Sumário elaborado pela relatora:
I. Se o requerimento probatório no qual foi solicitada a notificação de terceiros para prestarem esclarecimentos e juntarem documentos que tinham na sua posse foi deferido pelo tribunal e, mais tarde, satisfeito pelos terceiros, ainda que em termos não favoráveis à parte requerente, deve indeferir-se novo requerimento probatório apresentado por esta, dirigido aos mesmos terceiros, no qual se repetem as questões anteriormente colocadas, dado que o juiz do processo deve recusar todos os atos impertinentes e injustificados e é proibida a prática de atos inúteis.
II. Deve ser indeferido um pedido de esclarecimentos à Ré, formulado pelo Autor, relacionado com materialidade alegada na petição inicial, que constitua, no fundo, uma forma encapotada de obter uma “confissão” de factos.
III. O artigo 429.º do CPC (“Documentos em poder da parte contrária”) pressupõe os seguintes requisitos cumulativos:
i. - a identificação do concreto documento cuja junção se requer;
ii. - a indicação de quais os factos que com o identificado documento se pretende provar;
iii. – que estejam em causa documentos que se encontrem em poder da parte contrária e que a própria parte não consiga obter.
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora1
I. Relatório
Na presente ação declarativa, com processo comum, que Tecniquitel – Sociedade de Equipamentos Técnicos, S.A. intentou contra AA, Safemax – Sociedade Unipessoal, Lda., BB e CC, foi proferido, em 18-11-2024, o seguinte despacho:
«Requerimento de 10-09-2024, ref. 10949181
Na sequência da junção aos autos das informações solicitadas à Corporação de Bombeiros de Local 1 e Corporação de Bombeiros de Local 2, vem a Autora Tecniquitel – Sociedade De Equipamentos Técnicos, S.A., requerer que “se oficie o Comando do Corpo de Bombeiros Voluntários do Local 1 para virem prestar a informação solicitada nas indicadas alíneas a) e b) do referido requerimento probatório, juntando os documentos comprovativos. 6. Devendo, caso não tenha havido processo concursal aberto para o efeito, juntar o comprovativo da consulta efetuada a Safemax para a aquisição dos referidos equipamento” e ainda que se “oficie a corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 2 para vir esclarecer a informação prestada ao Tribunal, nomeadamente: a) Quando é que foi efetuada a apresentação dos equipamentos pelo Sr. AA; b) Como é que foi feita a consulta ou o pedido de cotação dos referidos equipamentos e; c) Juntar aos autos cópia da consulta efetuada a Safemax para aquisição dos 13 ARICAS completos + 13 Cilindros de reserva realizada em 2022.”.
Ora, compulsada a informação prestada pela Corporação de Bombeiros de Local 1 de 19-04-2024, ref. 10596817 e a informação prestada pela Corporação de Bombeiros Voluntários Local 2 de 26-04-2024, ref. 10612450 responde cabalmente às questões formuladas pela Autora no seu requerimento probatório, mostrando-se o presente requerimento como uma mera discordância no que respeita ao teor das respostas fornecidas, o que decorre do facto de a Autora não formular novas questões, mas requerer que se aquelas entidades venham responder, novamente, às anteriores.
Contudo, vale relembrar que consta do rol de testemunhas da Autora os dirigentes das respetivas Corporações de Bombeiros, pelo que poderá, em sede de audiência de discussão e julgamento obter os demais esclarecimentos que se revelem oportunos.
Assim e perante o exposto, indefere-se o requerido.
Notifique.
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Réplica de 14-11-2023, ref. 10159525
Na réplica apresentada, vem a Autora requerer “1 – A notificação da 2.ª R. para juntar aos autos:
a) Cópia da consulta efetuada pela corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 2 para aquisição dos 13 ARICAS completos + 13 Cilindros de reserva realizada em 2022;
b) Informar o tipo de processo concursal aberto para aquisição do referido equipamento e, se for o caso, o respetivo caderno de encargos;
c) Juntar a proposta que apresentou;
d) Informar os autos sobre o número de consultas ou convites, com indicação das datas e valores, lhe foram formulados pela corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 2 para fornecimento de bens e equipamentos no ano de 2022;
e) Informar quantos procedimentos concursais lhe foram adjudicados pela corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 2, bem como os respetivos valores.
2 – A notificação da 2.ª R. para juntar aos autos:
a) a consulta enviada pela corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 1 para compra de aparelhos respiratórios
f) Informar o tipo de processo concursal aberto para aquisição do referido equipamento e, se for o caso, o respetivo caderno de encargos;
g) Juntar a proposta que apresentou à corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 1;
h) Informar os autos sobre o número de consultas ou convites, com indicação das datas e valores, formulados pela corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 1 para fornecimento de bens e equipamentos no ano de 2022;
i) Informar quantos procedimentos concursais lhe foram adjudicados pela corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 1, bem como os respetivos valores.”
Antes de mais, importará referir, desde logo, que os pontos 1, alínea b), d) e e) e ponto 2, alíneas f), h) e i) do requerido pela Autor são pedidos de informação e/ou esclarecimentos que pretende obter da Ré e não documentos.
Porém, os princípios gerais do processo civil aplicáveis subsidiariamente ao processo de trabalho, não permitem o deferimento de tal pretensão. Trata-se de um processo de partes, vigorando o princípio da igualdade de armas, o princípio do dispositivo, da preclusão e da autorresponsabilidade das partes.
Vigora, igualmente, o princípio do ónus da prova, previso no artigo 342.º do Código Civil “1. Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado. 2. A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita. 3. Em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos do direito.”
Não se mostra coerente com aqueles princípios a solicitação da Autora ao Tribunal de que notifique a Ré a vir informar o tipo de processo concursal aberto para aquisição do referido equipamento e, se for o caso, o respetivo caderno de encargos e o número de consultas ou convites, com indicação das datas e valores, formulados pela corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 1 para fornecimento de bens e equipamentos no ano de 2022 bem como procedimentos concursais lhe foram adjudicados pela corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 1, bem como os respetivos valores, pois que tal alegação é feita pela Autora, pelo que lhe compete asseverar-se da sua veracidade e correspondente prova. A Autora deduz uma pretensão, alegando factos praticados pela Ré e incumbe-lhe provar o por si alegado.
O artigo 429.º do Código de Processo Civil aduz que “Quando se pretenda fazer uso de documento em poder da parte contrária, o interessado requer que ela seja notificada para apresentar o documento dentro do prazo que for designado; no requerimento, a parte identifica quanto possível o documento e especifica os factos que com ele quer provar”.
A notificação da Ré para informar sobre os concretos pontos solicitados pela Autora configuraria uma espécie de “confissão” de factos encapotada, ao abrigo de uma notificação judicial, o que não é, de todo admissível.
Por outro lado, concretamente quanto ao pedido de junção de documentos per si (Cópia da consulta efetuada pela corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 2 para aquisição dos 13 ARICAS completos + 13 Cilindros de reserva realizada em 2022; Juntar a proposta que apresentou; a consulta enviada pela corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 1 para compra de aparelhos respiratórios e Juntar a proposta que apresentou à corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 1, importa dizer que o mecanismo do artigo 429.º do Código de Processo Civil não escusa o Autor do ónus de prova que sobre si recaí, apenas facilita nas situações em que não tem acesso àqueles documentos nem forma de o obter.
Regressando ao caso dos autos, a Autora teve outra forma de obtenção dos referidos documentos, nomeadamente através da notificação dos terceiros. Assim, já foi determinada a notificação das respetivas corporações de Bombeiros, tendo sido junta aos autos a documentação existente, não se mostrando justificada, devidamente, uma nova notificação para obtenção da mesma informação.
Assim, perante o exposto, indefere-se o requerido.
Notifique.»
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Inconformada, a Autora interpôs recurso, extraindo das suas alegações as seguintes conclusões:
«A.Os despachos recorridos violam o preceituado nos artigos 7.º, n.º 4, 417.º, n.º 1 e 429.º ex vi art.º 432.º todos do Código de Processo Civil, impedindo a Recorrente de legitimamente obter a informação e os documentos para prova da factualidade alegada na ação, mormente na petição inicial e na réplica/resposta à reconvenção.
B. Os despachos recorridos impõe à Recorrente o ónus de fazer prova dos factos por si alegados, mas nega-lhe a obtenção dos meios probatórios, quando tais elementos e/ou documentos estão na exclusiva posse da Recorrida e das corporações de bombeiros.
C. O ofício dirigido pela secretaria do Tribunal a quo aos Bombeiros Voluntários do Local 2 incorreu em lapso porquanto não solicitou a informação requerida pela Recorrente e admitida pelo Tribunal no douto despacho saneador.
D. Por lapso imputável à secretaria do Tribunal foi feita uma incorreta análise, interpretação e resposta pelos Bombeiros Voluntários do Local 2, os quais não juntaram os documentos solicitados pela Recorrente e admitidos pelo Tribunal a quo.
E. Não obstante, a resposta prestada pelos Bombeiros Voluntários do Local 2 é esquiva e objetivamente não dá resposta ao efetivamente requerido pela Recorrente e admitido pelo Tribunal.
F. A omissão do dever de apresentação de documentos e/ou prestação de esclarecimentos, não é suscetível de ser suprido pelo depoimento das testemunhas exaradas no rol, porquanto, por um lado, o emitente da resposta dos Bombeiros Voluntários do Local 2 não consta do rol de testemunhas e não pode esclarecer em audiência a sua resposta.
G. Por outro lado, o Tribunal a quo não tem como saber, antecipadamente, se as testemunhas vão comparecer em Tribunal, nem o que vão depor, sendo certo que, as testemunhas não têm memória de todas as aquisições realizadas, muito menos de consultas, faturas, datas e das compras efetuadas, sendo verosímil não lograrem responder com precisão sem a documentação de suporte que se requereu e não foi junta.
H. Da informação prestada pelo Presidente da Associação de Bombeiros Voluntários de Local 1, resulta que a consulta fora efetuada pelo Comando do Corpo de Bombeiros pelo que, salvo melhor opinião, devia ter sido esse Comando a responder às questões e/ou a fornecer a documentação, conforme requerido no requerimento de 10/09/2024.
I. Ao não admitir o referido requerimento probatório da Recorrente o Tribunal a quo laborou em erro e violou o preceituado nos artigos 429.º ex vi art.º 432.º do Código de Processo Civil.
J. Uma correta interpretação do preceituado nos artigos 7.º, n.º 4, 417.º, n.º 1 e 429.º ex vi art.º 432.º todos do Código de Processo Civil impunha que o Tribunal a quo admitisse o requerimento probatório da Recorrente exarado na peça processual de 10-09-2024, ref. 10949181.
K. Pelo que, deverá assim dar-se provimento ao presente recurso de apelação e determinar-se a anulação do despacho recorrido, substituindo-o por outro que admita o requerimento probatório da Recorrente, repetindo-se o ofício aos Bombeiros Voluntários do Local 2 (este com as questões corretas) e à Associação de Bombeiros Voluntários de Local 1.
L. Relativamente ao requerimento probatório da Recorrente exarado na réplica e/ou resposta à contestação/reconvenção, indeferido pelo Tribunal a quo, cumpre registar que também está ferido de ilegalidade por violação dos referidos normativos.
M. A junção dos documentos requeridos à Recorrida, é essencial para a descoberta da verdade, para a justa composição do litígio e prova dos factos carreados para a ação pela Recorrente, ao abrigo do artigo 429.º do Código de Processo Civil.
N. Incumbe ao Tribunal, por sua iniciativa ou a requerimento de qualquer das partes, requisitar informações, pareceres técnicos, plantas, fotografias, desenhos, objetos ou outros documentos necessários ao esclarecimento da verdade – ver artigo 436.º do Código de Processo Civil.
O. Pretendendo a Recorrente fazer uso de documento em poder da parte contrária e não havendo motivo de recusa legítima, deveria o Tribunal a quo determinar a notificação da Recorrida para prestar a informação e/ou apresentar os documentos essenciais à descoberta da verdade.
P. A notificação da Recorrida, para vir juntar documentos não constitui um ato anormal do processo, nem configura uma espécie de “confissão” de factos encapotada ao abrigo de uma notificação judicial.
Q. Se a Recorrida não responder e/ou não juntar documentos não há confissão e/ou admissão de factos, mas sim a aplicação do disposto no artigo 417.º do nº 2 do Código de Processo Civil, ou seja, o tribunal aprecia livremente o valor da recusa para efeitos probatórios.
R. A junção de documentos no processo, pelas partes e/ou por terceiros, a pedido do Tribunal ou das partes, pode ter o efeito de firmar ou infirmar factos com interesse para a boa decisão da causa e descoberta da verdade, caso contrário serão impertinentes e desentranhados do processo por não terem interesse para o objeto do processo.
S. A posição assumida pelo Tribunal a quo no despacho recorrido, levada ao limite, importa aceitar que as partes podem omitir factos relevantes para a decisão da causa ou praticar omissão grave do dever de cooperação, comportamentos considerados como litigância de má-fé nos termos do art.º 542.º do Código Processo Civil.
T. O art.º 429 do Código de Processo Civil é uma decorrência do dever de cooperação em geral e do dever de cooperação para a descoberta da verdade, consagrados nos art.ºs 7.º, 8.º e 417.º todos do Código Processo Civil pelo que, devia o Tribunal a quo ter deferido a pretensão da Recorrente e ter determinado a notificação aos Recorridos para junção dos documentos e da informação solicitada.
U. Os despachos judiciais do Tribunal a quo em crise ao indeferir a admissão e/ou o cumprimento dos requerimentos probatórios da Recorrente impede-a de produzir prova essencial à descoberta da verdade e viola os referidos deveres de cooperação e de colaboração, bem como, as regras dispostas nos artigos 7º, 8º 417.º, 429º a 437.º do Código de Processo Civil e, ainda, o princípio da descoberta da verdade material.
V. Devem os despachos recorridos ser revogados e substituídos por outro a deferir o solicitado pela Recorrente no requerimento de 10-09-2024 e na réplica de 14-11-2023.
Nestes termos e nos demais de direito deverão Vossas Excelências Desembargadores admitir o presente recurso, por provado, e anular as decisões recorridas substituindo-as por outra que admita os indicados requerimentos probatórios, fazendo-se assim acostumada Justiça.»
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Contra-alegaram os Réus, propugnando pela improcedência do recurso.
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A 1.ª instância admitiu o recurso como de apelação, com subida imediata, em separado, e com efeito meramente devolutivo.
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Recebido o apenso do recurso na Relação, foi aberta vista ao Ministério Público e emitido parecer em sentido favorável à parcial procedência do recurso.
Não foi oferecida resposta.
O recurso foi mantido nos seus precisos termos e, depois de elaborado projeto de acórdão, foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
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II. Objeto do Recurso
É consabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, com a ressalva da matéria de conhecimento oficioso (artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho).
Em função destas premissas, cumpre apreciar o acerto ou desacerto dos despachos recorridos, que não admitiram meios de prova requeridos pela Autora/Recorrente
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III. Matéria de Facto
A matéria de facto a atender é a que consta do relatório supra, para o qual remetemos, sem necessidade da sua repetição, bem como os demais elementos que constam dos autos que sejam relevantes para a apreciação da questão sub judice.
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IV. Enquadramento jurídico
Os despachos recorridos rejeitaram diligências de prova requeridas pela Recorrente.
Em sede de recurso, requer-se a sindicância de tais despachos, entendendo a Recorrente que os mesmos violam os artigos 7.º, 8.º, 417.º, 429.º a 437.º do Código de Processo Civil e, ainda, o princípio da descoberta da verdade material.
Apreciemos, pois.
Principiemos pelo despacho que indeferiu o requerido em 10-09-2024 (ref.ª 10949181).
Na petição inicial a ora Recorrente requereu, entre outra, a seguinte prova:
«II – Prova documental:
1 – Deverá ser oficiada a corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 2 para juntar aos autos:
a) Cópia da consulta efetuada a 2.ª R. para aquisição dos 13 ARICAS completos + 13 Cilindros de reserva realizada em 2022;
b) Informar o tipo de processo concursal aberto para aquisição do referido equipamento e, se for o caso, o respetivo caderno de encargos;
c) Juntar a proposta apresentada pela 2.ª R;
d) Juntar a proposta apresentada pela A. ou informar se a ora A. foi também consultada;
e) Informar os autos sobre o número de consultas ou convites, com indicação das datas e valores, foram formulados à 2.ª R. para fornecimento de bens e equipamentos no ano de 2022;
f) Informar quantos procedimentos concursais foram adjudicados à ora 2.ª R., bem como os respetivos valores.
2 - Deverá ser oficiada a corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 1, para juntar aos autos:
a) a consulta enviada a 2.ª R. para compra de aparelhos respiratórios
g) Informar o tipo de processo concursal aberto para aquisição do referido equipamento e, se for o caso, o respetivo caderno de encargos;
h) Juntar a proposta apresentada pela 2.ª R;
i) Juntar a proposta apresentada pela A. ou informar se a ora A. foi também consultada;
j) Informar os autos sobre o número de consultas ou convites, com indicação das datas e valores, formulados a 2.ª R. para fornecimento de bens e equipamentos no ano de 2022;
k) Informar quantos procedimentos concursais foram adjudicados à ora 2.ª R., bem como os respetivos valores.»
Em 15-03-2024, foi prolatado despacho que fixou assim o objeto do litígio:
«A presente ação visa aferir do direito da Autora a ser indemnizada pelos danos e prejuízos causados pelos Réus diante a alegada violação dos seus deveres de lealdade e boa-fé emergentes de relação laboral; e do direito dos Réus a serem indemnizados pela Autora por violação do seu direito ao bom nome e reputação profissional.»
No que concerne ao requerimento probatório supracitado decidiu-se:
«Oficie aos Bombeiros Voluntários do Local 2; aos Bombeiros Voluntários do Local 1
; (…) nos termos requeridos pela Autora. Prazo p/ resposta: 10 dias.»
Em cumprimento do determinado, foram enviados às referidas entidades, respetivamente, ofícios com o seguinte teor:
«Assunto: Informação
Por ordem da Mma Juiz deste Tribunal solicita-se que seja este Tribunal informado, no prazo de dez dias da seguinte informação:
a) A consulta enviada a Safemax- Sociedade Unipessoal, Lda, para compra de aparelhos respiratórios;
b) Informar o tipo de processo concursal aberto para aquisição do referido equipamento e, se for o caso, o respetivo caderno de encargos;
c) Juntar a proposta apresentada pela Safemax- Sociedade Unipessoal, Lda;
d) Juntar a proposta apresentada pela Autora ou informar se a ora Autora foi também consultada;
e) Informar os autos sobre o número de consultas ou convites, com indicação das datas e valores, formulados a Safemax - Sociedade Unipessoal, Lda., para fornecimento de bens e equipamentos no ano de 2022;
f) Informar quantos procedimentos concursais foram adjudicados à ora 2.ª R., bem como os respetivos valores.»
E,
«Assunto: Informação
Por ordem da Mma Juiz deste Tribunal solicita-se que seja prestada, a este Tribunal, no prazo de dez dias, a seguinte informação:
1) A consulta enviada a Safemax- Sociedade Unipessoal, Lda, para compra de aparelhos respiratórios;
2) Informar o tipo de processo concursal aberto para aquisição do referido equipamento e, se for o caso, o respetivo caderno de encargos;
3) Juntar a proposta apresentada pela Safemax- Sociedade Unipessoal, Lda,;
4) Juntar a proposta apresentada pela Autora ou informar se a ora Autora foi também consultada;
5) Informar os autos sobre o número de consultas ou convites, com indicação das datas e valores, formulados a 2.ª Ré para fornecimento de bens e equipamentos no ano de 2022;
6) Informar quantos procedimentos concursais foram adjudicados à ora 2.ª Ré, bem como os respetivos valores.»
Mostra-se evidente que as alíneas b) a f) do ofício remetido aos Bombeiros Voluntários do Local 2 – o primeiro que foi transcrito - corresponde com exatidão ao requerido na petição inicial.
Apenas a alínea a) não tem uma correspondência total, porque não indica especificamente o equipamento mencionado no aludido articulado - «13 ARICAS completos + 13 Cilindros de reserva realizada em 2022 » - e não se menciona a «cópia» da consulta.
Ora, esta última insuficiência é absolutamente irrelevante e a primeira desconformidade não tem consequências, como veremos, pela resposta que foi dada ao solicitado.
A resposta dos Bombeiros Voluntários do Local 2 foi:
«No seguimento do pedido de informação da Mma Juiz desse tribunal, temos a esclarecer o seguinte:
a. A aquisição dos aparelhos respiratórios à Safemax – Sociedade Unipessoal, Lda, foi efetuada após uma apresentação do produto feita de forma presencial, pelo comercial desta empresa Sr. AA;
b. Não existiu procedimento concursal nem caderno de encargos, apenas foi adquirido com base nas nossas necessidades e após apresentação feita pelo comercial;
c. Orçamento A9 2022/7 (em anexo);
d. Para este tipo de equipamento, não foi solicitada proposta à autora;
e. Não possuímos informação relativa ao número de consultas, no entanto pelo extrato de fornecedor conseguimos verificar que em 2022 foram feitas duas aquisições à empresa Safemax;
f. Conforme referenciado anteriormente não foi realizado nenhum concurso, no entanto anexa-se ao presente extrato de conta de fornecedor onde constam os valores despendidos em equipamentos até à presente data.»
Ou seja, infere-se desta resposta e dos anexos apresentados quais os equipamentos que foram adquiridos à 2.ª Ré e os seus valores, o número de aquisições, a inexistência de procedimento concursal e de caderno de encargos, o modo como o produto foi apresentado e, ainda, que não foi solicitada qualquer proposta à autora, nem existe informação sobre o número de consultas.
Todas as questões apresentadas foram, pois, respondidas.
Quanto ao ofício enviado aos Bombeiros Voluntários de Local 1, o solicitado está absolutamente conforme com o indicado na petição inicial.
E a resposta a tal solicitação foi:
«Em resposta ao vosso ofício datado de 26-03-2024, cumpre-nos informar o seguinte:
1) A consulta foi efetuada pelo Comando do Corpo de Bombeiros que estava autorizado pela direção a fazer as consultas que entendesse necessárias para aquisição dos equipamentos.
Devido à especificidade deste tipo de equipamentos a direção não intervém na avaliação técnica e operacional do equipamento e como tal desconhecemos a data da pressuposta consulta enviada à SAFEMAX.
2) Os estatutos da A.H.B.V.R.M. não obrigam, em momento algum, abrir concursos para aquisição de bens ou equipamentos.
3) Anexamos documento solicitado.
4) Não recebemos proposta nem nunca consultámos a autora, até porque não tínhamos qualquer obrigação do fazer. Aliás a autora, em situação anterior, na qual foi nossa fornecedora, mesmo não havendo "processo concursal", não mostrou qualquer tipo de problema em avançar com o negócio.
5) A direção desconhece a existência de eventuais contactos que tenham sido efetuados em 2022 sobre a este assunto.
6) Apenas foi concretizado o negócio acima referido, pelo valor constante do documento em anexo.»
O documento anexado é o orçamento da 2.ª Ré.
Também esta resposta, a nosso ver, satisfaz o esclarecimento das questões solicitadas: a consulta efetuada pelo Comando do Corpo de Bombeiros, a inexistência de procedimento concursal (e, consequentemente, infere-se, de caderno de encargos), o orçamento apresentado pela 2.ª Ré, o único negócio efetuado e os valores envolvidos, a inexistência de propostas e de consultas à Autora.
A Recorrente foi devidamente notificada das respostas obtidas.
Na sequência, apresentou o requerimento que foi objeto de apreciação do despacho recorrido, no qual solicita:
a) - «que se oficie a corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 2 para vir esclarecer a informação prestada ao Tribunal, nomeadamente:
a) Quando é que foi efetuada a apresentação dos equipamentos pelo Sr. AA;
b) Como é que foi feita a consulta ou o pedido de cotação dos referidos equipamentos e;
c) Juntar aos autos cópia da consulta efetuada a Safemax para aquisição dos 13 ARICAS completos + 13 Cilindros de reserva realizada em 2022.
b) - «que se oficie o Comando do Corpo de Bombeiros Voluntários do Local 1 para virem prestar a informação solicitada nas indicadas alíneas a) e b) do referido requerimento probatório, juntando os documentos comprovativos.
6. Devendo, caso não tenha havido processo concursal aberto para o efeito, juntar o comprovativo da consulta efetuada a Safemax para a aquisição dos referidos equipamentos.»
Analisemos tais solicitações.
Em relação ao demandado quanto aos Bombeiros do Local 2, constata-se, tal como constatou o tribunal a quo, que o requerido nas alíneas b) e c) é uma repetição do anteriormente requerido e que já se mostra respondido. Aliás, pela informação obtida, a aquisição dos aparelhos respiratórios não foi feita através de qualquer consulta formalizada por escrito, mas através de uma apresentação presencial.
No que respeita ao pedido formulado na alínea a), a Recorrente não explica a utilidade de tal esclarecimento no contexto da matéria fáctica alegada.
Ademais, como se refere na decisão recorrida, o rol de testemunhas apresentado pela Recorrente inclui dirigentes da referida Corporação de Bombeiros, pelo que o esclarecimento em causa, se justificado, sempre poderá ser solicitado em julgamento.
Destarte, considerando a repetição anotada e a falta de justificação para o novo esclarecimento, e considerando ainda o disposto no artigo 130.º do Código de Processo Civil, que prescreve que o tribunal está proibido de realizar atos inúteis, bem andou o tribunal a quo ao negar o solicitado quanto aos Bombeiros do Bombarral.
No que respeita ao requerido em relação à Associação de Bombeiros de Local 1, aplica-se-lhe exatamente a mesma apreciação.
As questões que a Recorrente insiste em oficiar àquela entidade são idênticas às que já foram pedidas e respondidas.
A duplicação de atos integra-se na proibição do suprarreferido artigo 130.º, pelo que, também nesta parte, se sufraga a decisão recorrida.
A acrescentar, que o decidido não viola as normas indicadas pela Recorrente e, muito menos, o princípio da descoberta da verdade material.
As associações de bombeiros identificadas cooperaram com o tribunal, respondendo ao que lhes foi solicitado, e entregaram os documentos relacionados que tinham na sua posse.
E ao juiz do processo, de harmonia com o artigo 6.º do Código de Processo Civil subsidiariamente aplicável ao processo laboral, compete recusar todos os atos impertinentes ou injustificados.
Em suma, a decisão proferida sobre o requerimento de 10-09-2024 (ref.ª 10949181) não merece qualquer reparo.
Chegou o momento de apreciar o despacho que incidiu sobre meios probatórios apresentados na réplica de 14-11-2023 (ref.ª 10159525).
Tal despacho foi transcrito no relatório supra.
E desde já adiantamos que concordamos, absolutamente, com a sua fundamentação e consequente decisão.
Efetivamente, nos pontos 1, alínea b), d) e e) e ponto 2, alíneas f), h) e i) não se requer a junção de documentos que estivessem na posse dos Réus – artigo 429.º do Código de Processo Civil- , mas, antes, pedidos de esclarecimento relacionados com a matéria alegada na petição inicial.
Ora, ainda que em processo laboral vigorem o princípio de cooperação das partes e o dever de boa fé processual – por aplicação subsidiária dos artigos 7.º, 8.º e 417.º do Código de Processo Civil – tal princípio não pode ser uma via indireta para contornar as regras do ónus probatório.
O princípio e o dever mencionados estão relacionados com a obtenção das necessárias condições para que o tribunal, sem dilações inúteis, possa proferir uma decisão no menor período de tempo compatível com as exigências do processo – cf. Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil – Conceito e princípios gerais à luz do novo código, Coimbra Editora, 3.ª edição, pág. 186 - e os concretos pedidos de esclarecimentos apresentados, como lucidamente analisou o tribunal a quo, mais não são do que uma forma encapotada de obter uma “confissão” da 2.ª Ré sobre materialidade alegada na petição inicial, cuja prova compete à Recorrente, o que é legalmente inadmissível.
Ademais, a Recorrente teve oportunidade de pedir esses esclarecimentos a terceiros, tem prova testemunhal que arrolou e, inclusive, foi deferido o depoimento de parte de todos os Réus requerido na petição inicial, pelo que inexiste a mínima justificação para o deferimento dos solicitados esclarecimentos.
Enfim, resta-nos confirmar, nesta parte, o despacho recorrido.
Sobra, assim, o solicitado no ponto 1, alínea a) e c) e ponto 2, alíneas a) e g), em que é formulado um pedido de notificação da 2.ª Ré para juntar documentos.
Designadamente:
- a cópia da consulta efetuada pela corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 2 para aquisição dos 13 ARICAS completos + 13 Cilindros de reserva realizada em 2022 e a proposta apresentada;
- a consulta enviada pela corporação dos Bombeiros Voluntários do Local 1 para compra de aparelhos respiratórios e a proposta apresentada.
Dispõe o artigo 429.º do Código de Processo Civil:
«1 - Quando se pretenda fazer uso de documento em poder da parte contrária, o interessado requer que ela seja notificada para apresentar o documento dentro do prazo que for designado; no requerimento, a parte identifica quanto possível o documento e especifica os factos que com ele quer provar.
2 - Se os factos que a parte pretende provar tiverem interesse para a decisão da causa, é ordenada a notificação.»
Resulta do teor do artigo que o requerimento formulado com vista à notificação da parte contrária para junção de documento que esteja na sua posse tem de observar os seguintes requisitos:
- a identificação do concreto documento cuja junção se requer;
- a indicação de quais os factos que com o identificado documento se pretende provar;
- que estejam em causa documentos que se encontrem em poder da parte contrária e que a própria parte não consiga obter2 – cf. Acórdão da Relação de Coimbra de 21-04-2015 (Proc. n.º 124/14.1T8BFND-A.C1.
Ora, no caso que se aprecia, a Recorrente pediu os mesmos documentos a terceiros, designadamente aos Bombeiros do Local 2 e de Local 1, o que foi deferido pelo tribunal a quo. As respostas obtidas negaram a existência dos documentos.
A recorrente nada refere, no requerimento apresentado na réplica, que leve a concluir, ou pelo menos a criar uma dúvida razoável, sobre a existência dos documentos na posse da 2.ª Ré.
Deste modo, afigura-se-nos que não há qualquer razão atendível para ordenar a notificação da 2.º Ré para a pretendida junção de documentos.
Pelo exposto, sufragamos, também nesta parte, a decisão recorrida.
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Concluindo, o recurso improcede na totalidade.
As custas do recurso deverão ser suportadas pela Recorrente – artigo 527.º do Código de Processo Civil.
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V. Decisão
Nestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso improcedente e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida.
Custas do recurso a suportar pela Recorrente.
Notifique.
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Évora, 8 de maio de 2025
Paula do Paço
Filipe Aveiro Marques
Emília Ramos Costa
1. Relatora: Paula do Paço; 1.º Adjunto: Filipe Aveiro Marques; 2.ª Adjunta: Emília Ramos Costa↩︎
2. Realce e sublinhado da nossa responsabilidade.↩︎