ACIDENTE DE TRABALHO
SEGURO DE ACIDENTES DE TRABALHO
PAGAMENTO
LESADO
RESPONSABILIDADE OBJECTIVA
PRESSUPOSTOS
COMISSÃO
COMITENTE
COMISSÁRIO
ILICITUDE
CULPA
DANO
TERCEIRO
TRABALHO TEMPORÁRIO
EMPRESA DE TRABALHO TEMPORÁRIO
Sumário


I - A responsabilidade emergente de acidente de trabalho é uma responsabilidade objectiva, associada a um princípio de risco empresarial ou de socialização do risco, que tem subjacente a necessidade de assegurar que os trabalhadores sinistrados e as suas famílias não fiquem desprotegidos perante um acidente com reflexos na sua capacidade de trabalho e ganho.
II - Nas situações em que o acidente tenha resultado da actuação ilícita e culposa de outrem (que não as pessoas identificadas no artigo 18.º, da LAT), embora se mantenha a responsabilidade objectiva, pode o sinistrado ou, em caso de morte deste, os seus sucessores, demandar os terceiros que tenham provocado o acidente – artigo 17.º, da LAT.
III - Esta responsabilidade, que pode ser meramente cível ou também criminal, é exercida nos termos gerais e, não, no âmbito do processo de acidente de trabalho.
IV - A responsabilidade do comitente prevista no artigo 500.º, do Código Civil, é de natureza objectiva, sendo traço essencial da relação de comissão a existência de relações de autoridade e subordinação correlativas.
V - Constitui exemplo paradigmático da relação de comissão a de trabalho subordinado caracterizada por o trabalhador se encontrar sob as ordens e direcção efectiva do empregador.
VI - A responsabilidade pelos danos decorrentes da execução de tarefa ou actividade, nas situações em que alguém é colocado à disposição de um terceiro pelo seu comitente para execução dessa tarefa ou actividade, pode caber ao comitente habitual ou ao comitente ocasional, dependendo de se determinar quem detinha, no momento em que o dano é causado, o poder funcional de controle sobre o comissário.
VII – Constituem elementos essenciais de verificação de uma relação de comissão, a dependência funcional sustentada por uma relação jurídica (i.) e o agir no interesse do comitente (ii).
VIII – A colocação de um trabalhador (subordinado) à disposição de terceiro para manobrar uma máquina (retroescavadora) ao abrigo da execução de um contrato misto de locação e prestação de serviços, celebrado pelo empregador com terceiro, não determina uma “cedência” (total ou parcial) da autoridade e direcção da entidade empregadora, uma vez que o trabalhador agia no interesse e por conta daquela. Nessa medida, é de afastar a existência de uma relação de comissão relevante, para efeitos de responsabilização ao abrigo do artigo 500.º, do Código Civil, entre esse terceiro (empreiteira) e o trabalhador que causou o acidente por negligência, independentemente de, quando do acidente, este seguir as instruções dadas pela empresa empreiteira através do seu encarregado da obra.

Texto Integral


Acordam na 6ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça,

I - Relatório

1. Em 07-10-2020, FIDELIDADE – COMPANHIA DE SEGUROS, SA propôs acção declarativa de condenação contra HANDLE - CONSTRUÇÕES LDA e AA, pedindo a condenação da 1.ª Ré a pagar-lhe a quantia de €52.903,33, acrescida de juros de mora, desde a citação, reportada ao montante que despendeu em cumprimento de acordo homologado por sentença (transitada em julgado) prolatada no âmbito de acção especial emergente de acidente de trabalho (Processo n.º1385/15.0...), decorrente da celebração, com a H..., Lda, de um contrato de seguro de acidentes de trabalho1.

Subsidiariamente, pediu a condenação do 2.º Réu a pagar-lhe a referida quantia de €52.903,33, acrescida de juros de mora desde a citação.

Fundamenta a acção no seu direito de sub-rogação previsto no artigo 17.º, n.º 4, da Lei n.º 98/2009, de 04-09 (Lei dos Acidentes de Trabalho – LAT) e no artigo 500.º, do Código Civil.

Invocou para o efeito e fundamentalmente que, em 20-08-2015, na obra de Subconcessão Rodovia Baixo Alentejo, no concelho de ..., ocorreu acidente de trabalho de que resultou a morte de um trabalhador da 1.ª Ré (BB), decorrente dos trabalhos que se encontravam a ser executados pelo 2.º Réu, trabalhador da 1.ª Ré, ao manobrar uma retroescavadora (objecto de um contrato de aluguer de máquina com manobrador celebrado entre aquela 1.ª Ré e a T..., S.A.)2.

Alegou ainda a Autora que por sentença de 30-10-2018, transitada em julgado (Processo n.º 69/15.3..., do Juízo de Competência Genérica de ...), o 2.º Réu foi condenado pela prática de um crime de homicídio por negligência referente ao acidente dos autos.

2. A 1.ª Ré contestou defendendo-se por excepção (arguindo a sua ilegitimidade) e por impugnação. Neste âmbito declinou a sua responsabilidade pelas consequências do acidente, referindo que o 2.º Réu, enquanto manobrador do equipamento, quando do acidente, encontrava-se às ordens e sob a direcção da empresa T..., através de um seu funcionário, CC, no que concerne a efectiva utilização daquele equipamento.

3. Após várias vicissitudes processuais, proferido despacho que delimitou o objecto do litígio e enunciou os temas da prova, foi realizado julgamento e proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a 1.ª Ré a pagar à Autora a quantia de €48.643,70, acrescida de juros moratórios calculados à taxa legal civil desde a citação até integral pagamento.

4. Inconformada a 1.ª Ré interpõe apelação, tendo o tribunal da Relação de Évora proferido acórdão que julgou improcedente o recurso, confirmando a sentença.

5. A 1.ª Ré interpôs recurso de revista excepcional com fundamento na alínea a) do n.º1 do artigo 672.º do CPC, alicerçada na relevância jurídica da questão sobre a existência de relação de comissão em casos de acidentes de trabalho envolvendo trabalhadores sob ordens de terceiros, no contexto de contratos mistos de locação de equipamentos e prestação de serviços.

Conclui nas suas alegações (transcrição):

A) A Recorrente, aceitando a matéria de facto fixada pelo Tribunal da Relação, entende que o enquadramento realizado no Acórdão, merece uma melhor e mais aprofundada apreciação sobre o conceito do contrato de aluguer máquina com manobrador e suas consequências na relação jurídica de comitente comissário derivada desse mesma contrato, pelo que deverá assim ser aceite e apreciado o presente recurso de revista excecional nos termos e para os efeitos consignados no art.º 672 .º n.º 1, alínea a) do CPC.

B) A questão jurídica a apreciar para além do seu impacto direto na presente ação, reveste assim um carácter de interesse geral pela sua relevância jurídica, sendo claramente necessário para uma melhor apreciação do direito, por se tratar de um tema jurídico relevante, devendo ser admitida a revista excecional.

C) Como é realçado no Acórdão colocado em crise, que a decisão recorrida considerou que a Seguradora Fidelidade (para quem foi transferida a responsabilidade civil emergente de acidentes de trabalho) tem o direito de se sub-rogar no direito do lesado (vítima de acidente de trabalho) contra a aqui recorrente, pelo valor indemnizatório que pagou, fundando-se a responsabilidade daquela Ré, aqui recorrente, no facto de o acidente ter sido causado por um trabalhador que agia como seu comissário.

D) Por sua vez, a Recorrente, defende que em face da existência do contrato de aluguer, estamos perante uma sucessão e/ou cumulação de relações de comissão, que no momento do acidente a relação de comissão que assumia preponderância por forma a equacionar a aplicabilidade do artigo 500.º do Código Civil, era a existente a T..., S.A.,, entidade que havia celebrado o contrato de aluguer da máquina e manobrador, porquanto o ato danoso praticado pelo comissário surge na sequência expressa de, ordem, orientação e determinação da execução da tarefa ordenada pela referida T..., S.A., a quem se encontrava a executar os referidos trabalhos.

E) É, mister assim verificar o enquadramento legal do contrato de aluguer de equipamento com manobrador e suas consequências na relação de comissão e/ou sucessão de comissões, quando esse mesmo trabalhador executa uma tarefa, sob a vigilância da entidade locatária, suas ordens, no local por si designado, retirando dessa mesma execução o benefício para si.

F) Na análise e enquadramento jurídico que pretendemos ver abordada e esclarecia por Sua Exas Juízes Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça, importará realçar a matéria de facto dada como provada e não provada que, nos permitimos considerar como pertinente, sem prejuízo e/ou exclusão de qualquer outro facto, e que se encontra vertida nos pontos 5, 7, 9, 10, 11, 12. e 29 da matéria de facto dada como prova e o constante das alíneas a) e b) dos factos dados como não provados e que supra ficaram transcritos.

G) Para além da matéria de facto dada como provada, importa igualmente ter em consideração, no que respeita ao contrato de aluguer de máquina como manobrador, designadamente, que o valor do aluguer se divide em duas componentes: Hora de funcionamento € 23,00 e Hora à ordem € 11,50, isto é, o primeiro valor corresponderia às horas que a máquina estaria em funcionamento, o segundo correspondia ao valor a liquidar pela disponibilidade da máquina em obra, para ser usada quando a T..., S.A., na qualidade de locatária, utilizasse quando assim o entendesse.

H) Resulta ainda que no mencionado contrato não existe qualquer preço fixado para o manobrador, para o combustível, transportes, manutenção e assistência da máquina, todos estes itens, ficam a cargo do alugador, isto é, a cargo da Recorrente e em momento algum a Ré e a T..., S.A., fixaram quais a quantidades de horas e/ou trabalhos a realizar através da utilização da máquina alugada, e muito menos em que circunstâncias seriam executados.

I) É consabido que "um contrato, é um negócio jurídico bilateral ou plurilateral, isto é, integrado por duas ou mais declarações negociais exprimindo vontades convergentes no sentido da realização de um objetivo comum que justifica a tutela do direito. É, pois, a convenção pela qual duas ou mais pessoas constituem, regulam, modificam ou extinguem relações jurídicas, regulando assim os seus interesses", ou, dito por outras palavras, um "acordo por que duas ou mais partes ajustam reciprocamente os seus interesses, dando-lhes uma regulamentação que a lei traduz em termos de efeitos jurídicos".

J) Resulta dos factos provados que é a existência de um contrato de aluguer de máquina escavadora, com manobrador, celebrado entre a Recorrente e a Sociedade T..., S.A., tratando-se assim de um contrato atípico, celebrado ao abrigo da liberdade contratual das partes.

K) Na situação que nos ocupa, foi acordado que a Ré, ora recorrente, se obrigou a disponibilizar a máquina e manobrador, à T..., S.A., para esta executar os trabalhos à sua escolha, sobre suas ordens e orientações técnicas, na obra de subconcessão Rodovia Baixo Alentejo, entre ... e ..., no concelho de ....

L) Resulta provado nos autos que o 2.º Réu (manobrador) e BB (falecido e funcionário de um terceira entidade) seguiram no local as ordens dadas por CC, encarregado da T..., S.A., para aquela frente de trabalhos e por volta das 09h00m, CC, deu instruções ao 2.º Réu (manobrador) e a BB para se deslocarem até ao local identificado como PK 8+400, a fim de, nesse local, serem seladas, com argamassa, as juntas da caixa de drenagem ali existente (selagem dos dois anéis que compõem a caixa do evacuador do coletor central) e, posteriormente, colocada a respetiva cúpula. (vide pontos 11 e 12 dos factos dados como provados)

M) A relação comitente comissário encontra-se regulada no Artigo 500.º do Código Civil, e a doutrina tende a esclarecer que o termo comissão, utilizado pelo legislador deverá ser apreciado, num sentido amplo de serviço ou atividade realizada por conta e sob a direção de outrem, podendo essa atividade traduzir-se num ato isolado ou numa função duradoura, ter carácter gratuito ou oneroso, manual ou intelectual, pressupondo, uma relação de dependência ou subordinação entre o comitente e o comissário, que autorize aquele a dar ordens ou instruções a este, só essa possibilidade de direção é capaz de justificar a responsabilidade do primeiro pelos atos do segundo." (vide Antunes Varela e Pires de Lima, Código Civil Anotado, Vol. I, 4.ª Edição, pág. 507 e 508).

N) Importa é que o comissário ou preposto, nomeado ou aceite pelo comitente, embora, porventura, não escolhido, se encontre numa relação de subordinação ou dependência quanto a este último, de maneira que ele possua o direito, não só de dar-lhe ordens ou instruções precisas sobre a finalidade e os meios de execução da comissão, mas também de fiscalizar diretamente o seu desempenho.

O) Assim, salvo o devido entendimento contrário, deparamo-nos com uma sucessão ou cumulação de relações de comissão, sendo que a alugadora, ainda que sem uma relação jurídica com o manobrador, adquire através do contrato de aluguer, o poder de direção e sujeita o manobrador à sua subordinação, passando-lhe a dar ordens, orientações, fiscalizando e supervisionado o seu trabalho.

P) Na verdade, resulta da matéria de facto dada como provada que A Recorrente/comitente (Handle Construções, Ld.ª) põe o manobrador (o co-Réu) à disposição funcional de um terceiro (a T...).

Q) E, a partir desse momento, aquele manobrador passa a agir sob orientação e no imediato interesse deste (alugador), suportando este os seus custos (mediante pagamento do preço fixado no contrato de aluguer) e obtendo os benefícios da execução da tarefa.

R) A sociedade T..., mediante o contrato de aluguer celebrado, fica com a direção da máquina e manobrador, e este ultimo fica sujeito à sua subordinação (recebendo ordens diretas), e a através da execução das ordens e trabalho por este realizado, retirando para si de forma direta um benefício, cria uma relação comitente comissário entre ambos, por preencher todos os pressupostos da relação comitente comissário.

S) Resulta dos fatos dados como provados que foi a própria T... que para além de ter dado as ordens expressas para a execução dos trabalhos que vieram a desencadear o infeliz acidente, foi igualmente a T... que através do seu funcionário DD de EE, procedeu à formação do manobrador para a execução dos trabalhos com a máquina (vide ponto 29 da matéria de facto dada como provada).

T) Importa realçar que foi dado como provado que, para além do 2.º Réu (manobrador) estar na referida obra, onde seguia as instruções e ordens da T..., S.A., e que este aceitou, tendo sido CC, encarregado da T..., S.A., que lhe ordenou a deslocação para aquela frente de trabalhos, isto é, deu-se assim como como provado que o 2.º Réu, atuava "por conta e sob a direção" da T..., S.A.

U) A relação de comissão caracteriza-se, pela realização de uma atividade "por conta e sob a direção de outrem" que "pressupõe uma relação de subordinação ou dependência (criada pelo contrato celebrado entre a Recorrente e T...) o comitente (T...) e o comissário (manobrador), que autorize aquele a dar ordens ou instruções a este".

V) A relação de comitente comissário, nasce com a possibilidade de passar a dar ordens diretas ao manobrador, através do mencionado contrato de aluguer (atípico), ficando o manobrador numa situação se subordinação perante a T..., desde o momento em que aceita ser deslocado em conjunto ca máquina para a mencionada obra, onde recebe formação para o exercido da atividade e passa a receber ordens e orientações, executando trabalhos sobre sua direção e fiscalização.

W) Decorre assim dos factos dados provados e não provados que a Recorrente é alheia aos trabalhos executados pelo manobrador, não lhe deu qualquer instrução quanto à forma como esses trabalhos deveriam ser concretizados, não instruiu o mesmo quando o modo de execução e que tivesse qualquer benefício com a sua execução.

X) Ora, salvo o devido entendimento contrário, a doutrina aponta assim para o não preenchimento da relação de comissão, nas situações em que, apesar de se ter encomendado um serviço a outrem, esse serviço corresponda a uma função autonomamente exercida pelo devedor.

Y) Aliás, tal relação comitente comissário, “estará presente no caso das prestações de serviços em que a atividade é seja imputada ao próprio devedor, ainda que o resultado dessa atividade seja objeto de uma prestação ao credor, como no depósito (art. 1185.º), empreitada (art.1207.º) ou mesmo no contrato de transporte." (Vide Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Vol. I, 7.ª Edição, pág. 369.

Z) Na verdade, a T... apenas podia exigir da Ré, o bom funcionamento da máquina e sua disponibilização com o manobrador em obra, pagando o preço fixado pelas partes, que variava em função da disponibilização da própria máquina e do tempo real de trabalho, o cumprimento do trabalho e/ou tarefas que iriam ser executadas, apenas a si, podem ser imputados.

AA) Assim, somos do parecer que a melhor solução jurídica, será que no caso em concreto e por via da sucessão de comissão, no momento do acidente, o trabalhador da Ré/Recorrente, através do contrato de aluguer de uma maquina com manobrador, que passou a ser dirigido, recebendo ordens direta do alugador, ficando assim numa situação de subordinação deste, e na sequencia da execução de uma atividade por este determinada e sobre a sua orientações e vigilância, encontra sobre uma relação de comitente comissário.

BB) Pela relação criada através do contrato atípico de aluguer de máquina com manobrador, passado o alugador, por via desse mesmo contrato a ter a direção e o manobrador ficar sob sua subordinação, preenche todos os pressupostos para se poder afirmar que estamos perante uma relação de comitente comissário.

CC) A relação de comissão aqui pressuposta é bem mais ampla do que aquela prevista como relação puramente contratual no âmbito da legislação comercial. Aliás, no contexto deste artigo, nem parece pressupor-se uma relação de natureza ou origem contratual, não sendo, sequer, redutível a uma relação contratual de trabalho.

DD) Face à factualidade provada, enquadramento jurídico acolhido pelo douto Tribunal da Relação de Évora, ao considerar que a relação jurídica (contrato de trabalho existente entre a Recorrente e segundo Réu), era mister para a verificação do preenchimento da relação de comissão, é uma apreciação errada e violadora do mais amplo sentido do conceito de comissão criado pelo legislador, tudo como supra se deixou exposto, a T... passou a utilizar para si, com liberdade e autonomia, a coisa locada e manobrador agiu por conta e sua direção.

EE) Ora, entre o locador e o locatário não existe uma relação de comissão, este não desenvolve qualquer tarefa por incumbência daquele, porquanto o locatário recebe do locador uma coisa para a gozar temporariamente no seu interesse próprio (e não do locador), mediante uma retribuição (a renda ou aluguer) arts. 1022º, 1023º, 1031º e 1038º, al. a), do Código Civil.

FF) Destarte, não é a recorrente comitente, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 500.º do Código Civil e, consequentemente, para operar o disposto no artigo 17.º, nº 4 da Lei nº 98/2009, devendo ser absolvida do pedido.”.

6. Em contra-alegações a Autora pronuncia-se pela inadmissibilidade da revista excepcional e pela improcedência do recurso.

Formulou as seguintes conclusões (transcrição):

1. A Ré “Handle - Construções Lda.”, aqui Recorrente, não se conformando com o Acórdão proferido pelo Tribunal a quo a 10.10.2024, veio deste interpor recurso de revista excepcional para o Colendo Supremo Tribunal de Justiça, sob a égide do disposto no art. 672º/1 alínea a) do CPC.

2. Ora, no âmbito da sobredita decisão, o Tribunal a quo confirmou, na íntegra, a decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância datada de 31.10.2023 que, por sua vez, condenou a Recorrente no pagamento do montante de €48.643,70 (quarenta e oito mil seiscentos e quarenta e três euros e setenta cêntimos), acrescida de juros de mora.

3. Tanto o Tribunal de Primeira Instância, como o Venerando Tribunal da Relação de Évora, entenderam que assistia à Recorrida o direito de se sub-rogar na posição do Sinistrado, BB, contra a Recorrente, pelas despesas suportadas a título de um contrato de seguro por acidentes de trabalho, em virtude de um sinistro causado por negligência do Réu AA que, por sua vez, actuava como comissário daquela.

4. Por seu turno, a Recorrente veio agora interpor recurso de revista excepcional, nos termos do art. 672º/1 alínea a) do CPC, alegando, de forma vaga e genérica para tanto, que a questão por si suscitada, ou seja, a existência, ou não, de um relação de comissão in casu, “para além do seu impacto direito na presente ação”, “reveste uma excepcional importância na apreciação da causa jurídica em apreço”, com base na “sua transversalidade nas relações jurídicas estabelecidas entre as partes mediante o principio da liberdade contratual”.

5. Não obstante, cumpre salientar que o sobredito recurso de revista excepcional, não tem como intuito a resolução de um litígio entre as partes, mas sim a salvaguarda da estabilidade do sistema jurídico e da melhor aplicação do Direito.

6. Nas palavras do Colendo Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão proferido a 22.05.2024, “[a] revista excepcional, como o seu próprio nome indica, deve ser isso mesmo- excepcional”.

7. Neste mesmo sentido, esclarece o insigne Juiz Conselheiro Jubilado Abrantes Geraldes que “a intervenção do Supremo apenas se justifica em face de questões cujo relevo jurídico seja indiscutível o que pode decorrer por exemplo da existência de legislação nova cuja interpretação suscita sérias divergências, tendo em vista atalhar decisões contraditórias (efeito preventivo), ou do facto de as instâncias terem decidido a questão ao arrepio do entendimento uniforme da jurisprudência ou da doutrina (efeito reparador). (…) igualmente têm sido acolhidos casos em que se discutem questões de direito relativamente às quais existe instabilidade jurisprudencial especialmente ao nível das relações (…)”.

8. Sucede porém que, a questão suscitada pela Recorrente jamais encontra correspondência em qualquer uma das situações supra identificadas que, por seu turno, justificam a aplicabilidade do art. 672º/1 alínea a) do CPC.

9. Ora, o carácter excepcional deste tipo de recurso de revista, “aponta para a recusa da pretensão quando a decisão recorrida se encontrar numa corrente jurisprudencial consolidada, denotando a interposição de recurso mero inconformismo perante a decisão recorrida”.

10. Em bom rigor, e salvo o devido respeito, é notório que a motivação da Recorrente para a interposição do presente recurso prende-se, exclusivamente, ao seu inconformismo com a decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, entretanto confirmada pelo Tribunal a quo.

11. Servindo como uma última tentativa, infundada e inadmissível, da Recorrente se eximir da sua responsabilidade junto da Recorrida, quando já se encontram esgotadas as todas as vias judiciais.

12. Por conseguinte, o recurso de revista excepcional interposto pela Recorrente nos termos do art. 672º/1 alínea a) do CPC, não deverá ser admitido.

13. Sem prescindir, e apenas por mero dever de cautela e patrocínio, cumpre sempre evidenciar que o Tribunal a quo andou bem ao considerar que “a única relação de comissão que envolvia o 2.º réu AA, causador do sinistro de trabalho em causa nos autos, é aquela que resulta da subordinação jurídica inerente ao vínculo laboral existente entre ele e a Handle”.

14. Dos factos dados como provados, que, na verdade, não foram objecto de impugnação por parte da Recorrente, resulta que, aquando da ocorrência do sinistro em apreço, o Réu AA encontrava-se, a trabalhar numa determinada obra, ao abrigo de um contrato misto de aluguer e de prestação de serviços celebrado entre a Recorrente, sua entidade empregadora, e a Sociedade “T..., S.A.”, sendo certo que, apenas a primeira é que detinha sobre o sobredito Trabalhador os poderes de autoridade derivados de um típico contrato de trabalho subordinado.

15. Veja-se que, o contrato celebrado entre a Recorrente e a Empresa T... corresponde a um contrato misto de locação e de prestação de serviços, por via do qual a Recorrente se obrigou à realização de duas prestações distintas, mediante o pagamento de um preço: por um lado, proporcionar à sobredita Empresa o gozo temporário de uma máquina retroescavadora e, por outro lado, proporcionar um serviço de manuseamento do referido equipamento, prestado por parte de um trabalhador seu, o Réu AA.

16. Por seu turno, o contrato celebrado entre a Recorrente e o 2.º Réu corresponde a um típico contrato de trabalho, ao abrigo do preceituado no art. 11.º do CT, pelo que sempre incumbiu à primeira o cumprimento das respectivas obrigações contratuais, nomeadamente as remuneratórias, os encargos sociais e a contratação do seguro de acidentes de trabalho, encontrando-se o Trabalhador numa situação de subordinação jurídica e económica face a esta.

17. Na verdade, o Réu AA foi apenas, um trabalhador que a Recorrente utilizou para cumprir com o contrato celebrado com a Empresa T....

18. Além disso, quem retirou o lucro do exercício das funções do 2.º Réu sempre foi a Recorrente, tendo por base o vinculo laboral que une ambas as partes, sendo por essa razão responsável pelos danos que o trabalhador, que a própria escolheu e direccionou para aquela função em específico, causou na esfera jurídica de terceiro.

19. Responsabilidade esta, que nunca saiu da esfera jurídica da Recorrente.

20. Ora, a responsabilidade objectiva prevista no art. 500.º do CC pressupõe a verificação de três requisitos: um vínculo entre um comitente e comissário, assente na liberdade de escolha e na subordinação, a prática de facto ilícito no exercício da função de comissário e, finalmente, a responsabilidade deste.

21. Pelo que, no caso sub judice, nunca poderia a “T..., S.A.” ser considerada comitente, dado que o 2º Réu não é detentor de qualquer relação de subordinação jurídica com tal empresa.

22. Em face do supra exposto, a decisão do Tribunal a quo, não merece qualquer reparo, devendo-se manter, na sua íntegra, a decisão recorrida.”.

7. A Formação proferiu acórdão, que admitiu o recurso com fundamento na complexidade e ineditismo da questão, bem como a sua potencial repercussão em litígios futuros.

A decisão foi fundamentada na necessidade de clarificação jurisprudencial sobre a aplicação do artigo 500.º, do Código Civil, em situações semelhantes.

II – APRECIAÇÃO DO RECURSO

De acordo com o teor das conclusões das alegações e tendo em linha de conta a delimitação da questão a analisar na revista levada a cabo pelo acórdão da Formação, impõe-se apreciar:

Da existência de uma relação de comissão entre o 2.º Réu e a empreiteira da obra onde ocorreu o acidente de trabalho (T..., S.A.) nos termos e para efeitos do artigo 500.º, do Código Civil, por forma a afastar a responsabilidade da 1.ª Ré, enquanto entidade empregadora daquele.

1.1 As instâncias consideraram provada a seguinte matéria de facto, que se transcreve:

1 - Em 11 de março de 2015, entre H..., Lda., como primeira outorgante, e BB, como segundo outorgante, foi celebrado o contrato de trabalho temporário a termo incerto, junto à petição como documento n.º 5, aqui dado por integralmente reproduzido, no qual consta, entre o mais, o seguinte: «1.ª O/A Segundo/a Outorgante com a categoria de Pedreiro 2.ª, obriga-se perante a empresa ora outorgante a desempenhar funções, com a seguinte caraterização sumária, executa as tarefas que são inerentes à sua atividade profissional, junto da Empresa Utilizadora T..., S.A..»; «5.ª O/A Segundo/a Outorgante exercerá as funções no local que a Empresa Utilizadora designar, nomeadamente no local de execução da Empreitada sita em ..., toda a área de construção e todos os outros locais correlacionados, incluindo os escritórios, estaleiros e aqueles que decorram da execução destes trabalhos, podendo o mesmo ser alterado, desde que necessário ao exercício da atividade da Primeira Outorgante»; «6.ª O horário de trabalho será em concreto, aquele que for praticado no local de trabalho, de acordo com as instruções e regras de serviço da Empresa Utilizadora, no quadro do período normal de trabalho diário e semanal de 8 e 40 horas respetivamente, de 2.ª a 6.ª feira»; «9.ª Durante a vigência do presente contrato e nos termos do n.º 2 do Art. 185.º do D.L. n.º 260/2009 de 25.09, o/a Segundo/a Outorgante fica sujeito/a ao regime de trabalho que lhe for determinado pela Empresa Utilizadora no que respeita ao modo, lugar, duração e suspensão de prestação do trabalho, segurança, higiene e saúde no trabalho e acesso aos seus equipamentos sociais»; «10.ª A Primeira Outorgante deterá o poder disciplinar relativamente ao/à Segundo/a Outorgante sujeitando-se este/a aos poderes de autoridade e direção da Empresa Utilizadora, delegados pela Primeira Outorgante através do respetivo Contrato de Utilização».

2. Em 08 de junho de 2015, entre H..., Lda, como primeira outorgante, e BB, como segundo outorgante, foi celebrada a seguinte adenda ao contrato supra aludido, junto à petição como documento n.º 5, aqui dado por integralmente reproduzido, no qual consta, entre o mais, o seguinte: «1.ª O/A Segundo/a Outorgante com a categoria de Pedreiro 2.ª, obriga-se perante a empresa ora outorgante a desempenhar funções, com a seguinte caracterização sumária, executa as tarefas que são inerentes à sua atividade profissional, junto da Empresa Utilizadora»; «2.ª O motivo da presente adenda prende-se com a necessidade de mão-de-obra para a realização de empreitada com caráter temporal limitado, nos termos da alínea a) e g) do n.º 2 do Art. 140.º da Lei n.º 07/2009 de 12.02, concretamente com a adjudicação à Empresa Utilizadora da Empreitada: Lanço A + B em .../..., que justifica quer a cedência de trabalhadores com categorias de que a mesma não dispõe nos seus quadros, como o reforço eventual de mão-de-obra, em conformidade com o Contrato de Utilização celebrado entre a Primeira Outorgante e a Empresa Utilizadora».

3. Em 12 de março de 2015, entre T..., S.A., e H..., Lda, foi celebrado o contrato de utilização de trabalho temporário, junto à petição inicial como documento n.º 6, aqui dado por integralmente reproduzido, no qual consta, entre o mais, o seguinte: «Artigo 1.º Objeto Pelo presente contrato a Cedente obriga-se a pôr à disposição da T... trabalhadores com qualificações necessárias ao desempenho das tarefas indicadas no n.º 2 Artigo 2.º infra no âmbito da Empreitada»; «Artigo 2.º Justificação e Tarefas 1. O presente contrato é celebrado ao abrigo da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro. 2. Os trabalhadores cedidos no âmbito do presente contrato desempenharão as seguintes tarefas: trabalhos de construção civil e trabalhos indiferenciados em várias frentes de trabalho.» «Artigo 5.º Local de Trabalho O trabalho será prestado na Obra denominada “Execução dos trabalhos do Lanço A” (Entre o PK 22+600 e o PK 23+200) e do Lanço B (Entre o PK 0+000 e o PK 11+700) (...)”.

4. Em 08 de julho de 2015, entre a 1.ª Ré, como primeira outorgante, e o 2.º Réu, como segundo outorgante, foi celebrado o contrato de trabalho a termo incerto, junto à petição inicial como documento n.º 4, aqui dado por integralmente reproduzido, no qual consta, entre o mais, o seguinte:

«É estabelecido um contrato de trabalho a termo incerto, regido pelo Contrato Coletivo de Trabalho para a Indústria da Construção Civil e Obras Públicas celebrado entre a AECOPS – Associação de Empresas de Construção e Obras Públicas e outros e pela legislação geral aplicável, de acordo com as seguintes cláusulas»; «1.ª O Segundo Outorgante é admitido ao serviço do Primeiro Outorgante para desemprenhar a atividade correspondente à categoria profissional de Manobrador, exercendo a função respetiva, com a seguinte caracterização sumária: coadjuva nos diversos trabalhos, em obras adjudicadas ao Primeiro Outorgante tal como se encontra definido no Contrato Coletivo de Trabalho, compreendendo as funções que lhe sejam afins ou funcionalmente ligadas, exercendo ainda outras que o Primeiro Outorgante o possa legalmente incumbir»; «5.ª O local de trabalho será na seguinte obra adjudicada ao Primeiro Outorgante: “Lotes 19, 20 e 21 – Expansão IV da Zona Industria Ligeira de ...”, ou outro local a que o 1.º Outorgante venha a indicar pela sua conveniência de serviço»; «6.ª O período normal de trabalho semanal será regulado na cláusula 8.ª do CTT aplicável, distribuído por cinco dias da semana, de segunda a sexta-feira inclusive, correspondente a 08 horas por cada dia útil, das 08h00 às 12h00 e das 13h00 às 17h00, correspondente a 40 horas semanais».

5. Em 10 de julho de 2015, entre a 1.ª Ré e a T..., S.A., foi celebrado o contrato de aluguer de equipamento, com objeto na retroescavadora infra aludida, junto à contestação como documento n.º 1, aqui dado por integralmente reproduzido, no qual consta, entre o mais, o seguinte: «2- Equipamento Alugado Designação Retroescavadora»; «5- Manobrador Por conta do Alugador».

6. Por contrato de seguro titulado pela apólice n.º ...96, celebrado entre a Autora e H..., Lda, transferiu esta para a Autora a responsabilidade civil emergente de acidentes de trabalho que envolvessem o trabalhador BB, cujas condições gerais, especiais e particulares encontram-se juntas à petição inicial como documentos n.º 7 a 9, aqui dados por integralmente reproduzidos.

7. Em 20 de agosto de 2015, pelas 09h00m, o 2.º Réu e BB encontravam-se a trabalhar na obra de Subconcessão Rodovia Baixo Alentejo, entre ... e ..., no concelho de ....

8. BB encontrava-se a trabalhar no local sob a ordem da T..., S.A., como empresa utilizadora, em cumprimento, pela H..., Lda, como sua entidade patronal, do contrato aludido no ponto 3

9. A 1.ª Ré, para cumprimento do contrato aludido no ponto 5, ordenou ao 2.º Réu, como sua entidade patronal, que fosse manobrar a retroescavadora de marca New Holand, modelo NH95, com o n.º ...26, para a obra em causa e que seguisse, no local, as ordens da T..., S.A.

10. O 2.º Réu e BB seguiram no local as ordens dadas por CC, encarregado da T..., S.A. para aquela frente de trabalhos.

11. Por volta das 09h00m, CC deu instruções ao 2.º Réu e a BB para se deslocarem até ao local identificado como PK 8+400, a fim de, nesse local, serem seladas, com argamassa, as juntas da caixa de drenagem ali existente (selagem dos dois anéis que compõem a caixa do evacuador do coletor central) e, posteriormente, colocada a respetiva cúpula.

12. O 2.º Réu e BB dirigiram-se, de imediato, para o referido local.

13. Após produzir a argamassa, BB iniciou a aplicação da mesma nas juntas da caixa de drenagem.

14. A caixa de drenagem encontrava-se a uma cota inferior à cota do solo.

15. Simultaneamente, o 2.º Réu, através da condução da retroescavadora, posicionou-a junto do bordo do talude, para, quando BB terminasse a selagem das juntas, colocarem, com o auxílio do balde da retroescavadora, a cúpula na caixa de drenagem.

16. Para tal, o 2.º Réu, sentado no posto de comando e virado para a frente da máquina, iniciou a deslocação da mesma, em marcha-atrás, até junto do bordo do talude onde se encontrava a caixa de drenagem e BB.

17. Após posicionar a máquina, o 2.º Réu rodou o banco do condutor num ângulo de 180º, ficando virado para a traseira do equipamento e de frente para os trabalhos que estavam a decorrer.

18. Após posicionar a máquina retroescavadora, o 2.º Réu não ativou o travão de mão da mesma nem fez descer as sapatas e o balde da máquina.

19. Por não ter sido ativado o travão de mão da máquina retroescavadora e por a mesma não se encontrar estabilizada pelas sapatas e o balde e ter ficado posicionada muito próximo do talude, a máquina deslizou para dentro da vala onde se situava a caixa de drenagem, tendo entalado BB contra esta e contra o terreno contíguo.

20. O 2.º Réu atuou, nos termos supra aludidos, com imprudência e desatenção, podendo prever que da sua conduta podia resultar o acidente e a morte de BB.

21. Em consequência do embate supra aludido, BB sofreu lesões traumáticas raqui-medulares torácicas e abdominais que lhe causaram a morte.

22. Correu termos um processo especial emergente de acidente de trabalho sob o n.º 1385/15.0..., do Juízo do Trabalho de ... do Tribunal Judicial da Comarca de Beja, pelo acidente supra descrito, tendo FF, como viúva do falecido BB, e a Autora, como entidade seguradora responsável, chegado a acordo, homologado por sentença transitada em julgado, junta à petição inicial como documento n.º 12, aqui dado por integralmente reproduzido, nos termos do qual a Autora se obrigou ao pagamento dos seguintes montantes: «Pensão anual e vitalícia no montante de 2 712,97€, com início no dia seguinte ao da morte, calculada na base dos 30% da retribuição transferida e a calcular com base nos 40% dessa retribuição a partir da idade da reforma por velhice». «Subsídio por morte, nos termos do art.º 65.º da LAT, no montante de 5 533,70€». «Subsídio de despesas de funeral, nos termos do art. 66.º da LAT, no montante de 1 103,84€». «O montante de 40€, devido a título de despesas de deslocação a este tribunal».

23. A Autora pagou, a título de subsídios, por morte e por despesas de funeral e de transporte, decorrentes do acidente supra aludido, o montante de € 6.677,54.

24. A Autora pagou outras despesas no montante de € 4.259,63.

25. A Autora pagou, a título de pensões, incluindo subsídios de férias e o capital de remição, decorrentes do acidente supra aludido, o montante de € 41.966,16.

26. Correu termos um processo crime sob o n.º 69/15.3..., do Juízo de Competência Genérica de ... do Tribunal Judicial da Comarca de Beja, tendo o 2.º Réu, arguido nesses autos, por sentença, junta à petição como documento n.º 13 e aqui dado por integralmente reproduzido, datada de 30 de outubro de 2018, transitada em julgado, sido condenado pela prática de um crime de homicídio por negligência referente ao acidente em causa nos presentes autos, na pena de quinze meses de prisão, suspensa na sua execução.

27. Correu termos um processo de recurso de contraordenação sob o n.º 79/20.9..., do Juízo do Trabalho de ... do Tribunal Judicial da Comarca de Beja, para impugnação judicial da condenação da 1.ª Ré no pagamento de uma coima pela prática da contraordenação grave prevista e punida no artigo 43.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 50/2005, de 25 de fevereiro, por violação do disposto no artigo 5.º em conjugação com o artigo 32.º, n.º 1 do mesmo diploma, tendo a Ré, por sentença junta à certidão datada de 11/09/2023 [ref.ª 2561267] e aqui dada por integralmente reproduzida, sido absolvida.

28. A 1.ª Ré não ministrou qualquer formação ao 2.º Réu sobre a utilização da retroescavadora supra aludida, mas procedeu à sua avaliação quando com o mesmo celebrou o contrato aludido no ponto 4.

29. DD, como funcionário da T..., S.A., deu formação ao 2.º Réu sobre a utilização da retroescavadora supra aludida antes de o mesmo iniciar os trabalhos na obra supra aludida.”.

1.2 As instâncias consideraram não provada a seguinte matéria:

a) Que a 1.ª Ré haja sido subempreiteira na obra aludida no ponto 7.

b) Que, no dia 20 de agosto de 2015, o 2.º Réu seguisse, no local da obra, ordens da 1.ª Ré.

c) Que as despesas aludidas no ponto 24 sejam decorrentes do acidente em causa nos autos.”.

2. O direito

1. Conforme resulta do relatório supra e dos factos definitivamente fixados pelas instâncias, através da acção a Autora (por contrato de seguro, titulado pela apólice n.º ...96, celebrado com H..., Lda, por efeito do qual esta entidade transferiu a responsabilidade civil emergente de acidentes de trabalho que envolvessem o trabalhador BB3) veio peticionar, ao abrigo do direito de sub-rogação previsto no artigo 17.º, n.º 4, da Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro (Lei dos Acidentes de Trabalho – LAT)4 e fundada na qualidade de comitente por parte da Ré para efeitos da responsabilização desta ao abrigo do artigo 500.º, do Código Civil, o pagamento das quantias por si despendidas em cumprimento de acordo homologado por sentença no âmbito de processo de acidente de trabalho5, ocorrido em 20-08-2015, de que resultou a morte de BB, causado por conduta negligente do 2.º Réu6, que nessa altura se encontrava a desempenhar funções de manobrador na obra, por efeito de um contrato de aluguer de máquina (retroescavadora) com manobrador, celebrado entre a sua entidade patronal (a 1.ª Ré) e a T..., S.A. – cfr. n.ºs 4, 5, 6, 7, 19, 21 e 26 da matéria de facto provada.

A sentença, confirmada pelo acórdão recorrido, julgou parcialmente procedente a acção, condenando a 1.ª Ré a pagar à Autora na quantia de €48.643,70, acrescida de juros moratórios, calculados à taxa legal civil, desde a citação até integral pagamento.

Foi admitido recurso de revista excepcional quanto à questão da interpretação e aplicação do disposto no artigo 500.º, do Código Civil, em casos de acidentes de trabalho em que o terceiro que causou o acidente se encontrava, por ordem da sua entidade empregadora, a desempenhar as funções seguindo as instruções de um trabalhador de outra empresa.

Para uma plena compreensão da situação e do enquadramento jurídico que a sustenta, impõe-se a sua avaliação sob duas condicionantes: a relação de trabalho existente entre a 1.ª Ré e o 2.º Réu; a relação contratual estabelecida entre a 1.ª Ré e a T..., S.A., fundada no acordo que o tribunal a quo qualificou de contrato misto de locação e prestação de serviços, qualificação que não foi posta em causa no recurso e tem o nosso acolhimento.

Comecemos pela relação de trabalho, desde logo por ser unanimemente entendida como paradigma de relação contratual de comissão.

2. A responsabilidade emergente de acidente de trabalho (no caso, transferida da entidade patronal do falecido BB para a Autora) é uma responsabilidade objectiva, associada a um princípio de risco empresarial ou de socialização do risco, que tem subjacente a necessidade de assegurar que os trabalhadores sinistrados e as suas famílias não fiquem desprotegidos perante um acidente com reflexos na sua capacidade de trabalho e ganho. Nessa medida, o sinistrado tem direito a um conjunto de prestações em espécie e a prestações pecuniárias, que visam ressarcir a perda ou redução da capacidade de trabalho ou de ganho resultante de acidente de trabalho, mas que não abrange a totalidade dos danos emergentes do acidente.

A responsabilidade objectiva7 apenas é afastada quando haja culpa da entidade empregadora, dos seus representantes, de entidade por aquele contratada ou, no caso de trabalhadores temporários, da empresa utilizadora de mão-de-obra, ou o acidente resultar da violação das regras sobre segurança e saúde no trabalho por parte destes, nos termos do artigo 18.º, da LAT (responsabilidade agravada). Só nestas situações estes respondem pela totalidade dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos pelo trabalhador e seus familiares (em caso de falecimento do primeiro), nos termos gerais.

Todavia, sem prejuízo do direito de regresso, a seguradora satisfaz o pagamento das prestações que seriam devidas caso não houvesse actuação culposa ou violação das regras sobre segurança e saúde no trabalho (artigo 79.º, n.º 2, da LAT).

Nas situações em que o acidente tenha resultado da actuação ilícita e culposa de outrem (que não as pessoas identificadas no artigo 18.º, da LAT) mantém-se a responsabilidade objectiva. Contudo, conforme prescreve o artigo 17.º, n.º 1, da LAT “quando o acidente for causado por outro trabalhador ou por terceiro, o direito à reparação devida pelo empregador não prejudica o direito de acção contra aqueles, nos termos gerais”. Contempla, pois, este preceito a possibilidade de o sinistrado ou, em caso de morte deste, os seus sucessores (que não coincidem necessariamente com os beneficiários previstos na LAT) poderem demandar os terceiros que tenham provocado o acidente. Esta responsabilidade, que pode ser meramente cível ou também criminal, é exercida nos termos gerais e não no âmbito do processo de acidente de trabalho.

Nos casos em que o evento lesivo assuma, simultaneamente, natureza laboral e civil, não há uma cumulação de indemnizações que visem ressarcir o mesmo dano. As indemnizações são complementares de molde a cobrir as diversas dimensões do dano sofrido.

Por outro lado, se o sinistrado não exercer o direito de acção contra os terceiros responsáveis pelo acidente no prazo de um ano a contar da data do acidente, a entidade empregadora e a seguradora que tiverem pago a indemnização no processo de acidente de trabalho podem sub-rogar-se no direito do lesado contra os referidos terceiros (artigo 17.º, n.º 4, da LAT)8.

O direito de sub-rogação pode assim ser exercido em acção autónoma intentada para esse efeito ou na própria acção interposta pelo sinistrado ou pelos seus sucessores.

No caso sob apreciação, estamos perante um acidente que causou a morte de um trabalhador, que foi considerado um acidente de trabalho e simultaneamente foi imputado a um trabalhador de outra empresa a título de homicídio por negligência (2.º Réu).

Na revista, o direito de sub-rogação da seguradora não foi colocado em causa, circunscrevendo-se o objecto do dissídio em apreciar se a responsabilidade pelas consequências do acidente, fundada no artigo 500.º, do Código Civil, pode ser assacada à T..., S.A., empresa que tinha alugado à 1.ª Ré, ora Recorrente, uma retroescavadora com manobrador (2.º Réu), afastando a responsabilidade da (1.ª Ré) entidade empregadora do terceiro que causou o acidente (na qualidade de comitente, ao abrigo do artigo 500.º, do Código Civil)9.

As instâncias não acolheram a pretensão da 1.ª Ré (de se eximir da responsabilidade de comitente com fundamento de que no momento do acidente a “verdadeira” comitente era a T..., S.A.), tendo concluído que “a única relação de comissão que envolvia o 2.º réu AA, causador do sinistro de trabalho em causa nos autos, é aquela que resulta da subordinação jurídica inerente ao vínculo laboral existente entre ele e a Handle”, apoiadas na factualidade provada sob os n.ºs 5 e 9, por a considerarem inequívoca no sentido de evidenciar a inexistência de uma qualquer relação de comissão entre a T..., S.A. e o 2.º Réu.

Conforme passaremos a justificar e adiantando a solução, impõe-se-nos corroborar tal entendimento.

3. Alicerçada na relação jurídica decorrente da celebração do contrato de aluguer com a T..., S.A., a Recorrente defende na revista a existência de uma sucessão de relações de comissão, persistindo no entendimento de que “no momento do acidente a relação de comissão que assumia preponderância por forma a equacionar a aplicabilidade do artigo 500.º do Código Civil era a existente entre a T... e o réu AA” e que o acto danoso praticado pelo comissário surge na sequência da orientação e determinação da execução da tarefa ordenada pela T..., S.A., a quem incumbia a obrigação de vigilância e o poder de direcção, emitindo ordens, orientações e fiscalizando e supervisionado o seu trabalho. Nessa decorrência, conclui que no momento do acidente a relação laboral mantida com o 2.º Réu não é suficiente para determinar a existência da relação comitente/comissário.

Não há dúvida de que a responsabilização da T..., S.A. (sublinhe-se, que não é parte no processo) pelos danos decorrentes do acidente (de trabalho) que vitimou BB, justificada ao abrigo do artigo 500.º, do Código Civil, depende da demonstração de uma efectiva relação de comissão. Só a existência dessa relação permitiria repercutir na esfera jurídica daquela (e não da Ré, entidade patronal do 2.º Réu) os efeitos decorrentes da conduta culposa deste.

Vejamos.

3.1 A responsabilidade do comitente prevista no artigo 500.º, do Código Civil, indubitavelmente de natureza objectiva no nosso sistema jurídico, como expressamente decorre do n.º1 do citado preceito (ao estatuir que aquele que encarrega outrem de qualquer comissão responde pelos danos que o comissário causar independentemente de culpa10), pressupõe a existência de uma relação de comissão, figura que a lei não define, mas cujo conceito nada tem a ver com o de contrato de comissão previsto em matéria comercial11.

Embora caracterizada por limites formalmente indefinidos para efeitos de imputação da responsabilidade12, o traço essencial da figura é a existência de relações de autoridade e subordinação correlativas.

Esta autoridade, refere Rui Alarcão, traduz-se no direito de dar ordens e instruções ao preposto sobre o modo de desempenhar funções que lhe foram confiadas, o que parece dever incluir duas prerrogativas: a de fixar o fim a atingir e a de determinar os meios a empregar13 de que constitui exemplo paradigmático a relação de trabalho subordinado caracterizada por o trabalhador se encontrar sob as ordens e direcção efectiva do empregador.

Todavia, as relações de comissão não se esgotam no âmbito da relação laboral, realçando o citado acórdão do STJ, que se inserem no conceito de comissão os acordos que se traduzam na prestação de serviços por conta de outrem, com exclusão de casos em que exista um elevado grau de autonomia, como sucede no contrato de empreitada, em que a obrigação assumida perante o dono da obra tem por referência a realização e a posterior entrega de uma obra. Mesmo relativamente ao contrato de subempreitada se nega a relação de comissão.

Nem sempre a realidade se apresenta nítida quanto à existência de uma efectiva relação de dependência caracterizadora da comissão, particularmente nas situações em que alguém é colocado à disposição de um terceiro pelo seu comitente para execução de uma tarefa ou actividade. Nestes casos, que podem integrar sucessão, ou mesmo, de cumulação de relações de comissão, coloca-se com particular acuidade a questão de saber quem é responsável pelos danos decorrentes da execução dessa tarefa ou actividade, o comitente habitual e/ou o comitente ocasional14.

A resposta não pode deixar de ser encontrada na avaliação da prossecução do interesse do comitente e de quem detém, no momento em que o dano é causado, o poder funcional de controle sobre o comissário. Tratam-se de critérios concretos capazes de esclarecer a imputação de responsabilidades dentro de determinados esquemas predeterminados15.

Tal avaliação, que assentará no quadro jurídico que suporta o poder de controle e de dar ordens e instruções sobre a execução da tarefa ou da actividade, não pode, porém, ser feita sob indiferença do próprio fundamento da responsabilidade do comitente prevista no artigo 500.º, do Código Civil, e que põe em destaque a finalidade do instituto: quem utiliza para os seus próprios fins a actividade de outros terá de assumir as consequências dos seus actos para protecção dos lesados16.

Assim, segundo Sofia de Sequeira Galvão, reflectindo acerca da responsabilidade do comitente no quadro legal vigente, apenas dois pontos são, portanto, essenciais: que o comissário aja por conta do Comitente e que se estabeleça uma relação de subordinação do primeiro ao segundo.

O serviço ou a actividade podem consubstanciar-se em qualquer contrato, nominado ou não, ou resultar de uma situação jurídica mais complexa (v.g. a situação de trabalho, determinadas situações familiares). Imprescindível é que assentem numa relação de autoridade/subordinação e que se cifrem numa actuação por conta do interesse alheio.

O comissário deve agir por conta e no interesse do Comitente pelo que este é colocado numa posição relativa de autoridade e supremacia que explica, vimo-lo, a imputação pelo risco17.

3.2 No seguimento destas breves considerações, tendo em conta que a comissão constitui um vínculo fundado na base dúplice de autoridade/subordinação e interesse próprio/actuação por conta do interesse alheio, cremos que a realidade fáctica demonstrada não oferece dúvidas quanto à relação de comissão em que deve ser estruturada a resposta à questão da responsabilidade da Recorrente pela actuação do 2.º Réu de que resultou o falecimento de BB.

Com efeito, o acidente de trabalho ocorrido na obra de subconcessão Rodovia Baixo Alentejo, que vitimou um trabalhador ocorreu em consequência de uma conduta negligente do 2.º Réu, que se encontrava na obra a manobrar uma retroescavadora no âmbito de um contrato celebrado entre a 1.ª Ré, sua entidade empregadora, e a T..., S.A., o contrato aludido no ponto n.º5 dois factos provados.

Conforme consta do acórdão recorrido, através do referido contrato, denominado de “adjudicação de aluguer de equipamento”, a 1.ª Ré obrigou-se à realização de duas prestações principais: de proporcionar à T..., S.A. o gozo temporário de uma máquina retroescavadora e o trabalho do manobrador para conduzir/manobrar a referida máquina. Ou seja, para além do aluguer da máquina, o contrato incluiu a prestação de serviços de manobrador [constando do acordo que o valor de aluguer” é composto de dois items: “hora de funcionamento” (23,00€) e “hora à ordem” (11,50€)]; daí que a denominação que lhe foi atribuída pelas partes - Aluguer de equipamento – mostra-se aquém da sua efectiva natureza, tendo o tribunal recorrido considerado estar em causa um “contrato misto de locação e prestação de serviços18.

A questão em dissídio é a de saber se a colocação, por parte da Ré, de um seu trabalhador (subordinado) à disposição de terceiro (da T..., S.A.) para manobrar uma máquina locada determinou uma “cedência” (total ou parcial) da autoridade e direcção que detinha sobre esse trabalhador.

Como bem se sublinha no acórdão recorrido, a matéria factual mostra-se inequívoca quanto a este aspecto, pois que, nos termos contratualmente firmados, foi estabelecido «5- Manobrador Por conta do Alugador» o que impõe concluir, como o fez o tribunal recorrido, não estar em causa qualquer situação de cedência de utilização de um trabalhador definido pelo artigo 172.º, alínea c), do Código do Trabalho (contrato de prestação de serviço a termo resolutivo entre um utilizador e uma empresa de trabalho temporário, pelo qual esta se obriga, mediante retribuição, a ceder àquele um ou mais trabalhadores temporários). Tratou-se, pois, apenas, de um trabalhador subordinado (o 2.º Réu) que, por determinação e em obediência à ordem da sua entidade empregadora (a 1.ª Ré), ou seja, mantendo a subordinação jurídica a esta, foi deslocado para uma obra de terceiro (a T..., S.A.) para executar os serviços contratados, que se traduziam em manobrar a retroescavadora objecto de locação e que, necessariamente, implicava que seguisse, no local, as ordens da T..., S.A., mais precisamente e no momento do acidente, as instruções dadas por CC, encarregado daquela, conforme apurado nos pontos n.ºs 9 e 10 da matéria de facto provada.

Perante esta realidade, na sequência do que acima realçamos quanto aos elementos essenciais de verificação de uma relação de comissão – poder de direcção consubstanciador de uma subordinação lato sensu, que não coincide necessariamente com a subordinação jurídica, mas que se traduz numa dependência funcional sustentada por uma relação jurídica (i.) e em agir no interesse do comitente (ii)19 -, o 2.º Réu, quando do acidente, não obstante se encontrar a executar trabalhos seguindo as instruções e ordens do encarregado da T..., S.A.20, não deixou de estar na dependência funcional da 1.ª Ré (sua entidade empregadora no âmbito de um contrato de trabalho subordinado), agindo por conta e no interesse desta.

Improcedem, assim, na sua totalidade, as conclusões da revista.

III - Decisão

Nestes termos, acordam os Juízes deste Supremo Tribunal de Justiça em julgar a revista improcedente, mantendo, por isso, o acórdão recorrido.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 13 de Maio de 2025

Graça Amaral (relatora)

Maria Olinda Garcia

Ricardo Costa



1. Nos termos do qual a aqui Autora obrigou-se a pagar à beneficiária (viúva do sinistrado) uma pensão anual e vitalícia no montante de 2.712,97 €, com início no dia seguinte ao da morte, calculada na base dos 30% da retribuição transferida e a calcular com base nos 40% dessa retribuição a partir da idade da reforma por velhice; subsídio por morte, no montante de 5.533,70 €; subsídio de despesas de funeral, no montante de 1.103,84 € e despesas de deslocação ao tribunal no montante de 40 €.↩︎

2. O acidente decorre da retroescavadora não se encontrar devidamente imobilizada (por não ter sido accionado o travão), tendo deslizado para dentro do talude onde se encontrava a vítima.↩︎

3. À data do acidente (ocorrido em 20-08-2015, na obra de Subconcessão Rodovia Baixo Alentejo, entre ... e ..., no concelho de ...), trabalhador da sociedade H..., Lda, encontrando-se a trabalhar para a T..., S.A., no âmbito de contrato de utilização de trabalho temporário celebrado entre esta sociedade e aquela empresa de trabalho temporário. A H..., Lda. tinha celebrado um contrato de seguro de acidentes de trabalho com a Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A., ora Autora, que abrangia o sinistrado.↩︎

4. Pese embora o direito à sub-rogação da seguradora em caso de acidente de trabalho causado por terceiro se encontre previsto no artigo 17.º, n.º 4, da LAT, tem sido entendimento da jurisprudência que a competência para julgar os litígios emergente do exercício deste direito, incluindo a determinação dos responsáveis civis pertence aos juízos cíveis.

  ↩︎

5. Acção especial emergente de acidente de trabalho sob o n.º 1385/15.0..., que correu termos no Juízo do Trabalho de ..., no âmbito da qual acção especial. Nesta acção foi homologado, por sentença transitada em julgado, um acordo, nos termos do qual a seguradora, ora Autora, se obrigou a pagar à beneficiária (viúva do sinistrado) uma pensão anual e vitalícia no montante de €2.712,97, com início no dia seguinte ao da morte, calculada na base dos 30% da retribuição transferida e a calcular com base nos 40% dessa retribuição a partir da idade da reforma por velhice; subsídio por morte, no montante de €5.533,70; subsídio de despesas de funeral, no montante de €1.103,84 e despesas de deslocação ao tribunal no montante de €40 .↩︎

6. Por sentença de 30.10.2018, transitada em julgado (processo crime n.º 69/15.3..., do Juízo de Competência Genérica de ...), o 2.º Réu foi condenado pela prática de um crime de homicídio por negligência referente ao acidente dos autos.↩︎

7. Necessariamente subsidiária.↩︎

8. A LAT confere ainda à entidade empregadora e a sua seguradora o direito de intervir como parte principal no processo em que o sinistrado exigir aos responsáveis a indemnização pelo acidente (artigo 17.º, n.º 5).↩︎

9. Note-se que a Recorrente, embora faça referência, nas alegações da revista, à existência de uma “sucessão e/ou cumulação de relações de comissão, apenas direccionou o seu posicionamento para a questão da sucessão de relações de comissão (ou mesmo de existência de subcomissão), concluindo que “no momento do acidente a relação de comissão que assumia preponderância por forma a equacionar a aplicabilidade do artigo 500.º do Código Civil, era a existente a T..., S.A.”. E foi sob essa óptica que as instâncias analisaram a situação, pelo que a problemática referente à existência de uma responsabilidade repartida (co-responsabilidade entre a 1.ª Ré e a T..., S.A., que não é parte na acção) por cumulação de relações de comissão não chegou a ser discutida pelas instâncias.↩︎

10. No plano das relações externas, é inútil a prova de que a escolha do comissário foi bem feita, que foi exercida com vigilância adequada ou de que o comitente tudo fez para prevenir ou evitar o dano. A única defesa possível reside na demonstração de que não estão reunidas as condições desta fattispecie delitual - Rui Alarcão, Direito das Obrigações, Coimbra 1983, p 249.↩︎

11. Cfr. acórdão do STJ de 09-07-2017, Processo n.º 385/2002.E1.S1, acessível através das Bases Documentais do ITIJ; Maria da Graça Trigo, Responsabilidade civil do comitente (ou responsabilidade por facto de terceiro), Comemorações dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da reforma de 1977, volume III, Direito das Obrigações, Coimbra Editora, p 156.↩︎

12. Cfr. acórdão citado.↩︎

13. Obra citada, p 252.↩︎

14. A admissibilidade de responsabilidade cumulativa dos comitentes não se mostra pacífica (face à natureza e ao fundamento deste tipo de responsabilidade objectiva, por não se encontrar ligada apenas ao proveito que os comitentes retiram do serviço do preposto, particularmente quando se paga um preço ao comitente habitual). Independentemente do posicionamento a assumir, há quem defenda que mesmo na situação de dois comitentes se encontrarem a ver os seus interesses prosseguidos de forma paralela, a solução parece apontar em responsabilizar objectivamente aquele sob cuja autoridade directa estivesse o comissário aquando da prática do facto danoso. – cfr. Nuno Morais, A responsabilidade objectiva do comitente por facto do comissário, a análise do artigo 500 do Código Civil: seus pressupostos e regime, Julgar, N.º 6, Set./Dez. (2008), p55.↩︎

15. Cfr. Nuno Morais, obra citada, pp 41-65.↩︎

16. Rui Alarcão, obra citada, pp152-158.↩︎

17. Reflexões acerca da responsabilidade do comitente no direito civil português: a propósito do contributo civilista para a dogmática da imputação, AAFDL: Lisboa, 1990, pp. 103-116.↩︎

18. “(…) perante um contrato que reúne elementos correspondentes ao contrato de locação (artigos 1022.º e 1023.º, ambos do CC) e de prestação de serviços (artigo 1154.º do CC), ou seja, de um contrato misto o qual se define pela reunião num mesmo contrato de elementos correspondentes a vários tipos contratuais e cuja regulamentação resultará da combinada aplicação dos preceitos pertinentes aos vários tipos em que o contrato se inspira.↩︎

19. Ainda que se proponha a um fim filantrópico ou altruísta.↩︎

20. A formação ministrada pela empresa ao 2.º Réu não altera o agir por conta e interesse da 1.ª Ré, sendo que o acidente ocorreu com a especificidade de uma conduta negligente daquele fora do âmbito da execução de uma instrução por parte do encarregado da obra, conforme se evidencia pela matéria de facto provada nos pontos n.ºs 18 e 19: não ter activado o travão de mão da máquina nem fez descer as sapatas e o balde da mesma para a estabilizar.↩︎