do total perfurado para o bom funcionamento da bomba elétrica, o que resulta inequivocamente do documento n.º 1 junto à oposição da recorrente, bem como da inquirição das testemunhas da recorrida
- cfr. doc. n.º 1 junto à oposição da recorrente
- cfr. inquirição da testemunha CC, realizada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 10:37 horas e fim às 11:10 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 15:37min a 15:40min, 16:48min a 16:50min, 16:51min, 16:52min, 16:53min, 16:59min a 17:01min e 17:02min
- cfr. inquirição da testemunha EE, realizada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 11:12 horas e fim às 11:35 horas, gravadas no sistema Citius, com interesse, 10:00min a 10:10min, 10:25min a 10:37min, 10:37min a 10:40min e 10:45min a 10:47min
30.ª - O que dizendo alegadamente respeito às legis artis aplicáveis sempre deveria ter sido transmitido à recorrente ou ao seu companheiro, o que nunca foi, pelo que, nunca estes tomaram conhecimento de tal factualidade e, consequentemente, também nunca a aceitaram
- vd. art.º 236.º CC
31.ª - O tribunal “a quo” valorou, inexplicavelmente, o depoimento das testemunhas arroladas pela recorrida, quando os seus depoimentos se encontram repletos de contradições e foram prestados sob “pressão” da subordinação jurídica dessas testemunhas à recorrida sociedade - cfr. sentença recorrida
32.ª - Nos autos inexiste qualquer documento comprovativo dessa alegada necessidade de perfurar mais 30 metros para a caixa de água e mais 10% do total perfurado para o bom funcionamento da bomba elétrica, como por exemplo, estudos técnicos e recomendações dos produtores dessa bomba elétrica
33.ª - A recorrida limitou-se a invocar essa alegada necessidade em perfurar a mais, de forma genérica, abstrata e sem a inerente prova, o que não é legalmente admissível
34.ª - A ser verdade que para o bom funcionamento da bomba elétrica seja alegadamente aconselhável pelos fabricantes da mesma perfurar mais metros, a recorrida teria de ter em sua posse tais recomendações, o que não tem, nem alguma vez foram as mesmas juntas aos autos
35.ª - Tais recomendações a existirem, o que não existem, são prévias ao contrato estabelecido entre a recorrida e a recorrente, pelo que, naturalmente, deveriam ter sido transmitidas à recorrente, o que nunca foram
36.ª - A redação do ponto 15. da matéria de facto provada na sentença recorrida encontra-se matematicamente incorreta, pelo que, nunca poderia o tribunal “a quo” ter considerado provado que a recorrida houvesse perfurado 55 metros a mais, num total de 205 metros, pois que:
a) 149m + 30m= 179m
b) 179 x 10% = 17,9m
TOTAL: 179m + 17,9m = 196,9 metros
c) 30m + 17,9m = 47,9 metros
37.ª - Os pontos 13. a 16. da matéria de facto provada na sentença recorrida não fazem o menor sentido lógico ou dedutivo, encontrando-se infundamentados por recurso a regras de raciocínio lógico e matemático
38.ª - O próprio tribunal recorrido não ficou esclarecido da alegada necessidade de perfurar a mais 55 metros, o que contraria a sentença recorrida
- cfr. inquirição da testemunha FF, prestada na audiência de julgamento de 06.02.2024, com início às 15:45 horas e fim às 16:12 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 17:48min a 18:04min, 16:58min a 17:11min, 17:27min a 17:35min, 18:18min a 20:15min, 20:34min a 20:56min e 21:06min a 21:25min
39.ª - A testemunha CC, arrolada pela recorrida, acabou mesmo por contradizer a fatura reclamada nos autos, admitindo expressamente em plena audiência de julgamento que o furo em questão tem apenas 200 metros de profundidade
- cfr. inquirição da testemunha CC, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 10:37 horas e fim às 11:10 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 27:18min a 27:30min
40.ª - Assim, o tribunal “a quo” não poderia ter ficado convencido que o furo em causa tem, supostamente, 205 metros de profundidade
41.ª - Nos autos inexiste qualquer prova que demonstre efetivamente que:
- a recorrida haja perfurado o total de 205 metros
- a recorrida haja perfurado 55 metros a mais
- a água tenha aparecido aos 149 metros de perfuração, com caudal mínimo de 6.000L/dia
- os revestimentos e isolamentos alegadamente aplicados no furo de captação de água são os expressos na fatura reclamada
42.ª - A recorrente requereu prova apta a demonstrar a concreta profundidade da perfuração em causa nos autos, a concreta profundidade do “furo” quando foi alegadamente atingido o caudal mínimo garantido e os concretos revestimentos e isolamentos que foram alegadamente aplicados no dito furo
- cfr. alíneas c) e d) do requerimento probatório da oposição da recorrente, ref.ª Citius 185134889
43.ª - A prova requerida pela recorrente era, inclusive, apta a favorecer a recorrida, permitindo-lhe sustentar os valores peticionados e constantes da fatura reclamada nos autos
44.ª - Em 25.09.2023, o tribunal “a quo” ordenou a junção aos autos dos documentos de suporte que fundamentam a fatura n.º ...39, de 25.20.2022, no valor de € 10.870,74, da qual resultam 205 metros de perfuração, com revestimento de 140mm e isolamento de 180mm x 7,5kg
- cfr. ref.ª Citius 186070691
45.ª - A recorrida nunca juntou aos autos tais documentos de suporte e os mesmos nem sequer existem, o que foi expressamente admitido pelas testemunhas arroladas pela recorrida
- cfr. inquirição da testemunha FF, prestada na audiência de julgamento de 06.02.2024, com início às 15:45 horas e fim às 16:12 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 17:48min a 18:04min, 24:18min a 24:36min, 25:00min a 25:22min, 25:26min a 25:44min, 26:03min a 26:34min, 26:14min e 26:15min a 26:39min
- cfr. inquirição da testemunha CC, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 10:37 horas e fim às 11:10 horas, grava no sistema Citius, com interesse, 20:10min a 20:19min, 20:23min a 21:25min, 21:32min a 21:43min, 21:53min a 24:20min, 24:23min a 24:27min, 24:34min, 25:54min a 26:11min, 27:20min, 27:21min, 30:35min a 30:45min, 31:01min, 31:05min a 31:10min, 31:59min a 32:07min, 32:30min a 32:35min e 32:50min a 33:11min
- cfr inquirição da testemunha EE, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 11:12 horas e fim às 11:35 horas, gravadas no sistema Citius, com interesse, 10:00min a 10:10min, 10:37min a 10:40min, 11:31min a 11:43min, 12:01min a 12:04min, 12:19min a 12:26min, 12:35min, 12:36min a 12:54min, 12:59min a 13:15min, 13:20min a 13:38min, 13:39min a 13:43min, 13:47min a  13:57min, 14:05min, 16:52min, 18:17min a 18:40min, 18:56min a 19:39min, 19:57min a 20:03min, 20:47min a 20:54min e 21:13min a 21:42min
46.ª - A testemunha CC, arrolada pela recorrida sociedade, reiterou em plena audiência de julgamento, em síntese, que:
- os trabalhos a mais ou a menos e respetivos preços teriam de ser comunicados com antecedência
- não existe qualquer documento ou comunicação que comprove a informação a BB da necessidade de terem de ser perfurados 55 metros a mais ou do respetivo aumento de preço
- existiu uma comunicação escrita a informar BB de um aumento de € 36,00 no valor do orçamento, mas não de um aumento de € 2.000,00
 - não existem quaisquer registos de que a veia de água tenha aparecido aos 149 metros de perfuração
- o furo em questão nos autos tem 200 metros de profundidade
- não se recorda do dia em que alegadamente efetuou a referida chamada telefónica a BB
- não existem quaisquer documentos de suporte que sustentem que o furo em discussão nos autos tenha 205 metros
- cfr. inquirição da testemunha CC, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 10:37 horas e fim às 11:10 horas, gravadas no sistema Citius, com interesse, 20:10min a 20:19min, 20:23min a 21:25min, 21:32min a 21:43min, 21:53min a 24:20min, 24:23min a 24:27min, 24:34min, 25:54min a 26:11min, 27:20min, 27:21min, 30:35min a 30:45min, 31:01min, 31:05min a 31:10min, 31:59min a 32:07min, 32:30min a 32:35min e 32:50min a 33:11min
47.ª - A testemunha EE, arrolada pela recorrida, reiterou nos autos, em suma, que:
- não existem outras condições contratuais em causa que não as do “orçamento” referido em 5. e 6. da matéria de facto provada na sentença recorrida
- não existem quaisquer documentos comprovativos da necessidade de perfurar até 100, 150, ou 200 metros de profundidade
- não existem quaisquer documentos capazes de sustentar que a recorrente ou BB hajam sido informados da necessidade de perfurar até 205 metros de profundidade, nem do respetivo preço
- não existe qualquer documento comprovativo que demonstre que a recorrente ou BB hajam consentido ou anuído na perfuração a mais
- não existem quaisquer registos de perfuração que permitam sustentar o cálculo da profundidade do dito furo
- não existem quaisquer documentos que justifiquem o número de “varas” gastas na perfuração do dito furo
- o documento n.º 6 junto ao requerimento da recorrida de 11.10.2023 constitui um documento escrito à mão, sem qualquer documento de suporte que o justifique e que se destina meramente ao uso interno da recorrida sociedade
- cfr inquirição da testemunha EE, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 11:12 horas e fim às 11:35 horas, gravadas no sistema Citius, com interesse, 10:00min a 10:10min, 10:37min a 10:40min, 11:31min a 11:43min, 12:01min a 12:04min, 12:19min a 12:26min, 12:35min, 12:36min a 12:54min, 12:59min a 13:15min, 13:20min a 13:38min, 13:39min a 13:43min, 13:47min a 13:57min, 14:05min, 16:52min, 18:17min a 18:40min, 18:56min a 19:39min, 19:57min a 20:03min, 20:47min a 20:54min e 21:13min a 21:42min
48.ª - Contrariamente ao decidido na sentença recorrida, os depoimentos das testemunhas arroladas pela recorrida são desprovidos de qualquer sentido lógico-dedutivo e encontram-se repletos de contradições
49.ª - A testemunha FF começou por afirmar que perfurou 40 metros a mais, para mais tarde alegar que perfurou já 50 metros a mais
- cfr. inquirição da testemunha FF, prestada na audiência de julgamento de 06.02.2024, com início às 15:45 horas e fim às 16:12 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 20:04min a 20:15min e 21:06min a 21:13min
50.ª - Da inquirição da testemunha FF existe contradição expressa ou, pelo menos, incerteza relativamente aos metros alegadamente perfurados a mais e da mesma resulta também que a recorrida não procedeu à perfuração dos 205 metros expressos na fatura reclamada nos autos, pois que:
a) 149m + 40m = 189m
ou
b) 149m + 50m = 199m
51.ª - A testemunha CC referiu nos autos que elaborou o “orçamento” e que o furo tem alegadamente 200 metros, o que contraria o teor da fatura reclamada nos autos com indicação de 205 metros perfurados e contradiz expressamente a inquirição da testemunha EE
- cfr. inquirição da testemunha CC, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 10:37 horas e fim às 11:10 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 04:03min a 04:07min e 27:20min a 27:21min
- cfr inquirição da testemunha EE, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 11:12 horas e fim às 11:35 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 01:56min a 02:03min
52.ª - A testemunha EE referiu que nunca recebeu qualquer reclamação em relação à fatura descrita nos autos
- cfr inquirição da testemunha EE, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 11:12 horas e fim às 11:35 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 05:11min a 05:30min
53.ª - A referida testemunha aduziu, pois, em plena audiência de julgamento factos falsos e que se encontram em contradição expressa com o ponto 13.º do requerimento de injunção inicial e com o documento junto aos autos em 26.10.2023 pela recorrente
- cfr. ponto 13.º requerimento de injunção inicial
- cfr. doc. junto ao requerimento da recorrente de 26.10.2023, ref.ª Citius 15244422
54.ª - A contradição, falta de lógica argumentativa e até falsidade dos depoimentos das testemunhas arroladas pela recorrida é justificada pela subordinação jurídica que as mesmas estão sujeitas perante a recorrida, no âmbito da sua atividade profissional
55.ª - A testemunha GG referiu expressamente nos autos que o dito furo não tem 205 metros de profundidade e que no local não existe necessidade de perfurar mais do que 100 metros para atingir a veia de água
- cfr. inquirição da testemunha GG, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 12:18 horas e fim às 12:22 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 02:04min a 02:13min, 02:19min a 02:20min, 02:27min a 02:59min, 03:06min a 03:10min, 03:10min e 03:12min a 03:38min
56.ª - A inquirição da testemunha GG corrobora em parte a inquirição da testemunha CC ao reiterar nos autos que o furo não tem 205 metros de profundidade e corrobora também o documento n.º 2, elaborado pela “Agência Portuguesa do Ambiente”, junto autos pela recorrida, em 11.10.2023, ao confirmar que, no local, o estado subterrâneo da massa de água, aos 100 metros de profundidade, é bom
- cfr. ref.ª Citius 15163964
57.ª - O documento n.º 2, da “Agência Portuguesa do Ambiente”, junto autos pela recorrida, em 11.10.2023, é um documento exarado por autoridade ou instituição pública com competência para o efeito, constituindo documento autêntico, com força probatória plena
- vd. art.ºs 369.º e ss. CC e art.º 371.º CC
58.ª - No local do dito furo, aos 100 metros de profundidade, o estado da massa de água é bom, daí que, nos prédios vizinhos, o caudal mínimo seja atingido a essa profundidade, tal como relatado pela testemunha GG
59.ª - O documento elaborado pela “Agência Portuguesa do Ambiente” encontra-se sustentado por medições e previsões aritméticas e geológicas
60.ª - A testemunha DD consignou nos autos, em suma, que:
- BB referiu à testemunha CC, na sua presença, que o valor do orçamento não poderia ser ultrapassado
- BB ficou convencido que os trabalhos do “orçamento” seriam feitos
- a instalação da parte elétrica até à boca do furo constante do “orçamento” não foi concluída
- apesar de estar presente na obra, nunca ouviu a testemunha CC a referir a BB que seria necessário perfurar mais 50 metros, nem a informar este último do respetivo acréscimo de valor
- cfr. inquirição da testemunha DD, prestada na audiência de 21.02.2024, com início às 12:11 horas e fim às 12:17 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 01:18min a 01:31min, 01:35min a 02:11min, 02:14min a 02:31min, 03:59min a 04:14min, 04:16min, 04:19min e 04:20min a 04:33min
61.ª - A inquirição da testemunha DD foi corroborada pela inquirição da testemunha BB e, pelo menos em parte, pela inquirição da testemunha CC
- cfr. inquirição da testemunha BB, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 11:35 horas e fim às 12:10 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 05:14min a 05:20min, 07:00min a 11:26min, 11:31min a 11:58min, 13:50min a 14:17min, 15:23min a 15:42min, 15:47min a 16:29min, 16:43min a 17:02min, 17:32min a 17:51min, 20:00min a 20:26min, 26:48min a 27:00min, 27:06min a 27:24min e 27:43min a 27:47min
- cfr. inquirição da testemunha CC, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 10:37 horas e fim às 11:10 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 04:43min a 05:12min, 24:46min a 25:39min
62.ª - Os trabalhos contratados pela recorrente incluíam não só a execução do dito furo, mas também a instalação da parte elétrica, de acordo com o orçamento referido em 5. e 6. da matéria de facto provada e qualquer desvio a esse orçamento teria de ser comunicado á recorrente ou seu companheiro
63.ª - Por revestir importância no objeto do litígio e na boa decisão da causa, devem os pontos 13. a 16. da matéria de facto provada serem eliminados, passando a fazer parte integrante da matéria de facto não provada na sentença recorrida.
64.ª - Caso assim não se entenda, devem os pontos 13. a 16. da matéria de facto provada da sentença recorrida serem alterados nos seguintes termos:
“13. Na sequência da leitura, assinatura e aceitação pela ré e seu companheiro BB do orçamento referido em 5. e 6., a autora entre os dias 13 e 18 de outubro de 2022
procedeu à execução de um furo de captação de água no prédio da ré;
14. Aquando da execução do dito furo, a água apareceu com caudal mínimo.
15. (eliminado);
16. A autora concluiu a execução do furo de captação de água;”
65.ª - O tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento e errónea interpretação da prova produzida nos autos ao considerar provado o ponto 18. Da matéria de facto provada na sentença recorrida
66.ª - A recorrida elaborou internamente o orçamento descrito em 17. Da matéria de facto provada na sentença recorrida, mas nunca o entregou à recorrente ou ao seu companheiro BB, pois que esse orçamento:
- é desprovido de qualquer certificação de data
- é desprovido de qualquer certificação de envio (e-mail ou ...)
- é desprovido de qualquer comprovativo de entrega ou receção por parte da recorrente ou do seu companheiro BB
- foi concretamente impugnado pela recorrente, em 26.10.2023
- cfr. ref.ª Citius 15244422
- cfr. doc. n.º 3, junto ao requerimento da recorrida de 11.10.2023, ref.ª Citius 15163964
67.ª - Resulta dos autos uma total ausência de prova em relação ao ponto 18. da matéria de facto provada da sentença recorrida, bem como inexiste nos autos qualquer prova capaz de sustentar a não adjudicação da instalação da parte elétrica
68.ª - Por revestir manifesta importância no objeto do litígio e na boa decisão da causa, deve o ponto 18. da matéria de facto provada ser eliminado, passando a fazer parte integrante da matéria de facto não provada na sentença recorrida
69.ª - Dos autos resultam factos comprovados e que não foram atendidos ou sequer considerados pelo tribunal “a quo”, com preponderância na justa composição do litígio, que resultaram da instrução da causa, foram admitidos pela recorrida, que resultam da prova documental e testemunhal produzida nos autos e, ainda, da normalidade da vida e das regras da experiência comum
70.ª - Por terem influência direta no bom desfecho do litígio, tais factos deveriam ter sido considerados provados pelo tribunal recorrido, o que, surpreendentemente, não foram
71.ª - Resultou efetivamente demonstrado nos autos que a recorrente contestou, devolveu e requereu à recorrida a anulação da fatura descrita em 20. Da matéria de facto provada na sentença recorrida
- cfr. ponto 13.º do procedimento de injunção inicial
- cfr. doc. junto ao requerimento da recorrente de 26.10.2023, ref.ª Citius 15244422
72.ª - Pela importância que tal factualidade reveste na busca da verdade material e na justa composição do litígio, à matéria de facto provada da sentença recorrida deve ser aditado o seguinte ponto de facto:
“Em 27.10.2022, a ré, por intermédio do seu mandatário, contestou, devolveu e requereu a anulação da fatura descrita em 20. junto da autora.”
73.ª - O furo de captação de águas objeto dos autos foi realizado de forma ilegal, o que é apto a violar o Princípio da Legalidade, orientador de todo o sistema jurisdicional português
- vd. art.ºs 3.º e 266.º CRP
- cfr. doc. n.º 2, junto ao requerimento da recorrida de 11.10.2023, ref.ª Citius 15163964
74.ª - Da “Autorização de Utilização dos Recursos Hídricos - Pesquisa e Captação de Água Subterrânea” resulta, em síntese, que o furo em questão nos autos estava apenas autorizado/licenciado para uma profundidade de 100 metros
- cfr. doc. n.º 2, junto ao requerimento da recorrida de 11.10.2023, ref.ª Citius 15163964
75.ª - A “Autorização de Utilização dos Recursos Hídricos - Pesquisa e Captação de Água Subterrânea” constitui um documento autêntico, com força probatória plena e com manifesta importância na boa decisão do pleito
- vd. art.ºs 369.º e ss. CC e art.º 371.º CC
76.ª - A recorrida peticiona nos autos o pagamento de um furo de captação de água com uma profundidade de 205 metros, quando esse furo apenas estava autorizado/licenciado para 100 metros de profundidade, o que não é legalmente admissível
77.ª - Pela importância que tal factualidade reveste na busca da verdade material e na justa composição do litígio, à matéria de facto provada da sentença recorrida deve ser aditado o seguinte ponto de facto:
“A autora apresentou pedido de licença na APA - Agência Portuguesa do Ambiente, o qual foi deferido para uma profundidade de 100 metros, com o processo n.º  ...22.RH..., utilização n.º ....”
78.ª - A alínea A) da matéria de facto não provada na sentença recorrida é confirmada pela total ausência de prova nos autos capaz de demonstrar o seu inverso, foi expressamente admitida pela testemunha CC e foi corroborada pela testemunha DD
- cfr. inquirição da testemunha CC, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 10:37 horas e fim às 11:10 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 24:46min a 25:19min
- cfr. inquirição da testemunha DD, prestada na audiência de 21.02.2024, com início às 12:11 horas e fim às 12:17 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 01:18min a 01:31min, 01:35min a 01:44min, 01:48min, 01:54min a 02:11min, 02:14min a 02:16min, 03:59min a 04:14m, 04:16min e 04:19min a 04:33min
79.ª - Tendo existido uma comunicação da recorrida a informar a recorrente de um aumento do “orçamento” no valor de € 36,00, então, o aumento do respetivo preço em 55 metros de profundidade teria também de ser precedido de informação nesse sentido, o que não se verificou e é desconforme às regras da experiência comum, ao normal sentido da vida em sociedade e às boas práticas comerciais
- cfr. doc. n.º 2 junto à oposição da recorrente
80.ª - Pela importância que tal factualidade reveste na busca da verdade material e na justa composição do litígio, deve a alínea A) da matéria de facto não provada ser eliminada do elenco dos factos não provados, passando a fazer parte integrante do elenco dos factos provados na sentença recorrida
81.ª - Em respeito do Princípio da Economia Processual, a recorrente dá por integralmente reproduzido tudo o quanto alegou nas presentes alegações de recurso e respetivas conclusões, designadamente, aquilo que deixou dito na alínea d.4.1), ponto i) deste recurso, relativamente à impugnação dos pontos 10. e 11. da matéria de facto provada na sentença recorrida
82.ª - Pela importância que tal factualidade reveste na busca da verdade material e na justa composição do litígio, deve a alínea B) da matéria de facto não provada ser eliminada do elenco dos factos não provados, passando a fazer parte integrante do elenco dos factos provados na sentença recorrida
83.ª - O tribunal “a quo” cometeu erro notório de julgamento, de interpretação da lei e de apreciação e valoração da prova produzida em julgamento ao dar como não provada a alínea C) da matéria de facto não provada na sentença recorrida
84.ª - O tribunal “a quo” procedeu a manifesto erro de cálculo e de dedução lógica, dada a matéria de facto provada nos pontos 14. e 15. da sentença recorrida, que, por si só, impõe a prova da alínea C) dos factos não provados da sentença recorrida
85.ª - A recorrida nunca perfurou 205 metros e a testemunha CC admitiu nos autos que a perfuração tem 200 metros, ou seja, que tem uma profundidade inferior à que resulta da faturada reclamada nos autos
- cfr. inquirição da testemunha CC, prestada na audiência de julgamento de 21.02.2024, com início às 10:37 horas e fim às 11:10 horas, gravada no sistema Citius, com interesse, 27:18min a 27:min
86.ª - Tal demonstra que a recorrida procedeu à emissão abusiva da fatura reclamada nos autos, o que configura exceção perentória, como concretamente peticionado pela recorrente em sede de oposição
87.ª - Pela importância que tal factualidade reveste na busca da verdade material e na justa composição do litígio, deve a alínea C) da matéria de facto não provada ser eliminada do elenco dos factos não provados, passando a fazer parte integrante do elenco dos factos provados na sentença recorrida
88.ª - O contrato de empreitada é um contrato sinalagmático, do qual decorrem obrigações recíprocas e interrelacionadas para ambas as partes, obrigando-se uma das partes a realizar certa obra no tempo e modo convencionados, e a outra a pagar o respetivo preço
- vd. art.º 1207.º CC
89.ª - O empreiteiro vincula-se a uma obrigação de resultado, devendo a obra ter aptidão para o seu uso ordinário ou para o uso previsto no contrato e ser executada em conformidade com o que foi acordado, sem vícios que reduzam o seu valor ou a sua aptidão para o fim pretendido
- vd. art.º 1208.º CC
- vd. Ac. STJ, de 12.09.2013, proc. n.º 499/06.1TBFVN.C1.S1
90.ª - Foi com base no “orçamento” descrito em 5. e 6. da matéria de facto provada na sentença recorrida que a recorrente fundou a sua vontade de contratar e contratou a recorrida
91.ª - Esse “orçamento” prevê não só a execução do dito furo de captação de águas, mas também a instalação da respetiva parte elétrica, sendo este, pois, o resultado contratado pela recorrente junto da recorrida e nenhum outro
- cfr. doc. n.º 1 junto à oposição da recorrente
- vd. n.º 1, art.º 406.º CC
- vd. PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, “Código Civil Anotado”, Vol. I, 4.ª Edição Revista e Atualizada, págs. 373 e seguintes
92.ª - A satisfação do interesse do credor é a razão de ser da relação obrigacional, daí que o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que se vinculou
- vd. n.º 1, art.º 762.º CC
93.ª - A sentença recorrida, ao considerar que a recorrente apenas solicitou à recorrida a execução do dito furo, interpretou e aplicou incorretamente a lei e a jurisprudência aplicáveis no caso contrato
- vd. n.º 1, art.º 406.º; n.º 1, art.º 762.º e art.ºs 1207.º e 1208.º CC
- vd. Ac. STJ, de 12.09.2013, proc. n.º 499/06.1TBFVN.C1.S1
94.ª - A declaração negocial constitui um elemento do negócio jurídico, como manifestação de uma vontade, formada sem anomalias e coincidente com o sentido captado do respetivo comportamento
- vd. art.ºs 217.º, 224.º e 236.º CC
95.ª - A recorrente ficou legitimamente convencida que a recorrida iria proceder à execução do dito furo e instalação da respetiva parte elétrica, pelo que a sentença recorrida interpreta e aplica, novamente, de forma errónea a lei ao caso contrário- vd. art.ºs 217.º, 224.º e 236.º CC
96.ª - O empreiteiro não pode, sem autorização do dono da obra, proceder a alterações ao plano convencionado, que, in casu, previa a execução do furo de captação de água e a instalação da respetiva parte elétrica
- vd. n.º 1, art.º 1214.º CC
97.ª - Sem a instalação da parte elétrica, nunca o resultado pretendido seria alcançado, pelo que, a obra realizada pela recorrida é, pelo menos, defeituosa
- vd. n.º 2, art.º 1214.º CC
98.ª - A sentença recorrida determinou erradamente o objeto do negócio jurídico em causa, uma vez que o mesmo incluía não só a execução do dito furo de captação de água, mas também a instalação da respetiva parte elétrica
- cfr. doc. n.º 1 junto à oposição da recorrente
99.ª - A instalação da parte elétrica apresenta-se como uma condição sine qua non da empreitada contratada, pelo que, a recorrida não cumpriu efetivamente o contratado pela recorrente
100.ª - Um furo de captação de águas, sem a respetiva parte elétrica mais não representa do que um buraco realizado no prédio da recorrente, sem qualquer aptidão para o seu uso ordinário ou para o fim a que se destina - o fornecimento de água na moradia do prédio da recorrente
- vd. art.º 1208.º CC
101.ª - Defende a sentença recorrida que quando as alterações se revelarem necessárias “em virtude de certas razões objetivas” deverá ser-lhes aplicável o disposto no artigo 1215.º do Código Civil
102.ª - No entanto, a recorrida nunca conseguiu demonstrar nos autos que “razões objetivas” ou “regras técnicas” são essas, visto que:
- nada carreou para os autos capaz de demonstrar essa necessidade de perfurar a mais
- não juntou aos autos qualquer documento comprovativo dessa necessidade
- não juntou aos autos qualquer estudo técnico que demonstre essa necessidade
- não juntou aos autos os comprovativos efetivos de aparecimento da água aos 149 metros de perfuração
- não juntou aos autos os comprovativos efetivos de ter perfurado 205 metros
- não juntou aos autos qualquer recomendação técnica dos produtores da bomba elétrica no sentido de que, para o seu bom funcionamento, existe a necessidade de perfurar mais 30 metros e 10% do total perfurado
103.ª - Essas alegadas “regras técnicas” não constam sequer do “orçamento” descrito em 5. e 6. da matéria de facto provada, recebido, lido, analisado e assinado pela recorrente
104.ª - Assim, não existe in casu qualquer justificação plausível para a modificação do negócio jurídico seguida pelo tribunal recorrido
105.ª - Seguiu o tribunal recorrido o entendimento de que, de acordo com a repartição do ónus da prova, incumbia à recorrente demonstrar que não deu autorização para se perfurar além da previsão
106.ª - Sucede que, os presentes autos foram intentados pela recorrida contra a recorrente, pelo que, era à recorrida que incumbia provar e demonstrar que teve necessidade fundada de perfurar a mais 55 metros, que perfurou 205 metros, que o caudal mínimo garantido surgiu aos 149 metros e que instalou no local o isolamento e revestimento em crise
- vd. n.º 1, art.º 342.º CC
107.ª - Inexistindo convenção em contrário quanto ao modo de pagamento do preço, este apenas é devido após a realização e entrega da obra, cabendo o ónus da prova ao empreiteiro, em ação instaurada contra o dono da obra para pagamento do preço devido
- vd. n.º 1, art.º 342.º CC
- vd. Ac. TR de Évora, de 25.02.2021, proc. n.º 331/18.3T8TVR.E1
108.ª - Incumbia à recorrida provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua
- vd. n.º 1, art.º 799.º CC
109.ª - Deste modo, a sentença recorrida interpretou e aplicou erroneamente a lei e a jurisprudência aplicáveis ao caso concreto
- vd. n.º 1, art.º 342.º e n.º 1, art.º 799.º CC
110.ª - A sentença recorrida apreciou e julgou procedente um pedido ilícito, pois que o furo em questão foi apenas autorizado/licenciado para uma profundidade de 100 metros, ao passo que a fatura reclamada nos autos diz respeito a 205 metros de perfuração
- cfr. doc. n.º 2, junto ao requerimento da recorrida de 11.10.2023, ref.ª Citius 15163964
111.ª - O documento n.º 2, junto aos autos pela recorrida, em 11.10.2023, elaborado pela “Agência Portuguesa do Ambiente, constitui um documento autêntico, com força probatória plena, apto a demonstrar a ilegalidade do petitório da recorrida
- vd. art.ºs 369.º e ss. CC e art.º 371.º CC
112.ª - A sentença recorrida viola o Princípio da Legalidade, legal e constitucionalmente consagrado, que estabelece que toda e qualquer pessoa, sem exceção, se encontra sujeita à lei
- vd. art.ºs 369.º e ss. CC e art.º 371.º CC
- vd. art.ºs 3.º e 266.º CRP
113.ª - A sentença recorrida é ilegal e inconstitucional, devendo ser revogada e substituída por outra que decida conforme ao peticionado pela recorrente nos autos”.
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A Autora apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos, com efeito devolutivo, não tendo sido objecto de alteração neste Tribunal da Relação.
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No despacho de admissão do recurso, em cumprimento do disposto no nº1 do art. 617º do C.P.Civil de 2013, o Tribunal a quo pronunciou-se sobre as nulidades da decisão recorrida arguidas no recurso, nos seguintes termos: 
«Nas suas alegações de recurso, veio a Ré AA invocar a nulidade da sentença recorrida, quer por falta de fundamentação, quer por omissão de pronúncia e ainda por contradição dos fundamentos com a decisão.
Cumpre apreciar, segundo o determinado no artigo 617.º n.º1 do Código de Processo Civil.
Na convicção de que a sentença não padece das invocadas nulidades, mantém-se a mesma pelas razões aí vertidas, de onde decorrer, salvo melhor opinião, inexistência quer de falta de fundamentação, quer da omissão de pronúncia, quer ainda de contradição entre os fundamentos e a decisão».
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Foram colhidos os vistos legais.
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2. OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A DECIDIR

Por força do disposto nos arts. 635º/2 e 4 e 639º/1 e 2 do C.P.Civil de 2013, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas (as conclusões limitam a esfera de actuação do Tribunal), a não ser que se tratem de matérias que sejam de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, ou que sejam relativas à qualificação jurídica dos factos (cfr. art. 608º/2, in fine, aplicável ex vi do art. 663º, nº2, in fine, e 5º/3, todos do C.P.Civil de 2013).
Mas o objecto de recurso é também delimitado pela circunstância do Tribunal ad quem não poder conhecer de questões novas (isto é, questão que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que “os recursos constituem mecanismo destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando… estas sejam do conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha elementos imprescindíveis”[2] (pela sua própria natureza, os recursos destinam-se à reapreciação de decisões judiciais prévias e à consequente alteração e/ou revogação, pelo que não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida[3]).

Neste “quadro legal” e atentas as conclusões do recurso de apelação interposto pela Ré, são três as questões a apreciar por este Tribunal ad quem:
1) Se a sentença recorrida padece das invocadas nulidades previstas nas alíneas b), c), e/ou d) do nº1 do art. 615º do C.P.Civil de 2013;
2) Se a sentença recorrida deve ser alteradas quanto à respectiva decisão de facto, nos termos indicados na impugnação de facto deduzida pela Ré/Recorrente ou ao abrigo dos poderes oficiosos do Tribunal previstos no art. 662º/c) do C.P.Civil de 2013;
3) E caso proceda (parcial ou totalmente) a alteração da decisão de facto da sentença recorrida, apurar se a Ré é ou não devedora à Autora da totalidade da quantia em que foi condenada.
* * *
3. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Na sentença ora impugnada, o Tribunal a quo considerou como provados os seguintes factos:
1. A autora é uma sociedade comercial por quotas, que se dedica habitualmente à actividade de execução de furos artesanais, escavações, movimentações de terras, terraplanagens, aterros e desaterros, entre outras actividades, com escopo lucrativo;
2. No dia 10.05.2022 a ré AA e o seu companheiro BB solicitaram à autora um orçamento para a execução de um furo de captação de água e instalação da parte eléctrica até à boca do furo, no prédio sito na Travessa ..., ..., em ..., ...;
3. Em 11.05.2022, CC, colaborador da autora, deslocou-se ao referido prédio da ré, a fim de ver o trabalho a executar, encontrando-se junto ao local, DD, mandatado pela ré, para acompanhar o referido CC, em virtude da ré e seu companheiro se encontrarem a trabalhar na ...;
4. Nesse mesmo dia, o colaborador da autora CC marcou no prédio da ré o local do furo para a captação de água;
5. Em 17.05.2022 a autora enviou, via e-mail, para a ré e seu companheiro BB, um orçamento datado de 16-05-2022 para a execução de um furo de captação de água, no prédio identificado em 2., com uma previsão para perfuração e revestimento para 150 metros de profundidade e previsão de isolamento para 9 metros, no valor de € 6.552,00, acrescido de IVA à taxa legal em vigor;
6. No orçamento referido em 5., consta também a previsão para a instalação da parte eléctrica até à boca do furo, para 150 metros, no valor de €3.290,00, acrescido de IVA à taxa legal em vigor;
7. O valor total da previsão do orçamento referido em 5. foi de €9.842,00, acrescido de IVA à taxa legal em vigor;
8. Consta do referido orçamento, entre o mais, as seguintes informações: “O mínimo de água garantida é de 6.000L/dia; Este orçamento é para uma previsão de 150 metros. Caso sejam precisos mais metros de perfuração e revestimento para garantir o mínimo de água, ou isolamento para garantir o bom funcionamento, serão pagos aos preços acima indicados”;
9. Consta ainda do referido orçamento que “os preços acima indicados” são: “preço por metro de perfuração – €25,00; preço por metro de revestimento X Média Pressão Normal – €15,00; preço por metro de revestimento X Média Pressão Reforçado – €17,00; preço por metro de revestimento X Alta Pressão Reforçado – €19,00; preço por metro de isolamento 180mm x 7.5Kg Reforçado - €28,00; preço por metro de isolamento 190mm x 12.5Kg Reforçado - €35,00”;
10. A ré e o seu companheiro BB leram e assinaram o orçamento referido em 5.;
11. A ré, tendo por base o orçamento referido em 5., através do seu companheiro BB adjudicou verbalmente à autora a execução do dito furo;
12. Em 10.10.2022 a autora, através do seu funcionário CC comunicou à ré através do seu companheiro BB uma alteração no preço dos tubos de isolamento, isto é, que o isolamento 180mm x 7.5Kg Reforçado passava de €28,00 para €32,00 e o preço por metro de isolamento 190mm x 12.5Kg Reforçado passava de €35,00 para €38,00, totalizando um acréscimo ao valor orçamentado de €36,00, alteração essa que foi aceite pela ré;
13. Na sequência do acerto verbal referido em 11. a autora entre os dias 13 e 18 de Outubro de 2022 procedeu à execução de um furo de captação de água no prédio da ré, tendo executado uma perfuração com 205 metros, com revestimento 140mm média pressão reforçado em 205 metros e, isolamento de 180mm x 7.5Kg na quantidade de 15 metros;
14. Aquando da execução do dito furo, a água apareceu aos 149 metros com caudal mínimo de 6.000L/dia;
15. Apesar do referido em 14., a autora, por razões técnicas, perfurou mais 55 metros, 30 metros para a caixa de água e mais 10% do total perfurado para o funcionamento da bomba eléctrica, de forma a garantir o caudal mínimo de 6.000L/dia e o bom funcionamento do furo;
16. A autora concluiu a execução do furo de captação de água com 205 metros de profundidade, com um caudal aproximado de 250L/hora, revestimento de 140mm média pressão reforçado em 205 metros e isolamento de 180mm x 7.5Kg, na quantidade de 15 metros;
17. Tendo em conta que o orçamento referido em 5. para a execução da parte eléctrica apenas previa um furo até aos 150 metros, a autora em 19-10-2022 elaborou um novo orçamento para os 205 metros, no valor de €4.120,00 acrescido de IVA à taxa legal em vigor;
18. A autora entregou o novo orçamento mencionado em 18. à ré, através do seu companheiro BB, o qual não foi aceite por estes e, nessa sequência, não adjudicaram à autora a instalação da parte eléctrica do furo.
20[4]. Em 25-10-2022 a autora emitiu a factura n.º ...39, com data de vencimento no mesmo dia (25-10-2022), no valor de €10.870,74, referente à execução de um furo de captação de água com 205 metros de profundidade, com revestimento de 140mm média pressão reforçado em 205 metros e isolamento de 180mm x 7.5Kg, na quantidade de 15 metros, enviando-a a ré, que a recebeu;
21. O preço unitário por metro perfurado e materiais que ultrapassaram a previsão dos 150 metros inicialmente orçamentados foi facturado de acordo com o convencionado em 9. e 13.;

Na mesma sentença ora impugnada, o Tribunal a quo considerou como não provados os seguintes factos:

A) A autora garantiu à ré, através do seu companheiro BB, que o valor do orçamento não seria ultrapassado;
B) Que os preços orçamentados para a execução do furo de captação de água e instalação da parte elétrica previam o resultado de “água na torneira”;
C) A autora faturou mais metros do que aqueles que perfurou;
D) A ré procedeu ao pagamento da fatura.
* * *
4. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

4.1. Das Nulidades da Sentença Recorrida
As nulidades da decisão (sentença ou despacho) constituem vícios intrínsecos da própria, deficiências da respectiva estrutura, o que não é confundível com o erro de julgamento, ou sequer com um alegado erro na forma de processo.
Explica-se no Ac. desta RG de 17/12/2018[5] que “Os vícios determinativos de nulidade da sentença encontram-se taxativamente enunciados no referido art. 615º, do CPC”, reportando-se à estrutura ou aos limites da sentença, representando defeitos de actividade ou de construção da própria sentença, isto é, constituem “vícios formais da sentença ou relativos à extensão do poder jurisdicional por referência ao caso submetido ao tribunal”: as causas de nulidade enunciadas nas alíneas b) [falta de fundamentação] e c) [oposição entre os fundamentos e a decisão] referem-se a vícios da estrutura da sentença; e as causas de nulidade enunciadas nas alíneas d) [omissão ou excesso de pronúncia] e e) [pronúncia ultra petitum] referem-se a vícios atinentes aos limites da sentença. Estes vícios “afetam formalmente a sentença e provocam a dúvida sobre a sua autenticidade, como é o caso da falta de assinatura do juiz, ou a ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que se decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduzir logicamente a resultado oposto do adotado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender resolver questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões que deveria conhecer (omissão de pronúncia)”. Distintos destes vícios “são os erros de julgamento (error in iudicando), os quais contendem com erros ocorridos ao nível do julgamento da matéria de facto ou ao nível da decisão de mérito proferida na sentença/decisão recorrida, decorrentes de uma distorção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error iuris), de forma que o decidido não corresponde à realidade ontológica ou normativa”: estes erros correspondem a “uma deficiente análise crítica das provas produzidas” ou a “uma deficiente enunciação e/ou interpretação dos institutos jurídicos aplicados ao caso concreto”, e reportam-se ao mérito da relação material controvertida nela apreciada, não inquinando a sentença de invalidade, mas sim error in iudicando, sendo atacáveis por via de recurso.
Portanto, impõe-se distinguir as nulidades da decisão do erro de julgamento (seja de facto, seja de direito), sendo que aquelas reconduzem-se a vícios formais que emergem de um erro de actividade ou de procedimento (error in procedendo) respeitante à disciplina legal (“trata-se de vícios de formação ou actividade (referentes à inteligibilidade, à estrutura ou aos limites da decisão) que afectam a regularidade do silogismo judiciário, da peça processual que é a decisão e que se mostram obstativos de qualquer pronunciamento de mérito”), enquanto este ( error in judicando) emerge de uma distorção da realidade factual (error facti) ou na aplicação do direito (error juris) que conduz a que o decidido não corresponda à realidade ontológica ou à normativa (“traduzindo-se numa apreciação da questão em desconformidade com a lei, consiste num desvio à realidade factual - nada tendo a ver com o apuramento ou fixação da mesma - ou jurídica, por ignorância ou falsa representação da mesma”)[6].
Prescreve o art. 615º do C.P.Civil de 2013:“1 - É nula a sentença quando: (…) b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; (…)”.
Atento o disposto no nº4 deste mesmo preceito (“As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades”), dúvidas não existem que, cabendo recurso da sentença ora impugnada, tais nulidades devem e têm que ser invocadas em sede de recurso.
*
A causa de nulidade prevista na alínea b) está directamente conexionada com a obrigação de fundamentação especificamente imposta no nº3 do art. 607º (“Seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final”) e com a obrigação geral de fundamentação imposta no nº1 do art. 154º (“As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas”), ambos do C.P.Civil de 2013.
A necessidade de fundamentação das decisões judiciais constitui uma condição da sua própria legitimação (estatui o art. 205º/1 da C.R.Portuguesa que “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”) e da verificação de um processo equitativo (exigência esta que decorre, no plano do direito fundamental internacional, do disposto no art. 6º da Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem das Liberdades Fundamentais, e no art. 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e, a nível constitucional, do estipulado no art. 20º/4 da C.R.Portuguesa).
Nas palavras de Lebre de Freitas[7], “A exigência de fundamentação exerce a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior e de reforçar o autocontrolo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao ato jurisdicional”.
Só sabendo os concretos fundamentos que justificaram a prolação da decisão as partes terão a possibilidade real e efectiva de proceder à sua impugnação e suscitar a sua sindicância por um tribunal superior e este tribunal superior só pode sindicar a decisão se conhecer os fundamentos de facto e de direito que subjazem à decisão proferida.

Explicava Alberto dos Reis[8] que “A exigência de motivação é perfeitamente compreensível. Importa que a parte vencida conheça as razões por que o foi, para que possa atacá-las no recurso que interpuser. Mesmo no caso de não ser admissível recurso da decisão o tribunal tem de justificá-la, pela razão simples de que a decisão vale, sob o ponto de vista doutrinal, o que valerem os seus fundamentos. Claro que a força obrigatória da sentença ou despacho está na decisão; mas mal vai a força quando se não apoia na justiça e os fundamentos destinam-se precisamente a convencer de que decisão é conforme à justiça. A função própria do juiz é interpretar a lei e aplicá-la aos factos em causa; por isso, deixa de cumprir o dever funcional o juiz que se limita a decidir, sem dizer como interpretou e aplicou a lei ao caso concreto. A decisão é um resultado, é a conclusão dum raciocínio; não se compreende que se enuncie unicamente o resultado ou a conclusão, omitindo-se as premissas de que ela emerge”.

Esta causa de nulidade da sentença respeita apenas à falta absoluta de fundamentação, como tem sido unanimemente defendido pela Doutrina. Entre outros:
 - explicam A. Varela, M. Bezerra e S. Nora, Manual de Processo Civil[9] que “Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente e incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”;
- ensinava Alberto os Reis[10] que “Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade”;
- referia Rodrigues Bastos[11] que “a falta de motivação a que alude a alínea b) do n.º1 é a total omissão dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito em que assenta a decisão; uma especificação dessa matéria apenas incompleta ou deficiente não afecta o valor legal da sentença”;
- afirma Teixeira de Sousa[12] que “esta causa de nulidade verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciaiso dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo…  e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão… a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível”;
- e concretiza Tomé Gomes[13] que “a falta de fundamentação de facto ocorre quando, na sentença, se omite ou se mostre de todo ininteligível o quadro factual em que era suposto assentar. Situação diferente é aquela em que os factos especificados são insuficientes para suportar a solução jurídica adoptada, ou seja, quando a fundamentação de facto se mostra medíocre e, portanto, passível de um juízo de mérito negativo. A falta de fundamentação de direito existe quando, não obstante a indicação do universo factual, na sentença, não se revela qualquer enquadramento jurídico ainda que implícito, de forma a deixar, no mínimo, ininteligível os fundamentos da decisão”.
A nível jurisprudencial, também os tribunais superiores têm unanimemente considerado que esta nulidade apenas se verifica quando haja falta absoluta de fundamentos, e não quando a fundamentação se mostra deficiente, errada ou incompleta: entre outros, refere-se o Ac. do STJ de 15/05/2019[14] (“Para que se verifique a nulidade de falta de fundamentação prescrita no art. 615, nº 1, al, b), do CPC, não basta que a justificação seja deficiente, incompleta ou não convincente. É preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”), o Ac. do STJ de 02/03/2021[15] (“Só a absoluta falta de fundamentação - e não a errada, incompleta ou insuficiente fundamentação - integra a previsão da nulidade do artigo 615.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil”) e o Ac. desta RG de 17/11/2004[16] [no qual se refere “O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), repetidamente aconselha que: a extensão da obrigação de motivação pode variar consoante a natureza da decisão e deve analisar-se à luz das circunstâncias do caso concreto; a motivação não deve revestir um carácter exageradamente lapidar, nem estar por completo ausente (…). Mostra-se ainda útil esclarecer, a este propósito, que a exegese do disposto no art. 668º nº1 al. b) C.P.Civ., de há muito vem entendendo que a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso (…) Só a ausência de qualquer fundamentação é susceptível de conduzir à nulidade da decisão. Ao aludir-se a “ausência de qualquer fundamentação” quer referir-se a falta absoluta de fundamentação, a qual porém pode reportar-se seja apenas aos fundamentos de facto, seja apenas aos fundamentos de direito”].
Em resumo: uma situação é a sentença não estar motivada ou fundamentada e outra é essa motivação ou fundamentação ser deficiente, incompleta, errada e/ou não convincente, sendo que a primeira configura a causa de nulidade prevista na alínea b) do art. 615º/1 e a segunda configura (“apenas”) uma causa de recurso por erro de julgamento, de facto ou de direito (não produzindo qualquer nulidade da sentença, somente “enfraquecendo” o seu valor doutrinal e sujeitando-a, consequentemente, ao risco de ser revogada ou modificada em sede de recurso). E podemos deixar assente ser esta a única interpretação legalmente admissível do normativo em causa.
Importa ainda ter em conta que o grau de exigência de fundamentação de facto e de direito não é sempre idêntico, tendo que ser adaptado à concreta matéria que se está a apreciar e ao grau de controvérsia existente sobre a mesma.
No recurso, a Ré/Recorrente arguiu a nulidade da sentença recorrida por falta de fundamentação (cfr. conclusões 1ª a 3ª), alegando essencialmente que «a motivação da decisão de facto da sentença recorrida é omissa em relação aos pontos 13. a 21. dos factos provados, bem como é omissa em relação às alíneas A) a C) dos factos não provados».
Esta alegação é, em si mesma, insusceptível de configurar uma situação de absoluta falta de indicação dos fundamentos de facto e/ou de direito.
A análise da sentença recorrida permite constatar que o Tribunal a quo elencou os factos provados e os factos não provados, bem como justificou/motivou a respectiva decisão de facto, e realizou a subsunção jurídica daquela factualidade em cada uma das questões que enunciou como sendo as que incumbiam decidir. Como supra se explanou e é unanimemente entendido pela Doutrina e Jurisprudência, a nulidade «da falta de fundamentação» só se verifica quando haja falta absoluta da indicação de fundamentos.
A concreta invocação da Ré/Recorrente é que (na sua perspectiva) os factos provados nºs. 13 a 21 e os factos não provados a) a c) não se encontram motivados na sentença recorrida, isto é, o Tribunal a quo não indicou os meios de prova em que baseou o juízo no sentido da demonstração probatória dos primeiros e o juízo de não demonstração probatória dos segundos. Este tipo de alegação poderá representar uma situação de fundamentação incompleta e/ou deficiente [vício da deficiência da decisão de facto na alínea c) do nº2 do art. 662º do C.P.Civil de 2013], mas jamais pode consubstanciar o vício da absoluta falta de fundamentação de facto.
Destaca-se (uma vez mais) os ensinamentos de Alberto os Reis[17]: “há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade”. Acolhendo-se este entendimento no Ac. do STJ de 02/03/2021[18] decidiu-se que “Só a absoluta falta de fundamentação - e não a errada, incompleta ou insuficiente fundamentação - integra a previsão da nulidade do artigo 615.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil”.
E sempre importa ter presente que as nulidades da sentença se encontram taxativamente previstas no aludido art. 615º/1 e não compreendem a decisão sobre a matéria de facto, como resulta do alcance do seu próprio conteúdo, e isto mesmo apesar de, com o C.P.Civil de 2013, a decisão da matéria de facto ter passado a integrar a sentença, uma vez que os vícios, que a podem atingir, continuam a ter os mesmos efeitos que antes tinham, quando tal decisão era autónoma em relação à sentença.
Explana-se no Ac. da RC de 20/01/2015[19] que “Apesar de actualmente o julgamento da matéria de facto se conter na sentença final, há que fazer um «distinguo» entre os vícios da decisão da matéria de facto e os vícios da sentença, distinção de que decorre esta consequência: os vícios da decisão da matéria de facto não constituem, em caso algum, causa de nulidade da sentença, considerado além do mais o carácter taxativo da enumeração das situações de nulidade deste último acto decisório”, mais se acrescentando que “Realmente a decisão da matéria de facto está sujeita a um regime diferenciado de valores negativos - a deficiência, a obscuridade ou contradição dessa decisão ou a falta da sua motivação - a que corresponde um modo diferente de controlo e de impugnação: qualquer destes vícios não é causa de nulidade da sentença, antes é susceptível de lugar à actuação por esta Relação dos seus poderes de rescisão ou de cassação da decisão da matéria de facto da 1ª instância (artº 662 nº 2 c) e d) do NCPC)”[20]. No mesmo sentido, entendem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[21] que a deslocação da decisão da matéria de facto e da sua fundamentação para a própria sentença não afasta a distinção que se impõe operar entre decisão sobre a matéria de facto e decisão de direito, nem o regime específico do art. 662º/1 e 2 do C.P.Civil de 2013 a que se encontram subordinados os vícios que afetam o julgamento da matéria de facto, e não se pode concluir que os erros de julgamento da matéria de facto, em caso algum, constituam causa de invalidade da sentença nos termos do art. 615º, uma vez que tais erros poderão ser de tal modo graves que acabem por se reconduzir a um dos tipos de nulidade da própria sentença enunciados no nº1 do art. 615º do CPC, que levem à invalidação desta, como é o caso de uma sentença em que o juiz omite totalmente a declaração e a discriminação dos factos que julgou provados e/ou omite totalmente a discriminação dos julgados não provados e/ou omite totalmente a motivação do julgamento de facto.
Por conseguinte, a invocada deficiência da decisão de facto quanto à omissão de motivação de alguns dos factos provados e factos não provados não integra o vício formal de nulidade da sentença [previsto na alínea b) do art. 615º/1], podendo apenas (e eventualmente) representar o vício da deficiência da decisão de facto previsto na alínea c) do nº2 do art. 662º.

Tanto bastaria para se concluir que não está verificada a nulidade da sentença por falta de fundamentação prevista na alínea b) do nº1 do art. 615º.

Mas mais acresce que, ao contrário do que a Ré/Recorrente alega, embora sem fazer uma menção expressa aos factos provados nºs. 13 a 21 e aos factos não provados a) a c), no item relativo à motivação da decisão de facto, o Tribunal a quo indicou, de forma concreta, quais foram os meios de prova em que baseou o seu juízo probatório quanto a estas matérias.

Efectivamente, está consignado naquele item da decisão recorrida relativamente à matéria que está incluída nos factos provados nºs. 13 a 16 e no facto não provado c):
“Relativamente à perfuração para execução do furo e metros concretamente atingidos, o Tribunal atendeu ao depoimento sério, seguro e isento de contradições da testemunha FF, manobrador de máquinas e colaborador da autora, que explicou detalhadamente os concretos trabalhos executados e, bem assim, a profundidade atingida, que consignou no documento de obra junto a fls 38, a que igualmente se atendeu, explicando que no terceiro dia de perfuração a água apareceu à profundidade de 149 metros com um caudal mínimo de 6.000L/dia, esclarecendo que a necessidade de perfurar até aos 205 metros surgiu como necessidade imperiosa de permitir que se deixasse 30 metros para a caixa de água e mais 10% do total perfurado para o funcionamento da bomba elétrica, como as regras de boa execução exigiam, o que aliás foi corroborado pelo depoimento igualmente sério, credível e isento de contradições das testemunhas CC comercial e sondador da autora, com conhecimentos técnicos e experiência na área dos furos artesianos.
(…)
Mais, além de estar em manifesta contradição com o orçamento junto aos autos, o depoimento da testemunha BB foi também contraditado pelos depoimentos das testemunhas FF e, e principalmente CC, com quem acordou a realização da obra, tendo esta testemunha afirmado lhe foi dada autorização expressa por telefone pelo prócio BB para continuar a perfurar, isto quando se alcançou água aos 140m e lhe terá ligado a dar conta da necessidade de continuar a perfurar (até aos 205 m) para permitir fazer caixa de água e deixar a bomba a distância de segurança do fundo do furo, o que por si só abalaria a versão da testemunha BB, sendo certo que segundo as regras da repartição do ónus do prova era à ré que competia fazer prova de que não deu autorização para se perfurara além da previsão dos 100m, com melhor se explicará em sede de enquadramento jurídico.

Relativamente à matéria incluída nos factos provados nºs. 17 e 18, no mesmo item está consignado:
“Foi ainda pela pelo documento junto a fls 36v, que o tribunal deu como provado o valor do novo orçamentado apresentado para a instalação elétrica do furo (em função dos metros perfurados a mais do orçamento inicial, como infra se verá) (…)
Pelo depoimento da testemunha EE, funcionário no escritório da autora, o tribunal logrou formar convicção de que foi esta testemunha a elaborar os orçamentos por indicação do seu colega CC, mais esclarecendo que uma vez que o seu colega CC lhe deu indicação que a instalação da parte elétrica não tinha sido adjudicado pelo cliente (como admitiu BB, marido da ré) (…)”.

No que concerne à matéria incluída dos factos provados nºs. 20 e 21, está consignado no mesmo item:
“(…) tendo a factura a fls. 37 servido para dar como provado o valor faturado, tendo a testemunha BB, marido da ré, admitido que recebeu a mesma.
(…)
Pelo depoimento da testemunha EE, funcionário no escritório da autora, o tribunal logrou formar convicção de que foi esta testemunha a elaborar os orçamentos por indicação do seu colega CC, (…), a fatura limitou-se a verter o preço dos metros efectivamente perfurados”.

E referente à matéria incluída nos factos não provados a) e b), também se consignou nesse item:
“Pese embora o a testemunha BB, companheiro da ré, tenha procurado fazer crer que esta nunca consentiu que se perfurasse além dos 100m previstos no orçamento, o certo é que o seu depoimento revelou-se centrado em negar que autorização para perfurar além da previsão do orçamento, sendo que o seu depoimento é frontalmente contraditado pelo próprio teor do orçamento, que o mesmo admite que recebeu e rubricou, tal como a ré, de onde flui, de forma cristalina que “O mínimo de água garantida é de 6.000L/dia; Este orçamento é para uma previsão de 150 metros. Caso sejam precisos mais metros de perfuração e revestimento para garantir o mínimo de água, ou isolamento para garantir o bom funcionamento, serão pagos aos preços acima indicados, resultando desde logo do orçamento a possibilidade de perfurar mais metros, como as regras ténias vieram efectivamente a impor nos termos e condições a que supra se aludiu, devidamente explicados pelas testemunhas FF e CC.
Por seu turno, os depoimentos de DD, pessoa que vendeu a casa aos réus, e GG, amigo dos réus que toma conta da casa na sua ausência, revelaram um propósito claro colar a sua versão à da ré, em particular, ao depoimento do marido desta, sendo que apesar de referirem que o marido da ré lhes dizia que o orçamento não poderia ser ultrapassado, o certo é que não só não se descortinou em que situações é que tal terá ocorrido, como tais depoimentos estão em frontal contradição com o orçamento apresentada que, como vimos, já previa a possibilidade de serem perfurados mais metros, caso as legis artis assim o impusessem.
Uma nota final para referir que apesar da testemunha GG, operador de posto em área de serviço, ter referido que se deslocou a casa do autor, juntamente com um mineiro, para verificar a profundidade do furo, tendo aquele constatado que apenas teria 1999 m, tal afirmação, além de referir a conclusão a que terceiro (mineiro) teria chegado, não foi acompanhada de qualquer circunstancialismo ou elemento que a permitisse confirmar, ao contrário, por exemplo do depoimento do manobrador de máquinas que fez o furo FF, que de forma logica e coerente esclareceu que os metros perfurados foram anotados no documento de fls 38, tendo a testemunha e EE explicado que para aferir a profundidade dos metros alcançados se regem pelas réguas da própria máquina que faz a perfuração”.
De uma forma que não é compreensível, no presente recurso, a Ré/Recorrente olvidou todos os segmentos da motivação supra transcritos e que se reportam precisamente aos pontos de facto provados e não provados que alegadamente não estariam fundamentados.
Deste modo, porque inexiste a alegada omissão, conclui-se que não está verificada a nulidade da sentença recorrida por falta de fundamentação prevista na alínea b) do nº1 do art. 615º.
*
A causa de nulidade prevista na 1ª parte da alínea c) [única que releva para o caso em apreço] assenta numa ideia de que os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão funcionam como premissas lógicas necessárias para a formação do silogismo judiciário: quando numa sentença se expende uma argumentação que se baseia em determinados pressupostos de direito e de facto, os quais apontam inequivocamente para uma solução, mas se verifica que, a final, é tomada uma decisão que é oposta àquela solução, então “ocorre uma violação das regras necessárias à sustentação lógica da sentença, de tal maneira que nem se conseguirá dizer se a sentença fez uma correcta ou uma errada aplicação do direito, porque a mesma encerra em si um vício lógico de tal maneira grave que a torna inaproveitável como sentença”[22].
Referem Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto[23] que “entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa da nulidade da sentença”.
Pode afirmar-se que esta causa nulidade está directamente conexionada com a obrigação de fundamentação da decisão prevista nos arts. 154º e 607º/3 e 4 do C.P.Civil de 2013, e com necessidade da sentença constituir um silogismo lógico-jurídico em que a decisão deverá ser a conclusão lógica da norma legal (premissa maior) com os factos (premissa menor)[24].
Enquanto vício de natureza processual, esta causa de nulidade “não se confunde com o erro de julgamento, que se verifica quando o juiz decide mal - ou porque decide contrariamente aos factos apurados ou contra lei que lhe impõe uma solução jurídica diferente”[25],
Só se verifica quando a contradição reside entre os fundamentos exarados pelo juiz na fundamentação da decisão e a própria decisão, já não se verificando quando a contradição reside entre os factos provados e a decisão (porque a errada interpretação e valoração jurídica de facto envolve um erro de natureza jurídica, o qual, embora coloque em causa o acerto da fundamentação nessa parte, apenas se repercute no mérito da decisão, mas sem «beliscar» a sua regularidade formal)[26], ou quando essa contradição seja apenas atinente à própria matéria de facto (oposição entre os factos provados ou oposição entre os factos provados e os factos não provados), uma vez que, neste caso, estamos perante um vício que recai sobre o próprio enunciado do juízo probatório (e não sobre o silogismo lógico-jurídico da própria decisão) e configura um vício formal mas apenas da decisão de facto que está previsto na alínea c) do nº2 do art. 662º do C.P.Civil de 2013 [“(…) repute (…) contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto (…)”]. Foi precisamente nesta linha de entendimento que se pronunciou o já citado Ac. do STJ de 03/03/2021[27]: “Verifica-se tal nulidade quando existe contradição entre os fundamentos e a decisão e não contradição entre os factos provados e a decisão, ou contradições da matéria de facto, que a existirem, configuram eventualmente erro de julgamento(o sublinhado é nosso).
Em resumo, e como se decidiu no Ac. do STJ de 09/02/2017[28], só “Ocorre a nulidade prevista no art. 615º, nº1, al. c) do CPC quando os fundamentos referidos pelo juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente, não se verificando quando a solução jurídica decorreu de interpretação dos factos, diversa da pretendida pelo arguente”.
Relembre-se que, como já antedito, as nulidades da sentença encontram-se taxativamente previstas no aludido art. 615º/1 e não compreendem a decisão sobre a matéria de facto.
No recurso, a Ré/Recorrente arguiu a nulidade da sentença recorrida por oposição entre os fundamentos e a decisão (conclusões 8ª a 11ª), alegando essencialmente que: «a recorrida peticionou nos autos o pagamento da fatura n.º ...39, no valor de € 10.870,74, da qual se pode ler que as quantidades concretamente faturadas foram de 205 metros perfurados; em sede de oposição, a recorrente alegou que o furo em questão não tem 205 metros de profundidade e que a fatura reclamada nos autos não corresponde à verdade, tendo sido fraudulentamente emitida pela recorrida, o que consubstancia exceção perentória; seguindo o entendimento do tribunal “a quo”, nomeadamente, nos pontos 13. a 16. da matéria de facto provada na sentença recorrida, nunca se poderá concluir que a recorrida haja perfurado 205 metros de profundidade, nem que haja perfurado 55 metros a mais, uma vez que: a) 149m + 30m= 179m b) 179 x 10% = 17,9m TOTAL: 179m + 17,9m = 196,9 metros c) 30m + 17,9m = 47,9 metros; os fundamentos da decisão relativa aos pontos 13. a 16. da matéria de facto encontram-se em oposição expressa com a decisão recorrida».
Analisando estas alegações em face das considerações jurídicas anteriormente realizadas, revela-se inequívoco que não podem configurar uma situação de contradição entre os fundamentos de decisão e a própria decisão: com efeito, as mesmas traduzem, apenas e tão só, a invocação de uma (eventual) contradição entre os factos provados e a decisão plasmada na sentença recorrida (na perspectiva da Ré/Recorrente, a matéria dos factos provados nºs. 13 a 16 não permite concluir que foram perfurados os 205 metros, pelo que haverá oposição entre estes fundamentos de facto e a decisão), o que poderá representar uma (eventual) errada interpretação e valoração jurídica desses factos e configurar um erro de natureza jurídica que se repercute no mérito de decisão, mas não é susceptível de afectar a sua regularidade formal.
Mais decorre das próprias alegações que inexiste qualquer vício sobre o silogismo lógico-jurídico da própria decisão: como a Ré/Recorrente argumenta, em sede de subsunção jurídica da factualidade provada (nomeadamente, dos indicados factos provados nºs. 13 a 16), o Tribunal a quo concluiu (para este efeito, não releva se bem ou mal) que a Autora perfurou os 205 metros de profundidade, pelo que, com base nesse pressuposto (e noutros pressuposto indicados na fundamentação de direito, como é o relativo ao orçamento aprovado constituir uma mera previsão e permitir a perfuração de mais metros), mostra-se coerente e consentâneo o reconhecimento do direito da Autora a receber da Ré o valor/preço devido pelo serviço de perfuração de 205 metros.
Nestes termos, porque inexiste qualquer vício inerente ao silogismo lógico-jurídico em que assenta a sentença recorrida, conclui-se que não está verificada a sua nulidade, por oposição/contradição entre os fundamentos e a decisão, prevista na 1ªparte da alínea c) do nº1 do art. 615º.
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A causa de nulidade prevista na 1ªparte da alínea d) alicerça a sua razão de ser no incumprimento do disposto no art. 608º/2 do C.P.Civil de 2013, que estatui: “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”.
Sobre a interpretação desta causa de nulidade, na vertente «omissão de pronúncia» continuam a relevar os ensinamentos de Alberto dos Reis[29]: “(…) são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão(o sublinhado é nosso).
Na mesma linha de entendimento, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[30] explicam que, “(…) devendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (608-2), o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da sentença, que as partes hajam invocado”.
Prosseguindo este entendimento, Ferreira de Almeida[31] realça que as «questões» são todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas, integrando “esta causa de nulidade a omissão do conhecimento (total ou parcial) do pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão (não a fundamentação jurídica adrede invocada por qualquer das partes). Não confundir, porém, questões com razões, argumentos ou motivos invocados pelas partes para sustentarem e fazerem vigar as suas posições (jurídico processuais); só a omissão da abordagem de uma qualquer questão temática central integra vício invalidante da sentença, que não a falta de consideração de qualquer elemento de retórica argumentativa produzida pelas partes”.
Igualmente a Jurisprudência se tem pronunciado neste sentido.
Decidiu-se no Ac. do STJ de 03/10/2017[32] que “A nulidade consistente na omissão de pronúncia ou no desrespeito pelo objecto do recurso, em directa conexão com os comandos ínsitos nos arts. 608.º e 609.º do CPC, só se verifica quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões ou pretensões que devesse apreciar e cuja apreciação lhe foi colocada” e que “A expressão «questões» prende-se com as pretensões que os litigantes submetem à apreciação do tribunal e as respectivas causas de pedir e não se confunde com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os fundamentos, os motivos, os juízos de valor ou os pressupostos em que as partes fundam a sua posição na controvérsia”.
E explica-se no Ac. do STJ de 03/11/2020[33] que “Apenas existe omissão de pronúncia quando o Tribunal deixe de apreciar questões submetidas pelas partes à sua apreciação, mas já não quando deixe de apreciar os argumentos invocados a favor da posição por si sustentada, não sendo de confundir o conceito de «questões» com o de «argumentos» ou «razões». Constitui igualmente entendimento pacífico, tanto na doutrina como na jurisprudência, que a noção de «questões» em torno das quais gravita a referida infração processual se reporta aos fundamentos convocados pelas partes na enunciação da causa de pedir e/ou nas exceções e, também, aos pedidos formulados”.
Importa ter presente que as questões essenciais também não se confundem com “factos”: explica Alberto dos Reis[34] que “Uma coisa é tomar em consideração determinado facto, outra é conhecer de questão de que não podia tomar conhecimento; o facto material é um elemento para a solução da questão, mas não é a própria questão”.
Neste mesmo sentido se pronunciou o Ac. do STJ de 23/03/2017[35]: “I. O não atendimento de um facto que se encontre provado ou a consideração de algum facto que não devesse ser atendido nos termos do artigo 5.º, n.º 1 e 2, do CPC, não se traduzem em vícios de omissão ou de excesso de pronúncia, dado que tais factos não constituem, por si, uma questão a resolver nos termos do artigo 608.º, n.º 2, do CPC. II. Tais situações reconduzem-se antes a erros de julgamento passíveis de ser superados nos termos do artigo 607.º, n.º 4, 2.ª parte, aplicável aos acórdãos dos tribunais superiores por via dos artigos 663.º, n.º 2, e 679.º do CPC”.
Há que ter em consideração que, para apreciar e determinar se existe omissão de pronúncia, a sentença tem que ser interpretada na sua totalidade, articulando a fundamentação e a decisão[36].
No recurso, a Ré/Recorrente arguiu a nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia (cfr. conclusões 4ª a 7ª), alegando essencialmente que: «em sede de oposição, a recorrente peticionou, concreta e especificamente, que se julgassem procedentes por provadas duas exceções perentórias, sendo que a lei impõe que tribunal “a quo” conheça oficiosamente das mesmas; a sentença recorrida é omissa quanto à apreciação das exceções perentórias peticionadas pela recorrente».
Não lhe assiste razão.
Na oposição, a Ré/Recorrente invocou e qualificou como «excepções peremptórias» a matéria alegada sobre «os serviços contratados e da não conclusão dos mesmos» («o orçamento solicitado foi para a captação de um furo de água e instalação dos sistemas necessários à obtenção de “água na torneira”; os preços teriam já de prever o resultado pretendido de “água na torneira”; os trabalhos contratados previam não só a execução do dito furo de captação de águas, mas também a execução da parte elétrica do mesmo; a oponida procedeu apenas à perfuração do solo para captação de águas, sem ter procedido à referida instalação elétrica que permitiria beneficiarem de “água na torneira”; os trabalhos contratados não se encontram ainda devidamente concluídos pelo que a fatura reclamada não se encontra vencida, não sendo devida» - cfr. arts. 4º a 21º), sobre a «emissão abusiva da fatura n.º ...39 e da sua não correspondência com a realidade» («a oponente e o seu namorado BB, desde sempre, foram claros e inequívocos junto da oponida, no sentido de que não poderiam ser surpreendidos com valores diferentes do orçamento de 16.05.2022; BB reiterou novamente e por diversas vezes junto de CC que o orçamento deveria ser cumprido, mais lhe referindo expressamente que qualquer desvio ao valor total orçamentado, teria de ser discutido e aprovado por ambas as partes; CC sempre transmitiu ao namorado da oponente que o valor seria suficiente para a execução dos trabalhos contratados e para o efeito pretendido - “água na torneira”; entre 14 e 18 de outubro de 2022, cujo concreto dia não é possível aferir, a oponida, na pessoa do sondador CC, contactou BB, informando-o que aos 149 metros de profundidade de perfuração foi atingido o caudal de água em causa; na sequência, e porque a profundidade referida no ponto anterior se encontrava muito próxima dos ditos 150 metros de profundidade, BB questionou o dito CC se tal acarretaria um qualquer acréscimo no orçamento, o que mereceu resposta negativa por parte do colaborador/representante da oponida CC; sem que nada o fizesse prever, a oponida emitiu e remeteu à oponente a fatura n.º ...39, de 25.10.2022, no valor de € 10.870,74, que não foi aceite; o furo em causa tem a profundidade de 199 metros e é dotado de água até 184 metros; a fatura reclamada nestes autos não corresponde à verdade» - cfr. arts. 26º a 31º, 45º a 63º) e sobre «a desnecessidade de perfuração de mais 55 metros» («pela existência de água até 184 metros de profundidade conclui-se que, a perfuração de mais metros, demonstra-se desnecessária; a oponida procedeu, supostamente, a trabalhos desnecessários no prédio da oponente apenas com o objetivo de lhe imputar valores indevidos e injustificados para o efeito pretendido» - cfr. arts. 69º a 94º).
Independentemente deste conjunto de alegações consubstanciar ou não efectiva matéria de excepção peremptória, ao contrário do que a Ré/Recorrente invoca, o Tribunal a quo pronunciou-se e apreciou concretamente todas as questões suscitadas naquele âmbito.
Relativamente à matéria dos «serviços contratados e da não conclusão dos mesmos», está consignado na sentença recorrida:
“(…) como resulta da factualidade dada como provada, a autora logrou demonstrar, como lhe incumbia (artigo 342.º, nº 1, do Código Civil), que prestou os serviços que lhe foram solicitados pela ré, tendo por objeto a realização de um furo de pesquisa com transformação em captação de águas subterrâneas.
É certo que a Ré invoca, desde logo, a exceção de não cumprimento, alegando, em síntese, que não adjudicou o serviço que lhe foi faturado, mas a verdade é que não o logrou provar, como lhe incumbia, pois da factualidade provada resultou demonstrado que o serviço efetuado pela requerente foi o efetivamente solicitado pelo requerido, tendo ficado previamente definido que o custo da realização de um furo seria calculado em função dos metros que fossem necessários perfurar e que a indicação de 100 metros era uma estimativa, não se tratando aqui de uma qualquer alteração ao inicialmente convencionado e sem autorização do requerido.
Por outro lado, alegou também a ré que a autora não executou a totalidade dos trabalhos propostos, mas uma vez mais não o demonstrou pois ficou assente que os serviços faturados foram efetivamente realizados de acordo com o previamente acordado, ao que acresce que relativamente à instalação da bomba e demais acessórios eletricos, serviço que também foi adjudicado pelo requerido, não só o mesmo não foi faturado pela Autora à Réu, como resultou claro que foi esta que dela desistiu pois ainda antes da instalação desses materiais por não concordar com a actualização de valores em função dos metros perfurados a mais, naturalmente com relevância para a parte elétrica que careceria de mais fio e tubo, não tendo sido sequer o mesmo faturado.
Assente ficou, bem assim, a emissão pela requerente de uma fatura relativas à realização dos mencionados serviços efetivamente prestados, no montante global de € €10.870,74, e a respetiva data de vencimento (…).
No que se reporta à matéria da «emissão abusiva da fatura n.º ...39 e da sua não correspondência com a realidade», foi consignado na sentença recorrida:
“(…) De acordo com as regras do ónus da prova, incumbia à ré alegar e provar (…) sendo que igualmente não provou que a ré tivesse dado indicação expressa para não ultrapassar a perfuração prevista (100m), antes fluindo o orçamento por si assinado precisamente o contrário.
(…)
No caso dos autos a discussão entre as partes ocorre face à particularidade da obra - realização de um furo de pesquisa com transformação em captação de águas subterrâneas – pois pretende a ré que não é devido o valor reclamando pela autora dado o número de metros perfurados não corresponder ao acordado, tendo a A. contemplado na factura esse número de metros e não os inicialmente previstos, ainda que não ponha em causa que o objectivo da obra – a captação de água – tenha sido cumprido.
Pretendia assim, a ré que fosse aplicado o disposto no artº 1214º do CC relativo ao facto de ao invés de terem sido perfurados 100 metros, tal como constava do orçamento, tenham sido levadas a cabo mais 105metros (205 no total) o e que tal fosse considerada uma alteração realizada pelo empreiteiro e por iniciativa dele.
(…)
In casu, provando-se que o orçamento entregue ao Autora à Ré previa uma estimativa de profundida de perfuração, mas destinando-se esta à captação de água, e tendo esta surgido aos 149 metros de profundidade, com necessidade de perfurar mais 56m, e não se bastando com o furo a 100 nos termos constantes do orçamento, a obra só se torna completa com este fim alcançado.
Na verdade, pretender a ré afirmar que não lhe poderá ser exigido o valor correspondente aos metros perfurados, significaria que caso a A. não tivesse perfurado até obter o que se pretendia com tal empreitada, estaria a mesma em incumprimento?
Pois, manifestamente a perfuração havia sido feita e caso tivesse sido cumprido o previsto no orçamento, a obra em si seria de todo inútil para o réu.
Logo, não estaria em causa a aplicação do artº 1214º do CC, mas sim e caso se tivesse logrado provar que o convencionado era apenas os 100 metros, tal levar-nos-ia à aplicação do artº 1215º do CC.
Por conseguinte, constando do orçamento o valor unitário quanto aos metros perfurados, e apenas a estimativa destes, o valor devido pela ré à Autora será o correspondente à condenação, ou seja, o equivalente ao número de metros perfurados.
Pois, sempre os factos provados demonstram que por razões técnicas, ou melhor, por motivos de boa execução da obra, foi necessário perfurar mais de 105 metros que o previsto e orçamentado, frise-se, por estimativa.
Em suma, a factualidade em causa patenteia que para a integral e correcta realização da obra convencionada, seria preciso perfurar mais metros que o previsto no orçamento, pelo que mesmo que fosse considerado que se tratava de uma alteração, esta teria que se reputar como necessária.
Não se trataria, assim, de modificações voluntárias realizadas pela empreiteira, por sua própria iniciativa, desnecessárias à realização da obra convencionada.
Não se cuida aqui de satisfazer “a cobiça do empreiteiro”, mas sim de proceder a alterações destinadas à cabal e correcta concretização da empreitada, dado que nem sequer se provou a essencialidade do convencionado quanto ao número máximo de metros perfurados, mas sim que tais metros eram apenas os prováveis, o valor devido pela ré à A. corresponderia ao valor unitário de metros até ao objectivo de tal obra – a captação de água, ou seja, ao valor efectivmamente faturado”.
E sobre a matéria de «desnecessidade de perfuração dos 55 metros», está plasmado na sentença recorrida:
“(…)sempre os factos provados demonstram que por razões técnicas, ou melhor, por motivos de boa execução da obra, foi necessário perfurar mais de 105 metros que o previsto e orçamentado, frise-se, por estimativa.
Em suma, a factualidade em causa patenteia que para a integral e correcta realização da obra convencionada, seria preciso perfurar mais metros que o previsto no orçamento, pelo que mesmo que fosse considerado que se tratava de uma alteração, esta teria que se reputar como necessária.
Não se trataria, assim, de modificações voluntárias realizadas pela empreiteira, por sua própria iniciativa, desnecessárias à realização da obra convencionada (…)”.
Nestas circunstâncias, é inequívoco que o Tribunal a quo apreciou e decidiu as questões suscitadas na oposição independentemente da sua natureza (matéria de excepção peremptória ou mera matéria de impugnação motivada) e, por via disso, conclui-se que não está verificada a nulidade da sentença por omissão de pronúncia prevista na 1ªparte da alínea d) do nº1 do art. 615º.
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Por conseguinte, deverá julgar-se integralmente improcedente o fundamento de recurso relativo à arguição de nulidades da sentença recorrida.
* *
4.2. Da Alteração da Matéria de Facto

Sobre o recurso de impugnação na matéria de facto, prescreve o art. 640º/1 do C.P.Civil de 2013: “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.
No que respeita à especificação dos meios probatórios, a alínea a) do nº2 do referido art. 640º, estatui que “Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”.
Têm sido suscitadas dúvidas sobre se os requisitos do ónus impugnatório previstos neste art. 640º/1 devem figurar apenas no corpo das alegações ou se também têm que integrar as próprias conclusões, sob pena do recurso ser rejeitado (cfr. art. 635º/2 e 639º/1 do C.P.Civil de 2013).

Tem vindo a constituir entendimento pacífico do Supremo Tribunal de Justiça que:
1) o Recorrente tem sempre que indicar os «concretos prontos de facto» que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
2) o Recorrente deve especificar, na motivação, os meios de prova, constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos, mas não sendo necessário que tal especificação também conste das conclusões;
3) relativamente aos «pontos de facto» cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em «prova gravada», para além da supra referida especificação dos meios de prova, o Recorrente está obrigado a indicar, com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos, mas não sendo necessário que tal indicação conste das conclusões;
4) e, na motivação, o Recorrente tem de expressar a decisão que, no seu entendimento, deve ser proferida sobre os «concretos prontos de facto» que impugnou, tendo em atenção a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, o que se compreende em razão do reforço do ónus de alegação, com vista a evitar a interposição de recursos com conteúdo genérico ou inconsequente[37].
Neste sentido, entre outros, decidiu-se no Ac. do STJ de 29/10/2015[38]: “1. Face aos regimes processuais que têm vigorado quanto aos pressupostos do exercício do duplo grau de jurisdição sobre a matéria de facto, é possível distinguir um ónus primário ou fundamental de delimitação do objecto e de fundamentação concludente da impugnação - que tem subsistido sem alterações relevantes e consta actualmente do nº1 do art. 640º do CPC; e um ónus secundário - tendente, não propriamente a fundamentar e delimitar o recurso, mas a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes, que tem oscilado, no seu conteúdo prático, ao longo dos anos e das várias reformas - indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização exacta das passagens da gravação relevantes (e que consta actualmente do art. 640º, nº2, al. a) do CPC). 2. Este ónus de indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não sendo justificada a imediata e liminar rejeição do recurso quando - apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exacta e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo Tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento - como ocorre nos casos em que, para além de o apelante referenciar, em função do conteúdo da acta, os momentos temporais em que foi prestado o depoimento complemente tal indicação com uma extensa transcrição, em escrito dactilografado, dos depoimentos relevantes para o julgamento do objecto do recurso”.
E entendeu-se no Ac. do STJ de 01/10/2015[39] que “I - No recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa, relativamente a esses factos, e enuncie a decisão alternativa que propõe. II - Servindo as conclusões para delimitar o objecto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação; quanto aos demais requisitos, basta que constem de forma explícita na motivação do recurso. III - Não existe fundamento legal para rejeitar o recurso de apelação, na parte da impugnação da decisão da matéria de facto, numa situação em que, tendo sido identificados nas conclusões os pontos de facto impugnados, assim como as respostas alternativas propostas pelo recorrente, não foram, contudo, enunciados os fundamentos da impugnação nem indicados os meios probatórios que sustentam uma decisão diferente da que foi proferida pela 1.ª instância, requisitos estes que foram devidamente expostos na motivação. IV - Com efeito, o ónus a cargo do recorrente consagrado no art. 640º, do Novo CPC, não exige que as especificações referidas no seu nº1, constem todas das conclusões do recurso, mostrando-se cumprido desde que nas conclusões sejam identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação”[40]. Explica-se neste aresto que «as exigências que o legislador entendeu consagrar nesta matéria e que impõem ao Tribunal o dever de fundamentação e de motivação crítica da prova, no actual art. 607º, nº 4, do CPC, encontra o seu contraponto na igual exigência imposta à parte Recorrente, que pretenda impugnar a decisão de facto, do respectivo ónus de impugnação, devendo o Recorrente expor os argumentos que, extraídos de uma apreciação crítica dos meios de prova, determinem, em seu entender, um resultado diverso do decidido pelo Tribunal “a quo” (…) recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus: Primo: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento; Secundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa; Tertio: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas. Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão (…)» (os sublinhados são nossos).
Neste âmbito mostra-se relevante o Ac. do STJ de 22/09/2015[41] que clarifica: “II – Na impugnação da decisão de facto, recai sobre o Recorrente “um especial ónus de alegação”, quer quanto à delimitação do objecto do recurso, quer no que respeita à respectiva fundamentação. III – Na delimitação do objecto do recurso, deve especificar os pontos de facto impugnados; na fundamentação, deve especificar os concretos meios probatórios que, na sua perspectiva, impunham decisão diversa da recorrida (art. 640.º, n.º 1, do NCPC) e, sendo caso disso (prova gravada), indicando com exactidão as passagens da gravação em que se funda (art. 640.º, n.º 2, al. a), do NCPC). IV – A inobservância do referido em III é sancionada com a rejeição imediata do recurso na parte afectada. V - Se essa cominação se afigura indiscutível relativamente aos requisitos previstos no n.º1, dada a sua indispensabilidade, já quanto ao requisito previsto no n.º2, al. a), justifica-se alguma maleabilidade, em função das especificidades do caso, da maior ou menor dificuldade que ofereça, com relevo, designadamente, para a extensão dos depoimentos e das matérias em discussão. VI - Se a falta de indicação exacta das passagens da gravação não dificulta, de forma substancial e relevante, o exercício do contraditório, nem o exame pelo tribunal, a rejeição do recurso, com este fundamento, afigura-se uma solução excessivamente formal, rigorosa e sem justificação razoável”.
A análise do cumprimento destes ónus (exigências legais) deve ser realizada, como explica Abrantes Geraldes[42], “à luz de um critério de rigor. Trata-se afinal, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo. Exigências que, afinal, devem ser o contraponto dos esforços que todos quantos, durante décadas, reclamaram a atenuação do princípio da oralidade pura e a atribuição à Relação de efetivos poderes de sindicância da decisão da matéria de facto como instrumento da realização da justiça”.
É um dado objectivo que, nas alegações de recurso, existe uma forte tendência para “combinar” e “misturar” a impugnação de facto com a impugnação de direito, sendo que muitas vezes são invocadas meras “opiniões” sobre o que foi dado como provado e/ou não provado, afirmando-se um entendimento distinto mas, mesmo assim, há conformação com uma parte da decisão que foi tomada, havendo efectiva impugnação relativamente a outra parte. Logo, e como resulta da alínea a) do nº1 do referido art. 640º, impõe-se que o recorrente, nas respetivas conclusões, indique concretamente quais são os pontos da matéria de facto que impugna e o que entende que deve ser dado como «assente» e/ou como «não assente», relevando e apresentando a sua pretensão de uma forma inequívoca e que permita separar a mera exposição da sua apreciação sobre a prova da pretensão fundamentada quanto à alteração da matéria de facto.
 O incumprimento de qualquer dos ónus supra indicados conduz à imediata rejeição da impugnação da decisão da matéria de facto (rejeição que será total ou parcial, consoante o incumprimento seja relativo a todo o âmbito da impugnação ou seja relativo apenas a uma parte da impugnação), não sendo legalmente admissível a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões. Como resulta do disposto na alínea a) do nº1 do art. 652º do C.P.Civil de 2013, os poderes do relator, em matéria de convite ao aperfeiçoamento, estão inequivocamente limitados às situações previstas no nº3 do art. 639º do mesmo diploma legal, que não incluem incumprimento dos referidos ónus. Entre outros, refere-se aqui o Ac. do STJ de 25/03/2021[43], no qual se decidiu que “III - Omitindo o recorrente o cumprimento do ónus processual fixado na alínea a) e c) do nº 1 do art. 640º do CPCivil, impõe-se a imediata rejeição da impugnação da matéria de facto, não sendo legalmente admissível a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento das conclusões”[44].
Relativamente a tais ónus de impugnação, importa ter presente o recente Acórdão Uniformizador de Jurisprudência, proferido pelo STJ em 17/10/2023[45], no qual se decidiu: “Nos termos da alínea c), do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações”.
Porém, a decisão da matéria de facto pode apresentar «patologias» que não correspondem verdadeiramente a erros de apreciação ou de julgamento, sendo que em tais «patologias» enquadra-se a deficiência da decisão de facto decorrente da falta de apreciação e de inclusão, na matéria de facto provada ou não provada, de algum (ou alguns) facto essencial (ou principal) da causa que tenha sido alegado pelas partes. Como decorre do disposto no nº1 do art. 5º do C.P.Civil de 2013, factos essenciais são aqueles que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas (e cujo ónus alegatório incumbe às partes). Obviamente, tal falta de pronúncia também pode reportar-se a factos instrumentais e/ou a factos «complementares e concretizadores» que resultem da instrução da causa [cfr. art. 5º/2a) e b) do C.P.Civil de 2013].
Explica-se no Ac. desta RG de 16/03/2023[46]: “Realidade diversa da impugnação da decisão de facto, que pressupõe um erro de julgamento, é a deficiência da decisão de facto, que está plasmada no art.º 662º n.º 2 alínea c) (…) Actualmente poderá afirmar-se que haverá deficiência quando o tribunal não se pronuncie sobre algum facto integrante dos temas da prova ou como refere Abrantes Geraldes (…) a decisão de facto será deficiente se houver «falta de pronúncia sobre factos essenciais ou complementares», «de modo que conjugadamente se mostre impedido o estabelecimento de uma plataforma sólida para a integração jurídica do caso»; será caso de ampliação da matéria de facto, quando tiver sido omitida dos temas da prova matéria de facto alegada pelas partes que se revele essencial para a resolução do litigio (...)”.
O vício formal de deficiência da decisão de facto, tal como os vícios formais de obscuridade e de contradição da mesma decisão de facto, estão expressamente previstos na alínea c) do nº2 do art. 662º do C.P.Civil de 2013: “2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente: (…) c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta”.
Tais vícios recaem sobre o próprio enunciado do juízo probatório, não dizendo, portanto, respeito à respetiva motivação, devendo ter-se por deficiente “o enunciado linguístico que expresse um sentido incompleto do respetivo juízo probatório, nos seus próprios termos, não abrangendo naquele a factualidade ali relevante ou não cobrindo, de forma positiva ou negativa, todo o facto enunciado como provado”, devendo considerar-se como obscuro “o enunciado probatório vagos, ininteligível, equívoco ou imprecisos”, e devendo qualificar-se como contraditórios “os que exprimam sentidos reciprocamente excludentes”[47].
Detectado qualquer um destes vícios (patologias) da decisão de facto, como se explica no Ac. do STJ de 17/10/2019[48], “os poderes conferidos ao Tribunal da Relação como verdadeiro tribunal de instância - tendo em vista o cumprimento do desiderato de um segundo nível de jurisdição em matéria de facto em idênticas condições e sujeito às mesmas regras de direito probatório que vinculam o tribunal de 1ª instância -, conferem-lhe o dever, por um lado, de deles conhecer oficiosamente (independentemente, pois, da existência ou não de impulso da parte interessada) e, por outro, de os poder suprir imediatamente, desde que, naturalmente, constem do processo (ou da gravação) os elementos probatórios indispensáveis para esse suprimento (os sublinhados são nossos).
Com efeito, na apreciação e decisão do recurso, o Tribunal da Relação pode deparar-se com uma decisão de facto que se mostra deficiente e que exige a sua ampliação, “por terem sido desconsiderados nos temas de prova factos alegados pelas partes e essenciais para a resolução do litígio ou, ainda, como ora sucede, por terem sido desconsiderados na decisão factos que se revelem essenciais para a resolução do litígio, na medida em que assegurem um enquadramento ou fundamentação jurídica diverso do que foi suposto pelo Tribunal a quo. Trata-se de uma faculdade que nem sequer está dependente da iniciativa do recorrente, bastando que a Relação se confronte com uma omissão objectiva de factos relevantes”[49].
Do primeiro segmento normativo do art. 662º/2c) parece resultar que a deficiência, a obscuridade e/ou a contradição da decisão de facto têm, como consequência, a anulação do julgamento (“A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente, anular a decisão proferida na 1ª instância”). Porém, como supra já se referiu e atendendo ao teor do segundo segmento normativo (“quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto”), dúvidas não existem de que o Tribunal da Relação, verificando a existência do vício da deficiência da decisão de facto (ou dos vícios da obscuridade ou da contradição), poderá/deverá supri-los a partir dos elementos que constam do processo e/ou da prova gravada.
Daqui resulta que a anulação do julgamento está, afinal, configurada como a última consequência do vício formal da deficiência da decisão de facto: “a anulação da decisão de 1ª instância apenas deve ser decretada se do processo não constarem todos os elementos probatórios relevantes. Ao invés, se estes estiverem acessíveis, a Relação deve proceder à sua apreciação e introduzir na decisão da matéria de facto as modificações que forem consideradas oportunas (…) deve ser sempre uma medida de último recurso, apenas legítima quando de outro modo não for possível superar a situação, por forma a fixar com segurança a matéria de facto provada e não provada, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, tendo em conta, além do mais, os efeitos negativos que essa anulação determina ao nível da celeridade e da eficácia”[50].
Importa ter presente que, no caso dos vícios de deficiência, obscuridade ou contradição da decisão de facto, o Tribunal da Relação actuará como Tribunal de substituição ou Tribunal de cassação consoante as circunstâncias concretas de cada caso (recurso): “Deparando-se a Relação com respostas que sejam de reputar deficientes, obscuras ou contraditórias, se a reapreciação dos meios de prova permitir sanar a deficiência, obscuridade ou a contradição, a Relação fá-lo-á sem necessidade de reenviar o processo ao tribunal recorrido, após o que prosseguirá com a apreciação das demais questões que o recurso suscite. No caso inverso, cabe-lhe assinalar as referidas nulidades, determinar a anulação (parcial) do julgamento e ordenar que o tribunal a quo as supere”[51], frisando-se que tais vícios, dada a sua natureza formal, só relevam quando obstem a qualquer pronunciamento de mérito sobre o juízo probatório dessa forma afetado[52].
A alteração oficiosa da matéria de facto pelo Tribunal da Relação com fundamento em deficiência, obscuridade ou contradição, quando constam dos autos todos os elementos de prova foi considerada conforme com a Constituição (ou seja, não está afectada do vício da inconstitucionalidade) pelo Ac. do TC de 08/07/2009[53]: embora tal aresto se tenha pronunciado sobre o art. 712º/1a) e 4 do C.P.Civil na versão anterior a 2013, o respectivo entendimento tem plena aplicabilidade ao disposto no art. 662º/2c) do C.P.Civil de 2013, porque este normativo é idêntico ao daquele antigo  art. 712º/1a) e 4.

Tendo em consideração todo o entendimento supra exposto, procedendo à análise das conclusões formuladas e da motivação deduzida pela Ré/Recorrente, temos que concluir que as alegações de recurso cumprem minimamente os respectivos requisitos formais (sendo que, nas conclusões, até se indicam os meios de prova, o que é desnecessário), e que o âmbito da impugnação deduzida corresponde aos seguintes pontos de facto:

1) os pontos nºs. 10 e 11 da matéria de facto provada devem ser alterados nos seguintes termos: “10. A ré e o seu companheiro BB leram e assinaram o orçamento referido em 5. e 6.” e “11. A ré e o seu companheiro BB, tendo por base o orçamento referido em 5. e 6., adjudicaram à autora a execução do dito furo e a instalação da parte elétrica até à boca do furo”;
2) os pontos 13. a 16. da matéria de facto provada devem ser eliminados, passando a fazer parte integrante da matéria de facto não provada na sentença recorrida, ou caso assim não se entenda, devem ser alterados nos seguintes termos: “13. Na sequência da leitura, assinatura e aceitação pela ré e seu companheiro BB do orçamento referido em 5. e 6., a autora entre os dias 13 e 18 de outubro de 2022 procedeu à execução de um furo de captação de água no prédio da ré”; “14. Aquando da execução do dito furo, a água apareceu com caudal mínimo”; “15. (eliminado)”; e “16. A autora concluiu a execução do furo de captação de água”;
3) o ponto 18. da matéria de facto provada deve ser eliminado, passando a fazer parte integrante da matéria de facto não provada na sentença recorrida;
4) à matéria de facto provada da sentença recorrida deve ser aditado o seguinte ponto de facto: “Em 27.10.2022, a ré, por intermédio do seu mandatário, contestou, devolveu e requereu a anulação da fatura descrita em 20. junto da autora”;
5) à matéria de facto provada da sentença recorrida deve ser aditado o seguinte ponto de facto: “A autora apresentou pedido de licença na APA - Agência Portuguesa do Ambiente, o qual foi deferido para uma profundidade de 100 metros, com o processo n.º  ...22.RH..., utilização n.º ...”;
6) a alínea A) da matéria de facto não provada deve ser eliminada do elenco dos factos não provados, passando a fazer parte integrante do elenco dos factos provados;
7) a alínea B) da matéria de facto não provada deve ser eliminada do elenco dos factos não provados, passando a fazer parte integrante do elenco dos factos provados;
8) e a alínea C) da matéria de facto não provada deve ser eliminada do elenco dos factos não provados, passando a fazer parte integrante do elenco dos factos provados.

Sobre os termos em que a reapreciação da matéria de facto deve ser realizada, estatui o nº1 do art. 662º do C.P.Civil de 2013, que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se, quanto aos factos tidos como assentes (ou quanto aos os factos tidos como não provados, acrescentamos nós), a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Como refere Abrantes Geraldes[54], “Com a redacção do art. 662º pretendeu-se que ficasse claro que, sem embargo de correcção, mesmo a título oficioso, de determinadas patologias que afectam a decisão da matéria de facto (v.g. contradição) e também sem prejuízo do ónus de impugnação que recai sobre o recorrente e que está concretizado nos termos previstos no art. 640º, quando esteja em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos a livre apreciação, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos, e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras da experiência… fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis e com observância do princípio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia… sem embargo, das modificações que podem ser oficiosamente operadas relativamente a determinados factos cuja decisão esteja eivada de erro de direito, por violação de regras imperativas, à Relação não é exigido, nem lhe é permitido que, de motu próprio, se confronte com a generalidade dos meios de prova que estão sujeitos a livre apreciação e que, ao abrigo desse princípio foram valorados pelo Tribunal de 1ª instância, para deles extrair, como se se tratasse de um novo julgamento, uma decisão inteiramente nova. Pelo contrário, as modificações a operar devem respeitar o que o recorrente, no exercício do seu direito de impugnação da decisão da matéria de facto, indicou nas respectivas alegações que circunscrevem o objecto de recurso(os sublinhados são nossos).
A decisão de facto consiste na apreciação que o Tribunal faz, em função da prova produzida, sobre os factos alegados pelas partes (ou oportuna e licitamente adquiridos no decurso da instrução) e que se mostrem relevantes para a resolução do litígio, pelo que tal decisão tem por objeto os juízos probatórios parcelares, positivos ou negativos, sobre cada um desses factos relevantes, embora com o alcance da respetiva fundamentação ou motivação. Neste quadro, no âmbito do recurso, a apreciação do erro de julgamento da decisão de facto está circunscrita aos pontos impugnados, mas em termos de latitude da investigação probatória, o Tribunal da Relação tem um amplo poder inquisitório sobre a prova produzida que imponha decisão diversa, como decorre do estatuído no referido art. 662º/1 do C.P.Civil de 2013, incluindo os mecanismos de renovação ou de produção dos novos meios de prova, nos exatos termos das alíneas a) e b) do nº2 do mesmo preceito, sem estar adstrito aos meios de prova que tiverem sido convocados pelas partes e nem sequer aos indicados pelo tribunal recorrido: “… como é hoje jurisprudência seguida por este Supremo Tribunal, a reapreciação da decisão de facto impugnada pelo tribunal de 2.ª instância não se limita à verificação da existência de erro notório por parte do tribunal a quo, mas implica uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, por parte do tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir, para só, em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do erro invocado, mantendo ou alterando os juízos probatórios em causa”[55].
Em jeito de resumo e conclusão, traz-se aqui à colação o Ac. do STJ de 04/10/2018[56], que define bem o “quadro” em que funciona a reapreciação da matéria de facto pelo Tribunal da Relação: “I. A apreciação da decisão de facto impugnada pelo Tribunal da Relação não visa um novo julgamento da causa, mas, antes, uma reapreciação do julgamento proferido pelo Tribunal de 1ª Instância com vista a corrigir eventuais erros da decisão. II. No âmbito dessa apreciação, incumbe ao Tribunal da Relação formar a seu próprio juízo probatório sobre cada um dos factos julgados em primeira instância e objeto de impugnação, de acordo com as provas produzidas constantes dos autos e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir [cfr. nº 2, als. a) e b) do artigo 662º do CPC], à luz do critério da sua livre e prudente convicção, nos termos do artigo 607.º, n.º 5, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil. III. O Tribunal da Relação, tal como decorre do preceituado nos artigos 5º, nº2, alínea a), 640º, nº 2, alínea b) e 662º, nº1, todos do Código de Processo Civil, tem um amplo poder inquisitório sobre a prova produzida que imponha decisão diversa e não está adstrito aos meios de prova que tiverem sido convocados pelas partes nem aos indicados pelo Tribunal de 1ª Instância, apenas relevando o fator da imediação prevalecente em 1ª Instância quando o mesmo se traduza em razões objetivas. IV. Em sede de reapreciação da decisão de facto é conferido ao Tribunal da Relação o poder de se socorrer, mesmo oficiosamente, de todos os meios de prova constantes do processo bem como do uso a presunções judiciais, nos termos permitidos pelos artigos 349º e 351º, ambos do Código Civil” (os sublinhados são nossos).

Estatui o art. 607º/5 do C.P.Civil de 2013, que o “juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”, sendo que esta previsão resulta do disposto nos arts. 389º, 391º e 396º do C.Civil, respectivamente para a prova pericial, para a prova por inspecção e para a prova testemunhal. Porém, desta livre apreciação pelo juiz estão legalmente excluídos os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, aqueles que só possam ser provados por documentos ou aqueles que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes - cfr. 2ªparte do nº5 do referido art. 607º.
Toda a prova tem que ser apreciada segundo critérios de valoração racional e lógica do julgador, com recurso às regras da experiência e critérios de lógica: “(…) segundo o princípio da livre apreciação da prova o que torna provado um facto é a íntima convicção do juiz, gerada em face do material probatório trazido ao processo (bem como da conduta processual das partes) e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento dos homens; não a pura e simples observância de certas formas legalmente prescritas[57].
A prova idónea (suficiente) alicerça-se num juízo de certeza (jurídica) e não um juízo de certeza material (absoluto): a prova “não é uma operação lógica visando a certeza absoluta (a irrefragável exclusão da possibilidade de o facto não ter ocorrido ou ter ocorrido de modo diferente) (…) a demonstração da realidade de factos desta natureza, com a finalidade do seu tratamento jurídico, não pode visar um estado de certeza lógica, absoluta,… A prova visa apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à aplicação prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto[58].
O juiz está vinculado a identificar quais os concretos meios probatórios que serviram para formar a sua convicção e a indicar as razões pelas quais, relativamente ao mesmo facto, concede maior credibilidade a um meio probatório em detrimento de outro de sinal oposto, sendo este o “caminho” que evita que a «livre apreciação da prova» se transforme numa «arbitrária apreciação da prova»: o “juiz [de 1ª Instância] explicará por que motivo deu mais crédito a uma testemunha do que a outra, por que motivo deu prevalência a um laudo pericial em detrimento de outro, por que motivo o depoimento de certa testemunha tecnicamente qualificada levou à desconsideração de um relatório pericial ou por que motivo não deu como provado certo facto apesar de o mesmo ser referido em vários depoimentos. E é ainda assim por referência a certo depoimento e a propósito do crédito que merece (ou não), o juiz aludirá ao modo como o depoente se comportou em audiência, como reagiu às questões colocadas, às hesitações que não teve (teve), a naturalidade e tranquilidade que teve (ou não)”[59].
É inquestionável que, uma vez que é perante si que toda a prova é produzida, é o juiz da 1ªinstância quem se encontra na posição mais favorável e privilegiada para proceder à sua valoração, nomeadamente no que concerne especificamente à prova testemunhal: atenta a respectiva imediação, o juiz da 1ªinstância está totalmente habilitado a detectar no comportamento das testemunhas todos os elementos relevantes para aferir da espontaneidade e credibilidade dos seus depoimentos, incluindo aqueles elementos que frequentemente não transparecem da gravação (esta constitui apenas um registo «áudio», e não um registo «vídeo», pelo que não pode transmitir todos os comportamentos da testemunha que respeitam directamente às suas reacções só observáveis através de imagem). Por conseguinte, a modificabilidade da matéria de facto só deverá ordenada quando, ao cumprir a supra referida incumbência de formar o seu próprio juízo probatório, o Tribunal da Relação conclua que a prova produzida tem um sentido diverso e impõe uma decisão diferente da que foi proferida pelo Tribunal da 1ªInstância, ou seja, quando consiga alcançar um juízo certo e seguro de que existe erro de julgamento na matéria de facto[60].
Como explica Ana Luísa Geraldes[61], “Em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte”.
Relativamente à interpretação do princípio da imediação, mostra-se relevante o entendimento explanado no Ac. do STJ (de fixação de jurisprudência) de 29/10/2008[62]: “Sem dúvida que a imediação torna possível, na apreciação das provas, a formação de um juízo insubstituível sobre a credibilidade da prova; das razões que se podem observar, no exame directo da prova, para acreditar, ou não acreditar, na mesma. Significa o exposto que a imediação é o meio pelo qual o tribunal realiza um acto de credibilização sustentada sobre determinados meios de prova em relação a outros. Exemplifica-se o exposto recorrendo ao caso do testemunho que parece mais digno de crédito do que um outro pela percepção directa imediata do seu relato e das circunstâncias em que o mesmo se desenrolou: - terá sido mais categórico, eventualmente mais seguro; terá recorrido menos vezes à aquiescência tácita de terceiro; ter-se-á expressado em termos mais correntes e mais próprios da sua condição social o que induziu o tribunal a pensar que o seu testemunho era mais fidedigno e menos passível de preparação prévia; suportou com maior à vontade o exercício do contraditório. Todas estas, que são razões que servem para acreditar em determinadas provas, e não acreditar noutras, sem dúvida que só são susceptíveis de ser apreciadas directamente pela pessoa que as avalia - o juiz de julgamento em primeira instância - e a possibilidade de admitir que tais circunstancias possam ser aferidas somente com recurso a um escrito - a denominada transcrição - produz uma evidente dificuldade pela ausência, ou diminuta qualidade de informação carreada para o tribunal, susceptível de o informar sobre as razões da atribuição de credibilidade” (os sublinhados são nossos).
Estritamente conexionada com a decisão de facto está o ditame legalmente consagrado no art. 607º/4 do C.P.Civil de 2013: o Tribunal só deve responder aos factos que julga provados e não provados, não envolvendo esta pronúncia aqueles pontos que contenham matéria conclusiva, irrelevante e/ou de direito.
Como se decidiu no Ac. do STJ de 28/09/2017[63], “Muito embora o art. 646.º, n.º 4, do anterior CPC tenha deixado de figurar expressamente na lei processual vigente, na medida em que, por imperativo do disposto no art. 607.º, n.º 4, do CPC, devem constar da fundamentação da sentença os factos julgados provados e não provados, deve expurgar-se da matéria de facto a matéria susceptível de ser qualificada como questão de direito, conceito que, como vem sendo pacificamente aceite, engloba, por analogia, os juízos de valor ou conclusivos(o sublinhado é nosso).
Mas o mesmo STJ, através do seu aresto de 22/03/2018[64], sustenta que a inexistência no C.P.Civil de 2013 de um preceito como o do art. 646º/4 do antigo C.P.Civil (que titulava de “não escrita” as respostas do coletivo sobre questões de direito) “não pode deixar de ter implicações no que concerne à atual metodologia no que concerne à descrição na sentença do que constitui «matéria de facto» e «matéria de direito»”No que concerne à decisão sobre a matéria de facto provada e não provada, não será indiferente nem o modo como as partes exerceram o seu ónus de alegação, nem a forma como o juiz, na audiência prévia ou em despacho autónomo, enunciou os temas da prova, tarefas relativamente às quais foram introduzidas no CPC importantes alterações que visaram quebrar rotinas instaladas e afastar os efeitos negativos a que conduziu a metodologia usualmente aplicada no âmbito do CPC de 1961… A matéria de facto provada deve ser descrita pelo juiz de forma mais fluente e harmoniosa do que aquela que resultava anteriormente da mera transcrição do resultado de respostas afirmativas, positivas, restritivas ou explicativas a factos sincopados que usualmente preenchiam os diversos pontos da base instrutória do CPC de 1961…”. Defende-se que, em face da modificação formal da produção de prova em audiência ter por objeto temas de prova e à opção da integração da decisão da matéria de facto no âmbito da própria sentença, “deve existir uma maior liberdade no que concerne à descrição da realidade litigada, a qual não deve ser imoderadamente perturbada por juízos lógico-formais em torno do que seja «matéria de direito» ou «matéria conclusiva» que apenas sirva para provocar um desajustamento entre a decisão final e a justiça material do caso... a patologia da sentença neste segmento apenas se verificará, em linhas gerais, quando seja abertamente assumida como «matéria de facto provada» pura e inequívoca matéria de direito…”[65].
Perante esta divergência no STJ, afigura-se-nos relevante o “caminho” indicado pelo Ac. da RG de 11/11/2021[66]: “Não obstante subscrevermos uma maior liberdade introduzida pelo legislador no novo (atual) Código de Processo Civil, entendemos que não constituem factos a considerar provados na sentença nos termos do disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 607º do Código de Processo Civil os que contenham apenas formulações absolutamente genéricas e conclusivas, não devendo também constituir «factos provados» para esse efeito as afirmações que «numa pura petição de princípio assimile a causa de pedir e o pedido»… De facto, se a opção legislativa tem subjacente a possibilidade de com maior maleabilidade se fazer o cruzamento entre a matéria de facto e a matéria de direito, tanto mais que agora ambos (decisão da matéria de facto e da matéria de direito) se agregam no mesmo momento, a elaboração da sentença, tal não pode significar que seja admissível a «assimilação entre o julgamento da matéria de facto e o da matéria de direito ou que seja possível, através de uma afirmação de pendor estritamente jurídico, superar os aspetos que dependem da decisão da matéria de facto»…” (os sublinhados são nossos).
Prosseguindo este “caminho” (e sabendo-se que a linha divisória entre a matéria de facto e a matéria de direito não é fixa, dependendo em larga medida dos termos em que a lide se apresenta), afigura-se-nos que os factos conclusivos não devem relevar (não podem integrar a matéria de facto) quando, porque estão diretamente relacionados com o thema decidendum, impedem ou dificultam de modo relevante a percepção da realidade concreta, seja ela externa ou interna, ditando simultaneamente a solução jurídica, normalmente através da formulação de um juízo de valor[67] e que é de acolher o ensinamento do Ac. da RP de 07/12/2018[68]: Acaso o objeto da ação esteja, total ou parcialmente, dependente do significado real das expressões técnico-jurídicas utilizadas, há que concluir que estamos perante matéria de direito e que tais expressões não devem ser submetidas a prova e não podem integrar a decisão sobre matéria de facto. Se, pelo contrário, o objeto da ação não girar em redor da resposta exata que se dê às afirmações feitas pela parte, as expressões utilizadas, sejam elas de significado jurídico, valorativas ou conclusivas, poderão ser integradas na matéria de facto, passível de apuramento através da produção dos meios de prova e de pronúncia final do tribunal que efetua o julgamento, embora com o significado vulgar e corrente e não com o sentido técnico-jurídico que possa colher-se nos textos legais” (o sublinhado é nosso)[69].
Frise-se que a questão de saber se um concreto facto integra um conceito de direito ou assume feição conclusiva ou valorativa constitui questão de direito, porquanto a sua apreciação não envolve um juízo sobre a idoneidade da prova produzida para a demonstração ou não desse facto enquanto realidade da vida ou sobre o acerto ou desacerto da decisão que o teve por provado ou não provado[70], e, por via disso, quando o recurso tem por objecto saber se um determinado facto julgado provado pelo tribunal contém ou não matéria conclusiva, ao abrigo dos seus poderes decisórios previstos no art. 662º do C.P.Civil de 2013, pode o Tribunal de Recurso, caso conclua afirmativamente, eliminá-lo do elenco dos factos provados[71]: como se refere no Ac. da RG de 30/09/2021[72], “Daí que a inclusão na fundamentação de facto constante da sentença de matéria de direito ou conclusiva configure uma deficiência da decisão, vício que é passível de ser conhecido, mesmo oficiosamente, pelo Tribunal da Relação, tal como decorre do artigo 662.º, n.º2, al. c), do CPC”.
Tecidas estas considerações jurídicas, cumpre proceder à reapreciação dos pontos de facto que foram impugnados pelos Réus/Recorrentes.
Como ponto prévio, deixa-se aqui expressamente consignado que foram integralmente ouvidos todos os depoimentos prestados pelas testemunhas e foi analisada toda a prova documental apresentada nestes autos.
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Quanto à alteração dos factos provados nºs. 10 e 11.

Pretende a Ré/Recorrente que seja aditado ao facto provado nº10 o segmento «e 6.» e que seja aditado ao facto provado nº11 os segmentos «e 6.» e «e a instalação da parte elétrica até à boca do furo», defendendo que «alegou especificamente que os trabalhos contratados previam não só a execução do furo de captação de águas, mas também a execução da parte elétrica do mesmo», que «os pontos 10. e 11. da matéria de facto provada encontram-se em contradição com o ponto 2. da matéria de facto provada na sentença recorrida, encontram-se em contradição com o documento n.º 1 junto à oposição da recorrente e, ainda, com o teor dos articulados carreados para os autos pela recorrente» e que «a prova testemunhal foi inequívoca a sustentar que os trabalhos contratados pela recorrente à recorrida incluíam quer a execução do dito furo, quer a instalação da parte elétrica».
No que concerne ao pretendido aditamento ao facto provado nº10, o mesmo revela-se inútil e desnecessário.
No facto provado nº5 encontra-se plasmada matéria reportada ao envio do orçamento (datado de 16/05/2022) pela Autora à Ré (e seu companheiro) para execução do furo de captação, indicando-se a previsão dos metros de perfuração, de revestimento e de isolamento e respectivos valores, mas a matéria dos factos provados nºs. 6 a 9 reporta-se ao mesmo orçamento, constituindo a mera continuação da discriminação do seu conteúdo, designadamente, e para além do mais, a previsão para a instalação de parte eléctrica até a boca do furo para 150 metros e o respectivo valor (naquele ponto 6).
Ora, estando consignado no facto provado nº10 que «A ré e o seu companheiro BB leram e assinaram o orçamento referido em 5.», inexistem quaisquer dúvidas que este acto de leitura e assinatura se reporta ao orçamento identificado nesse ponto nº5, o qual engloba, não só o conteúdo descrito no ponto nº5, mas também o conteúdo descrito nos pontos nºs. 6, 7, 8 e 9. Aliás, a aditar-se o nº6, também teriam que ser aditados os nºs. 7 a 9, porque todos se reportam ao mesmo orçamento.
Portanto, a menção ao «orçamento referido em 5.» basta e é suficiente para se compreender que o acto da Ré e do seu companheiro abrange todo o conteúdo do orçamento que se encontra descrito não só no facto provado nº5 mas também nos quatro seguintes factos provados (os aludidos pontos nºs. 6 a 9).
E porque assim é, então a redacção do facto provado nº10 não apresenta qualquer contradição com o teor do facto provado nº2 (o segmento desta matéria relativa à solicitação do orçamento também «para trabalhos de instalação da parte eléctrica até a boca do furo» está em total consonância com a matéria que «continua» a discriminar o conteúdo do orçamento e que está plasmada no facto provado nº6), nem com o teor do documento nº1 da oposição que corresponde ao orçamento aqui em causa (constante de fls. 21 dos autos, e que é igual ao documento nº1 junto com a resposta da Autora, e constante de fls. 33v dos autos - o teor deste documento está discriminado ao longo da matéria inserta nos factos provados nºs. 5 a 9, incluindo, assim, o ponto nº6), nem com o teor dos articulados (não se vislumbra, nem a Ré/Recorrente o indica, qual o segmento do requerimento de injunção, da oposição e/ou da resposta que contrarie o teor da redacção do facto provado nº10 que, como já se explicou, abrange todo o conteúdo do orçamento discriminado nos factos provados nºs. 5 a 9).
E para este efeito revela-se manifestamente escusado o recurso à prova testemunhal já que, nomeadamente, a assinatura constante daquele documento de fls. 21 dos autos não contém qualquer ressalva relativamente a qualquer segmento (parte) do seu conteúdo.
Relembre-se que a matéria de facto em causa neste ponto provado nº10 diz respeito, apenas e tão só, ao acto de leitura e assinatura do orçamento, o que a Ré/Recorrente claramente olvida nesta parte do recurso (a matéria sobre quais foram os trabalhos concretamente adjudicados está plasmada no facto provado nº11, sendo distinta do acto de leitura e assinatura).
Deste modo, não tem fundamento a pretensão de aditamento ao facto provado nº10 do segmento «e 6.» porque é matéria que já está necessariamente abrangida pela redacção que foi dada pelo Tribunal a quo àquele ponto de facto, pelo que tem que improceder esta pretensão.
Relativamente aos pretendidos aditamentos ao facto provado nº11.
Quanto ao aditamento do segmento «e 6.», damos por reproduzidas as considerações supra expostas quanto ao facto provado nº10, pelo que (em razão das mesmas) mostra-se infundada esta parte da pretensão.
Remanesce a apreciação do aditamento do segmento «e a instalação da parte elétrica até à boca do furo».
Relembre-se o teor deste ponto de facto nº11: «A ré, tendo por base o orçamento referido em 5., através do seu companheiro BB adjudicou verbalmente à autora a execução do dito furo».
Esta redacção tem correspondência na matéria alegada pela Autora no art. 5º do requerimento de injunção («De acordo com o orçamento provisional a requerida, na pessoa do seu marido BB, contratualizou verbalmente a requerente para a execução do furo para captação de água»).
Na oposição, a Ré alegou expressamente que «os trabalhos contratados previam não só a execução do dito furo de captação de águas, mas também a execução da parte elétrica do mesmo» (art. 16º), ou seja, invocou que a adjudicação foi da realização do furo e também da realização da respectiva parte eléctrica.
Perante tais alegações é inequívoco que existe acordo entre as partes sobre a matéria factual que integra aquele ponto nº11, sendo que foi neste acordo que o Tribunal a quo fundou o juízo probatório deste facto.
Porém, decorre dos factos provados nºs. 2, 5 e 6 que o orçamento solicitado pela Ré, e companheiro, à Autora foi não só para a execução de um furo de captação de água mas também para a instalação da parte eléctrica até à boca do furo, e que o orçamento apresentado por esta àqueles incluía trabalhos (e respectivos valores) para a execução de um furo de captação de água e para a instalação da parte eléctrica até à boca do furo.
Perante este “quadro” factual já assente e o teor do alegado pela Ré na sua oposição, verifica-se que foram solicitados e orçamentados dois trabalhos distintos (a execução propriamente dita do furo e a realização da respectiva parte eléctrica), mas a factualidade inserta no ponto nº11 apenas se reporta à adjudicação do primeiro deles (execução do furo), não contendo qualquer elemento sobre o segundo trabalho (instalação eléctrica), mais acrescendo que quer a restante matéria de facto provada, quer a matéria de facto não provada, também nada contêm sobre se este segundo trabalho (solicitado e orçamentado) foi ou não adjudicado no momento em que foi adjudicado aquele primeiro (a referência a uma «não adjudicação» que integra o facto provado nº18 - e que adiante será objecto de apreciação -, não diz respeito ao orçamento datado de 16/05/2022, mas sim a um novo/rectificado orçamento apresentado muito posteriormente - cfr. facto provado nº17).
Apurar se a adjudicação por parte da Ré (também) abrangeu ou não a execução da instalação da parte eléctrica consignada no orçamento datado de 16/05/2022, constitui um facto relevante para a decisão da causa, especialmente para a apreciação da questão sobre se a Autora (empreiteira) realizou e concluiu todos os trabalhos que lhe foram contratados (adjudicados) pela Ré (dona da obra), sendo certo que é precisamente na alegada falta de conclusão dos trabalhos relativos à parte eléctrica que a Ré/Recorrente alicerçou a dedução da excepção peremptória da exceptio non adimpleti contractus (excepção do cumprimento).
A omissão deste facto (adjudicação da execução da instalação da parte eléctrica) da factualidade provada (nomeadamente, da matéria do facto provado nº11) e da factualidade não provada configura uma deficiência da decisão de facto em razão de não abranger toda a matéria de facto relevante e alegada pelas partes (no caso pela Ré), que deve ser suprida, mesmo de forma oficiosa, ao abrigo dos poderes decisórios previstos no art. 662º/c) do C.P.Civil de 2013, pois os autos contêm todos os elementos probatórios necessários para o efeito (sem necessidade de anulação e remessa ao Tribunal a quo). Esta omissão mostra-se, aliás, pouco compreensível já que, na fundamentação de direito da sentença recorrida, o próprio Tribunal a quo consignou expressamente «ao que acresce que relativamente à instalação da bomba e demais acessórios elétricos, serviço que também foi adjudicado» (o sublinhado é nosso). 
Analisemos os elementos probatórios que foram produzidos sobre a matéria da adjudicação (ou não) da parte eléctrica.
Como antedito, há que ter em consideração que ficou probatoriamente demonstrado que o orçamento solicitado pela Ré à Autora foi para a execução do furo de captação de água e também para a instalação da parte eléctrica até à boca do furo, e que o orçamento apresentado por esta àquela continha a execução de ambos os trabalhos/obras (cfr. factos provados nºs. 2, 5 e 6, os quais não foram objecto de impugnação).
Daqui decorre, de forma imediata, a existência quer de uma vontade da Ré no sentido de obter a realização de ambos os trabalhos (o furo e a respectiva parte eléctrica) quer de uma vontade da Autora de executar ambos.
Mais importa ter em consideração que também ficou probatoriamente demonstrado que a Ré e o seu companheiro leram e assinaram o orçamento que incluía a execução de ambos os trabalhos (cfr. facto provado nº10), o que significa, inequivocamente, uma aceitação e concordância da Ré (e seu companheiro) com todo o orçamento apresentado, incluindo a execução da parte eléctrica. E frise-se que, analisando o teor do documento de fls. 21 dos autos (que corresponde ao orçamento em causa), facilmente se percebe que a Ré (e o seu companheiro) não consignaram qualquer ressalva ou exclusão relativamente a algum dos trabalhos neles previstos.
Este “quadro factual”, por si só, afigura-se-nos ser suficiente para que este Tribunal ad quem gere uma convicção, segura e objectiva, no sentido de que a adjudicação abrangeu/englobou também a execução da parte eléctrica.
Acresce que também foi este o sentido da prova testemunhal produzida.
Analisados os depoimentos das testemunhas CC e EE (trabalhadores da Autora, sondador/comercial e funcionário de escritório respectivamente), verifica-se que não produziram qualquer declaração no sentido da adjudicação da Ré (através do seu companheiro) referente ao orçamento datado de 16/05/2022 ter sido restrita à execução do trabalho do furo em si mesma, com exclusão do trabalho da parte eléctrica. Antes pelo contrário: ambas foram unívocas no esclarecimento de que a Ré não teria que fazer qualquer pagamento após estar executado o trabalho do furo, mas sim quando também estivesse executado o trabalho da parte eléctrica, o que só se mostra consentâneo com a adjudicação de ambos os trabalhos. Mais: também esclareceram que, por terem sido perfurados mais metros que os previstos, foi necessário corrigir o orçamento quanto à parte eléctrica, sendo que foi apenas perante um «novo orçamento da parte eléctrica» (alegadamente correspondente ao documento de fls. 36v dos autos) que o companheiro da Ré afirmou que não queria/pretendia a realização dos trabalhos da parte eléctrica, em razão do aumento do preço (como explicou a testemunha CC), o que claramente pressupõe que a parte eléctrica já estava anteriormente adjudicada (embora por preço inferior). Nos respectivos depoimentos, as testemunhas BB e DD (respectivamente o companheiro da Ré e a pessoa que vendeu a casa a esta, e acompanhou a execução do furo) pronunciaram-se no sentido de que a «contratação» foi de ambos os trabalhos (furo e parte eléctrica) porque a Ré pretendia ter «água na torneira». E nenhuma das restantes testemunhas inquiridas se pronunciou sobre esta matéria (tal como inexistiu qualquer produção de prova documental que tivesse um sentido contrário à da indicada prova testemunhal).
A conjugação desta prova testemunhal com o supra identificado “quadro factual” reforçam a convicção deste Tribunal ad quem no sentido da verificação do facto aqui em causa.
Assim, deve a pretensão da Ré/Recorrente proceder quanto ao aditamento do segmento factual «e a instalação da parte elétrica até à boca do furo» ao ponto provado nº11, ficando, desta forma, suprida a deficiência da sua omissão da decisão de facto.
Em consequência, determina-se que o facto provado nº11 passe a ter a seguinte redacção - «A ré, tendo por base o orçamento referido em 5., através do seu companheiro BB adjudicou verbalmente à autora a execução do dito furo e a instalação da parte elétrica até à boca do furo».
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Quanto à alteração dos factos provados nºs. 13 a 16.

Pretende a Ré/Recorrente que os pontos nºs. 13 a 16 da matéria de facto provada sejam eliminados e passem a integrar da matéria de facto não provada ou que, caso assim não se entenda, sejam alterados nos seguintes termos: «13. Na sequência da leitura, assinatura e aceitação pela ré e seu companheiro BB do orçamento referido em 5. e 6., a autora entre os dias 13 e 18 de outubro de 2022 procedeu à execução de um furo de captação de água no prédio da ré; 14. Aquando da execução do dito furo, a água apareceu com caudal mínimo. 15. (eliminado); 16. A autora concluiu a execução do furo de captação de água» (cfr. conclusões 24ª a 63ª).
Importa começar por atentar que existe uma repetição parcial de factualidade inserta nos factos provados nºs. 13 e 16: estando consignado no primeiro (para além do mais) que «tendo executado uma perfuração com 205 metros, com revestimento 140mm média pressão reforçado em 205 metros e, isolamento de 180mm x 7.5Kg na quantidade de 15 metros», voltou a consignar-se no segundo «com 205 metros de profundidade» e «revestimento de 140mm média pressão reforçado em 205 metros e isolamento de 180mm x 7.5Kg, na quantidade de 15 metros», sendo que a única matéria nova incluída neste ponto é constituída pelo segmento «A Autora concluiu a execução do furo de captação de água» e «com um caudal aproximado de 250L/hora».
Porque se trata da reprodução da mesmíssima factualidade, o que se mostra desnecessário e inútil para a apreciação da causa, devem ser eliminados da decisão de facto os identificados segmentos factuais do ponto provado nº16 («a execução do furo de captação de água com 205 metros de profundidade» e «revestimento de 140mm média pressão reforçado em 205 metros e isolamento de 180mm x 7.5Kg, na quantidade de 15 metros»), e isto independentemente deste ponto de facto (na parte que remanesce) dever ser mantido na matéria de facto provada ou dever transitar para a matéria de facto não provada (como reclama a Recorrente).
Em seguida, importa ter presente a factualidade concretamente alegada pelas partes neste âmbito e que se mostra relevante.
No requerimento de injunção (petição), a Autora alegou: «7.º na sequência do contrato verbal a requerente executou entre os dias 13 e 18 de outubro de 2022, perfuração com 205 metros, com revestimento 140 mm média pressão reforçado incluído com 205 metros e isolamento de 180 mm x 7,5kg na quantidade de 15 metros»; «8.º aquando dos trabalhos de perfuração foi necessário perfurar mais metros do que estava no orçamento provisional, para obter o caudal mínimo garantido, colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno, tudo por ser necessário para atingir o caudal mínimo garantido e o bom funcionamento do furo, tendo a requerente informado a requerida na pessoa do marido BB, dessa necessidade, e que o valor dos trabalhos seriam superiores ao orçamento provisional, face a necessidade de acréscimo dos metros de perfuração, revestimento e isolamento, e que os metros, de perfuração, de revestimento e isolamento, acima dos 150 metros, seriam pagos aos preços unitários especificados no orçamento, o que foi aceite pela requerida»; e «9.º face ao acordado a requerente perfurou até aos 205 metros, tendo atingido o caudal mínimo garantido, tendo informado a requerida, na pessoa do seu marido BB, dos metros perfurados e que o furo debitava acima do mínimo de água garantida, 6.000 litros dia».
E no articulado de resposta às excepções deduzidas na oposição, a Autora mais alegou a seguinte matéria nova: «15. O caudal mínimo garantido foi obtido, mas para esse efeito foi necessário perfurar mais metros»; e «16. Advém, que a veia de água apareceu aos 149 metros de profundidade, pelo que seria necessário perfurar mais metros, para que a eletrobomba trabalhe abaixo desse nível e se conseguisse garantir o mínimo diário de 6.000 litros/dia».
Na oposição, a Ré impugnou genericamente «os pontos 2.º a 16.º» do requerimento de injunção (art. 100º) e alegou (com efectiva relevância nesta matéria): «31.º Quaisquer outras divergências de valores referentes ao orçamento de 16.05.2022, nunca foram comunicadas pela oponida e/ou aceites pela oponente ou pelo seu namorado BB»; «51.º Entre 14 e 18 de outubro de 2022, cujo concreto dia não é possível aferir, a oponida, na pessoa do sondador CC, contactou BB, informando-o que aos 149 (cento e quarenta e nove) metros de profundidade de perfuração foi atingido o caudal de água em causa»; «52.º Na sequência, e porque a profundidade referida no ponto anterior se encontrava muito próxima dos ditos 150 metros de profundidade, BB questionou o dito CC se tal acarretaria um qualquer acréscimo no orçamento»; «53.º Tal mereceu resposta negativa por parte do colaborador /representante da oponida CC»; «69.º Em 15.05.2023, deslocou-se ao prédio descrito em 6.º desta oposição o Sr. HH, técnico especializado em sistemas de captação e furos de águas desde há largos anos, acompanhado pelo Sr. GG, este último morador nas redondezas do prédio urbano propriedade da oponente»; «69.º Essa deslocação teve por objetivo medir concretamente a extensão do furo de águas alegadamente executado pela oponida, bem como o nível de água existente no mesmo»; «70.º o dito HH atestou, no local, concretamente, o seguinte: - o furo em causa tem a profundidade de 199 (cento e noventa e nove) metros; - o furo em causa é dotado de água até 184 (cento e oitenta e quatro) metros de profundidade»; e «77.º pela existência de água até 184 metros de profundidade conclui-se que, a perfuração de mais metros, tal como preconizado pela oponida, demonstra-se desnecessária».
Sendo este o “quadro alegatório” das partes, podemos desde já extrair cinco conclusões que têm influência decisiva na apreciação deste ponto da pretensão impugnatória.
Primeira.
A Ré não impugnou especificadamente a seguinte matéria factual: «Na sequência do acerto verbal referido em 11. a autora entre os dias 13 e 18 de Outubro de 2022 procedeu à execução de um furo de captação de água no prédio da ré» (1ªparte do facto provado nº13); e «A autora concluiu a execução do furo de captação de água» (1ªparte do facto provado nº16).
Atento o teor da oposição, neste âmbito, limitou-se, por um lado, a contestar a quantidade de metros que a Autora alega ter perfurado (afirmando ter sido menos que os 205 metros invocados por ela) e a necessidade de perfurar mais que os 150 metros previstos no orçamento e, por outro lado, a negar que tenha sido informada da necessidade de perfurar mais que aqueles 150 metros e do respectivo acréscimo do preço, e a negar que tenha aceite a perfuração a mais e o acréscimo de preço.
Ou seja, quanto aos pontos de facto em análise, centrou a sua divergência factual, não na falta de execução e/ou conclusão dos trabalhos relativos ao furo em si mesmo, mas sim na matéria inserta na 2ª parte do facto provado nº13 e nos factos provados nºs. 14 e 15, e ainda na matéria alegada na 2ª parte do art. 8º e 1ª parte do art. 9º, ambos do requerimento de injunção (matéria esta reportada à informação e aceitação de maior quantidade de perfuração e de custo, a qual, como adiante melhor se explicará, não foi incluída pelo Tribunal a quo na decisão de facto).
A Ré não produziu qualquer alegação no sentido de negar, de forma concreta e definida, a execução e a conclusão dos trabalhos relativos ao furo de captação de água no período temporal em causa (aliás, como mais decorre do teor da sua oposição, embora invoque expressamente a falta de execução e conclusão de trabalhos, a Ré reporta tal falta apenas no que concerne à parte eléctrica, o que clara e obviamente pressupõe que já estavam realizados os trabalhos relativos ao furo).
Logo, quanto à matéria aqui em causa, a Ré não cumpriu a regra basilar consagrada no art. 574º/1 do C.P.Civil de 2013: “Ao contestar, deve o réu tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor”.
A «posição definida» exigida neste preceito legal constitui o núcleo irredutível do ónus de impugnação legalmente estabelecido, podendo (e tendo) que assumir (em concreto) diferentes contornos e intensidades em face quer da estruturação da acção em termos de facto quer da própria estratégia de defesa delineada pelo réu (defesa directa e/ou defesa indirecta)[73], mas jamais se basta (se cumpre) com uma mera impugnação genérica e abstracta sobre um conjunto de artigos e que até respeitam a realidades distintas, como se limitou a fazer no já citado art. 100º da sua oposição.
Não tendo tomado uma «posição definida» relativamente à factualidade em análise (e assinalando-se que até se trata de matéria da qual devia ter conhecimento), nos termos da 1ª parte do nº2 do citado art. 574º, conclui-se que tem de ser considerada admitida por acordo, correspondendo à plasmada na 1ªparte do facto provado nº13 (segmento «Na sequência do acerto verbal referido em 11. a autora entre os dias 13 e 18 de Outubro de 2022 procedeu à execução de um furo de captação de água no prédio da ré») e na 1ªparte do facto provado nº16 (segmento «A autora concluiu a execução do furo de captação de água»).
Assim, nesta parte, não tem fundamento nem pode proceder a pretensão impugnatória da Ré/Recorrente no sentido desta matéria transitar da factualidade provada para a factualidade não provada (frise-se que, na «pretensão impugnatória subsidiária» sobre esta questão, aquela admite a verificação desta factualidade, como decorre da «nova e subsidiária redacção» que propôs para estes dois factos).
E ainda que a prova desta matéria não resultasse do acordo das partes (por aplicação da citada regra legal), o que se admite apenas por mera hipótese de raciocínio, registe-se que a prova testemunhal produzida nos autos foi inequívoca no sentido de terem sido efectivamente executados e concluídos os trabalhos relativos ao furo de captação de água (isto independentemente dos metros concretamente perfurados, e/ou da necessidade de perfurar mais que 150 metros, e/ou da Ré, ou o seu companheiro, terem sido informados da necessidade de maior perfuração e do acréscimo de custo). Com feito, foi nesse sentido que se pronunciaram todas as testemunhas: FF (manobrador de máquinas da Autora) confirmou ter sido ele a executar a perfuração e que o furo ficou terminado e pronto para ser instalada a parte eléctrica; também as já citadas testemunhas CC e EE afirmaram a completa realização do furo; mesmo a testemunha BB (companheiro da Ré) admitiu que o furo foi executado e concluído, o que também foi confirmado pela citada testemunha DD; e a testemunha GG, que acompanhou uma «medição» da profundidade do furo, não produziu qualquer declaração no sentido do furo não estar finalizado. Logo, com base nestes elementos probatórios, sempre se formaria uma convicção objectiva e segura no sentido de verificação da matéria aqui em causa.
Segunda.
Embora esteja controvertida a dimensão da profundidade do furo, isto é, quanto metros foram perfurados pela Autora na sua execução, mostra-se inquestionável que, atentas as posições assumidas pelas partes nos respectivos articulados, existe acordo no sentido de que o furo tem, pelo menos, a profundidade de 199 metros [a Autora alegou que perfurou um total de 205 metros (cfr. arts. 7º e 8º do requerimento de injunção) e a Ré veio alegar que o furo não tem essa profundidade e que tem sim 199 metros (cfr. art. 70º da oposição)].
Neste “quadro alegatório”, verifica-se que existe uma aceitação por parte da Ré de que, na sua execução, a Autora perfurou, pelo menos (no mínimo), 199 metros, estando esta realidade assente por acordo das partes.
Assim, no que concerne à matéria inserta na 2ª parte do facto provado nº13, nomeadamente no segmento «tendo executado uma perfuração de 205 metros», conclui-se que apenas está por apurar se, para além daqueles 199 metros, a Autora ainda executou mais 6 metros de perfuração e, por via disso, a pretensão impugnatória da Ré/Recorrente, nesta parte, está restrita ao apuramento da existência de execução de mais metros de perfuração para além dos 199 metros já assentes.
Terceira.
A matéria relativa à prestação de informação por parte da Autora à Ré sobre a necessidade de perfurar mais 55 metros que os 150 previstos no orçamento e sobre o acréscimo de preço, e relativa à existência de aceitação por parte da Ré (constante dos arts. 8º e 9º do requerimento de injunção, e que foi negada em sede de oposição - cfr. arts. 31º e 51º a 60º), não foi considerada pelo Tribunal a quo na decisão de facto pese embora tenha manifesta relevância para a decisão da causa: independentemente da questão sobre se tal tipo de perfuração a mais (e de maior custo) já resultava (estava prevista) no orçamento aprovado/adjudicado, por força da configuração da causa de pedir apresentada pela Autora, é de inquestionável pertinência apurar da verificação (ou não) da factualidade em causa porque, em caso positivo, representa uma alteração do plano (orçamento) convencionado por iniciativa da empreiteira mas com a autorização da dona da obra, o que concede à Autora do direito de reclamar o pagamento do preço, incluindo a parte correspondente à alteração («perfuração de mais 55 metros») - cfr. art. 1214º, a contrario, do C.Civil.
A omissão desta matéria da decisão de facto configura uma deficiência da decisão de facto que deve ser suprida, mesmo de forma oficiosa, ao abrigo dos poderes decisórios previstos no art. 662º/c) do C.P.Civil de 2013 (os autos contêm todos os elementos probatórios necessários para o efeito, não havendo necessidade de anulação da decisão e remessa ao Tribunal a quo).
Deste modo e porque são realidades que estão directamente conexionadas, conclui-se que, no âmbito da apreciação desta pretensão impugnatória reportada aos pontos provados nºs. 13 e 16, deve ser incluída na decisão de facto e avaliada, em termos de demonstração probatória (ou não), a seguinte matéria de facto alegada e relevante: «aquando dos trabalhos de perfuração, a Autora informou a Ré, na pessoa do seu companheiro BB, da necessidade de perfurar mais metros do que estava no orçamento provisional, para obter o caudal mínimo garantido, e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno, e o valor dos trabalhos seria superior ao orçamento provisional, sendo pagos aos preços unitários especificados no orçamento, o que foi aceite pela Ré» e «face ao acordado a Autora perfurou até aos 205 metros».
Quarta e quinta.
No facto provado nº15 o Tribunal a quo consignou matéria que não foi alegada pelas partes, e que corresponde aos segmentos «por razões técnicas» e «30 metros para a caixa de água e mais 10% do total perfurado para o funcionamento da bomba eléctrica».
Efectivamente, percorrendo quer o requerimento de injunção quer o articulado de resposta às excepções, não se encontra qualquer alegação expressa concernente a «razões técnicas» e/ou a «caixa de água» e/ou a «mais 10% do total perfurado para o funcionamento da bomba eléctrica».
No requerimento de injunção, a Autora alegou que a necessidade de perfurar mais metros (do que os 150 previstos no orçamento) só surgiu «aquando dos trabalhos de perfuração» e invocou, como motivo justificativo, o seguinte: «obter o caudal mínimo garantido, colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno, tudo por ser necessário para atingir o caudal mínimo garantido e o bom funcionamento do furo» (cfr. art. 8º). Neste articulado, nada foi alegado no sentido da causa (justificação) da necessidade de maior perfuração ser a execução de uma caixa de água e/ou um acréscimo (“margem”) de mais 10% de perfuração para o funcionamento da bomba.
No articulado de resposta, relativamente à necessidade de perfuração de mais metros que os 150 previstos no orçamento, a Autora continuou a alegar, como motivo, «garantir a obtenção do caudal mínimo de 6.000 litros/dia» (cfr. arts. 14º e 15º), mas veio concretizar que «a veia de água apareceu aos 149 metros de profundidade» (matéria plasmada na 2ª parte do facto provado nº14) e que «foi necessário perfurar mais metros para que a eletrobomba trabalhe abaixo desse nível» (cfr. art. 16º). Também neste articulado, nada foi concretamente alegado no sentido de a causa (justificação) da necessidade de maior perfuração ser a execução de uma caixa de água e/ou um acréscimo (“margem”) de mais 10% de perfuração para o funcionamento da bomba. Saliente-se que, perante a simples (e sintética) alegação de que «a eletrobomba trabalhe abaixo do nível a que apareceu a veia de água», não se vislumbra de que modo (em que termos) esta alegação de concretização (da exigência de garantir o caudal mínimo diário) pode estar relacionada (conexionada) com a execução da caixa de água: não só não lhe foi feita uma referência mínima, como também nem sequer se fez uma alusão à dimensão/profundidade da mesma, acrescendo que igualmente não se fez uma referência mínima no sentido que «a eletrobomba tinha que trabalhar X metros abaixo do nível a que apareceu a veia de água» (apenas e tão só se alegou que tem que trabalhar abaixo do nível). E, neste articulado, manteve-se a ausência absoluta de referência a «regras técnicas».
Perante a matéria inserta nos articulados quanto a este ponto específico da causa de pedir e que não foi objecto de qualquer alteração/ampliação nos termos legalmente previstos (e, na sua oposição, naturalmente a Ré nada alegou sobre os motivos da invocada necessidade de perfuração de mais 55 metros), mostra-se claro que os segmentos «por regras técnicas» e «30 metros para a caixa de água e mais 10% do total perfurado para o funcionamento da bomba eléctrica» não constituem matéria alegada pelas partes (designadamente, pela Autora). E sempre se registe que também em nenhum dos documentos apresentados nos autos (designadamente, no orçamento datado de 16/05/2022 - cfr. facto provado nº5 – ou no documento de fls. 38 dos autos) existe qualquer menção ou alusão a «regras técnicas», «caixa de água» e/ou «acréscimo de mais 10% de perfuração».
Analisemos autonomamente cada um destes segmentos.

No que concerne ao segmento «por regras técnicas», para além da sua falta de alegação, atento o objecto do litígio, verifica-se que está directamente relacionado com o thema decidendum já que, não só corresponde a uma expressão utilizada pela própria Lei (mais especificamente no art. 1215º do C.Civil, no qual se prevê o regime das alterações necessárias ao plano convencionado no âmbito do contrato de empreitada), como também uma das questões a decidir depende do significado real desta expressão técnico-jurídica. Com efeito:
- a Autora pretende que a Ré seja condenada a pagar-lhe o valor correspondente ao preço da execução do furo, valor que inclui a parte relativa à perfuração de mais de 55 metros do que a “metragem” prevista no orçamento;
- para fundamentar tal pretensão, para além do mais (e como supra se referiu), a Autora alegou que obteve a aceitação (autorização) da Ré para realizar essa maior perfuração, o que foi expressamente negado em sede de oposição, donde decorre que, na falta de prova desta autorização, poderá ser aplicável o disposto no art. 1214º do C.Civil e não assistirá àquela o direito a receber o valor do preço relativo à parte da «perfuração a mais»;
- mas a Autora também alegou (como supra se referiu) que a maior perfuração teve como causa a «obtenção do caudal mínimo garantido diário de 6.000 litros/dia e o colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno, para o bom funcionamento do furo» e a «eletrobomba trabalhar abaixo do nível a que apareceu a veia de água», sendo que esta matéria de facto, a provar-se, poderá configurar o preenchimento do disposto no citado art. 1215º/1, isto é, que, por exigência das «regras técnicas» aplicáveis à obra em causa, é permitido ao empreiteiro introduzir alterações ao plano (orçamento) convencionado sem autorização do dono da obra, e, ainda assim, assistir-lhe o direito a receber o valor do preço na parte correspondente às alterações (no caso em apreço, a maior perfuração)

Deste modo, tendo em consideração a matéria efectivamente alegada neste âmbito, importa apurar e inserir na decisão de facto o concreto motivo (ou motivos) que, aquando da execução da obra, tornou necessária a perfuração de mais metros que os 150 previstos no orçamento, sendo a partir desta realidade fáctica que ficar provada (ou que não ficar provada) que pode ser extraída a conclusão jurídica sobre se, na execução do furo do caso em apreço, imperaram concretas regras técnicas que determinaram a necessidade da Autora (empreiteira) introduzir alterações («maior perfuração») ao plano (orçamento) convencionado independentemente de qualquer autorização da Ré (dona da obra), ou seja, se está preenchida facti speci da norma contida no art. 1215º/1.
Logo, mesmo que tivesse sido alegado (e não foi), o segmento em causa representa matéria de natureza conclusiva e jurídica, inserindo-se mesmo numa das respostas jurídicas a obter com vista a decidir a questão jurídica fundamental, pelo que se impõe concluir que não pode constar da decisão de facto (isto é, não pode integrar quer os factos provados, quer os factos não provados).
Estamos, portanto, perante uma deficiência da decisão de facto, devendo o segmento «regras técnicas» ser eliminado da mesma (designadamente, do facto provado nº15), o que se deve determinar de forma oficiosa, ao abrigo dos poderes decisórios previstos no art. 662º/c) do C.P.Civil de 2013.
No que concerne ao segundo segmento - «30 metros para a caixa de água e mais 10% do total perfurado para o funcionamento da bomba eléctrica».
Este segmento traduz uma versão fáctica que é nova e distinta daquela que, sobre este ponto específico, a Autora configurou na causa de pedir inserta no articulado inicial (na qual o motivo foi «obter/atingir o caudal mínimo garantido e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno, tudo para garantir o caudal mínimo diário e o bom funcionamento do furo», e não a necessidade de executar uma caixa de água e/ou uma “margem” de mais 10% de perfuração), e que foi objecto de (alguma) concretização no articulado de resposta (acrescentando-se que, para garantir o caudal mínimo diário, era necessário que a «eletrobomba trabalhasse abaixo do nível a que apareceu a veia de água», mas continuando a não existir qualquer referência à necessidade de realizar uma caixa de água e/ou uma “margem” de mais 10% de perfuração).
No facto provado nº15 (e na restante factualidade provada e não provada), o Tribunal a quo omite parcialmente a matéria efectivamente alegada pela Autora para justificar a necessidade de maior perfuração («obter/atingir o caudal mínimo garantido e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno» e «a eletrobomba trabalhe abaixo do nível a que apareceu a veia de água») e, ao invés, consignou o segmento factual aqui em causa que, como supra já se explicou, não foi alegado e representa matéria de facto nova, traduzindo até uma alteração parcial (e oficiosa) da causa de pedir concretamente alegada quanto a este ponto específico.
Por força do disposto no art. 5º/1 do C.P.Civil de 2013, têm que ser obrigatoriamente alegados pelas partes todos os factos essenciais que constituem a causa de pedir [«na petição deve o autor expor os factos essenciais que constituem a causa de pedir» - cfr. art. 552º/1d) do C.P.Civil de 2013] e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas [«na contestação deve o réu expor os factos essenciais em que se baseiam as exceções deduzidas» - cfr. art. 572º/c) do C.P.Civil de 2013].
Referindo-se ao citado art. 5º, explicam Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[74] que “embora se tenha deixado mencionar na epígrafe o princípio do dispositivo (epígrafe do anterior art. 264), substituído pela expressão “ónus de alegação das partes”, é dele que se trata, na vertente do princípio da controvérsia (…), bem como do princípio da legalidade do conteúdo da decisão”, e que o princípio da controvérsia “traduz-se na liberdade de alegar os factos destinados a constituir fundamento da decisão, na de acordar em dá-los por assentes e, em certa medida, na iniciativa da prova dos que forem controvertidos”, concretizando que “o seu aspeto principal consiste em que às partes cabe a formação da matéria de facto em causa, mediante a alegação, nos articulados, dos factos principais, isto é, dos que integram a causa de pedir, fundando o seu pedido, e daqueles em que se baseiam as exceções perentórias. Sem prejuízo dos factos da causa poderem ser alegados por qualquer das partes, cada uma tem o ónus da alegação daqueles que têm um efeito que lhe é favorável (…)”. E mais afirmam: “O juiz não pode considerar, na decisão, factos principais diversos dos alegados pelas partes (em articulado ou em resultado da instrução da causa). Por muito que suspeite da sua verificação ou que deles tenha até conhecimento, o juiz não pode, em regra, deles servir-se” (neste mesmo sentido se pronunciou o Ac. do STJ de 30/11/2022[75] - «os “factos essenciais nucleares” devem ser alegados pelas partes (nos termos do art. 5.º/1 do CPC) e só por estas, estando vedado ao tribunal servir-se de factos essenciais que por elas não hajam sido alegados»).
Não tendo sido alegado por qualquer das partes, o Tribunal a quo não podia ter tomado em consideração este segmento factual para efeitos da decisão de facto, estando-lhe legalmente vedada a possibilidade de o inserir na matéria de facto (seja na provada seja na não provada): no caso em apreço, apenas podia ter em consideração a realidade (versão) fáctica concretamente invocada pela Autora, ou seja, os factos essenciais consistentes na necessidade de maior perfuração ter como razão/causa a «obtenção  do caudal mínimo garantido e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno, tudo para atingir o caudal mínimo garantido e o bom funcionamento do furo» (art. 8º do requerimento de injunção) e/ou que a «eletrobomba trabalhe abaixo do nível em que apareceu a veia de água» (art. 16º do articulado de resposta), registando-se que, como antedito, o Tribunal a quo omitiu da decisão de facto parte desta factualidade alegada pela Autora.
 Acresce que não se nos afigura que este segmento factual possa ter enquadramento na previsão do nº2 do citado art. 5º: “Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz: a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; c) Os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções”.
Os factos instrumentais são aqueles cuja ocorrência conduz à demonstração, por dedução, dos factos essenciais, sendo que a sua função é probatória, porquanto servem fundamentalmente para formar a convicção do julgador sobre a ocorrência ou não dos factos essenciais[76]. Ora, uma vez que a matéria contida no segmento em análise é nova e diversa da alegada pela Autora, então é insusceptível de demonstrar (por dedução), ou de auxiliar na formação da convicção, no que concerne aos factos concretos (e essenciais) invocados para justificar a necessidade de maior perfuração: a «caixa de água» e/ou «a margem de 10%» poderiam constituir motivos para obrigar a uma maior perfuração, mas não foram os motivos alegados e são inquestionavelmente distintos dos que foram concretamente invocados pela Autora, pelo que nada permitem deduzir sobre ««obter/atingir o caudal mínimo garantido», «colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno», e/ou «a eletrobomba trabalha abaixo do nível a que apareceu a veia de água». Portanto, não se lhe pode reconhecer a natureza de facto instrumental.
Por sua vez, os factos complementares são (passe a redundância) os completadores de uma causa de pedir complexa ou de uma excepção complexa, ou seja, uma causa de pedir ou uma excepção aglutinadora de diversos elementos, uns constitutivos do seu núcleo primordial (factos essenciais ou principais), outros complementando aquele núcleo essencial/principal. Já os factos concretizadores são os que têm por função pormenorizar a questão fáctica exposta, sendo exactamente essa pormenorização dos factos anteriormente alegados que se torna fundamental para a procedência da acção ou da excepção[77]. Nestes termos e relembrando (mais uma vez) que a realidade que decorre dos factos concretamente alegados pela Autora sobre os motivos da necessidade de maior perfuração é distinta e diversa da que decorre da matéria contida neste segmento factual, jamais esta pode revestir uma natureza concretizadora ou complementar (e sempre se assinale que, mesmo que a matéria factual constante deste segmento tenha resultado da instrução da causa, designadamente da prova testemunhal, certo é que nada consta dos autos que comprove que o Tribunal a quo deu conhecimento às partes que tal matéria tinha natureza complementar ou concretizadora e deu oportunidade às mesmas para sobre ela se pronunciarem).
Logo, este segmento factual jamais podia ser considerado pelo juiz nos termos do nº2 do citado art. 5º (obviamente que não configura um facto notório nem matéria de que o tribunal tome conhecimento no exercício das suas funções). E também não tem natureza superveniente nos termos definidos no nº2 do art. 588º do C.P.Civil de 2013.
Nestas circunstâncias, a não inclusão de matéria de facto concretamente alegada pelas partes (no caso, pela Autora) e que se mostra relevante para a decisão (designadamente, para o apuramento da existência ou não da necessidade de maior perfuração e que corresponde à alegação de que «a eletrobomba trabalha abaixo do nível em que apareceu a veia de água» - art. 16º do articulado de resposta) e a inclusão de matéria que não foi alegada pelas partes (o segmento consistente em «30 metros para a caixa de água e mais 10% do total perfurado para o funcionamento da bomba eléctrica») configuram deficiências da decisão de facto que devem ser supridas, mesmo de forma oficiosa, ao abrigo dos poderes decisórios previstos no art. 662º/c) do C.P.Civil de 2013.

Por via disso, impõe-se concluir que, no âmbito da apreciação desta pretensão impugnatória reportada aos pontos provados nºs. 13 e 16:
- deve ser incluída na decisão de facto e avaliada, em termos de demonstração probatória (ou não), a seguinte matéria de facto alegada e relevante - «a eletrobomba trabalha abaixo do nível em que apareceu a veia de água»;
- e deve ser eliminado da decisão de facto (designadamente, do facto provado nº15) o segmento «30 metros para a caixa de água e mais 10% do total perfurado para o funcionamento da bomba eléctrica».

Tendo em consideração estes pressupostos (conclusões), apreciamos, então, a este ponto da pretensão impugnatória.
No que concerne à matéria da 2ªparte do facto provado nº13 («tendo executado uma perfuração com 205 metros, com revestimento 140mm média pressão reforçado em 205 metros e, isolamento de 180mm x 7.5Kg na quantidade de 15 metros»), do facto provado nº14 e do segmento «com um caudal aproximado de 250L/hora» que integra o facto provado nº16 (parte que remanesce por provar, atendendo a que a 1ª parte já está assente e foi eliminada parte do seu conteúdo em face da supressão do vício da deficiência de que padecia), o Tribunal a quo motivou o seu juízo probatório essencialmente no seguinte:
“Relativamente à perfuração para execução do furo e metros concretamente atingidos, o Tribunal atendeu ao depoimento sério, seguro e isento de contradições da testemunha FF, manobrador de máquinas e colaborador da autora, que explicou detalhadamente os concretos trabalhos executados e, bem assim, a profundidade atingida, que consignou no documento de obra junto a fls 38, a que igualmente se atendeu, explicando que no terceiro dia de perfuração a água apareceu à profundidade de 149 metros com um caudal mínimo de 6.000L/dia (…)
Uma nota final para referir que apesar da testemunha GG, operador de posto em área de serviço, ter referido que se deslocou a casa do autor, juntamente com um mineiro, para verificar a profundidade do furo, tendo aquele constatado que apenas teria 1999[78] m, tal afirmação, além de referir a conclusão a que terceiro (mineiro) teria chegado, não foi acompanhada de qualquer circunstancialismo ou elemento que a permitisse confirmar, ao contrário, por exemplo do depoimento do manobrador de máquinas que fez o furo FF, que de forma logica e coerente esclareceu que os metros perfurados foram anotados no documento de fls 38, tendo a testemunha e EE explicado que para aferir a profundidade dos metros alcançados se regem pelas réguas da própria máquina que faz a perfuração”.
Perante a prova produzida, entendemos ser acertada esta fundamentação do Tribunal a quo, não se podendo reconhecer razão à Ré/Recorrente quanto a estes pontos de facto, salientando-se que, neste plano, está apenas em causa apurar a quantidade de metros perfurada, os géneros e quantidades de revestimento e isolamento realizados, e o caudal obtido (e não se houve necessidade de maior perfuração, matéria que respeita a outros pontos de facto, como adiante se verá).
De todas as testemunhas inquiridas, a única que interveio de forma directa na execução do furo (designadamente na respectiva perfuração), foi a testemunha FF. Assim, é esta testemunha quem tem conhecimento directo e concreto dos trabalhos que foram executados.
Embora seja trabalhadora da Autora, não se vislumbra que a inerente relação de dependência tenha tido algum efeito negativo na credibilidade do seu depoimento: aliás, no recurso, a Ré/Recorrente não identifica um único segmento que revele a influência («pressão») dessa relação no conteúdo das suas declarações (limitando-se a produzir considerações genéricas, sem qualquer concretização).
Quanto a estes pontos de facto, o depoimento da testemunha FF mostrou-se coerente, lógico, objectivo, isento de contradição e não revelou interesse no sentido da decisão da causa. A testemunha explicou, de forma clara e concreta, os trabalhos que executou, afirmando que perfurou até aos 205 metros e que, no fim dos trabalhos, fez um «relatório» com a discriminação dos mesmos, «relatório» esse que reconheceu corresponder ao documento de fls. 38 dos autos (documento nº6 do articulado de resposta), confirmando quer ser de sua autoria quer o respectivo conteúdo (que explicou).
O depoimento não padece da contradição que a Ré/Recorrente lhe apontou («começou por afirmar que perfurou 40 metros a mais, para mais tarde alegar que perfurou já 50 metros a mais»). Decorre do teor do mesmo que a testemunha FF começou por explicar que, após ter parado aos 150 metros e ter comunicado ao CC que «a água tinha aparecido bastante funda» (149 metros), este veio posteriormente informá-lo que tinha acordado com o cliente perfurar até aos 200 metros e, na sequência, perfurou até aos 205 metros. Portanto, não afirmou «ter perfurou mais 50 metros», assumindo sim que foi além dos «mais 50 metros» que lhe foram informados. Esta assunção de uma perfuração até 205 metros, reforça a credibilidade das suas declarações já que, perante a «ordem» para ir até aos 200 metros, só se compreende que reconheça o incumprimento de tal «ordem» no caso de, na realidade, ter perfurado efectivamente até 205 metros (e não apenas até aos 200). Mais: quando posteriormente, no seu depoimento, se referiu a «40 metros» («neste caso, foi à volta de 40 metros»), estava a reportar-se à «dimensão» da «caixa que teve que fazer para a bomba», e não à quantidade de metros que atingiu a profundidade do furo.           
Tendo o «relatório» (documento de fls. 38 dos autos) sido elaborado pela testemunha FF no fim da execução do furo (ou seja, num momento em que ainda não existia qualquer conflito entre as partes), não se vislumbra qualquer razão válida e plausível para que a testemunha tivesse consignado nesse documento mais «uns poucos metros» (5 ou 6 metros) do que aqueles que teria efectivamente perfurado (relembre-se que a própria Ré/Recorrente reconheceu que o furo tinha pelo menos 199 metros).
Existe, portanto, uma real consonância entre o depoimento da testemunha FF e o teor do documento de fls. 38 quanto à metragem total da perfuração. E perante a existência deste documento, são destituídas de sentido as alegações da Ré/Recorrente de que «não existem quaisquer documentos de suporte que sustentem que o furo em discussão nos autos tenha 205 metros» e/ou «não existem quaisquer registos de perfuração que permitam sustentar o cálculo da profundidade do dito furo».
Acresce que, no respectivo depoimento, a testemunha EE explicou que, na factura (documento de fls. 37 dos autos - documento nº4 junto com o articulado de resposta), foi feito um desconto de € 252,00 (o qual que consta do documento de fls. 37), equivalente ao custo total de 5 metros (de perfuração e revestimento), em face de terem sido perfurados 205 metros (e não 200 metros). E frise-se que, ao contrário do que a Ré/Recorrente alega, a testemunha CC não confirmou que o furo tinha apenas 200 metros, tendo sim explicado que «5 metros foram oferta da empresa», donde resulta que, também segundo esta testemunha, foi perfurado um total de 205 metros (e não 200 metros). Estes elementos probatórios corroboram, quanto à profundidade atingida, o depoimento da testemunha FF e o teor do documento de fls. 38 dos autos.
A única prova produzida em sentido contrário (ao da perfuração ter atingido 205 metros), foi o depoimento da testemunha GG. Porém, esta testemunha declarou ser (profissionalmente) «operador de posto em área de serviço» e não revelou possuir qualquer conhecimento e/ou experiência na actividade de «perfuração de furos para a captação de água» e/ou de «medição» de tais furos, decorrendo das suas declarações que se limitou a acompanhar um «mineiro» na verificação/medição da profundidade do furo e a afirmar que o furo tem 199 metros de profundidade. Ora, como bem se refere na motivação da sentença recorrida, esta afirmação corresponde a uma mera «conclusão a que terceiro (mineiro) terá chegado», sendo que, por um lado, esse terceiro («mineiro») não foi apresentado como testemunha nos autos e, por outro lado, a testemunha GG não deu qualquer explicação e/ou pormenorização sobre a forma como foi realizada e obtida a medição. Deste modo, o seu depoimento não apresenta um mínimo de sustentação para merecer credibilidade por parte do Tribunal e, por via disso, contrariar o sentido dos elementos probatórios supra elencados.
A Ré/Recorrente invocou ainda que «não existem quaisquer documentos que justifiquem o número de “varas” gastas na perfuração do dito furo», mas não se compreende o sentido desta alegação: para além de não ter concretizado a que tipo de documentos se refere, certo é que da prova testemunhal produzida nada resultou no sentido de que, na respectiva actividade, a Autora realiza um registo documental das «varas gastas/utilizadas na perfuração» e de que é a partir desse registo que se determina a profundidade (metragem) do furo.
Por outro lado, a consonância entre o depoimento da testemunha FF e o teor do documento de fls. 38 dos autos também se constata relativamente aos metros de perfuração a que apareceu a água («por volta dos 149 metros» como referiu a testemunha, sendo que é exactamente esse «valor» que está consignado no documento) e relativamente ao caudal (a testemunha explicou que a água apareceu logo com a quantidade no limite, ou seja, nos 6.000 litros/dia, pormenorizando a forma como mediu a quantidade dessa caudal, o que tudo corresponde ao consignado no documento - «produção, profundidade 149 m, Caudal +-250 l/h» -, sendo que 250 litros/hora corresponde obviamente a 6.000 litros/dia).
Neste ponto, não foi produzida qualquer prova em sentido contrário.
Apesar da Ré/Recorrente indicar o depoimento da testemunha GG, como supra já se referiu, esta testemunha não revelou ter qualquer conhecimento e/ou experiência na execução de furos de captação de água, acrescendo que se limitou a afirmar que «bateram logo em água, a 15 metros da boca» e que «os vizinhos normalmente não têm que perfurar 200 metros, tenho conhecimento de um que só fez 100 metros», mas nada mais explicou, circunstanciou e/ou pormenorizou (nomeadamente, não concretizou a forma como detectaram a água a 15 metros e de que forma esta circunstância era incompatível com o aparecimento de água, aquando da perfuração, apenas a 149 metros, tal como não concretizou a localização dos prédios dos vizinhos em relação ao da Ré - aliás, nem sequer identificou qualquer vizinho).
A Ré/Recorrente indicou ainda o documento de fls. 34 a 36 dos autos (documento nº2 do articulado de resposta), o que até é contraditório com a declaração de impugnação do mesmo que inseriu no seu requerimento datado de 26/10/2023. Mas não relevando isto, estamos efectivamente perante um documento autêntico (porque emitido pela Agência Portuguesa do Ambiente no âmbito das suas competência e actividade - cfr. art. 363º/1 e 2 do C.Civil), o qual tem força probatória plena no que respeita aos factos que neles são referidos «como praticados pela autoridade ou respectivo oficial público» e/ou «com base nas percepções da “entidade documentadora”» (cfr. art. 371º/1 do C.Civil). Explicam Pires de Lima e Antunes Varela[79] que “o valor probatório pleno do documento autêntico não respeita a tudo o que se diz ou contém no documento (…) não fica provado que seja verdadeira a afirmação do outorgante, ou que esta não tenha sido viciada por erro, dolo ou coacção, ou que o acto não seja simulado”, ou seja, a força probatória plena não abrange a sinceridade ou a veracidade dos actos e declarações que o documento encerra[80]. Ora, atento o respectivo conteúdo, este documento faz prova plena quanto ao facto de ter sido autorizada a utilização de recursos hídricos (através de pesquisa e captação de água subterrânea) no prédio da Ré. Mas já não faz prova plena quanto ao facto de, nesse prédio e até uma profundidade máxima de 100 metros, ser captável água e com o caudal mínimo de 6.000 litros/dia: com efeito, embora esteja nele consignado «Perfuração (…) Profundidade (m) 100.0», esta menção não traduz nem consubstancia um acto/facto praticado ou percepcionado pela referida entidade (aquando da sua emissão/elaboração) no sentido de comprovar e assegurar que se captaria água até essa profundidade (em nenhum segmento do documento está mencionado que a APA - ou melhor, quem actou em seu nome ou em sua representação - pesquisou e captou água até uma profundidade de 100 metros). Registe-se que as testemunhas CC e EE afirmaram que a menção de «100,0 m» constante da licença é uma indicação da própria APA, mais esclarecendo a testemunha EE que, após a perfuração, é feito um relatório final para a APA e, sendo o caso, são corrigidos os metros da profundidade concretamente atingida. E sempre se saliente que a menção «Classificação do estado/potencial ecológico (superficial) ou estado (subterrânea) da massa de água Bom» não se reporta à profundidade a que a água pode ser captada, mas sim e apenas ao estado quantitativo e químico da massa de água em causa (cfr. art. 4º da Lei nº58/2005, de 29/12). Assim, este documento é insusceptível de contrariar o sentido do depoimento da testemunha FF e do documento de fls. 38 dos autos quanto à profundidade a que foi obtida (captada) a água (e com o caudal em causa).
Por fim, o teor do documento de fls. 38 dos autos (confirmado pela testemunha FF), comprova e atesta os géneros e as quantidades de revestimento e de isolamento integrados na execução do furo (revestimento de 140mm x 10 kg em 205 m e isolamento de 180mm x 7.5Kg em 15 m). Importa registar que nenhum elemento probatório foi produzido em sentido contrário (nomeadamente, de que não foram colocados tais géneros e quantidades de revestimento e isolamento). Aliás, no recurso, a Ré/Recorrente não indicou qualquer meio de prova que contrariasse, neste ponto, o teor do aludido documento e/ou do depoimento da testemunha FF.
Em face das razões (fundamentos) supra elencadas, no nosso entendimento, os elementos probatórios que são efectivamente relevantes e credíveis quanto a estes pontos de facto impõem necessariamente um juízo probatório igual ao formado pelo Tribunal a quo, pelo que este Tribunal ad quem gera uma convicção, segura e objectiva, no sentido da demonstração probatória da factualidade inserta na 2ªparte do facto provado nº13 («tendo executado uma perfuração com 205 metros, com revestimento 140mm média pressão reforçado em 205 metros e, isolamento de 180mm x 7.5Kg na quantidade de 15 metros»), no facto provado nº14, e no segmento do facto provado nº16 que remanescia por provar («com um caudal aproximado de 250L/hora»). Improcede, portanto, nesta parte, a impugnação da Ré/Recorrente.
No que concerne à matéria do facto provado nº15 (estripado dos segmentos eliminados em razão da supressão do vício de deficiência de que padecia) e à matéria que, supra, se concluiu dever integrar a decisão de facto («obtenção do caudal mínimo garantido e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno» e «a eletrobomba trabalhe abaixo do nível em que apareceu a veia de água»), verifica-se que, como resulta da própria motivação da sentença recorrida, apenas as testemunhas FF e CC se pronunciaram sobre as razões (causas) da necessidade de perfurar para além dos 150 metros previstos no orçamento datado de 16/05/2022.
Sucede que as razões relatadas por estas testemunhas traduzem uma realidade nova e distinta daquela que foi concretamente alegada pela Autora.
Alegou esta, como uma das razões da necessidade de maior perfuração, a «obtenção do caudal mínimo garantido». Sucede que, como resulta do respectivo depoimento, a testemunha FF explicou que a água apareceu «por volta dos 149 metros» e «logo com a quantidade no limite» (como, aliás, também resulta do documento de fls. 38 dos autos), jamais afirmando que o caudal nesse momento era inferior aos 6.000 litros/dia que teriam que ser garantidos, o que está em total contradição com a aludida alegação. Já a testemunha CC afirmou que «era necessário afundar mais» (que os 150 metros) mas não estabeleceu qualquer ligação com a necessidade de ainda se ter que obter (atingir) o caudal mínimo garantido de 6.000 litros/dia (reportou este «afundar mais» à exigência de construção da «caixa de água» e deixar uma margem de segurança entre a bomba e o fundo do furo; apenas quando se pronunciou sobre o contacto telefónico com o BB, referiu ter-lhe dito que «era para garantir o caudal dos 6.000 litros»).      
Também alegou, como razão da necessidade de maior perfuração, o «colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno». Embora a testemunha FF tenha confirmado o isolamento de 15 metros tal como consta do documento de fls. 38 dos autos, jamais concretizou ou explicou que a necessidade de continuar a perfurar se prendia com a realização de um isolamento maior que o previsto no orçamento (9 metros) e/ou que este maior isolamento adveio das condições/características do terreno. A testemunha CC nem sequer se pronunciou sobre a necessidade deste maior isolamento.
Alegou ainda a Autora, como razão da necessidade de maior perfuração, a circunstância da «eletrobomba ter que trabalhar abaixo do nível em que apareceu a veia de água». A testemunha FF efectivamente afirmou que «a bomba tem que ir para baixo da veia de água» e a testemunha CC também se pronunciou nesse sentido. Porém, não se limitaram a enquadrar a necessidade de maior perfuração numa mera colocação da bomba «abaixo do nível da veia de água». Com efeito, embora tenha sido esta a única realidade que a Autora alegou quanto à localização (posicionamento) da bomba, de uma forma completamente inovatória e diferente, ambas as testemunhas vieram afirmar a exigência de construção de uma «caixa de água» com cerca de 30 metros (segundo a testemunha CC) ou de 40 metros (segundo a testemunha FF), e explicar que é no fundo dessa «caixa» que é colocada a bomba a trabalhar (ou seja, a localização da bomba não é meramente abaixo do nível da veia de água). Ora, como supra se explicou vastamente, a existência e a construção de uma «caixa de água» (e com tal dimensão) foi completamente omitida pela Autora (não a alegou em qualquer dos articulados como razão/justificação da necessidade de perfurar mais metros do que os 150 previstos), mais acrescendo que, por um lado, no orçamento (documento de fls. 21 dos autos) não está consignada a realização de qualquer «caixa» (e muito menos com a dimensão de 30 ou 40 metros) e que, por outro, não foi consignado no documento de fls. 38 dos autos («relatório) a execução de qualquer trabalho relativo a uma «caixa de água» e à respectiva dimensão (metragem). Logo, nesta parte, os depoimentos das testemunhas FF e CC «avançam» uma razão (causa) para a necessidade de maior perfuração que é diversa e distinta da versão alegada pela Autora (e que vai muito para além de uma mera colocação/posicionamento da bomba abaixo do nível da água).
Igualmente de forma completamente inovatória e diferente do concretamente alegado pela Autora, as testemunhas FF e CC mais vieram afirmar que, a seguir à «caixa de água», ainda existe a exigência de fazer (deixar) uma margem de 10% do total da perfuração («margem de segurança», nas palavras da testemunha CC) porque «a bomba não pode encostar no fundo do furo» e «essa margem é aconselhada pelos fabricantes». De novo, como supra se explicou exaustivamente, a existência desta «margem» (e com tal dimensão) também foi absolutamente omitida pela Autora (não a alegou em qualquer dos articulados como razão/justificação da necessidade de perfurar mais metros do que os 150 previstos), mais se constatando que, por um lado, no orçamento (documento de fls. 21 dos autos) não está consignada a realização de uma «margem de segurança» (ou de 10% da totalidade da perfuração) e que, por outro, não foi consignado no documento de fls. 38 dos autos («relatório») a execução de qualquer trabalho relativo a tal margem e à respectiva dimensão (metragem). Portanto, igualmente nesta parte, os depoimentos das testemunhas FF e CC «avançam» outra razão (causa) para a necessidade de maior perfuração que é diversa e distinta da versão alegada pela Autora (salientando-se que não foi apresentado nos autos qualquer documento que comprove a «recomendação» do fabricante da bomba para à existência da aludida margem).
Sobre a matéria aqui em causa não foi produzido qualquer outro elemento probatório relevante (nenhuma das outras testemunhas inquiridas se pronunciou sobre a mesma, e nenhum dos documentos apresentados assume significado neste campo). 
Nestas circunstâncias, perante o “quadro alegatório relevante e válido” (atendendo a que, como supra se conclui, está legalmente vedado considerar factos que não foram alegados) e perante o “quadro probatório produzido”, impõe-se necessariamente concluir no sentido de um juízo probatório diverso do formado pelo Tribunal a quo:
- por um lado, atento o teor dos depoimentos das testemunhas FF e CC (que, nesta parte são coincidentes e não foram objecto de qualquer prova contrária), este Tribunal ad quem gera uma convicção, segura e objectiva, no sentido de que ficou probatoriamente demonstrado que «apesar do referido em 14., foi necessário perfurar mais metros que os 150 referidos em 5., numa quantidade que não concretamente apurada, para que a eletrobomba trabalhe abaixo do nível em que apareceu a veia de água e permita o bom funcionamento do furo» (naturalmente, a quantidade de metragem necessária para este efeito não pode ser determinada já que estava dependente da execução de uma «caixa de água» que não foi alegada);
- e, por outro lado, atenta a inexistência de prova (ou a que foi produzida teve um sentido contrário), este Tribunal ad quem gera uma convicção, segura e objectiva, no sentido de que não ficou probatoriamente demonstrado que «foi ainda necessário perfurar mais metros que os 150 referidos em 5., para obter o caudal mínimo garantido e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno».
Em face das razões (fundamentos) supra elencadas, conclui-se que, nesta parte, a impugnação da Ré/Recorrente procede apenas de forma parcial (e com base em fundamentação diferente), impondo-se a alteração da decisão de facto de acordo com os termos supra indicados, sendo que uma das alterações (eliminação de factualidade não alegada) é determinada ao abrigo do disposto no art. 662º/c) do C.P.Civil de 2013.

Em consequência, determina-se:  
- que o facto provado nº15 passe a ter a seguinte redacção - «Apesar do referido em 14., foi necessário perfurar mais metros que os 150 referidos em 5., numa quantidade que não concretamente apurada, para que a eletrobomba trabalhe abaixo do nível em que apareceu a veia de água e permita o bom funcionamento do furo»;
- e que se adite um facto não provado E) com a seguinte redacção - «Para além do referido em 15., foi necessário perfurar mais metros que os 150 referidos em 5., para obter o caudal mínimo garantido e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno».
No que concerne à matéria consistente em  «aquando dos trabalhos de perfuração, a Autora informou a Ré, na pessoa do seu companheiro BB, da necessidade de perfurar mais metros do que estava no orçamento provisional, para obter o caudal mínimo garantido, e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face a natureza do terreno, e o valor dos trabalhos seriam superiores ao orçamento provisional, sendo pagos aos preços unitários especificados no orçamento, o que foi aceite pela Ré» e «face ao acordado a Autora perfurou até aos 205 metros» (matéria que, como supra se concluiu, deve integrar a decisão de facto), verifica-se que os únicos elementos probatórios produzidos foram os depoimentos das testemunhas CC e BB (a testemunha FF limitou-se a referir aquilo que a testemunha CC lhe disse ter acordado com o cliente, não tendo assistido a qualquer conversa entre eles; e nenhuma outras das testemunhas inquiridas revelou conhecimento directo e concreto sobre esta realidade).
Nesta matéria, os dois depoimentos das testemunhas CC e BB foram contraditórios: a testemunha CC afirmou ter contactado telefonicamente o BB dizendo-lhe que «tinha aparecido água e que era necessário afundar mais 50 metros, para garantir o caudal dos 6.000 litros e para garantir o bom funcionamento do furo» e «desses 50, 30 seriam para fazer a caixa e os outros 20 para margem de segurança da bomba, 10% o total perfurado», e mais lhe dizendo que «isso teria um custo extra de 2.000 euros», e afirmou que «ele concordou»; por sua vez, a testemunha BB afirmou que «não me foi comunicado qualquer necessidade de perfurar mais 55 metros», que «não aceitei o acréscimo do custo», que «lhe foi transmitido pelo CC, por telefone, que apareceu água aos 149 metros e perguntou ao CC se era preciso alguma coisa para não ultrapassar o orçamento e o CC disse que não haverá acréscimo e nós ficámos descansados que as coisas seriam bem feitas».
Entendemos que, neste campo, ambos os depoimentos encerram incoerências e faltas de explicação.
Quanto ao da testemunha CC. Não conseguiu precisar o dia em que terá realizado o telefonema. Não se compreende a afirmação «para garantir o caudal dos 6.000 litros» quando resulta, quer do depoimento da testemunha FF, quer do documento de fls. 38 dos autos, que a água apareceu aos 149 metros com esse caudal mínimo. Não se entende porque referiu ao BB a necessidade de fazer uma caixa de água com 30 metros e deixar uma margem de segurança de 20 metros, quando nenhum destes trabalhos consta do orçamento (documento de fls. 21 dos autos). Não se percebe porque não referiu ao BB a necessidade de aumentar a quantidade do isolamento de 9 para 15 metros. Embora tenha procurado explicar a razão pela qual não elaborou uma mensagem escrita a comunicar o aumento do preço da execução do furo («o acréscimo dos 50 metros, era uma coisa mais complexa, já foi durante a execução dos trabalhos e era mais fácil explicar por telefonema»), não o fez de uma forma plausível: importa ter em atenção que esta testemunha remeteu uma mensagem escrita ao BB a comunicar uma alteração ao valor do orçamento de apenas mais € 36,00 (relativo ao custo do isolamento - cfr. documento de fls. 21v dos autos e facto provado nº12) e a solicitar a respectiva aceitação, tal como lhe apresentou um orçamento rectificado/corrigido relativamente à execução da parte eléctrica, em razão da maior profundidade do furo, com o aumento do custo em cerca de € 830,00 sem IVA (cfr. documento de fls. 36v dos autos - documento nº3 do articulado de resposta), tendo em vista obter a aceitação do mesmo; perante tal tipo de conduta não se consegue descortinar uma razão válida para não ter apresentado também, por escrito, um orçamento rectificado/corrigido englobando o preço do acréscimo dos mais 50 metros de perfuração (e que representava um aumento do custo de cerca de € 2.500,00), com vista a obter a aceitação do BB (a circunstância dos trabalhos estarem executados não pode constituir motivo bastante para a não apresentação escrita desse orçamento rectificado/corrigido, até porque a própria testemunha confirmou ter ordenado à testemunha FF para parar a perfuração e aguardar pelo contacto com o cliente, acrescendo que, tendo efectivamente havido comunicação da maior perfuração e aceitação do respectivo custo pelo cliente, então facilmente a testemunha CC poderia ter enviado um email à testemunha BB contendo orçamento rectificado/corrigido e obter a confirmação por escrito dessa concordância da Ré e do próprio BB, tal como sucedeu com o orçamento inicial). Deste modo, este segmento do depoimento suscita muitas dúvidas e incertezas sobre a realidade ocorrida, o que necessariamente afecta (negativamente) a sua credibilidade.
Quanto ao da testemunha BB. Não explicou porque razão o CC lhe telefonou a dizer que tinha aparecido água aos 149 metros quando tinha contratado a perfuração até aos 150 metros (limitou-se a conjeturar sobre hipóteses da finalidade do telefonema), e não se compreende porque razão, por iniciativa própria, questionou o CC sobre se haveria acréscimo do custo do furo, quando (na sua versão) não lhe foi comunicada qualquer necessidade de maior perfuração. Assim, este segmento do depoimento provoca dúvidas e incertezas que sobre a realidade ocorrida, o que forçosamente afecta (negativamente) a sua credibilidade.
Perante a ausência de produção de outra prova relevante e efectiva sobre esta matéria e apresentando os dois citados depoimentos fragilidades que se mostram inultrapassáveis (até pela inexistência de outro elemento probatório que permitisse conceder maior credibilidade a um ou a outro), então, porque incumbe à Autora o ónus de prova desta realidade que alegou e lhe aproveita, por força do disposto no art. 414º do C.P.Civil de 2013, a dúvida sobre a verificação ou não desta factualidade tem que se resolver contra a ela.
Por isso, não se pode subscrever a motivação da sentença recorrida quando se afirma: “(…) o depoimento da testemunha BB foi também contraditado pelos depoimentos das testemunhas FF e, e principalmente CC, com quem acordou a realização da obra, tendo esta testemunha afirmado lhe foi dada autorização expressa por telefone pelo prócio BB para continuar a perfurar, isto quando se alcançou água aos 140m[81] e lhe terá ligado a dar conta da necessidade de continuar a perfurar (até aos 205 m) para permitir fazer caixa de água e deixar a bomba a distância de segurança do fundo do furo, o que por si só abalaria a versão da testemunha BB, sendo certo que segundo as regras da repartição do ónus do prova era à ré que competia fazer prova de que não deu autorização para se perfurara além da previsão dos 100m[82] (…)”.
Igualmente não se subscreve a motivação da sentença recorrida quando se sustenta que: “Pese embora o a testemunha BB, companheiro da ré, tenha procurado fazer crer que esta nunca consentiu que se perfurasse além dos 100m previstos no orçamento, o certo é que o seu depoimento revelou-se centrado em negar que autorização para perfurar além da previsão do orçamento, sendo que o seu depoimento é frontalmente contraditado pelo próprio teor do orçamento, que o mesmo admite que recebeu e rubricou, tal como a ré, de onde flui, de forma cristalina que “O mínimo de água garantida é de 6.000L/dia; Este orçamento é para uma previsão de 150 metros. Caso sejam precisos mais metros de perfuração e revestimento para garantir o mínimo de água, ou isolamento para garantir o bom funcionamento, serão pagos aos preços acima indicados, resultando desde logo do orçamento a possibilidade de perfurar mais metros (…)”. Frise-se que a factualidade que aqui está em causa é, como alega a própria Autora (mas foi omitido pelo Tribunal a quo na decisão de facto), se esta informou a Ré da necessidade de perfurar mais metros (e de mais metros de isolamento) e do acréscimo de custo, e se a Ré aceitou. Logo, saber se o conteúdo do orçamento, por si só, permitia à Autora a possibilidade de perfurar mais metros porque a Ré já o teria consentido, é uma questão completamente diversa da realidade aqui em análise e que cumpre apurar, configurando, aliás, uma questão que respeita unicamente à interpretação jurídica dos factos provados relativos ao conteúdo («cláusulas») do orçamento.      
Deste modo, porque este Tribunal ad quem não consegue formar uma convicção minimamente certa e segura, impõe-se necessariamente um juízo probatório no sentido de considerar como não provada a matéria factual aqui em causa, impondo-se a alteração da decisão de facto, por forma a incluir tal factualidade, e que, como supra se explicou, é determinada ao abrigo do disposto no art. 662º/c) do C.P.Civil de 2013.
Em consequência, determina-se que se adite um facto não provado F) com a seguinte redacção: «Aquando dos trabalhos de perfuração, a Autora informou a Ré, na pessoa do seu companheiro BB, da necessidade de perfurar mais metros do que os 150 referidos em 5., para obter o caudal mínimo garantido, e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face a natureza do terreno, e informou que o valor dos trabalhos seriam superiores ao orçamento referido em 5., sendo pagos aos preços unitários especificados no orçamento, o que foi aceite pela Ré, pelo que a Autora perfurou até aos 205 metros referidos em 13.».
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Quanto à alteração do facto provado nº18.
Pretende a Ré/Recorrente que o ponto nº18 da matéria de facto provada seja eliminado e passe a integrar da matéria de facto não provada, por entender ocorrer uma total ausência de prova sobre esta matéria.
Este facto tem o seguinte conteúdo: «A autora entregou o novo orçamento mencionado em 18. à ré, através do seu companheiro BB, o qual não foi aceite por estes e, nessa sequência, não adjudicaram à autora a instalação da parte eléctrica do furo».
Constata-se, desde logo, que padece de um manifesto lapso de escrita: quando se consignou «em 18.», pretendia-se, obviamente, redigir-se «em 17.» uma vez que é na matéria do facto provado nº17 que está mencionado o novo orçamento. Assim, ao abrigo do disposto no art. 249º do C.Civil, determina-se a rectificação deste lapso de escrita, substituindo-se «18.» por «17.».
Analisando a prova produzida sobre esta matéria, verifica-se que (com relevância):
- a testemunha CC explicou que «uns dias a seguir a terminarem dos trabalhos da execução do furo, esteve com o BB quando foi apresentar a conta-corrente um pouco superior a 10.000,00 euros e o orçamento rectificado da parte eléctrica», que «o BB achou o orçamento rectificado um bocado caro e lhe disse que ainda ia pensar sobre a parte eléctrica» e que «posteriormente o BB lhe deu indicações para não avançar com a parte eléctrica e ficou suspensa esta parte»;
- a testemunha BB explicou que «quando a equipa de electricistas chegou ao local, disseram que as medições tinham sido mal efectuadas e que havia um acréscimo no orçamento», que «quando o CC chegou ao local para me explicar a situação, apresentou um papel com uma conta de 15.350,00 euros e eu não dei autorização e disse-lhe que a situação não estava correcta e ele tinha que rectificar com a empresa», confirmando que «a parte eléctrica não foi colocada porque não aceitei o acréscimo»;
- e a testemunha EE explicou que «fez o orçamento corrigido da parte eléctrica» e que «o BB não queria fazer a instalação eléctrica com a Autora».

Logo, ao contrário do que a Ré/Recorrente alegou, existem elementos probatórios concretos e relevantes sobre a matéria aqui em causa, os quais apresentam uma real consonância no sentido de lhe ter sido apresentado, na pessoa do seu companheiro, o orçamento rectificado relativamente à parte eléctrica (a elaboração e existência deste «novo» orçamento está probatoriamente demonstrada no facto provado nº17, o qual não foi objecto de impugnação e corresponde ao documento de fls. 36v dos autos) e no sentido de não ter sido aceite: com efeito, tendo sido efectivamente elaborado tal orçamento, mostra-se plausível que tenha sido apresentado à testemunha BB (como foi afirmado pelas testemunhas CC e EE), até porque só assim se compreende que esta testemunha tenha afirmado que não aceitou o acréscimo do custo da parte eléctrica (só através da apresentação deste novo orçamento é que a testemunha BB pôde tomar conhecimento do valor desse acréscimo e, com base nisso, decidir e declarar que não o aceitava).

Inexistindo qualquer elemento probatório que contrarie o sentido global dos depoimentos supra indicados, impõe-se necessariamente formar um juízo probatório igual ao formado pelo Tribunal a quo, gerando este Tribunal ad quem uma convicção, segura e objectiva, no sentido da demonstração probatória do segmento factual «a autora entregou o novo orçamento mencionado em 17. à ré, através do seu companheiro BB, o qual não foi aceite por estes».

No que concerne ao segmento factual «e, nessa sequência, não adjudicaram à autora a instalação da parte eléctrica do furo», apresenta-se com um sentido oposto (e até contraditório) ao facto provado nº11 (na nova redacção que supra se determinou): pelas razões que anteriormente se expuseram (e aqui se são por integralmente reproduzidas), concluiu-se que, na sequência da apresentação do orçamento inicial (datado de 16/05/2022 e referido no facto provado nº5), a Ré adjudicou à Autora não só a execução do furo mas também a execução da parte eléctrica até à boca do furo; logo, estando desde esse momento adjudicada a totalidade dos trabalhos orçamentados (incluindo, a parte eléctrica), mostra-se incompatível e inconciliável com a posterior ocorrência de uma realidade que lhe é contrária (ou seja, a existência de uma decisão de não adjudicar um trabalho que já estava há muito adjudicado). Frise-se que nesta matéria está em causa apenas e tão só a apresentação e a aceitação de um orçamento corrigido quanto ao valor do preço de um trabalho que já estava anteriormente adjudicado, e não a apresentação e a aceitação de um orçamento relativo a um novo trabalho (sendo que a interpretação e efeito jurídico da não aceitação do orçamento corrigido por parte da Ré é questão que apenas releva em sede de fundamentação jurídica). Por conseguinte, por forma a evitar a verificação do vício da contradição da matéria de facto previsto no art. 662º/c) do C.P.Civil de 2013, deve este segmento ser eliminado do facto provado nº18 e transitar para a factualidade não provada.

Nestas circunstâncias, nesta parte, deve a impugnação da Ré/Recorrente proceder parcialmente (e ainda que com base em fundamentação distinta da invocada no recurso) e, em consequência, determina-se:
- que o facto provado nº18 passe a ter a seguinte redacção: «A autora entregou o novo orçamento mencionado em 17. à ré, através do seu companheiro BB, o qual não foi aceite por estes»;
- e aditar um facto provado G) com a seguinte redacção - «Na sequência do referido em 18., não adjudicaram à autora a instalação da parte eléctrica do furo»
*
Quanto ao aditamento de dois novos factos provados.
Pretende a Ré/Recorrente que sejam aditados à matéria de facto provada da sentença recorrida os seguintes factos: «Em 27.10.2022, a ré, por intermédio do seu mandatário, contestou, devolveu e requereu a anulação da fatura descrita em 20. junto da autora»; e «A autora apresentou pedido de licença na APA - Agência Portuguesa do Ambiente, o qual foi deferido para uma profundidade de 100 metros, com o processo n.º  ...22.RH..., utilização n.º ...».
Entendemos que não se lhe pode reconhecer razão.
Relativamente ao primeiro.
A Ré/Recorrente limita-se a invocar, de forma genérica, que «tem influência direta no bom desfecho do litígio» e que «tem importância na busca da verdade material e na justa composição do litígio», não concretizando minimamente qual a sua relevância para a apreciação da pretensão formulada pela Autora e/ou das excepções peremptórias por si deduzidas, sendo que este Tribunal não alcança qual o interesse que poderá ter para a decisão.
É inútil para a resolução da questão sobre se assiste à Autora o direito a receber da Ré a totalidade do preço reclamado pela execução do furo: no âmbito desta questão importa apurar se a II executou o furo a que se obrigou contratualmente e se a maior quantidade de perfuração (e revestimento e isolamento) estava contratualmente prevista, ou, não estando prevista, se foi aceite/autorizada pela Ré ou corresponde a alterações necessárias; só ficando demonstrado o cumprimento da obrigação e a verificação de uma destas três situações (previsão contratual, aceitação/autorização ou alterações necessárias), é que será reconhecido o direito ao pagamento da totalidade do preço, sendo que este direito não será impedido, modificado ou extinto pela circunstância da Ré ter «contestado, devolvido e requerido a anulação» da respectiva factura; e no caso de não ficar demonstrado cumprimento da obrigação e/ou a verificação de pelo menos uma das três referidas situações, não pode ser reconhecido tal direito, independentemente de ter existido ou não «contestação, devolução e pedido de anulação» da factura.
Inutilidade que se mantém para a resolução das questões suscitadas pela Ré a título de excepções peremptórias:
- para a questão dos «serviços contratados e da não conclusão dos mesmos» (exceptio non adimpleti contractus) apenas releva apurar se a Autora se vinculou contratualmente a realizar ambos os trabalhos (furo e instalação eléctrica), sendo que, apenas demonstrando tal vinculação, assistirá à Ré o direito de recusar o pagamento do preço reclamado enquanto não for executada a totalidade dos trabalhos, independentemente de ter existido ou não a aludida reclamação sobre a factura («contestação, devolução e pedido de anulação» da factura);
- para a questão da «emissão abusiva da fatura n.º ...39 e da sua não correspondência com a realidade», apenas revela apurar qual a metragem total do furo (e do revestimento e do isolamento), sendo que, caso se apure uma metragem inferior à consignada na factura, o preço que a Ré está obrigada a pagar será inferior ao constante da factura, e isto independentemente de ter existido ou não reclamação sobre a factura;
- e a questão da «desnecessidade de perfuração dos 55 metros» está directamente relacionada e dependente do apuramento da existência ou não de motivos técnicos que determinem/imponham essa maior perfuração, sendo que, em caso negativo, não assistirá à Autora direito a receber da Ré o preço relativo a essa maior perfuração (revestimento e isolamento), e tudo isto independentemente de ter existido ou não reclamação sobre a factura.
Deste modo, porquanto se mostra irrelevante e desnecessária para a decisão e apreciação de qualquer das questões da causa, carece de fundamento legal a inclusão na decisão de facto da matéria indicada pela Ré/Recorrente neste primeiro facto que pretende aditar.
No que concerne ao segundo.
A Ré/Recorrente fundamenta o seu aditamento no seguinte: «o furo de captação de águas foi realizado de forma ilegal, o que é apto a violar o Princípio da Legalidade; o furo estava apenas autorizado/licenciado para uma profundidade de 100 metros; a “Autorização de Utilização dos Recursos Hídricos - Pesquisa e Captação de Água Subterrânea” constitui um documento autêntico, com força probatória plena e com manifesta importância na boa decisão do pleito; a recorrida peticiona nos autos o pagamento de um furo de captação de água com uma profundidade de 205 metros, quando esse furo apenas estava autorizado/licenciado para 100 metros de profundidade, o que não é legalmente admissível».
Para além de se revelarem ininteligíveis perante alegação da própria Ré/Recorrente (inserta na oposição) no sentido de que contratou e adjudicou à Autora a execução de um furo e respectiva instalação eléctrica até 150 metros de profundidade e de se revelarem contraditórias com a impugnação do documento de fls. 34 a 36 dos autos (documento nº2 do articulado de resposta) deduzida no seu requerimento datado de 26/10/2023 (como já se tinha referido), estas alegações configuram a dedução de uma questão nova.
No nosso sistema processual civil, os recursos constituem um mecanismo destinado a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, não sendo lícito invocar questões que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida.

Explica Luís Filipe Espírito Santo[83] que “No conhecimento do objecto do recurso é basicamente apreciada a legalidade da decisão recorrida, em concreto o juízo de facto e de direito que incidiu sobre pretensão submetida ao veredicto judicial, naquele único e singular circunstancialismo, e não a tomada em consideração (pelo tribunal superior) de questões novas não suscitadas nem discutidas em 1ª instância. Está em causa a avaliação em segundo grau de uma decisão judicial pré-existente e não a possibilidade de iniciar uma nova e diversa discussão sobre temas não versados (que se viesse a reabrir originariamente). Trata-se de sindicar a valoração do juízo de facto e de direito emitidos pelo juiz de 1ª instância e não o conhecimento de novos factos ou de novas questões de direito que as partes - podendo fazê-lo - entenderam não apresentar, nem configurar ou esgrimir, no processo que decorreu na instância inferior. Com efeito, são as partes que definem, no âmbito da sua liberdade de actuação, predominante e decisiva no campo do direito privado, os termos enformadores da causa, por via da causa de pedir e pedido que nessa sede expõem, não fazendo sentido que, uma vez apreciadas em 1ªinstância as questões jurídicas que dividem os litigantes e obtida a decisão que sobre elas incide (esgotando-se nessa altura o poder jurisdicional do julgador, nos termos do artigo 613º, nº 1, do Código de Processo Civil), venham a suscitar-se, por via do recurso, questões que extravasam aquilo que constituiu o objecto da discussão travada perante o juiz a quo. A natureza da fase recursiva revela-se, assim, enquanto continuação da instância e não como configuração de uma nova instância, o que baliza, delimitando o objecto do recurso a conhecer pelo tribunal superior” (os sublinhados são nossos).
Tem sido este o entendimento unânime da jurisprudência do STJ: para além do já citado Ac. de 07/07/2016[84], menciona-se também o Ac. de 29/09/2016[85] no qual se decidiu que “Os recursos não visam criar e emitir decisões novas sobre questões novas (salvo se estas forem de conhecimento oficioso), mas impugnar, reapreciar e, eventualmente modificar as decisões do tribunal recorrido sobre pontos questionados e «dentro dos mesmos pressupostos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento em que a proferiu»” e se concluiu que “não pode o tribunal de recurso conhecer de questões que não tenham sido objeto da decisão recorrida ou que as partes não suscitaram perante o tribunal recorrido (arts. 627º, n.º 1 e 635º, n.º 2 e 4 do CPC)”. E realça-se no Ac. do STJ de 07/10/2021[86] que se pronunciou no sentido de que “Não é lícito que um recorrente invoque, em qualquer recurso, questões que não tenham sido objeto de apreciação pela decisão recorrida, pois os recursos são meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação  e consequente alteração e/ou revogação”.

No caso em apreço, como resulta da mera análise do teor dos articulados apresentados pelas partes (e, designadamente, do teor da oposição e do requerimento datado de 26/10/2023), não foi suscitada (nomeadamente, pela Ré/Recorrente) qualquer questão/excepção que verse sobre a ilegalidade, ilicitude e/ou inconstitucionalidade do pedido formulado pela Autora (pagamento do preço pela execução de um furo de 205 metros) em razão do documento de fls. 34 a 36 dos autos (emitido pela APA) apenas autorizar/licenciar o furo para uma profundidade de 100 metros. E como resulta da mera análise da sentença recorrida, o Tribunal a quo não apreciou nem decidiu qualquer questão relativa à ilegalidade, ilicitude e/ou inconstitucionalidade em razão do furo ter uma profundidade superior à alegadamente autorizada/licenciada pela APA.
Como esta questão apenas foi suscitada nos autos no recurso interposto pela Ré/Recorrente (cfr. conclusões 110ª a 113ª), não pode ser objecto de conhecimento e apreciação por este Tribunal ad quem (nem sequer por via do conhecimento oficioso).
Logo, uma vez que a pretensão de aditamento deste segundo facto está directamente conexionada com a apreciação e decisão desta questão (ou seja, a matéria que o integra apenas relevaria interesse para a resolução de tal questão), não tem qualquer utilidade para a apreciação das questões efectivamente suscitadas pelas partes e decididas na sentença recorrida, temos que necessariamente que concluir que carece de fundamento legal (ou melhor, de interesse e relevância) a sua inclusão na decisão de facto. 
Nestas circunstâncias, nesta parte, deve a impugnação da Ré/Recorrente improceder na íntegra.
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Quanto ao facto não provado A).
Pretende a Ré/Recorrente que a alínea A) da matéria de facto não provada passe a fazer parte integrante do elenco dos factos provados, alegando que «é confirmada pela total ausência de prova nos autos capaz de demonstrar o seu inverso, foi expressamente admitida pela testemunha CC e foi corroborada pela testemunha DD».
Atentemos na prova produzida sobre esta matéria.
Ao contrário do que a Ré/Recorrente alega, a testemunha CC não confirmou nem admitiu que «garantiu ao companheiro da Ré (testemunha BB) que o valor do orçamento datado de 16/05/2022 não seria ultrapassado». Muito pelo contrário: negou-o. Com efeito, quando foi questionada directamente sobre esta matéria, a testemunha CC confirmou que «o BB lhe referiu que o preço do orçamento não podia ser ultrapassado», mas também afirmou, de forma expressa, que «lhe disse que isso não podia garantir, que a única coisa que podia garantir eram os 6.000 litros por dia e que, em relação aos valores, caso houvesse necessidade de perfurar mais ou menos metros ou se se encontrasse água antes, variavam consoante os preços unitários, o orçamento seria ajustado ao preço unitário». Estas declarações estão em consonância com as que prestou logo no início do seu depoimento («expliquei-lhe que em cima, no orçamento, estavam descritos os preços unitários, tanto da perfuração como dos materiais aplicados, e de seguida que o furo estava para uma previsão de 150 metros e o que era garantido no orçamento eram os 6.000 litros de água por dia, o furo poderia ter que ir mais metros caso fosse necessário garantir esse caudal, mas também poderia ter menos, e que tudo isto seria comunicado com antecedência»).
A testemunha BB afirmou que «referiu ao CC, todas as vezes, sempre que falámos, a não ultrapassagem do orçamento que nós assinámos», mas não produziu qualquer declaração no sentido de que a testemunha CC lhe garantiu que o orçamento não seria ultrapassado. Acresce que, no fim do seu depoimento e de forma contrária com aquela afirmação, esta testemunha declarou que «a possibilidade de perfurar a mais prevista no orçamento, era para ser dada autorização por mim ou pela minha companheira», o que claramente indicia que não houve uma garantia absoluta de que o valor do orçamento não seria ultrapassado (ainda que alegadamente mediante prévia autorização, foi configurada a possibilidade de haver maior perfuração o que, naturalmente, implicaria alteração do preço do orçamento).
A testemunha DD afirmou que «ouvi o BB dizer ao CC que queria que fosse o orçamento válido» e que «o BB ficou convencido que o que ia ser feito era o contratado e que os valores iam ser respeitados», mas não produziu qualquer declaração no sentido de que a testemunha CC garantiu ao BB que o orçamento não seria ultrapassado.
Analisando o teor do orçamento datado de 16/05/2022 (documento de fls. 21 dos autos), verifica-se que nele está expressamente consignado: «Previsão Qtd Descrição P. Unit Importância 150 Metros de Perfuração 25,00 € 3.750,00 € 150 Metros de Revestimento X Média Pressão Reforçado 17,00 € 2.550,00 € 9 Metros de Isolamento 180 mm X 7,5 Kg Reforçado 28,00 € 252,00 €»; «Total da Previsão do Orçamento 9.842,00 €»; e «Este orçamento é para uma previsão de 150 metros. Caso sejam precisos mais metros de perfuração e revestimento para garantir o mínimo de água, ou Isolamento para garantir o bom funcionamento, serão pagos aos preços acima indicados». Tendo o orçamento sido assinado pela Ré (e seu companheiro) sem qualquer ressalva, os segmentos supra identificados indiciam claramente que o valor orçamento podia ser objecto de alteração (neste campo, não interessa se essa alteração tinha que ser previamente comunicada e aceite pela Ré), o que aponta num sentido contrário à existência da alegada garantia.
Não foram produzidos outros elementos probatórios sobre esta matéria (nenhuma das restantes testemunhas se pronunciou sobre esta realidade, e nenhum dos outros documentos apresentados nos autos contém algum elemento relevante neste âmbito).
Perante o descrito “quadro probatório”, constata-se uma absoluta falta de assertividade dos depoimentos das testemunhas BB e DD no sentido de confirmarem que a testemunha CC garantia que o valor do orçamento não seria ultrapassado, sendo certo que esta testemunha negou expressamente ter dado tal garantia, negação esta que tem consonância com o teor do próprio orçamento (documento de fls. 21), no qual está expressamente consignado que se trata de uma previsão para perfuração de 150 metros e que caso seja preciso perfurar mais metros o preço será alterado de acordo com os preços unitários descritos no mesmo.
Mais: também apontando claramente no sentido da inexistência da prestação de tal garantia é a demonstração probatória de uma alteração ao orçamento (ainda antes do início da obra) relativamente aos preços dos tubos de isolamento (cfr. facto provado nº12)
Nestas circunstâncias, impõe-se necessariamente um juízo probatório igual ao formado pelo Tribunal a quo (embora alicerçado numa fundamentação mais ampla): os elementos probatórios supra elencados não permitem a este Tribunal ad quem formar uma convicção, minimamente certa e segura, no sentido da demonstração probatória da realidade inserta no facto não provado A).
Assim, improcede, nesta parte, a impugnação da Ré/Recorrente.
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Quanto ao facto não provado B).
Pretende a Ré/Recorrente que a alínea B) da matéria de facto não provada passe a fazer parte integrante do elenco dos factos provados, sustentando tal pretensão na mesma fundamentação que deduziu para a pretensão formulada quanto à impugnação dos factos provados nºs. 10 e 11.
Não se lhe pode reconhecer razão.
A factualidade inserta neste ponto de facto não provado é diversa da contida naqueles dois pontos de facto provados: naquele está em causa se os preços e trabalhos orçamentados eram para obter o resultado de “água na torneira”; e nestes (como decorre da apreciação que supra se realizou sobre tal segmento da impugnação) está em causa a amplitude do orçamento e se a adjudicação também abrangeu a execução da instalação da parte eléctrica.
Deste modo, a fundamentação que sustenta a impugnação dos factos provados nºs. 10 e 11 não tem nem pode assumir relevância para impugnar o ponto de facto não provado aqui em causa, o que, por si só, implica a improcedência da pretensão.
Ainda que assim não fosse, o que só se admite por mera hipótese de raciocínio, não foi produzida prova consistente nesta matéria. Antes pelo contrário.
Atente-se que ficou probatoriamente demonstrado que o orçamento solicitado pela Ré à Autora foi para a execução do furo de captação de água e para a instalação da parte eléctrica até à boca do furo (cfr. facto provado nº2). Ou seja, a solicitação não foi para a execução de um furo com resultado de “água na torneira”.
Atente-se igualmente que no orçamento datado de 16/05/2022 (documento de fls. 21 dos autos), lido e assinado pela Ré e o seu companheiro, não consta qualquer menção a “água na torneira” e muito menos a ser esse o resultado a obter ou garantido pela execução dos trabalhos. Para além dos preços unitários de perfuração e materiais (revestimento e isolamento), no mesmo estão consignados os trabalhos a executar («um furo de água vertical, com a previsão da perfuração de 150 metros» e a «parte elétrica até à boca do furo»), sendo que, em termos de resultado, apenas está mencionado «o mínimo de Água Garantida é de 6.000L/dia».
A testemunha BB limitou-se a afirmar que «o objectivo do furo era ter água em casa, “água na torneira”», jamais explicando que foi este resultado que acordou com a Autora (nomeadamente, com a testemunha CC), tal como nada explicou sobre a razão de não constar qualquer menção nesse sentido no orçamento que ele próprio e a Ré assinaram.
Inexistem outros elementos probatórios sobre esta matéria (nenhuma outra testemunha se pronunciou sobre esta realidade, e nenhum dos outros documentos apresentados nos autos fornece algum elemento relevante neste âmbito).
Nestas circunstâncias, impõe-se necessariamente um juízo probatório igual ao formado pelo Tribunal a quo (embora alicerçado numa fundamentação mais ampla): os elementos probatórios supra discriminados não permitem que este Tribunal ad quem gere uma convicção, minimamente certa e segura, no sentido da demonstração probatória da realidade inserta no facto não provado B).
Portanto, improcede, nesta parte, a impugnação da Ré/Recorrente.
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Quanto ao facto não provado C).
Pretende a Ré/Recorrente que a alínea C) da matéria de facto não provada passe a fazer parte integrante do elenco dos factos provados, alegando que: «o tribunal “a quo” procedeu a manifesto erro de cálculo e de dedução lógica, dada a matéria de facto provada nos pontos 14. e 15. da sentença recorrida; a testemunha CC admitiu nos autos que a perfuração tem 200 metros, ou seja, que tem uma profundidade inferior à que resulta da faturada reclamada nos autos».
Considerando o que anteriormente se apreciou e decidiu quanto ao segmento da impugnação de facto deduzida pela Ré/Recorrente sobre os pontos de facto provados nºs. 14 e 15 [nomeadamente, a nova redacção que foi dada ao facto provado nº15 e o aditamento de um novo facto não provado E)], cujos fundamentos e razões se dão aqui por inteiramente reproduzidos, conclui-se necessariamente que não assiste razão nesta parte da impugnação já que este Tribunal ad quem formou um juízo probatório no sentido de que foram perfurados 205 metros, o que impede, por si só, a demonstração probatória da realidade (com um caracter conclusivo) contida no ponto de facto aqui em análise.
Logo e sem necessidade de outras considerações, tem que improceder, nesta parte, a impugnação da Ré/Recorrente.
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Consequentemente, atentas todas as respostas supra alcançadas, conclui-se que procede apenas de forma parcial a pretensão recursória da Ré/Recorrente no que concerne à impugnação da matéria de facto.

Em resumo, por força da procedência parcial da impugnação de facto e das alterações determinadas oficiosamente pelo Tribunal na apreciação de tal impugnação, a decisão de facto constante da presente sentença recorrida, passa a conter as modificações que supra se indicaram, mas que aqui se elencam na sua totalidade:

- o facto provado nº11 passa a ter a seguinte redacção - «A ré, tendo por base o orçamento referido em 5., através do seu companheiro BB adjudicou verbalmente à autora a execução do dito furo e a instalação da parte elétrica até à boca do furo»;
- o facto provado nº15 passa a ter a seguinte redacção - «Apesar do referido em 14., foi necessário perfurar mais metros que os 150 referidos em 5., numa quantidade não concretamente apurada, para que a eletrobomba trabalhe abaixo do nível em que apareceu a veia de água e permita o bom funcionamento do furo»;
- o facto provado nº16 passa a ter a seguinte redacção - «A autora concluiu a execução do furo de captação de água, com o caudal aproximado de 250 L/hora»;
- o facto provado nº18 passa a ter a seguinte redacção - «A autora entregou o novo orçamento mencionado em 17. à ré, através do seu companheiro BB, o qual não foi aceite por estes»;
- é aditado um facto não provado E) com a seguinte redacção - «Para além do referido em 15., foi necessário perfurar mais metros que os 150 referidos em 5., para obter o caudal mínimo garantido e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno»;
- é aditado um facto não provado F) com a seguinte redacção - «Aquando dos trabalhos de perfuração, a Autora informou a Ré, na pessoa do seu companheiro BB, da necessidade de perfurar mais metros do que os 150 referidos em 5., para obter o caudal mínimo garantido, e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face a natureza do terreno, e informou que o valor dos trabalhos seriam superiores ao orçamento referido em 5., sendo pagos aos preços unitários especificados no orçamento, o que foi aceite pela Ré, pelo que a Autora perfurou até aos 205 metros referidos em 13.»;
- e é aditado um facto não provado G) com a seguinte redacção - «Na sequência do referido em 18., não adjudicaram à autora a instalação da parte eléctrica do furo».
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4.3. Da Obrigação da Ré de Pagamento do Preço Facturado/Reclamado pela Autora

Resulta inequivocamente do recurso (alegações e conclusões) que a Ré/Recorrente pretende a alteração (revogação) da sentença recorrida quanto à sua condenação do pagamento do preço reclamado/facturado pela Autora pela execução do furo, mas alicerçando tal pretensão no pressuposto/fundamento da procedência da impugnação da matéria de facto por si deduzida.
Perante a alteração da matéria de facto que supra se determinou no âmbito da apreciação da questão anterior (quer em resultado de tal impugnação, quer em resultado de deficiências oficiosamente supridas por este Tribunal ad quem), cumpre então apurar se assiste à Autora o direito a receber da Ré o valor do preço facturado/reclamado e que lhe foi reconhecido na sentença recorrida.
A catalogação (qualificação) de um contrato como pertencendo a um determinado tipo contratual, necessária para determinar qual o regime jurídico aplicável e regulador, constitui uma operação lógica subsequente à interpretação das declarações de vontade das partes e dela dependente, configurando matéria de direito sobre a qual o Tribunal se pode pronunciar livremente (cfr. art. 5/3º do C.P.Civil de 2013), sem estar vinculado à denominação que os contraentes tenham empregado[87].
Entre os que têm consagração legal (contratos típicos), releva o contrato de prestação de serviços, na modalidade de empreitada (arts. 1154º, 1155º e 1207º, todos do C.Civil).
Nos termos do art. 1207º, “a empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço”.
Trata-se de um contrato bilateral e que reveste uma natureza sinalagmática, importando obrigações correlativas para ambas as partes: para o empreiteiro, a obrigação de realizar a obra que se comprometeu a efectuar, mediante o correspectivo recebimento do preço; para o dono da obra, a obrigação de pagar o preço, mediante a correspectiva obtenção da obra encomendada e pretendida (resultado).
Refere Pedro Romano Martinez[88] que “é um contrato sinalagmático na medida em dele emergem obrigações recíprocas e interdependentes; a obrigação de realizar uma obra tem, como contrapartida, o dever de pagar o preço”. No mesmo sentido, o Ac. do STJ de 17/11/2015[89]: “O contrato de empreitada é um contrato bilateral ou sinalagmático de que resultam prestações correspetivas ou correlativas (a obrigação de executar a obra e a do pagamento do preço), isto é, interdependentes, sendo uma o motivo determinante da outra e intercedendo entre ambas um nexo de causalidade e de reciprocidade”.
Apresenta-se também como um contrato oneroso “porque o esforço económico é suportado pelas duas partes e há vantagens correlativas para ambas” e como um contrato consensual “pois, não tendo sido estabelecida nenhuma norma cominadora de forma especial para a sua celebração, a validade das declarações negociais depende do mero consenso (art. 219º do C.Civil)”[90].
São três os elementos do contrato de empreitada: os sujeitos (empreiteiro e dono da obra); a realização de uma obra; e o pagamento do preço[91].
Para que haja um contrato de empreitada é primordial que tenha como objecto a realização de uma «obra» por uma das partes (o empreiteiro), sob a sua própria direcção e com autonomia, mediante o pagamento de um preço pela outra das partes (o dono da obra).
Explica-se no Ac. da RC de 11/03/2008[92] que “para se verificar este tipo contratual (contrato de empreitada), é essencial, não apenas que o contrato tenha por objecto a realização de uma obra determinada (requisito resultado: realizar certa obra), mas também que haja autonomia daquele a quem cabe executar a obra contratada em relação ao dono da obra (requisito autonomia que se opõe à heteronomia ou subordinação jurídica) e, além disso, um preço como contrapartida da realização da obra, ainda que o preço seja não determinado mas determinável. É o que inequivocamente resulta do disposto nos artigos 1207º, 1210º e 1218º ss e 1211º do CC. São a realização da obra como resultado, a autonomia na execução da obra e a onerosidade consistente no preço que, em abstracto, justificam a estatuição dos direitos específicos que a lei atribui ao dono da obra. A haver mera obrigação de meios, a haver gratuitidade ou heteronomia, não se justificava a especificidade desse conjunto de direitos (aliás hierarquizados) que consta basicamente dos artigos 1221º a 1223º do CC”.
Por realização de obra deve entender-se não só a construção ou criação, mas também a reparação, a modificação ou a demolição de uma coisa, sendo certo que não se poderá prescindir de um resultado material, por ser esse o sentido usual, normal, do vocábulo obra e tudo indicar que é esse o sentido visado no referido art. 1207º[93].
Por força do disposto nos arts. 1207º e 1208º do C.Civil, no âmbito do contrato de empreitada, a prestação a que o empreiteiro se vincula consiste na execução da obra contratada, execução que deve ser realizada “em conformidade com o convencionado e sem vícios que lhe reduzam ou excluam o valor ou a aptidão para o uso ordinário ou o previsto no contrato”[94] (no aludido art. 1208º estipulam-se as condições em que a obra deve ser executada pelo empreiteiro).
O preço representa a retribuição do empreiteiro pela realização da obra, sendo mesmo um “elemento essencial do conceito de empreitada pois, se não for estabelecido um preço estar-se-á perante uma contrato gratuito de prestação de serviço”[95].
O preço da empreitada é normalmente fixado até ao momento da celebração do contrato, e habitualmente até consta do próprio orçamento que é aprovado (adjudicado) aquando do ajuste do contrato. Porém, ressalva-se que tanto pode ser fixado em quantia previamente acordada como pode ser convencionado outro modo para a sua fixação, designadamente de um modo global, por cada artigo (por unidade a executar), por medida (o preço total da obra depende da dimensão depois de concluída) e em função do tempo de trabalho[96]. Elucida Pedro Romano Martinez[97] que “Se o montante do preço for determinado por convenção das partes, ele pode ter sido fixado por várias formas. Formas que o direito privado deixou na inteira disponibilidade das partes (…) O preço pode ter sido determinado de um modo global, normalmente designado por preço à forfait, a corpo ou per aversionem. Neste caso, é ajustado um preço para a totalidade da obra (…) Diferentemente, as partes podem estabelecer que o preço da obra seja determinado por cada artigo, por unidade a executar (…) Da mesma forma, se as partes estabeleceram um preço por medida, o preço total da obra vai depender da dimensão que esta tiver depois de concluída (…) Também se admite que a remuneração seja determinada em função do tempo de trabalho”.
Mas, como salienta Pedro Romano Martinez[98], “se as partes não estabeleceram uma forma de fixação do preço, ou se o orçamento tinha uma finalidade de mera orientação, terá de se estabelecer um critério para assentar no valor desta prestação do dono da obra”.
Foi esse critério que o legislador consagrou no art. 1211º/1 do C.Civil: “É aplicável à determinação do preço, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 883.º”.
Por força de tal remissão e de acordo com o estatuído no aludido art. 883º/1, verifica-se que “se o preço não for fixado por entidade pública (o que não será frequente nas empreitadas de Direito Privado), valerá como preço aquele que o empreiteiro normalmente pratica à data da conclusão do contrato; na falta deste, ter-se-á em conta o preço comumente praticado, para a realização de obras daquele tipo, no momento e no lugar do cumprimento da prestação do comitente. Não sendo estes critérios suficientes, recorre-se ao art. 400º e o preço é determinado pelo tribunal, segundo juízos de equidade. O processo para a determinação judicial do preço da empreitada vem regulado no art. 1429º do CPC”[99].
Atente-se que a obrigação de pagamento de um preço (retribuição do empreiteiro) que emerge do contrato de empreitada para o dono da obra não se confunde com a fixação do preço que deve ser pago: essencial à existência de um contrato de empreitada é que, para além do mais, do acordo celebrado entre as partes nasça a obrigação do dono da obra pagar um valor («um preço») ao empreiteiro como contraprestação pela realização da obra; já a determinação de qual é esse valor preço, caso não tenha sido definido por acordo das partes no momento da celebração do contrato, pode emergir de um acordo posterior ou pode vir a ser fixado de acordo com as regras estabelecidas no citado art. 883º (por via da remissão do referido art. 1211º/1).
Revertendo ao caso em apreço, não existem dúvidas que Autora e Ré celebraram entre si um contrato de empreitada: o manancial factual apurado (cfr. factos provados nºs. 2, 5 a 11) demonstra que aquela se obrigou perante esta a realizar uma obra (execução de um furo de captação de água e instalação da parte eléctrica até à boca do furo), com autonomia técnica, mediante o pagamento de um preço (€ 9.842,00, acrescido de IVA à taxa legal em vigor), o que preenche todos os elementos do tipo contratual previsto no art. 1207º do C.Civil. E assinale-se que, nos seus articulados, ambas as partes assumem a celebração de um contrato de empreitada e que, na sentença recorrida, o Tribunal a quo qualificou-o como tal, sendo que no recurso nenhuma questão foi suscitada contra a “catalogação” do contrato.
Para reconhecer, no âmbito deste contrato de empreitada, o direito da Autora a receber da Ré o valor do preço reclamado/facturado pela execução do furo de captação de água, como expressamente consignou na sentença recorrida, o Tribunal a quo seguiu, «pela similitude factual», «o entendimento vertido no Ac. TRL, de 14.2.2019, proc. 98880/17.5YIPRT.L1-6, disponível em www.dgsi.pt».
Sucede que a matéria de facto relevante para a presente decisão não é sobreponível à matéria de facto considerada naquele processo. Com efeito, pese embora exista efectivamente alguma similitude factual entre as duas acções (naquele processo ficou provada a celebração de um contrato para a realização de um furo de pesquisa com transformação em captação de águas subterrâneas e que no decorrer dos trabalhos de perfuração houve necessidade de aumentar a profundidade relativamente aos metros inicialmente estimados, o que também ocorre na presente acção), é inequívoco que (até por força das alterações introduzidas na factualidade que supra se determinaram) a matéria de facto (provada e não provada) relevante para a decisão da presente acção tem uma amplitude maior e abarca realidades diversas [ao contrário do que ocorre naquele processo, nesta acção está provado que o contrato de empreitada também abarcava a instalação da parte eléctrica até à boca do furo e está provado que, perante a apresentação de um orçamento corrigido quanto ao valor da execução da parte eléctrica, a dona da obra não o aceitou - cfr. factos provados nºs. 11 e 18; naquele processo nada ficou provado quanto ao motivo da necessidade de maior perfuração, mas nesta acção está provada parte da motivação alegada para a necessidade de maior perfuração e não resultou provada outra parte da motivação alegada - cfr. factos provados nºs. 13 e 15 e facto não provado E); e também ao contrário do que ocorre naquele processo, nesta acção foi expressamente alegado que a empreiteira comunicou à dona da obra os motivos da necessidade de maior perfuração e que esta os aceitou, matéria que não resultou provada - cfr. facto não provado F)]. Deste modo, as matérias de facto relevantes não são iguais em ambas as acções, o que, por si só, impede a «transposição» do entendimento expresso naquele aresto para a apreciação e decisão desta acção.
No recurso e no que concerne ao direito, a Ré/Recorrente invoca, em primeiro lugar, o incumprimento contratual da empreiteira (Autora), alegando no essencial que: «o resultado contratado com base no orçamento foi não só a execução do dito furo de captação de águas, mas também a instalação da respetiva parte elétrica; a sentença recorrida determinou erradamente o objeto do negócio jurídico em causa, uma vez que o mesmo incluía não só a execução do dito furo de captação de água, mas também a instalação da respetiva parte elétrica; a recorrida não cumpriu efetivamente o contratado pela recorrente; sem a instalação da parte elétrica, nunca o resultado pretendido seria alcançado, e a obra realizada é, pelo menos, defeituosa; um furo de captação de águas, sem a respetiva parte elétrica mais não representa do que um buraco realizado no prédio da recorrente, sem qualquer aptidão para o seu uso ordinário ou para o fim a que se destina - o fornecimento de água na moradia do prédio da recorrente» (cfr. conclusões 88ª a 95ª e 97ª a 100ª).
Assiste razão à Ré/Recorrente quanto ao objecto do contrato de empreitada, e nomeadamente quanto ao concreto «conteúdo» e «amplitude» da prestação a que se vinculou a empreiteira (Autora).
Ficou demonstrado que: a Ré e companheiro solicitaram à Autora um orçamento para a execução de um furo de captação de água e instalação da parte eléctrica até à boca do furo (no prédio sito na Travessa ..., ..., em ..., ...); a Autora enviou à Ré e companheiro um orçamento para a execução de um furo de captação de água (naquele prédio), com uma previsão para perfuração e revestimento para 150 metros de profundidade e previsão de isolamento para 9 metros, e com a previsão para a instalação da parte eléctrica até à boca do furo, para 150 metros; a Ré e o seu companheiro BB leram e assinaram o orçamento; e a Ré, tendo por base o mesmo, através do seu companheiro BB adjudicou verbalmente à Autora a execução do dito furo e a instalação da parte elétrica até à boca do furo (cfr. factos provados nºs. 2, 5, 6 e 11).
Decorre desta factualidade que, no âmbito do contrato de empreitada que celebraram, a obrigação (vínculo jurídico) a que a Autora (na qualidade de empreiteira) ficou adstrita para com a Ré (dona da obra) consistia na realização de uma obra constituída não só pela execução de um furo de captação de água mas também pela instalação da parte eléctrica até à boca do furo, tudo numa previsão de 150 metros de profundidade.
Frise-se que não ficou probatoriamente demonstrado que a obrigação da Autora (empreiteira) também incluía trabalhos para a obtenção de “água na torneira” [cfr. facto não provado B)].
Portanto, no que concerne à obra/construção contratualizada, o objecto do contrato de empreitada foi efectivamente a execução do furo e a respectiva instalação eléctrica (como já anteriormente se referiu, o Tribunal a quo consignou, na sentença recorrida, que «relativamente à instalação da bomba e demais acessórios elétricos, serviço que também foi adjudicado», ou seja, reconhece que a obra contratualizada também incluía a parte eléctrica).
Determinada a concreta obrigação contratual, cabe agora analisar se a empreiteira (Autora) a cumpriu (como se concluiu na sentença recorrida) ou a incumpriu (como se defende no recurso).
Quanto ao cumprimento das obrigações, estatui o art. 762º/1 do C.Civil que “O devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado”, referindo Antunes Varela[100] que o cumprimento consiste na “realização voluntária da prestação debitória”.
A lei acolhe o princípio da integridade do cumprimento da obrigação: por força do art. 763º/1 do C.Civil, “A prestação deve ser efectuada por inteiro e não por partes, excepto se outro for o regime convencionado ou interposto pelos usos”.
No que concerne ao contrato de empreitada, como já se referiu, em razão do estatuído nos arts. 1207º, 1208º e 1213º do C.Civil, o dever primeiro do empreiteiro é o de executar a obra em conformidade com o que foi convencionado e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato.
Logo, o empreiteiro não cumpre a sua obrigação quando não realiza de todo, ou de forma integral, a obra contratada, ou quando, embora execute e entregue a obra contratada, esta apresenta defeitos que representam deformidades (são discordâncias relativamente ao plano convencionado) ou vícios (são imperfeições que excluem ou reduzem o valor da obra ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato).
Não efectuando a sua prestação nos termos em que está contratual e legalmente vinculado, ocorre o inadimplemento da obrigação por parte do empreiteiro com a consequente responsabilidade, sendo que o inadimplemento pode revestir três formas: uma situação de simples mora (consiste no atraso, demora, dilatação ou retardamento, do empreiteiro na realização da obra encomendada, por causa que lhe seja imputável, mas apesar disso continua a ser ainda possível de realizá-la - cfr. art. 804º/2 do C.Civil), ou uma situação de incumprimento definitivo (se a obra contratada, não tendo sido realizada, já não o puder ser por o dono da obra ter perdido o interesse – cfr. art. 808º/1, 1ªparte, do C.Civil; ou se a obra contratada não foi realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo dono da obra – cfr. art. 808º/1, 2ªparte, do C.Civil; se a obra contratada não foi atempadamente realizada e já não puder vir a sê-lo, na medida em que, entretanto, se tornou impossível a sua execução por causa imputável ao empreiteiro – cfr. art. 801º/1 do C.Civil; ou se o empreiteiro tiver expressamente declarado que já não realizará a obra) ou uma situação de cumprimento defeituoso (se o empreiteiro entregar pronta uma obra que não corresponda à conduta devida por ter sido realizada com defeitos - deformidades e/ou vícios).
Relativamente ao cumprimento da obrigação da Autora, na sentença recorrida, considerou-se que «como resulta da factualidade dada como provada, a autora logrou demonstrar, como lhe incumbia (artigo 342.º, nº 1, do Código Civil), que prestou os serviços que lhe foram solicitados pela ré, tendo por objeto a realização de um furo de pesquisa com transformação em captação de águas subterrâneas».
Para além de configurar a reprodução ipsis verbis de um segmento da fundamentação do aresto que o Tribunal a quo entendeu seguir, não podemos acompanhar este juízo.
Como supra se explicou, o objecto do contrato de empreitada não se reconduzia apenas à execução do furo, incluindo também a instalação da parte eléctrica.
Acresce que o manancial factual provado atesta, inequivocamente, que a Autora não executou de forma integral a obra a que se obrigou uma vez que não procedeu à realização dos trabalhos da instalação da respectiva parte eléctrica. Com efeito, ficou probatoriamente demonstrado que: a Autora entre os dias 13 e 18 de Outubro de 2022 procedeu à execução de um furo de captação de água no prédio da Ré, tendo executado uma perfuração com 205 metros, com revestimento 140mm média pressão reforçado em 205 metros e, isolamento de 180mm x 7.5Kg na quantidade de 15 metros; aquando da execução do dito furo, a água apareceu aos 149 metros com caudal mínimo de 6.000L/dia, mas apesar disto, foi necessário perfurar mais metros que os 150, numa quantidade que não concretamente apurada, para que a eletrobomba trabalhe abaixo do nível em que apareceu a veia de água e permita o bom funcionamento do furo; a Autora concluiu a execução do furo de captação de água, com o caudal aproximado de 250 L/hora; tendo em conta que o orçamento para a execução da parte eléctrica apenas previa um furo até aos 150 metros, a Autora em 19-10-2022 elaborou um novo orçamento para os 205 metros, no valor de €4.120,00 acrescido de IVA à taxa legal em vigor; e a autora entregou este novo orçamento à Ré, através do seu companheiro BB, o qual não foi aceite por estes (cfr. factos provados nºs. 13 a 18).
Daqui decorre que, para além de não ter alegado a sua realização, efectivamente a Autora não provou que procedeu à instalação da parte eléctrica até à boca do furo e, por via disso, não se pode concluir que demonstrou (tal como lhe incumbia - cfr. art. 342º/1 do C.Civil) que «prestou os serviços que lhe foram solicitados», isto é, que realizou na integralidade a obra abrangida pelo objecto do contrato de empreitada e a cuja execução se vinculou (tal como lhe é imposto pelos citados arts. 762º/1 e 763º/1 do C.Civil).
Portanto, também assiste razão à Ré/Recorrente quanto à «não conclusão integral da obra por parte da autora».
Porém, no presente recurso, a Ré/Recorrente olvida por completo que, na sentença recorrida, o Tribunal a quo mais considerou que «relativamente à instalação da bomba e demais acessórios eletricos, serviço que também foi adjudicado pelo requerido, não só o mesmo não foi faturado pela Autora à Réu, como resultou claro que foi esta que dela desistiu pois ainda antes da instalação desses materiais por não concordar com a actualização de valores em função dos metros perfurados a mais, naturalmente com relevância para a parta elétrica que careceria de mais fio e tubo, não tendo sido sequer o mesmo faturado» (o sublinhado é nosso).
Ou seja, o Tribunal a quo entendeu que a conduta da Ré de não aceitação do orçamento corrigido (quanto à metragem e valor) que a Autora lhe apresentou para a execução da parte eléctrica consubstancia uma desistência da dona da obra quanto a este trabalho que estava incluído na obra.
No presente recurso, a Ré/Recorrente nada alegou no sentido de contrariar este entendimento do Tribunal a quo.
Nos termos do art. 1229º do C.Civil, “O dono da obra pode desistir da empreitada a todo o tempo, ainda que tenha sido iniciada a sua execução, contanto que indemnize o empreiteiro dos seus gastos e trabalho e do proveito que poderia tirar da obra”.
A desistência prevista neste preceito não corresponde a uma revogação ou resolução unilateral, nem a uma denúncia do contrato, atentos os efeitos especiais aqui estatuídos: o contrato de empreitada é eficaz até ao momento em que ocorre a desistência, sendo que o dono da obra fica proprietário de tudo aquilo que já estiver executado (e até dos próprios materiais não incorporados, se o seu custo for computado na indemnização) e fica obrigado a indemnizar o empreiteiro, não só pelos danos emergentes, como pelos lucros cessantes tal como se houvesse resolução pelo não cumprimento da obrigação imposta ao desistente[101].
Constitui uma situação sui generis, cujo objectivo é apenas o de conceder ao dono da obra a faculdade de, a todo o tempo (quer a obra ainda não tenha sido iniciada, quer a obra já esteja a ser executada), decidir que não quer prosseguir com a empreitada para o futuro, decisão essa que pode alicerçar-se nas mais variadas causas (mudança de vida, ou alteração das condições económicas, ou prosseguir mas com outro empreiteiro, ou realizar a obra por outra forma, etc), mas sendo certo que não tem necessidade de indicar a causa (razão ou justificação) para tal e que não tem de efectuar qualquer aviso prévio[102].
Uma vez que este normativo não consagra a exigência de uma forma especial ou de formalidade específica (e salvo se as partes convencionarem o contrário no contrato de empreitada), a desistência do dono da obra é uma declaração negocial que pode ser feita por qualquer dos meios previstos no art. 217º do C.Civil[103] (“1. A declaração negocial pode ser expressa ou tácita: é expressa, quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação da vontade, e tácita, quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam. 2. O carácter formal da declaração não impede que ela seja emitida tacitamente, desde que a forma tenha sido observada quanto aos factos de que a declaração se deduz”) e, por via disso, pode depreender-se da adopção de uma conduta reveladora de desinteresse na prestação e é aferível mediante apelo às regras legais da interpretação da declaração negocial estabelecidas no art 236º do C.Civil[104].
Atente-se que no nº1 deste art. 236º se consagrou a regra da “teoria da impressão do destinatário”, segundo a qual deve prevalecer o sentido objectivo que se obtenha do ponto de vista do declaratário concreto, supondo-o uma pessoa normal, média e razoável (ou seja, a declaração negocial deve ser interpretada no sentido que um declaratário normal, com base em todas as circunstâncias por ele conhecidas ou susceptíveis de o serem, podia e devia entender como sendo a vontade do declarante). Esta regra de interpretação objectivista foi «temperada» com a consagração no nº2 do mesmo preceito da regra da interpretação segundo a vontade real do declarante quando o declaratário tenha conhecido essa vontade, caso em que a declaração negocial valerá de acordo com essa vontade (ou seja, na ausência de oposição à vontade real do declarante, o declaratário está obrigado a procurar entender a declaração colocado na sua situação concreta, atendendo, por isso, às circunstâncias por ele conhecidas e às que seriam conhecidas por um tal declaratário, de modo a determinar, através desses elementos, o sentido querido pelo declarante).

No caso concreto, ficou probatoriamente demonstrado que, após a realização do furo de captação de água no prédio da Ré com uma perfuração com 205 metros, tendo em conta que o orçamento de 16/05/2022 para a execução da parte eléctrica apenas previa um furo até aos 150 metros, a Autora em 19-10-2022 elaborou um novo orçamento para os 205 metros, no valor de €4.120,00 acrescido de IVA à taxa legal em vigor, e entregou-o à Ré, através do seu companheiro BB, o qual não foi aceite por estes (cfr. factos provados nºs. 5, 6, 13, 17 e 18).
Ponderando que foram dois os trabalhos adjudicados no contrato de empreitada celebrado entre as partes (execução do furo e instalação da parte eléctrica), ponderando que estava executado o primeiro desses trabalhos (furo), e ponderando que foi precisamente antes da Autora dar início à realização do segundo trabalho (parte eléctrica) que a Ré emite esta declaração (de não aceitação do orçamento corrigido/rectificado quanto ao valor e à metragem para a realização da instalação eléctrica até à boca do furo), afigura-se-nos que, seguindo a regra da “teoria da impressão do destinatário” (nº1 do art. 236º), a declaração transmite objectivamente um desinteresse por parte da dona da obra relativamente à realização desta (segunda) parte da obra.
Assinale-se que, para além de declarar directa e inequivocamente que não aceitava o valor (orçamento) corrigido/rectificado para a realização do segundo trabalho (parte eléctrica), a Ré nada alegou na acção (nomeadamente na oposição) no sentido de que, em simultâneo com tal não aceitação ou na respectiva sequência, exigiu à Autora a realização da instalação da parte eléctrica em consonância com o valor inicialmente orçamentado ou por valor inferior ao do orçamento corrigido/rectificado. Portanto, a Ré nada alegou na acção (e, por isso, nada logrou provar) que demonstrasse que continuou a ter interesse e a pretender que a empreiteira cumprisse a sua prestação quanto à parte eléctrica do furo, ainda que não aceitasse o aumento do preço. Registe-se que também nada foi alegado no recurso neste sentido (o que, aliás, é consentâneo com a absoluta falta de anterior alegação na acção). Deste modo, não existe qualquer elemento probatório que pudesse sequer indiciar que a vontade real da Ré era no sentido de manter algum interesse na instalação da parte eléctrica.
Neste “quadro”, a declaração de não aceitação da Ré tem que ser interpretada no sentido de configurar uma desistência da dona da obra nos termos do art. 1229º do C.Civil relativamente à «segunda parte» da obra (instalação da parte eléctrica).
Esta desistência parcial da empreitada conduziu necessariamente a que a Autora (empreiteira) ficou desobrigada da prestação respeitante à realização do segundo trabalho abrangido na obra contratada, isto é, deixou de estar adstrita à obrigação de realização da instalação da parte eléctrica. Em rigor, o contrato de empreitada celebrado entre as partes, pro força da desistência, deixou de ter eficácia (de produzir efeitos) quanto a esta parte da obra. 
Por via disso, a «não conclusão integral da obra por parte da autora» (nomeadamente, a instalação da parte eléctrica) não consubstancia, no caso concreto, um efectivo incumprimento contratual da Autora em razão da identificada desistência parcial da Ré/Recorrente, pelo que não lhe assiste razão na invocação deste fundamento (frisando-se que até se mostra ininteligível a alegação, em sede de recurso, de que «um furo de captação de águas, sem a respetiva parte elétrica mais não representa do que um buraco realizado no prédio da recorrente, sem qualquer aptidão para o seu uso ordinário ou para o fim a que se destina», uma vez que foi a própria dona da obra que desistiu da realização da parte da obra que iria permitir dotar o furo já executado da aptidão que permite a efectiva captação da água, ou seja, a alegada falta de aptidão é imputável à própria dona da obra).
Mostram-se, assim, absolutamente infundadas as conclusões 107ª e 108ª: a obra foi realizada e entregue na parte em que empreitada manteve eficácia (atenta a desistência parcial da dona da obra), pelo que a Autora (empreiteira) logrou demonstrar o cumprimento da obrigação a que permaneceu vinculada (cfr. art. 762º/1 do C.Civil), inexistindo qualquer situação de falta de cumprimento ou de cumprimento defeituoso da obra (e, deste modo, não impendia sobre aquela o ónus de demonstrar a sua falta de culpa – cfr. art. 799º/1 do C.Civil).
Importa salientar que, em sede de oposição, precisamente com base na «falta de conclusão dos trabalhos relativos à parte eléctrica» (e não com base «na falta de adjudicação do serviço que lhe foi faturado», como incorrectamente se afirma na sentença recorrida), a Ré deduziu a excepção peremptória da exceptio non adimpleti contractus (excepção do não cumprimento), prevista no nº1 do art. 428º do C.Civil (“Se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo”).
Não configura uma sanção, mas sim e apenas um meio lógico de assegurar, mediante o cumprimento simultâneo, o equilíbrio contratual em que assenta o esquema do contrato bilateral: a exceptio deve ser admitida sempre que, existindo um nexo de correspondência ou de reciprocidade entre as obrigações principais que emergem para ambas as partes, se verifique um desequilíbrio injustificado e contrário às regras da boa fé, consagradas nos arts. 227º e 762º/2 do C.Civil (“Traduz-se numa causa justificativa do incumprimento da prestação, por uma das partes, quando haja reciprocidade entre as prestações, tenha havido boa fé de quem recusa o cumprimento, plasmada na proporcionalidade ou adequação do incumprimento da contraparte, que terá de ser grave”[105]).
Registe-se que o requisito de «não haver prazos diferentes» (a que a alude o art. 428º) tem que ser devidamente interpretado: o seu verdadeiro sentido é o de que o excepcionante que não se encontre obrigado a cumprir antes da contraparte e, desta forma, a diversidade de prazos, apenas obsta à invocação desta excepção pelo contraente que primeiro deve efectuar a sua prestação, mas já nada impede o outro de opô-la[106].
Esta excepção não é de conhecimento oficioso, tendo que ser invocada pelo demandado perante quem se exija o cumprimento[107], constituindo uma excepção de direito material porquanto é um corolário do sinalagma funcional que a funda e legitima: “o excipiens não nega o direito do autor ao cumprimento nem enjeita o dever de cumprir a prestação; pretende tão só um efeito dilatório, o de realizar a sua prestação no momento (ulterior) em que receba a contraprestação a que tem direito e (contra) direito ao cumprimento simultâneo”[108] (neste mesmo sentido se pronunciou o Ac. desta RG de 27/10/2022[109]).

Salienta Menezes Leitão[110]: “Tem-se entendido que, para a excepção de não cumprimento do contrato poder ser invocada sem que haja contrariedade à boa fé, exige-se uma tripla relação entre o não cumprimento do outro contraente e a recusa de cumprir por parte de quem invoca a excepção, em termos de sucessão, causalidade e proporcionalidade entre uma e outra. A relação de sucessão pressupõe que quem invoca a excepção não tenha sido o primeiro a cair em incumprimento, uma vez que a recusa em cumprir deve ser posterior e não anterior ao incumprimento da outra parte. A relação de causalidade pressupõe que a invocação da excepção vise exclusivamente compelir a outra parte à realização da sua prestação, sendo essa invocação ilegítima quando seja determinada por outros fins. Finalmente, a relação de proporcionalidade pressupõe que a invocação da excepção seja proporcional ao incumprimento que a legitima, não sendo admitido o recurso à excepção sempre que esse incumprimento for de escassa importância”.

Como se dá nota no Ac. do STJ de 09/12/2021[111], “vem sendo posição unânime da doutrina e da jurisprudência” que o pressuposto desequilíbrio contratual “vale tanto para o caso de falta integral do cumprimento (incumprimento temporário), como para o de cumprimento parcial ou defeituoso”, sendo que, neste último caso, a procedência da exceptio depende “da demonstração pelo excipiens de que os efeitos da prestação realizada prejudicam, de forma relevante ou significativa, a satisfação do interesse visado no contrato”.
Esta figura tem aplicação no âmbito do contrato de empreitada (estamos perante um contrato bilateral e sinalagmático), sendo admitida como um meio lícito de que um dos sujeitos contratuais pode lançar mão para não cumprir, temporariamente, a prestação a que se acha vinculado (para o caso em apreço não releva tomar posição sobre se, no caso de cumprimento defeituoso da empreitada, o dono da obra só poder opor a exceptio após usar os meios legais, e pela respectiva ordem, estatuídos nos arts. 1221º, 1222º e 1223º do C.Civil).
No caso em apreço a exceptio foi deduzida pela Ré como causa justificativa para não proceder ao pagamento do preço facturado/reclamado pela Autora enquanto esta não concluísse todos os trabalhos adjudicados, designadamente o relativo à instalação da parte eléctrica (segundo trabalho adjudicado).
Uma vez que, como supra se concluiu, a dona da obra desistiu da empreitada precisamente em relação a esse segundo trabalho, então a Ré/Recorrente não pode opor, de forma válida e eficaz, a exceptio para recusar, e remeter para momento ulterior o cumprimento da sua obrigação de pagamento do preço que corresponde unicamente à parte da obra que a empreiteira efectivamente realizou (execução do furo): embora por força dos termos contratuais acordados, o preço só devesse ser pago após a conclusão integral da obra (não foi convencionada qualquer obrigação de ir procedendo ao pagamento do preço por fases da obra - cfr. factos provados nºs. 5 a 11), por força da mencionada desistência parcial da empreitada, a Autora (empreiteira) deixou de ter que realizar qualquer outro trabalho para além daquele que já havia executado (furo); logo, porque a empreiteira já tinha cumprido integralmente o contrato na parte em que a empreitada manteve a sua eficácia (execução do furo), assiste-lhe o direito de reclamar o pagamento do preço na parte correspondente à obra executada, não lhe podendo ser oposta a exceptio por inexistir qualquer contraprestação por cumprir.
Portanto, a excepção peremptória da exceptio non adimpleti contractus deduzida pela Ré carece de fundamento legal, tendo que improceder (embora por razões distintas das sustentadas na sentença recorrida).
No recurso, igualmente no que concerne ao direito, a Ré/Recorrente invoca, em segundo lugar, que a empreiteira (Autora) realizou alterações ao plano convencionado sem autorização da dona da obra (Ré) e que tais alterações não eram necessárias, alegando no essencial que: «o empreiteiro não pode, sem autorização do dono da obra, proceder a alterações ao plano convencionado; defende a sentença recorrida que quando as alterações se revelarem necessárias “em virtude de certas razões objetivas” deverá ser-lhes aplicável o disposto no artigo 1215.º do Código Civil; a recorrida nunca conseguiu demonstrar nos autos que “razões objetivas” ou “regras técnicas” são essas; essas alegadas “regras técnicas” não constam sequer do “orçamento”; não existe in casu qualquer justificação plausível para a modificação do negócio jurídico seguida pelo tribunal recorrido; seguiu o tribunal recorrido o entendimento de que, de acordo com a repartição do ónus da prova, incumbia à recorrente demonstrar que não deu autorização para se perfurar além da previsão; os presentes autos foram intentados pela recorrida contra a recorrente, pelo que, era à recorrida que incumbia provar e demonstrar que teve necessidade fundada de perfurar a mais 55 metros, que perfurou 205 metros, que o caudal mínimo garantido surgiu aos 149 metros e que instalou no local o isolamento e revestimento em crise» (cfr. conclusões 101ª a 106ª).
Vejamos.
Embora esteja vinculado a realizar a obra em conformidade com o inicialmente convencionado e sem defeitos (cfr. arts. 1027º e 1208º do C.Civil), isto não significa, na sua execução, uma obediência «cega» por parte do empreiteiro ao que foi inicialmente convencionado já que a realização rigorosa, e conforme com o projeto, não o isenta de responsabilidade civil, caso a obra venha a apresentar defeitos, consabido que, estando o mesmo adstrito ao cumprimento de uma obrigação de resultado, a obra não pode deixar de ter aptidão para o seu uso ordinário ou para o uso previsto no contrato[112]. Na verdade, a execução fiel do projecto da obra ou cumprimento do caderno de encargos não representa necessariamente que fique isento de responsabilidade já que, como perito que é ou será muitas vezes, ao empreiteiro incumbe, nos termos genéricos do art. 762º/2 do C.Civil, a obrigação de avisar o dono da obra dos defeitos que detectar no projecto ou no caderno de encargos, quer antes de iniciada a obra, quer durante a sua  execução, podendo até ter que responder (independentemente da culpa dos autores do projecto) pelos defeitos que não detecte mas que lhe incumbisse descobrir e indicar[113].  
É igualmente consabido que a execução da obra pode desencadear (e com frequência desencadeia), quer por iniciativa do dono da obra, quer iniciativa do próprio empreiteiro, quer por razões alheias a um ou a outro, alterações ao projeto inicial, pelo que só em termos relativos se pode afirmar que, numa empreitada ajustada «por preço global», «à forfait» ou «per avisionem», tal preço está desde logo fixado no momento da celebração do contrato[114].
Foi por estar ciente destas realidades que o legislador fixou um regime legal específico para as modificações da composição e/ou do conteúdo da obra no âmbito do contrato de empreitada, nomeadamente e no que releva para o caso sub judice, consagrou o regime previsto no art. 1214º do C.Civil, respeitante às alterações realizadas por iniciativa do empreiteiro, e o regime previsto no art. 1215º do C.Civil, respeitante a alterações que se mostrem necessárias.

Estatui o referido art. 1214º:

“1. O empreiteiro não pode, sem autorização do dono da obra, fazer alterações ao plano convencionado.
2. A obra alterada sem autorização é havida como defeituosa; mas, se o dono quiser aceitá-la tal como foi executada, não fica obrigado a qualquer suplemento de preço nem a indemnização por enriquecimento sem causa.

3. Se tiver sido fixado para a obra um preço global e a autorização não tiver sido dada por escrito com fixação do aumento de preço, o empreiteiro só pode exigir do dono da obra uma indemnização correspondente ao enriquecimento deste”.

Resulta deste normativo que o empreiteiro não tem a faculdade de introduzir unilateralmente alterações ao «plano convencionado» para a obra, ou seja, as alterações da sua iniciativa não podem ser feitas sem a autorização do dono da obra.
Se o empreiteiro as fizer sem essa autorização, a obra é considerada como defeituosa e o empreiteiro fica sujeito a que o dono da obra exerça os direitos estipuladas nos arts. 1221º e ss. do C.Civil (eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização). Porém, concede-se ao dono da obra a opção de, querendo, aceitar a obra com as alterações introduzidas pelo empreiteiro, sendo que esta opção não implica nem o aumento do preço a pagar nem a obrigação de indemnização com fundamento em enriquecimento sem causa (no caso de ter aumentado o valor da obra)[115].
Explica-se no Ac. desta RG de 21/11/2024[116]: “Se o empreiteiro pretender fazer alterações ao plano convencionado, deve dirigir uma proposta nesse sentido ao dono da obra. Caso este aceite, opera-se uma modificação do contrato; caso o empreiteiro não obtenha o consentimento do dono da obra, esta será tida como defeituosa, mas este pode aceitá-la como foi executada, sem ficar obrigado a qualquer aumento de preço ou a uma indemnização por enriquecimento sem causa”.
Este normativo regula também as alterações introduzidas pelo empreiteiro com autorização do dono da obra (nº3), sendo necessário distinguir o caso da empreitada «por medida» do caso da empreitada «à forfait» (preço global): no primeiro caso, é devido o preço unitário convencionado (ou aquele que vier a ser determinado ao abrigo do disposto no já citado art. 883º do C.Civil, pelo que daqui pode resultar um aumento do preço a pagar pelo dono da obra se ocorrer uma maior amplitude das dimensões ou do volume da obra); no segundo caso, se a autorização for dada por escrito e com o aumento do preço, apenas há que cumprir o convencionado quanto às alterações e quanto ao preço, mas se não houver autorização pela forma escrita, o desrespeito desta formalidade determina que o empreiteiro só pode exigir do dono da obra uma indemnização correspondente ao enriquecimento sem causa[117]. Sobre este segundo caso, relevam as explicações constantes do citado Ac. desta RG de 21/11/2024: “Para que o empreiteiro tenha direito ao aumento do preço, têm de estar preenchidos dois requisitos: a) que a autorização do dono da obra revista forma escrita; b) que desta autorização conste a indicação do valor do aumento. A ratio do preceito é esta: tutelar o dono da obra a respeito de aumentos de preço aos quais não tenha dado o seu assentimento expresso. Repare-se que o acento tónico não incide sobre a autorização da obra, mas sobre o aumento do preço, pois trata-se de evitar que o empreiteiro se sirva de expedientes destinados a elevar o custo da obra, o que sempre conseguiria se obtivesse o acordo quanto à realização das alterações, mas não quanto ao expresso aumento do preço daí decorrente. Se a autorização for verbal ou, sendo dada por escrito, dela não conste a indicação do aumento do preço, o empreiteiro terá apenas direito a uma indemnização nos termos do enriquecimento sem causa”.

Mas, se ao invés de estarmos perante alterações voluntárias (da iniciativa) do empreiteiro, estivermos perante alterações necessárias ao «plano convencionado», então rege-se o citado art. 1215º:

“1. Se, para execução da obra, for necessário, em consequência de direitos de terceiro ou de regras técnicas, introduzir alterações ao plano convencionado, e as partes não vierem a acordo, compete ao tribunal determinar essas alterações e fixar as correspondentes modificações quanto ao preço e prazo de execução.
2. Se, em consequência das alterações, o preço for elevado em mais de vinte por cento, o empreiteiro pode denunciar o contrato e exigir uma indemnização equitativa”.

As alterações necessárias previstas neste normativo advêm de razões objectivas estritamente conexionadas com direitos de terceiro ou com as regras técnicas aplicáveis na execução da obra.
Como salientam Pires de Lima e Antunes Varela[118], “não está abrangido o caso de se ter tornado mais difícil ou mais onerosa a execução da obra. Neste, o que pode haver é lugar à resolução ou modificação do contrato por alteração das circunstâncias, nos termos dos artigos 437.º e seguintes”, sendo que exemplificam, como caso em que a necessidade de alteração provém de um direito de terceiro, “a existência de uma servidão desconhecida das partes”, e exemplificam como casos de necessidade técnica, “encontrar-se uma mina ou um poço no sítio onde deviam ser construídos os alicerces ou um pilar do edifício; alterarem-se as regras para a aplicação do betão armado, sendo a alteração aplicável retroactivamente às obras em curso; descoberta no projecto de imperfeições técnicas, não imputáveis a nenhum dos contraentes, mas que importa corrigir”.
Relativamente à necessidade de alteração, refere João Cura Mariano[119] que pode “verificar-se uma situação em que é necessário efectuar-se alterações à obra inicialmente projectada, para que esta não venha a sofrer vícios, ou por erro de previsão, ou por evento superveniente” e, na mesma linha, Pedro Romano Martinez[120] assinala que “a necessidade de alteração pode ficar a dever-se a uma imperfeição ou a uma insuficiência do plano não imputável a nenhuma das partes. Mesmo no caso em que seja imputável a uma das partes, pode esta, ou a contraparte, recorrer ao art. 1215° CC, suportando, todavia, o culpado os danos resultantes dos erros ou omissões do projecto”.
Verificada a necessidade de alterar o plano de obra convencionado, colocam-se duas hipóteses: ou as partes acordam quanto às alterações, quanto à modificação do preço, e quanto a prazo de execução, sendo que, neste caso, estar-se-á perante uma modificação do negócio jurídico derivada do mútuo consenso (cfr. art. 406º/1 do C.Civil) e que segue as regras gerais, designadamente da liberdade de forma (cfr. arts. 219º e 222º/2 do C.Civil)[121]; ou, não alcançando acordo, compete ao Tribunal determinar as alterações que, por necessárias, devem ser introduzidas no plano convencionado e fixar as inerentes modificações do preço e do prazo de execução. Mostra-se compreensível esta solução legal: confrontando-se o empreiteiro com uma necessidade de fazer alterações à obra e cabendo-lhe realizar a empreitada isenta de vícios, mostra-se lógico que, em caso de ausência de acordo entre as partes, a lei imponha que seja o Tribunal a decretar o conteúdo das mudanças e do respectivo preço.
Portanto, nenhuma das partes pode, apesar da necessidade de alteração, executá-la ou ordená-la unilateralmente. No caso de o Tribunal decretar a alteração, o dono da obra não está impedido de desistir da obra nos termos do citado art. 1229º (conquanto fica sujeito à obrigação de indemnizar o empreiteiro dos seus gastos e trabalho e do proveito que podia retirar), e o empreiteiro fica limitado à possibilidade de denunciar o contrato (e exigir uma indemnização equitativa) se, em consequência da alteração decretada, o preço for mais elevado em 20%[122].
Revertendo ao caso em apreço e recorrendo à factualidade provada (cfr. factos provados nºs. 2, e 5 a 10), conclui-se que o «plano convencionado» para a obra objecto do contrato de empreitada celebrado entre as partes corresponde basicamente ao conteúdo do orçamento datado de 16/05/2022 (apresentado pela Autora a solicitação da Ré e que foi por esta assinado), assentando nos seguintes pontos: - execução de um furo de captação de água, no prédio da Ré, com uma previsão para perfuração e revestimento para 150 metros de profundidade e previsão de isolamento para 9 metros, no valor de € 6.552,00, acrescido de IVA à taxa legal em vigor; - previsão para a instalação da parte eléctrica até à boca do furo, para 150 metros, no valor de €3.290,00, acrescido de IVA à taxa legal em vigor; - o mínimo de água garantida é de 6.000L/dia; - o orçamento é para uma previsão de 150 metros; - caso sejam precisos mais metros de perfuração e revestimento para garantir o mínimo de água, ou isolamento para garantir o bom funcionamento, serão pagos aos “preços acima indicados” (“preço por metro de perfuração - €25,00; preço por metro de revestimento X Média Pressão Normal - €15,00; preço por metro de revestimento X Média Pressão Reforçado - €17,00; preço por metro de revestimento X Alta Pressão Reforçado - €19,00; preço por metro de isolamento 180mm x 7.5Kg Reforçado - €28,00; preço por metro de isolamento 190mm x 12.5Kg Reforçado - €35,00”).
Embora o «plano convencionado» previsse a execução do furo por meio de uma perfuração e um revestimento de 150 metros e de um isolamento de 9 metros, a factualidade provada comprova que, na realidade, a Autora procedeu à execução de um furo de captação de água com 205 metros de perfuração e de revestimento (140mm média pressão reforçado) e com 15 metros isolamento (de 180mm x 7.5Kg) - cfr. facto provado nº13.
Na sentença recorrida, o Tribunal a quo considerou que a perfuração de mais 55 metros não corresponde a qualquer alteração ao plano convencionado, com base nos seguintes fundamentos “tendo ficado previamente definido que o custo da realização de um furo seria calculado em função dos metros que fossem necessários perfurar e que a indicação de 100[123] metros era uma estimativa, não se tratando aqui de uma qualquer alteração ao inicialmente convencionado e sem autorização do requerido” e “provando-se que o orçamento entregue ao Autora à Ré previa uma estimativa de profundida de perfuração, mas destinando-se esta à captação de água, e tendo esta surgido aos 149 metros de profundidade, com necessidade de perfurar mais 56m, e não se bastando com o furo a 100[124] nos termos constantes do orçamento, a obra só se torna completa com este fim alcançado”.
Estamos, de novo, perante reproduções ipsis verbis (com excepção das metragens indicadas) de segmentos da fundamentação do aresto que o Tribunal a quo entendeu seguir, os quais não têm qualquer consonância com a factualidade efectivamente provada nos autos: menciona-se que «o custo de realização do furo seria calculado em função dos metros que fossem necessários perfurar», quando na presente acção está demonstrado que foi fixado um preço global para a empreitada (valor total de € 9.842,00, mais IVA, e valores parcelares para cada um dos dois trabalhos, sendo € 6.552,00 mais IVA para o furo e € 3.290,00 mais IVA para a parte eléctrica); e na acção a que respeita aquele aresto ficou provado que «no contrato ficou estipulado uma estimativa de custos para captação de água, com perfuração inicialmente estimada de 60 metros», o que não tem qualquer correspondência com o conteúdo do contrato/orçamento da presente acção, no qual consta uma previsão concreta de 150 metros de perfuração (e de revestimento), e não uma qualquer «estimativa inicial».
Mais: por se limitar a seguir o aludido aresto, o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a maior quantidade de revestimento nem sobre a maior quantidade de isolamento, e não explicou a razão por que, tendo a água surgido aos 149 metros (isto é, antes da previsão de 150 metros) e logo com o caudal mínimo que tinha que ser garantido, houve necessidade de perfurar mais metros quando o resultado a obter com a obra estava alcançado. 
Ora, embora esteja consignado no contrato que «o orçamento é para uma previsão de 150 metros», é inquestionável que, de forma concreta e efectiva, o plano convencionado para a obra, no que respeita ao trabalho de execução do furo, consiste na realização de perfuração e revestimento até 150 metros e de isolamento de 9 metros por forma a obter/garantir um caudal mínimo de água de 6.000L/dia. Foi este o projecto definido e acordado entre as partes para a execução da obra do furo aquando da celebração do contrato.
E nenhum outro trabalho foi concreta e efectivamente convencionado/acordado quanto à execução do furo.
A menção de «previsão» não se reporta ao trabalho concreto a realizar (este será sempre a realização de perfuração e revestimento de 150 metros), mas sim ao valor do preço global a pagar relativamente a este trabalho («o orçamento é para uma previsão de 150 metros»).
Apesar do orçamento constar que «caso sejam precisos mais metros de perfuração e revestimento para garantir o mínimo de água, ou isolamento para garantir o bom funcionamento», uma vez que imediatamente se lhe segue o segmento «serão pagos aos “preços acima indicados”» (e que se referem aos preços por metros de perfuração, de revestimento e de isolamento e aos preços dos respectivos materiais), reporta-se, única e exclusivamente, à estipulação do preço que seria pago no caso de vir a ser realizada maior perfuração e revestimento e/ou maior isolamento. Estes transcritos segmentos do texto do orçamento adjudicado não correspondem à definição de qualquer outro trabalho projectado para a execução do furo: por um lado, não foi sequer determinado quantos metros mais seriam perfurados (e revestidos e/ou isolados), tal como não está consagrado um critério que permitisse calcular os limites dessa maior perfuração (revestimento e/ou isolamento); e, por outro lado, a possibilidade de maior perfuração e/ou revestimento e/ou de maior quantidade de isolamento não resulta da vontade unilateral e/ou do critério exclusivo da empreiteira (Autora), mas sim da estrita necessidade («ser preciso») de «garantir o mínimo de água» (6.000L/dia), no caso da perfuração/revestimento, ou «garantir o bom funcionamento», no caso do isolamento. Logo, uma vez que esta «necessidade» (isto é, qual a sua causa e justificação concreta) não está fixada no contrato (nomeadamente, no orçamento) e uma vez que o projecto (trabalho) a executar em razão dessa «necessidade» também não está indicado no contrato, então facilmente se conclui que a eventual realização de mais trabalhos na execução no furo está para além do conteúdo do «plano convencionado» entre as partes, carecendo de projecto a definir posteriormente.
Neste “quadro”, não se pode subscrever a interpretação do Tribunal a quo no sentido de que a indicação de 150 metros era uma «mera estimativa» e de que a perfuração de mais metros não constitui qualquer «alteração ao plano convencionado, mas sim o alcançar do fim da obra». Em bom rigor, de acordo com esta interpretação, para além dos 150 metros, o «plano convencionado» permitiria à Autora (empreiteira) perfurar (e revestir) os metros de profundidade que entendesse, sem ter que demonstrar a sua concreta necessidade e/ou sem obter autorização à Ré (dona da obra), o que não tem respaldo no efectivo conteúdo daquele plano (como supra se concretizou).
Em face do anteriormente exposto quanto ao concreto e efectivo conteúdo do «plano convencionado», afigura-se-nos que a interpretação da declaração negocial que traduz o «plano convencionado» (atendendo à regra da “teoria da impressão do destinatário” consagrada no já citado art. 236º/1) deverá ser precisamente em sentido contrário: tal plano/projecto não inclui a execução de trabalhos de perfuração e revestimento para além dos 150 metros e/ou de isolamento para além de 9 metros, pelo que, se na execução do plano convencionado sobre a execução do furo se viesse a revelar necessária a realização de uma maior perfuração e revestimento para garantir o caudal mínimo e/ou a realização do maior isolamento para garantir o bom funcionamento, estaríamos perante uma situação de alteração necessária, a qual exigia que a Autora (empreiteira) concretizasse a sua causa/justificação junto da Ré (dona da obra) e dela obtivesse o respectivo acordo (cfr. art. 1215º/1).
Bem demonstrativo de que a própria Autora interpretou o «plano convencionado neste sentido (ou melhor, a necessidade de realizar maior perfuração e revestimento e maior isolamento estava para além do projecto acordado) é que, no âmbito da sua causa de pedir, alegou expressamente que «aquando dos trabalhos de perfuração, a Autora informou a Ré, na pessoa do seu companheiro BB, da necessidade de perfurar mais metros do que os 150 referidos no orçamento, para obter o caudal mínimo garantido, e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno, e informou que o valor dos trabalhos seriam superiores ao orçamento, sendo pagos aos preços unitários especificados no orçamento, o que foi aceite pela Ré, pelo que a Autora perfurou até aos 205 metros» (cfr. arts. 8º e 9º do requerimento de injunção), matéria que corresponde à factualidade inserta no facto não provado F).
Deste modo, não se pode subscrever a sentença recorrida e entendemos que a perfuração de mais 55 metros, tal como o revestimento de mais de 55 metros e o isolamento de mais 6 metros, correspondem a objectivas alterações ao plano convencionado no âmbito do contrato de empreitada.
Ora, na sentença recorrida, ainda mais se considerou que, a ser uma alteração, a perfuração de mais 55 metros foi necessária por razões técnicas: “não estaria em causa a aplicação do artº 1214º do CC, mas sim e caso se tivesse logrado provar que o convencionado era apenas os 100[125] metros, tal levar-nos-ia à aplicação do artº 1215º do CC… sempre os factos provados demonstram que por razões técnicas, ou melhor, por motivos de boa execução da obra, foi necessário perfurar mais de 105[126] metros que o previsto e orçamentado… Em suma, a factualidade em causa patenteia que para a integral e correcta realização da obra convencionada, seria preciso perfurar mais metros que o previsto no orçamento, pelo que mesmo que fosse considerado que se tratava de uma alteração, esta teria que se reputar como necessária. Não se trataria, assim, de modificações voluntárias realizadas pela empreiteira, por sua própria iniciativa, desnecessárias à realização da obra convencionada”.
O Tribunal a quo não concretizou quais as «razões técnicas», depreendendo-se que se refere à matéria inserta na redacção original do facto provado nº15 («Apesar do referido em 14., a autora, por razões técnicas, perfurou mais 55 metros, 30 metros para a caixa de água e mais 10% do total perfurado para o funcionamento da bomba eléctrica, de forma a garantir o caudal mínimo de 6.000L/dia e o bom funcionamento do furo»).
Sucede que, como supra se concluiu no âmbito da apreciação da impugnação recursiva sobre a matéria de facto, este Tribunal ad quem determinou a introdução de alterações à decisão de facto que integra a sentença recorrida (pelas razões então expostas e que aqui se dão por reproduzidas) e, por via disso, a matéria que agora releva nesta sede é a seguinte:
- ficou provado que «aquando da execução do dito furo, a água apareceu aos 149 metros com caudal mínimo de 6.000L/dia, mas foi necessário perfurar mais metros que os 150 referidos no orçamento de 16/05/2022, numa quantidade que não concretamente apurada, para que a eletrobomba trabalhe abaixo do nível em que apareceu a veia de água e permita o bom funcionamento do furo, e a autora concluiu a execução do furo de captação de água, com o caudal aproximado de 250 L/hora» (cfr. factos provados nºs. 14 a 16);
- e não ficou provado que «(Para além do referido em 15.) foi necessário perfurar mais metros que os 150 referidos no orçamento de 16/05/2022, para obter o caudal mínimo garantido e colocar mais metros de isolamento, de 9 para 15 metros, face à natureza do terreno» [cfr. facto não provado E)].

Este manancial factual (provado e não provado) não permite enquadrar o trabalho de perfuração e revestimento de mais 55 metros e o trabalho de isolamento de mais 6 metros como alterações necessárias ao plano convencionado (projecto inicial).
Por um lado, a Autora não logrou demonstrar (tal como lhe incumbia em exclusivo - cfr. art. 342º/1 do C.Civil) que os mais 55 metros de perfuração e revestimento foram necessários para obter o caudal mínimo garantido no contrato de empreitada (aliás, até resultou provado o contrário já que tal caudal mínimo foi obtido logo aos 149 metros de perfuração, ou seja, dentro do «plano convencionado» que previa a perfuração e revestimento até 150 metros) nem que os mais 6 metros de isolamento foram necessários perante a natureza (características) do terreno.
Por outro lado, embora tenha alcançado demonstrar que foi necessário perfurar mais metros que os 150 para que a eletrobomba trabalhasse abaixo do nível em que apareceu a veia de água e permitir o bom funcionamento do furo, verifica-se que a Autora já não logrou provar (tal como lhe incumbia em exclusivo - cfr. art. 342º/1 do C.Civil) quais os concretos metros desta necessidade, isto é, tendo sido obtido o caudal mínimo garantido (e contratado) aos 149 quantos mais metros eram necessários perfurar e revestir para que a eletrobomba funcionasse abaixo daquele nível e de uma forma correcta. Isto é, não se apurou a «medida» desta necessidade, não se sabendo se para este efeito, na execução do furo, era indispensável perfurar e revestir mais 1 metro (o que até estaria ainda abrangido pelos 150 metros previstos no orçamento), ou mais 5, 10, 25, 40, ou 55 metros. Logo em razão da Autora não ter dado cumprimento integral ao ónus probatório que sobre si recaía, mesmo admitindo que tal necessidade configura uma regra técnica, o Tribunal está impedido de determinar, em concreto, quantos mais metros foram necessários perfurar e revestir e, por via disso, de concluir qual a alteração (em termos de metragem) que tinha e devia ser introduzida no «plano convencionado» (cfr. parte final do nº1 do art. 1215º).
Nestes termos, para além de não estar provado o acordo da dona da obra (e de não ter havido recurso prévio ao Tribunal para que este determinasse a alteração necessária), uma vez que não ficou probatoriamente demonstrada uma necessidade técnica de perfurar e revestir um concreto número de metros para além dos 150 previstos no «plano convencionado» e/ou de isolar mais metros que os 9 previstos nesse mesmo plano, não pode o Tribunal concluir que a perfuração e revestimento de mais 55 metros e o isolamento de mais 6 metros configuraram uma alteração necessária para efeitos do regime do art. 1215º/1 e, por via disso, não há que fixar qualquer preço devido ao empreiteiro relativamente a esta alteração.
Acresce que, mesmo que tivesse sido apurada a metragem que era concretamente necessária perfurar e revestir para a eletrobomba trabalhar abaixo do nível da água, afigura-se-nos que esta necessidade técnica sempre consubstanciaria uma insuficiência do «plano convencionado» imputável à própria Autora.
Atendendo ao teor do orçamento (cfr. factos provados nºs. 5 a 9), facilmente se constata que, relativamente à execução do furo, a empreiteira limitou-se a discriminar os trabalhos consistentes em perfuração e revestimento até 150 metros e em isolamento até 9 metros (indicando os respectivos materiais), jamais tendo identificado e discriminado a realização de qualquer outro trabalho, nomeadamente, não inseriu no «plano de trabalhos a realizar» a colocação da eletrobomba abaixo do nível da água nem qualquer perfuração específica para esta colocação (e relembre-se que a menção que consta do orçamento relativamente a uma «maior perfuração e revestimento» reporta-se apenas a garantir o caudal mínimo de água).
Tendo em consideração que o plano convencionado consistia na realização de perfuração e revestimento até 150 metros (e de isolamento de 9 metros) por forma a obter/garantir um caudal mínimo de água de 6.000L/dia, tendo em consideração que este caudal podia ser obtido logo aos 150 metros (até porque no orçamento não consta qualquer indicação de que seria obtido a profundidade inferior), e tendo em consideração que sempre teriam que ser perfurados (e revestidos) mais «x» metros para que a eletrobomba fosse colocada abaixo do nível da veia de água e pudesse funcionar de forma correcta, então a empreiteira (Autora) teria obrigatoriamente que incluir este trabalho no «plano de trabalhos» a executar relativamente ao furo, o que manifestamente não fez apesar de ter conhecimento desta regra técnica. Mais: ao omiti-lo do orçamento apresentado e dos trabalhos aí discriminados, a Autora transmitiu à dona da obra (Ré) claramente a ideia errada de que, realizada a perfuração até à profundidade que garantia o caudal em causa, não seria necessário continuar a perfurar (e revestir) mais metros.
Portanto, como perita que é na execução deste tipo de obras (é a sua actividade - cfr. facto provado nº1), a Autora deveria e teria que incluir e discriminar no plano constante do orçamento também o trabalho correspondente ao cumprimento e execução desta regra técnica relativa à colocação e funcionamento da eletrobomba: não o tendo feito, o plano/projecto que veio a ser convencionado/acordado mostra-se insuficiente para que a obra de execução do furo fosse apta para o seu uso ordinário, insuficiência esta da inteira responsabilidade da Autora e, por via disso, deve ser esta a suportar os danos deste erro/omissão do projecto que apresentou no orçamento (frise-se que este mesmo raciocínio teria que ser aplicado, caso tivessem sido alegadas - e não o foram -, às regras técnicas que constavam da redacção dada pelo Tribunal a quo ao facto provado nº15, mas que foi alterada: como já se referiu, também a necessidade de realizar uma «caixa de água» e/ou de «deixar uma margem de segurança de 10%» não consta do plano de trabalhos do orçamento).    
Tais danos consistem, necessariamente, no custo da perfuração e do revestimento de mais metros (para além dos 150 previstos) com vista à colocação da eletrobomba, custo que terá que ser suportado pela própria Autora.
Logo, ainda que tivesse sido apurada a concreta quantidade de maior perfuração (e revestimento) necessária à colocação e funcionamento da eletrobomba, mesmo que a Autora quisesse recorrer ao regime do art. 1215º, porque teria que ser ela própria a suportar os custos do trabalho de tal alteração, jamais se lhe poderia reconhecer o direito a receber da Ré o preço relativo a este trabalho.
Nestas circunstâncias, também neste âmbito não se acompanha a sentença recorrida, antes se entendendo que a perfuração de mais 55 metros, tal como o revestimento de mais de 55 metros e o isolamento de mais 6 metros, não se enquadram no regime das alterações necessárias previsto no citado art. 1215º/1.
Não configurando alterações necessárias, estamos perante alterações não autorizadas pela dona da obra [não foi demonstrada a aceitação por parte da Ré – cfr. facto não provado F)], a obra alterada é havida como defeituosa e como não foram exercidos os direitos previstos nos arts. 1221º, 1222º e 1223º do C.Civil, então temos que entender que a Ré a aceitou nos termos executados (no que concerne à execução do furo – relembre-se que que desistiu no que concerne à parte eléctrica), mas por força do disposto na 2ª parte do nº2 do art. 1214º, não ficou obrigada a qualquer suplemento de preço relativamente a estas alterações.
Atentas todas as conclusões supra obtidas, impõe-se a conclusão final de que à Autora assiste efectivamente o direito de receber da Ré o pagamento do preço pela execução do furo, de acordo com o estipulado no contrato de empreitada (cfr. facto provado nº5), mas apenas no valor que corresponde à realização da perfuração até 150 metros, do revestimento de 140mm média pressão reforçado e do isolamento de 180mmm x 7,5Kg, ou seja, no valor total de € 8.103,24 (incluindo a alteração do preço do material do isolamento em mais € 26,00 e que foi aceite pela Ré - cfr. facto provado nº12 - e incluindo o valor do IVA).
Portanto, não assiste à Autora o direito à totalidade do preço reclamado e facturado (€ 10.870,74 - cfr. facto provado nº20) e também não assiste razão à Ré/Recorrente ao defender, no recurso, que não estava obrigada ao pagamento de qualquer preço.
Uma última nota: como já se explicou no âmbito da apreciação e decisão da questão anterior (relativa à impugnação de facto), a invocação da ilegalidade, ilicitude e/ou inconstitucionalidade do pedido formulado pela Autora (pagamento do preço pela execução de um furo de 205 metros) em razão do documento de fls. 34 a 36 dos autos (emitido pela APA) apenas autorizar/licenciar o furo para uma profundidade de 100 metros (cfr. conclusões 110ª a 113ª), configura uma questão nova (apenas foi suscitada nos autos em sede de recurso) e não pode ser objecto de conhecimento e apreciação por este Tribunal ad quem (nem sequer por via do conhecimento oficioso).
Consequentemente e sem necessidade de outras considerações, perante tudo o que supra se expôs e concluiu, a resposta à presente questão, que no âmbito do recurso incumbe a este Tribunal ad quem apreciar, é necessariamente no sentido de que, a título de preço, a Ré é devedora à Autora apenas da quantia de € 8.103,24, e não da totalidade da quantia em que foi condenada pelo Tribunal a quo (€ 10.870,74).
Nestes termos, deverá proceder, ainda que de forma parcial, este fundamento de recurso.
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4.4. Do Mérito do Recurso

Perante as respostas alcançadas quanto às questões que se impunha decidir, deverá julgar-se parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pela Ré/Recorrente, devendo a decisão recorrida ser revogada e alterada quanto ao valor da quantia condenatória em conformidade com o supra exposto, mantendo-se a mesma no demais (sem prejuízo das alterações determinadas quanto à decisão de facto)
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4.5. Da Responsabilidade quanto a Custas
Procedendo o recurso apenas parcialmente, porque ficaram ambas vencidas, deverão a Autora/Recorrida e a Ré/Recorrente suportarem as respectivas custas na proporção do respectivo decaimento, devendo fixar-se a tal proporção em 1/5 e 4/5 respectivamente (art. 527º/1 e 2 do C.P.Civil de 2013)
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5. DECISÃO

Face ao exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pela Ré/Recorrente e, em consequência, decidem:

1) revogar parcialmente a sentença recorrida, alterando-a nos seguintes termos - «Condeno a Ré AA, a pagar à autora Furos de Água EMP01..., Lda a quantia de € 8.103,24 (oito mil cento e três euros e vinte e quatro cêntimos)»;
2) e manter no mais a sentença recorrida (sem prejuízo das alterações determinadas quanto à decisão de facto).
Custas do recurso de apelação pela Autora/Recorrida e pela Ré/Recorrente na proporção de 1/5 e de 4/5 respectivamente.
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Guimarães, 08 de Maio de 2025.
(O presente acórdão é assinado electronicamente)
 
Relator - Pedro Manuel Quintas Ribeiro Maurício;
1ªAdjunta – Maria João Marques de Pinto Matos;
2ªAdjunta – Susana Raquel de Sousa Pereira.



[1]A presente decisão é redigida segundo a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, mas respeita-se, no caso das transcrições, a grafia utilizada nos textos originais.
[2]António Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 6ª edição actualizada, Almedina, p. 139.
[3]Ac. STJ de 07/07/2016, Juiz Conselheiro Gonçalves da Rocha, proc. nº156/12.0TTCSC.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[4]Note-se que a decisão recorrida não contém um facto provado nº19 já que, por manifesto lapso de escrita na numeração dos factos provados, do nº18 passou-se para o nº20. 
[5]Juiz Desembargador José Moreira Dias, proc. nº1867/14.0TBBCL-F.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.   
[6]Ac. STJ 03/03/2021, Juíza Conselheira Leonor Cruz Rodrigues, proc. nº3157/17.8T8VFX.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj. [7]In A Ação Declarativa Comum À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3ªedição, p. 317.
[8]In Comentário ao Código de Processo Civil, vol. II, Coimbra Editora, 1945, p. 172/173
[9]In Coimbra Editora, 2ªedição, 1985, p. 687.
[10]In Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1981, Vol. V, p. 140.
[11]In Notas ao Código de Processo Civil, III, p. 194.
[12]In Estudos sobre o Processo Civil, p. 221.
[13]In Da Sentença Cível, p. 39.
[14]Juiz Conselheiro Ribeiro Cardoso, proc. nº835/15.0T8LRA.C3.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[15]Juíza Conselheira Leonor Cruz Rodrigues, proc. nº3157/17.8T8VFX.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[16]Juiz Desembargador Vieira e Cunha, proc. nº1887/04-1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg
[17]In Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1981, Vol. V, p. 140.
[18]Juíza Conselheira Leonor Cruz Rodrigues, proc. nº3157/17.8T8VFX.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[19]Juiz Desembargador Henrique Antunes, proc. nº2996/12.0TBFIG.C1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrc.
[20]No mesmo sentido, Ac. RL 29/10/2015, Juiz Desembargador Olindo Geraldes, proc. nº161/09.3TCSNT.L1-2, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrl.
[21]In Código de Processo Civil Anotado, 2ºVolume, 3ªedição, p. 707/708 e 733/734.
[22]Ac. RG de 13/01/2022, Juiz Desembargador Afonso Cabral de Andrade, proc. nº1194/16.9T8VCT.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[23]In Código de Processo Civil Anotado, II vol., p. 670.
[24]Ac. RL de 09/07/2014, Juiz Desembargador Pedro Brighton, proc. nº1021/09.3 T2AMD.L1-1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrl.
[25]Ac. RP de 02/05/2016, Juiz Desembargador Correia Pinto, proc. nº1556/14.6T8LOU-A.P1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp.
[26]Cfr. Ac. STJ de 11/01/2018, Juíza Conselheira Rosa Ribeiro Colego, proc. nº779/14.2TBEVR-A.E1.S1, cuja publicação se desconhece mas estando o sumário disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2019/06/civel2018-1.pdf. No mesmo sentido, Ac. STJ de 18/01/2018, Juiz Conselheiro Ribeiro Cardoso, proc. nº25106/15.8T8LSB.L1.S1, e Ac. STJ de 31/01/2017, Juiz Conselheiro Fonseca Ramos, proc. nº820/07.5TBMCN.P1.S1, ambos disponíveis em http://www.dgsi.pt/jstj.
[27]Juíza Conselheira Leonor Cruz Rodrigues, proc. nº3157/17.8T8VFX.L1.S1.
[28]Juiz Conselheiro Ribeiro Cardoso, proc. nº2913/14.3TTLSB.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[29]In Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, 1984, p. 143.
[30]In Código de Processo Civil Anotado, 1ºVolume, 4ªedição, 2018, p. 737.
[31]In Direito de Processo Civil, vol. II, Almedina, 2015, p. 371.
[32]Juiz Conselheiro Alexandre Reis, proc. nº2200/10.6TVLSB.P1.S1, disponível em www.stj.pt/wp-content/uploads/2018/01/Civel_2017_10.pdf. 
[33]Juíza Conselheira Maria João Vaz Tomé, proc. nº2057/16.3T8PNF.P1.S1 disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[34]In Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, 1984, p. 145.
[35]Juiz Conselheiro Tomé Gomes, proc. nº7095/10.7TBMTS.P1.S1 disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[36]Cfr. Ac. STJ 23/01/2019, Juiz Conselheiro Júlio Gomes, proc nº4568/13.3TTLSB.L2.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[37]Cfr. Abrantes Geraldes, in obra referida, p. 196 e 197.
[38]Juiz Conselheiro Lopes do Rego, proc. nº233/09.4TBVNC.G1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj
[39]Juíza Conselheira Ana Luísa Geraldes, proc. nº824/11.3TTLRS.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[40]No mesmo sentido, entre outros, Acs. STJ de 31/05/2016, Juiz Conselheiro Garcia Calejo, proc. nº1572/12.2TBABT.E1.S1, de 19/02/2015, Juiz Conselheiro Tomé Gomes, proc. nº299/05.6TBMGD.P2.S1, e de 28/04/2016, Juiz Conselheiro Abrantes Geraldes, proc. nº1006/12.2TBPRD.P1.S1, disponíveis em http://www.dgsi.pt/jstj
[41]Juiz Conselheiro Pinto de Almeida, proc. nº29/12.6TBFAF.G1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[42]In obra referida, p. 200.
[43]Juiz Conselheiro Bernardo Domingos, proc. nº756/14.3TBPTM.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[44]Ver também o mais recente Ac. STJ 02/02/2022, Juiz Conselheiro Fernando Augusto Samões, proc. nº1786/17.9T8PVZ.P1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[45]Juíza Conselheira Ana Resende, proc. nº8344/17.6T8STB.E1-A.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[46]Juiz Desembargador José Carlos Pereira Duarte, proc. nº5172/18.5T8BRG.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[47]Cfr. Ac. 12/05/2016, Juiz Conselheiro Tomé Gomes, proc. nº2325/12.3TVLSB.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[48]Juiz Conselheiro Bernardo Domingos, proc. nº3901/15.8T8AVR.P1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[49]António Abrantes Geraldes, in obra citada, p. 353. Sufragando este entendimento, veja-se o já citado Ac. STJ 17/10/2019, Juiz Conselheiro Bernardo Domingos, proc. nº3901/15.8T8AVR.P1.S1.
[50]António Abrantes Geraldes, in obra citada, p. 354. Novamente sufragando este entendimento, veja-se o já citado Ac. STJ 17/10/2019, Juiz Conselheiro Bernardo Domingos, proc. nº3901/15.8T8AVR.P1.S1.
[51]António Abrantes Geraldes, in obra citada, p. 357.
[52]Cfr. o já citado Ac. STJ 12/05/2016, Juiz Conselheiro Tomé Gomes, proc. nº2325/12.3TVLSB.L1.S1.
[53]Publicado no DR, IIª Série, de 18/08/2009.
[54]In obra citada, p. 331, 332 e 338.
[55]Ac. STJ de 22/10/2015, Juiz Conselheiro Tomé Gomes, proc. nº212/06.3TBSBG.C2.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[56]Juíza Conselheira Rosa Tching, proc. nº588/12.3TBPVL.G2.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[57]Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, Reimpressão, 1993, p. 384.
[58]Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2ªEdição, Revista e Actualizada, p. 435 a 436.
[59]P.J.Pimenta, in Processo Civil Declarativo, Almedina, 2014, p. 325.
[60]Neste sentido, o Ac. RG de 13/07/2021, Juíza Desembargadora Raquel Baptista Tavares, proc. nº3625/20.4T8VCT.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[61]In Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Volume I, p. 609.
[62]Juiz Conselheiro Santos Cabral, proc. nº07P4822, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[63]Juíza Conselheira Fernanda Isabel Pereira, proc. nº809/10.7TBLMG.C1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj
[64]Juiz Conselheiro Abrantes Geraldes, proc. nº1568/09.1TBGDM.P1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.  
[65]António Abrantes Geraldes, in obra referida, p. 351.
[66]Juíza Desembargadora Raquel Baptista Tavares, proc. nº671/20.1T8BGC.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[67]Cfr. Ac. do STJ de 23/09/2009, Juiz Conselheiro Bravo Serra, proc. nº238/06.7TTBGR.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[68]Juiz Desembargador Filipe Caroço, proc. nº338/17.8YRPRT, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp
[69]Este mesmo entendimento foi sufragado pelo Ac. da RG de 30/09/2021, Juiz Desembargador Paulo Reis, proc. nº899/19.7T8VCT.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg
[70]O já referido Ac. do STJ de 28/09/2017, Juíza Conselheira Fernanda Isabel Pereira, proc. nº809/10.7TBLMG.C1.S1.
[71]Cfr. Ac. do STJ de 28/09/2017, Juíza Conselheira Fernanda Isabel Pereira, proc. nº659/12.6TVLSB.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[72]Juiz Desembargador Paulo Reis, proc. nº899/19.7T8VCT.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[73]Cfr. Ac. STJ 14/12/2004, Juiz Conselheiro Nuno Cameira, proc. nº04A4044, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[74]In Código de Processo Civil Anotado, Volume 1.º Artigos 1.º a 361.º, 4ª edição, Almedina, p. 35 a 37.
[75]Juiz Conselheiro António Barateiro Martins, proc. nº23994/16.0T8LSB-F.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[76]Cfr. o citado Ac. STJ 30/11/2022, Juiz Conselheiro António Barateiro Martins, proc. nº23994/16.0T8LSB-F.L1.S1.
[77]Cfr. Rui Pinto, in Notas ao Código de Processo Civil, Coimbra Editora, 2014, p. 19 a 25.
[78]Por manifesto lapso de escrita, o Tribunal a quo refere «1999» quando a Ré alegou e a testemunha afirmou «199».
[79]In Código Civil Anotado, vol. I, 4ªedição, p. 326 e 327,
[80]Cfr. Ac. STJ de 26/04/1994, in CJ-ACSTJ, 1994, tomo II, p. 69.
[81]Por manifesto lapso de escrita, o Tribunal a quo refere «140» quando a Autora alegou «149 metros», sendo que as testemunhas FF e CC afirmaram «149» e que o documento de fls. 38 dos autos tem consignado «149».  
[82]Por manifesto lapso de escrita, o Tribunal a quo refere «100» quando a Autora alegou «150 metros» e o orçamento tem expressamente consignado «150 metros».  
[83]In Recursos Civis, Edição CEDIS, Set. 2020, p. 7 e 8.
[84]Juiz Conselheiro Gonçalves da Rocha, proc. nº156/12.0TTCSC.L1.S1.
[85]Juiz Conselheiro Ribeiro Cardoso, proc. nº291/12.4TTLRA.C1.S2, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[86]Juiz Conselheiro Jorge Dias, proc. nº235/14.9T8PVZ.P1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[87]Cfr. Ac. STJ 08/05/1984, Juiz Conselheiro Corte Real, proc. nº071455, disponível in http://www.dgsi.pt/jstj.
[88]In Contrato de Empreitada, 1994, p. 66 e 67.
[89]Juíza Conselheira Maria Clara Sottomayor, proc. nº2545/10.5TVLSB.L1.S1, disponível in http://www.dgsi.pt/jstj.
[90]Pedro Romano Martinez, in obra referida, p. 67.
[91]Cfr. Ac. STJ 25/03/2010, Juiz Conselheiro Oliveira Vasconcelos, proc. nº2688/07.2TBVCT.G1.S1, disponível in http://www.dgsi.pt/jstj. No mesmo sentido, Pedro Romano Martinez, in obra referida, p. 66.  
[92]Juiz Desembargador Virgílio Mateus, proc. nº 4/04.4TBVNO.C2, disponível in http://www.dgsi.pt/jtrc.
[93]Pires de Lima e Antunes varela, in Código Civil Anotado, volume II, 4ª edição revista e actualizada, p. 865.  
[94]Cfr. Ac. STJ 13/10/2009, Juiz Conselheiro Moreira Alves, proc. nº08A4106, disponível in http://www.dgsi.pt/jstj.
[95]Pedro Romano Martinez, in obra referida, p. 103. No mesmo sentido, Pedro de Albuquerque e Miguel Assis Raimundo, in Direito das Obrigações, Contratos em Especial, volume II, Almedina 2012, p. 178 e 179.
[96]Cfr. Ac. RL 10/05/2017, Juiz Desembargador Pedro Lima Gonçalves, proc. nº1154/2007-8, disponível in http://www.dgsi.pt/jtrl.
[97]In obra referida, p. 105 a 107.
[98]In obra referida, p. 108.
[99]Pedro Romano Martinez, in obra referida, p.109.
[100]In Das Obrigações em Geral, 5ª edição, Vol. 2, p. 7.
[101]Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, volume II, 4ª edição revista e actualizada, p. 908, e Ac. STJ 11/01/2005, Juiz Conselheiro Azevedo Ramos, proc. nº04A4007, disponível in http://www.dgsi.pt/jstj
[102]Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, volume II, 4ª edição revista e actualizada, p. 908; o citado Ac. STJ 11/01/2005, Juiz Conselheiro Azevedo Ramos, proc. nº04A4007; e Ac. RL 11/01/2005, Juiz Desembargador Arlindo Crua, proc. nº85577/17.5YIPRT.L1-2, disponível in http://www.dgsi.pt/jtrl
[103]Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, volume II, 4ª edição revista e actualizada, p. 908.
[104]Cfr. o citado Ac. RL 11/01/2005, Juiz Desembargador Arlindo Crua, proc. nº85577/17.5YIPRT.L1-2.
[105]Ac. RG 10/03/2004, Juiz Desembargador Espinheira Baltar, proc. nº2298/03-2, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp.
[106]Neste sentido, Almeida Costa, in Direito das Obrigações, 7ª edição, p. 309; Ac. STJ 18/02/2003, in CJ-ACSTJ, 2003, Tomo I, p. 103; e Ac. STJ 21/02/2006, Juiz Conselheiro Borges Soeiro, proc. nº05A3593, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[107]Cfr. Ac. STJ 16/06/2015, Juiz Conselheiro Fonseca Ramos, proc. nº3309/08.1TJVNF.G1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[108]Calvão da Silva, in Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, Almedina, p. 334.
[109]Juíza Desembargadora Raquel Baptista Tavares, proc. nº428/19.2T8CMN.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg
[110]In Direito das Obrigações, Vol. II, 7ª Edição, Almedina, p. 269.
[111]Juíza Conselheira Rosa Tching, proc. nº3069/19.0T8LSB.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[112]Cfr. Ac. STJ 12/03/2013, proc. nº499/06.1TBFVN.C1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[113]Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, volume II, 4ª edição revista e actualizada, p. 869.
[114]Cfr. Jorge Andrade da Silva, in Regime Jurídico das Empreitadas Públicas, 8ª Edição, 2003, p. 52.
[115]Cfr. João Cura Mariano, in Responsabilidade Contratual do Empreiteiro Pelos Defeitos da Obra, 3ª edição, p. 69 e Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, volume II, 4ª edição revista e actualizada, p. 869.
[116]Juiz Desembargador Joaquim Boavida, proc. nº3673/23.2T8VNF.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[117]Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, volume II, 4ª edição revista e actualizada, p. 869.
[118]In Código Civil Anotado, volume II, 4ª edição revista e actualizada, p. 884 e 885.
[119]In obra referida, p. 69 e 70.
[120]In obra referida, p. 140.
[121]Cfr. Ac. STJ 10/09/2013, Juiz Conselheiro Garcia Calejo, proc. nº499/06.1TBFVN.C1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj
[122]Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, volume II, 4ª edição revista e actualizada, p. 885.
[123]Por manifesto lapso, na sentença recorrida, refere-se «100 metros» quando no orçamento, e na factualidade provada, são «150» os metros previstos.  
[124]De novo, o mesmo lapso referido na nota anterior.
[125]De novo, o mesmo lapso referido na nota 123.
[126]Por manifesto lapso, na sentença recorrida, refere-se «105 metros» quando resulta da factualidade provada que a perfuração foi de «mais 55 metros».