Sumário1:
É extemporâneo o requerimento de intervenção principal provocada deduzido nos termos dos artigos 316.º n.º 2 e 39.º do CPC, após ter sido designada data para audiência prévia.
Juízo Central Cível de Setúbal – Juiz 2
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Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora,
I.RELATÓRIO.
Em 16.09.2022 AA propôs contra BB e CC, ação declarativa de condenação sob a forma comum, pedindo que:
A) Se declare a Autora possuidora, dona e legítima proprietária do prédio misto denominado “Herdade”, situado no concelho de ..., inscrito na matriz predial rústica sob o artigo matricial n.º 2, das secções R-R1-R3 e urbanos n.º 247, n.º 248, n.º 249, n.º 338, n.º 340, n.º 342, n.º 344 e n.º 346 da ... (antiga freguesia de ...) e ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob a ficha n.º 2480/20080417, com descrição em livro número 91, N.º 1 sp., do concelho de ..., registado e inscrito a favor da Autora pela apresentação n.º 1 de 1974/04/16.
B) Condene os Réus a reconhecerem a Autora como possuidora, dona e legítima proprietária da casa n.º 8 sub judice, que faz parte ou é parte integrante do prédio misto denominado Herdade, identificado na alínea anterior;
C) Condene os Réus a restituírem e entregar de imediato à Autora, livre e devoluta de pessoas, coisas e bens e de ónus ou encargos, a casa n.º 8 sub judice, que faz parte do prédio misto denominado “Herdade”, identificado na alínea A) deste pedido;
D) Condene os Réus a abster-se de praticar quaisquer atos ou condutas que possam lesar ou ameaçar lesar ou perturbar o direito de propriedade da Autora sobre a casa n.º 8 sub judice e do respetivo prédio misto n.º 2480/20080417, da qual a mesma faz parte, ou de o violar, designadamente abstendo-se de ocuparem qualquer parte do referido prédio, abstendo-se de fruir, alienar, onerar ou transformar diretamente ou por interposta pessoa ou de qualquer atitude que possa pôr em causa a posse e o domínio decorrente do direito de propriedade da Autora sobre todo prédio identificado na alínea A) deste pedido;
E) Condene os Réus no pagamento imediato da quantia de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros), acrescida dos juros legais vencidos e vincendos, por cada dia de ocupação e de retardamento na entrega da casa n.º 8 sub judice, livre e devoluta de pessoas, de coisas e bens e de ónus ou encargos, a contar desde o dia 15 de julho de 2022 ou, subsidiariamente, a contar da data da citação dos Réus para a presente ação, até à data da cessação da lesão do direito de propriedade da Autora, mediante a efetiva desocupação e restituição à Autora a casa n.º 8 sub judice, livre e devoluta de pessoas, de coisas e bens e de ónus ou encargos;
F) Condene os Réus no pagamento da indemnização no montante de € 4.000,00 pelos prejuízos apurados até ao presente, sendo esta quantia acrescida dos juros de mora à taxa de juro legal, a contar a partir da citação dos Réus até ao efetivo pagamento da mesma;
G) Condene os Réus a pagar indemnizações à Autora, pelos danos já causados e ainda pelos danos emergentes, prejuízos diretos e indiretos, ganhos cessantes, lucros cessantes e danos futuros, que se venham a apurar, nomeadamente com perdas de oportunidades de negócios de venda deste seu prédio e, ainda, pelos danos morais ou de ordem não material que também se venham apurar, sendo a indemnização, pelos danos patrimoniais e morais, a atualizar desde a citação dos Réus até à sentença e execução da mesma, à taxa legal, e ainda a condenação em indemnização pelos danos que, entretanto, se venham a apurar e culposamente causados ou decorrentes da atuação dos Réus, relegando-se o seu apuramento para execução de sentença;
H) Condene os Réus, em multa condigna, que se deixa ao prudente juízo do Digníssimo Tribunal, contudo, não devendo ser inferior a € 1.000,00 e numa indemnização nos termos das als. a) e b) do n.º 1 do 543.º, do C.P.C., com reembolso das despesas a que a má fé dos Réus obrigou a Autora a suportar, como sejam as respetivas taxas, preparos para despesas inerentes e decorrentes deste processo, incluindo os honorários do mandatário e no reembolso dessas despesas e restantes prejuízos sofridos pela Autora como consequência direta ou indireta da má fé, cujo valor está estimado em, pelo menos, € 2.000,00-
Alegou para tanto, em síntese, que é proprietária do imóvel acima referido, incluindo a casa nº 8 que os RR. ocupam, apesar de já terem sido interpelados para dela saírem e saberem que não têm título que legitime tal ocupação, tendo aí permanecido por mera tolerância da A., que deixou de se verificar por esta pretender vender o imóvel, sendo que a ocupação pelos RR. está a causar prejuízo avultado à A., além do mais, devido à dificuldade criada com tal ocupação para a concretização do negócio de venda da propriedade por parte da A.
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Citados, os Réus vieram defender-se por exceção, invocando a sua ilegitimidade passiva, alegando que não são eles, mas sim a Sociedade DD, Unipessoal, Lda., que está a ocupar a casa nº 8 da Herdade, servindo o imóvel em causa de panificadora, padaria e forno da mencionada Sociedade, sendo nesse imóvel que a referida Sociedade exerce a sua atividade, não passando os RR. de meros trabalhadores da Sociedade proprietária da panificadora, que tem as suas instalações e labora no prédio “casa 8”, não tendo os R.R. a posse do imóvel em causa.
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Por requerimento de 10.02.2023, a Autora respondeu pugnando pela improcedência da exceção de ilegitimidade e reiterou os pedidos formulados na petição inicial.
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Em 08.05.2023 teve lugar a audiência prévia, no âmbito da qual foi proferido despacho saneador em que a exceção de ilegitimidade foi julgada improcedente, foi identificado o objeto do litigio e selecionados os temas da prova, admitidos os meios de prova requeridos e designada data para a realização da audiência final.
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Veio então a Autora, por requerimento de 25.03.2023 requerer a intervenção principal da sociedade DD, UNIPESSOAL, LDA., alegando que os Réus vieram trazer ao conhecimento dos autos que, “…quem está na posse da casa nº 8, objeto do presente litigo, é a Sociedade DD, Unipessoal, Lda.” (cfr. artigo 5º da contestação) e que os Réus são meros trabalhadores da dita sociedade, vindo agora a verificar, pela junção da certidão atualizada do registo daquela sociedade, que a Ré é a única sócia e gerente da sociedade, pelo que a sociedade tem “um interesse igual” ao dos Réus para estar em juízo.
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Os Réus deduziram oposição a tal requerimento para intervenção principal, pugnando pela sua inadmissibilidade.
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Por despacho de 28.06.2023 foi o requerimento de intervenção principal indeferido.
É o seguinte o teor de tal despacho:
“Veio a A. AA, agora requerer a intervenção principal da sociedade DD, UNIPESSOAL, LDA, alegando que os RR. vieram trazer ao conhecimento dos autos que, “…quem está na posse da casa nº 8, objeto do presente litigo, é a Sociedade DD, Unipessoal, Lda.” (cfr. artigo 5º da contestação) e que os RR. são meros trabalhadores da dita sociedade, vindo agora a verificar, pela junção da certidão atualizada do registo daquela sociedade, que a Ré é a única sócia e gerente da sociedade, pelo que a sociedade tem “um interesse igual” ao dos RR. para estar em juízo.
Os RR. já vieram deduzir oposição a tal requerimento para intervenção principal, pugnando pela sua inadmissibilidade.
Nos termos do disposto no art.º 316º nº 1 Código de Processo Civil:
“Ocorrendo a preterição de litisconsórcio necessário, qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com legitimidade para intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária”.
Dispõe o artº 311º do Código de Processo Civil que: “Estando pendente causa entre duas ou mais pessoas, pode nela intervir como parte principal aquele que, em relação ao seu objeto, tiver um interesse igual ao do autor ou do réu, nos termos dos artigos 32º, 33º e 34º.”
Prescreve o artigo 312º do C.P.C. que “O interveniente principal faz valer um direito próprio, paralelo ao do autor ou do réu (...)”.
Porém, como resulta claramente do disposto no artº 318º do CPC, “1 - O chamamento para intervenção só pode ser requerido:
a) No caso de ocorrer preterição do litisconsórcio necessário, até ao termo da fase dos articulados, sem prejuízo do disposto no artigo 261.º;
b) Nas situações previstas no n.º 2 do artigo 316.º, até ao termo da fase dos articulados;
c) Nos casos previstos no n.º 3 do artigo 316.º e no artigo anterior, na contestação ou, não pretendendo o réu contestar, em requerimento apresentado no prazo de que dispõe para o efeito.”
Nenhuma destas situações ocorre no caso dos autos, nem o disposto no artº 261º do CPC, tem aqui aplicação, já que não foi proferida a decisão a que aquele artigo se refere, tendo a fase dos articulados já terminado há muito e até já foi realizada a audiência prévia e marcada data para a realização da audiência final e, além disso, nem sequer existe qualquer superveniência no conhecimento pela A. da alegada ocupação pela sociedade ora chamada do imóvel em causa nos autos, já que tal situação foi invocada desde logo na contestação dos RR., há mais de sete meses.
Assim sendo, sem necessidade de outras considerações, não se admite o requerido chamamento para intervenção principal da sociedade DD, Unipessoal, Lda., por ser o mesmo manifestamente extemporâneo.
Custas do incidente a cargo da A.
Notifique.
Set.”
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Inconformada, recorreu a Autora, alegando e apresentado a seguinte síntese conclusiva:
“1.º FUNDAMENTO: A correta e adequada interpretação das normas dos art.º 261.º, 318.º n.º 1, al. a), 6.º, 7.º, 33.º n.º 2 e 3 e 547.º do CPC para a revogação da decisão recorrida para que seja substituída por outra que admita a intervenção principal provocada de DD Unipessoal, Ld.ª, para seja obtida decisão que produza o seu efeito útil e normal.
A) Este recurso é interposto da decisão, de 28.06.2023, na qual o Digníssimo Tribunal a quo não aplicou corretamente o Direito, designadamente as normas dos art.ºs 33.º n.º 2 e 3, 261.º, 318.º n.º 1 al. a), 6.º, 7.º e 547.º do CPC, ao não admitir a intervenção principal provocada da sociedade DD Unipessoal, Ld.ª, que a Autora requereu oportuna e atempadamente;
B) A intervenção principal provocada pode ser requerida mesmo antes de ser proferida a decisão que julgue ilegítima qualquer das partes, designadamente porque a norma do n.º 1 do art.º 261.º do CPC apenas indica o último dia do prazo, para requerer a intervenção;
C) A norma do n.º 1 do art.º 261.º do CPC, ao estabelecer «1. Até ao trânsito em julgado da decisão…», apenas estabelece o prazo limite de 30 dias para apresentar o requerimento para chamar a pessoa a intervir, nos termos dos art.º 316.º e seguintes do CPC, ou seja, apenas indica o último dia do prazo, o qual é um prazo ad quem;
D) Nos presentes autos ainda não foi proferida qualquer decisão que declare a ilegitimidade de qualquer das partes;
E) No sentido de que a Autora pode requerer a intervenção provocada, antes da prolação da decisão que julgue ilegitimidade, entre outros, o douto acórdão, de 10.01.2002, do Supremo Tribunal de Justiça, e os acórdãos de 05.04.2011, 15.12.2016 e de 03.12.2020, da Relação de Guimarães;
F) Após a fase dos articulados e antes da decisão que declare a ilegitimidade, sendo o incidente de intervenção provocada deduzido pela Autora, é ainda possível o chamamento, nos termos conjugados dos art.ºs 318.º n.º 1. al. a) parte final e 261.º n.º 1 parte final, ambos do CPC, à luz da interpretação sistemática e teleológica de tais preceitos e tendo em conta o princípio da economia processual, tal como doutamente conclui o acórdão de 03.12.2020 da Relação de Guimarães;
G) Conjugados, articulados e adequadamente interpretados os art.ºs 318.º n.º 1. al. a) parte final e 261.º n.º 1 possibilitam o chamamento após esses momentos e antes da decisão quanto à ilegitimidade;
H) Na adequada interpretação e aplicação da norma do n.º 1 do art.º 261.º do CPC com a devida interpretação enunciativa, é fundamental o argumento a maioria, ad minus, ou seja, o que é válido para o mais, deve necessariamente prevalecer para o menos, isto é, «quem pode o mais pode o menos.», por maioria de razão ou a fortiori:
– pode a Autora chamar essa pessoa a intervir, Antes da prolação da decisão que julgue ilegítima alguma das partes, por não estar em juízo determinada pessoa e antes do trânsito em julgado dessa decisão;
I) Seria contraditório admitir-se a regularização mesmo depois de transitar em julgado da decisão que ponha termo ao processo [n.º 2 do artigo 261.º que permite o mais ] e não admitir a intervenção como modo de impedir a declaração de ilegitimidade [ou seja, antes da declaração de ilegitimidade, assim, permitindo o menos ], nem tal se compreenderia face aos princípios da economia processual, cooperação e prevalência da verdade material, como mui doutamente clarifica o acórdão, de 10.01.2002, do Supremo Tribunal de Justiça;
J) O n.º 1 do 261.º do CPC consagra uma exceção, para assegurar a legitimidade das partes, pelo que permite intervenção provocada nos termos do art.º 318.º 1. al a) do CPC, tal como a Autora requereu;
K) O art.º 318.º nº 1, a) parte final, do CPC contém uma exceção à regra de que o incidente tem de ser deduzido até ao termo da fase dos articulados, permitindo ainda o chamamento nas situações previstas no art.º 261.º do CPC, como douta e fundamentadamente sublinha o acórdão de 03.12.2020 do Tribunal da Relação de Guimarães;
L) O n.º 1 do art.º 261.º do CPC, tem de ser interpretado no sentido de possibilitar o chamamento após a fase dos articulados e antes da decisão quanto à legitimidade, quando o incidente é deduzido pela Autora, como sucede no caso sub judice;
M) In casu verifica-se preterição do litisconsórcio necessário o qual também resulta dos termos em que a Meritíssima identificou o objeto do litígio e enunciou os temas de prova que envolvem diretamente a sociedade DD Unipessoal, Ld.ª nesta mesma e única relação jurídica controvertida, em causa nesta única e mesma ação;
N) No cumprimento do dever de gestão processual e ou da economia processual, para a boa decisão da causa o Tribunal a quo, deveria ter convidado as partes a requererem a intervenção principal, até porque a própria Meritíssima Juíza, na audiência prévia, de 08.05.2023, sustentou que nesta ação é controvertido quem está a ocupar a casa n.º 8 sub judice: os Réus e ou interveniente sociedade DD, Unipessoal, Ld.ª?;
O) A certidão superveniente, junta aos autos em 12.05.2023, prova que existe uma outra pessoa a sociedade DD, Unipessoal, Ld.ª, na relação jurídica controvertida, a qual é uma terceira pessoa, que não é uma parte, que não está em juízo neste processo e deveria estar por via da intervenção principal provocada oportunamente requerida pela Apelante;
P) Neste caso há uma única relação material controvertida e há preterição do litisconsórcio necessário, pelo que, em termos substanciais ou materiais e processualmente, é necessário admitir a intervenção principal provocada oportunamente requerida pela Autora, para que seja assegurada uma tutela jurisdicional efetiva, com a devida economia processual para que este seja um processo justo em que possa vir a ser obtida uma decisão que produza o seu efeito útil e normal;
Q) Perante a ratio das normas dos art.ºs 6.º, 7.º, 33.º n.º 2 e 3, 261.º, 318.º n.º 1 al. a) e 547.º do CPC, em face dos termos do processo, o Tribunal a quo antes de avançar para marcação da audiência de julgamento (agendada para o dia 26.09.2023), deveria no exercício do dever de gestão processual, ter adotado previamente, mecanismos de simplificação e agilização processual ou de economia processual para assegurar um processo eficaz para garantir a composição do litígio em prazo razoável, designadamente impedindo que neste processo venha a final ser proferida sentença meramente formal, com a declaração de absolvição dos Réus por ilegitimidade por preterição da legitimidade necessária;
R) O instituto do litisconsórcio necessário visa evitar decisões inconciliáveis
sob o ponto de vista prático e, consequentemente, se obtenha segurança, certeza, eficácia e unidade na decisão de situações jurídicas a decidir para que, de facto e do ponto de vista prático, a decisão produza o seu efeito útil normal em conformidade com os princípios da economia processual e da adequação formal;
S) O litisconsórcio necessário é imposto pela lei e pelos princípios supra invocados, no sentido da obtenção do efeito útil normal da sentença a proferir a final pelo Tribunal, como resulta da letra e do ratio legis do art.º 33.º do CPC, pelo que, tendo em conta todo o processado, em especial os despachos de 08.05.2023 e os novos factos decorrentes da certidão permanente, de 11.05.2023, da referida sociedade, junta aos autos em 12.05.2023 em devido tempo (25.05.2023) a Autora requereu a intervenção principal provocada da sociedade DDUnipessoal, Ld.ª;
T) A intervenção principal provocada da sociedade DDUnipessoal, Ld.ª, foi requerida atempada e oportunamente e a sua admissão é essencial até porque o Digníssimo Tribunal a quo na audiência prévia e nos despachos de 08.05.2023, reconheceu que existe um litisconsórcio necessário porque a relação controvertida diz respeito diretamente à interveniente sociedade DD, Unipessoal, Ld.ª;
U) Em 25.05.2023, a Autora requereu oportuna e atempada a intervenção principal provocada da DD Unipessoal, Ld.ª, como resulta do processado e da letra e ratio legis do n.º 1 do art.º 261.º do CPC interpretado e aplicado corretamente em conexão e articulação com o disposto nos art.ºs 6.º, 7.º, 33.º n.º 2 e 3, 318.º n.º 1 al. a) e 547.º todos do CPC.;
V) Em 25.05.2023 a Autora deduziu, por requerimento simples, atempada e oportunamente a intervenção principal provocada da sociedade DD Unipessoal, Ld.ª, para que neste processo venha a ser proferida uma decisão que produza o seu efeito útil e normal: em termos práticos regule definitivamente este caso ou situação concreta da vida real;
W) A Autora no requerimento de intervenção principal, alertou que o motivo da dedução do chamamento foi designadamente o de impedir a declaração de ilegitimidade para que este seja um processo eficaz e, que, atento o dever de gestão processual seja neste processo jáassegurada uma tutela jurisdicional efetiva e seja proferida decisão de acordo com a realidade dos factos que resolva definitivamente o litígio mediante a prolação de uma decisão que produza o seu efeito útil normal;
X) Só com a intervenção de todos os interessados, incluindo a referida sociedade chamada intervir, é que fica acautelado que a decisão a obter produza o efeito útil normal, sob pena de não se compor definitivamente o litígio e não ser possível obter a unidade da decisão, nem a sentença final produzir o seu efeito útil normal;
Y) Não admitir a intervenção principal da sociedade DD Unipessoal, Ld.ª além de “abrir caminho”, criar condições para a prolação de uma sentença que se antevê, que não produzirá o seu efeito útil e normal em termos práticos, não resolve definitivamente o litígio com unidade de decisão, porque não atinge todos os interessados na decisão, podendo vir a ser posta em causa em processo e decisão posterior e , entretanto, envolverá a prática de atos inúteis, numa clara violação dever de gestão processual e da economia processual os quais visam um processo eficaz para garantir a composição do litígio em prazo razoável com uma tutela jurisdicional efetiva;
Z) A decisão recorrida violou, por deficiente, desadequada e ou errada interpretação e aplicação o disposto nas normas dos art.ºs 6.º, 7.º, 33.º n.º 2 e 3, 261.º n.º 1, 318.º n.º 1, al. a) e 547.º todos do CPC, pelo que, deve ser revogada a decisão recorrida e substituída por outra que julgue tempestiva a dedução do incidente de intervenção principal provocada, devendo os autos prosseguir em conformidade.
2.º FUNDAMENTO: A decisão recorrida incorreu em diversos erros de interpretação e aplicação do direito, designadamente do n.º 1 do art.º 261.º do CPC e por violação do dever de gestão processual e da economia processual da cooperação, da adequação formal, para que seja proferida decisão que produza o seu efeito útile normal.
A) O Tribunal a quo, com a decisão recorrida, violou o dever de gestão processual e da economia processual da cooperação, da adequação formal, os quais devidamente interpretados e aplicados com referência ou em coerência com todo sistema ou ordenamento jurídico, apontam no sentido da admissão da intervenção principal provocada da sociedade DD Unipessoal, Ld.ª: tal como deveria ter sido admitida ab initio, no despacho proferido em 28.06.2023 – para impedir a declaração de ilegitimidade, com vista a que sentença final produza o seu efeito útil e normal;
B) O Tribunal a quo, com a decisão recorrida, não cumpriu o dever de gestão processual e da economia processual limitou-se a prosseguir com o processo em que se antevê, que não é eficaz e não é justoque, envolverá a prática de atos inúteis – com o inerente desperdício de meios e recursos humanos que já são escassos no nosso sistema judiciário, para a final, vir a ser proferida uma sentença com uma decisão meramente formal de absolvição da instância por ilegitimidade, o que além do desperdício de meios e recursos humanos, se traduzirá em consequentes custos para a Autora e para o Estado, sobrecarregando a Justiça, o Digníssimo Tribunal a quo, com um processo que, nesta fase, é ineficaz e injusto;
C) O Tribunal a quo deveria agir e decidir em conformidade com os princípios da defesa, da tutela jurisdicional efetiva, da Justiça material – não meramente formal – e da economia processual, da boa gestão processual e ainda da proporcionalidade, da proibição do excesso, aos quais está subjacente o princípio de evitar a sujeição das pessoas a julgamento em que, se antevê, que se perspetiva que serão desnecessários;
D) A decisão recorrida ao não admitir a intervenção principal provocada e oportunamente requerida de DD Unipessoal, Ld.ª, inquina o processo, tornando-o ineficaz e injusto no qual certamente serão praticados atos inúteis – o que está vedado ao Tribunal, como decorrência dos mais elementares princípios de Direito e de Justiça e ainda pelo disposto no art.º 130.º do CPC;
E) O Tribunal a quo não cumpriu o seu o dever de gestão processual ao não adotar mecanismos de simplificação agilização processual e de economia processual e de cooperação para assegurar a tutela jurisdicional efetiva mediante a admissão da intervenção principal provocada da sociedade DD Unipessoal, Ld.ª, oportuna e atempadamente requerida para que a decisão a proferir resolva definitivamente o litígio com uma decisão que produza o seu efeito útil normal, em termos práticos e ou materialmente regule definitivamente o caso sub judice.
3.º FUNDAMENTO: O Tribunal a quo com a decisão recorrida violou o primado da substância sobre a forma, como garantia de um processo eficaz e justo, para que seja proferida decisão que produza o seu efeito útil e normal
A) A doutrina e a melhor jurisprudência defendem o primado da substância sobre a forma, como garantia de um processo eficaz e justo para que no mesmo seja proferida uma decisão que produza o seu efeito útil e normal;
B) Pelo menos, desde o Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de dezembro que o legislador dá particular relevância ao princípio da economia processual como princípio orientador ou norma interpretativa do art.º 261.º, que permite a regularização da instância, no caso de absolvição por preterição do litisconsórcio necessário;
C) O dever de gestão processual e o princípio da economia processual impõe a interpretação que a Autora pode chamar a referida sociedade a intervir, mesmo antes da prolação da decisão que julgue ilegítima alguma das partes, a fim de evitar a prática de atos inúteis e para assegurar um processo eficaz e justo;
D) As normas do n.º 1 do art.º 261.º e do 318.º n.º 1 al. a) têm de ser interpretadas em articulação e conexão com os art.ºs 6.º, 7.º, 33.º do CPC e com a economia processual e dever de gestão processual para assegurar um processo eficaz e justo, para que, seja proferida decisão que produza o seu efeito útil e normal, que concretamente, materialmente regule definitivamente esta situação concreta tudo com respeito com o princípio da integridade na aplicação do direito, no nosso sistema jurídico, consagrado no art.º 9.º do Código Civil.
4.º FUNDAMENTO: A decisão recorrida face aos direitos fundamentais maxime o direito à tutela jurisdicional efetiva incorreu em erros de interpretação e aplicação do direito, designadamente do n.º 1 do art.º 261.º do CPC e art. 20.º n.º 1 e 5 da Constituição, que foi posto em causa, em termos constitucionalmente censuráveis ao não admitir a intervenção principal provocada oportuna e atempada requerida, para que seja proferida decisão que produza o seu efeito útil e normal.
A) A ratio decidendi está sujeita à vinculação aos direitos fundamentais, como proibições de intervenção e imperativos de proteção, como decorrência dos princípios constitucionalmente consagrados, e da conformidade constitucional, pelo que, a decisão recorrida em face da errada aplicação do direito, não atendeu a tal conformidade e, assim, violou direitos fundamentais maxime o da defesa e o da tutela jurisdicional efetiva, ao não admitir a intervenção principal provocada de DDUnipessoal, Ld.ª oportuna e atempada requerida pela Autora;
B) As normas do n.º 1 do art.º 261.º 318.º n.º 1 al. a), do CPC devem ser adequadamente interpretadas e aplicadas, com referência e ou coerência e integridade na aplicação do direito, em conjugação com as normas dos art.ºs 6.º, 7.º, 33.º e 547.º do CPC, em articulação e valoração em função dos princípios da adequação, da conformação constitucional consagrados nos art.ºs 2.º, 12.º 13.º, 16.º a 18.º e 20.º n.º 1 e 5 da Lei Fundamental e dos art.ºs 7.º, 8.º, 10.º e 17.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e dos art.ºs 6.º e 7.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem;
C) O Tribunal a quo na decisão recorrida realizou uma interpretação inconstitucional dos art.ºs 261.º n.º 1, 318.º n.º 1 al. a), 7.º e 33.º todas do CPC, ao não admitir a intervenção principal provocada da sociedade DD Unipessoal, Ld.ª.
5.º FUNDAMENTO: Das Normas Violadas:
A) O Tribunal a quo na decisão recorrida violou entre outras as normas as dos art.º 6.º, 7.º, 33.º n.º 2 e 3, 261.º, 318.º n.º 1 al. a) e 547.º do CPC e ainda as normas dos art.º 590.º n.º 2, al. b), n.º 3 e 4 e, ainda, 593.º n.º 2, al. b) todos do CPC e, também, violou o disposto no art.º 9.º do CC e concomitantemente, o Tribunal a quo com esta sentença realizou uma interpretação inconstitucional dos art.ºs 261.º n.º 1, 318.º n.º 1 al. a), 7.º e 33.º todas do CPC, ao não admitir a intervenção principal provocada da sociedade DD Unipessoal, Ld.ª, face ao consagrado nos art.ºs 2.º, 12.º 13.º, 16.º a 18.º e 20.º n.º 1 e 5 da Lei Fundamental, por violação dos princípios fundamentais de Direito e de Justiça, como sejam o da economia processual, o da dever de gestão processual, o da cooperação, o da igualdade, o da confiança, da proporcionalidade, o da aquisição processual, o da eficácia processual e o do acesso à Justiça ou da tutela jurisdicional efetiva, que emanam, nomeadamente dos art.ºs 2.º, 13.º e 20.º da nossa Constituição e, também, os princípios da adequação e da conformação constitucional que estão consagrados e ou decorrem dos art.ºs 2.º, 12.º 13.º, 16.º a 18.º e 20.º n.º 1 e 5 da Lei Fundamental e as dos art.ºs 7.º, 8.º, 10.º e 17.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e, também, as dos art.ºs 6.º e 7.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
Nestes termos, por qualquer um dos fundamentos enunciados e nos melhores de Direito e de Justiça que, suprindo, a Veneranda Relação de Évora queira subscrever, pede-se o provimento do recurso, no sentido da decisão de 28.06.2023 ser revogada e de ser proferido douto Acórdão que julgue admitida a intervenção principal da requerida sociedade DD Unipessoal Ld.ª e determine que os autos prossigam os termos subsequentes com a citação da interveniente, com a consequente anulação dos atos posteriormente praticados, mas a Veneranda Relação ad quem melhor decidirá, com o que se fará, como sempre, JUSTIÇA.”
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Os Réus contra-alegaram, apresentando, por seu turno, as seguintes conclusões:
“1º O tribunal a quo interpretou de forma exemplar o direito, de acordo com o princípio da boa fé, da boa administração da justiça, da economia processual, no sentido de rejeitar atos inúteis e ainda respeitando o princípio da tutela jurisdicional efetiva e o princípio do dispositivo.
2º No caso concreto, a Recorrente considerou que deveria ser admitido o chamamento da Sociedade nos termos do nº 1 do Art. 261º do Código de Processo Civil.
3º Para ser admitido o chamamento da intervenção principal da Sociedade, fora da fase dos articulados, o mesmo tinha de ser compaginável com uma situação de litisconsórcio necessário.
4º Como é sabido, nos termos do nº 1 do Art. 33º do Código de Processo Civil, existe litisconsórcio se “ a lei ou o negócio exigir a intervenção dos vários interessados na relação controvertida”.
5º De acordo com o nº 2 do Art. 33º do Código de Processo Civil, é necessária a presença de todos os interessados quando, pela própria natureza da relação jurídica, seja necessária para produzir um efeito útil.
6º Ora, in casu, não existe a preterição de litisconsórico necessário, não se fazendo prova de que existe, por parte da Sociedade, um interesse igual ao dos réus e que o mesmo seja co-dependente.
7º A Sociedade é uma pessoa coletiva, tem personalidade jurídica para agir de per si e para estar sozinha em juízo.
8º Não existe nenhum efeito útil, em demandar conjuntamente os Recorridos e a Sociedade, uma vez que estes são titulares de interesses distintos e que em nada se compaginam ou dependem.
9º Assim, no caso concreto, não existe litisconsórcio necessário, entre os Recorridos e a Sociedade.
10º Mais, no chamamento à demanda da Sociedade, a Recorrente com base no Art. 261º, nº 1 do Código de Processo Civil, fez uma interpretação desprovida de fundamento, extensiva e contra legem.
11º O nº 1 do Art. 261º é taxativo, e só admite o chamamento aos autos se for proferida “decisão que julgue ilegítima alguma das partes por não estar em juízo determinada pessoa”.
12º A norma é cumulativa e pressupõe a existência de uma decisão que julgue ilegítima alguma das partes, e que essa decisão só existiu porque não estava em juízo uma determinada pessoa, o que in casu não se verificou.
13º Logo, a norma não pode ser aplicada no caso sub judice.
14º Mais, mesmo que assim não se entendesse, a verdade é que o mencionado nº 1 do Art. 261º do Código de Processo Civil remete para a aplicação do Art. 316º e ss do mesmo diploma legal.
15º E, o Art. 316º do Código de Processo Civil, consagra o regime a que terá de obedecer o chamamento, através da intervenção principal provada, se existir uma circunstância de litisconsórcio.
16º Desta forma, no caso concreto, não poderia ser admitido o chamamento à demanda da Sociedade, nos termos do nº 1 do Art. 261º e do Art. 316º do Código de Processo Civil, porquanto não estamos perante uma situação de litisconsórcio.
Pelo que, são totalmente inconsequentes, descabidas e infundadas as conclusões do Recorrente.
TERMOS EM QUE, deve a douta sentença recorrida, ser totalmente mantida “in totto” por ter feito uma correcta aplicação do Direito aos factos provados, não merecendo, por isso, qualquer censura ou reparo.
Decidindo-se assim, far-se-á JUSTIÇA!!!”
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Colhidos os vistos, cumpre apreciar.
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II.OBJECTO DO RECURSO.
Como é sabido, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (cfr. arts. 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC) - impõe-se conhecer das questões colocadas pela recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.
Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pela Recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar se deve ser admitida a intervenção principal da sociedade DD, Unipessoal, Lda.
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III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
São os descritos no relatório introdutório os factos/incidências processuais relevantes ao conhecimento do objeto do recurso.
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IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
Como é sabido, citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei (artigo 260.º do Código de Processo Civil (doravante CPC).
Uma das possibilidades de modificação subjetiva da instância prevista na lei é a decorrente dos incidentes de intervenção de terceiros (alínea b) do artigo 262.º).
Tal intervenção pode ser principal (artigos 311.º a 320.º) ou acessória (321.º a 332.º), ou traduzir-se naquilo que o legislador regula em sede de oposição (artigos 333.º a 350.º).
A intervenção principal pode ser espontânea (artigos 311.º a 315.º) ou provocada (artigos 316.º a 320.º).
Prossegue-se, com a modificação subjetiva da causa decorrente dos incidentes de intervenção de terceiros, o objetivo de alcançar economia de meios, resolvendo-se no mesmo processo um maior número possível de litígios (cf. José Lebre de Freitas, Introdução ao processo civil, Coimbra Editora, 3.ª edição, 2013, pág. 203).
É o artigo 316º do CPC que delimita as situações em que é processualmente admissível a intervenção provocada - a que foi requerida nos autos – o que faz da seguinte forma:
“1 - Ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário, qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com legitimidade para intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária.
2 - Nos casos de litisconsórcio voluntário, pode o autor provocar a intervenção de algum litisconsorte do réu que não haja demandado inicialmente ou de terceiro contra quem pretenda dirigir o pedido nos termos do artigo 39.º.
3 - O chamamento pode ainda ser deduzido por iniciativa do réu quando este:
a) Mostre interesse atendível em chamar a intervir outros litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material controvertida;
b) Pretenda provocar a intervenção de possíveis contitulares do direito invocado pelo autor.” (o destacado é nosso).
Estando em causa pedido de intervenção formulado pelo Autor, pois, ele poderá chamar terceiro à ação, para nela intervir como parte principal nas seguintes situações:
a) A fim de suprir a ilegitimidade decorrente de preterição de litisconsórcio necessário, seja do lado ativo seja do lado passivo (artigo 33 do CPC);
b) Para acompanhar o réu em caso de litisconsórcio voluntário (artigo 32 do CPC);
c) Visando constituir pluralidade subjetiva subsidiária passiva, isto é, para chamar alguém que possa ser condenado a título subsidiário, em caso de dúvida fundamentada sobre o sujeito passivo da relação controvertida (artigo 39.º do CPC).
Esta última situação, de pluralidade subjetiva subsidiária prevista no artigo 39º do Código de Processo Civil, na sua vertente de litisconsórcio subsidiário, origina no processo uma dupla subsidiariedade - objetiva e subjetiva -, porquanto comporta a dedução de um pedido subsidiário não apenas no confronto das partes singulares da ação, mas de uma parte que apenas é demandada para ver a sua situação jurídica apreciada no caso de não proceder o pedido deduzido a título principal.
O artigo 590.º, n.º 2, al. a) do CPC apenas impõe ao juiz que suscite, oficiosamente, o chamamento para intervenção principal provocada para sanar a ilegitimidade plural, delineada nos artigos 33.º e 34.º do CPC, com vista ao suprimento pelas partes do referido vício (artigos 316.º, nº 1 do CPC); não para suprir um litisconsórcio passivo eventual ou subsidiário.
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In casu, dúvidas não se colocam de que a Autora requereu o chamamento da sociedade invocando que entre a sociedade e os Réus se verifica uma situação de litisconsórcio necessário.
Mas não lhe assiste razão, porquanto no litisconsórcio necessário, todos os interessados devem demandar ou ser demandados, originando a falta de qualquer deles uma situação de ilegitimidade.
Assim, enquanto o litisconsórcio voluntário decorre exclusivamente da vontade dos interessados, o litisconsórcio necessário é imposto às partes, pela lei ou negócio e pela própria natureza da relação jurídica, para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal (artigo 33º, nºs 1 e 2 do CPC).
E a decisão produz o seu efeito útil normal sempre que, não vinculando embora os restantes interessados, possa regular definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado (artigo 33.º, nº 3 do CPC).
Diversas são as situações de litisconsórcio passivo eventual e subsidiário passivo, que justificam a formulação pelo autor de um pedido subsidiário contra o chamado, a fim de a situação no seu confronto ser apreciada, com as devidas consequências jurídicas, no caso de improcedência do pedido principal por ele formulado contra o primitivo réu (artigos 316.º, nº 2, 2ª parte e 39.º do CPC).
E é desta natureza a situação dos autos.
O Autor pretende fazer intervir nos autos a sociedade que os Réus alegam que ocupa o prédio dos autos, para o caso de se demonstrar que é aquela e não estes que no prédio se encontram. Por outras palavras, ou os Réus ocupam e serão condenados, ou ocupa a Chamada, o que implicaria a absolvição dos Réus e a condenação da Chamada, caso o chamamento fosse admissível, mas nunca a condenação de Réus e chamada.
São casos de pluralidade subjetiva subsidiária passiva superveniente resultantes de dúvida, surgida no decurso da demanda, por exemplo, sobre se o primitivo réu contraiu a obrigação em causa como titular do órgão de uma pessoa coletiva, como representante desta ou como gestor de negócio alheio.
Note-se que como se esclareceu em sede de despacho saneador aquando da apreciação da legitimidade passiva, se concluiu que perante a relação material controvertida desenhada pela Autora na petição inicial eram os Réus parte legítima.
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No que concerne à oportunidade do chamamento, impõe a lei que, nas situações previstas no n.º 2 do artigo 316.º, o chamamento para intervenção só pode ser requerido “até ao termo da fase dos articulados.”
O que se compagina com o regime da intervenção principal espontânea, em que a intervenção mediante articulado próprio só será admissível até ao termo da fase dos articulados (art.º 314.º).
Como se refere no Acórdão da Relação de Lisboa, de 12.07.2018, proferido no âmbito do processo n.º 3549/16.0T8CSC-A.L1-2, que aqui seguimos de perto:
“(…)Uma interpretação literal destas normas propugnaria que o dies ad quem para o requerimento do chamamento corresponderia ao termo do prazo para a apresentação do último articulado; uma outra interpretação, que José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre reputam de mais racional, aponta para que a preclusão se dê “com a prática do ato seguinte à apresentação do último articulado, que é, na tramitação normal do processo e consoante os casos, o despacho pré-saneador (art. 590-2), a marcação da data da audiência prévia (art. 591-1), o despacho que a dispense (art. 593-1) ou o primeiro dos despachos do art. 593-2)” (Código de Processo Civil anotado, volume 1.º, 3.ª edição, 2014, Coimbra Editora, pp. 612, 613 e 622). Esta última interpretação é considerada, por estes autores, como a preferível (ob. cit., p. 613). No mesmo sentido escrevem Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro (Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, 2.ª edição, 2014, Almedina, p. 291).
Seja qual for a interpretação que se adote, no caso vertente a A. apresentou o seu requerimento extemporaneamente, três meses após a apresentação da contestação e proferido que fora despacho convocando audiência prévia.
Pelo que o requerido chamamento deveria ter sido indeferido.(…)”
No caso, o requerimento foi apresentado depois da contestação, onde os Réus alegaram a ocupação pela aludida sociedade, da resposta, da audiência prévia no âmbito da qual foi proferido despacho saneador em que a exceção de ilegitimidade foi julgada improcedente.
O mesmo é, pois, efetivamente extemporâneo.
Note-se que o caso não é subsumível ao disposto no artigo 261º que, por se referir a uma situação de preterição de litisconsórcio necessário, pressupõe decisão que julgue ilegítima alguma das partes por não estar em juízo determinada pessoa, decisão que manifestamente, não foi, como se mencionou, proferida, pois que as partes foram julgadas legítimas.
Não se impunha, pois, na presente situação, intervenção do juiz no sentido de convidar a parte a deduzir o incidente de intervenção, tanto mais que os factos que o suportam foram alegados na contestação, a que a Autora respondeu.
Tal interpretação não é inconstitucional, por não comprometer de modo desproporcional, designadamente o direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, que não é absoluta e ilimitada, antes tem de ser exercida, com responsabilidade, na observância da lei, dos prazos nela previstos para acautelar, designadamente o direito a uma decisão em tempo razoável, e dos ónus por ela estatuídos, que outros interesses visam acautelar (como o de evitar a prática de, proibidos, atos inúteis).
Improcedem, pois, todas as conclusões do recurso.
Face ao total decaimento da pretensão, a Apelante terá de suportar as custas respetivas (artigo 527º nº 1 e 2 do Código de Processo Civil).
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V. Decisão.
Em conformidade com o exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a douta decisão recorrida.
Custas pela Apelante.
Registe e notifique.
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Évora,
Ana Pessoa
José António Moita
Maria João Sousa e Faro
1. Da exclusiva responsabilidade da relatora.↩︎