ARRENDAMENTO PARA HABITAÇÃO
FALTA DE RESIDÊNCIA PERMANENTE
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
Sumário

1 – Torna-se inexigível ao senhorio manter o contrato de arrendamento sempre ocorra um cenário de falta de uso do arrendado por mais de um ano, por tal comportamento objectivar a violação de um dever do arrendatário, sempre que o locado passe a constituir uma simples habitação intermitente ou não permanente, quando o arrendamento tiver sido celebrado para a instalação da residência primária do locatário e do seu agregado familiar.
2 – A residência permanente é o local onde está centrada a organização da vida individual, familiar e social do arrendatário, com carácter de habitualidade e estabilidade.
3 – Isto é, a casa em que o arrendatário juntamente com o agregado familiar toma as suas refeições, dorme, desenvolve toda a sua vivência diária, familiar e social, de modo estável e continuado, onde se centra a actividade inerente à economia doméstica e familiar do arrendatário.
4 – Não relevam meras utilizações ou aberturas esporádicas, que não descaracterizam o estado de desocupação em que é essencialmente mantido o espaço arrendado com o não uso, designadamente a serventia restrita a épocas de férias ou em períodos festivos.
(Sumário do Relator)

Texto Integral

Processo n.º 1787/22.5T8BJA.E3
Tribunal Judicial da Comarca de Beja – Juízo Local de Competência Cível – J2
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório:
Na presente acção de despejo proposta pela “Santa Casa da Misericórdia de (…)” contra (…), a Autora veio interpor recurso da sentença proferida.
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A Autora pedia que
a) fosse declarada a resolução do contrato, com base no não uso do locado por mais de um ano – artigo 1083.º, n.º 2, alínea d), do Código Civil;
b) fosse decretado o despejo, condenando-se a Ré a entregar de imediato à Autora, livre e desocupado, o prédio urbano objecto do contrato aqui em causa.
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Em beneficio da sua pretensão, a Autora invocou que a Ré não reside no locado há mais de 20 anos.
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Devidamente citada, a Ré impugnou a versão da parte activa, dizendo que mantém residência na casa arrendada e que, estando reformada, apenas passa algum tempo em Espanha, onde reside e trabalha a sua filha, regressando depois sempre a sua casa, onde vive e convive com os amigos.
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Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal a quo decidiu absolver a Ré dos pedidos formulados pela Autora.
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A recorrente não se conformou com a referida decisão e nas suas alegações apresentou as seguintes conclusões:
«a) Salvo melhor entendimento, o Tribunal a quo incorreu num erro notório de apreciação da prova.
b) A prova produzida em sede de audiência de julgamento, sem embargo do princípio da livre apreciação da prova, teria necessariamente que conduzir a conclusões distintas por parte do Tribunal a quo.
c) Os depoimentos das testemunhas arroladas pela A. demonstraram não só um conhecimento consubstanciado em realidades palpáveis (informação da própria Ré, informação dos vizinhos da Ré, queixas apresentadas por pessoas que junto da A. procuram habitação social identificando a casa arrendada à Ré como estando fechada), como também directo dos factos, mormente no caso da testemunha (…), que pôde observar, variadíssimas vezes de “per si” e directamente que, no último e nos últimos 10 anos, a casa se encontra fechada, situação que pôde comprovar quer pelas passagens que faz com frequência pela lateral do imóvel, quer pela passagens pelas traseiras do mesmo.
d) Dos seus depoimentos resultou que, há pelo menos 10 anos, a Ré não reside com carácter de permanência no locado, que o imóvel se encontra fechado, que há varias queixas de pessoas que recorrem à A. para obter habitação social referindo expressamente o imóvel arrendado à Ré como sendo um dos que está fechado e desabitado, que a própria Ré confirmou que reside em Espanha e utiliza o locado como casa de férias e que paga a renda do imóvel anualmente porque não está em Portugal em permanência, paga quando vem a Portugal.
e) Resultou ainda claro que a testemunha (…), ao serviço da A., nas visitas que faz ao Bairro onde se insere a casa arrendada a Ré, não tem batido à porta desta porque efectivamente sabe que não está lá ninguém a morar, pelos motivos atrás expostos.
f) Mais resultou ainda que, quando esta testemunha se desloca ao Bairro e tenta contactar os moradores estes nem sempre estão em casa, porém, resolve a questão à posterior uma vez que os moradores acabam por comparecer nas instalações da Autora para fazerem a actualização dos elementos pretendidos pela Autora. Com a Ré este procedimento não se verifica porque a mesma não reside em Portugal e apenas se desloca às instalações da Autora cerca de uma vez por ano para pagar a renda e simultaneamente fazem a confirmação do que é sabido por todos, que a Ré não reside em Portugal.
g) Por outro lado, sendo o Bairro pequeno, onde com facilidade tudo se sabe, é do conhecimento geral que a Ré vive em Espanha há muitos anos e que a casa que tem arrendada neste Bairro está fechada, conforme foi claramente referido pela testemunha (…), que aliás demonstrou ter um conhecimento perfeito das casas do Bairro, nomeadamente as que estão ou não estão habitadas.
h) Também as testemunhas arroladas pela Ré afirmaram peremptoriamente que há pelo menos 10 anos que a Ré visita uma filha em Espanha por períodos de um ou mais meses seguidos, tendo aumentado o período de permanência em Espanha da Ré nos últimos dois/três anos por causa dos tratamentos a que esta se submete em Espanha ao Covid e outras patologias.
i) Por outro lado as referências aos períodos de permanência da Ré em Portugal são sempre a espaços de tempo muito curtos, não mais que um mês seguido.
j) Estando ausente um ou mais meses seguidos do locado, a Ré não cumpre os requisitos do conceito de habitação permanente, por falta do carácter de habitualidade e estabilidade do centro da sua vida no locado.
k) Não é por isso no locado que a Ré, de forma estável e/ ou habitual, toma as suas refeições, recebe correspondência, recebe amigos ou familiares, passa ou seus momentos de lazer ou pernoita.
l) Com excepção de um almoço recente, não há qualquer registo nos últimos 10 anos de convívios da Ré com amigos ou familiares no locado.
m) A Ré recebe a sua correspondência por intermédio de terceiros, nomeadamente das duas testemunhas que arrolou para os presentes autos e do seu irmão.
n) A Ré apenas toma as suas refeições, pernoita ou passa momentos de lazer no locado quando está de férias em Portugal.
o) A Ré foi para Espanha já com sintomas de Covid, aí foi tratada e continua a ser inclusivamente a outras patologias nomeadamente vai ser submetida a uma intervenção cirúrgica a um joelho.
p) Tal facto só vem reforçar que efectivamente a Ré tem o centro da sua vida pessoal, social e doméstica em Espanha, e aí reside com carácter de permanência, caso contrário não se entenderia porque é que é tratada a patologias em Espanha quando poderia sê-lo perfeitamente em Portugal.
q) Não se entende sob ponto de vista nenhum, a não ser à luz da sua residência permanente em Espanha, porque é que a Ré haveria de suportar os incómodos e despesas de deslocações frequentes a Espanha para consultas e tratamentos que pode fazer em fazer Portugal.
r) As regras da experiência comum dizem-nos que as pessoas residentes em Portugal, são tratadas em Portugal, à excepção de casos raros e graves, cujo tratamento não possa ser efectuado em Portugal, o que não é o caso.
s) O companheiro da Ré, trabalha ou pelo menos trabalhou em Espanha, onde naturalmente reside.
t) Compreende-se por isso que a Ré, estando reformada, tenha acompanhado o companheiro para Espanha e com ele aí resida.
u) Não se compreende que a Ré, tendo 3 filhas, duas em Espanha, apenas visite uma, sendo que tal não é mais do que uma vã tentativa de justificar as suas longas ausências em Espanha, onde efectivamente reside e tem o centro da sua vida com carácter habitual e estável.
v) Inclusivamente a Ré entregou a chave do locado a mais do que uma pessoa para que o que for necessário.
w) A Ré, para ser contactada, tem um número de telefone espanhol.
x) A prova testemunhal produzida em audiência de julgamento, quer a arrolada pela A., quer a arrolada pela Ré, analisada na sua globalidade vai toda no mesmo sentido, isto é, a Ré há pelo menos 10 anos que se desloca com grande regularidade e por períodos de tempo muito consideráveis, sempre superiores a um mês, para Espanha, deixando por isso de residir com carácter de permanência no locado.
y) Acentuando-se ainda essa realidade nos últimos dois/três anos, em que claramente resulta da prova testemunhal produzida que a Ré passa mais tempo em Espanha do que em Portugal, tentando as testemunhas arroladas pela Ré justificar esse facto com alegados tratamentos médicos que a Ré receberá em Espanha, situação que, como já se disse, salvo melhor entendimento, não poderá receber acolhimento.
z) A verdade clara e inequívoca é que a Ré nos últimos 2/3 anos passa mais tempo em Espanha do que cá.
aa) Assim, em face da prova testemunhal e documental produzida nos presentes autos, a única conclusão que se coaduna com as regras da experiência comum é de facto a de que a Ré não reside com carácter de permanência no locado.
bb) Ao não interpretar no sentido ora defendido, incorreu o Tribunal a quo num erro notório de apreciação da prova quanto á matéria de facto vertida nos pontos 8 a 10 dos factos dados como provados e na alínea a) dos factos dados como não provados, aos quais, apreciada a prova na sua globalidade conjugada com as regras da experiência comum deveria ter sido dada a seguinte redacção:
Ponto 8 da matéria de facto dada como provada – “O companheiro e duas das filhas da Ré residem e trabalham em Espanha”.
Ponto 9 da matéria de facto dada como provada – “A Ré, há vários a esta parte, que se desloca para Espanha, acompanhando o seu companheiro que ali trabalha, e visita uma das filhas, aí permanecendo períodos de um ou mais meses consecutivos, passando nos últimos dois/ três anos mais tempo em Espanha do que em Portugal”.
Ponto 10 da matéria de facto dada como provada – “A Ré tem no imóvel referido em 1) móveis e electrodomésticos”.
Todos os itens da alínea a) da matéria de facto dada como não provada devem ser dados como provados e consequentemente transferidos para os factos dados como provados, passando os factos provados a ter um ponto 11 com a seguinte redacção:
A Ré, há mais de um ano, que no prédio referido em 1):
i. Não toma refeições com carácter de regularidade e permanência;
ii. Apenas recebe correspondência por intermédio de terceiros;
iii. Não recebe amigos ou familiares;
iv. Não passa os seus momentos de lazer;
v. Não pernoita com carácter de regularidade ou permanência.
Pelo exposto, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e consequentemente, nos termos do artigo 662.º, n.º 1, do CPC alterar-se a decisão proferida quanto à matéria de facto no sentido ora requerido, substituindo-se a douta sentença recorrida por outra que julgue a acção totalmente procedente e em consequência declare a resolução do contrato de arrendamento urbano em causa nos presentes autos, com base na falta de uso do locado por mais de um ano, decretando o despejo e condene a Ré a entregar de imediato à Autora, livre e desocupado, o prédio urbano objecto do referido contrato de arrendamento.
Assim se fará a mais costumada, Justiça!».
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A parte contrária não apresentou alegações.
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Admitido o recurso, foram observados os vistos legais. *
II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).
Apesar da sua exagerada extensão, analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação de:
i) erro na avaliação da matéria de facto.
ii) erro de julgamento na subsunção jurídica realizada.
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III – Dos factos apurados:
3.1 – Matéria de facto provada:
Com pertinência para a decisão da causa a Primeira Instância considerou provado o seguinte:
1. A Autora é dona e legitima proprietária do prédio urbano sito na Rua (…), n.º 6, da União de Freguesias de Beja (… e …), concelho de Beja, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo (…) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Beja sob o n.º (…).
2. A propriedade do referido prédio urbano foi inicialmente do Fundo de Fomento de Habitação que, por sua vez, transferiu o património para o IGAPHE (Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado).
3. Por escritura datada de 16 de Junho de 1995, a propriedade deste e de outros prédios urbanos foi transferida para a Santa Casa da Misericórdia de (…).
4. Desde data anterior a 1992, que o IGAPHE procedia à cobrança de quantias pecuniárias em contrapartida da cedência do gozo do imóvel referido em 1) à Ré.
5. Em virtude da transferência de propriedade do prédio referido em 1), a Autora assumiu os direitos e obrigações do IGAPHE, situação que foi comunicada à Ré.
6. Desde Julho de 1995, até a presente data, a Ré tem entregue as quantias devidas à Autora em contrapartida pelo uso do prédio referido em 1).
7. Actualmente o valor mensal da contrapartida devida pelo gozo do prédio referido em 1) é de € 32,66.
8. O companheiro e duas das filhas da Ré residem e trabalham em Espanha[1].
9. Eliminado[2].
10. A Ré mantém no imóvel alguns móveis, roupas e electrodomésticos[3].
11. Com ressalva dos períodos de férias e festivos, a Ré, há mais de um ano que, no prédio referido em 1), não toma refeições, apenas recebe correspondência por intermédio de terceiros, não recebe amigos ou familiares, não passa os seus momentos de lazer, não pernoita.
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3.2 – Matéria de facto não provada:
Com interesse para a decisão da causa, ficaram por provar os seguintes factos:
a) Eliminado[4].
b) Apesar de interpelada por diversas vezes para proceder à entrega do imóvel e das respetivas chaves, a Ré nunca o fez, alegando ter as rendas em dia.
c) A Ré não tem noutra habitação, nem de que seja proprietária, nem arrendada, nem tão pouco emprestada.
d) A Ré tem feito alguns trabalhos de conservação do prédio referido em 1).
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IV – Fundamentação:
4.1 – Erro na fixação da matéria de facto:
Só à Relação compete, em princípio, modificar a decisão sobre a matéria de facto, podendo alterar as respostas aos pontos da base instrutória, a partir da prova testemunhal extractada nos autos e dos demais elementos que sirvam de base à respectiva decisão, desde que dos mesmos constem todos os dados probatórios, necessários e suficientes, para o efeito, dentro do quadro normativo e através do exercício dos poderes conferidos pelo artigo 662.º do Código de Processo Civil.
Em face disso, a questão crucial é a de apurar se a decisão do Tribunal de 1ª instância que deu como provados (e não provados) certos factos pode ser alterada nesta sede – ou, noutra formulação, é tarefa do Tribunal da Relação apurar se essa decisão fáctica está viciada em erro de avaliação ou foi produzida com algum meio de prova ilícito e, se assim for, actuar em conformidade com os poderes que lhe estão confiados.
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A requerente pretende a alteração dos factos provados indicados em 8), 9) e 10), propondo a fixação de uma redacção alternativa[5] [6] [7] e a transmutação do facto inscrito em a) dos factos não provados em factualidade provada.
Em benefício da sua pretensão, a Autora convoca as prestações probatórias de (…), (…), (…) e uma sugere diferente valoração dos testemunhos tomados a (…) e a (…).
O Tribunal a quo fixou os factos 8) a 10) com o recurso aos testemunhos de (…) e (…), sendo que «resultou dos mesmos que a Ré, por alegadamente ter contraído Covid-19, e ter tido complicações em consequência da mesma, é seguida medicamente em Espanha – por as mesmas se terem verificado quando ela lá estaria – razão, pela qual, a primeira testemunha referiu que a Ré e o companheiro “às vezes estão mais tempo lá do que cá” e a segunda testemunha que “há 2 ou 3 anos tem estado lá mais tempo”».
Mais adiantou que a segunda testemunha referiu «ter, em seu poder, uma procuração outorgada pela Ré para levantamento de correspondência registada» e que a mesma «confirmou ter a chave da casa da Ré, para fazer a limpeza e para o que for necessário».
No entanto, a decisão de facto sublinha que as «testemunhas não conseguiram concretizar os períodos que a Ré passa em Espanha e no imóvel arrendado à Autora», mas isso não obstou a que a matéria dos pontos 9) e 10) fosse demonstrada com base nessas declarações, sem embargo de ter qualificado esses depoimentos como «vagos e genéricos».
Relativamente à matéria da resposta negativa à alínea a) dos factos não provados, ficou exarado o seguinte: «acresce que o referido por estas testemunhas não foi corroborado por outros meios de prova, designadamente, por prova documental, a qual, indiciariamente e com apelo às regras da experiência comum (designadamente, consumos excessivamente baixos de serviços públicos essenciais, nomeadamente, água e eletricidade), poderia ser determinante para que o Tribunal formasse convicção segura que determinasse julgar provada a factualidade constante da alínea a) dos factos não provados».
Complementarmente, ao mesmo passo, desvalorizou os depoimentos de (…) e (…) que, no entender, do julgador a quo não tinham conhecimento directo dos factos.
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Foi ouvida toda a prova gravada e analisados os restantes suportes presentes nos autos.
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A prova como demonstração efectiva (segundo a convicção do juiz) da realidade de um facto «não é certeza lógica mas tão-só um alto grau de probabilidade suficiente para as necessidades práticas da vida (certeza histórico-empírica)»[8].
A apreciação da prova deve ocorrer sob o signo da probabilidade lógica – de evidence and inference –, ou seja, segundo o grau de confirmação lógica que os enunciados de facto obtêm a partir das provas disponíveis.
O sistema judicial nacional combina o sistema da livre apreciação ou do íntimo convencimento com o sistema da prova positiva ou legal, posto que, tomando em consideração a análise da motivação da respectiva decisão e as provas produzidas, importa aferir se os elementos de convicção probatória foram obtidos em conformidade com o princípio da convicção racional, consagrado pelo n.º 5 do artigo 607.º do Código de Processo Civil.
A valoração da prova, nomeadamente a testemunhal, deve ser efectuada segundo um critério de probabilidade lógica, através da confirmação lógica da factualidade em apreciação a partir da análise e ponderação da prova disponibilizada[9].
A jurisprudência mais avalizada firma o entendimento que a «prova testemunhal, tal como acontece com a prova indiciária de qualquer outra natureza, pode e deve ser objecto de formulação de deduções e induções, as quais, partindo da inteligência, há-de basear-se na correcção de raciocínio, mediante a utilização das regras de experiência [o id quod plerumque accidit] e de conhecimentos científicos.
Na transição de um facto conhecido para a aquisição ou para a prova de um facto desconhecido, têm de intervir as presunções naturais, como juízos de avaliação, através de procedimentos lógicos e intelectuais, que permitam, fundadamente, afirmar, segundo as regras da experiência, que determinado facto, não, anteriormente, conhecido, nem, directamente, provado, é a natural consequência ou resulta, com toda a probabilidade próxima da certeza, ou para além de toda a dúvida razoável, de um facto conhecido»[10].
Neste enquadramento jurídico-existencial, a credibilidade concreta de um meio individualizado de prova tem subjacente a aplicação de máximas de experiência comum que devem enformar a opção do julgador e cuja validade se objectiva e se afere em determinado contexto histórico e jurídico, à luz da sua compatibilidade lógica com o sentido comum e com critérios de normalidade social, os quais permitem (ou não) aceitar a certeza subjectiva da sua realidade[11].
Em caso de colisão, o julgador deve recorrer a tais critérios sopesando a valia relativa de cada meio de prova, determinando no seu prudente critério qual o que deverá prevalecer e por que razões deve ocorrer tal primazia[12].
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Vejamos.
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A testemunha (…) é directora financeira da Santa Casa da Misericórdia de (…) e teve um depoimento credível em que explicitou o modo e o tempo habitual de pagamento da renda por parte da Ré (…).
A testemunha foi convincente quando afirmou que a arrendatária lhe confidenciou «que está em Espanha», «vem esporadicamente a Portugal» e que, inclusivamente, esta «já lhe ligou de Espanha» e que «o marido trabalha em Espanha». Mais adiantou que, recorrentemente, recebe de pedidos para a celebração de novos arrendamentos e que alguns desses interessados se queixam que a habitação em causa «está fechada». Embora não exista prova suficiente para afirmar que o arrendado não está ocupado desde 2014, a imagem global é que o centro de vida da Ré se situa em Espanha e que a casa estava quase permanentemente desocupada e que isso aconteceu, pelo menos, no decurso do último ano.
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(…) é assistente social e trabalha para a Santa Casa da Misericórdia de (…) desde 2015 e o seu depoimento foi verosímil e diferenciado, em função do acompanhamento que realiza no terreno relativamente aos prédios que a sua entidade patronal mantém arrendados.
Começou por relatar que, logo após assumir funções, tentou empreender um levantamento das diversas habitações existentes e que nunca conseguiu contactar a arrendatária, a qual, de acordo com a vizinhança, «residia fora do país».
No âmbito das suas funções faz visitas às casas e realiza inquéritos, salientando que, quanto a esta morada, a D. (…) assumiu que não vivia na casa, pormenorizando que nas primeiras vezes que ali se deslocou «nunca ninguém lhe abriu a porta» e que soube pelos vizinhos que «a senhora vivia em Barcelona», «só vinha cá de férias» e «já morava lá há alguns anos». Entretanto, enviou cartas registadas, as quais vinham devolvidas e, mais tarde, foi procurada pela Ré que lhe confidenciou que «vivia em Barcelona» «há alguns anos» e que esta «era a casa de férias». A arrendatária deu-lhe a morada naquela cidade e os contactos telefónicos em território espanhol.
A referida casa foi apontada como estando fechada e que «não há um dia» que não haja «pessoas a recorrer à Misericórdia a procurar casa e a inscrever-se na lista de espera da habitação social e mais do que uma vez nos enumeraram essa casa», «porque alguém do bairro lhes disse que a casa estava vazia».
Esclareceu que esta situação diverge das demais, uma vez que «esta senhora procura-nos quando vem cá uma vez por ano» e a perguntas do Mm.º Juiz de Direito reiterou que a questão da não residência permanente lhe foi comunicada pela própria e «por vizinhos da rua». Mais relatou que uma vizinha que mora duas portas mais abaixo e «que não é inquilina da Santa Casa» foi a primeira pessoa «a dizer-lhe que morava em Espanha» e que tinha uma chave da casa para lá ir se fosse preciso – assim como o irmão da arrendatária tem outra.
A testemunha assumiu que passa muitas vezes na rua e a casa «continua fechada», «os estores estão fechados», «nunca viu lá a D. (…)», passando «por lá cerca de duas vezes por mês» e que «ela continua a ir à Santa Casa quando vem a Portugal».
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(…) mora no bairro, está em processo de aquisição de uma habitação da Santa Casa da Misericórdia e conhece vagamente a Ré (…). Esta testemunha manteve um registo espontâneo em que, de forma clara e persuasiva, afiançou que «é uma senhora que eu saiba não está cá há muitos anos», «já não a vê há muitos anos», a casa «está fechada» e o «conhecimento geral é que está em Espanha». Sabe que a Ré tem uma filha na Alemanha e outra em Espanha, estimando que a «mãe foi primeiro para Espanha do que a filha».
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(…) é amiga da filha mais velha da Ré e sabe que a (…) tem três filhas, uma filha que reside na Alemanha e outras duas na zona de Barcelona. Tinha conhecimento que a Ré esteve em recuperação da doença Covid em Espanha e sabe que a mesma tem «uma casa de herança» em Beja, situada na «zona da (…)».
No entanto, a testemunha não manteve um registo credível, transparecendo um proteccionismo excessivo da posição processual da parte passiva, não conseguindo contextualizar temporalmente as suas afirmações e denotando dificuldades sempre que alguma pergunta a parecia surpreender. Para além da questão da existência do mencionado imóvel e de estar munida com uma procuração para receber correio registado, o único ponto com relevo em que mereceu credibilidade correu quando fez a descrição da existência de mobílias e electrodomésticos no locado, não logrando, no mais, convencer, por isso, minimamente, o Tribunal de Recurso.
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(…) é amiga da (…) e revelou ter conhecimento sobre factos essenciais da vida familiar da Ré e do estado de saúde da mesma.
Assumiu que a arrendatária passa mais tempo em Espanha do que em Beja, que o companheiro desta trabalha na zona de Tarragona e que a casa situada junto à (…) está arrendada. Contudo, no mais, tal como prognosticou o Tribunal a quo, a testemunha manteve um registo vago e genérico, a que acrescentamos nós, sem a virtualidade de convencer o Tribunal da Relação de Évora.
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Da audição da prova e da avaliação dos restantes elementos resulta claro que, de acordo com um juízo de normalidade, a morada habitual da Ré se situa fora do território nacional e que, dando prevalência à força probatória dos testemunhos colhidos às testemunhas arroladas pela Autora, não estamos perante um cenário de residência alternada, mas antes se verifica que a permanência no locado é meramente episódica e está centrada em períodos de férias ou festivos.
Assim, com base nas declarações convocadas pelo recorrente, ao invés daquele que foi o entendimento do Mm.º Juiz de Direito, o Tribunal da Relação de Évora não tem qualquer dúvida em afirmar que, sem embargo das divergências existentes entre grupos de interesses revelados no decurso do julgamento e do próprio ónus constitutivo da prova, resulta que, com excepção dos períodos de férias e festivos, o facto essencial inscrito na alínea a) dos factos não provados se mostra demonstrado.
E isso implica necessariamente que a decisão de facto seja alterada, ao abrigo da disciplina contida no artigo 662.º[13] do Código de Processo Civil.
Em adição, altera-se igualmente o ponto 8) dos factos provados nos termos propostos, elimina-se o ponto 9 da factualidade provada e modifica-se o facto provado 10) nos seguintes termos: A Ré mantém no imóvel alguns móveis, roupas e electrodomésticos.
As alterações são feitas na correspondente secção e evidenciadas a negrito para facilitar a detecção da modificação da decisão de facto.
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4.2 – Do erro de direito: da falta de residência permanente:
A locação vem prevista nos artigos 1022.º e seguintes do Código Civil e corresponde ao «contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa mediante retribuição».
O artigo 1079.º[14] do Código Civil versa sobre as formas de cessação do arrendamento, entre as quais avulta a extinção do contrato por resolução, cujos fundamentos estão inscritos na previsão do artigo 1083.º[15] do mesmo diploma, na respectiva relação com as obrigações do locatário precipitadas no artigo 1038.º[16]. No elenco dos fundamentos resolutivos consta o não uso do locado por mais de um ano, salvo nos casos previstos no n.º 2 do artigo 1072.º[17].
Na acção de despejo com o fundamento de o arrendatário não ter no prédio ou local arrendado a sua residência permanente, o senhorio apenas tem de alegar e provar a falta de residência do arrendatário no locado, uma vez que se trata de facto constitutivo do direito que ele, na acção, pretende fazer valer.
Torna-se inexigível ao senhorio manter o contrato de arrendamento sempre ocorra um cenário de falta de uso do arrendado por mais de um ano, por tal comportamento objectivar a violação de um dever do arrendatário, sempre que o locado passe a constituir uma simples habitação intermitente ou não permanente, quando o arrendamento tiver sido celebrado para a instalação da residência primária do locatário e do seu agregado familiar.
De forma habitual a residência permanente é conceptualizada como o local onde está centrada a organização da vida individual, familiar e social do arrendatário, com carácter de habitualidade e estabilidade. Isto é, a casa em que o arrendatário juntamente com o agregado familiar toma as suas refeições, dorme, desenvolve toda a sua vivência diária, familiar e social; o local onde, de modo estável e continuado, se centra a actividade inerente à economia doméstica e familiar do arrendatário.
Não relevam, tal como defende Jorge Pinto Furtado, meras utilizações ou aberturas esporádicas, que não descaracterizam o estado de desocupação em que é essencialmente mantido o espaço arrendado com o não uso[18].
Com ressalva dos períodos de férias e festivos, a Ré, há mais de um ano que, no prédio referido em 1), não toma refeições, apenas recebe correspondência por intermédio de terceiros, não recebe amigos ou familiares, não passa os seus momentos de lazer, não pernoita (facto 11).
Não se provou assim que a Ré partilhava o seu tempo entre Portugal e Espanha, ali deslocando para visitar uma das filhas e onde permanecia apenas por períodos de um ou mais meses consecutivos.
Antes pelo contrário, não se trata só de passar mais tempo em Espanha do que em Portugal, mas antes de ali manter o seu centro organizacional de vida. Aliás, sintomático deste uso intermitente é de realçar que o companheiro e duas das filhas da Ré residem e trabalham em Espanha.
Complementarmente, não ficou comprovado que se tratava de uma situação de não uso lícito, fundado em caso de força maior ou de doença. Não ocorre assim qualquer critério de razoabilidade no comportamento omissivo do arrendatário e perpassa até da imagem global do julgamento que esse não uso permanente perdura há cerca de 14 anos.
Na verdade, estamos num domínio onde impera a regra que o arrendatário deve usar efectivamente a coisa para o fim do contrato, não podendo deixar de utilizar o locado por mais de um ano e onde um comportamento contrário aos fins da lei fundamenta o despejo.
Escrutinada a matéria de facto cumpre assim concluir pela resolução do contrato de arrendamento celebrado relativamente ao prédio urbano sito em Beja na Rua (…), n.º 6, decretando o despejo do imóvel aqui em causa e condenando-se a Ré a entregá-lo à Autora livre e devoluto de pessoas e bens.
Por conseguinte, julga-se procedente o recurso apresentado e revoga-se a decisão recorrida nos termos acima assinalados.
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V – Sumário: (…)

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VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar procedente o presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, declarando-se resolvido o contrato de arrendamento celebrado nos autos, com base no não uso do locado por mais de um ano, condenando-se a Ré a entregar de imediato à Autora, livre e desocupado, o prédio urbano objecto do contrato aqui em causa.
Custas a cargo da apelada, atento o disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Notifique.
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Processei e revi.
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Évora, 09/04/2025
José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho
Isabel de Matos Peixoto Imaginário
Ana Margarida Carvalho Pinheiro Leite


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[1] A alteração ocorrida resulta da reapreciação da matéria de facto realizado no ponto 4.1 do presente acórdão.
[2] A eliminação resulta da reapreciação da matéria de facto realizado no ponto 4.1 do presente acórdão.
[3] A alteração ocorrida resulta da reapreciação da matéria de facto realizado no ponto 4.1 do presente acórdão.
[4] A eliminação resulta da reapreciação da matéria de facto e o facto em questão passou a integrar o elenco dos factos provados (facto 11).
[5] (8) O companheiro e duas das filhas da Ré residem e trabalham em Espanha.
[6] (9) A Ré, há vários a esta parte, que se desloca para Espanha, acompanhando o seu companheiro que ali trabalha, e visita uma das filhas, ai permanecendo períodos de um ou mais meses consecutivos, passando nos últimos dois/ três anos mais tempo em Espanha do que em Portugal.
[7] (10) A Ré tem no imóvel referido em 1) móveis e electrodomésticos.
[8] Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, Coimbra, pág. 191.
[9] Antunes Varela, Miguel Varela e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 435-436.
[10] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de uniformização de jurisprudência de 21/06/2016, in www.dgsi.pt.
[11] Sobre esta matéria ver, em sentido próximo, o Acórdão da Relação de Lisboa de 19/05/2016, in www.dgsi.pt, que realça que «a prova dos factos assenta na certeza subjectiva da sua realidade, ou seja, no elevado grau de probabilidade de verificação daquele, suficiente para as necessidades práticas da vida, distinguindo-se da verosimilhança que assenta na simples probabilidade da sua verificação».
[12] Luís Filipe Pires Sousa, Prova Testemunhal. Noções de Psicologia do Testemunho, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2020, pág. 413.
[13] Artigo 662.º (Modificabilidade da decisão de facto):
1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
3 - Nas situações previstas no número anterior, procede-se da seguinte forma:
a) Se for ordenada a renovação ou a produção de nova prova, observa-se, com as necessárias adaptações, o preceituado quanto à instrução, discussão e julgamento na 1.ª instância;
b) Se a decisão for anulada e for inviável obter a sua fundamentação pelo mesmo juiz, procede-se à repetição da prova na parte que esteja viciada, sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de facto, com o fim de evitar contradições;
c) Se for determinada a ampliação da matéria de facto, a repetição do julgamento não abrange a parte da decisão que não esteja viciada, sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de facto, com o fim de evitar contradições;
d) Se não for possível obter a fundamentação pelo mesmo juiz ou repetir a produção de prova, o juiz da causa limitar-se-á a justificar a razão da impossibilidade.
4 - Das decisões da Relação previstas nos nºs 1 e 2 não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
[14] Artigo 1079.º (Formas de cessação)
O arrendamento urbano cessa por acordo das partes, resolução, caducidade, denúncia ou outras causas previstas na lei.
[15] Artigo 1083.º (Fundamento da resolução):
1 - Qualquer das partes pode resolver o contrato, nos termos gerais de direito, com base em incumprimento pela outra parte.
2 - É fundamento de resolução o incumprimento que pela sua gravidade ou consequências torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento, designadamente quanto à resolução pelo senhorio:
a) A violação de regras de higiene, de sossego, de boa vizinhança ou de normas constantes do regulamento do condomínio;
b) A utilização do prédio contrária à lei, aos bons costumes ou à ordem pública;
c) O uso do prédio para fim diverso daquele a que se destina, ainda que a alteração do uso não implique maior desgaste ou desvalorização para o prédio;
d) O não uso do locado por mais de um ano, salvo nos casos previstos no n.º 2 do artigo 1072.º;
e) A cessão, total ou parcial, temporária ou permanente e onerosa ou gratuita, do gozo do prédio, quando ilícita, inválida ou ineficaz perante o senhorio.
3 - É inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento em caso de mora igual ou superior a três meses no pagamento da renda, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário ou de oposição por este à realização de obra ordenada por autoridade pública, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 3 a 5 do artigo seguinte.
4 - É ainda inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento no caso de o arrendatário se constituir em mora superior a oito dias, no pagamento da renda, por mais de quatro vezes, seguidas ou interpoladas, num período de 12 meses, com referência a cada contrato, não sendo aplicável o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo seguinte.
5 - É fundamento de resolução pelo arrendatário, designadamente, a não realização pelo senhorio de obras que a este caibam, quando tal omissão comprometa a habitabilidade do locado e, em geral, a aptidão deste para o uso previsto no contrato.
6 - No caso previsto no n.º 4 o senhorio apenas pode resolver o contrato se tiver informado o arrendatário, por carta registada com aviso de receção, após o terceiro atraso no pagamento da renda, de que é sua intenção pôr fim ao arrendamento naqueles termos.
[16] Artigo 1038.º (Enumeração)
São obrigações do locatário:
a) Pagar a renda ou aluguer;
b) Facultar ao locador o exame da coisa locada;
c) Não aplicar a coisa a fim diverso daqueles a que ela se destina;
d) Não fazer dela uma utilização imprudente;
e) Tolerar as reparações urgentes, bem como quaisquer obras ordenadas pela autoridade pública;
f) Não proporcionar a outrem o gozo total ou parcial da coisa por meio de cessão onerosa ou gratuita da sua posição jurídica, sublocação ou comodato, excepto se a lei o permitir ou o locador o autorizar;
g) Comunicar ao locador, dentro de quinze dias, a cedência do gozo da coisa por algum dos referidos títulos, quando permitida ou autorizada;
h) Avisar imediatamente o locador, sempre que tenha conhecimento de vícios na coisa, ou saiba que a ameaça algum perigo ou que terceiros se arrogam direitos em relação a ela, desde que o facto seja ignorado pelo locador;
i) Restituir a coisa locada findo o contrato.
[17] Artigo 1072.º (Uso efetivo do locado):
1 - O arrendatário deve usar efectivamente a coisa para o fim contratado, não deixando de a utilizar por mais de um ano.
2 - O não uso pelo arrendatário é lícito:
a) Em caso de força maior ou de doença;
b) Se a ausência, não perdurando há mais de dois anos, for devida ao cumprimento de deveres militares ou profissionais do próprio, do cônjuge ou de quem viva com o arrendatário em união de facto;
c) Se a utilização for mantida por quem, tendo direito a usar o locado, o fizesse há mais de um ano.
d) Se a ausência se dever à prestação de apoios continuados a pessoas com deficiência com grau de incapacidade superior a 60%, incluindo a familiares.
[18] Jorge Pinto Furtado, Comentário ao Regime do Arrendamento Urbano, 4ª edição, revista e atualizada, Almedina, Coimbra, 2022, pág. 373.