1. Se, num acidente simultaneamente de viação e de trabalho, o lesado demanda apenas a seguradora da responsabilidade civil automóvel, pode esta requerer a intervenção principal da seguradora do ramo laboral (cf. art.ºs 17º, n.º 5, da Lei n.º 98/2009, de 04.9/LAT e 7º, n.º 3, do CC).
2. Trata-se de intervenção que tem natureza principal sem que lhe esteja subjacente situação de litisconsórcio, antes de coligação - em tais situações a entidade patronal e/ou a sua seguradora podem intervir (espontaneamente) ou ser chamadas a intervir (intervenção provocada) ao lado do autor lesado contra o responsável civil (lesante) ou respetiva seguradora, a fim de obterem o que foi pago com base na responsabilidade infortunística.
3. Em termos de economia processual, importará evitar uma eventual duplicação de ações deduzindo oportuna intervenção principal, concretizando/atuando dessa forma o direito de regresso ou reembolso no confronto do lesante ou respetiva seguradora.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Relator: Fonte Ramos
Adjuntos: Luís Cravo
Moreira do Carmo
I. Na ação declarativa comum movida por AA contra A... - Companhia de Seguros, S. A., fundada em responsabilidade civil extracontratual por acidente de viação (visando o ressarcimento de danos patrimoniais e não patrimoniais dele derivados e que imputa a conduta culposa de condutor do veículo seguro), a Ré, na contestação, requereu a intervenção principal de B... Companhia de Seguros, S. A., aduzindo, em síntese, que o acidente (ocorrido em 26.4.2019) teve a dupla natureza viária e laboral, e a chamada B... assumiu a responsabilidade infortunística e o pagamento ao sinistrado das quantias previstas na Lei de Acidentes de Trabalho, assistindo-lhe o direito de regresso, a exercitar contra a chamante, verificando-se, assim, os requisitos legais que validam o chamamento da mesma ao processo, por via incidental, nos termos da lei processual civil.
O A. opôs-se à dita intervenção.
Por despacho de 19.11.2024, o Tribunal a quo indeferiu liminarmente os incidentes de intervenção principal espontânea da B... Companhia de Seguros, S. A., e de intervenção principal provocada da mesma deduzido pela Ré.
Inconformada, a Ré apelou formulando as seguintes conclusões:
1ª - O art.º 17º/5 da Lei 98/2009 da NLAT, expressamente confere ao empregador ou à sua seguradora, nos casos de acidente simultaneamente laboral e de viação, o direito de intervirem, como parte principal no processo em que o sinistrado estiver a exigir aos responsáveis, a indemnização pelo acidente causado por terceiro, no caso pelo responsável viário.
2ª - É certo que, uma vez iniciada a instância, esta, de regra, deve manter-se estável quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, conforme estatuído no art.º 260º do Código de Processo Civil (CPC), sem prejuízo das modificações subjetivas, a que alude o art.º 261º do CPC e sem prejuízo das ditadas pelo art.º 262º do CPC, mormente as que possam surgir em virtude dos incidentes de intervenção de terceiros (art.º 262º b) do CPC).
3ª - Por via do princípio da estabilidade da instância, e depois das alterações do CPC de 2013, e nos termos conjugados dos art.ºs 316º, 311º e 32º a 34º do CPC, de acordo com a lei geral adjetiva, o incidente de intervenção principal provocada (ou espontânea), passou a ser apenas admissível nos casos de litisconsórcio voluntário (art.º 32º) ou necessário (art.º 33º) ou “conjugal” (art.º 34º).
4ª - Só que, é absolutamente indiscutível que o art.º 17º/5 da Lei 98/2009, expressamente confere ao empregador e ou à sua seguradora, o direito de intervirem como parte principal no processo em que o lesado esteja a exigir do responsável ou responsáveis, a indemnização pelo acidente causado por terceiro, no caso pelo responsável viário e nas situações em que o sinistro assuma a dupla natureza viária e laboral.
5ª - O art.º 17º/5 da NLAT propicia esta intervenção principal (de modo provocado ou espontâneo) do empregador ou da seguradora deste, sem que subjacentemente se verifique litisconsórcio, mas mera coligação, porque o preceito em causa é lei especial, que não está revogada pelo CPC, que é a lei adjetiva geral.
6ª - De facto, nos termos do art.º 7º/3 do Código Civil (CC), a lei geral posterior (no caso o CPC/2013), não revoga lei especial anterior (no caso a Lei 98/2009).
7ª - O legislador, quando em 2013 alterou o figurino do CPC, não modificou nem revogou este especial regime previsto no art.º 17º/5 da NLAT que rege o concurso de ambas as responsabilidades (civil e laboral).
8ª - Vigente que está, em plenitude, o art.º 17º/5 da Lei 98/2009 de 04/9 e a sua não revogação pela lei geral adjetiva (CPC/2013), a Ré A... (alegadamente responsável no plano viário) tem o direito de suscitar a intervenção principal provocada ativa da B... (art.ºs 316º e seguintes do CPC).
9ª - O segmento final da decisão que condenou a Ré A..., na qualidade de chamante, em custas incidentais, deve ser revogado e tudo sob as legais consequências, e no limite, a manter-se a decisão – solução que de todo se rejeita – alterado para custas incidentais com taxa de justiça a fixar em valor inferior.
10º - A decisão proferida fez incorreta interpretação e aplicação do que dispõem os art.ºs 32º a 34º e 311º do CPC, 17º/5 da Lei 98/2009 (LAT), 260º, 261º, 262º, 262º b) e 316º do CPC e 7º/3 do CC e a correta interpretação e aplicação dita a revogação da decisão que foi proferida e a sua substituição por outra que defira e admita o incidente da intervenção provocada da B..., suscitado pela Ré/recorrente e que revogue e dê sem efeito a condenação desta em custas e/ou no limite, a alteração para valor inferior.
Não houve resposta.
Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objeto do recurso[1], importa apreciar e decidir se é ou não de admitir o incidente de intervenção principal provocada.
2. Cumpre apreciar e decidir.
Citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei (art.º 260º do CPC, sob a epígrafe “Princípio da estabilidade da instância”).
A instância pode modificar-se, quanto às pessoas, em virtude dos incidentes da intervenção de terceiros (art.º 262º, alínea b)).
Estando pendente causa entre duas ou mais pessoas, pode nela intervir como parte principal aquele que, em relação ao seu objeto, tiver um interesse igual ao do autor ou do réu, nos termos dos artigos 32º, 33º e 34º (art.º 311º).
Ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário, qualquer das partes pode chamar a juízo o interessado com legitimidade para intervir na causa, seja como seu associado, seja como associado da parte contrária (art.º 316º, n.º 1). Nos casos de litisconsórcio voluntário, pode o autor provocar a intervenção de algum litisconsorte do réu que não haja demandado inicialmente ou de terceiro contra quem pretenda dirigir o pedido nos termos do artigo 39º (n.º 2). O chamamento pode ainda ser deduzido por iniciativa do réu quando este: a) Mostre interesse atendível em chamar a intervir outros litisconsortes voluntários, sujeitos passivos da relação material controvertida; b) Pretenda provocar a intervenção de possíveis contitulares do direito invocado pelo autor (n.º 3).
3. Nos termos da Lei n.º 98/2009, de 04.9 (que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais) / LAT: Quando o acidente for causado por outro trabalhador ou por terceiro, o direito à reparação devida pelo empregador não prejudica o direito de ação contra aqueles, nos termos gerais (art.º 17º, n.º 1). Se o sinistrado em acidente receber de outro trabalhador ou de terceiro indemnização superior à devida pelo empregador, este considera-se desonerado da respetiva obrigação e tem direito a ser reembolsado pelo sinistrado das quantias que tiver pago ou despendido (n.º 2). Se a indemnização arbitrada ao sinistrado ou aos seus representantes for de montante inferior ao dos benefícios conferidos em consequência do acidente, a exclusão da responsabilidade é limitada àquele montante (n.º 3). O empregador ou a sua seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente pode sub-rogar-se no direito do lesado contra os responsáveis referidos no n.º 1 se o sinistrado não lhes tiver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano a contar da data do acidente (n.º 4). O empregador e a sua seguradora também são titulares do direito de intervir como parte principal no processo em que o sinistrado exigir aos responsáveis a indemnização pelo acidente a que se refere este artigo (n.º 5).
4. A lei geral não revoga a lei especial, exceto se outra for a intenção inequívoca do legislador (art.º 7º, n.º 3 do CC).
5. O estabelecido no art.º 311º apenas abrange a intervenção litisconsorcial, voluntária ou necessária, deixando de se prever a intervenção coligatória que figurava na alínea b), do art.º 320º do CPC de 1961, na redação conferida pelo DL n.º 329-A/95, de 12.12.
A opção do legislador prende-se com a circunstância de a intervenção de terceiros no processo dever ser excecional e reservada para os casos de justificação evidente.[2]
Porém, existem previsões legais especiais que conferem o direito a intervir em situações de coligação, como é o caso do art.º 17º, n.º 5, da Lei n.º 98/2009, de 04.9 (com conteúdo idêntico ao do n.º 5, do art.º 31º da Lei n.º 100/97, de 13.9)[3].
6. Na situação em análise ocorre confluência de situações de responsabilidade civil no domínio dos acidentes de trabalho, já que o acidente de viação foi simultaneamente acidente de trabalho.
7. É desde há muito pacífico o entendimento de que a indemnização por acidente de viação não é acumulável com a emergente de acidente de trabalho, sendo antes complementares, no sentido de esta subsistir para além da medida em que é absorvida por aquela.
As indemnizações consequentes ao acidente de viação e ao sinistro laboral - assentes em critérios distintos e cada uma delas com a sua funcionalidade própria - ´não são cumuláveis`, mas antes `complementares` até ao ressarcimento total do prejuízo causado, pelo que não deverá tal `concurso de responsabilidades` conduzir a que o lesado/sinistrado possa acumular no seu património um ´duplo ressarcimento pelo mesmo dano concreto`.[4]
Esta perspetiva encontra fundamento, atualmente, na previsão do art.º 17º da Lei n.º 98/2009, de 04.9.[5]
8. De sublinhar também que em caso de acidente simultaneamente de viação e de trabalho, a responsabilidade em 1ª linha será do responsável pelo acidente de viação (ou sua seguradora); a responsabilidade primacial e definitiva é a que incide sobre o responsável civil, quer com fundamento na culpa, quer com base no risco.[6]
Daí o direito de regresso concedido à entidade empregadora ou respetiva seguradora, em relação aos responsáveis pelo acidente de viação, de forma a repercutir aquilo que, a título de responsável objetivo pelo acidente laboral, tenha pago ao sinistrado (pois, no âmbito da responsabilidade meramente objetiva, garantem ao sinistrado o recebimento das prestações que lhe são reconhecidas pela legislação laboral).[7]
9. Considera-se ainda que desta fisionomia essencial do concurso ou concorrência de responsabilidades (não envolvendo uma acumulação real de indemnizações pelos mesmos danos concretos - atento o princípio fundamental, vigente nesta sede, da não duplicação ou acumulação material de indemnizações) pode extrair-se a conclusão que este figurino normativo preenche, no essencial, a figura da solidariedade imprópria ou imperfeita, já que: a) no plano das relações externas, o lesado/sinistrado pode exigir alternativamente a indemnização ou ressarcimento dos danos a qualquer dos responsáveis, civil ou laboral, escolhendo aquele de que pretende obter em primeira linha a indemnização, mas sem que lhe seja lícito somar, em termos de acumulação real, ambas as indemnizações; b) no plano das relações internas, a circunstância de haver um escalonamento de responsabilidades, sendo um dos obrigados a indemnizar o responsável definitivo pelos danos causados, conduz a que tenha de se outorgar ao responsável ´provisório` (a entidade patronal ou respetiva seguradora) o direito ao reembolso das quantias que tiver pago, fazendo-as repercutir definitivamente, direta ou indiretamente, no património do responsável ou responsáveis civis pelo acidente.
10. No mesmo plano das relações internas, tem sido acentuado que o quadro normativo aplicável é o que resulta estritamente do disposto na lei dos acidentes de trabalho, sendo esse direito ao reembolso do responsável laboral efetivado necessariamente por uma de três formas:
- Substituindo-se ao lesado na propositura da ação indemnizatória contra os responsáveis civis, se lhe pagou a indemnização devida pelo sinistro laboral e o lesado não curou de os demandar;
- Intervindo como parte principal na causa em que o sinistrado exerce o seu direito ao ressarcimento no plano da responsabilidade por factos ilícitos, aí efetivando o direito de regresso ou reembolso pelas quantias já pagas;
- Exercendo o direito ao reembolso contra o próprio lesado, caso este tenha recebido (em processo em que não haja tido lugar a referida intervenção principal) indemnização que represente duplicação da que lhe tinha sido outorgada em consequência do acidente laboral.
11. É assim indispensável a iniciativa do verdadeiro titular do interesse protegido através da consagração da regra fundamental da proibição de acumulação de indemnizações, traduzida na dedução de oportuna intervenção principal na causa, ou no exercício do direito ao reembolso contra o próprio lesado que obteve indemnização pela totalidade do dano ou na propositura de ação de regresso em substituição do lesado.
Ademais, em termos de economia processual, importará evitar uma eventual duplicação de ações deduzindo oportuna intervenção principal, concretizando/atuando dessa forma o direito de regresso ou reembolso no confronto do lesante ou respetiva seguradora.[8]
12. In casu, temos um acidente simultaneamente de viação e de trabalho, imputável a terceiro, que vitimou o A./trabalhador.
Face ao regime jurídico aplicável, surgirá deslocada ou irrelevante a questão de saber se a situação em apreço configura verdadeiro direito de regresso ou mera sub-rogação, sendo que, independentemente de tais conceitos, a jurisprudência tem vindo a assinalar, principalmente, o direito ao reembolso (de importâncias pagas por quem é primeiro ou imediato responsável pela reparação da situação emergente do sinistro), fazendo com que, em caso de confluência de vários tipos de responsabilidade civil no domínio dos acidentes de trabalho, o terceiro responsável, incluindo seguradoras, não deixe de efetuar a correspondente prestação indemnizatória.[9]
13. A Ré suscitou a intervenção provocada ativa de terceiro - a intervenção da seguradora da responsabilidade infortunística para que, na causa intentada pelo lesado contra si, seguradora do responsável civil, em evento que constitui simultaneamente acidente de viação e acidente de trabalho, possa formular a pretensão destinada a fazer atuar os direitos em que se tenha “sub-rogado” por pagamentos que haja efetuado ao lesado.
Não tem o terceiro, em relação ao objeto da causa (relação material controvertida que serve de causa de pedir à ação) qualquer interesse litisconsorcial com o autor (voluntário ou necessário).
Contudo, o art.º 17º, n.º 5, da LAT, prevê serem a entidade patronal e a sua seguradora titulares do direito de intervir como parte principal no processo em que o sinistrado exija indemnização aos responsáveis civis.
Trata-se, como se adiantou em II. 5., supra, de intervenção que tem natureza principal sem que lhe esteja subjacente situação de litisconsórcio, antes de coligação[10] - em tais situações a entidade patronal e/ou a sua seguradora podem intervir (espontaneamente) ou ser chamadas a intervir (intervenção provocada) ao lado do autor lesado contra o responsável civil (lesante) ou respetiva seguradora, a fim de obterem o que foi pago com base na responsabilidade infortunística.
E assim porque o referido normativo (art.º 17º da Lei 98/2009) deverá ser considerado como lei especial, não revogada pela lei geral (Código de Processo Civil), aplicando-se o comando do art.º 7º, n.º 3 do CC.
14. É, pois, correta a posição da Ré/recorrente, mormente quando afirma que, perante a vigência do art.º 17º, n.º 5 da lei 98/2009 de 04.9 e a sua não revogação pela lei geral (CPC de 2013), há que reconhecer quer o direito da recorrente (responsável no plano viário) suscitar a intervenção principal provocada ativa da B... (art.ºs 316º e seguintes do CPC), quer o direito desta última de intervir espontaneamente como interveniente principal do lado ativo da relação jurídico processual (art.ºs 311º e seguintes do CPC).
Ademais, o descrito procedimento contribuirá para afastar os riscos já assinalados em II. 11., supra, bem como os associados a um (eventual) restrito e particular acertamento dos interesses em presença.[11]
15. Concluindo: deverá ser admitida a requerida intervenção principal, reconhecendo-se à seguradora da entidade patronal do autor - lesado em acidente de viação simultaneamente de trabalho - o direito a intervir como parte principal na causa por este intentada contra a seguradora do lesante.[12] [13]
16. Procedem, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso.
Custas pelo A./recorrido.
29.4.2025
[1] Admitido a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo (638º, n.º 1, 631º, n.º 1, 644º, n.º 1 al. a), 645º, n.º 2 e 647º, n.º 1 do CPC).
[2] Vide Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo CPC, 2014, 2ª edição, Vol. I., Almedina, pág. 289.
Sobre a orientação consagrada no CPC de 2013, cf., de entre vários, acórdãos da RG de 18.6.2020-processo 2981/19.1T8VCT-A.G1 e da RP de 12.10.2023-processo 619/22.9T8PVZ.P1, publicados no “site” da dgsi.
[3] E o art.º 31º da lei n.º 100/97, de 13.9 (diploma revogado pela Lei n.º 98/2009, de 04.9), previa o seguinte: «1 - Quando o acidente for causado por outros trabalhadores ou terceiros, o direito à reparação não prejudica o direito de acção contra aqueles, nos termos da lei geral. 2 - Se o sinistrado em acidente receber de outros trabalhadores ou de terceiros indemnização superior à devida pela entidade empregadora ou seguradora, esta considera-se desonerada da respectiva obrigação e tem direito a ser reembolsada pelo sinistrado das quantias que tiver pago ou despendido. 3 - Se a indemnização arbitrada ao sinistrado ou aos seus representantes for de montante inferior ao dos benefícios conferidos em consequência do acidente ou da doença, a desoneração da responsabilidade será limitada àquele montante. 4 - A entidade empregadora ou a seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente tem o direito de regresso contra os responsáveis referidos no n.º 1, se o sinistrado não lhes houver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano a contar da data do acidente. 5 - A entidade empregadora e a seguradora também são titulares do direito de intervir como parte principal no processo em que o sinistrado exigir aos responsáveis a indemnização pelo acidente a que se refere este artigo.»
Idêntico regime estabelecia a Base XXXVII da Lei 2127, de 03.8.1965.
[4] Vide, nomeadamente, V. Ribeiro, Acidentes de Trabalho, 1984, páginas 225 e seguintes; C. Carvalho, Acidentes de Trabalho, 2ª edição, páginas 154 e seguintes e Carlos Alegre, Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, 2ª edição, Almedina, pág. 150 e, de entre vários, acórdãos do STA de 04.3.1957 e do STJ de 24.01.2002 e 11.12.2012-processo 40/08.1TBMMV.C1.S1, in AD n.º 162º, 872; CJ-STJ, X, 1, 54 e “site” da dgsi, respetivamente.
No tocante aos danos patrimoniais futuros, o lesado poderá optar por ser indemnizado pelo acidente de trabalho ou pelo acidente de viação, mas não pode cumular as duas indemnizações - cf., designadamente, acórdãos do STJ de 30.6.2009-processo 1995/05.3TBVCD.S1 [no qual se afirma, designadamente, que “embora a fixação ao lesado, no âmbito laboral, dum montante de capital ou duma pensão vitalícia, vise ressarcir a sua incapacidade permanente para o desempenho de funções laborais, não pode a seguradora do acidente de viação escusar-se ao pagamento da indemnização que lhe cabe com o fundamento da cumulação de indemnizações (laboral e por acidente de viação”) e, ainda, que “respondendo a companhia de seguros Ré, ora recorrente, em primeira linha pelos danos resultantes do acidente de viação, sempre teria que efetuar o pagamento integral dos danos da sinistrada, sem que lhe fosse possível invocar a duplicação de indemnizações, pois nos termos do art.º 31º, n.º 2, da Lei n.º 100/97, de 13-09, seria à seguradora do acidente de trabalho (e não a recorrente, seguradora do acidente de viação) que competiria efetuar, caso se justificasse, o pedido de reembolso do que foi pago à Autora”] e da RC de 02.02.2010-processo 1593/04.9TBLRA.C1, publicados no “site” da dgsi.
Sobre a matéria, cf., ainda, acórdão da RC de 14.3.2023-processo 3166/19.2T8VIS.C1 [concluindo-se: «1. Em caso de acidente simultaneamente de viação e de trabalho, a indemnização, em tribunal do trabalho, do dano patrimonial laboral, com atribuição de pensão anual e vitalícia, não impede a indemnização, na instância cível, do dano biológico na sua autónoma dimensão extralaboral/cível. 2. Em tal caso, não logrando a indemnização laboral ressarcir a totalidade do dano biológico – na dimensão extralaboral deste –, a reparação pela seguradora de acidentes de viação não se assume como cumulativa/sobreposta (perante a prestada no foro laboral), mas como complementar, de molde a cobrir as diversas dimensões do dano sofrido. (...)»], publicado no “site” da dgsi.
[5] E, no tocante aos acidentes em serviço, nos art.ºs 46º e 47º do DL n.º 503/99, de 20.11.
[6] Segundo Antunes Varela (in Das Obrigações em Geral, Vol. I, 9ª edição, Almedina, pág. 725), tem subjacente o entendimento de que “o risco próprio do veículo causador do acidente funciona como causa mais próxima do dano que o perigo inerente à laboração da entidade patronal”.
[7] Vide ainda, de entre vários, os citados acórdãos do STJ de 30.6.2009-processo 1995/05.3TBVCD.S1 e 11.12.2012-processo 40/08.1TBMMV.C1.S1, bem como os acórdãos da RG de 11.02.2004 e RC de 22.01.2008-processo 576-A/2002.C1 [tendo-se concluído, nomeadamente, que “a concretização processual do ´direito de intervir` (...) é materializada através do incidente de intervenção principal, consubstanciando, no caso de a seguradora ser chamada à lide (…), intervenção principal provocada abarcada no âmbito da intervenção coligatória ativa prevista na al. b) do art.º 320º do CPC (de 1961)], publicados na CJ, XXIX, 1, 287 e “site” da dgsi, respetivamente.
[8] Cf. o citado acórdão do STJ de 11.12.2012-processo 40/08.1TBMMV.C1.S1, aqui seguido de perto (pontos II. 9. a II. 11.).
[9] Cf., entre outros - nas situações similares dos acidentes em serviço -, acórdãos da RC de 23.6.2015-processo 2988/12.0TBVIS.C1 e 02.02.2016-processo 760/15.4T8LRA.C1, publicados no “site” da dgsi.
[10] Vide, nomeadamente, A. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e L. F. Pires de Sousa, CPC Anotado, Vol. I, 2018, pág. 362.
[11] Veja-se, a propósito, o citado acórdão da RC de 02.02.2016-processo 760/15.4T8LRA.C1, onde se concluiu: «1. Ocorrendo um acidente, simultaneamente de viação e de serviço, imputável a culpa de terceiro e em que é sinistrado um subscritor da C. G. A., esta entidade, depois de proferida decisão definitiva sobre o direito às prestações da sua responsabilidade, goza do direito de regresso contra aquele terceiro responsável, incluindo seguradoras, nos termos do n.º 3 do art.º 46º do DL n.º 503/99, de 20.11 (…). 2. Qualquer eventual “acordo” que o responsável civil realize com o sinistrado, através do qual este considere ou declare “inteiramente indemnizados” os correspondentes “danos e prejuízos” e renuncie “a quaisquer direitos de acção judicial e indemnizações emergentes do mesmo acidente”, estará naturalmente condicionado pela imperatividade do regime jurídico dos acidentes de trabalho (em serviço), que não poderá desrespeitar/defraudar.»
[12] Relativamente ao concreto seguro de responsabilidade civil decorrente da circulação de viatura automóvel e às aludidas qualidades/posições adjetivas, cf., por exemplo, art.ºs 82º e seguintes e 92º e seguinte da petição inicial dos autos principais.
[13] Cf., entre outros, o cit. acórdão da RG de 18.6.2020-processo 2981/19.1T8VCT-A.G1 [com o sumário: «I. A intervenção principal, espontânea ou provocada, está limitada aos casos de litisconsórcio, tendo o Código de Processo Civil de 2013 suprimido a admissibilidade da intervenção principal a título de coligação. II. A solução geral (o regime dos incidentes de intervenção traçado no Código de Processo Civil) referida em I convive com soluções especiais (consagradas em leis avulsas), sendo a intervenção principal ativa, espontânea ou provocada, de admitir nas ações baseadas em acidente de viação simultaneamente de trabalho (ou noutros eventos em que seja aplicável o art.º 17º da Lei 98/2009) em que a entidade patronal ou seguradora do risco infortunístico procedeu, no âmbito da relação laboral, ao pagamento de prestações ao sinistrado/lesado – em tais situações a entidade patronal e/ou a sua seguradora podem intervir (espontaneamente) ou ser chamadas a intervir (intervenção provocada) ao lado do autor lesado, na ação por este intentada contra o responsável civil (lesante) ou respetiva seguradora, a fim de obter o que foi pago com base na responsabilidade infortunística.»] e acórdão da mesma Relação de 18.3.2021-processo 2692/20.5T8GMR-A.G1, publicado no “site” da dgsi.