As partes continuam vinculadas ao contrato de empreitada.
Neste, o direito à indemnização tem uma função complementar ou integradora dos outros direitos conferidos ao dono da obra pelos artigos 1221º e 1222º do Código Civil, servindo para reparar aqueles danos que o exercício destes direitos não reparasse.
A excepção de não cumprimento do contrato justifica que a Autora recuse pagar o restante do preço, pelo menos enquanto a situação não estiver regularizada.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra:
A..., S.A, intentou ação contra B..., LDA, pedindo: 1. Seja a Ré condenada, a pagar a quantia de € 29.625,78 (vinte e nove mil seiscentos e vinte e cinco euros e setenta e oito cêntimos), valor que corresponde ao montante necessário para terminar a obra e retificar todos os erros cometidos pela Ré. 2. Devem ainda ser condenada a Ré ao pagamento daquele valor acrescido de juros de mora à taxa legal contabilizados desde a data da citação da Ré até efetivo integral pagamento. 3. Devendo ainda a Ré ser condenada ao pagamento de uma indemnização para ressarcimento dos danos/prejuízos sofridos pela Autora decorrentes da sua conduta de incumprimento e inercia, indemnização que se estima em € 10.000,00, acrescida de juros de mora desde a citação até efeito e integral pagamento.
Fundamenta a sua pretensão no contrato de empreitada celebrado pela ré e no seu incumprimento por parte desta invocando que a obra sofre de vícios e não se encontra finalizada.
Devidamente citada a R. contestou. Conclui pela improcedência da ação e deduziu reconvenção, pedindo a condenação da autora a pagar à reconvinte a quantia a quantia de € 17.754,48 (dezassete mil setecentos e cinquenta e quatro euros e quarenta e oito cêntimos), acrescidos de juros à taxa legal em vigor, até ao integral pagamento.
A autora respondeu e conclui pela improcedência da reconvenção.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença a julgar a ação parcialmente procedente e em conformidade: condenar a ré a pagar à autora a quantia de € 19.003,05 (dezanove mil e três euros e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal, atualmente de 4% ao ano, desde a data da citação até efetivo integral pagamento e absolver a ré do resto do pedido; e julgar a reconvenção procedente e condenar a autora a pagar à reconvinte a quantia a quantia de € 17.754,48 (dezassete mil setecentos e cinquenta e quatro euros e quarenta e oito cêntimos), acrescidos de juros à taxa legal em vigor, atualmente de 4% ano, desde a data da notificação do pedido reconvencional [2021-07-08] até ao integral pagamento.
I. Compulsada toda a prova produzida e avaliada toda a factualidade elencada, não
pode, pois, a Apelante conformar-se com tal posição, desta feita pelo Douto Tribunal, por entender que os factos dados como NÃO provados mormente os relativos à petição inicial, deveriam ter sido dados como provados, não só devido à prova documental apresentada (alguma não valorada – salvo incompreensivelmente - devido respeito) como, na sequencia da prova testemunhal,
II. Parece evidente que as Testemunhas, cujo depoimento foi valorado e serviu de
prova para concluir alguns dos factos, não depuseram no sentido que o douto Tribunal determinou, pelo que não podia o mesmo ter concluído como concluiu.
III. Ora, na apreciação da prova Testemunhal, vigora o princípio da livre convicção do julgador, no entanto, não pode o Tribunal olvidar-se do que foi expressamente referido pelas testemunhas no que se refere aos factos.
IV. O resultado da actividade de julgamento da matéria de facto pode exprimir-se numa afirmação susceptível de ser considerada verdadeira ou falsa. Contudo, essa verdade não é uma verdade absoluta ou ontológica, sendo antes uma verdade judicial, jurídico-prática.
V. E assim, no que diz respeito a matéria de facto dada como não provada, e provada o Tribunal não valorou o depoimento da testemunha, e pior, justifica a sua posição como se o tivesse feito, quando na realidade, não o fez.
VI. Pelo que, se encontram mal julgados os factos dados como não referentes à petição inicial, ao invés também nunca podendo o Douto Tribunal ter decidido como decidiu.
VII. Deveriam também ter sido dados como provados os factos 8.º; 12.º; 13.º; 14.º; 15.º; 17.º; 20.º; 24.º; 26.º; 31.º; com o facto de ter sido considerado o Documento junto a 05 de janeiro de 2022 (cfr. Fls. Dos autos) – documento não impugnado, e não tido em consideração pelo tribunal (sabe-se lá porque razão).
VIII. Deveria e em suma, o Douto Tribunal ter dado como provados os factos supra elencados, porque efetivamente afirmados e confirmados pelas testemunhas e documento que não foi tido em consideração, assim ter decido de forma diferente da que decidiu, nomeadamente no que diz respeito à condenação da Apelada a proceder ao pagamento de uma indemnização à Apelante, decorrente dos danos sofridos pela Autora, nomeadamente danos na sua imagem e reputação junto dos seus clientes e fornecedores, assim como da falta de condições para o trabalho dos seus trabalhadores, indemnização que não poderá ser inferior à quantia de € 10.000,00 (dez mil euros). Acrescidos de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento.
IX. Requerendo-se assim tal alteração e consequente condenação da Apelada em proceder ao pagamento de uma indemnização à Apelante pelos danos por esta sofridos com a sua atuação.
X. Devendo ainda, a Apelada ser condenada ao pagamento da totalidade dos valores Requeridos pela Apelante na sua petição inicial no valor total de € 29.625,78 – demonstrados que foram os defeitos de obra e falta de execução dos trabalhos.
XI. Não poderá ainda a Apelante concordar com a douta sentença, quando a mesma a condena no pagamento de um valor referente a faturas não pagas.
XII. Com efeito, as faturas não foram pagas pelo simples facto de o trabalho adjudicado não ter sido finalizado!
XIII. como bem referiram as testemunhas, assim como bem demonstrado, A OBRA NÃO FOI ACEITE pela Apelante (cfr. facto dado como não provado – e bem – 47.º da contestação), pelo simples facto da mesma não se encontrar concluída.
XIV. Tendo alias, o Douto Tribunal tido em consideração teor dos emails remetidos pela representante legal da Apelada, referindo alias, que a mesma faltou à verdade!!! Em plena audiência de julgamento… (cfr. 23-09-2021 – documento n.º 1) no qual a mesma refere que os trabalhos preparatórios se encontram concluídos nunca a obra foi entregue na totalidade….
XV. Não poderia ser a Apelante ser condenada ao pagamento de serviços que não usufruiu ou que foram executados defeituosamente
XVI. A obra não foi concluída nem aceite pela Autora!
XVII. A Ré comprometeu-se sempre a solucionar os defeitos existentes na obra por si executada, e sempre assumiu os mesmos.
XVIII. O Showroom não se encontra concluído, a Autora nunca aceitou nem aceitaria uma obra com os defeitos existentes e causados pela execução dos trabalhos por parte da Ré.
XIX. É falso que a cobertura tenha ruído devido ao seu estado de alegada “ruina”, a inundação apenas e somente ocorreu, porque a Ré, demoliu tal cobertura e deixou a mesma a céu aberto, mesmo após ter sido alertada para o efeito.
XX. Aliás, a demolição foi faturada pela Ré (cfr. Documentos n.ºs 12 e 13 juntos com a contestação.
XXI. Reitera-se que a Autora NUNCA aceitou a obra, sendo inexistente qualquer auto de entrega da mesma.
XXII. Não há dúvidas que a responsabilidade das obras, mal executadas, é da Ré, a mesma assumiu responsabilidades pela inundação, e ainda, apesar de alegadamente pretender dar “garantia de obra” não chegou a realizá-la.
XXIII. É verdade que as partes não acordaram em “caucionar” a obra pela falta de qualidade de trabalho, mas, salvo o devido respeito, para além da falta de qualidade, a Ré não executou trabalhos que se tinha obrigado a executar, pelo que, não pode a Autora ser condenada a qualquer pagamento referente a qualquer parcela das faturas que requer pagamento na sua reconvenção.
XXIV. É falso que as obras tenham sido concluídas, e/ou aceites pela Autora, pois as mesmas, foram executadas com deficiências, e para além disso, não foram concluídas.
XXV. É falso que a obra tenha sido concluída em 22/01/2020. Inexistindo qualquer documento de entrega e recebimento.
XXVI. Não aceita a Autora ser devedora de qualquer quantia à Ré, quando a mesma não concluiu os trabalhos descritos nas faturas e os que executou foram com defeitos, sendo aliás a responsável pela inundação ocorrida, por falta de cuidado e brio profissional.
XXVII. Ora, atendendo à falta de prestação de serviço e/ou serviço inacabado e mal executado, deveria a Apelante ter sido absolvida do pagamento de tais quantias requeridas na reconvenção. Porque não devidas, devendo a sentença ser alterada também nesta parte.
XXVIII. Deve assim improceder os pedidos reconvencionais formulados pela Apelada nesta sede, porque infundados e desprovidos de qualquer fundamento fáctico-jurídico.
XXIX. Apesar de não o referirem diretamente, parece decorrente do senso comum que, tendo a obra sido executada deficientemente, tendo a Ré causado Danos nas instalações da Autora (devido às demolições executadas de forma imprudente), e tendo a mesma não terminado os serviços que foram prestados, deveria SIM ser condenada a indemnizar a Autora pelos nos decorrentes da má imagem causada, do tempo despendido pelos funcionários, pelas péssimas condições em que os mesmos se encontram a trabalhar, e ainda tratando-se de empresa de materiais de construção civil, é facilmente conclusivo que o estado em que a sua sede se encontra devido à atuação da Apelante é para si danoso a vários níveis.
XXX. Estatui ainda o artigo 1208º do Código Civil que “o empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato”.
XXXI. Ora, a Apelada, empreiteira na obra adjudicada pela Apelante não cumpriu o contrato celebrado uma vez que a obra apresenta os diversos vícios vertidos acima.
XXXII. A Autora interpelou a Ré para que esta procedesse à retificação e finalização da obra, o que não sucedeu, constituindo-se por isso, a Ré, em mora nos termos do artigo 804º nº 2 e 805º nº 1, ambos do Código Civil
XXXIII. A Ré, apesar de devidamente interpelada, não realizou as devidas retificações nem terminou a obra.
XXXIV. Posto isto, e atendendo à mora da Ré, a Autora perdeu o interesse em aquela finalizasse a obra, por se já ter demonstrado a sua falta de brio e compromisso.
XXXV. Assim, nos termos do artigo 808º nº1 do Código Civil, a Ré entrou em incumprimento definitivo.
XXXVI. Determina o artigo 798º do Código civil que “o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor”.
XXXVII. Sendo que o prejuízo causado se afigura evidente, no que diz respeito à imagem causada nos seus clientes e fornecedores que assistem a uma obra inacabada por culpa apenas e somente da Ré.
XXXVIII. Prejuízo ainda evidente no que diz respeito à falta de condições para o trabalho dos trabalhadores da Ré, que assistem a um local de trabalho inacabado, e sem condições de circulação decentes,
XXXIX. Estabelece ainda o artigo 432º do Código Civil que “é admitida a resolução do contrato fundada na lei ou em convenção”.
XL. Ora, o artigo 801º nº2 do Código Civil prevê que “tendo a obrigação por fonte um contrato bilateral, o credor, independentemente do direito à indemnização, pode resolver o contrato”.
XLI. Resolvido o contrato, deve ser a Apelada condenada ao pagamento da indemnização peticionada nos termos do artigo 798º do Código civil, demonstrada a culpa o prejuízo causado.
XLII. o artigo 428.º, n.º 1, do Código Civil, que, se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efetuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo.
XLIII. As duas obrigações justificam-se uma à outra, cada uma delas é causa da outra. São interdependentes. A esta relação entre obrigações das partes chama-se sinalagma, designando-se como sinalagmáticas as mesmas obrigações.
XLIV. Pelo que, pelos factos já descritos, não haverá qualquer obrigação da Apelante em proceder ao pagamento do que quer que seja à Apelada, não tendo a mesma executado os serviços em causa, ou tendo executado os mesmos de forma deficiente.
XLV. Assim, o pagamento de qualquer serviço pela Apelante à Apelada, apenas seria devido se o mesmo tivesse sido prestado e de forma conveniente, estamos perante obrigações “propter rem”, ou seja, obrigações a que o respetivo sujeito passivo está vinculado, o serviço seria prestado e o seu adquirente teria a obrigação de o pagar – o que de resto – o que não sucedeu como demonstrado
XLVI. é de admitir que a Apelante, possa recusar o pagamento de qualquer fatura emitida pela Apelada, porquanto aquela não procedeu à prestação dos serviços em causa.
XLVII. Pelo que deve a Reconvenção deveria ter sido julgada totalmente improcedente pelo facto de não ser exigível a obrigação por parte da Apelante, pelo não cumprimento por parte dos serviços que a Apelada se obrigou executar referentes às faturas em causa.
XLVIII. Devendo assim, a Douta sentença ser alterada sendo a Apelante ser absolvida dos pedidos contra si formulados pela Apelada, apenas se encontrando na disponibilidade de proceder ao pagamento de serviços prestados e aceites – tendo sido os mesmos já liquidados e não aceitando pagar serviços que não usufruiu ou executados de forma deficiente.
XLIX. Pelo que, a douta sentença, para além de aplicar erradamente o direito, os factos dados como provados e não provados, deveriam ter encaminhado para um desfecho diferente ao que infelizmente se verificou.
L. Pelo que, a fundamentação e enquadramento jurídico não poderá ser acolhida como valida e/ou legal, deverá ser substituída por outra que determine a Condenação da Apelada ao pagamento da quantia global de pelo menos de € 29.625,78 (vinte e nove mil seiscentos e vinte e cinco euros e setenta e oito cêntimos), valor que corresponde ao montante necessário para terminar a obra e retificar todos os erros cometidos pela Ré. Assim como deve a Apelante ser condenada ao pagamento de indemnização para ressarcimento dos danos/prejuízos sofridos pela Autora decorrentes da sua conduta de incumprimento e inercia, indemnização que se estima em € 10.000,00, acrescida de juros de mora desde a citação até efeito e integral pagamento.
LI. Devendo ainda a Apelante ser absolvida dos pedidos Reconvencionais contra si formulados.
I - Fundamentos que estão em oposição com a decisão:
a) A Douta Sentença considerou não provada a seguinte factualidade:
Relativamente à obra no Showroom, que: - haja má instalação dos rodapés… - haja erros na execução das casas de banho, que ainda estão por corrigir. - haja má aplicação do pavimento, que foi assumido pela Ré tendo esta garantido a sua correção. - A Ré tenha assumido ser responsável pela ocorrência da inundação.
b) Incorreta condenação da Ré nos seguintes pagamentos:
33. O valor dos trabalhos: De retificação de todo o pavimento dos escritórios e showroom ascende a € 9750+IVA De retificação dos rodapés ascende a € 1200 + IVA De resolução do problema elétrico da sala de reuniões ascende a € 600 + IVA De retificação das portas colocadas nos arrumos ascende a € 1500 + IVA De colocação das portas de correr da sala de reuniões do showroom ascende a € 2400 + IVA.
c) Olhando-se para a decisão recorrida e analisando-se a matéria de facto acima referida dada como provada e como não provada, existe uma contradição entre aqueles factos dados como provados e como não provados, pois não se dá como provada determinada factualidade e condena-se pela factualidade que foi dada como não provada.
B – COMUNS AO RECURSO SUBORDINADO E À RESPOSTA ÀS ALEGAÇÕES DA AUTORA
II – Incorreta interpretação e aplicação do direito no que concerne ao contrato de empreitada: a) O Tribunal decidiu: - “julgar a ação parcialmente procedente e em conformidade: (…) b) O Tribunal apresentou para tanto a seguinte fundamentação de direito: (…)
c) Apesar desta correta fundamentação legal, a Douta Sentença condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de € 19.003,05 (…), sem que a Autora, em primeiro lugar, exigisse da Ré a sua eliminação (nº1, 1ª parte do artigo 1221º do CC); não sendo esta exigência voluntariamente cumprida, a Autora devia exigir judicialmente à Ré, o seu cumprimento (nº1 do artigo 817º do CC); só após obtenção da decisão judicial que condene a Ré a eliminar os defeitos e esta se recusar a eliminá-los, então é que a Autora tem o direito de requerer que a eliminação dos defeitos seja levada a efeito por outrem à custa da a Ré. d) Não se trata de um caso urgente, pois os trabalhadores continuam a laborar no espaço intervencionado pela Ré, que até à data da audiência de julgamento, nada tinha sido reparado. e) Para exigir o pagamento do empreiteiro, a Autora deveria ter apresentado recibo, ou factura/recibo do empreiteiro que realizou as obras de reparação dos defeitos, com a despesa exacta do que foi gasto. f) Entende a Ré que, não tendo sido cumpridos estes preceitos legais, existe na Douta sentença, nesta situação, uma má aplicação do mesmo. g) Não devendo proceder o pedido pela A e reforçado em Recurso, devendo, igualmente, a Sentença ser alterada em conformidade.
III - Acertada condenação da Autora relativamente ao valor peticionado pela Ré na Reconvenção.
IV - Não aplicação da taxa de juros comercial. a) Não subsiste qualquer dúvida que se trata de uma dívida comercial, porque a obra executada pela Ré para a Autora e foi levada a cabo no exercício da sua actividade comercial. b) A Douta Sentença considera que “1. O objeto social da R. é a elaboração de projetos de engenharia, arquitetura, design, design de interiores e decoração, fiscalização de obras públicas e privadas, execução de obras públicas e privadas, consultoria técnica, formação profissional e técnica, prestação de serviços no domínio imobiliário, comercial, financeiro, compra e venda de imóveis e revenda de adquiridos para este fim, comercialização de produtos de design de interiores, decoração, mobiliário e materiais de construção”.”2. A Autora contactou a Ré para que esta lhe prestasse os seus serviços, para dar resposta a solicitações variadas e espaçadas no tempo, nomeadamente, na realização da obra no seu Showroom e Anexos”. c) Tratando de uma dívida comercial, porque a obra executada pela Ré para a Autora foi levada a cabo no exercício da actividade comercial da Ré, os juros a aplicar terão que ser juros comerciais, porque a dívida é comercial e o montante não pago é consequência de uma actividade comercial da Ré. d) A Douta Sentença condenou, desacertadamente, a Autora, apenas, no pagamento de juros civis. e) Apesar de não peticionados juros vencidos desde o vencimento das facturas não pagas e não os quantificando, os mesmos foram considerados na Douta Sentença “apenas desde a notificação do pedido reconvencional à Autora”, decisão do Tribunal que a Ré, igualmente, julga incorreto. f) Condenou a autora no pagamento do referido valor, não aplicando a taxa de juros comercial, porque a Ré, no entender do Tribunal, deveria ter quantificado os juros já vencidos à data da reconvenção, à taxa de juros comercial e solicitado o pagamento dos vincendos à mesma taxa, o que não fez. g) Não subsiste qualquer dúvida que se trata de uma dívida comercial, porque a obra executada pela Ré para a Autora e foi levada a cabo no exercício da sua actividade comercial. h) A Douta Sentença, condenando apenas a Autora no pagamento de juros civis, que a Ré desaprova, desrespeitou o preceituado no Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de maio.
A reapreciação da matéria de facto não provada, relativa à petição.
A resolução contratual e a mora. A exceção do não cumprimento.
A contradição na fixação do valor dos trabalhos (facto 33).
Os danos não patrimoniais.
Os juros comerciais da reconvenção.
A Recorrente questiona os factos não provados em 8, 12, 13, 14, 15, 17, 20, 24, 26, 31, 33, 40 a 45.
A Recorrente invoca os depoimentos de AA e BB e os 7 documentos juntos a 5.1.2022 e nº 2 com a réplica.
A prova disponível, a reconsiderar, está sujeita à livre apreciação do julgador.
Na reapreciação dos factos, o Tribunal da Relação altera a decisão proferida sobre a matéria de facto se a prova produzida, reapreciada a pedido dos interessados, impuser decisão diversa (art.662, nº1, do Código de Processo Civil).
Este tribunal forma a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos impugnados.
Lembremos, porém, que a aplicação do regime processual em sede de modificação da decisão da matéria de facto conta necessariamente com a circunstância de que existem fatores ligados aos depoimentos que, sendo passíveis de influir na formação da convicção, não passam nem para a gravação nem para a respectiva transcrição. É a imediação da prova que permite detetar diferenças entre os depoimentos, tornando possível perceber a sua maior ou menor credibilidade.
Reapreciada a prova indicada, não encontramos elementos convincentes para alterar o decidido, julgando assim improcedente a impugnação feita pela Recorrente.
Vejamos:
Importa considerar a diferença entre a má execução da obra contratada e a falta de reparação dos danos resultantes da inundação imputada à concreta falta de diligência da Ré.
Quanto à primeira (a má execução), o Tribunal recorrido apenas considerou o que consta do facto 25, não impugnado.
Com as provas agora relevadas pela Recorrente, e na natural dificuldade em distinguir o que resulta da má execução e da falta de diligência no caso da inundação, continua por demonstrar que, à exceção da deficiência elétrica (25), os restantes danos ou defeitos sejam também resultado da má ou da falta de execução contratada.
A esse respeito, os testemunhos não são minimamente precisos e os indicados documentos não nos ajudam.
De qualquer maneira, uns e outros danos estão na base da condenação da Ré.
Quanto aos danos sobre o funcionamento, os funcionários, os clientes e a imagem da Autora, ocorre também falta de prova, existindo insuficiência para o nosso convencimento com as declarações dos testemunhos indicados.
O local está em funcionamento. Não é ouvido um cliente. Não é concretizada uma falta de condição de trabalho (o BB nem ali trabalha) ou uma indisposição. As imagens disponíveis não apresentam uma gravidade que (não tenha sido minorada) que nos convença de um dano ao nível não patrimonial.
Pelo exposto, julgamos improcedente a impugnação feita pela Recorrente e decidimos manter a matéria de facto como fixada.
1. O objeto social da R. é a elaboração de projetos de engenharia, arquitetura, design, design de interiores e decoração, fiscalização de obras públicas e privadas, execução de obras públicas e privadas, consultoria técnica, formação profissional e técnica, prestação de serviços no domínio imobiliário, comercial, financeiro, compra e venda de imóveis e revenda de adquiridos para este fim, comercialização de produtos de design de interiores, decoração, mobiliário e materiais de construção.
2. A Autora contactou a Ré para que esta lhe prestasse os seus serviços, para dar resposta a solicitações variadas e espaçadas no tempo, nomeadamente, na realização da obra no seu Showroom e Anexos.
3. Em 22/10/2018 a R apresentou um orçamento para Projeto de Design de Interiores e Acompanhamento de Obra do Showroom, no valor de 3.750€ + IVA;
4. Que foi aceite pela A.
5. Em 16/01/2019, foi apresentado pela R., um orçamento para Remodelação de Showroom, no valor de 52.921,70€ + IVA;
6. O valor referido no artigo anterior, em 22/02/2019, foi retificado para 52.336,70€ + IVA e, desta vez, aceite pela A.
7. A obra do showroom foi adjudicada e iniciada em 6/3/2019.
8. Em 28/02/2019, foi efetuado o pagamento da fatura 132, que validou a adjudicação da obra correspondente à remodelação do Showroom.
9. Em 03/06/2019 foi efetuado e enviado à A. o auto de medição nº 1, que foi aceite por esta.
10. Em 05/06/2019 foi paga a fatura 135, no valor de € 24.858 descontado o valor da adjudicação.
11. No que concerne ao segundo auto de medição, da mesma obra, foi enviado no dia 23/07/2019.
12. Tendo sido emitida a fatura nº 156 (Doc. nº 22), no valor de 27.869,00€.
13. Em relação à qual foi pago o valor de € 16.376,58 em 08/08/2019.
14. Tendo o montante de €1.492,42 sido pago em 08.10.2019.
15. Desta fatura nº 156 está, ainda, por pagar a quantia de € 10.000,00.
16. A autora recebeu e pagou a totalidade da fatura nº 157 de setembro de 2019, no valor de € 9499,17 relativa à obra realizada no showroom.
17. Em 22/02/2019 a R. apresentou à A., que aceitou, um Orçamento para Mobiliário e Decoração de Showroom valor: 7.973,60€ + IVA.
18. Em 24/09/2019, foi apresentado pela R., um orçamento de extras de decoração de Showroom, no valor de 2.191,51€ + IVA.
19. Em 07/10/2019, a R. apresentou à A., um orçamento para Remodelação dos Anexos, no valor de 16.142,40€ + IVA.
20. O valor referido no artigo anterior foi alterado para 19.342,40€ + IVA.
21. Ao valor de 16.142,40€ + IVA, acresceu o montante de 3.200€, para trabalhos de demolições não incluídos na versão inicial.
22. Em 06/06/2020, a R apresentou à A. que o aceitou, um orçamento para Remodelação de Entrada de Showroom, no valor: 1.710,00€ + IVA.
23. A Ré emitiu e remeteu à Autora a fatura nº 174 de novembro de 2019 no valor de € 8.042,72 (oito mil e quarenta e dois euros e setenta e dois cêntimos) – correspondendo o valor de € 4.842,72 (quatro mil oitocentos e quarenta e dois euros e setenta e dois cêntimos) a trabalhos previstos no orçamento e € 3.200 ( três mil e duzentos euros) a custos extra não orçamentados - a fatura nº 179 de janeiro de 2020 no valor de € 8.021,28 (oito mil e vinte e um euros e vinte e oito cêntimos) e a fatura nº12 de novembro de 2020 no valor de € 3.828 (três mil oitocentos e vinte e oito euros).
24. Relativamente às faturas acima mencionadas, a Autora procedeu à liquidação da totalidade do valor das faturas nº 174 de novembro de 2019 e nº179 de janeiro de 2020 e não liquidou a fatura 12 de novembro de 2020.
25. Relativamente à obra no Showroom, denotaram-se os seguintes defeitos:
Falta a resolução do problema elétrico existente na sala de reuniões.
26. Em novembro de 2019, ocorreu uma inundação resultado da autuação da Ré que, retirou o telhado dos Anexos não tendo protegido a fachada do edifício do Showroom, colocando- o à mercê das condições climatéricas que, naquela altura do ano, são propensas à ocorrência de chuva, o que sucedeu.
27. Desta inundação resultaram diversos danos, nomeadamente nas portas de correr da sala de reuniões do Showroom e no pavimento e nos rodapés precisam de ser retificados.
28. A Autora informou de imediato a Ré da inundação, tendo remetido as imagens acima juntas através de e-mail datado de 22 de novembro de 2019.
29. A Ré assumiu a substituição das ditas portas, em e-mail remetido para a Autora em 03 de novembro de 2020, onde esta substituição surge como garantia de trabalho.
30. O levantamento da tampa de saneamento determinou a deterioração do pavimento.
31. Foi também possível verificar zonas empoladas e descascadas no pavimento em zonas onde a inundação não alcançou.
32. Na parte da obra realizada nos Anexos falta retificar as portas que ali foram montadas que estão impossíveis de abrir e fechar.
33. O valor dos trabalhos: de retificação de todo o pavimento dos escritórios e showroom ascende a € 9750+IVA; de retificação dos rodapés ascende a € 1200 + IVA; de resolução do problema elétrico da sala de reuniões ascende a € 600 + IVA; de retificação das portas colocadas nos arrumos ascende a € 1500 + IVA; de colocação das portas de correr da sala de reuniões do showroom ascende a € 2400 + IVA.
34. A Ré nunca procedeu às aludidas retificações.
35. A Autora comercializa materiais construtivos.
36. A aqui reconvinte, a solicitação da reconvinda, realizou para esta, os seguintes trabalhos: - Em 22/10/2018, proposta para Elaboração de Projeto de Design de interiores e Acompanhamento de Obra do Showroom, no montante de € 3.750 + IVA, que foi aceite pela A, tendo o trabalho sido iniciado em 23/10/2018 e concluído em 30/12/2018, valor que foi pago; - Em 22/02/2019, proposta para Remodelação de Showroom, no montante de € 52.336,70 + IVA, que foi aceite pela A, tendo o trabalho sido iniciado em 09/03/2019 e concluído em 10/10/2019, valor que foi apenas parcialmente pago; - Em 22/02/2019, proposta para Mobiliário e Decoração de Showroom, no montante de € 7.973,60 + IVA, que foi aceite pela A, tendo o trabalho sido iniciado em 31/05/2019 e concluído em 10/10/2019, valor que foi pago; - Em 24/09/2019, proposta para Extras de Decoração de Showroom, no montante de 2.191,51€ + IVA, que foi aceite pela A, tendo o trabalho sido iniciado em 02/10/2020 e concluído em 02/11/2020, valor que não foi pago; - Em 02/12/2019, proposta para Remodelação de Anexos, no montante de € 19.342,40 + IVA, que foi aceite pela A, tendo o trabalho sido iniciado em 02/12/2019 e concluído em 31/01/2020, valor que foi apenas parcialmente pago; - Em 06/06/2020, proposta para Remodelação de Entrada Exterior de Showroom, no montante de 1.710,00€ + IVA, que foi aceite pela A, tendo o trabalho sido iniciado em 06/10/2019 e concluído em 03/11/2020, valor que não foi pago.
37. A R. apresentou à A as seguintes faturas e notas de crédito:
Fatura Nº 119 em 27/12/2018, no valor de € 2767,50; Fatura Nº 127 em 27/02/2019, no valor de € 1845,00; Fatura Nº 132 em 27/02/2019, no valor de € 15700,00; Fatura Nº 135 em 31/05/2019, no valor de € 24858,00; Fatura Nº 137 em 31/05/2019, no valor de € 3800,00; Nota de Crédito Nº 6 em 31/05/2019, de valor € 15700,00 (Doc. nº 20); Fatura Nº 154 em 22/07/2019, no valor de € 2767,50; Fatura Nº 156 em 22/07/2019, no valor de € 27869,00; Fatura Nº 157 em 22/07/2019, no valor de € 9499,17; Nota de Crédito Nº8 em 22/07/2019, de valor € 2767,50; Nota de Crédito Nº10 em 04/09/2019, de valor € 3800,00; Fatura Nº P/10 em 28/09/2020, no valor de € 1480,00; Fatura Nº P/11 em 28/09/2020, no valor de € 2446,48; Fatura Nº P/12 em 28/09/2020, no valor de € 3828,00; Fatura Nº 174 em 29/11/2019, no valor de € 8042,72; Fatura Nº 179 em 07/01/2020, no valor de € 8021,28;
38. Por carta datada de 7/1/2021, recebida pela autora em 11/1/2021, foi solicitado o pagamento pelo advogado da reconvinte, para efetuar o pagamento, acrescido dos juros.
39. A autora enviou à ré a carta datada de 8 de fevereiro de 2021, reclamando a resolução imediata de defeitos de obra e solicitando a conclusão da obra.
Não está demonstrado um incumprimento definitivo.
Perante a inércia da Ré, a Autora não procedeu a uma interpelação admonitória daquela (art.808º do Código Civil).
São requisitos desta interpelação:
A intimação para o cumprimento;
A fixação de um termo peremptório para o cumprimento;
A cominação de que a obrigação se terá por definitivamente não cumprida se não se verificar o cumprimento dentro do prazo.
Ora, a última atitude conhecida da Autora é a sua carta de 8.2.2021, a denunciar defeitos e a conceder um prazo para a reparação daqueles.
A Autora não declara a referida cominação.
No âmbito da perda de interesse na prestação, não existe qualquer facto provado que permita chegar a essa conclusão.
A perda do interesse na prestação é apreciada objetivamente.
O que se constata é que a Autora, tendo o local em funcionamento, mantem interesse na reparação dos defeitos, mas prefere receber da Ré uma indemnização.
Objetivamente, o que releva é a possibilidade dos danos serem reparáveis, sendo certo que não ficou provado uma inadequação da obra ao fim a que se destina ou uma falta de qualidade essencial/estrutural.
A resolução do contrato, prevista no art.1222º do Código Civil, só existe se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina.
Também não está expresso nos factos provados uma clara e inequívoca vontade da Ré de não querer cumprir. Ou uma urgência na reparação dos defeitos, tanto que está por realizar.
Já no processo, o conflito das partes incidiu também sobre os termos em que ocorreu a inundação. A recusa da Ré pode ser interpretada parcialmente como tendo por pressuposto a prévia definição do que realmente ocorreu. O pressuposto da sua atitude pode ser o litígio a respeito dos defeitos realmente imputáveis a si.
Perante a factualidade, não sendo inequívoca uma definitiva recusa da Ré na eliminação dos defeitos provados, não estando provada uma inadequação da obra ao fim a que se destina, não se justificando a resolução, a Ré encontra-se ainda em mora, no âmbito de uma relação ainda sustentável.
O empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o convencionado e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato – artigo 1208º do Código Civil.
Provados os defeitos, o empreiteiro, para afastar a sua responsabilidade, terá de demonstrar que o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua, continuando a funcionar a presunção de que o devedor da prestação é o culpado, por força do artigo 799º, nº1 do Código Civil.
O direito de eliminação dos defeitos é, em princípio, independente de culpa do empreiteiro, desta dependendo apenas a sua obrigação de indemnizar.
No caso, não está em causa a obrigação da Ré reparar os defeitos provados. O que está em causa é o direito a uma indemnização equivalente ao gasto que os Autores terão, para realizar a reparação por si ou por terceiro.
Os direitos concedidos ao dono da obra pelos arts. 1221 (eliminação dos defeitos ou nova construção), 1222 (redução do preço ou resolução do contrato) e 1223 (indemnização nos termos gerais), do Código Civil, são exercidos sucessivamente e pela ordem em que são reconhecidos.
Em nome da conservação do negócio jurídico, “enquanto o cumprimento da prestação acordada for possível, mediante a eliminação do defeito ou através da sua substituição, não pode estar aberto o caminho para a resolução do contrato, nem para a redução do preço” (Cfr., Pedro Romano Martinez, in “Cumprimento Defeituoso, em Especial na Compra e Venda e na Empreitada”, páginas. 439 e 440.)
Só no caso do empreiteiro, por impossibilidade, desproporcionalidade ou recusa, não renovar o cumprimento em conformidade com o contrato, nos termos devidos, é que o dono da obra pode exigir uma redução adequada da sua contraprestação ou a resolução do contrato por incumprimento.
Aceita-se, em determinadas condições, que o dono da obra terá direito à eliminação dos defeitos a efetuar por terceiro, nomeadamente através da condenação do empreiteiro no reembolso dos montantes que houver ou venha despender para eliminar os defeitos.
Porém, o direito de indemnização previsto no artigo 1223º do Código Civil é residual e complementar relativamente ao direito de eliminação dos defeitos. O dono da obra só tem direito de indemnização relativamente aos prejuízos que não obtiveram reparação através do exercício daquele outro direito, pelo que só pode ser exercido, cumulativa ou isoladamente, nas hipóteses em que se revela o único meio de reparação do prejuízo resultante da existência do defeito.
Como assinala o acórdão da Relação do Porto, de 28.3.2012, no processo 621/09 (em www.dgsi.pt), “O direito à indemnização, nos termos do artº 1223º, tem apenas em vista os danos que não podem ser ressarcidos através da eliminação dos defeitos, ou da construção de novo da obra, ou da redução do preço. Tratando-se de danos compensáveis por estes meios, é deles que o lesado se deve socorrer e não do pedido de indemnização nos termos gerais, que apenas respeita àqueles danos que não estão numa conexão «imediata» com o cumprimento defeituoso, mas que são causados por outro acontecimento que está com o cumprimento defeituoso só numa conexão «mediata», como acontece, por exemplo, com os danos resultantes da mora no cumprimento, os causados à pessoa do dono da obra ou a outros bens jurídicos dele, os resultantes da deformidade da obra, não eliminável ou cuja eliminação não tenha sido pedida, mas que não lhe diminua o valor ou o rendimento, os resultantes da violação contratual positiva, isto é, do imperfeito ou defeituoso cumprimento, de tal maneira que semelhante direito à indemnização terá uma função complementar ou integradora dos outros direitos conferidos ao dono da obra pelos citados arts. 1221º e 1222º, servindo apenas apara reparar aqueles danos que o exercício destes direitos não reparasse (citado acórdão Ac. STJ de 14/3/95)”.
Assim, as partes continuam vinculadas ao contrato.
A Ré está em mora na conclusão do contrato e na reparação dos danos a si imputados (factos 25 a 27).
Sendo assim, a reparação dos defeitos deve ser feita pela Ré.
“A lei supõe uma condenação prévia do empreiteiro, na sequência da qual o dono pode exigir a eliminação do defeito ou a nova construção por terceiro, à custa do devedor, ou a indemnização pelos danos sofridos.” (P. de Lima, A. Varela, Código Civil Anotado, vol. II, 3ª edição, página 820; ver também página 823.)
A Autora não tem direito (imediato) à indemnização porque os danos invocados serão compensáveis através da condenação do empreiteiro na eliminação dos defeitos. O problema é que a Autora não pediu esta condenação.
Por isso, nesta parte, impõe-se a absolvição da Ré do pedido de indemnização.
O tribunal recorrido entendeu que sim, mas nós entendemos que não.
Conforme o artigo 428.º, nº1, do Código Civil, “se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo.”
“A exceptio não funciona como uma sanção, mas apenas como um processo lógico de assegurar, mediante o cumprimento simultâneo, o equilíbrio em que assenta o esquema do contrato bilateral. Por isso ela vigora, não só quando a outra parte não efectua a sua prestação” (…), como vale para o caso “de cumprimento parcial ou defeituoso, desde que a sua invocação não contrarie o princípio geral da boa fé consagrado nos artigos 227º e 762º, nº2.” (P. de Lima, A. Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 3ª edição, página 381.)
As obrigações das partes resultantes do acordo são sinalagmáticas.
Sinalagma é o vínculo que liga as obrigações, tornando-as interdependentes; é o vínculo que gera a reciprocidade e torna as prestações correlativas.
O contrato é bilateral e as prestações de realizar a obra e pagar o preço (art.1207º do Código Civil) são interdependentes.
No caso é suposto que a Ré terminava a obra e, recebendo-a, a Autora pagaria o preço em dívida (art.1211º, nº2, do Código Civil).
Todavia, a Ré não completou a obra e deixou-a defeituosa.
A obra tem-se por não realizada e a Ré está em mora.
Faz assim todo o sentido que a Autora recuse pagar o restante do preço, pelo menos enquanto a situação não estiver regularizada.
Não sendo entendido assim, o pedido da Ré, para pagamento imediato do restante preço, quando deixou a obra no estado provado, constitui um exercício ilegítimo do respetivo direito, por estar a exceder manifestamente os limites impostos pela boa fé. (cfr. art. 334º do Código Civil.)
Esta questão da Ré fica prejudicada porque se entendeu que a Autora não tem direito (imediato) à indemnização, nesse valor.
Esta questão, com a reapreciação da matéria de facto, assentava num pressuposto de facto, não demonstrado.
Com efeito, não se mostram provados factos que constituam dano moral ou não patrimonial, com gravidade relevante.
São indemnizáveis, com base na equidade, os danos não patrimoniais que “pela sua gravidade mereçam a tutela do direito” – nºs 1 e 3 do art. 496º do Código Civil.
Como entendeu o Tribunal recorrido, “reconhece-se que a Autora certamente se sente frustrada pela atuação da Ré, mas não foi feita prova concreta de factos passíveis de serem considerados danos graves, pois só esses despoletam a condenação do lesante no pagamento de quantia que os compense.”
Esta questão da Ré fica prejudicada porque se entendeu que ela não tem direito (imediato) ao restante do preço, enquanto não finalizar a obra e reparar os danos.
De qualquer maneira, conforme jurisprudência do STJ, de 19.9.2024 (proc. 258/09, em www.dgsi.pt), em face do seu pedido, não são esses os juros reclamados.
Julgam-se os recursos parcialmente procedentes e, em consequência, mantendo o demais decidido:
Absolve-se a Ré do pedido indemnizatório feito pela Autora;
Absolve-se a Autora do pedido reconvencional relativo ao preço por liquidar.
Custas da ação pela Autora e custas da reconvenção pela Ré.
Custas do recurso da Autora, por esta. Custas do recurso da Ré, por esta.
Coimbra, 2025-04-29
(Carlos Moreira)
(Alberto Ruço)