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ACIDENTE DE TRABALHO
DESCARACTERIZAÇÃO DO ACIDENTE
VIOLAÇÃO DAS REGRAS DE SEGURANÇA NO TRABALHO
NEGLIGÊNCIA GROSSEIRA
Sumário
Sumário: 1. Para se proceder à descaracterização do acidente de trabalho, nos termos do art. 14.º n.º 1 al. a) da LAT, devem estar reunidos quatro requisitos cumulativos: 1 – existência de específicas condições de segurança, sejam elas estabelecidas pelo empregador, ou pela lei; 2 – violação de tais condições, por acto ou omissão do trabalhador; 3 – inexistência de causa justificativa para tal violação; 4 – e nexo causal entre a violação da regra e o acidente. 2. A violação das regras de segurança, quer legais quer estabelecidas pela entidade patronal, deve ser voluntária ou com elevado grau de negligência, estando excluídos da descaracterização os actos ou omissões que resultem de inadvertência, imperícia, distracção, esquecimento ou outros actos involuntários, resultantes ou não da habituação ao risco. 3. Encontrando-se o sinistrado a concluir a montagem da estrutura de um andaime, com dois lances, tendo este tombado para o lado porque o sinistrado ainda não havia fixado o primeiro lance ao prédio, pois pretendia fazê-lo no final da montagem do segundo lance, para não ter de, eventualmente, acertar a fixação do primeiro, tal comportamento apenas revela negligência na montagem, mas não culpa grave. 4. O comportamento do sinistrado revela, acima de tudo, excesso de confiança induzido pela profissão e consequente habituação ao perigo – e por isso o acidente não deve ser descaracterizado.
Texto Integral
Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
No Juízo do Trabalho de Beja, foi participado acidente de trabalho sofrido por AA, quando desempenhava a actividade de pintor de construção civil, por conta própria, tendo a sua responsabilidade infortunística transferida para Companhia de Seguros Allianz Portugal, S.A..
Infrutífera a tentativa de conciliação, prosseguiram os autos para a fase contenciosa, com apresentação da respectiva petição inicial e contestação da Seguradora, invocando a descaracterização do acidente, nos termos do art. 14.º n.º 1 al. a) da LAT, pois o acidente ter-se-á devido a culpa do sinistrado por desrespeito das normas de segurança exigíveis.
Procedeu-se a exame por junta médica, no âmbito do respectivo apenso, onde foi fixada uma IPATH, com IPP de 38,256%.
Realizado o julgamento, a sentença julgou a causa procedente, fixando ao sinistrado as prestações devidas face à sua incapacidade.
Inconformada, a Seguradora recorre e conclui:
1. A Recorrente concorda com o elenco de factos provados que constam da douta Sentença recorrida.
2. Em face dos factos que resultaram provados na Sentença ora em crise, e ao contrário do julgado, estava o Tribunal a quo vinculado a considerar que o acidente estaria descaracterizado à luz do disposto no artigo 14º da Lei nº 98/2009, de 04 de Setembro, entendimento que a Recorrente não pode aceitar.
3. Estatui o nº 1 do artigo 14º da Lei 98/2009, de 04 de Setembro, que “o empregador não tem de reparar os danos decorrentes do acidente que: a) For dolosamente provocado pelo sinistrado ou provier de seu acto ou omissão, que importe violação, sem causa justificativa, das condições de segurança estabelecidas pelo empregador ou previstas na lei”.
4. A jurisprudência tem sublinhado repetidamente que para esta causa de exclusão funcionar terão de se verificar cumulativamente 4 requisitos: i) a existência de condições de segurança estabelecidas pelo empregador ou previstas na lei; ii) a sua violação por parte do trabalhador; iii) actuação voluntária do sinistrado, embora não intencional, e sem causa justificativa; iv) que o acidente seja consequência, em termos de causalidade adequada, dessa conduta (iii).
5. O Apelado, ao arrepio das imposições legais, para efectuar o trabalho para o qual foi contratado, decidiu montar um andaime com duas mesas e 4 metros de altura, sem cuidar de fixar o mesmo seja de que forma for.
6. O Apelado omitiu as regras impostas para a montagem de andaimes no Decreto-Lei n.º 82/99, de 16 de Março e Decreto-lei de 41821/58 de 21/08.
7. O Apelado omitiu deliberadamente o cumprimento da legislação atrás mencionada, violando condições de segurança impostas pelo legislador para a tarefa em causa.
8. Embora se admita que o Apelado não tivesse em mente o resultado da sua incúria, no sentido do mesmo ser certo e aceitá-lo, a verdade é que sabendo o mesmo como tinha de ser montado o andaime a queda era no mínimo cogitável, sendo que se conformou com essa possibilidade, estando preenchido assim desta forma o dolo na sua menos grave configuração – dolo eventual.
9. A ausência de fixação do andaime, não ocorreu de forma negligente. O Apelado não fixou o andaime porque assim o entendeu. Há obviamente culpa grave do mesmo.
10. Não obstante, do estatuído no art. 14º, nº1, al a) da LAT, não se vislumbra que seja necessário para o acidente ser descaracterizado, que a violação da lei aplicável ocorra após uma conduta dolosa ou proveniente de culpa grave.
11. Resultou provado foi que o Apelado “Após ter recolhido, na sua viatura, os utensílios necessários a concluir a montagem do andaime e iniciar os trabalhos, o autor subiu pela parte lateral (escada) da estrutura de andaime e quando já estava posicionado nas pranchas na 2ª mesa de andaime, a cerca de 4 metros do solo, escorregou – facto provado 26.
12. O Apelado caiu do andaime quando já se encontrava a trabalhar e não propriamente a concluir a montagem do andaime uma vez que o mesmo, a ser assim, não teria caído da altura que caiu, uma vez que a primeira mesa do andaime já estaria fixada à empena do imóvel em causa.
13. No caso dos autos parece-nos que os factos provados permitem concluir que o Sinistrado actuou com negligência consciente, “sem causa justificativa”.
14. Para além da violação de regras de segurança pelo Apelado, resultou provada a existência de nexo de causalidade entre tal violação das regras e o acidente que vitimou o Sinistrado.
15. No caso dos presentes autos não há a mínima duvida quanto ao preenchimento deste requisito, já que ficou consagrado na matéria assente que: 29) Se o autor tivesse fixado o primeiro lance do andaime à empena do prédio, não teria caído.
16. Deverá reconhecer-se a descaracterização do acidente, absolvendo a Recorrente de todos os pedidos, assim se fazendo a correcta aplicação do disposto no art. 14º, nº1, al. a) da LAT.
Na respectiva resposta, o sinistrado sustenta a manutenção do julgado.
A mesma posição foi manifestada já nesta Relação pela Exm.ª Magistrada do Ministério Público, no seu parecer.
Cumpre-nos decidir.
Ficou assim estabelecida na sentença a matéria de facto provada:
1. O A é empresário em nome individual, trabalhando por conta própria, na actividade de pintor da construção civil, auferindo a quantia anual de 9.975,00€ (712,50 x14).
2. O autor celebrou com a Ré um contrato de seguro, titulado pela apólice n.º … para transferência da responsabilidade civil emergente de acidentes laborais enquanto trabalhador independente, pela referida retribuição anual.
3. No dia 08 de Janeiro de 2021, cerca das 16:00, o autor caiu dum andaime que havia montado numa fachada exterior do edifício sito na Praceta …, para aí proceder à limpeza do algeroz, conforme acordado com os condóminos do referido prédio, embatendo com os dois pés no pavimento.
4. A Ré seguradora recusou assistência ao Autor, invocando violação de regras de segurança.
5. O perito do GML atribuiu ao Autor um grau de incapacidade permanente de 63,95%, com IPATH para a função habitual de pintor da construção civil, e 780 dias de ITA.
6. A Ré nada pagou ao Autor.
7. Procedeu-se a Tentativa de Conciliação no dia 13.02.2023, a qual se veio a frustrar, pelas razões que da respectiva acta constam e se dão por reproduzidas.
8. O Autor deslocou-se a Beja, para realização de exame médico e para tentativa de conciliação, no âmbito dos presentes autos.
9. Como consequência directa e imediata o A sofreu:
a. Fractura cominutiva do corpo do astrágalo direita, exposta grau IIIb de GA, com luxação subastragalina;
b. Fractura do astrágalo corpo do astrágalo à esquerda;
10. No mesmo dia foi submetido à 1ª intervenção cirúrgica, sob raquianestesia que consistiu em:
a. Lavagem mais desbridamento;
b. Redução cruenta mais fixação com dois parafusos tipo herbert de 4mm;
c. Sutura por planos (pele com agrafos);
d. Imobilização com TGP - suropodálica
11. No dia seguinte, 09-01-2021, foi submetido, sob anestesia geral, à 2ª intervenção cirúrgica que consistiu em:
a. Redução incruenta mais fixação com 2FK de 2mm por luxação de Chopart à esquerda;
b. Imobilização com TGP - suropodálica
12. Aquando da alta hospitalar, em 23 de Janeiro de 2021, recebeu indicações para:
a. -Repouso com membros superiores elevados;
b. -Realizar uma injecção subcutânea de enoxaparina de 24h em 24h;
c. -Realizar RX no dia da consulta;
d. -Analgesia prescrita
13. E foi-lhe prescrita a seguinte medicação:
a. -Amoxicilina+A cido clavulânico;
b. -Paracetamol;
c. -Metamizol Magnésio;
d. -Enoxaparina sódica.
14. Duas semanas depois - em 09.02.2021 - passou a ser seguido, mensalmente, nas consultas externas de ortopedia no Hospital de Beja.
15. Em 6.07.2021, tendo decorrido cerca de 6 meses após o acidente, na respectiva consulta de ortopedia foi-lhe diagnosticada artrose tibiotársica à esquerda, pós-fractura do astrágalo com cavilha à esquerda
16. O que implicou que o Autor fosse sujeito a uma nova cirurgia com anestesia geral em 28-09-2021, cujo procedimento consistiu numa artrodese tibiotársica com cavilha à esquerda.
17. Tendo este tido alta hospitalar em 29.09.2021 com as seguintes indicações:
a. -Vigilância dos sinais de compromisso neuro-vascular do membro intervencionado;
b. -Elevação do membro intervencionado mais gelo local;
c. -Deambular com canadianas carga parcial/ que tolerar;
d. -Deverá manter esquema de FT iniciado neste internamento;
e. -Profilaxia antitrombótica
18. E foi-lhe prescrita a seguinte medicação:
a. -Paracetamol+Tramadol
b. -Meatamizom magnésio;
c. -Enoxaparina sódica (Lovenox);
19. Após a alta do Hospital de Beja o Autor, por indicação do medico ortopedista que aí presta serviço, reiniciou fisioterapia em regime de ambulatório e com periodicidade diária.
20. Por indicação médica e a expensas do Autor, passou este a realizar sessões de fisioterapia em regime de ambulatório, na clínica ….
21. Para tratamento das lesões resultantes dos autos o autor despendeu em taxas moderadoras com consultas (97,85€), transportes de ambulância (184,92€), medicamentos (342,81€) e sessões de fisioterapia (1.222,00€), o total de €1.847,58€.
22. Em cada deslocação, ida e volta, a diligências no âmbito dos presentes autos, em viatura própria, de …, o autor despende cerca de 30€.
23. O autor deslocou-se a Évora, em viatura própria, para realizar exame, no âmbito dos presentes autos, tendo despendido cerca de 40€.
24. No dia do acidente o autor tinha como tarefa limpar o algeroz do prédio e isolar com tela uma fissura na caleira em alvenaria.
25. Para o efeito, edificou uma estrutura de andaime com dois lances com 4 metros de altura;
26. Após ter recolhido, na sua viatura, os utensílios necessários a concluir a montagem do andaime e iniciar os trabalhos, o autor subiu pela parte lateral (escada) da estrutura de andaime e quando já estava posicionado nas pranchas na 2.ª mesa de andaime, a cerca de 4 metros do solo, escorregou.
27. A queda ficou a dever-se a um desequilíbrio do Autor, o qual, ao tentar amparar-se, agarrando-se à empena do prédio, exerceu uma força contrária, fazendo com que o andaime tombasse para o lado da estrada e o autor deixasse de ter a sustentação do mesmo.
28. O A. não fixou o primeiro lance do andaime ao prédio, pretendendo fazê-lo no final da montagem do segundo lance, para não ter que, eventualmente, acertar a fixação do primeiro.
29. Se o autor tivesse fixado o primeiro lance do andaime à empena do prédio, não teria caído.
30. Em resultado as lesões sofridas o autor esteve total e temporariamente impedido de exercer qualquer trabalho desde a data do acidente até 25.02.202, data em que recebeu alta da consulta de ortopedia, com consolidação das lesões.
31. O autor apresenta como sequelas do acidente: artrodese da tibiotársica esquerda e rigidez moderada na flexão e extensão da tibiotársica direita, as quais o impedem de exercer as funções de pintor da construção civil, designadamente por não conseguir movimentar-se livremente, manter-se de pé durante longos períodos de tempo, ou de joelhos, subir e descer escadas e andaimes ou carregar baldes de tinta, sendo a capacidade residual de 38,256%.
APLICANDO O DIREITO Da descaracterização do acidente
Argumenta a Recorrente que se deve proceder à descaracterização do acidente, nos termos do art. 14.º n.º 1 al. a) da LAT (Lei 98/2009, de 4 de Setembro), por violação, por acto ou omissão do sinistrado, sem causa justificativa, das condições de segurança previstas na lei.
Pode-se afirmar que esta norma exige quatro requisitos cumulativos para a descaracterização do acidente: 1 – existência de específicas condições de segurança, sejam elas estabelecidas pelo empregador, ou pela lei; 2 – violação de tais condições, por acto ou omissão do trabalhador; 3 – inexistência de causa justificativa para tal violação; 4 – e nexo causal entre a violação da regra e o acidente.[1]
Estabelecidos os requisitos da norma, está provado que o sinistrado se encontrava a montar um andaime no exterior de um edifício, com dois lances com 4 metros de altura. No momento da queda, o sinistrado encontrava-se a concluir a montagem do andaime, estando posicionado nas pranchas na 2.ª mesa de andaime, a cerca de 4 metros do solo. O andaime tombou para o lado da estrada e o sinistrado não havia fixado o primeiro lance ao prédio, pretendendo fazê-lo no final da montagem do segundo lance, para não ter que, eventualmente, acertar a fixação do primeiro. Se tivesse fixado o primeiro lance do andaime à empena do prédio, não teria caído.
De acordo com o art. 8.º do Decreto n.º 41821, de 11.08.1958 – Regulamento de segurança no trabalho da construção civil – “a construção dos andaimes nos cunhais deverá ser feita com especiais cuidados, em ordem a conseguir-se completa segurança dos operários, bem como, uma ligação perfeita e um travamento firme para o conjunto do andaime.”
Por outro lado, no DL 50/2005, de 25 de Fevereiro – que revogou o DL n.º 82/99, por isso incorrectamente citado na sentença recorrida e nas alegações de recurso – dispõe no seu art. 40.º n.º 1 o seguinte: “1 – A montagem, desmontagem ou reconversão do andaime só pode ser efectuada sob a direcção de uma pessoa competente com formação específica adequada sobre os riscos dessas operações, nomeadamente sobre: a) A interpretação do plano de montagem, desmontagem e reconversão do andaime; b) A segurança durante a montagem, desmontagem ou reconversão do andaime; c) As medidas de prevenção dos riscos de queda de pessoas ou objectos; d) As medidas que garantem a segurança do andaime em caso de alteração das condições meteorológicas; e) As condições de carga admissível; f) Qualquer outro risco que a montagem, desmontagem ou reconversão possa comportar.”
A sentença recorrida reconheceu que, caso o andaime estivesse fixado à empena do prédio, a queda não teria ocorrido, pelo que foi a inobservância das regras de montagem daquela estrutura que levou ao acidente. Mas afirmou que os factos provados não permitiam concluir, quer pelo dolo, quer pela culpa grave do sinistrado na inobservância das aludidas normas, tanto mais que este, “para evitar ter de refazer as fixações iniciais, apenas procedia à fixação do andaime à parede após finalizar a montagem do mesmo, e que quando caiu ainda estava a completar a montagem do andaime. É certo que este não é um procedimento correcto, mas a justificação apresentada impede que o tribunal conclua por um comportamento altamente censurável do sinistrado que implique a descaracterização do acidente.”
Por seu turno, a Seguradora alega que a queda ocorreu quando o sinistrado já estava a trabalhar no andaime e não a concluir a sua montagem, e que o acidente não teria ocorrido caso o 1.º lance já estivesse fixado à empena do prédio, motivo pelo qual há negligência consciente.
Vejamos.
Temos a dizer que o acto descaracterizador do acidente deve resultar de culpa exclusiva do trabalhador, sem concurso de qualquer outra acção de terceiros ou da entidade patronal.
Acresce que a violação das regras de segurança, quer legais quer estabelecidas pela entidade patronal, deve ser voluntária ou com elevado grau de negligência, estando excluídos da descaracterização os actos ou omissões que resultem de inadvertência, imperícia, distracção, esquecimento ou outros actos involuntários, resultantes ou não da habituação ao risco.[2]
A propósito, Júlio Gomes escreve o seguinte: «a privação da reparação por acidente de trabalho é uma consequência desproporcionada, a não ser para comportamentos dolosos ou com um grau de negligência muito elevado que sejam, eles próprios, a causa do acidente, de tal modo que verdadeiramente se quebre o nexo etiológico entre o trabalho e o acidente.»[3]
E acrescenta: «Não pode ser o mero facto da violação das regras de segurança que opera a descaracterização, devendo exigir-se um comportamento subjectivamente grave, ao que acresce que outras “justificações” poderão ser relevantes. Terá, por conseguinte, que verificar-se, também aqui, uma culpa grave do trabalhador, tão grave que justifique a sua exclusão, mesmo que ele esteja a trabalhar, a executar a sua prestação, do âmbito de tutela dos acidentes de trabalho. Essa culpa deve ser aferida em concreto e não em abstracto, e não poderá deixar de atender a factores como o excesso de confiança induzido pela própria profissão, a passividade do empregador perante condutas similares no passado (…) e, simplesmente, factores fisiológicos e ambientais como o cansaço, o calor ou o ruído existente no local de trabalho, Destarte, deve considerar-se (…) que a violação das regras de segurança pode ter outras causas justificativas para além da dificuldade em conhecer ou entender a norma legal ou estabelecida pelo empregador.»[4]
Nesta perspectiva, não está provado que o A. já tivesse concluído a montagem do andaime – aliás, está provado o contrário, preparava-se para concluir essa tarefa para depois iniciar os trabalhos de limpeza do algeroz.
E também está provado que o A. não fixou o primeiro lance do andaime ao prédio, pretendendo fazê-lo no final da montagem do segundo lance, para não ter que, eventualmente, acertar a fixação do primeiro.
Face a estes factos, se pode detectar-se negligência na montagem, já não se detecta a culpa grave, tanto mais que o comportamento do A. revela, acima de tudo, “o excesso de confiança induzido pela própria profissão” e consequente habituação ao perigo – e por isso considerou que apenas deveria proceder à fixação do andaime do prédio no final da montagem, para não ter que voltar a acertar essa fixação.
Como se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01.02.2023 (Proc. 9573/18.0T8PRT.P1.S1), publicado na página da DGSI, “só a violação das regras de segurança com culpa grave é que pode descaracterizar o acidente de trabalho”. E daí que se tenha decidido que “age sem culpa grave o trabalhador que, confiando na sua experiência profissional e habituado ao perigo, sobe a um telhado, do qual veio a cair, queda que resultou na sua morte, sem adoptar medidas especiais de segurança, com o propósito de efectuar um orçamento para a reparação do mesmo e antes da execução de qualquer obra.”
Visto que também nestes autos a hipótese de excesso de confiança e habituação ao perigo é a de maior plausibilidade, tanto basta para afastar a descaracterização pretendida pela Recorrente.
Visto que outras questões não são lançadas no recurso, resta negar-lhe provimento.
DECISÃO
Destarte, nega-se provimento ao recurso e confirma-se a sentença recorrida.
As custas pela Recorrente.
Évora, 8 de Maio de 2025
Mário Branco Coelho (relator) Emília Ramos Costa Paula do Paço
__________________________________________________ [1] Vide, a propósito, o Acórdão da Relação de Guimarães de 12.02.2015 (Proc. 679/11.8TTVNF.P1.G1), e o Acórdão desta Relação de Évora de 23.02.2016 (Proc. 390/14.8TTSTB.E1), ambos disponíveis em www.dgsi.pt. No Supremo Tribunal de Justiça, vide o Acórdão de 13.10.2021 (Proc. 3574/17.3T8LRA.C1.S1), na mesma base de dados. [2] Neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.12.2017 (Proc. 2763/15.0T8VFX.L1.S1), igualmente na página da DGSI. [3] In O Acidente de Trabalho – O Acidente In Itinere, Coimbra Editora, 2013, págs. 232-234. [4] Loc. cit., págs. 240-246.