A invocação da autoridade do caso julgado, pelo réu-recorrente, pela primeira vez no recurso de revista, sem que a questão tivesse sido suscitada nas instâncias e por elas decidida, constitui questão nova, que não pode ser apreciada em revista, e que não pode sustentar a admissibilidade deste recurso com base no artigo 629.º, n.º 2, alínea a) do CPC.
*I. RELATÓRIO
1. CC e DD propuseram ação declarativa comum contra EE e FF (1ºs Réus) e contra AA e BB (2ºs Réus).
Os autores pediram o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre o prédio identificado no artigo 1º da petição inicial e que sobre a faixa de terreno descrita nos artigos 9º e 10º da petição inicial, que integra o prédio dos 1ºs réus, descrito no artigo 8º, está constituída uma servidão permanente de passagem a pé e com veículos de tração animal e mecânica, por usucapião, a favor do prédio dos autores identificado no artigo 1º da petição inicial. Pediram também a condenação de todos os réus a reconhecerem o direito dos autores e a manterem livre e desimpedida a faixa de terreno destinada a caminho, abstendo-se de praticar quaisquer atos impeditivos ou perturbadores do exercício do direito de servidão dos autores.
Apenas os segundos réus (agora recorrentes) contestaram a ação, impugnando a generalidade dos factos alegados pelos autores, e pediram a respetiva condenação como litigantes de má-fé.
2. A primeira instância enunciou o objeto do litigio nos seguintes termos:
«São as seguintes as questões que compete a este tribunal decidir:
- direito de propriedade dos autores sobre o prédio identificado no artigo 1º da petição inicial;
- constituição de servidão de passagem a pé, com veículos de tração animal e mecânica, por usucapião, a favor do prédio dos autores sobre a faixa de terreno descrita nos artigos 8º e 9º da petição inicial sobre o prédio dos 1ºs réus;
- litigância de má fé.»
E por sentença de 23.02.2024 proferiu a seguinte decisão:
«Pelo exposto, julgo a presente ação de processo comum totalmente procedente e, em consequência:
a) Reconheço o direito de propriedade dos autores sobre o prédio urbano que se destina a habitação, com a área coberta de 185,50 m2 e descoberta de 9.034,50 m2, sito na Rua ..., ..., ..., inscrito na respetiva matriz predial da freguesia de ... sob o artigo ..09º e descrito na 2º Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ..71/19900102;
b) Reconheço que sobre a faixa de terreno com a largura de cerca de 5 metros e a extensão de cerca de 31,70 m, destinada a caminho e que permite o acesso pelo lado sul, do prédio dos autores de e para a via pública, a Rua ..., através de um portão lateral com a largura de 4 metros, situado a uma distância de cerca de 31,70 m contados desde a Rua ..., iniciando-se o referido caminho a poente, junto à Rua ... e prolonga-se para nascente, numa extensão de 31,70 m, até ao portão lateral existente na estrema sul do prédio dos autores, que integra o prédio dos 1ºs réus descrito no artigo 8º da petição inicial, está constituída uma servidão permanente de passagem a pé e com veículos de tração animal e mecânica, por usucapião, a favor do prédio dos autores supra descrito;
c) Condeno todos os réus a reconhecerem o direito dos autores e a manterem livre e desimpedida a faixa de terreno destinada a caminho, abstendo-se de praticar quaisquer actos que possam impedir ou perturbar o exercício do direito de servidão dos autores.»
3. Os segundos réus interpuseram recurso de apelação, impugnando o julgamento da matéria de facto e a aplicação do direito.
A segunda instância enunciou o objeto do recurso nos seguintes termos:
« a) impugnação da decisão sobre a matéria de facto (erro na apreciação da prova);
b) decisão de mérito, cuja modificação depende, sobretudo, da eventual alteração da decisão de facto.»
Por acórdão de 24.09.2024, o TRC julgou improcede a pretensão dos segundos réus em verem modificada a decisão de facto, bem como julgou improcedente a decisão de direito, confirmando a sentença recorrida.
4. Contra esse acórdão, os segundos réus interpuseram recurso de revista, em cujas alegações formularam as seguintes conclusões:
«A) Quando o recurso de revista tem como fundamento a ofensa de caso julgado é sempre admissível recurso, como resulta do disposto no artigo 629º, nº 2, a), do Código de Processo Civil, não estando o recurso limitado pelo valor da causa e sucumbência, nem pela limitação da “dupla conforme” constante do art. 671º, nº 3, do Código de Processo Civil, pois a previsão desta logo excepciona os casos em que o recurso é sempre amissível.
B) Na acção ordinária nº 74/97 do ...º Juízo do Tribunal Judicial de ... foi proferida em 10-01-1998 e logo transitou em julgado sentença homologatória da transacção celebrada em 19-1-1997 entre o antecessor na posse e propriedade do prédio dos ora 2ºs RR. e recorrentes, GG, autor em tal processo, e o antecessor na posse e propriedade do prédio dos ora 1ºs RR., HH e mulher II, réus em tal processo, pela qual se determinou que:
1ª - O terreno dos réus (antecessores dos ora 1ºs RR.) é o terreno central de 3630 m2, que integra a parcela B do mapa que se estende para nascente até à linha delimitadora que nos autos é a linha assinalada pela letra E do referido mapa.
2ª - O caminho de serventia descrito no mapa por “CAMINHO A ABANDONAR” e que se estende de Noroeste para Sudeste, passa a ser substituído pelo caminho situado a Sul da propriedade e que se estende de Poente para Nascente. Tem este último caminho 5 m de largura e a superfície de 525 m2.
3ª - O autor (antecessor dos ora 2ºs RR.) é proprietário da faixa de terreno situado a Norte que se estende, no sentido Poente Nascente e que tem a área descrita no mapa, de 335 m2. Esta área passa a integrar a área da parcela nº 1 do mapa que assim ficará a ter a área de 8404 m2 e que também é assinalada pela letra A.
4ª - A área da parcela nº 2 também assinalada no mapa pela letra B, fica com a área de 12158 m2, e é pertença dos réus na parte central da propriedade ou da área B, onde possuem os assinalados 3630 m2.
5ª - As partes acordaram em atribuir a letra E à linha delimitadora entre a propriedade de autor e réus.
C) Estas transacção e sentença judicial que a homologou determinaram que a faixa de terreno, que nos presentes autos inversamente se ajuizou constituir uma servidão de passagem a favor do prédio do autor a onerar o prédio dos 1ºs réus onde tal faixa de terreno se integra, é, ao invés, parte integrante do prédio dos aqui 2ºs RR. e ora recorrentes, de maneira que é o prédio dos 2ºs RR. que confronta também aí com o prédio dos AA. a Norte e com o prédio dos 1ºs RR. a Sul interpondo-se entre os prédios de AA. e 1ºs RR. Pelo que,
D) O que foi prescrito em tal transacção e sua sentença homologatória transitada em julgado contraria e torna impossíveis os factos provados 5), 7), 24), 52), 76), 77) e 78) e afirma o facto não provado a), referidos supra em 5 e 6. E
E) A injunção decisória proferida nos presentes autos, de servidão de passagem a favor do prédio do autor a onerar a faixa de terreno integrante do prédio dos 1ºs RR., no pressuposto lógico de que a faixa de terreno é parte integrante do prédio dos 1ºs RR., também se revela - quer a propriedade dos 1ºs RR. quer a servidão dos AA. que a onera - impossível juridicamente e em termos lógicos, por contrária à prescrição da transacção homologada por sentença de que tal faixa de terreno é pertença e parte integrante do prédio dos 2ºs RR.
F) «A sentença homologatória da confissão, desistência ou transação efetuada numa ação declarativa constitui, no nosso sistema jurídico, uma decisão de mérito, equiparada à que julga aplicando o direito aos factos (art. 290.º, n.º 3), sendo dotada de eficácia de caso julgado, na medida em que, por ela, é o réu condenado ou absolvido nos precisos termos do ato dispositivo celebrado» - cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12-09-2023, proferido no processo 7624/15.0T8LSB.L1-7, em que foi relator o Senhor Desembargador José Capacete.
G) Coloca-se assim a questão que tem a ver com o conteúdo e alcance do caso julgado material, na sua vertente positiva, ou seja, com a eficácia da autoridade do caso julgado formado pela referida sentença homologatória de transacção «no que respeita à sua extensão a ações posteriores, e, em especial, a terceiros, pelo que importa analisá-la à luz do art. 619º, nº 1, do C.P. Civil, o qual dispõe que “Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580º e 581º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696º a 702º”».
H) «Dito de outro modo e nas palavras de Miguel Teixeira de Sousa, “quando vigora como autoridade de caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade do caso julgado é o comando de acção ou a proibição de omissão respeitante à vinculação subjectiva à repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão antecedente”».
I) E a autoridade de caso julgado pode funcionar independentemente da verificação da tríplice identidade sujeitos, de pedido e de causa de pedir, «podendo estender-se a outros casos, designadamente quanto a questões que sejam antecedente lógico necessário da parte dispositiva do julgado».
J) «Do mesmo modo, considera Lebre de Freitas que “(…) a autoridade do caso julgado tem (…) o efeito de impor a primeira decisão, como pressuposto indiscutível da segunda decisão de mérito (…). Este efeito positivo assenta numa relação de prejudicialidade: o objecto da primeira decisão constitui questão prejudicial na segunda acção, como pressuposto necessário da decisão de mérito que nesta há-de ser proferida».
L) Também sustenta Miguel Teixeira de Sousa, que “não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário, que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo considerado no seu todo: o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge estes fundamentos enquanto pressupostos daquela decisão”.
M) «O alcance e autoridade do caso julgado não se pode limitar aos estreitos contornos definidos nos arts. 580 e 581º do CPC, para a exceção do caso julgado, antes se devendo tornar extensivos a situações em que, não obstante a ausência formal da identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir, o fundamento e razão de ser daquela figura jurídica estejam notoriamente presentes» - cfr. Acórdão do STJ, de 15.01.2013 (processo nº 816/09.2TBAGD.C1.S1).
N) «A autoridade do caso julgado implica o acatamento de uma decisão proferida em ação anterior cujo objeto se inscreve, como pressuposto indiscutível, no objeto de uma ação posterior, obstando assim a que a relação jurídica ali definida venha a ser contemplada, de novo, de forma diversa e abrange, para além das questões diretamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado» - Cfr. Acórdão do STJ, de 22.02.2018 (revista nº 3747/13.8T2SNT.L1.S1).
O) Quanto à extensão do caso julgado salienta-se:
«i) – os terceiros juridicamente indiferentes, a quem a decisão não produz nenhum prejuízo jurídico, porque não interfere com a existência e validade do seu direito, mas pode afetar a sua consistência prática ou económica, ficando, por isso, abrangidos pela eficácia do caso julgado;
ii) – os terceiros juridicamente prejudicados, titulares de uma relação jurídica independente e incompatível com a das partes (definida pela sentença), os quais não são atingidos pelo caso julgado alheio;
iii) – os terceiros titulares de uma relação ou posição dependente da definida entre as partes por decisão transitada, a quem se tem reconhecido a eficácia reflexa do caso julgado;
iv) – os terceiros titulares de relações paralelas à definida pelo caso julgado alheio ou com ela concorrentes, considerando-se, quanto às primeiras, que o caso julgado só se estende às partes e, quanto às segundas que, se a lei não exigir a intervenção de todos os interessados, só lhes aproveita o caso julgado favorável» - Cfr. Acórdão do STJ de 13-09-2018 proferido no processo 687/17.5T8PNF.S1 em que foi relatora a Senhora Conselheira Rosa Tching.
P) Ora, o que foi prescrito pela referida transacção e sua sentença homologatória transitada em julgado contraria e torna impossíveis os factos provados 5), 7), 24), 52), 76), 77) e 78) e afirma o facto não provado a).
Q) E a injunção decisória proferida nos presentes autos de servidão de passagem a favor do prédio do autor a onerar a faixa de terreno integrante do prédio dos 1ºs RR., no pressuposto lógico de que a faixa de terreno é parte integrante do prédio dos 1ºs RR., também se revela - quer a propriedade dos 1ºs RR. quer a servidão dos AA. que a onera - impossível juridicamente e em termos lógicos, por contrária à prescrição da transacção homologada por sentença de que tal faixa de terreno é pertença e parte integrante do prédio dos 2ºs RR. Com efeito,
R) Afirmando-se naquela referida transacção e sentença homologatória, no confronto entre os antecessores dos 2.ºs RR. e dos 1ºs RR., o direito de propriedade daqueles e assim dos 2.ºs RR. em detrimento destes e assim dos 1ºs RR., estes, sendo sucessores adquirentes de quem foi parte naquele processo em que foi celebrada a transacção e proferida sentença homologatória, e os AA. enquanto titulares do direito real menor derivado baseado no direito de propriedade, são titulares de uma relação ou posição dependente da definida entre as partes por decisão transitada, verifica-se eficácia reflexa daquele caso julgado da transacção e sua sentença homologatória.
Deste modo,
S) O Acórdão proferido incorre em ofensa do caso julgado enquanto autoridade do caso julgado da transacção e respectiva sentença homologatória do processo 74/97 e assim em violação das normas legais dos artigos 290º, nº 3, e 619º, nº 1, do Código de Processo Civil. Pelo que
T) Deve e impõe-se dar cumprimento a tais normas e caso julgado, proferindo-se decisão que revogue o Acórdão proferido e, porque «a autoridade do caso julgado tem antes o efeito positivo de impor a primeira decisão, como pressuposto indiscutível de segunda decisão de mérito», que julgue a acção improcedente absolvendo os RR. dos pedidos.»
Os recorridos apresentaram contra-alegações.
5. Distribuídos os autos no STJ e prefigurada a não admissibilidade da revista, foram as partes notificadas para se pronunciarem, nos termos do artigo 655.º do CPC.
Os recorrentes pronunciaram-se, reiterando o entendimento de que o recurso seria admissível por existir exceção de caso julgado ou ofensa de caso julgado.
6. Em 26.02.2025 foi proferida decisão singular que julgou findo o recurso por não haver que conhecer do seu objeto.
7. Os recorrentes reclamaram para a Conferência pedindo a revogação dessa decisão, reafirmando que a revista devia ser admissível com base na existência de caso julgado.
Cabe apreciar em Conferência.
*
II. FUNDAMENTOS
1. A questão da admissibilidade da revista
1.1. A presente causa tem o valor de € 5.000,01, o que, em princípio, excluiria o recurso de revista, atento o disposto no artigo 629.º, n.º 1 do CPC e no artigo 44º da Lei n.º 62.º/2013. Por outro lado (e ainda que assim não fosse), o acórdão recorrido confirmou a decisão da primeira instância, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, pelo que a revista não seria admissível nos termos gerais, do artigo 671º, n.º 1 do CPC, por a tal obstar a existência de dupla conforme prevista no n.º 3 do artigo 671º.
Face a tais obstáculos processuais, os recorrentes invocaram o disposto no artigo 629º, n.º 2, alínea a) do CPC, ou seja, a ofensa do caso julgado, para justificarem a admissibilidade da revista, dado que tal hipótese não depende do valor da causa, nem é bloqueada pela existência de dupla conforme.
1.2. Como decorre das alegações dos recorrentes, o objeto da revista respeitaria à ofensa do caso julgado na vertente de autoridade do caso julgado.
Porém, tal configura uma matéria não apreciada, em momento algum, pelas instâncias.
Compulsando as conclusões da apelação que os agora recorrentes haviam apresentado no TRC, facilmente se concluiu que a questão da ofensa do caso julgado não foi aí suscitada pelos apelantes, pelo que tal questão não integrou o objeto desse recurso.
A questão do caso julgado surge, assim, como questão nova apenas no presente recurso, pelo que esse alegado fundamento não poderá, por si só, conduzir à admissibilidade da revista, pois como decorre do artigo 671º, n.º 1 do CPC, e do próprio nomen iuris deste recurso, o STJ revê o que foi decidido pela Relação.
Ora se a questão não foi suscitada pelos recorrentes, que tinham o ónus de a suscitar, obviamente que não pode ser conhecida pelo STJ. Acresce que, como a jurisprudência e a doutrina têm unanimemente sustentado, a questão da ofensa do caso julgado não é de conhecimento oficioso, tendo, portanto, de ser invocada pelas partes.
1.3. Consta dos autos que apenas a matéria atinente à exceção dilatória do caso julgado foi apreciada pela 1.ª instância, que, em sede de despacho saneador, afirmou o seguinte: “Em segundo lugar, os réus invocam, a excepção do caso julgado relativamente à transacção celebrada no processo nº 74/1997.
No referido processo, cuja junção foi requerida, verifica-se que o autor GG instaurou acção de demarcação contra HH e mulher II, pedindo que seja demarcada a respectiva área do prédio sito no ..., freguesia de ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ..90 da freguesia de ... e descrito a favor do autor na 1ª Conservatória do Registo Predial de ... sob a ficha nº ..35.
Ora, verifica-se que naquela acção e na presente acção não há identidade de sujeitos, porquanto naquela acção os ora autores e réus não foram intervenientes, sendo o pedido de demarcação ali requerido completamente diferente dos pedidos formulados na presente acção.
Não estão, pois, verificados, os pressupostos do caso julgado.
Pelo exposto, julgo improcedente a excepção de caso julgado invocada pelos 3º e 4º réus.”.
Esta decisão transitou em julgado, não tendo os recorrentes dela interposto recurso.
1.4. No presente recurso, os recorrentes vêm invocar a autoridade do caso julgado, que, como já referido, constitui uma questão nova não apreciada pelas instâncias. Efetivamente, a exceção dilatória do caso julgado foi julgada improcedente na primeira instância e transitou em julgado (porque não foi impugnada) e a autoridade do caso julgado não foi invocada pelos réus agora recorrentes, como era seu ónus e decorria do princípio da concentração da defesa.
Ora, as questões novas não podem ser objeto de recurso de revista, a não ser que esteja em causa matéria de conhecimento oficioso, o que não se verifica no caso concreto, pois, como é sabido, a autoridade do caso julgado (diferentemente da exceção dilatória de caso julgado) não é de conhecimento oficioso.
Como afirma Rui Pinto: «ao contrário do que sucede com a existência de prévia sentença entre as partes, a qual é de conhecimento oficioso a fim de que o juiz possa aferir se há exceção de caso julgado - ex vi artigos 577.º, al. i), e 578.º, justamente -, a autoridade de caso julgado não é de conhecimento oficioso. E porquê? Porque, como se vê, ela resume-se à invocação de sentença anterior para se alegar factos principais que constituem a causa de pedir da ação ou em que se baseiam as exceções, respetivamente, de autor e réu. Ora, apenas às “partes cabe alegar” esses factos, como impõe o n.º 1 do artigo 5.º.», in “Exceção e autoridade de caso julgado – algumas notas provisórias”, Julgar Online, novembro de 2018, pp. 35-36.
Pelo exposto, tem de se concluir, como se concluiu na decisão agora reclamada, que não se encontra verificada a hipótese prevista no artigo 629.º, n.º 2, alínea a) do CPC, nem qualquer outra hipótese que sustentasse a admissibilidade da revista. Não existe, assim, fundamento para revogar a decisão reclamada, tal como não existe qualquer nulidade dessa decisão por omissão de pronúncia, pois, como supra referido, não existe qualquer matéria de conhecimento oficioso.
*
DECISÃO: Pelo exposto, julga-se a reclamação improcedente, confirmando-se a decisão reclamada que não admitiu a revista.
Custas pelos recorrentes-reclamantes.
Lisboa, 29.04.2025
Maria Olinda Garcia (relatora)
Luís Espírito Santo
Rosário Gonçalves