PROVA PERICIAL
ADMISSIBILIDADE
IMPERTINÊNCIA
DILATÓRIA
Sumário

I – A prova pericial, procurando demonstrar a realidade dos factos alegados pelas partes, tem a especificidade de trazer a sua percepção ou apreciação feita por meio de peritos e pode ser produzida sempre que sejam necessários conhecimentos especiais ou especializados que os julgadores não possuam (em áreas técnicas, científicas ou artísticas) ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objecto de inspecção judicial.
II - A perícia pode assim ser opinativa - em que o(s) perito(s) se limita(m) a dar a sua opinião valorativa a partir de factos apurados no processo- ou investigatória - quando o seu objecto é a verificação da exatidão de enunciado(s) fáctico(s) formulado(s) pela(s) parte(s), podendo ter como objecto factos, máximas de experiência e prova sobre prova.
III - Para regular adjectivamente esta matéria, o Código de Processo Civil dedica-lhe o Capítulo IV (Prova Pericial), do Título IV (Da Instrução do Processo), do Livro I (Da Acção, das Partes e do Tribunal): os artigos 467.º a 489.º.
IV – Por aplicação do dever de gestão processual (artigo 6.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), o n.º 1 do artigo 476.º do Código de Processo Civil, prevê que a prova pericial não seja admitida indiscriminadamente, sendo julgada impertinente ou dilatória quando não respeite a factos condicionantes da decisão final ou porque, quando a eles respeite, o respectivo apuramento não dependa de prova pericial (por não estar em causa o tipo de conhecimentos referido em I).
V – Em abstracto, nada obsta a que um/a Autor/a requeira a realização de uma perícia para o apuramento dos danos que tivesse sofrido e dos quais pretendesse ser indemnizado/a, sendo, para o efeito, irrelevante que o facto ilícito (contratual ou delitual) que lhe tivesse dado origem, estivesse ou não dado como provado: a responsabilidade civil tem os seus pressupostos e requisitos e todos têm de ser provados.
VI - A circunstância de a perícia pretendida assentar num facto controvertido (o facto ilícito) não torna - à partida - impertinente nem dilatória a sua realização (que tenha como objecto a delimitação/quantificação dos danos originados).
VII – Para a verificação da admissibilidade da perícia releva o conhecimento do pedido formulado, a causa de pedir invocada, a concreta factualidade alegada na acção, o Objecto do Processo definido, os Temas de Prova seleccionados, e a delimitação da perícia com a definição das questões de facto que se pretendam ver esclarecidas (cfr. o n.º 1, do artigo 475.º do Código de Processo Civil).
VIII – A prova pericial é um meio de prova e não serve como forma de suprir a omissão de alegações da(s) parte(s).
IX - O objectivo da perícia é dar resposta a questões concretas e não a produzir exercícios especulativos (e, por isso se baseia em factos alegados).
X – Deve ser indeferida a prova pericial requerida aquando da Audiência Prévia, quando não respeitar a factos devidamente alegados e, como tal relevantes para a decisão da causa atento o objecto definido (por impertinência) e porque a factualidade alegada pelo requerente, para a sua prova – nos termos em que foi feita – não exige o tipo de conhecimento especial que está inerente à produção de prova pericial e, como tal, apenas geraria atraso no processo (por ser dilatória).
Da responsabilidade do Relator, em conformidade com o n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil.

Texto Integral

Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa[1]

Relatório
C, Lda. instaurou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra E, S.A. e D, S.A. peticionando a condenação destas a pagar solidariamente, uma indemnização de €4.330.123,92, acrescida dos respectivos juros moratórios, à taxa de juros comerciais, contados desde a data da citação e até integral pagamento.
Alega, em suma, a Autora, que:
- contratualizou com a E – primeiramente, em 01/04/2016 e, depois, em 20/05/2016 e 23/06/2017 -, o fornecimento de energia elétrica ao seu estabelecimento de restauração e bebidas, padaria e pastelaria (entre outras actividades) sito na Av. António Serpa, n.º 32, em Lisboa, obrigando-se esta a fornecer-lhe, ainda que em termos médios, uma potência de 41,4 KVA e, subsequentemente, de 100 KVA e de 160 KVA;
- ao ter-lhe cobrado, em 16/10/2016 e 20/06/2017, o total de € 1.565,03 (€1.310,11 + € 254,92), a título de comparticipação nas redes e de serviços de ligação à rede de Baixa Tensão, a Recorrida D (então E) estava legal e contratualmente obrigada a inteirar-se sobre se as infraestruturas de fornecimento de energia eléctrica que serviam o seu estabelecimento reuniam as condições para esse fim e, na negativa, a diligenciar com vista a assegurar essas condições;
- a E nunca forneceu à Recorrente nem a potência de 41,4 KVA inicialmente contratada, nem as potências de 100 KVA e de 160 KVA que subsequentemente se obrigou a fornecer ao estabelecimento da mesma;
- a D apenas em Novembro de 2019 assegurou as condições para a regularização do fornecimento de energia eléctrica ao estabelecimento da Autora, uma vez que somente no período entre Dezembro de 2017 e Agosto de 2018 procedeu à execução da obra de reforço do posto de transformação de distribuição (PTD) que alimenta a instalação do dito estabelecimento;
- as condutas das Recorridas, porque violadoras das obrigações contratuais a que se vincularam perante a Recorrente, foram directamente causadoras de prejuízos na esfera jurídica da mesma, pelo que geradoras de responsabilidade civil contratual e, consequentemente, do correspectivo dever de indemnizar (cfr. artigos 798.º e 799.º e 483.º, n.º 1, do Código Civil);
- os seus danos emergentes e lucros cessantes reclamados, decorrem do plano de negócios por si concebido para a exploração do estabelecimento, que previa um volume de vendas de € 1.560.000 em 2016, de € 2.250.000 em 2017, de € 2.832.750 em 2018 e de € 3.423.775 em 2019, o que corresponderia a um resultado líquido projectado de € 359.544 (em 2016), de € 488.088 (em 2017), de € 691.590 (em 2018), e de € 924.785 (em 2019).
- em consequência do incumprimento pelas Rés das suas obrigações contratuais para com a Recorrente, consubstanciado, respectivamente, no não fornecimento da potência com a mesma contratada em 01/04/2016, 20/05/2016 e 23/06/2017, e na não realização, no tempo devido, da obra de reforço do posto de transformação de distribuição (PTD) que alimenta a instalação do estabelecimento da Recorrente, de modo a possibilitar o fornecimento da potência contratada e o pleno exercício da sua actividade no local, esta viu-se impossibilitada de realizar o volume de vendas projectado para o estabelecimento no período compreendido entre 2016 e 2019, bem como de obter o resultado líquido previsto para esses quatro anos;
- em resultado do incumprimento das Rés o volume de vendas realizado pela Recorrente entre 2016 e 2019 foi de € 586.119,20 em 2016, de € 753.645,96 em 2017, de €740.596,60 em 2018, e de € 592.887,07 em 2019, o que se traduziu num resultado líquido de € 3.711,63, em 2016, de € 3.278,46 em 2017, de € 10.964,50 em 2018, e de € 12.563,52 em 2019;
- a Autora teve um prejuízo, nos anos 2016 a 2019, no valor de €4.328.558,89;
- atendendo a que, em 16/10/2016 e 20/06/2017, a autora pagou à Ré D o total de € 1.565,03 (€ 1.310,11 + € 254,92), a título de comparticipação nas redes e de serviços de ligação à rede de Baixa Tensão – quantia essa que se veio a concluir não ter tido qualquer utilidade ou necessidade associada (pois, apenas em Novembro de 2019 criou as condições para regularizar o fornecimento de energia ao seu estabelecimento impõe-se concluir que, para além dos lucros cessantes que a mesma deixou de obter em consequência da conduta das Recorridas, a mesma sofreu também um dano emergente de €1.565,03.

Citadas as Rés vieram apresentar Contestações:
- E, S.A. defendendo a improcedência da acção;
- a D, S.A. defendendo a improcedência da acção e, por cautela, a intervenção nos autos da Seguradora F, como sua associada.

Admitida a intervenção e citada a chamada, veio a F apresentar Contestação, na qual conclui pela improcedência da acção e requer a condenação da Autora como litigante de má fé.

Realizada Audiência Prévia, nela foi proferido Despacho Saneador, relegado para final o conhecimento de excepções de ilegitimidade da E, de ilegalidade do litisconsórcio passivo e de prescrição, fixado o valor da causa (€ 4.330.123,92), identificado o objecto do litígio[2], e seleccionados os Temas da Prova[3].
No decurso da Audiência Prévia, a Autora alterou o seu requerimento probatório, requerendo a produção de prova pericial colegial e propondo as questões que haveria de ter como objecto[4].
Concedido às Rés, prazo para se pronunciarem sobre a admissibilidade da prova pericial, seu eventual alargamento e perito a nomear, ambas se vieram a opor (pugnando, subsidiariamente, pela ampliação do seu objecto).

A 17 de Fevereiro de 2025 o Tribunal a quo proferiu o seguinte Despacho:
“Na sequência da enunciação dos temas da prova, requereu a. a produção de prova pericial à matéria constante dos art.º 33º e 70º a 77º da Petição inicial.
Requereu que a perícia fosse colegial e indicou os seguintes quesitos:
1- O não fornecimento ao estabelecimento da Autora da potência eléctrica contratada em Abril de 2016 e Junho de 2017 respectivamente de 100kva e 160 kva constitui um factor limitador da sua actividade económica?
2- Na positiva, ele é susceptível de reduzir a actividade desenvolvida pela Autora no seu estabelecimento a 27%?
3- Dada a natureza da actividade comercial que Autora se propunha desenvolver no seu estabelecimento, a localização e as características do mesmo, bem como o modelo de negócio para este estabelecido, a mesma poderia ter atingindo um volume de vendas de 1.560.000,00 euros em 2016 de 2.250.000,00 euros em 2017 e 2.832.750,00 euros em 2018 e de 3.423.775,00 euros em 2019?
4- Na positiva, esse volume de vendas corresponderia a um resultado líquido projectado de 359.544,00 euros em 2016 de 488.088,00 euros em 2017 de 691.590,00 euros 2018 e de 924.785,00 euros em 2019?
5- Na negativa, qual o volume de vendas que a Autora poderia ter atingido em cada um desses anos e qual o correspondente resultado líquido expectável?
6- O volume de vendas realizado pela Autora entre 2016 e 2019 foi de 586.119,20€ em 2016, de 753.645,96€ em 2017, de 740.596,60€ em 2018 e de 592.887,07€ em 2019?
7- Na positiva, isso traduziu-se no resultado líquido de 3.711,63€ em 2016, 3.278,46€ em 2017, de 10.964,50€ em 2018 e de 12.563,52€ em 2019?
8- Na negativa, qual foi o volume de vendas realizado pela Autora nos anos de 2016 a 2019 e qual o correspondente resultado líquido em cada um desses anos?

A interveniente F, S.A. veio pronunciar-se referindo que a. pretende ver submetidas à apreciação de peritos formulações conclusivas que não consubstanciam factos; que não requerem conhecimentos técnicos, mas antes uma análise circunstanciada dos factos ocorridos e aos quais os peritos não assistiram, designadamente saber se entre Abril de 2016 e Janeiro de 217 o estabelecimento laborou com limitações decorrente da corrente fornecida. Acresce que se dá como premissa matéria controvertida: o não fornecimento ao estabelecimento da potência contratada.
Conclui que a perícia requerida deve ser indeferida por os quesitos não conterem questões de facto.
Sem conceder entende que apenas os quesitos 6, 7 e 8 poderão ser susceptíveis de resposta objectiva mediante a análise da contabilidade da A..
Requer que, caso a perícia seja deferida quanto a estes quesitos que seja ampliado o objecto da perícia por forma a considerar os anos de 2020 a 2024 dado que só assim será possível fazer uma análise comparativa do funcionamento do estabelecimento.

A Ré E, S.A. veio também requer que não seja admitida a perícia relativamente aos quesitos 2 a 5 porquanto não foi alegado qualquer facto susceptíveis de serem provados por estes quesitos, sendo, assim, irrelevantes para a decisão do pleito.
Subsidiariamente, caso se admita a perícia nos termos requeridos, requer a ampliação do objecto da perícia, aditando novos quesitos.

A Ré D pugna pela inadmissibilidade da perícia alegando que não se mostram alegados factos que fundamentem a realização da perícia, sendo até desconhecido o modelo de negócio da A. desenvolvido no estabelecimento em causa.
Considera que a perícia requerida é impertinente devendo ser indeferida.
Sem prescindir e subsidiariamente, caso a perícia venha a ser admitida pretende ampliar o objecto da perícia indicando novos quesitos.

Cumpre decidir:
Estabelece o art.º 475º do CPC que “Ao requerer a perícia a parte indica logo, sob pena de rejeição, o respectivo objecto, enunciando as questões de facto que pretende ver esclarecidas através da diligência” e acrescenta o n.º 2 que “A perícia pode reportar-se, quer aos factos articulados pelo requerente quer aos alegados pela parte contrária”.
Quanto à finalidade, dispõe o art.º 388.º do CCiv. que a prova pericial tem por fim a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objecto de inspecção judicial.
Nos termos do art.º 476.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a contrario, conclui-se que o juiz deve indeferir a diligência probatória, se entender que a perícia é “impertinente” ou “dilatória”.
Será impertinente se não respeitar aos factos da causa, será dilatória se não obstante versar sobre os factos da causa, o seu apuramento não requerer o meio de prova pericial, por não estarem em causa conhecimentos especiais que a mesma pressupõe, tornando tal prova desnecessária.

Ora, compulsados os autos verifica-se que, por um lado, como referido pelas RR., a perícia pretendida parte de um facto que se mostra, ainda, controvertido – da falta de fornecimento pela 1ª Ré da potência eléctrica contratada – e que, como tal, não pode servir de premissa à apreciação dos Srs. Peritos.
Por outro lado, no que respeita aos quesitos 6, 7 e 8, a resposta aos mesmos não necessita de prova pericial podendo ser provados mediante a análise da documentação contabilística da Autora, donde decorrerá o volume de vendas e o resultado líquido obtido pela A. sem que, para concluir por tais elementos, seja necessário conhecimentos especiais.
Assim, afigura-se que a diligência requerida se afigura impertinente e dilatória, motivo pelo qual se indefere a mesma, nos termos do referido artigo 476º, n.º 1 do Código de Processo Civil a contrario.
Notifique”.

É desta Decisão que vem pela Autora interposto Recurso de Apelação, tendo apresentado Alegações culminadas com as seguintes Conclusões:
A- Vem o presente recurso interposto da decisão interlocutória proferida em 17/02/2025 que, mediante o despacho com a Ref. n.º 441942708, indeferiu a produção da prova pericial requerida pela Recorrente na Audiência Prévia realizada em 08/10/2024.
B- A Recorrente discorda de tal decisão, pois considera que a mesma constrange, de forma ilegal, o direito que lhe assiste de recorrer ao meio de prova tido como necessário ao esclarecimento e à comprovação dos factos que alega, assim violando o disposto nos artigos 475.º, n.º 1, 410.º e 411.º do CPC e, dessa forma, o direito fundamental à prova inerente ao direito à tutela jurisdicional efectiva consagrado no artigo 20.º da CRP.
C- A Recorrente intentou a acção declarativa sub judice pedindo a condenação solidária das Recorridas a pagarem-lhe uma indemnização no valor global de €4.330.123,92, acrescida dos juros moratórios, à taxa de juros comerciais, desde a data da citação e até integral pagamento, correspondente aos danos emergentes e aos lucros cessantes derivados da conduta das Recorridas.
D- Para tanto, e em síntese, alegou ter contratualizado com a Recorrida E – primeiramente, em 01/04/2016 e, depois, em 20/05/2016 e 23/06/2017 -, o fornecimento de energia elétrica ao seu estabelecimento de restauração e bebidas, padaria e pastelaria (entre outras actividades) sito na Av. António Serpa, n.º 32, em Lisboa, tendo a Recorrida, dessa forma, se obrigado a fornecer-lhe, ainda que em termos médios, uma potência de 41,4 KVA e, subsequentemente, de 100 KVA e de 160 KVA.
E- Mais alegou, no que tange à Recorrida D (então E) que, ao ter-lhe esta cobrado, em 16/10/2016 e 20/06/2017, o total de € 1.565,03 (€1.310,11 + € 254,92), a título de comparticipação nas redes e de serviços de ligação à rede de Baixa Tensão, a mesma estava legal e contratualmente obrigada a inteirar-se sobre se as infraestruturas de fornecimento de energia eléctrica que serviam o seu estabelecimento reuniam as condições para esse fim e, na negativa, a diligenciar com vista a assegurar essas condições.
F- Sucede que, a Recorrida E nunca forneceu à Recorrente nem a potência de 41,4 KVA inicialmente contratada, nem as potências de 100 KVA e de 160 KVA que subsequentemente se obrigou a fornecer ao estabelecimento da mesma.
G- E a Recorrida D apenas em Novembro de 2019 assegurou as condições para a regularização do fornecimento de energia eléctrica ao estabelecimento da Recorrente, uma vez que, conforme reconhecido pela própria Recorrida em 05/08/2020, somente no período entre Dezembro de 2017 e Agosto de 2018 procedeu à execução da obra de reforço do posto de transformação de distribuição (PTD) que alimenta a instalação do estabelecimento da Recorrente.
H- Porque violadoras das obrigações contratuais a que se vincularam perante a Recorrente, as condutas das Recorridas foram directamente causadoras de prejuízos na esfera jurídica da Recorrente, pelo que geradoras de responsabilidade civil contratual e, consequentemente, do correspectivo dever de indemnizar (cfr. artigos 798.º e 799.º e 483.º, n.º 1, do Código Civil).
I- Para concretização dos danos emergentes e dos lucros cessantes reclamados, a Recorrente alegou, em síntese, os seguintes factos:
J- Que, no plano de negócios por si concebido, para a exploração do seu estabelecimento, previa ter um volume de vendas de € 1.560.000,00 em 2016, de € 2.250.000,00 em 2017, de € 2.832.750,00 em 2018 e de € 3.423.775,00 em 2019;
K- Esse volume de vendas corresponderia a um resultado líquido projectado de €359.544,00 em 2016, de € 488.088,00 em 2017, de € 691.590,00 em 2018, e de €924.785,00 em 2019;
L- O incumprimento pelas Recorridas das suas obrigações contratuais para com a Recorrente, traduzido, respectivamente, no não fornecimento da potência com a mesma contratada em 01/04/2016, 20/05/2016 e 23/06/2017, e na não realização, no tempo devido, da obra de reforço do posto de transformação de distribuição (PTD) que alimenta a instalação do estabelecimento da mesma, de modo a possibilitar o fornecimento da potência contratada e o pleno exercício da sua actividade no local, impossibilitou a Recorrente de realizar o volume de vendas projectado para o estabelecimento no período compreendido entre 2016 e 2019, bem como de obter o resultado liquido previsto para esses quatro anos;
M- Em resultado do incumprimento das Recorridas, o volume de vendas realizado pela Recorrente entre 2016 e 2019 foi de € 586.119,20 em 2016, de €753.645,96 em 2017, de €740.596,60 em 2018, e de € 592.887,07 em 2019;
N- O que se traduziu num resultado líquido de € 3.711,63, em 2016, de € 3.278,46 em 2017, de € 10.964,50 em 2018, e de € 12.563,52 em 2019;
O- Daqui resultando que a Recorrente teve um prejuízo, nos anos 2016 a 2019, no valor de €4.328.558,89;
P- Por outro lado, atendendo a que, em 16/10/2016 e 20/06/2017, a Recorrente pagou à Recorrida D o total de € 1.565,03 (€ 1.310,11 + € 254,92), a título de comparticipação nas redes e de serviços de ligação à rede de Baixa Tensão – quantia essa que se veio a concluir não ter tido qualquer utilidade ou necessidade associada, uma vez que, como reconhecido pela própria Recorrida, apenas em Novembro de 2019 a mesma criou as condições para regularizar o fornecimento de energia ao seu estabelecimento -, conclui-se que, para além dos lucros cessantes que a mesma deixou de obter em consequência da conduta das Recorridas, a mesma sofreu também um dano emergente de €1.565,03;
Q- As Recorridas causaram, assim, à Recorrente prejuízos que totalizam €4.330.123,92 (quatro milhões trezentos e trinta mil cento e vinte e três euros e noventa e dois cêntimos).
R-Por despacho proferido na Audiência Prévia realizada em 08/10/2024, nos termos e para os fins estabelecidos no artigo 591.º, n.º 1, alíneas a) a g), do CPC, o Tribunal a quo fixou o objecto do litígio e os enunciou os temas da prova.
S- O objecto do litígio foi fixado nos seguintes termos:
“Direito da Autora a receber das Rés, solidariamente, as quantias peticionadas a título de indemnização por incumprimento contratual.”
T- Os temas da prova estabelecidos foram os seguintes: “(…)
1. Dos contratos celebrados entre a Autora e as Rés: tempo, modo e respectiva produção de efeitos;
2. Das quebras de energia e consequente limitação da actividade comercial desenvolvida pela Autora;
3. Da falta de fornecimento pela 1ª Ré da potência contratada pela Autora;
4. Dos prejuízos sofridos pela Autora: volume de vendas realizado entre 2016 e 2019 e volume projectado para o mesmo período;
5. Das objecções por parte da D à activação do fornecimento de energia pretendido pela Autora;
6. Da actividade desenvolvida por cada uma das Rés e sua relação com os consumidores de energia eléctrica;
7. Da postura processual da Autora para efeito de apreciação da litigância de má-fé.”
U- No exercício da faculdade prevista no artigo 598.º, n.º 1, do CPC, a Recorrente requereu nessa sede a alteração do seu requerimento probatório e, atentos os temas da prova, e por se lhe afigurar pertinente para prova dos danos patrimoniais alegados, bem como à sua quantificação, requereu a produção de prova pericial colegial, subordinada à matéria alegada nos artigos 33.º e 70.º a 77.º da PI, enunciando, para tanto, nos termos do disposto no artigo 475.º, n.º 1, do CPC, as seguintes de questões de facto:
“(…)
1. O não fornecimento ao estabelecimento da Autora da potência eléctrica contratada em Abril de 2016 e Junho de 2017 respectivamente de 100kva e 160 kva constitui um factor limitador da sua actividade económica?
2. Na positiva, ele é susceptível de reduzir a actividade desenvolvida pela Autora no seu estabelecimento a 27%?
3. Dada a natureza da actividade comercial que Autora se propunha desenvolver no seu estabelecimento, a localização e as características do mesmo, bem como o modelo de negócio para este estabelecido, a mesma poderia ter atingindo um volume de vendas de 1.560.000,00 euros em 2016 de 2.250.000,00 euros em 2017 e 2.832.750,00 euros em 2018 e de 3.423.775,00 euros em 2019?
4. Na positiva, esse volume de vendas corresponderia a um resultado líquido projectado de 359.544,00 euros em 2016 de 488.088,00 euros em 2017 de 691.590,00 euros 2018 e de 924.785,00 euros em 2019?
5. Na negativa, qual o volume de vendas que a Autora poderia ter atingido em cada um desses anos e qual o correspondente resultado líquido expectável?
6. O volume de vendas realizado pela Autora entre 2016 e 2019 foi de 586.119,20€ em 2016, de 753.645,96€ em 2017, de 740.596,60€ em 2018 e de 592.887,07€ em 2019?
7. Na positiva, isso traduziu-se no resultado líquido de 3.711,63€ em 2016, 3.278,46€ em 2017, de 10.964,50€ em 2018 e de 12.563,52€ em 2019?
8. Na negativa, qual foi o volume de vendas realizado pela Autora nos anos de 2016 a 2019 e qual o correspondente resultado líquido em cada um desses anos?”
V- Ouvidas as Recorridas e a Chamada F, todas se pronunciaram no sentido do indeferimento da realização da perícia, pugnando, subsidiariamente, pela ampliação do seu objecto.
W- Mediante o despacho recorrido, foi decidido pela Mm.ª Juíza a quo o seguinte: “(…) compulsados os autos verifica-se que, por um lado, como referido pelas RR., a perícia pretendida parte de um facto que se mostra, ainda, controvertido – da falta de fornecimento pela 1ª Ré da potência eléctrica contratada- e que, como tal, não pode servir de premissa à apreciação dos Srs. Peritos.
Por outro lado, no que respeita aos quesitos 6, 7 e 8, a resposta aos mesmos não necessita de prova pericial podendo ser provados mediante a análise da documentação contabilística da Autora, donde decorrerá o volume de vendas e o resultado líquido obtido pela A. sem que, para concluir por tais elementos, seja necessário conhecimentos especiais.
Assim, afigura-se que a diligência requerida se afigura impertinente e dilatória, motivo pelo qual se indefere a mesma, nos termos do referido artigo 476º, n.º 1 do Código de Processo Civil a contrario”.
X- Ora, tal decisão constrange, ilicitamente, o direito à prova que assiste à Recorrente, violando, ostensivamente, o disposto nos artigos 475, n.º 1, 410.º e 411.º do CPC e, desse modo, o direito à tutela jurisdicional efectiva.
Y-Desde logo, porque, contrariamente ao entendido pela Mm.ª Juíza a quo, a circunstância de a perícia requerida partir de um facto controvertido – a falta de fornecimento pela 1ª Ré (Recorrida E) da potência eléctrica contratada com o Recorrente –, não torna impertinente, nem dilatória a sua realização.
Z- Antes pelo contrário: é também por tal facto se mostrar, ainda, controvertido – na óptica das Recorridas – que o mesmo carece de prova.
AA- Ora, tendo a instrução por objecto os temas da prova (cfr. artigo 410.º do CPC), apenas os factos controvertidos carecem de ser provados, pelo que é sobre estes que os meios de prova têm de incidir (cfr. artigos 411.º, 412.º e 413.º do mesmo Código).
BB- Tendo a prova pericial “por fim a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem” (cfr. artigo 388.º do CC), ela pode reportar-se a factos passados ou futuros e implicar o estabelecimento, por perito, de uma relação de causa-efeito entre esses factos, controvertidos, em discussão.
CC- Deste modo, o indeferimento da perícia só pode fundar-se na sua inadmissibilidade, designadamente, por os factos sobre os quais incide serem insusceptíveis de prova ou, especificamente, de prova pericial, ou na sua manifesta impertinência para a resolução do litígio.
DD- No presente caso, porém, resulta evidente que a perícia requerida não só não é impertinente – posto que respeita a factos controvertidos constitutivos da causa de pedir (artigos 33.º e 70.º a 77.º da PI) – como não é dilatória, uma vez que os factos sobre os quais incidirá se apresentam carecidos de prova e são susceptíveis de prova pericial.
EE- Esses factos encontram expressão nos quesitos formulados pela Recorrente para objecto da perícia, que se traduziram nas seguintes questões:
1. O não fornecimento ao estabelecimento da Autora da potência eléctrica contratada em Abril de 2016 e Junho de 2017 respectivamente de 100kva e 160 kva constitui um factor limitador da sua actividade económica?
2. Na positiva, ele é susceptível de reduzir a actividade desenvolvida pela Autora no seu estabelecimento a 27%?
3. Dada a natureza da actividade comercial que Autora se propunha desenvolver no seu estabelecimento, a localização e as características do mesmo, bem como o modelo de negócio para este estabelecido, a mesma poderia ter atingindo um volume de vendas de 1.560.000,00 euros em 2016 de 2.250.000,00 euros em 2017 e 2.832.750,00 euros em 2018 e de 3.423.775,00 euros em 2019?
4. Na positiva, esse volume de vendas corresponderia a um resultado líquido projectado de 359.544,00 euros em 2016 de 488.088,00 euros em 2017 de 691.590,00 euros 2018 e de 924.785,00 euros em 2019?
5. Na negativa, qual o volume de vendas que a Autora poderia ter atingido em cada um desses anos e qual o correspondente resultado líquido expectável?
6. O volume de vendas realizado pela Autora entre 2016 e 2019 foi de 586.119,20€ em 2016, de 753.645,96€ em 2017, de 740.596,60€ em 2018 e de 592.887,07€ em 2019?
7. Na positiva, isso traduziu-se no resultado líquido de 3.711,63€ em 2016, 3.278,46€ em 2017, de 10.964,50€ em 2018 e de 12.563,52€ em 2019?
8. Na negativa, qual foi o volume de vendas realizado pela Autora nos anos de 2016 a 2019 e qual o correspondente resultado líquido em cada um desses anos?
FF- Todas estas questões versam matéria de facto controvertida, e o seu apuramento ou não é completa e elucidativamente passível de prova documental, e, muito menos, testemunhal (quesitos 6, 7 e 8), ou apenas é susceptível de demonstração por meio de perícia (quesitos 1, 2, 3, 4 e 5).
GG- Como tal, ao ter decidido como decidiu, indeferindo a realização da perícia requerida, o Tribunal a quo incorreu em manifesto erro de julgamento, violando o disposto nos artigos 475, n.º 1, 410.º e 411.º do CPC e o direito fundamental à prova decorrente do direito à tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20.º da CRP.
NESTES TERMOS, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser julgada procedente a presente apelação e, em consequência, revogado o despacho recorrido proferido em 17/02/2025, determinando-se a admissão da perícia requerida pela Recorrente, com o objecto pela mesma proposto em sede de Audiência Prévia, subordinado às questões supra enunciadas, e a consequente baixa do processo à primeira instância, para que aí seja realizada”.

A Ré E apresentou Contra-Alegações, culminadas com as seguintes Conclusões:
“A. Entre a Autora e a 1.ª Ré foram celebrados três contratos de fornecimento de energia elétrica, em 1 de abril de 2016 (à potência de 41,4 kVA), 29 de abril de 2016 (à potência de 100 kVA) e 23 de junho de 2017 (à potência de kVA), respetivamente; contudo, o primeiro contrato nunca produziu efeitos, uma vez que foi substituído pelo celebrado em 29 de abril de 2016, o qual, por sua vez, se veio a revelar inválido.
B. Já o contrato celebrado em 23 de junho de 2017 também não chegou a produzir efeitos, dado que a D objetou à ativação do fornecimento de energia à potência contratada naquele CPE, por não se reunirem as condições técnicas necessárias.
C. No dia 12 de outubro de 2022, a Recorrente iniciou uma ação declarativa de condenação contra a E a D (2.ª Ré), alegando, entre o mais, que a E nunca forneceu à Recorrente a energia nas potências de 41,4 kVA inicialmente contratada, nem as potências de 100 kVA e de 160 kVA que subsequentemente se obrigou a fornecer ao estabelecimento da mesma, pedindo a condenação das Rés, solidariamente, no pagamento à Autora de uma indemnização no valor global de € 4.330.123, 92, acrescida dos respetivos juros moratórios, à taxa de juro comercial, contados desde a data de citação até integral pagamento.
D. A 1.ª Ré contestou afirmando, entre o mais, que os respetivos contratos nunca produziram efeitos, porquanto não se verificou a condição suspensiva de que dependia – a verificação das condições técnicas exigidas e a aprovação da D para a ativação do fornecimento de energia naquele CPE.
E. Logo, não se chegaram a constituir quaisquer obrigações de fornecimento para a E (nem o correspetivo direito de a Autora ser fornecida), nem qualquer obrigação de pagamento do preço por parte da Autora (nem o correspetivo direito da E exigir esse preço).
F. Em sede de Audiência Prévia, que ocorreu no dia 08.10.2024, a Autora alterou o seu requerimento probatório e requereu a produção de prova pericial colegial, propondo como objeto as questões que constam da Ata da Audiência Prévia e que aqui se dão por reproduzidas (cfr. Ata com a referência citius 439060156).
G. As Rés e a Chamada pronunciaram-se no sentido do indeferimento da realização da perícia, advogando, em suma, a sua manifesta impertinência e caráter dilatório; subsidiariamente, pugnaram pela ampliação do seu objeto.
H. Acolhendo os argumentos das Rés e da Chamada, o Tribunal a quo proferiu despacho no sentido do indeferimento da perícia, por esta se afigurar uma diligência impertinente e dilatória (cfr. Despacho com a ref. citius 441942708).
I. Inconformada, a Autora recorreu do referido despacho, todavia, sem qualquer razão, porquanto a decisão é correta, justa e equilibrada, devendo ser mantida na íntegra.
J. A prova pericial requerida pela Autora peca, desde logo, por assentar numa petição de princípio, dado que, no quesito n.º 1, a Autora toma como premissa um facto controvertido - o não fornecimento de energia pela E à Autora na potência contratada.
K. Para que a perícia possa lograr responder à questão de saber se a falta de fornecimento de energia à potência contratada constituiu um fator limitador da atividade económica da Autora, i.e., saber se existiu dano, necessário era que a falta de fornecimento fosse um facto incontestável.
L. Não o sendo, o referido quesito consubstancia uma formulação conclusiva e não um facto alegado pelas Partes, não podendo, como tal, servir de premissa à apreciação dos Srs. Peritos.
M. Com efeito, o contrato celebrado entre a Autora e a E estava condicionado pela verificação e aprovação da D (2.ª Ré) das condições técnicas para a ativação do fornecimento de energia naquele CPE.
N. Sendo certo que a D objetou à ativação do fornecimento de eletricidade naquele ponto de consumo, não se chegaram a constituir quaisquer obrigações de fornecimento para a E (nem o correspetivo direito da Autora ser fornecida), outrossim não existiu qualquer obrigação de pagamento do preço por parte da Autora (nem o correspetivo direito da E exigir esse preço).
O. Ora, se o(s) contrato(s) celebrado(s) entre as Partes não era(m) eficaz(es), não se constituindo uma obrigação de fornecimento de energia a cargo da E que esta pudesse ter incumprido, naturalmente, também não se geraram danos para a Autora.
P. Por conseguinte, não pode em caso algum servir como premissa para a perícia a falta de fornecimento de energia pela E, porquanto não foi omitido pela 1.ª Ré qualquer ato que lhe fosse imposto por contrato com a Autora, nem se pode ter como pressuposto a existência de dano.
Q. Por outro lado, também não pode proceder o argumento da Autora de que são factos futuros, porquanto estes são eventos ou consequências que, com base em determinados factos concretos já ocorridos, podem ser projetados ou previstos.
R. Se o “facto-base” é um facto controvertido, o dano que a Autora pretende provar não é, nestes termos, um facto futuro suscetível de ser objeto da perícia.
S. Destarte, a perícia pode ter como objeto factos controvertidos; porém, não pode tomá-los como premissa, sob pena de os Srs. Peritos laborarem em erro e incorrerem num raciocínio falacioso, visto que estariam a assumir como verdadeira a conclusão que pretendem avaliar e provar.
T. Além do mais, as questões formuladas sob os pontos 2 a 5 do objeto da perícia são, todas elas, irrelevantes, para a solução a dar ao pleito, tendo em conta as normas abstratamente aplicáveis (artigos 562.º e 563.º do Código Civil).
U. Tais questões não visam, minimamente, demonstrar ou comprovar a situação que existiria se a Ré lhe tivesse fornecido eletricidade à potência de 100kVAe 160kVA.
V. Visam, tão só, “confirmar” a plausibilidade de projeções económicas feitas pela própria Autora, sem qualquer pressuposto subjacente de fornecimento elétrico a determinada potência.
W. Em bom rigor, a única coisa que importaria apurar – segundo a versão dos factos narrada pela própria Autora – seria a diferença entre os resultados que teria se a potência elétrica fosse de 100kVA e 160 kVA e os resultados que teve (se a potência não tiver sido, de facto, aquela).
X. Destarte, essa comprovação é irrelevante para a decisão dos presentes autos, sendo, também nestes quesitos, a prova pericial a produzir manifestamente impertinente, sob pena de se violar o disposto no artigo 475.º, n.º 2 do CPC.
Subsidiariamente,
Y. Da leitura do artigo 388.º do Código Civil resulta cristalino que a prova pericial só deve ser admitida se os julgadores carecerem de conhecimentos especiais para conhecerem dos factos.
Z. Ora, aceitar a argumentação da Autora e admitir-se a prova pericial, nomeadamente, os seus quesitos 6.º, 7.º e 8.º, levaria a que se realizasse uma diligência manifestamente inútil, porquanto as questões de facto podem ser plenamente conhecidas através de outros meios de prova, mormente, documental.
AA. Ou seja, a resposta ao objeto da perícia, em parte, não carece de conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, pelo que não se pode admitir a prova pericial sobre esse objeto, sendo certo que admiti-la violaria o disposto no artigo 388.º do Código Civil.
BB. Assim, acompanhamos totalmente o entendimento do Tribunal que, de forma irrepreensível, afirmou que a prova pericial é desnecessária, porquanto a matéria em causa não exige qualquer análise especializada que não possa ser suprida pela simples verificação da informação contabilística da Autora, donde decorrerá o volume de vendas e o resultado líquido por ela obtido, concluindo, no final, pelo caráter dilatório da perícia.
CC. Por conseguinte, também neste segmento, deve manter-se integralmente a decisão recorrida ou, caso assim não se entenda e a título subsidiário, deve ser limitado o seu objeto, excluindo-se os quesitos 6.º, 7º. e 8.º, sob pena de violação do artigo 388.º do Código Civil.
Adicionalmente,
DD. Do artigo 475.º, n.º 2 do CPC decorre, de forma inequívoca, que a prova pericial – como qualquer outro meio de prova – só pode versar sobre matéria que tenha sido alegada pelas partes nos articulados e que seja relevante para a solução jurídica a dar ao pleito.
EE. Ora, não se extrai dos articulados da Autora quaisquer factos suscetíveis de serem provados pela resposta a dar ao quesito n.º 2, a saber, “[n]a positiva, ele é suscetível de reduzir a atividade desenvolvida pela Autora no seu estabelecimento a 27%?”.
FF. Motivo pelo qual, também neste ponto, a questão de facto enunciada no referido quesito é inadmissível e irrelevante.
GG. Por conseguinte, a perícia devia ser – como foi – também neste ponto indeferida; todavia, se assim não se entender, o que não se concede e só por mero dever de patrocínio se equaciona, deve ser limitado o seu objeto sob pena de violação do artigo 475.º, n.º 2 do CPC.
Em face de todo o exposto,
HH. Bem andou o Tribunal ao indeferir a prova pericial requerida pela Autora, por impertinente e dilatória, à luz dos artigos 476.º, n.º 1 e 475.º, n.º 2 do CPC, do 388.º do CC, e sem desvirtuar os princípios ínsitos nos artigos 410.º, 411.º do CPC e 20.º da Constituição da República Portuguesa, decisão que deve ser mantida na íntegra.
IV. PEDIDO
Nestes termos e nos mais de Direito, o recurso interposto pela Autora deve ser julgado improcedente e deve ser mantido, na íntegra, o Despacho Recorrido. Caso assim não se entenda e subsidiariamente, deve ser limitado
o objeto da perícia, excluindo-se do seu âmbito os quesitos n.º 2, 6, 7 e 8, sob pena de violação dos artigos 388.º do Código Civil e do artigo 475.º, n.º 2 do CPC”.

A Ré D apresentou Contra-Alegações, culminadas com as seguintes Conclusões:
“a) O presente recurso surge interposto pela Recorrente C, LDA. do douto despacho proferido pelo Tribunal a quo em 17.02.2025, com o qual não se conforma e nos termos do qual foi indeferida a produção de prova pericial por si requerida em sede de audiência prévia realizada em 08.10.2024, com fundamento na impertinência e caráter dilatório dessa diligência, ao abrigo do disposto no artigo 476.º, n.º 1, a contrario, do CPC.
b) A Recorrente argui que a decisão recorrida padece de erro de julgamento por violação do disposto nos artigos 475.º, n.º 1, 410.º e 411.º, todos do CPC, na medida em que limita de forma ilícita o direito de acesso a um meio de prova tido como necessário para o “esclarecimento dos factos que alega” e que, dessa forma, pretere o “direito fundamental à prova inerente ao direito à tutela jurisdicional efetiva consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa (CRP)”.
c) A Recorrente considera a perícia pertinente por entender que a mesma respeita a factos controvertidos constitutivos da causa de pedir, sendo essa natureza a caraterística que lhe confere a necessidade de prova, podendo a perícia reportar-se a factos passados e futuros como meio de habilitar o que denomina de estabelecimento de “uma relação de causa- efeito”, e que a mesma não é dilatória por entender que o apuramento e o esclarecimento da matéria nela vertida reclama especiais conhecimentos técnicos, de cariz económico- financeiro, de que o Tribunal a quo se encontra desprovido, para além de que a comprovação dessa matéria não pode ser alcançada mediante produção de outra prova, nomeadamente prova testemunhal e documental.
d) No entanto, não assiste qualquer razão à Recorrente, inexistindo qualquer erro de julgamento que vicie a douta decisão recorrida, perfilhando-se nesta uma correta interpretação e aplicação do Direito.
e) A Recorrida sufraga a douta decisão sob censura pela Recorrente, precisamente porque é inequívoco que a prova pericial por esta requerida não persegue o propósito inscrito no artigo 388.º do CC, sendo a mesma impertinente e dilatória, justificando-se, em conformidade, o seu indeferimento por imposição do disposto no artigo 476.º, n.º 1, a contrario, do CPC.
f) A prova pericial tem por desiderato a perceção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, o que significa, desde logo, que a perícia não pode ter por premissas factos controvertidos, sob pena de se poder convolar num ato puramente inútil caso a factualidade em questão venha a ser julgada não provada.
g) Os atos inúteis são ilícitos no processo, como postula o artigo 130.º do CPC.
h) No caso sob cogitação, é cristalino que a generalidade dos “factos” que consubstanciam os quesitos formulados pela Recorrente são, em si mesmos, factos que não se podem ter como incontroversos, donde a sua inaptidão para gerar matéria que constitui pressuposto do quesito.
i)A Recorrente confunde
(i) o facto controvertido que constitui a base em que assenta o quesito com
(ii) o facto controvertido que se pretende dirimir com a perícia, não parecendo perceber que aquela premissa base é inadmissível.
j) Materializando o que se deixa exposto, por apelo ao caso sub judice, e em concreto por reporte aos interligados quesitos 1 e 2 da perícia requerida, é patente que não se pode tentar obter um juízo pericial quanto à putativa limitação da atividade económica da Recorrente tendo como alicerce um facto não assente, a saber: o não fornecimento da potência elétrica contratada com a Recorrida E, S.A.. Efetivamente, esse suposto não fornecimento da potência elétrica contratada não está no objeto da perícia, outrossim constitui um pressuposto material do almejado juízo pericial – pressuposto esse que, como se disse, não é, de todo, incontroverso. Não se exigem conhecimentos especiais para o apuramento da alegada falta de fornecimento da potência elétrica tida por contratada – mas não é esse, reitere-se, o objeto da perícia, dependendo este daquele apuramento.
k)Por outro lado, é notório que o corpo de factualidade que se pretende sindicar sob a alçada dos quesitos 1 e 2 da perícia requerida revela a sua inabilitação para o desejado escrutínio, porque a simples conjugação desses quesitos permite concluir pela ininteligibilidade da matéria submetida a juízo especial; e isto sem que se olvide que a Recorrente não carreou para o petitório qualquer menção factual ao concreto quantum de redução da atividade, o que consubstancia uma clara violação do disposto no artigo 475.º, n.º 2, do CPC.
l) No reduto do conjunto dos quesitos 3, 4 e 5 da pretendida prova pericial não se pode ensaiar conhecer o volume de vendas potencial para os anos de 2016 a 2019 sem que se conheça factualmente o modelo de negócio pretendido para o estabelecimento e as específicas caraterísticas que a Recorrente considera serem relevantes para tal prognose – sendo que a ora Recorrida impugnou na sua contestação o denominado “modelo de negócio”, não podendo o mesmo ter-se por assente; além disso, o modelo de negócio não se encontra minimamente alinhado em factos concretos vertidos na petição inicial, nem mesmo no documento a esta junto – documento esse que não se circunscreve a um só estabelecimento e que também se encontra impugnado.
m) No que concerne aos pontos 4 e 7 da perícia requerida, é relevante ressalvar que, para que se considere provado o resultado líquido apurado nos exercícios correspondentes aos anos 2016 a 2019, seria imperativo conhecer os custos associados, entre outros, ao estabelecimento, à laboração e à produção, incluindo, sem limitar, os basilares encargos inerentes a eletricidade, água, gás, pessoal, matérias-primas e transportes, sendo certo que, ante a petição, é evidente que tais factos não se encontram sequer alegados; e, mais importante, seria indispensável estabelecer a ligação desses resultados (e do volume esperado de vendas) com a potência elétrica existente e, na narrativa da Recorrente, com a potência elétrica devida, o que não se alcança nos quesitos.
n) Não estando em causa a atividade corrente da Recorrente e suas vicissitudes, mas a sua suposta atrofia por falta de determinada potência elétrica, sempre o juízo a obter pelos Senhores Peritos perante os quesitos da perícia seria inócuo e inútil, por não ter efeito probatório prático.
o) Também os pontos 5 e 8 da perícia requerida têm por escopo a prova de factos que a Recorrente não alega e que, antecipa-se, sempre seriam controvertidos em função do posicionamento assumido nas contestações oferecidas pelas partes passivas nestes autos.
p) Enfatiza-se, pois, que a acrescer ao facto de estarmos perante diversos factos não alegados, a controvérsia associada aos factos em que a Recorrente ampara o pedido de valoração técnica especializada, incidente sobre matéria daqueles emergente, inviabiliza a utilidade e pertinência da requerida diligência.
q) A natureza controvertida da premissa que sustenta o quesito não é compaginável com a realização da perícia, de tal forma que o juízo pericial só pode incidir sobre factos concretos e não sobre realidades virtuais e especulativas.
r) Ademais, a perícia não pode radicar em factos, principais ou instrumentais, não alegados na petição, como pontualmente sucede in casu, em ab-rogação conveniente da disciplina veiculada pelo artigo 475.º, n.º 2, do CPC.
s) Significa isto que a perícia requerida é claramente impertinente.
t) A matéria dos temas da prova que se presume ser o escopo da diligência de perícia requerida pela Recorrente, dado que confessa que a correspetiva matéria decorre da concretização dos supostos danos emergentes e dos lucros cessantes reclamados, reconduz-se a priori somente ao genérico tema da prova inscrito sob o ponto 4, pelo que importaria conhecer, por um lado,
(i) o enunciado de danos emergentes e, por outro lado,
(ii) a alegação de factualidade objetiva atinente aos lucros cessantes, associada à alegada potência elétrica deficitária.
u) No entanto, a perícia potestativa impetrada pela A. peca por uma clara petição de princípio, pois que as questões de facto controvertidas que são submetidas a perícia carecem, para poderem ser julgadas provadas ou não provadas, nomeadamente quanto aos lucros cessantes, de alegação dos elementos de facto em que as mesmas assentam, elementos esses que não se encontram materializados no petitório.
v) Com efeito, não se vislumbra na petição inicial, nem nos quesitos da perícia, o complexo de factos que equivale à alegação/demonstração da existência do direito efetivo de que a Recorrente se arroga titular e que teria sido subtraído em resultado de um facto ilícito. Isto é, não existem factos bastantes que permitam avaliar o direito ao ganho e a frustração do ganho que a Recorrente persegue com o presente pleito por consequência da atuação das Recorridas (que, na retórica da petição, emerge da falta da potência contratada).
w) A perícia requerida não se alavanca, portanto, em matéria de facto que lhe é indispensável.
x) Sublinha-se que o recurso à realização de uma perícia depende da exigibilidade de conhecimentos acrescidos e especializados para a apreciação e valoração de determinados factos controvertidos suscitados na lide, em observância do conceito explícito no artigo 388.º do CC; no que tange aos quesitos 6, 7 e 8, que correspondem às matérias em que tal paradigma se poderia equacionar, é inarredável que o conhecimento da matéria aos mesmos subsumida emerge, com maior eficiência, de prova documental, injuntiva do ponto de vista fiscal, sendo o seu apuramento de fácil apreensão pelo Tribunal a quo, sendo que a interpretação sobre tais elementos escritos está perfeitamente ao alcance de qualquer Julgador, não se exigindo para a sindicância em apreço qualquer conhecimento técnico especial.
y) A subavaliação que a Recorrente tece sobre o juízo cognitivo e valorativo do Tribunal a quo é meramente especulativa e gratuita, pelo que a perícia requerida, além de impertinente, é manifestamente dilatória.
z) Assim sendo, a douta decisão recorrida em nada cerceia, ou por qualquer meio compromete, o direito da Recorrente a socorrer-se do meio de prova necessário para o esclarecimento dos factos constitutivos por si alegados, estando totalmente ao seu dispor para o efeito os meios comuns de prova, inter alia, documental e testemunhal.
aa) Não está in casu preterido o princípio do inquisitório (inscrito no artigo 411.º do CPC), pois que em nada se desprezou o apuramento da verdade e a boa decisão da causa, sendo de destacar nesse domínio que o ónus da prova que impende sobre as partes, nos termos do artigo 342.º do CC, não tem de ser cumprido por um meio de prova cujo uso a lei reserva para situações específicas que reclamam os catalogados conhecimentos técnicos especiais.
bb) Não existe, nessa esteira, qualquer erro de julgamento, designadamente por violação do disposto no artigo 475.º, n.º 1, do CPC, ou nos artigos 410.º e 411.º do mesmo diploma, nem se compreende como a Recorrente configura a violação do citado artigo 475.º, n.º 1, do CPC, quando é insofismável que o mesmo não constituiu sequer a ratio decidendi do despacho sob censura.
cc) A Recorrente tem a prerrogativa de produzir prova sobre todos os factos que alega, não precisando para tanto de extrapolar a capacidade e amplitude cognoscente de que se encontra dotado o Tribunal a quo.
dd) Por conseguinte, não está igualmente em causa o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva consagrado no artigo 20.º da CRP – sendo pacífico que não existe violação abstrata de tal direito fundamental, no sentido de se poder consumar a ofensa do sobredito dispositivo constitucional nos termos em que a Recorrente o enuncia, exigindo-se, isso sim, que se proceda a um recorte do sentido normativo que se considera pretensamente violado e que não se perceciona, nem existe, no recurso a que se responde.
ee) Em suma, não se verifica o vício de violação de lei, por erro de julgamento, invocado pela Recorrente, antes pelo contrário, o despacho impugnado neste recurso pugna pelo cumprimento do disposto no artigo 476.º, n.º 1, a contrario, do CPC, observando a concetualização de perícia prefigurada no artigo 388.º do CC, o que equivale a dizer que não merece mácula.
ff) Sem prescindir, e subsidiariamente, pese embora se entenda que o presente recurso se cinge à admissão, ou não admissão, da perícia, e não à definitividade do seu objeto, é de enfatizar, na eventualidade de se perfilhar entendimento antagónico ao plasmado na presente resposta, ou meramente distinto, não pode deixar de se considerar o alargamento do objeto da perícia requerida, a fim de se bascular algum interesse, processual e substantivo, para o seu desfecho, ao abrigo do disposto no artigo 476.º, n.º 1, do CPC, aditando-se as questões de facto, conexas com o objeto definido pela Recorrente, que a aqui Recorrida inscreveu no seu requerimento de pronúncia de 19.10.2024 (que aqui se considera reproduzido, em género de cautela).
Termos em que,
Sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., Digníssimos Juízes Desembargadores,
Deve ser negado provimento ao recurso interposto pela Recorrente C LDA., por manifesta falta de fundamento, mantendo-se incólume na ordem jurídica o douto despacho recorrido por ser insuscetível de censura, com as demais consequências legais.
A título meramente subsidiário,
Na eventualidade de procedência do recurso (no que, salvo o devido respeito, não se concede e somente se conjetura por cautela), e caso se exacerbe o respetivo objeto para a ponderação casuística do perímetro da perícia, deve admitir-se, por pertinente, a ampliação da matéria a submeter a juízo pericial conforme requerido pela Recorrida perante o Tribuna a quo, com as demais consequências legais, como é de
JUSTIÇA”.

**
Questões a Decidir
São as Conclusões da Recorrente que, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, delimitam objectivamente a esfera de actuação do Tribunal ad quem (exercendo uma função semelhante à do pedido na Petição Inicial, como refere, Abrantes Geraldes[5]), sendo certo que, tal limitação, já não abarca o que concerne às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil), aqui se incluindo qualificação jurídica e/ou a apreciação de questões de conhecimento oficioso.
In casu, e na decorrência das Conclusões da Recorrente, importará verificar se a prova pericial requerida foi ou não bem indeferida.
**
Corridos que se mostram os Vistos, cumpre decidir.
*
Fundamentação de Facto
A factualidade a levar em consideração é a que se mostra descrita Relatório.
*º*

Fundamentação de Direito
Destinando-se – como qualquer outra prova – a (como define o artigo 341.º do Código Civil[6]) demonstrar a realidade dos factos alegados pelas partes, a prova pericial tem a especificidade de trazer “a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objecto de inspecção judicial”: é o que se afirma no artigo 388.º do mesmo diploma, sendo certo que a força probatória das respostas que os peritos venham a dar “é fixada livremente pelo tribunal” (artigo 389.º do mesmo diploma).
João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa, de forma mais simples, referem que ela “é o meio de prova que consiste na transmissão ao juiz de informações de facto por uma entidade - perito - especialmente encarregada de as recolher”[7].
A perícia pode assim ser opinativa[8] ou investigatória[9], destinando-se “sempre a trazer para o processo um conhecimento até aí nele desconhecido”[10], podendo – como escreve Luís Filipe Pires de Sousa – ter como “objeto factos, máximas de experiência e prova sobre prova”[11] e tendo como traço definidor o chamar-se ao processo “alguém que tem conhecimentos especializados em determinados aspetos de uma ciência ou arte para auxiliar o julgador, facultando-lhe informação sobre máximas de experiência técnica que o julgador não possui, e que são relevantes para a perceção e apreciação dos factos controvertidos. Em regra, além de facultar ao julgador o conhecimento dessas máximas de experiência técnica, o perito veicula a ilação concreta que se justifica no processo, construída a partir de tais máximas de experiência”[12].
“Quando incide sobre factos, a prova pericial pode visar a afirmação de um juízo de certeza sobre os mesmos ou a valoração de factos ou circunstâncias”, cabendo ao perito “fazer um labor de reconstrução dos factos do passado e de estabelecer uma relação de causa-efeito ou de fazer uma projeção dos efeitos futuros dos factos de acordo com a mesma relação causa-efeito, respetivamente” [13].
É por isso que, como se vincou no Acórdão da Relação de Guimarães de 17 de Dezembro de 2019 (Processo n.º 21/16.1T8VPC-B. G1-Maria João Matos[14]) “só podem ser peritos as pessoas de reconhecida idoneidade e competência na matéria em causa” e que a “aferição da idoneidade e da competência de perito, quando a lei não a pré-defina de forma imperativa (v.g. reservando a realização da perícia a certas entidades ou estabelecimentos, ou aos detentores de determinados títulos ou habilitações), fica na disponibilidade do juiz”.

Para regular adjectivamente esta matéria, o Código de Processo Civil dedica-lhe o Capítulo IV (Prova Pericial), do Título IV (Da Instrução do Processo), do Livro I (Da Acção, das Partes e do Tribunal): os artigos 467.º a 489.º.

Em causa nos autos está um despacho que não admitiu a realização de uma perícia colegial, por impertinente e dilatória, o que nos remete para o n.º 1 do artigo 476.º do Código de Processo Civil (“Se entender que a diligência não é impertinente nem dilatória, o juiz ouve a parte contrária sobre o objeto proposto, facultando-lhe aderir a este ou propor a sua ampliação ou restrição”).
Dizem Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa que a “perícia é impertinente ou dilatória quando não respeita a factos condicionantes da decisão final ou porque, embora respeitando a tais factos, o respectivo apuramento não depende de prova pericial, por não estarem em causa conhecimentos especiais que a mesma pressupõe”[15] (o que concatena com o já citado artigo 388.º do Código Civil).
Esta apreciação, como assinalam Lebre de Freitas-Isabel Alexandre, acaba por se traduzir na “aplicação à prova pericial da norma geral consagrada no art.º 6-1 (ver também o art.º 410)”[16], ou seja, do dever de gestão processual (“Cumpre ao juiz, sem prejuízo do ónus de impulso especialmente imposto pela lei às partes, dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório e, ouvidas as partes, adotando mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável”).
O regime legal fica bem sintetizado[17] no Acórdão da Relação do Porto de 26 de Outubro de 2020 (Processo n.º 258/18.9T8PNF-A.P1-Eugénia Cunha), quando refere que:
- “Toda a prova a produzir, e, como tal, também a pericial, se destina a demonstrar a realidade dos factos da causa relevantes para a decisão (artº 341º do Código Civil), sendo que a demonstração que se pretende obter com a prova se traduz na convicção subjetiva a criar no julgador”;
- “Podendo ser objeto de instrução tudo quanto, de algum modo, possa interessar à prova dos factos relevantes para a decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, vedado está aquilo que se apresenta como irrelevante (impertinente) para a desenhada causa concreta a decidir, devendo, para se aferir daquela relevância, atentar-se no objeto do litígio (pedido e respetiva causa de pedir e matéria de exceção)”;
- “Havendo enunciação dos temas de prova, o objeto da instrução são os temas da prova formulados, densificados pelos respetivos factos, principais e instrumentais (constitutivos, modificativos, impeditivos ou extintivos do direito afirmado) –v. arts 410º, do CPC e 341º e seguintes, do Código Civil e, ainda, artigo 5º, daquele diploma legal”;
- “Cabe ao tribunal pronunciar-se sobre as provas propostas e emitir, sobre elas, um juízo, não só de legalidade mas também de pertinência sobre o seu objeto: a prova de factos, controvertidos, da causa, relevantes para a decisão”;
- “A prova pericial, com a especificidade de ter a mediação de uma pessoa - o Perito – para a demonstração do facto, consiste na perceção ou apreciação de factos pelo perito/s chamado a os percecionar (com os órgãos dos sentidos) e/ou a os valorar (à luz dos seus especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos), conhecimentos esses que, não fazendo parte da cultura geral e da experiência comum, se presumem não detidos pelo julgador”;
- “A perícia, para perceção e valoração de factos da causa carecidos de prova (por isso pertinente), só deveria ser indeferida se a perceção e a apreciação desses factos não reclamasse conhecimentos científicos, técnicos ou artísticos especiais (caso em que seria dilatória)”.

Ora, efectivamente, a Autora-Recorrente justificou a necessidade da Perícia, com o objectivo de fazer a prova da quantificação do que alegou e considerou serem os seus danos patrimoniais, originados pela conduta das Rés.
O Tribunal considerou a perícia, impertinente e dilatória, a Autora-Recorrente considera a decisão cerceadora dos seus direitos e as Recorridas pugnam pelo acerto do decidido.

Cremos que ambos os lados incorrem em alguns equívocos, sem prejuízo de a decisão ter sido a correcta.
Por um lado é parece-nos evidente que – em abstracto – nada obstaria a que a Autora pretendesse a realização de uma perícia para o apuramento dos danos que tivesse sofrido e dos quais pretendesse ser indemnizado, sendo, para o efeito, irrelevante que o facto ilícito (contratual ou delitual) que lhe tivesse dado origem, estivesse ou não dado como provado: a responsabilidade civil tem os seus pressupostos e requisitos e todos têm de ser provados.
A seguir o entendimento das Recorridas, num processo de indemnização por acidente de viação em que fosse controvertida a dinâmica do acidente (que permitisse a leitura da ilicitude da conduta e a culpa do(s) interveniente(s)) não poderiam fazer-se perícias médico-legais quanto aos danos sofridos pela vítima, só porque se – a final – resultasse ser esta a responsável por ele, tal perícia se tornasse inútil…
Assim, a circunstância de a perícia pretendida assentar num facto controvertido (a falta de fornecimento da potência eléctrica contratada) não torna à partida impertinente nem dilatória a sua realização (que tenha como objecto a delimitação/quantificação dos danos originados).
Os danos alegados têm de ser provados e assentam noutros factos prévios que terão também de o ser, mas estes não estão incluídos no objecto da perícia.

O que tem de ser verificado é se a concreta perícia requerida possui todos os requisitos necessários para poder funcionar como meio de prova útil ao processo.

E para isso, o que releva é o conhecimento do pedido formulado, da causa de pedir invocada, da concreta factualidade alegada na acção, do Objecto do Processo definido, dos Temas de Prova seleccionados, e da delimitação da perícia com a definição das questões de facto que se pretendam ver esclarecidas (cfr. o n.º 1, do artigo 475.º do Código de Processo Civil).
Vejamos um a uma a uma as questões de facto indicadas (como “quesitos”) pela Recorrente-Autora:
- 1.º O “não fornecimento ao estabelecimento da Autora da potência elétrica contratada em Abril de 2016 e Junho de 2017 respetivamente de 100kva e 160 kva constitui um fator limitador da sua atividade económica?”
Sem merecer maiores desenvolvimentos é ostensiva a conclusividade e inutilidade para efeitos periciais desta matéria, pelo que nunca poderia objecto de uma qualquer perícia.
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- 2.º Se o não fornecimento de eletricidade com determinadas potências que limita a atividade da Autora, “é susceptível de reduzir a actividade desenvolvida pela Autora no seu estabelecimento a 27%?”.
Para além de ser matéria que não se mostra alegada na Petição Inicial, trata-se de uma matéria totalmente conclusiva, abstracta, sem assentar em qualquer base, o que a torna inútil para efeitos de realização de uma perícia.

Como refere de forma assaz feliz o Acórdão da Relação de Guimarães de 11 de Maio de 2023 (Processo n.º 2352/21.0T8VCT-A.G1-José Carlos Duarte), a “perícia tem um objectivo, uma finalidade determinante: demonstrar ou não, através da percepção e apreciação de factos carecidos de prova, por quem tem conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, a realidade ou irrealidade de tais factos, ou seja, tem-se em vista responder a questões concretas e não especular[18].
Ora, como também se dá conta no Acórdão da Relação de Guimarães de 26 de Setembro de 2019 (Processo n.º 137/16.4T8CMN-A.G1-José Alberto Moreira Dias), a “prova pericial é um “meio de prova” e não um meio alegatório de factos, sequer se destina a obter outros meios de prova, designadamente, prova documental, e através dela não se podem suprir as omissões de alegação em que incorreram as partes[19].
Assim, também esta questão estaria condenada ao insucesso.
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- 3.º Se, dada “a natureza da actividade comercial que Autora se propunha desenvolver no seu estabelecimento, a localização e as características do mesmo, bem como o modelo de negócio para este estabelecido, a mesma poderia ter atingindo um volume de vendas de 1.560.000,00 euros em 2016 de 2.250.000,00 euros em 2017 e 2.832.750,00 euros em 2018 e de 3.423.775,00 euros em 2019?”.
- 4.º Se “esse volume de vendas corresponderia a um resultado líquido projectado de 359.544,00 euros em 2016 de 488.088,00 euros em 2017 de 691.590,00 euros 2018 e de 924.785,00 euros em 2019?”;
- 5.º Qual o volume de vendas que a Autora poderia ter atingido em cada um desses anos e qual o correspondente resultado líquido expectável?”.
Neste ponto, haveria de relevar o Tema de Prova n.º 4 (Dos prejuízos sofridos pela Autora: volume de vendas realizado entre 2016 e 2019 e volume projectado para o mesmo período) e os factos alegados na Petição Inicial (70.º a 77.º).
Sucede que, na linha do acabado de referir, a Perícia não é um exercício especulativo, não é um processo, nem muito menos um julgamento, é um acto de verificação, necessita de factos nos quais se basear e a Autora, ora Recorrente, não os alegou (nomeadamente, qual o seu “plano” ou “modelo” de negócio, tipo de actividade e suas características, localização e inserção, etc.[20])…
E as perícias só podem sobre os “factos da causa” enunciados pelas partes[21], que se mostrem carecidos de demonstração no processo (cfr. artigo 341.º do Código Civil).
Apurar danos emergentes e lucros cessantes sem factos objectivados (mesmo que controvertidos) torna impossível a actividade pretendida pela Autora-Recorrente)[22].
Mais: como assinala de forma lúcida a Recorrida E (em sede de Contra-Alegações), “à luz do direito abstratamente aplicável ao caso e tomando em consideração a causa de pedir tal como configurada pela Autora, o dano que importaria provar corresponderia à diferença entre:
a) a situação patrimonial da Autora que existiria se a Ré lhe tivesse fornecido eletricidade à potência de 100kVA e 160kVA; e
b) a situação patrimonial da Autora que se verificou pelo facto de ter laborado com uma potência elétrica inferior”, sendo que, “as questões propostas pela Autora como objeto da perícia nos pontos 2 a 5 não visam, minimamente, demonstrar ou comprovar a situação que existiria se a Ré lhe tivesse fornecido eletricidade à potência de 100kVA e 160kVA” e visam “tão só, “confirmar” a plausibilidade de projeções económicas feitas pela própria Autora, sem qualquer pressuposto subjacente de fornecimento elétrico a determinada potência”.
Assim sendo, sempre estas questões haveriam de estar excluídas do objecto da perícia.
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- 6.º Se o “volume de vendas realizado pela Autora entre 2016 e 2019 foi de 586.119,20€ em 2016, de 753.645,96€ em 2017, de 740.596,60€ em 2018 e de 592.887,07€ em 2019?”;
- 7.º Se isso se traduziu “no resultado líquido de 3.711,63€ em 2016, 3.278,46€ em 2017, de 10.964,50€ em 2018 e de 12.563,52€ em 2019?”;
- 8.º Qual “foi o volume de vendas realizado pela Autora nos anos de 2016 a 2019 e qual o correspondente resultado líquido em cada um desses anos?”.
Neste ponto, diga-se que, sem outra explanação e contextualização factual, o simples apuramento do volume de vendas de uma sociedade não necessita de perícia alguma, por tal não reclamar nenhum especial conhecimento científico, técnico ou artístico[23], que o Tribunal (assente numa normal cultura geral e experiência comum) não possua, perante outra prova produzida (testemunhal ou documental[24], nomeadamente).

E é por isso que o juízo formulado pelo Tribunal a quo se mostra correcto, dado que nenhuma das matérias pretendidas pela Autora, ora Recorrente, em concreto é susceptível de ser objecto de prova pericial.
Em nada se mostra cerceado o direito da Autora fazer a prova do que alegou, pois tem de respeitar os requisitos que a lei processual lhe impõe, sendo que toda a restante produção de prova está ao seu dispor.
O que a Autora-Recorrente pretendeu fazer (e, repare-se, apenas o fez aquando da Audiência Prévia), atento o objecto por si definido, foi impertinente (por não respeitar a factos devidamente alegados e, como tal relevantes para a decisão da causa) e dilatório (porque a factualidade que alegou, para a sua prova – nos termos em que o fez – não exige o tipo de conhecimento especial que está inerente à produção de prova pericial e, como tal, apenas geraria atraso no processo).

A decisão do Tribunal a quo, em função da concatenação dos artigos 341.º e 388.º do Código Civil e 476.º, n.º 1, 477.º, nº 1, do Código de Processo Civil, foi a correcta e, como tal, improcederá o recurso e será aquela confirmada.
n n

DECISÃO
Com o poder fundado no artigo 202.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, e nos termos do artigo 663.º do Código de Processo Civil, acorda-se, nesta 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, face à argumentação expendida e tendo em conta as disposições legais citadas, em julgar improcedente a Apelação e, em consequência, confirma-se a Decisão recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
*
Notifique e, oportunamente, remeta à 1.ª Instância (artigo 669.º do Código de Processo Civil).
***

Lisboa, 13 de Maio de 2025
Edgar Taborda Lopes
Micaela Sousa
Ana Mónica Mendonça Pavão
_______________________________________________________
[1] Por opção do Relator, o Acórdão utilizará a grafia decorrente do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1945 (respeitando nas citações a grafia utilizada pelos/as citados/as).
A jurisprudência citada no presente Acórdão, salvo indicação expressa noutro sentido, está acessível em http://www.dgsi.pt/ e/ou em https://jurisprudencia.csm.org.pt/.
[2]“Direito da Autora a receber das Rés, solidariamente, as quantias peticionadas a título de indemnização por incumprimento contratual”.
[3] “1. Dos contratos celebrados entre a Autora e as Rés: tempo, modo e respectiva produção de efeitos;
2. Das quebras de energia e consequente limitação da actividade comercial desenvolvida pela Autora;
3. Da falta de fornecimento pela 1ª Ré da potência contratada pela Autora;
4. Dos prejuízos sofridos pela Autora: volume de vendas realizado entre 2016 e 2019 e volume projectado para o mesmo período;
5. Das objecções por parte da D à activação do fornecimento de energia pretendido pela Autora;
6. Da actividade desenvolvida por cada uma das Rés e sua relação com os consumidores de energia eléctrica;
7. Da postura processual da Autora para efeito de apreciação da litigância de má-fé”.
[4] “Atento aos temas da prova e por se afigurar pertinente para a prova dos danos patrimoniais subjacentes ao pedido de indemnizatório formulado nos presentes autos bem como quanto à sua quantificação a Autora requer nos termos conjugados no disposto nos artigos a 598º nº 1, 468º nº1, alínea b) e 475º, do C.P.Civil a produção de prova pericial relativamente à matéria constante nos artigos 33º e 70º a 77º da P.I.
Considerando, por outro lado, que não estamos perante matéria que revista simplicidade é entendimento da Autora que a perícia deverá ser efectuada em modo colegial tendo como objecto as seguintes questões de facto:
1) O não fornecimento ao estabelecimento da Autora da potência eléctrica contratada em Abril de 2016 e Junho de 2017 respectivamente de 100kva e 160 kva constitui um factor limitador da sua actividade económica?
2) Na positiva, ele é susceptível de reduzir a actividade desenvolvida pela Autora no seu estabelecimento a 27%?
3) Dada a natureza da actividade comercial que Autora se propunha desenvolver no seu estabelecimento, a localização e as características do mesmo, bem como o modelo de negócio para este estabelecido, a mesma poderia ter atingindo um volume de vendas de 1.560.000,00 euros em 2016 de 2.250.000,00 euros em 2017 e 2.832.750,00 euros em 2018 e de 3.423.775,00 euros em 2019?
4) Na positiva, esse volume de vendas corresponderia a um resultado líquido projectado de 359.544,00 euros em 2016 de 488.088,00 euros em 2017 de 691.590,00 euros 2018 e de 924.785,00 euros em 2019?
5) Na negativa, qual o volume de vendas que a Autora poderia ter atingido em cada um desses anos e qual o correspondente resultado líquido expectável?
6) O volume de vendas realizado pela Autora entre 2016 e 2019 foi de 586.119,20€ em 2016, de 753.645,96€ em 2017, de 740.596,60€ em 2018 e de 592.887,07€ em 2019?
7) Na positiva, isso traduziu-se no resultado líquido de 3.711,63€ em 2016, 3.278,46€ em 2017, de 10.964,50€ em 2018 e de 12.563,52€ em 2019?
8) Na negativa, qual foi o volume de vendas realizado pela Autora nos anos de 2016 a 2019 e qual o correspondente resultado líquido em cada um desses anos?”.
[5] António Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 6.ª edição Atualizada, Almedina, 2020, página 183.
[6] Onde constam as regras de direito probatório material.
[7] João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa, Manual de Processo Civil, Volume I, CIDP-AAFDL, 2022, página 552.
[8] Aquela “em que o perito se limita a dar a sua opinião a partir de factos apurados no processo” João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa, Manual…, ob. loc. cit..
Luís Filipe Pires de Sousa refere que na “perícia de opinião a regra é a da admissibilidade de resultados contraditórios que terá de ser objeto de adequada valoração” (Direito Probatório Material, 3.ª edição, Almedina, 2023, página 205).
[9] Aquela “em que o perito é chamado a trazer para o processo um facto ainda não apurado”João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa, Manual, ob. loc. cit..
Luís Filipe Pires de Sousa refere que a “perícia cientificamente obectiva (…) ocorre quando o objeto da mesma é apenas verificar a exatidão de algum enunciado fáctico feito pela parte, operando por uma metodologia que só pode dar um resultado, v.g., medir a área de um terreno ou um exame” (Direito Probatório Material, 3.ª edição, Almedina, 2023, páginas 204-205).
[10] João de Castro Mendes-Miguel Teixeira de Sousa, Manual…, ob. loc. cit..
[11] Luís Filipe Pires de Sousa, Direito Probatório Material, 3.ª edição, Almedina, 2023, página 204.
[12] Luís Filipe Pires de Sousa, Direito…, cit., página 204.
[13] Luís Filipe Pires de Sousa, Direito…, cit., página 204.
[14] Também referenciado por Miguel Teixeira de Sousa, no seu Blog do Processo Civil.
[15] Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Volume I, 2.ª edição, Almedina, 2020, página 560.
[16] José Lebre de Freitas-Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado - Volume 2.º Artigos 362.º a 626.º, 4.ª Edição, Almedina, 2019, página 326.
[17] Síntese reforçada no Acórdão da mesma Relação e Relatora de 22 de Maio de 2023 (Processo n.º 1557/21.8T8VFR-A.P1): “Podendo ser objeto de instrução tudo quanto, de algum modo, possa interessar à prova dos factos relevantes para a decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, vedado está, contudo, aquilo que se apresenta como irrelevante (impertinente) para a desenhada causa concreta a decidir, devendo, para se aferir daquela relevância, atentar-se no objeto do litígio (pedido e respetiva causa de pedir e matéria de exceção). Havendo enunciação dos temas de prova, o objeto da instrução são os temas da prova formulados, densificados pelos respetivos factos, principais e instrumentais (constitutivos, modificativos, impeditivos ou extintivos do direito afirmado) – arts 410º, do CPC e 341º e seguintes, do Código Civil;(…) A perícia, para perceção ou valoração de factos da causa carecidos de prova (por isso pertinente), só pode ser indeferida se a perceção e a apreciação desses factos não reclamar conhecimentos científicos, técnicos ou artísticos especiais sendo que, a reclamá-los, é aos peritos que cabe a pronúncia”.
[18] Carregado e sublinhado nossos.
[19] Carregado e sublinhado nossos.
[20]Do mesmo modo que seria relevante conhecer os custos da actividade…
[21] Como se refere no Acórdão da Relação de Coimbra de 07 de Maio de 2024 (Processo n.º 2481/23.5T8LRA-A.C1-Pires Robalo), aprova pericial «é impertinente» se «não respeitar aos factos da causa», sendo, por outro lado, «dilatória» se, «não obstante respeitar aos factos da causa, o seu apuramento não requerer o meio de prova pericial, por não estarem em causa conhecimentos especiais que a mesma pressupõe»” (exemplificando com a situação desses autos em que, uma Autora, pretendendo “ser ressarcida dos danos, de que segundo ela foi vitima, em virtude do acidente, inerentes à paralisação de material circulante, descrevendo os mesmos e o respectivo valor nos articulados, para conhecer dos mesmos, e responder a tal matéria não é necessário conhecimento específicos, científicos, ou especiais, que o julgador não possua, sendo, por isso, desnecessária a realização de prova pericial”.
[22] E saber se podia ou devia ter havido algum aperfeiçoamento da Petição Inicial não é o objecto deste recurso, nem isso parece ter preocupado as partes.
[23] Assim, por exemplo:
- o Acórdão da Relação do Porto de 23 de Janeiro de 2025 (Processo n.º 2369/21.4T8PNF-C.P1-Ana Luísa Loureiro): “I- Nos termos do disposto no art.º 388.º do Cód. Civil, a prova pericial tem por fim a perceção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objeto de inspeção judicial. II - O indeferimento do requerimento de produção de prova pericial pressupõe que esta, atento o seu objeto, se mostre impertinente – não respeite aos factos (controvertidos) relevantes para a decisão final – ou dilatória – apesar de respeitar a factos (controvertidos) relevantes para a decisão final, o apuramento de tal factualidade não exige os conhecimentos especiais inerentes a tal meio de prova”;
- o Acórdão da Relação de Lisboa de 19 de Dezembro de 2024 (Processo n.º 2322/23.3T8CSC-A.L1-2-Fernando Caetano Besteiro): a “prova pericial constitui um meio de prova a realizar nas situações em que, para o apuramento de um facto, seja necessário apelar ao conhecimento especial (técnico, científico ou artístico) de outrem, que assume a função de perito e que irá pronunciar-se sobre a questão (ou questões) de facto solicitada, percepcionando-o e valorando-o em razão desse conhecimento especial”.
- o Acórdão da Relação do Porto 04 de Junho de 2024 (Processo n.º 5494/23.3T8VNG-A.P1-Alexandra Pelayo): “Não pode ser considerada impertinente a perícia que tem por objeto a emissão de juízo técnico sobre a contabilidade da ré, para esclarecimento de factos alegados na petição inicial, que visam demonstrar a irregularidade das contas aprovadas pela deliberação social cuja anulação é requerida”;
- o Acórdão da Relação de Lisboa de 15 de Setembro de 2022 (Processo n.º 739/22.0T8PDL-A.L1-2-Nelson Borges Carneiro): “A perícia é um meio de prova a que a parte ou/e o tribunal pode lançar mão quando se torne necessário recorrer ao conhecimento técnico de outrem, os peritos, os quais pronunciando-se sobre a questão solicitada expõem as suas observações e as suas impressões pessoais sobre os factos presenciados, retirando conclusões objetivas dos factos observados e daqueles que se lhes ofereçam como existentes, concorrem, positiva ou negativamente, para formar a convicção do tribunal”;
- o já citado Acórdão da Relação de Guimarães de 26 de Setembro de 2019: “A prova pericial tem de específico em relação aos restantes meios de prova legalmente previstos, a circunstância da perceção (verificação material) dos “factos” e/ou a apreciação destes (determinação das ilações que deles se possam tirar acerca de outros) reclamar conhecimentos científicos, técnicos ou artísticos especiais, que por não fazerem parte da cultura geral e da experiência comum, se devem presumir não serem detidos pelo juiz”.
[24] A simples verificação da informação contabilística da Autora, permite a verificação do seu volume de vendas e dos resultados líquidos assim obtidos.