DESPEJO
OPOSIÇÃO À RENOVAÇÃO CONTRATUAL
ENTREGA DO LOCADO
Sumário

Determinado ter sido válida e eficaz a declaração de oposição à renovação do contrato feita pelo Autor, assiste o direito ao autor de exigir a restituição do prédio ou locado como o mesmo se encontrava á data da celebração do contrato vigente com as respetivas benfeitoras.

Texto Integral

Processo nº 1064/21.9T8AGD.P1

Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Aveiro - JC Cível - ...

Relatora: Ana Vieira

1º Adjunto Desembargador Dr.ª. Isabel Rebelo Ferreira

2º Adjunto Desembargador Dr.ª Judite Pires


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Sumário

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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I- RELATÓRIO

AA, intentou acção declarativa de condenação em processo comum contra A... Unipessoal Lda., alegando em resumo que:

O Autor é senhorio da Ré desde 2009, mercê da celebração de contrato de arrendamento que tem vindo a ser sucessivamente renovado.

Em 2019 foi feito novo contrato de arrendamento pelo período de cinco anos.

O Autor pretende pôr fim ao contrato de arrendamento, no final do prazo deste, a 31 de Dezembro de 2023.

No entanto, a Ré a tal se opõe, alegando que o Autor não se pode opor à renovação do contrato até 2028, o que não corresponde ao que vem previsto na lei.

Conclui pedindo que a acção seja julgada procedente por provada e, consequentemente, ser reconhecido:

a) O prazo de 5 anos do contrato de arrendamento para fins não habitacionais.

b) Que a norma redigida em 2019 (Artº 1110, nº4) não se aplica ao presente contrato por esta não ter a capacidade de modificar relações já constituídas, ou ainda que se entenda que se aplica, não produz os efeitos pretendidos pela Ré.

c) O direito ao A. de se opor á renovação do contrato de arrendamento com antecedência mínima de 120 dias antes do termo deste (31 de Dezembro de 2023).

d) O Direito do A. em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias.

2- Citada a ré, a mesma contestou e apresentou reconvenção, alegando em resumo que: A Ré, nos termos legais pode opor-se à renovação do contrato de arrendamento e que a ré sempre terá direito a ser indemnizada pelo valor das obras realizadas no prédio.

Conclui, pedindo que:- A acção seja julgada improcedente.

- O Autor seja condenado como litigante de má fé.

- Seja reconhecido o direito de a Ré reclamar uma indemnização pelas benfeitorias realizadas no imóvel, no montante de 114,348,28€

Foi dispensada a realização de audiência prévia, admitida a reconvenção e foi elaborado despacho saneador, fixando-se o objecto do litígio e os temas de prova.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com estrita observância dos formalismos legais.


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Na sentença recorrida foi decidido: «… Decisão

Por todo o exposto:

A) Julgo improcedente a acção, absolvendo a Ré dos pedidos contra ela formulados.

B) Face à improcedência da acção encontra-se prejudicado o conhecimento da reconvenção

C) Improcede o pedido de condenação do autor como litigante de má fé.

Custas pelo Autor…»»(sic).


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Inconformada com tal decisão, veio o requerente interpor o presente recurso, o qual foi admitido como apelação, a subir de imediato, nos autos e com efeito devolutivo.

O autor com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões:«… Pelo que se conclui que:

1º. É prorrogativa do senhorio, opor-se à primeira renovação no caso do contrato ser de 5 anos.

2º. Tudo isto porque a norma contida no art.º 1110/4 dispõe que nos primeiros 5 anos de arrendamento o senhorio não se pode opor à renovação do contrato. Entende, a “escola de Lisboa” que, como o prazo (de 120 dias) de oposição fica dentro dos 5 anos a que alude a norma, o senhorio não se poderá opor, por lhe estar vedado por Lei.

3º. No entanto, a interpretação dada pelo Tribunal da Relação do Porto parece-nos muito mais fidedigna, especialmente porque tem em conta que os contratantes haviam já, no momento da formação do contrato, que o arrendamento duraria 5 anos, e não 10, como parece pretender a Ré.

4º. Concorda-se, enfim, com a posição deste mesmo Tribunal da Relação do Porto.

5º. Seguidamente à petição inicial foi deduzida contestação com reconvenção.

6º. Tal reconvenção, foi admitida, mal, smo, em despacho saneador (este irrecorrível no momento da sua prolação, pelo disposto no art.º644, sendo-o,apenas, a final. Deste modo o A.vem apelar a inadmissibilidade da reconvenção, o que fez com os fundamentos que seguem.

7º. A reconvenção, para ser admissível tem de estar conexionada com o pedido através dos elementos dispostos no art.º 266 do Código de Processo Civil. Tal não acontece no caso sob Júdice.

8º. A Ré (autora do pedido reconvencional) veio peticionar o reconhecimento do direito a receber o valor gasto como benfeitorias, mas, no caso, não lhe está a ser pedida a entrega do imóvel, situação prevista como elemento de conexão da alínea b) do art.º 266.

9º. O A. simplesmente intenta ação de reconhecimento do direito a opor-se à renovação do contrato de arrendamento, enquanto não tenta efetivar o despejo – momento em que, smo, a Ré poderia exigir o pagamento de benfeitorias.

10º.Como tal, a reconvenção foi mal admitida, pelo que deverá ser desconsiderada.

11º.Assim como o seu valor.

12º.No entanto, a ser considerada, é necessário melhor julgamento quanto à responsabilidade das custas, isto porque o A. foi condenado na totalidade das custas, quando não foi ele que lhes deu causa.

13º.Segundo o princípio da causalidade é aquém dá causa à ação que é responsável pelo pagamento de custas, o que vem disposto no art.º 527 do Código de Processo Civil.

14º.Sendo assim, e sob a máxima que quem dá causa à ação é quem a perde, o A., por não ter visto a sua pretensão procedente, o tribunal a quo entendeu que este seria o responsável pelas custas, com o que não se pode discordar mais.

15º.No caso de reconvenção, ainda para mais de um pedido que não está conexionado com a causa de pedir do A., quem é A. do pedido reconvencional é o/a Ré(u). É o que acontece nos presentes autos.

16º.O A. interpôs um pedido que valorou em 15.000,00€, ao passo que, com diferente causa de pedir, a Ré intentou pedido reconvencional (do qual é A.) no valor de 114.348,28€, que, como se sabe, gerou a grande parte das custas processuais.

17º.Ora, a A. do pedido de 114.348,28€ (neste caso a Ré) não teve ganho de causa, pois o pedido não foi procedente, e não lhe foi reconhecida a faculdade de exigir tal valor (ou qualquer outro) do A. no momento em que tivesse de entregar o imóvel. Ou seja, quanto ao seu pedido a Ré teve um decaimento de 100%.

18º.As custas deveriam ter sido repartidas, tanto que A. e R. não viram os seus pedidos procedentes na proporção de 11,60% para o A., e o restante de 88,40% para a Ré.

19º.No entanto, a decisão justa importaria sempre o pagamento da totalidade das custas pela Ré, porquanto o pedido do A. seria totalmente procedente, pois ser-lhe-ia confirmado o direito de se opor à renovação do contrato de arrendamento e o pedido reconvencional não seria admitido.

20º.A sentença proferida nos autos viola as disposições normativas dispostas nos art.º 1110, nomeadamente o seu n.º 4 do Código Civil; assim como no art.º 266 do Código de Processo Civil quanto à admissão da reconvenção; e por fim o art.º 527 do Código do Processo Civil, quanto à matéria das custas.

Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exa. doutamente suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente e, por via dele, ser alterada a sentença proferida em 1.ª instância, tudo com as devidas e legais consequências….».


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Não foram juntas contra-alegações.


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Relativamente ao referido recurso foi proferido Acórdão, em resumo com o seguinte teor:

«… Nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre decidir.


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II- DO MÉRITO DO RECURSO

1. Definição do objecto do recurso

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil[1].

Porque assim, atendendo á estrutura das conclusões das alegações apresentadas pelos apelantes, resulta que as questões a analisar são as seguintes:
1. Do direito à oposição à renovação do contrato de arrendamento.
2. Admissibilidade da reconvenção.
3. Condenação do autor no pagamento das custas.


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III- FUNDAMENTOS DE FACTO

Nesse contexto, cumpre referir que a sentença recorrida consignou a seguinte matéria de facto: III – Fundamentação

Ficaram provados os seguintes factos:

1 – O Autor e a Ré, representada por BB e CC, celebraram a 25 de Abril de 2009 um contrato de arrendamento que tinha por objecto o prédio com a matriz predial ...14 no concelho ..., união de freguesias ..., ... e ... - fração autónoma designada por Lote nº..., correspondente a parte do terreno para construção urbana (actualmente serviços) com 1410 m2 em ....

2 – Este contrato foi objecto de diversas renovações corporizadas em novos contratos e aditamentos.

3 - Em 2018, decorria um contrato, datado de um de Janeiro de 2017, que terminava em 2021.

4 - Nesse contrato a cláusula terceira tinha a seguinte formulação:

“A renda mensal para os anos de 2017 e 2018 é de 550.00 € e para os anos de 2019, 2020 e 2021 é de 600,00 €”

5 – E a cláusula sexta tinha a seguinte formulação:

“Findo o contrato, a fracção arrendada, deverá ser entregue nas mesmas condições em que o recebeu em 1 de Julho de 2009”

6 - A Ré, representada por BB, pediu para que fosse alterada a data do termo da relação contratual para 2024.

7 – Assim, com data de 1 de janeiro de 2019, foi elaborado novo contrato, estabelecendo-se na cláusula segunda que o seu o prazo é de “cinco anos” “com início em 1 de Janeiro de 2019 e termo em 31 de Dezembro de 2023”.

8 - Na cláusula sexta refere-se que no fim do contrato o prédio “deverá ser entregue ao senhorio, nas mesmas condições em que o recebeu nesta data”.

9 - Foi ainda acordado que a renda que estava estipulada em 600 €, no contrato que decorria, fosse reduzida para 500,00 €.

10 – Em momento não concretamente apurado, o Autor comunicou à Ré a intenção de não renovar o contrato de arrendamento.

11 - A ré recebeu do autor o prédio descrito em 1, sem qualquer construção.

12 - Tendo as partes convencionado que a ré procederia ao licenciamento da construção e edificaria o prédio a fim de corresponder às funções de uma lavagem de carros, o que foi efectuado pela Ré.

13- No licenciamento a Ré despendeu as seguintes quantias:

- Projecto de arquitectura, alteração, loteamento e licenciamento – Torre de Papel – 6.500.40€;

- Estradas de Portugal – Legalização da Obra e acessos à EN1 – 499,45 €;

- EDP – 209,60 €;

- Câmara Municipal ... – Licenças de Construção – 795,34 €.

14 - Na construção, realizada em 2009, a Ré despendeu, pelo menos, as seguintes quantias:

- Pavidalle – Obra Civil- 21.000,00 €;

- Fossas Residuais – 1100,00 €;

- Cobertura e túneis – Boxes – 80.400,00 €.

15 - As obras realizadas no local têm um valor, em novo, de 72.750,00 €, assim distribuído: Pavimentos – 24.750,00 €; Fossa águas residuais – 1.500,00 €; Separação de hidrocarbonetos – 750,00 €; Cobertura lavagem – 25.000,00 €; Cobertura aspiração – 16.000,00 €; Rede de alimentação de água – 1.500,00 €; Rede de drenagem de águas residuais – 2.500,00 €; Iluminação – 750,00 €.

16 - Atendendo a depreciação sofrida em função da idade e do estado de conservação essas obras têm, actualmente, um valor de 38.000,00 €, assim distribuída: Pavimentos – 12.375,00 €; Fossa águas residuais – 1.050,00 €; Separação de hidrocarbonetos – 525,00 €; Cobertura lavagem – 12.500,00 €; Cobertura aspiração – 8.000,00 €; Rede de alimentação de água – 1.125,00 €; Rede de drenagem de águas residuais – 1.875,00 €; Iluminação – 562,00 €.

Não se provou que

a) Na renovação do contrato referida em 7 as partes acordassem, mercê da redução da renda e do alargamento do prazo de arrendamento referidos em 7 e 9, que as benfeitorias efectuadas, ficassem, sem pagamento de qualquer indemnização, como parte do locado

b) O motivo da realização de um novo contrato em janeiro de 2019 se prendesse com o facto de em 2017 o representante da ré, Sr. BB, ter intenção de comprar a quota ao seu anterior sócio, considerando que tal negócio só seria viável se conseguisse garantir junto do Autor a renovação do contrato de arrendamento do estabelecimento.

c) Quando no inicio de 2018 se apercebesse que o filho do Autor, Sr. DD, iria abrir um negocio semelhante, o representante da Ré sentisse uma enorme revolta,

d) Disto deu conta ao Autor, dizendo-lhe ainda que o iria denunciar às finanças por todos estes anos que andava a passar recibos de valor inferior ao que efetivamente recebia, tanto quanto à Ré, como quanto aos outros inquilinos.

e) O Autor, em consequência destas afirmações oferecesse um novo contrato à Ré, com o valor que efetivamente a ré paga, isto é 500 €,

f) Fosse nessa sequência que fosse alterada, em relação ao contrato anterior, a clausula sexta.

g) A Ré tenha gasto 2000,00 € no jardim, 896,27 € num separador de hidrocarbonetos, 547,20 na bomba e fossa de águas residuais e 400,00 € na Baixada BT.

h) A Ré tenha gasto 2150,00 € na vedação do imóvel.


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IV - FUNDAMENTOS DE DIREITO

Nesta fase cumpre analisar o mérito da sentença, na vertente da fundamentação de direito, analisando em resumo se a sentença deveria ser alterada conforme pugna o recorrente.

A sentença recorrida, na parte atinente ao mérito objecto do recurso, refere o seguinte: «…Nos presentes autos discute-se se o Autor, tem direito a denunciar o contrato de arrendamento, no fim do prazo estipulado para a sua duração e, em caso afirmativo, se a Ré tem direito a ser indemnizada pelas obras feitas no local.

….Trata-se um arrendamento de prédio urbano para fins não habitacionais, ao qual se aplica, para além das normas gerais de todos os arrendamentos de prédios urbanos (arts. 1069º a 1093º), as normas especiais dos artigos 1108º a 1110º, todos do Código Civil.

Ora, particularmente no que se refere à duração do contrato, sua denúncia e oposição à renovação estabelece o art. 1110º n.º 4 que “Nos cinco primeiros anos após o início do contrato, independentemente do prazo estipulado, o senhorio não pode opor-se à renovação”.

Da forma como a norma se encontra redigida, com ênfase na expressão “não pode”, não restam dúvidas que se trata de uma norma imperativa e, por isso, subtraída à disponibilidade das partes.

Conforme se retira do art 1º da Lei 13/2019 de 12/02 esta teve como objectivo “estabelecer medidas destinadas a corrigir situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios, a reforçar a segurança e a estabilidade do arrendamento urbano e a proteger arrendatários em situação de especial fragilidade”.

O objectivo da lei foi, portanto, expressamente, o de proteger os arrendatários, nomeadamente os que desenvolvem uma actividade industrial, dando-lhes segurança e estabilidade e protegendo também, reflexamente, a actividade económica,

Esta norma foi introduzida pela Lei 13/2019 de 12/02.

Nos termos do art. 16º da mesma lei esta entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Seguindo a regra do art. 12º n.º 2 do Código Civil e uma vez que a norma do art. 1110º n.º 4 dispõe sobre o conteúdo da relação jurídica, essa norma aplica-se aos contratos já celebrados à data da sua entrada em vigor e, concretamente, ao contrato objeto destes autos.

Ora a norma em apreço tem suscitado algumas divergências quanto à sua interpretação, em dois sentidos:

- Num deles, entendem os seus defensores, que, com a norma em questão, se pretendeu assegurar que os contratos não pudessem findar, por vontade do senhorio, antes de decorridos cinco anos. Assim, o senhorio poderia denunciar o contrato, antes de decorrido esse período, mas essa denúncia só operaria no termo desse prazo, tal como no art. 1097º n.º 3 do Código Civil, estabelecendo assim uma unidade normativa.

Neste sentido, se pronuncia Jessica Rodrigues Ferreira, no seu texto “Análise das principais alterações introduzidas pela Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro, aos regimes da denúncia e oposição à renovação dos contratos de arrendamento urbano para fins não habitacionais”, publicado na Revista Electrónica de Direito.

- Para uma outra corrente, com esta norma, quis impedir-se o senhorio de denunciar o contrato antes de decorridos cinco anos, pelo que a denúncia feita antes não tem qualquer validade.

Referem que essa é a interpretação que decorre da letra da lei, claramente diversa da redacção do art. 1097º n.º 3 do Código Civil que se aplica aos arrendamentos para habitação e que tem a seguinte formulação: “A oposição à primeira renovação do contrato por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data”.

Face à diversidade de redação das duas normas, não se pode, pois, presumir que o legislador quis instituir um regime similar.

No limite, portanto, o arrendamento pode durar 10 anos (como poderá acontecer no presente caso).

Referem ainda que o senhorio pode obstar a este efeito prevendo uma cláusula de não renovação.

Esta dualidade de interpretação vem bem espelhada no Acórdão da Relação de Lisboa de 27/10/2022, 12613/21.2T8LSB.L1-6, e no Acórdão da Relação de Lisboa de 29 de Setembro de 2022, processo 1006/21.1T8CSC.L1-2, defendendo-se em ambos esta última posição.

Concorda-se decisivamente com a mesma. De facto, a letra da lei é clara e inequívoca, não se podendo presumir que o legislador disse aquilo que não disse.

Pelo exposto, não podendo o Autor opor-se à renovação do contrato, improcede a acção. Fica prejudicado o conhecimento da reconvenção.

…Decisão

Por todo o exposto:

A) Julgo improcedente a acção, absolvendo a Ré dos pedidos contra ela formulados.

B) Face à improcedência da acção encontra-se prejudicado o conhecimento da reconvenção

C) Improcede o pedido de condenação do autor como litigante de má fé.

Custas pelo Autor…».


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O recorrente refere que deduziu ação declarativa de simples apreciação nos termos do Art.º 10 do Código de Processo Civil,por ter a convicção de que se poderia opor à renovação do contrato de arrendamento onde figura como senhorio. Por isso mesmo, o A. decidiu recorrer aos tribunais, para que apreciassem da existência do direito à oposição, o que mereceu, por parte da Ré uma contestação com reconvenção, onde pediu, em largos modos, que o A. fosse condenado ao pagamento do valor de 114.348,28€ por benfeitorias realizadas.

Mais refere que no decurso do julgamento, já durante a produção de prova, foi, por despacho determinado que “uma vez que se discute o valor das obras realizadas no prédio” se procedesse à avaliação do valor das obras realizadas.

Proferida a sentença nela se dispôs que o A. não tinha direito à oposição à renovação do contrato de arrendamento, e, por conseguinte, não se apreciou o pedido reconvencional feito pela Ré/reconvinte.

Alega que a a questão principal prende-se com o facto de A. e R. terem, em 2019, celebrado um contrato de arrendamento pelo prazo de 5 anos, e o A. pretender opor-se, já, à primeira renovação. Para além de sindicar pela legalidade de tal oposição, o A. pretende ainda que se discutam outros dois aspetos: Com a contestação, a Ré interpôs um pedido reconvencional, aliás esse que veio atribuir à causa o valor de 129.348,28€, tendo sido o A. condenado, também nas custas processuais.

Alega assim, que o recurso versa sobre estas 3 matérias que merecem melhor discussão, e posterior alteração da decisão: 1. Do direito à oposição à renovação do contrato de arrendamento; 2º admissibilidade da reconvenção e 3 condenação do autor nas custas.


1- Direito á oposição á renovação do contrato.

Neste segmento alega que dispõe o Art.º 1110/4 do Código Civil, com a redação dada pela Lei 13/2019 de 12 de fevereiro que “nos cinco primeiros anos após o início do contrato, (…) o senhorio não pode opor-se à renovação”, o que, no entender da Ré significa que, como a comunicação para a oposição tem de ter lugar 120 dias antes dos efeitos que se pretendem, o A., senhorio estaria impedido de o fazer.

Refere que na sentença, o tribunal a quo assume a dualidade de posições existentes, mas opta pela que vai contra as pretensões do A., e alega que vai também contra o que este tribunal tem vindo a decidir. Indica que o tribunal acabou por defender a posição que tem seguido a “escola de Lisboa” porquanto acabou por seguir a jurisprudência que de lá foi emanada, nomeadamente ao oferecer que “Esta dualidade de interpretação vem bem espelhada no Acórdão da Relação de Lisboa de 27/10/2022, 12613/21.2T8LSB.L1-6, e no Acórdão da Relação de Lisboa de 29 de Setembro de 2022, processo 1006/21.1T8CSC.L1-2, defendendo-se em ambos esta última posição.”.

Alega o autor que nesta Relação se tem decidido de maneira diferente, nomeadamente no Ac. proferido no dia 08-05-2023, (Relator José Eusébio Almeida, processo 1085/22.4YLPRT.P1) .

Invoca o recorrente que o autor e R. celebraram um contrato de arrendamento em 2019, com termo em 2024, e o A. pretende opor-se à primeira renovação. Ora, este tribunal já decidiu que é prorrogativa dos senhorios fazê-lo.

Refere que considera que o que se pretendeu com as alterações decorrente da Lei n.º 13/2019 foi que “ao contrato não poderá pôr-se termo, pelo senhorio, antes dos primeiros cinco anos”], mas não mais que isso. Conclui, que seja no caso dos contratos para habitação, seja nos contratos para fins não habitacionais, a Lei n.º 13/2019 pretendeu fixar um tempo mínimo de vigência do arrendamento, mas, não alterou os prazos de comunicação da oposição à renovação que, aliás, sempre foram prazos mínimos.


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Estamos perante um contrato de arrendamento para fins não habitacionais.

O disposto no art.º 1110/4 do CC, introduzido pela Lei 13/2019, aplica-se ao contrato em causa nos autos porque, embora o contrato tenha sido celebrado antes de aquela lei ter entrado em vigor (que foi no dia seguinte ao da sua publicação: artigo 16 da Lei 13/2019), tal norma dispõe directamente sobre o conteúdo da relação do arrendamento existente entre as partes, abstraindo do facto que lhe deu origem e, por isso, abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor: art.º 12/2, 2.ª parte, do CC.

O art.º 1110/4 do CC dispõe: “Nos cinco primeiros anos após o início do contrato, independentemente do prazo estipulado, o senhorio não pode opor-se à renovação.”

Consideramos que face ao teor deste normativo que nos 5 primeiros anos o senhorio não se pode opor à renovação. Pelo que, se o contrato tiver um prazo de duração igual ou inferior a 5 anos, até ao fim dele não é possível uma oposição à renovação e, por isso, o contrato, até ao fim desses 5 anos, renovou-se.

Pelo que, antes desta renovação não é possível a oposição à mesma.

Assim, aderimos á fundamentação da sentença recorrida de que, não é válida a oposição à renovação, porque a lei proíbe a oposição à renovação antes do fim dos 5 anos.

Neste sentido e para outros desenvolvimentos, vide o Ac da RL 1006/21.1T8CSC.L1-2, Relator: PEDRO MARTINS, Data do Acórdão: 29-09-2022: A norma do art.º 1110/4 do CC, na redacção da Lei 13/2019, norma imperativa que se aplica às relações contratuais existentes à data da sua entrada em vigor (art.º 12/2, 2.ª parte, do CC), “proíbe a oposição à renovação no primeiro lustro contratual” do contrato de arrendamento urbano para fins não habitacionais. É diferente da norma do art.º 1097/3 do CC, tendo um sentido incompatível com ela.»


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2. Da admissibilidade do pedido reconvencional

O apelante considera que interpôs uma ação de simples apreciação, para aferir da existência de uma faculdade jurídica, e que a ré deduziu pedido reconvencional, o qual foi admitido no despacho saneador nos termos do artigo 266, número 2, b) do Código de Processo Civil (Quando o réu se propõe tornar efetivo o direito a benfeitorias ou despesas relativas à coisa cuja entrega lhe é pedida;”).

Entende que como nesta acção não lhe estava a ser pedida a entrega do locado que este pedido reconvencional não deveria ter sido admitido, por inexistência de elemento de conexão.

A acção de simples apreciação não pressupõe qualquer lesão ou violação de um direito, sendo meios de tutela de direitos em que não é posta em causa a sua violação, quer efectiva, quer receada, sem prejuízo de o autor, ter de demonstrar que tem um interesse em agir, isto é, que carece da a obtenção da declaração judicial da existência ou inexistência do alegado direito. A classificação de uma acção como de simples apreciação positiva ou negativa depende do pedido, ou seja da providência requerida pelo autor; na acção de simples apreciação não se exige a prestação de uma coisa ou de um facto, não podendo a acção ser título executivo quanto ao objecto da acção.

Neste caso resulta que estamos perante uma acção de simples apreciação e que o autor não formulou pedido de entrega do locado e nesta medida entendemos que a ré não tem qualquer interesse em agir na dedução do pedido reconvencional .

Neste sentido, vide o Ac da RE 24/19.4T8BJA-A.E1, Relator: MÁRIO SILVA, data do Acórdão: 24-10-2019: Sumário: 1. O âmbito da ação de simples apreciação negativa está confinado à mera declaração de inexistência do direito, pelo que entende a jurisprudência maioritária ser redundante a dedução de pedido reconvencional por parte do réu, pois a mesma não constitui nenhuma mais-valia perante a eventual procedência da defesa que vier a ser deduzida.

2. A partir da dedução do pedido reconvencional, considera-se ampliado ope legis o valor da causa, sendo irrelevante, para este efeito, a posterior decisão de inadmissibilidade da reconvenção.»

Assim, não se admite o pedido reconvencional deduzido pela ré, procedendo nesta parte a apelação.


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3. Do valor do processo e do pagamento das custas.

Por fim, o autor alega que foi condenado nas custas do processo e que nos termos do artigo º 527, nº2 do CPC, o critério de distribuição da responsabilidade pelas custas assenta no princípio da causalidade e, apenas subsidiariamente, no da vantagem ou proveito processual.

Entende que o pedido reconvencional alterou substancialmente o valor da acção, e se é certo que o A. deu causa à ação principal, no valor de 15.000,00€ já não será tão certo que tenha dado ao pedido reconvencional (este que já nem devia ter sido admitido, mas ainda que seja).

Refere que o tribunal mesmo a admitir o pedido da ré não o reconheceu e nessa medida admite que seja o A. condenado ao pagamento das custas em proporção de 11,60%, ao passo que a responsabilidade da Ré nas custas será de 88,4%, pelo que deve ser alterada a decisão proferida em sentença, no sentido de refletir tais alterações.

Entende-se que assiste razão ao recorrente este segmento do recurso dado que neste caso a acção foi julgada improcedente e igualmente o pedido reconvencional não deveria ser admitido, mas mesmo a ser admitido, o mesmo não foi conhecido considerando-se como sendo indeferido, e neste caso a condenação em custas deverá ter em conta a proporção do valor da acção e do valor reconvencional.

Neste sentido, vide o AC do STJ 3966/21.3T8GDM.P1.S1 Relator: JORGE LEAL 31-10-2023 Sumário: Se o desfecho da revista teve como resultado a improcedência da ação e a improcedência da reconvenção, e o valor da causa é € 46 261,80, correspondente a € 30 841,20 pela ação e € 15 420,60 pela reconvenção, a percentagem de decaimento das partes é, respetivamente, de 66,7% pelos AA./recorrentes e de 33,3% pela R./recorrida..

Pelo exposto, e quanto á fundamentação jurídica, conclui-se que o presente recurso de apelação terá, por conseguinte, ser julgado parcialmente procedente em conformidade com o decidido..


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III- DISPOSITIVO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação parcialmente procedente, revogando-se parcialmente a decisão recorrida, com a consequente não admissão do pedido reconvencional e condenando-se o autor no pagamento das custas na proporção de 11,60%, e a ré no valor de 88,4%.

No mais, mantém-se a decisão recorrida….». (sic).


*

O autor AA, veio recorrer do predito Acórdão, tendo deduzido revista excepcional, tendo formulado as seguintes conclusões:«… Pelo que se conclui:

1. O presente recurso versa sobre a matéria de direito e é de Revista Excecional, nos termos do art.º 672 do Código de Processo Civil.

2. É admissível porquanto o valor da causa é de 129.348,28 €, portanto superior ao valor da alçada dos Tribunais da Relação, e a sucumbência é de 15.004,40€, portanto de valor superior à metade da alçada, características que têm de se verificar, e verificam.

3. Por o Ac. recorrido confirmar a decisão de primeira instância não seria admissível recurso ordinário, no entanto, por o Ac. recorrido estar em contradição com outro já transitado em julgado, proferido por qualquer relação (e até pelo STJ) no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e como não foi proferido acórdão de uniformização de jurisprudência conforme com o primeiro, é admissível recurso de Revista Excecional, como dispõe o art.º 672, alínea c) do n.º 1.

4. O A. celebrou em 2019 contrato de arrendamento para fins não habitacionais, portanto regulado, na parte que lhe compete, pelo art.º 1110 do Código Civil.

5. Quando o A. avisou a Ré de que se iria opor à renovação do contrato de arrendamento, a Ré disse entender que não o podia fazer, por motivo do disposto no art.º 1110 do Código Civil, que determina que nos primeiros 5 anos de arrendamento o senhorio não se pode opor à renovação do contrato, estando esta prevista.

6. Interpretação com a qual o A. não concordou, pelo que submeteu a causa a juízo, através de ação de simples apreciação.

7. Em primeira instância, apesar de conhecer da dualidade das posições em causa, o Tribunal optou por seguir a corrente de pensamento que não permitia ao A. opor-se à renovação, decisão que mereceu a discordância do A.

8. Apelado, o Tribunal da Relação do Porto, apesar de também conhecer da dualidade de correntes, aderiu à fundamentação da sentença.

9. No entanto, o A. quando submeteu a causa a juízo fê-lo convicto da sua argumentação e tese que expôs fundamentadamente no seu pedido.

10. Por momento da prolação da sentença, em agosto de 2023, o A. seguia já de perto o proc.º 1085/22.4YLPRT.P1, que em quase tudo se assemelha ao seu caso, nomeadamente conhecia do Ac. do Tribunal da Relação do Porto, que transportado para o seu caso lhe daria total razão.

11. Quando a sentença do Tribunal de primeira instância não deu a sua pretensão como procedente, é já suportado no Ac. supra citado que apelou, seguro de que o Tribunal da Relação do Porto seguiria o mesmo entendimento que seguiu no Acórdão-fundamento, ao proc.º 1085/22.4YLPRT.P, o que não aconteceu.

12. Tem, agora, palco para submeter a causa ao entendimento do Supremo Tribunal de Justiça, também já suportado no Ac. (que também terá de se considerar Acórdão-fundamento) do Supremo Tribunal de Justiça ao mesmo processo supra citado que dá razão à sua pretensão.

13. A norma do n.º 4 do art.º 1110 do C.C., é de interpretar no sentido de que a declaração de oposição à renovação pode ter lugar antes de terminado o prazo mínimo de vigência do contrato de arrendamento para fins não habitacionais para produzir efeitos na data em que, sem a oposição, o contrato se renovaria, concluindo-se, assim, no caso dos autos, pela validade e eficácia da declaração da locadora de oposição à renovação do contrato de arrendamento celebrado pelo prazo de cinco anos.

14. Pelo dito o Tribunal a quo violou a norma disposta no art.º 1110, número 4, do Código Civil.

Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exa. doutamente suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente e, por via dele, ser alterada a sentença proferida em 1.a instância, tudo com as devidas e legais consequências….»-


*


Relativamente ao recurso foi proferido despacho de admissão da revista.

No Supremo Tribunal de Justiça foi proferido o seguinte despacho:« 1.- O Autor - AA – demandou, em acção declarativa de condenação com forma de processo comum, a Ré - A... Unipessoal Lda.,

Alegou, em resumo:

O Autor é senhorio da Ré desde 2009, mercê da celebração de contrato de arrendamento que tem vindo a ser sucessivamente renovado.

Em 2019 foi feito novo contrato de arrendamento pelo período de cinco anos.

O Autor pretende pôr fim ao contrato de arrendamento, no final do prazo deste, a 31 de Dezembro de 2023.

No entanto, a Ré a tal se opõe, alegando que o Autor não se pode opor à renovação do contrato até 2028, o que não corresponde ao que vem previsto na lei.

Pediu que seja reconhecido:

O prazo de 5 anos do contrato de arrendamento para fins não habitacionais; Que a norma redigida em 2019 (Artº 1110, nº4) não se aplica ao presente contrato por esta não ter a capacidade de modificar relações já constituídas, ou ainda que se entenda que se aplica, não produz os efeitos pretendidos pela Ré; O direito ao A. de se opor á renovação do contrato de arrendamento com antecedência mínima de 120 dias antes do termo deste (31 de Dezembro de 2023);

O direito do A. em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias.

2.- A Ré contestou e em reconvenção pediu que seja reconhecido o direito de a Ré reclamar uma indemnização pelas benfeitorias realizadas no imóvel, no montante de 114,348,28 €

3. – Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que decidiu julgar improcedente a acção e absolver a Ré dos pedidos, declarando prejudicado o conhecimento da reconvenção.

4.- O Autor recorreu de apelação e a Relação decidiu:

“Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação parcialmente procedente, revogando-se parcialmente a decisão recorrida, com a consequente não admissão do pedido reconvencional e condenando-se o autor no pagamento das custas na proporção de 11,60%, e a ré no valor de 88,4%.

No mais, mantém-se a decisão recorrida.”

5.- O Autor recorreu de revista excepcional, com as seguintes conclusões:

1. O presente recurso versa sobre a matéria de direito e é de Revista Excepcional, nos termos do art.º 672 do Código de Processo Civil.

2. É admissível porquanto o valor da causa é de 129.348,28 €, portanto superior ao valor da alçada dos Tribunais da Relação, e a sucumbência é de15.004,40€, portanto de valor superior à metade da alçada.

3. Por o Ac. recorrido confirmar a decisão de primeira instância não seria admissível recurso ordinário, no entanto, por o Ac. recorrido estar em contradição com outro já transitado em julgado, proferido por qualquer relação (e até pelo STJ) no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, e como não foi proferido acórdão de uniformização de jurisprudência conforme com o primeiro, é admissível recurso de Revista Excecional, como dispõe o art.º 672,

alínea c) do n.º 1.

4. O A. celebrou em 2019 contrato de arrendamento para fins não habitacionais, portanto regulado, na parte que lhe compete, pelo art.º 1110 do Código Civil.

5. Quando o A. avisou a Ré de que se iria opor à renovação do contrato de arrendamento, a Ré disse entender que não o podia fazer, por motivo do disposto no art.º 1110 do Código Civil, que determina que nos primeiros 5 anos de arrendamento o senhorio não se pode opor à renovação do contrato, estando esta prevista.

6. Interpretação com a qual o A. não concordou, pelo que submeteu a causa a juízo, através de ação de simples apreciação.

7. Em primeira instância, apesar de conhecer da dualidade das posições em causa, o Tribunal optou por seguir a corrente de pensamento que não permitia ao A. opor-se à renovação, decisão que mereceu a discordância do A.

8. Apelado, o Tribunal da Relação do Porto, apesar de também conhecer da dualidade de correntes, aderiu à fundamentação da sentença.

9. No entanto, o A. quando submeteu a causa a juízo fê-lo convicto da sua argumentação e tese que expôs fundamentadamente no seu pedido.

10. Por momento da prolação da sentença, em agosto de 2023, o A. seguia já de perto o proc.º 1085/22.4YLPRT.P1, que em quase tudo se assemelha ao seu caso, nomeadamente conhecia do Ac. do Tribunal da Relação do Porto, que transportado para o seu caso lhe daria total razão.

11. Quando a sentença do Tribunal de primeira instância não deu a sua pretensão como procedente, é já suportado no Ac. supracitado que apelou, seguro de que o Tribunal da Relação do Porto seguiria o mesmo entendimento que seguiu no Acórdão-fundamento, ao proc.º 1085/22.4YLPRT.P, o que não aconteceu.

12. Tem, agora, palco para submeter a causa ao entendimento do Supremo Tribunal de Justiça, também já suportado no Ac. (que também terá de se considerar Acórdão-fundamento) do Supremo Tribunal de Justiça ao mesmo processo supracitado que dá razão à sua pretensão.

13. A norma do n.º 4 do art.º 1110 do C.C., é de interpretar no sentido de que a declaração de oposição à renovação pode ter lugar antes de terminado o prazo mínimo de vigência do contrato de arrendamento para fins não habitacionais para produzir efeitos na data em que, sem a oposição, o contrato se renovaria, concluindo-se, assim, no caso dos autos, pela validade e eficácia da declaração da locadora de oposição à renovação do contrato de arrendamento celebrado pelo prazo de cinco anos.

14. Pelo dito o Tribunal a quo violou a norma disposta no art.º 1110, nº 4, do Código Civil.

6.- Verifica-se a dupla conforme (art.671 nº3 CPC), pois existe confirmação decisória, sem voto de vencido, e confirmação na fundamentação.

O Autor interpôs revista excepcional, com fundamento no art.672 nº1 a) e c) CPC.

A revista excepcional exige a comprovação dos pressupostos gerais, que se verificam, e do pressuposto específico enunciado no art.672 CPC, cuja apreciação compete ao colectivo da Formação.

7.- Pelo exposto, decide-se:

Remeter o processo à Formação…».


*

Ulteriormente foi proferido no Supremo Tribunal de Justiça o seguinte despacho:« Para poder ser admitida a revista excecional, com fundamento em contradição jurisprudencial, tem o recorrente, no requerimento de interposição do recurso, que invocar, nos termos do art. 637.º/2 do CPC, a contradição jurisprudencial motivadora da revista excecional e que juntar cópia do acórdão-fundamento (da Relação ou do STJ) anteriormente transitado em julgado (cfr. art. 672.º/1/c) do CPC), porém, o recorrente não procede a tal junção, pelo que – em linha com o entendimento do TC sobre a inconstitucionalidade da “imediata rejeição” sancionada pelo art. 637.º/2 do CPC para a não junção de cópia do acórdão-fundamento – deve o recorrente, no prazo de 10 dias, proceder à junção de certidão do acórdão-fundamento invocado, com nota de trânsito (por o seu trânsito ser um pressuposto de admissibilidade da revista), sob pena de, não o fazendo, a revista excecional não poder ser, com fundamento em contradição jurisprudencial, admitida.

Notifique.».


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Seguidamente foi proferido o seguinte acórdão no Supremo Tribunal de Justiça:« Acordam, na Formação, no Supremo Tribunal de Justiça

I – Relatório

O Autor – AA – demandou, em ação declarativa de condenação com forma de processo comum, a Ré – A... Unipessoal Lda..

Alegou, em resumo, ser senhorio da Ré desde 01/01/2009, mercê da celebração de contrato de arrendamento para fins não habitacionais, sendo que, em 2019, foi feito novo contrato de arrendamento pelo período de cinco anos, pretendendo o A. pôr fim a tal contrato de arrendamento, no final do mesmo, em 31 de Dezembro de 2023, ao que a Ré se opõe, alegando que o A. não se pode opor à renovação do contrato até 2028. E pede o A. que se reconheça que a norma do art. 1110.º/4 do C. Civil, redigida em 2019, não se aplica ao presente contrato, ou por esta não ter a capacidade de modificar relações já constituídas, ou por não produzir os efeitos pretendidos pela Ré.

A Ré contestou e em reconvenção pediu que seja reconhecido o direito a uma indemnização pelas benfeitorias realizadas no imóvel, no montante de 114,348,28 €.

Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que decidiu julgar improcedente a ação e absolver a Ré dos pedidos, declarando-se prejudicado o conhecimento da reconvenção.

O A. apelou e a Relação decidiu:

“Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação parcialmente procedente, revogando-se parcialmente a decisão recorrida, com a consequente não admissão do pedido reconvencional e condenando-se o autor no pagamento das custas na proporção de 11,60%, e a ré no valor de 88,4%. No mais, mantém-se a decisão recorrida.”

Vem agora o A. interpor recurso de revista excecional de tal acórdão do Tribunal da Relação do Porto.

No seu requerimento de recurso, para fundamentar a revista excecional, o recorrente começa por indicar todas as alíneas do n.º 2 do art. 672.º do CPC.

Contudo, o que ressalta evidente das alegações e conclusões recursórias é que o recorrente fundamenta o presente meio impugnatório excecional na existência de contradição jurisprudencial1 entre o acórdão recorrido e o acórdão proferido por este Supremo Tribunal de Justiça a 11-01-2024, no âmbito do processo n.º 1085/22.4YLPRT.P1.S1 (que confirmou o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido no mesmo processo a 8-05-2023), quanto à questão fundamental de direito de saber se a declaração de oposição à renovação por parte do senhorio pode ter lugar antes de terminado o prazo mínimo de vigência do contrato de arrendamento para fins não habitacionais, tendo em vista produzir efeitos na data em que, sem a oposição, o contrato se renovaria.


*

A ré não apresentou contra-alegações.

*

O Exmo. Senhor Juiz Conselheiro relator entendeu encontrar-se verificada a dupla conformidade decisória a que alude o n.º 3 do art. 671.º do CPC obstativa da interposição do recurso de revista dita normal, ordenando, neste conspecto, a remessa do recurso interposto pelo A. à Formação, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 672.º. n.º 3 do CPC.

*

II – Do recurso de revista excecional

II – A – Dos requisitos formais de admissibilidade do recurso

Segundo o que dispõe o n.º 2 do art. 672.º do CPC, o recorrente deve indicar, na sua alegação, sob pena de rejeição, (i) as razões pelas quais a apreciação da questão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito; (ii) as razões pelas quais os interesses são de particular relevância social; (iii) os aspetos de identidade que determinam a contradição alegada, juntando cópia do acórdão-fundamento com o qual o acórdão recorrido se encontra em oposição.

1 Ainda que se considerasse também invocadas as als. a) e b) do n.º 2 do art. 672.º do CPC, certo é que teríamos sempre de concluir pelo não cumprimento dos ónus adjetivos, verdadeiros pressupostos processuais de admissibilidade da revista excecional, exigidos pelos respetivos preceitos legais.

A Formação tem-se pronunciado de modo consistente, nas suas sucessivas composições, no sentido de que a lei configura com especial exigência os pressupostos da revista excecional, não sendo admissível suprir as insuficiências das alegações apresentadas ou dirigir um convite ao aperfeiçoamento destinado a colmatar défices de alegação no que respeita aos fundamentos específicos deste meio impugnatório excecional.

O recorrente cumpriu o ónus adjetivo que lhe incumbia quanto à oposição jurisprudencial alegada. Com efeito, ainda que através da transcrição dos excertos dos acórdãos em confronto, logrou o recorrente identificar os aspetos gerais de identidade fáctico-normativa entre aqueles dois arestos.

II – B – Da contradição de julgados

Dispõe o art. 672.º, n.º 1, al. c), do CPC que “excecionalmente, cabe recurso de revista do acórdão da Relação referido no n.º 3 do artigo anterior quando: c) o acórdão da Relação esteja em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido por qualquer Relação ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme.”.

Existe, assim, oposição de julgados se se verificar:

identidade da questão de direito sobre que incidiram os acórdãos em confronto;

identidade dos núcleos factuais em confronto;

identidade da oposição emergente de decisões expressas e não apenas implícitas;

oposição com reflexos no sentido da decisão tomada.

Invoca o recorrente existência de contradição jurisprudencial entre o acórdão recorrido e o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça a 11-01-2024, no âmbito do processo n.º 1085/22.4YLPRT.P1.S1 (que confirmou o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido no mesmo processo a 8-05-2023), quanto à questão fundamental de direito de saber se a declaração de oposição à renovação por parte do senhorio pode ter lugar antes de terminado o prazo mínimo de vigência do contrato de arrendamento para fins não habitacionais, tendo em vista produzir efeitos na data em que, sem a oposição, o contrato se renovaria.

A questão de direito assim enunciada é objeto de apreciação em ambos os arestos em confronto, sendo que, no caso em apreço e como se lê no acórdão recorrido existiu integral adesão à fundamentação da sentença recorrida na parte em que julgou não ser válida a oposição à renovação em causa nos autos, por entender que o art. 1110.º, n.º 4 do CC – que dispõe que “nos cinco primeiros anos após o início do contrato, independentemente do prazo estipulado, o senhorio não pode opor-se à renovação” – o não permite.

Por sua vez, no acórdão fundamento, e como aí se lê, foi considerado que “se, em tese geral, seria de atribuir relevância à diferença entre a redacção do n.º 4 do art. 1110.º («Nos cinco primeiros anos após o início do contrato, independentemente do prazo estipulado, o senhorio não pode opor-se à renovação») e a do n.º 3 do art. 1097.º («A oposição à primeira renovação do contrato, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data (...)»), o resultado, a nosso ver ilógico, resultante da atribuição de relevância a tal diferença de redação – transformando um prazo de vigência contratual de cinco anos, acordado entre as partes e correspondente ao prazo de renovação supletivo mínimo previsto no n.º 3 do art. 1110.º, num prazo mínimo de vigência (para o senhorio) de dez anos –, leva-nos a ser favoráveis a que ambas as normas sejam interpretadas em sentido equivalente.”.

Acrescenta o acórdão fundamento, citando, que “ainda que o intérprete deva, na fixação do sentido da lei, presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, cremos que o objetivo do legislador terá sido tão-só o de garantir um prazo de duração efetiva de cinco anos. Por isso, atendendo à ‘ratio’ da norma, admitimos que ao senhorio deve ser permitido opor-se à renovação de um contrato celebrado pelo prazo inicial de cinco anos. De outro modo, dar-se-ia o resultado absurdo de o senhorio só poder terminar o contrato no seu décimo ano de duração.”.

Neste contexto, o acórdão fundamento invocado propugna o entendimento de que o art. 1110.º, n.º 4 do CC não pretendeu impedir que, durante os primeiros cinco anos de duração do contrato de arrendamento para fins não habitacionais, o senhorio não pudesse exercer o seu direito de oposição à renovação, mas tão só garantir o diferimento dos efeitos da primeira oposição à renovação, ou seja, garantir que o contrato de arrendamento dure, pelo menos, 5 anos.

Verifica-se, pois, entre os acórdãos em cotejo, dois pronunciamentos divergentes quanto à questão essencial de saber de que forma opera a declaração de oposição à renovação do contrato de arrendamento para fins não habitacionais, tendo por base um quadro factual idêntico, já que em ambos os arestos está em causa a vigência de um contrato de arrendamento para fins não habitacionais celebrado pelo período de cinco anos e a existência de uma declaração de oposição à renovação por parte do senhorio em momento anterior ao termo do período inicial do contrato.

E enquanto o acórdão recorrido, parte de uma interpretação literal do art. 1110.º, n.º 4 do CC, asseverando estar vedado ao senhorio opor-se à renovação do contrato de arrendamento nos primeiros cinco anos (o que, na prática, implicará a renovação do contrato por mais cinco anos), o acórdão fundamento interpreta aquele normativo no sentido de que é válida a declaração de oposição à renovação efetuada pelo senhorio antes dos primeiros cinco anos, desde que a produção de efeitos dessa declaração ocorra no fim do quinto ano de duração do contrato.

Sendo de afirmar uma identidade fáctico-normativa entre os dois arestos em cotejo conducente a resultados decisórios antagónicos quanto à mesma questão fundamental de direito, resta concluir que se encontra verificada a contradição jurisprudencial pressuposta pela norma constante da alínea c) do n.º 1 do art. 672.º do CPC


*


III. Decisão

Pelo exposto, face à oposição de julgados quanto à identificada questão respeitante à interpretação/aplicação do art. 1110.º/4 do C. Civil, admite-se a revista excecional, restrita, já se vê, a tal identificada questão.

Notifique…».


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Seguidamente o Supremo Tribunal de Justiça proferiu o seguinte acórdão:«… Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

I – RELATÓRIO

1.1.- O Autor – AA – instaurou acção declarativa, com forma de processo comum, contra a Ré– A... Unipessoal Lda.

Alegou, em síntese:

O Autor (senhorio) e a Ré (arrendatária) celebraram em 25 de Abril de 2009, contrato de arrendamento para fins não habitacionais, que tem vindo a ser sucessivamente renovado, tendo por objecto o prédio com a matriz predial ...14 no concelho ..., união de freguesias ..., ... e ... - fração autónoma designada por Lote nº..., correspondente a parte do terreno para construção urbana (actualmente serviços) com 1410 m2 em ....

Em 2019 foi feito novo contrato de arrendamento pelo período de cinco anos.

O Autor pretende pôr fim ao contrato de arrendamento, no final do prazo deste, a 31 de Dezembro de 2023. No entanto, a Ré a tal se opõe, alegando que o Autor não se pode opor à renovação do contrato até 2028, o que não corresponde ao que vem previsto na lei.

Pediu que seja reconhecido:

a) O prazo de 5 anos do contrato de arrendamento para fins não habitacionais;

b) Que a norma redigida em 2019 (Artº 1110, nº4) não se aplica ao presente contrato por esta não ter a capacidade de modificar relações já constituídas, ou ainda que se entenda que se aplica, não produz os efeitos pretendidos pela Ré;

c) O direito ao A. de se opor à renovação do contrato de arrendamento com antecedência mínima de 120 dias antes do termo deste (31 de Dezembro de 2023);

d) O direito do A. em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias.

1.2.- A Ré contestou, concluindo pela improcedência da acção e pela condenação do Autor como litigante de má-fé, e em reconvenção pediu que seja reconhecido o direito de Ré reclamar uma indemnização pelas benfeitorias realizadas no imóvel, no montante de €114,348,28.

1.3. - Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que decidiu julgar improcedente a ação e absolver a Ré dos pedidos, declarando-se prejudicado o conhecimento da reconvenção.

1.4. - O Autor apelou e a Relação decidiu:

“Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação parcialmente procedente, revogando-se parcialmente a decisão recorrida, com a consequente não admissão do pedido reconvencional e condenando-se o autor no pagamento das custas na proporção de 11,60%, e a ré no valor de 88,4%. No mais, mantém-se a decisão recorrida.”

1.4. – O Autor recorreu de revista excepcional (admitida por acórdão de 19-6- 2024), com as seguintes conclusões:

“(…)

4. O A. celebrou em 2019 contrato de arrendamento para fins não habitacionais, portanto regulado, na parte que lhe compete, pelo art.º 1110 do Código Civil.

5. Quando o A. avisou a Ré de que se iria opor à renovação do contrato de arrendamento, a Ré disse entender que não o podia fazer, por motivo do disposto no art.º 1110 do Código Civil, que determina que nos primeiros 5 anos de arrendamento o senhorio não se pode opor à renovação do contrato, estando esta prevista.

6. Interpretação com a qual o A. não concordou, pelo que submeteu a causa a juízo, através de ação de simples apreciação.

7. Em primeira instância, apesar de conhecer da dualidade das posições em causa, o Tribunal optou por seguir a corrente de pensamento que não permitia ao A. opor-se à renovação, decisão que mereceu a discordância do A.

8. Apelado, o Tribunal da Relação do Porto, apesar de também conhecer da dualidade de correntes, aderiu à fundamentação da sentença.

9. No entanto, o A. quando submeteu a causa a juízo fê-lo convicto da sua argumentação e tese que expôs fundamentadamente no seu pedido.

10. Por momento da prolação da sentença, em agosto de 2023, o A. seguia já de perto o proc.º 1085/22.4YLPRT.P1, que em quase tudo se assemelha ao seu caso, nomeadamente conhecia do Ac. do Tribunal da Relação do Porto, que transportado para o seu caso lhe daria total razão.

11. Quando a sentença do Tribunal de primeira instância não deu a sua pretensão como procedente, é já suportado no Ac. supracitado que apelou, seguro de que o Tribunal da Relação do Porto seguiria o mesmo entendimento que seguiu no Acórdão-fundamento, ao proc.º 1085/22.4YLPRT.P, o que não aconteceu.

12. Tem, agora, palco para submeter a causa ao entendimento do Supremo Tribunal de Justiça, também já suportado no Ac. (que também terá de se considerar Acórdão-fundamento) do Supremo Tribunal de Justiça ao mesmo processo supracitado que dá razão à sua pretensão.

13. A norma do n.º 4 do art.º 1110 do C.C., é de interpretar no sentido de que a declaração de oposição à renovação pode ter lugar antes de terminado o prazo mínimo de vigência do contrato de arrendamento para fins não habitacionais para produzir efeitos na data em que, sem a oposição, o contrato se renovaria, concluindo-se, assim, no caso dos autos, pela validade e eficácia da declaração da locadora de oposição à renovação do contrato de arrendamento celebrado pelo prazo de cinco anos.

14. Pelo dito o Tribunal a quo violou a norma disposta no art.º 1110, número 4, do Código Civil.”

A recorrida apresentou contra-alegações, no sentido da improcedência do recurso.

II - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. – O objecto do recurso

A questão submetida a revista consiste em saber se a declaração de oposição à renovação por parte do senhorio pode ter lugar antes de terminado o prazo mínimo de vigência do contrato de arrendamento para fins não habitacionais (5 anos), tendo em vista produzir efeitos na data em que, sem a oposição, o contrato se renovaria (tese do recorrente ) ou se, pelo contrário, tal declaração de oposição à renovação não pode, de todo, ocorrer nos primeiros 5 anos de vigência do contrato de arrendamento, com a consequente automaticidade da primeira renovação (tese do acórdão recorrido ).

2.2. – Os factos provados

1 – O Autor e a Ré, representada por BB e CC, celebraram a 25 de Abril de 2009 um contrato de arrendamento que tinha por objecto o prédio com a matriz predial ...14 no concelho ..., união de freguesias ..., ... e ... - fração autónoma designada por Lote nº..., correspondente a parte do terreno para construção urbana (actualmente serviços) com 1410 m2 em ....

2 – Este contrato foi objecto de diversas renovações corporizadas em novos contratos e aditamentos.

3 - Em 2018, decorria um contrato, datado de um de Janeiro de 2017, que terminava em 2021.

4 - Nesse contrato a cláusula terceira tinha a seguinte formulação:

“A renda mensal para os anos de 2017 e 2018 é de 550.00 € e para os anos de 2019, 2020 e 2021 é de 600,00 €”

5 – E a cláusula sexta tinha a seguinte formulação:

“Findo o contrato, a fracção arrendada, deverá ser entregue nas mesmas condições em que o recebeu em 1 de Julho de 2009”

6 - A Ré, representada por BB, pediu para que fosse alterada a data do termo da relação contratual para 2024.

7 – Assim, com data de 1 de janeiro de 2019, foi elaborado novo contrato, estabelecendo-se na cláusula segunda que o seu o prazo é de “cinco anos” “com início em 1 de Janeiro de 2019 e termo em 31 de Dezembro de 2023”.

8 - Na cláusula sexta refere-se que no fim do contrato o prédio “deverá ser entregue ao senhorio, nas mesmas condições em que o recebeu nesta data”.

9 - Foi ainda acordado que a renda que estava estipulada em 600 €, no contrato que decorria, fosse reduzida para 500,00 €.

10 – Em momento não concretamente apurado, o Autor comunicou à Ré a intenção de não renovar o contrato de arrendamento.

11 - A ré recebeu do autor o prédio descrito em 1, sem qualquer construção.

12 - Tendo as partes convencionado que a ré procederia ao licenciamento da construção e edificaria o prédio a fim de corresponder às funções de uma lavagem de carros, o que foi efectuado pela Ré.

13- No licenciamento a Ré despendeu as seguintes quantias:

- Projecto de arquitectura, alteração, loteamento e licenciamento – Torre de

Papel – 6.500.40€; - Estradas de Portugal – Legalização da Obra e acessos à EN1 – 499,45 €; - EDP – 209,60 €; - Câmara Municipal ... – Licenças de Construção – 795,34 €.

14 - Na construção, realizada em 2009, a Ré despendeu, pelo menos, as seguintes quantias: - Pavidalle – Obra Civil- 21.000,00 €; - Fossas Residuais – 1100,00 €; - Cobertura e túneis – Boxes – 80.400,00 €.

15 - As obras realizadas no local têm um valor, em novo, de 72.750,00 €, assim distribuído: Pavimentos – 24.750,00 €; Fossa águas residuais – 1.500,00 €; Separação de hidrocarbonetos – 750,00 €; Cobertura lavagem – 25.000,00 €; Cobertura aspiração – 16.000,00 €; Rede de alimentação de água – 1.500,00 €; Rede de drenagem de águas residuais – 2.500,00 €; Iluminação – 750,00 €.

16 - Atendendo a depreciação sofrida em função da idade e do estado de conservação essas obras têm, actualmente, um valor de 38.000,00 €, assim distribuída: Pavimentos – 12.375,00 €; Fossa águas residuais – 1.050,00 €; Separação de hidrocarbonetos – 525,00 €; Cobertura lavagem – 12.500,00 €; Cobertura aspiração – 8.000,00 €; Rede de alimentação de água – 1.125,00 €; Rede de drenagem de águas residuais – 1.875,00 €; Iluminação – 562,00 €.

2.3. – Os factos não provados

a) Na renovação do contrato referida em 7 as partes acordassem, mercê da redução da renda e do alargamento do prazo de arrendamento referidos em 7 e 9, que as benfeitorias efectuadas, ficassem, sem pagamento de qualquer indemnização, como parte do locado

b) O motivo da realização de um novo contrato em janeiro de 2019 se prendesse com o facto de em 2017 o representante da ré, Sr. BB, ter intenção de comprar a quota ao seu anterior sócio, considerando que tal negócio só seria viável se conseguisse garantir junto do Autor a renovação do contrato de arrendamento do estabelecimento.

c) Quando no início de 2018 se apercebesse que o filho do Autor, Sr. DD, iria abrir um negócio semelhante, o representante da Ré sentisse uma enorme revolta,

d) Disto deu conta ao Autor, dizendo-lhe ainda que o iria denunciar às finanças por todos estes anos que andava a passar recibos de valor inferior ao que efetivamente recebia, tanto quanto à Ré, como quanto aos outros inquilinos.

e) O Autor, em consequência destas afirmações oferecesse um novo contrato à Ré, com o valor que efetivamente a ré paga, isto é 500 €,

f) Fosse nessa sequência que fosse alterada, em relação ao contrato anterior, a clausula sexta.

g) A Ré tenha gasto 2000,00 € no jardim, 896,27 € num separador de hidrocarbonetos, 547,20 na bomba e fossa de águas residuais e 400,00 € na Baixada BT.

h) A Ré tenha gasto 2150,00 € na vedação do imóvel.

2.4. - Problematiza-se no recurso a interpretação do art.1110 nº4 CC e a questão de saber se a declaração de oposição à renovação por parte do senhorio pode ter lugar antes de terminado o prazo mínimo de vigência do contrato de arrendamento para fins não habitacionais (5 anos), tendo em vista produzir efeitos na data em que, sem a oposição, o contrato se renovaria ou se, pelo contrário, tal declaração de oposição à renovação não pode, de todo, ocorrer nos primeiros 5 anos de vigência do contrato de arrendamento, com a consequente automaticidade da primeira renovação.

O acórdão recorrido, aderindo à fundamentação da sentença, considerou que o 1110 n.º 4 do CC não permite a renovação nos primeiros cinco anos de vigência do contrato.

Por sua vez, no acórdão fundamento entendeu-se posição contrária, argumentando-se “se, em tese geral, seria de atribuir relevância à diferença entre a redacção do n.º 4 do art. 1110.º («Nos cinco primeiros anos após o início do contrato, independentemente do prazo estipulado, o senhorio não pode opor-se à renovação») e a do n.º 3 do art. 1097.º («A oposição à primeira renovação do contrato, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data (...)»), o resultado, a nosso ver ilógico, resultante da atribuição de relevância a tal diferença de redação – transformando um prazo de vigência contratual de cinco anos, acordado entre as partes e correspondente ao prazo de renovação supletivo mínimo previsto no n.º 3 do art. 1110.º, num prazo mínimo de vigência (para o senhorio) de dez anos –, leva-nos a ser favoráveis a que ambas as normas sejam interpretadas em sentido equivalente.

“Por isso, atendendo à ‘ratio’ da norma, admitimos que ao senhorio deve ser permitido opor-se à renovação de um contrato celebrado pelo prazo inicial de cinco anos. De outro modo, dar-se-ia o resultado absurdo de o senhorio só poder terminar o contrato no seu décimo ano de duração.”.

Neste contexto, o acórdão fundamento propugna o entendimento de que o art. 1110.º, n.º 4 do CC não pretendeu impedir que, durante os primeiros cinco anos de duração do contrato de arrendamento para fins não habitacionais, o senhorio não pudesse exercer o seu direito de oposição à renovação, mas tão só garantir o diferimento dos efeitos da primeira oposição à renovação, ou seja, garantir que o contrato de arrendamento dure, pelo menos, 5 anos.

Comprova-se que entre as partes foi celebrado um contrato de arrendamento para fins não habitacionais, por meio do qual o autor cedeu à ré o gozo do prédio com a matriz predial ...14 no concelho ..., união de freguesias ..., ... e ... - fração autónoma designada por Lote nº..., correspondente a parte do terreno para construção urbana (actualmente serviços) com 1410 m2 em ....

Não se presta, igualmente, a discussão a conclusão a que chegaram as instâncias de que o contrato de arrendamento dos autos tem uma duração de 5 anos, sendo renovável por períodos de igual duração, por força do disposto no art. 1110.º, n.º 3, do CC.

Por fim, não se discute, outrossim, a conclusão a que chegaram as instâncias de que a nova redação do n.º 4 do art. 1110.º do CC tem plena aplicação ao caso dos autos.

O recorrente impugna a decisão da Relação apenas na parte em que se concluiu que “consideramos que face ao teor deste normativo que nos 5 primeiros anos o senhorio não se pode opor à renovação. Pelo que, se o contrato tiver um prazo de duração igual ou inferior a 5 anos, até ao fim dele não é possível uma oposição à renovação e, por isso, o contrato, até ao fim desses 5 anos, renovou-se.

Pelo que, antes desta renovação não é possível a oposição à mesma.” Está, assim, em causa a interpretação e aplicação da norma contida no n.º 4 do art. 1110.º do CC (introduzida pela Lei n.º 13/2019, de 12-02).

Dispõe o art. 1110.º do CC que “1 - As regras relativas à duração, denúncia e oposição à renovação dos contratos de arrendamento para fins não habitacionais são livremente estabelecidas pelas partes, aplicando-se, na falta de estipulação, o disposto quanto ao arrendamento para habitação, sem prejuízo do disposto no presente artigo e no seguinte. 2 - Na falta de estipulação, o contrato considera-se celebrado com prazo certo, pelo período de cinco anos, não podendo o arrendatário denunciá-lo com antecedência inferior a um ano. 3 - Salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado por prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração ou de cinco anos se esta for inferior, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 1096.º. 4 - Nos cinco primeiros anos após o início do contrato, independentemente do prazo estipulado, o senhorio não pode opor-se à renovação.”.

Trata-se de uma norma cuja aplicação se restringe aos contratos de arrendamento para fins não habitacionais, como é o contrato dos autos.

A nova redacção do art.1110 CC foi dada pela Lei n.º 13/2019, de 12-02, cujo objetivo declarado foi o de estabelecer medidas destinadas a corrigir situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios, a reforçar a segurança e a estabilidade do arrendamento urbano e a proteger arrendatários em situação de especial fragilidade.

Neste quadro, as alterações legislativas introduzidas deixaram a descoberto uma clara intenção de intervir ao nível da duração dos contratos, seja com a introdução de prazos mínimos de duração dos contratos de arrendamento (cf. art. 1095.º do CC), seja na introdução de períodos de renovação mínimos (cf. arts. 1096.º, n.º 1, 1097.º, n.º 3, e 1110.º, n.ºs 3 e 4, todos do CC).

Ora, se o objetivo do legislador se afigura claro, o mesmo não se pode afirmar quanto à aplicação das normas em análise que tem vindo a suscitar dúvidas interpretativas, de que é exemplo a questão em análise nos autos. Efetivamente, do cotejo das normas a que se fez referência, resulta a dúvida interpretativa de saber qual o prazo mínimo de vigência inicial do contrato e das respetivas renovações e qual a data de produção de efeitos da declaração de oposição à renovação.

Como adverte Jéssica Rodrigues Ferreira, “não se compreende se o direito de oposição só “nasce” findos os cinco anos, como parece resultar da letra do n.º 4 do art.º 1110.º, ou se, pelo contrário, o legislador se limitou a deferir a produção dos efeitos do exercício do direito de oposição à renovação do contrato, quando deduzida pelo senhorio, para o fim do quinto ano de duração do contrato, como parece resultar da redação dada ao n.º 4 do art.º 1097.º, aplicável aos arrendamentos habitacionais, onde se pode ler que “a oposição à primeira renovação do contrato, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data, sem prejuízo do disposto no número seguinte” –(«Análise das principais alterações introduzidas pela Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro, aos regimes da denúncia e oposição à renovação dos contratos de arrendamento urbano para fins não habitacionais», in Revista Electrónica de Direito, Fevereiro 2020, n.º 1, vol. 21, pág. 84.)

Sobre a interpretação do art.1110 nº4 do CC existem-se duas orientações:

a) Uma no sentido propugnado pelo acórdão recorrido, ou seja, que a declaração de oposição à renovação não pode ocorrer nos primeiros 5 anos de vigência do contrato de arrendamento, com a consequente automaticidade da primeira renovação (cf., por exemplo, Ac RL de 29-09-2022 (proc. n.º 1006/21.1T8CSC.L1-2, Rel. Pedro Martins, Ac RL de 27-10-2022 (proc. n.º 12613/21.2T8LSB.L1-6, Rel. Eduardo Petersen Silva, disponíveis em www.dgsi.pt).

Também David Magalhães («Algumas alterações ao regime jurídico do Arrendamento Urbano», in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Vol. XCV, Tomo I, 2019, p. 575) considera que “durante cinco anos em nenhum caso pode o arrendatário ser despejado por mera vontade do senhorio; se nada se convencionar sobre a renovação, a extinção ‘ad nutum’ só será alcançada mediante oposição à segunda renovação que pudesse ocorrer após o primeiro lustro contratual, garantindo-se ao arrendatário o mínimo de dez anos de duração contratual”.

b) – Em sentido contrário – propugnado pelo recorrente – pronunciou-se o Ac RP de 21-11-2023, processo nº 16892/22.0T8PRT.P1, Rel. Anabela Miranda, em www dgsi, e o já citado Ac STJ de 11-01-2024 ao decidir que “a norma do n.º 4 do art. 1110.º do CC, introduzida pela L. n.º 13/2019, de 12.02, é de interpretar no sentido de que a declaração de oposição à renovação pode ter lugar antes de terminado o prazo mínimo de vigência do contrato de arrendamento para fins não habitacionais para produzir efeitos na data em que, sem a oposição, o contrato se renovaria, concluindo-se, assim, no caso dos autos, pela validade e eficácia da declaração da locadora de oposição à renovação do contrato de arrendamento celebrado pelo prazo de cinco anos.” – proc. n.º 1085/22.4YLPRT.P1.S1, Rel. Maria da Graça Trigo, disponível em www.dgsi.pt.

No plano doutrinário, por exemplo, André Mena Hüsgen, deixou escrito que “atendendo à ratio da norma, admitimos que ao senhorio deve ser permitido opor se à renovação de um contrato celebrado pelo prazo inicial de cinco anos. De outro modo, dar-se-ia o resultado absurdo de o senhorio só poder terminar o contrato no seu décimo ano de duração.” - «As novas regras sobre a duração, denúncia e oposição à renovação do arrendamento urbano», in Estudos de Arrendamento Urbano, Vol. I, Universidade Católica Editora, Porto, 2020, p. 97.

Também Jéssica Rodrigues Ferreira considera que “A nosso ver, a solução que melhor se coaduna com o espírito da lei é a última, e que tem suporte na letra do art.º 1097.º, n.º 4. Ou seja, o que se pretende é deferir a produção de efeitos da primeira oposição à renovação deduzida pelo senhorio, de forma a garantir que o contrato de arrendamento habitacional dure pelo menos três/cinco anos, consoante seja habitacional ou não habitacional (salvo se o arrendatário pretender antes disso opor-se à sua renovação ou denunciá-lo) e não impedir que, durante esses três/cinco anos, o senhorio possa exercer o seu direito de oposição à renovação, coartação essa da qual poderia, na prática, resultar uma duração mínima do contrato de arrendamento bastante superior àquela que o legislador quis acautelar e que se reflete, também, nos novos prazos supletivos de duração dos períodos de renovação dos contratos” – Ob. Cit. p. 85.

No mesmo sentido, Edgar Valente para quem “celebrando as partes um contrato de cinco anos, o senhorio poderá opor-se logo à primeira renovação do contrato, uma vez que, no referido exemplo e em observância do disposto no n.º 4, apenas lhe é imposta a manutenção do vínculo pelo período de cinco anos” – Arrendamento Urbano, Comentário às alterações introduzidas ao regime vigente, 1.ª edição, Coimbra, Almedina, p. 48.

Ponderados os argumentos, a melhor interpretação é a já decidida neste Supremo no citado Ac de 11-01-2024, pelas seguintes razões:

Em primeiro lugar, importa salientar que o actual regime legal dos contratos de arrendamento para fins não habitacionais surge ancorado, em primeira linha, no princípio da autonomia privada. Efetivamente, como resulta do disposto no art. 1110.º, n.º 1, do CC, “as regras relativas à duração, denúncia e oposição à renovação dos contratos de arrendamento para fins não habitacionais são livremente estabelecidas pelas partes”.

Neste quadro, não parece verosímil que o legislador tenha querido impor às partes uma solução que foi, voluntariamente, excluída por aquelas. Como é evidente, o reforço da segurança e da estabilidade do arrendamento urbano não é possível fazer-se à custa do que é a vontade das partes no momento da celebração do contrato, a que, como vimos, o legislador atribuiu uma enorme relevância. Ora, se as partes quiseram prever um prazo de duração do contrato de arrendamento de 5 anos renovável, não é possível defender que tal declaração de vontade não tem qualquer aplicação prática face à letra da lei e que, inevitavelmente, tal contrato vigorará por um período de 10 anos.

Depois, muito embora seja notória a diferença de redacção da norma em análise face à redacção do n.º 3 do art. 1097.º do CC é incontornável a ideia de que caso fosse intenção do legislador prever um período de duração mínimo de 10 anos nestes casos, teria, certamente, deixado tal intenção expressa. Se tal não ocorreu foi, simplesmente, porque o legislador não pretendeu adotar essa solução.

É, assim, manifesto que a solução legal fixada em ambas as normas em confronto (arts. 1097.º, n.º 3, e 1110.º, n.º 4, do CC), visou garantir um período de duração mínimo do contrato, prazo que se considerou justificado face ao investimento que, não raras vezes, é realizado no âmbito do arrendamento não habitacional e que corresponde, tudo visto, ao período de duração supletivo previsto pelo legislador.

Note-se que o segmento “independentemente do prazo estipulado” visou apenas abranger os contratos com duração inferior a 5 anos, pretendendo o legislador garantir que tal prazo seria sempre o prazo mínimo de duração do contrato. Foi tão-só este o objetivo do legislador.

Por fim, não deixaria de ser estranho e contrário à tendência que se tem vindo a observar nas sucessivas reformas das leis do arrendamento, que o regime do arrendamento não habitacional se revelasse mais favorável do que o regime do arrendamento habitacional (o que sucederia caso o entendimento do acórdão recorrido fosse aceite).

De resto, caso fosse outro o entendimento, poderíamos estar perante uma solução que, ao contrário da vontade do legislador, estaria a estimular o recurso a contratos de arrendamento não renováveis, inviabilizando a pretendida estabilidade e durabilidade das relações de arrendamento.

Como se afirma no citado Ac STJ de 11-01-2024, “se, em tese geral, seria de atribuir relevância à diferença entre a redacção do n.º 4 do art. 1110.º («Nos cinco primeiros anos após o início do contrato, independentemente do prazo estipulado, o senhorio não pode opor-se à renovação») e a do n.º 3 do art. 1097.º («A oposição à primeira renovação do contrato, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data (...)»), o resultado, a nosso ver ilógico, resultante da atribuição de relevância a tal diferença de redação – transformando um prazo de vigência contratual de cinco anos, acordado entre as partes e correspondente ao prazo de renovação supletivo mínimo previsto no n.º 3 do art. 1110.º, num prazo mínimo de vigência (para o senhorio) de dez anos –, leva-nos a ser favoráveis a que ambas as normas sejam interpretadas em sentido equivalente.

Por isso, atendendo à ‘ratio’ da norma, admitimos que ao senhorio deve ser permitido opor-se à renovação de um contrato celebrado pelo prazo inicial de cinco anos. De outro modo, dar-se-ia o resultado absurdo de o senhorio só poder terminar o contrato no seu décimo ano de duração.”.

Deste modo, conclui-se ser válida e eficaz a declaração de oposição à renovação do contrato feita pelo Autor, e consequentemente o contrato de arrendamento cessou em 31 de Dezembro de 2023.

No entanto, o pedido formulado em d) da petição inicial (reconhecimento do direito autor em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias) não foi objeto de conhecimento por parte das instâncias, na medida em que ficou prejudicado, pois entendeu-se que o contrato não cessara por não ser válida a declaração de oposição à renovação.

Estando, neste caso, vedado ao Supremo os poderes de substituição, em face do art.679 CPC (cf., por ex., Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 6ª ed., pág.483 a 485) o processo deverá baixar à Relação para se pronunciar sobre esse pedido.

2.5.- Síntese conclusiva

A norma do n.º 4 do art. 1110.º do CC, introduzida pela Lei n.º 13/2019, de 12/02, deve ser interpretada no sentido de que a declaração de oposição à renovação pode ter lugar antes de terminado o prazo mínimo de vigência do contrato de arrendamento para fins não habitacionais (5 anos) para produzir efeitos na data em que, sem a oposição, o contrato se renovaria.

III – DECISÃO

Pelo exposto, decidem:

1)

Julgar procedente a revista e revogar o acórdão recorrido, reconhecendo ao Autor o direito de se opor à renovação do contrato de arrendamento com antecedência mínima de 120 dias antes do termo deste (31 de Dezembro de 2023), sendo de 5 anos o prazo do contrato de arrendamento para fins não habitacionais.

2)

Determinar a remessa do processo à Relação para apreciação do pedido formulado em d) (“O direito do A. em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias”).

3)

Condenar a Ré nas custas…».


*

Após foi junto o seguinte requerimento: «… A..., Unipessoal Lda, ré e melhor identificada no processo supra descrito, vem apresentar nos termos do 614º do CPC Pedido de retificação do acórdão Porquanto:

O Autor vem nos presentes autos invocar na sua Petição Inicial que “ Em inícios de 2021, depois do regresso do filho do A. a Portugal, e em vista da hipótese de começar a explorar o prédio em 2024, no fim do contrato de arrendamento, iniciaram-se conversações que anteviam a vontade do Autor não renovar (novamente) o contrato de arrendamento, ao que o representante da demandada arguiu que o contrato seria válido até 2028, sob a epitome de o A. não se poder opor à renovação.” (sublinhado nosso)

Nunca o Autor provou, invocou ou peticionou, ter notificado a Ré da intenção de não renovação do contrato.

Não peticionou o autor o direito a ver reconhecido a denuncia, mas antes sim o direito a exercer a denuncia, tal como expressamente indicou no PI, “Assim, nestes termos, e nos melhores de direito, deve a presente ação ser julgada procedente por provada e ser reconhecido: a) O prazo de 5 anos do contrato de arrendamento para fins não habitacionais.

b) Que a norma redigida em 2019 (Artº 1110, nº4) não se aplica ao presente contrato por esta não ter a capacidade de modificar relações já constituídas, ou ainda que se entenda que se aplica, não produz os efeitos pretendidos pela Ré.

b) O direito ao A. de se opor á renovação do contrato de arrendamento com antecedência mínima de 120 dias antes do termo deste (31 de Dezembro de 2023).

c) O Direito do A. em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias.”

Valor da Causa: 15.000,00€

Prova Documental:

-Contrato de arrendamento celebrado a 1 de janeiro de 2019

-Contrato de arrendamento não habitacional celebrado a 1 de Janeiro de 2017

-Contrato de arrendamento não habitacional celebrado a 25 de Abril de 2009 com respetivos (4) aditamentos.

No ante-ante-penúltimo paragrafo do ponto 2.4 do acordo sub iudice, conclui este tribunal que “Por isso, atendendo à ‘ratio’ da norma, admitimos que ao senhorio deve ser permitido opor-se à renovação de um contrato celebrado pelo prazo inicial de cinco anos.

De outro modo, dar-se-ia o resultado absurdo de o senhorio só poder terminar o contrato no seu décimo ano de duração.”

Se o acórdão ficasse por aqui, apesar de a Ré não partilhar da orientação do tribunal em ir contra a letra da lei, e entender que o legislador não se expressou corretamente, a decisão seria inatacável.

No entanto, continua o acórdão no paragrafo seguinte dizendo que: “Deste modo, conclui-se ser válida e eficaz a declaração de oposição à renovação do contrato feita pelo Autor, e consequentemente o contrato de arrendamento cessou em 31 de Dezembro de 2023.”

Ora, não há qualquer declaração de oposição à renovação do contrato, havendo sim entre mandatários “conversações que anteviam a vontade do Autor não renovar (novamente) o contrato de arrendamento, ao que o representante da demandada arguiu que o contrato seria válido até 2028, sob a epitome de o A. não se poder opor à renovação”

Uma vez que em parágrafos consecutivos este tribunal conclui dois factos distintos e inconciliáveis – Direito do senhorio a opor-se à renovação de um contrato VS declaração válida e eficaz de oposição à renovação do contrato feita pelo Autor (que não existiu, não foi alegada nem tão pouco requerida).

Assim, entende a ré que o Acórdão é ambíguo indo inclusive além do pedido do Autor, consubstanciando nos termos das alíneas d) e) do artigo 615º do CPC uma nulidade, que por mera cautela, desse já se invoca.

Nestes termos e melhores de direito e, salvo melhor opinião, deverá Acórdão sub iudice ser expurgado dos erros indicados e substituído por um outro que vá de encontro ao da realidade jurídica objeto da presente ação e peticionado pelas partes. ..»

Seguidamente foi junto pelo autor o seguinte requerimento: «..AA, id nos autos, antecipando-se a um eventual despacho que convidasse ao exercício do contraditório nos termos do art.º 3/3 do C.P.C. vem, o A., esclarecer o seguinte:

Vem agora a Ré alegar que “nunca o autor provou, invocou ou peticionou, ter notificado a Ré da intenção de não renovação do contrato”, arguindo, inclusivamente, nulidade do Acórdão proferido por ir além do pedido.

Apesar de se reconhecer o esforço da Ré, entende-se que já não vai a tempo de contestar um facto perfeitamente assente na Ordem Jurídica, uma vez que, retomada a decisão proferida nos presentes autos a 04/08/2023 pelo Juízo Central Cível de Aveiro – ..., dá-se como provado, no facto inscrito sob o n.º 10 que “Em momento não concretamente apurado, o Autor comunicou à Ré a intenção de não renovar o contrato de arrendamento.” (sublinhado e negrito nosso), o que é inequívoco e se encontra cristalizado nos autos, uma vez que não foi, tal facto, por parte nem de A. nem de R. objeto de recurso ou contra-alegações.

Mais se recorda, apesar de não ter, pelo menos aparentemente, interesse para estes autos, que o A. tinha até ao dia 31/08/2023 para se opor à renovação do contrato de arrendamento, o que fez, como já se expôs supra e como concedido pela Ré ao não recorrer de tal decisão.

Mesmo que assim se não entendesse, seria idílico considerar que o A. estaria a instaurar uma ação judicial como mero exercício académico, sem que tivesse intenção de exercer o direito que litigou.

A reforma da decisão não é um recurso – nem na modalidade de reapreciação ou reponderação, nem na de reexame (aqueles, ao contrário destes, sem possibilidade de jus novarum), pelo que não pode servir para mera manifestação de discordância do julgado, mas apenas, e sempre perante o juízo decisor – para tentar suprir uma deficiência notória.

Terá, assim, mais a estrutura da reclamação acerca de um erro sobre a previsão, nas suas modalidades de erro na qualificação ou na subsunção, afinal a violação primária da lei que tem de ter como causa um lapso manifesto.

Não se trata de verdadeiro recurso, do qual tem apenas o perfil substancial, mas de maneira de corrigir o que mais não é do que um erro de julgamento.

Terá, contudo, de ser erro resultante de lapso manifesto, quer na determinação da norma, quer na subsunção dos factos, quer na desconsideração de documentos que constem do processo.

O que o reclamante pretende, afinal, é manifestar uma mera discordância do julgado. A ser acolhida esta perspetiva, todas as decisões passariam a ser objeto de pedido de reforma pois, e sempre, a parte vencida (e não convencida, por em desacordo com o decidido) viria alegar que o julgador se enganou manifestamente o que não foi o caso.

Daí que, no modesto entendimento do A. nenhuma razão assista ao reclamante.

Pugna assim pelo indeferimento do pretendido

Pede respeitosamente deferimento…».

Em conferência foi proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça o seguinte Acórdão:«… Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

1.- A Ré– A... Unipessoal Lda., reclamou do acórdão de 15 de Outubro de 2024, com arguição de nulidade.

Alegou, em resumo:

Face ao alegado no art.9 da petição inicial, nunca o Autor provou, invocou ou peticionou, ter notificado a Ré da intenção de não renovação do contrato, nem peticionou o direito a ver reconhecido a denuncia, mas antes sim o direito a exercer a denuncia.

O acórdão reclamado concluiu que “Por isso, atendendo à ‘ratio’ da norma, admitimos que ao senhorio deve ser permitido opor-se à renovação de um contrato celebrado pelo prazo inicial de cinco anos. De outro modo, dar-se-ia o resultado absurdo de o senhorio só poder terminar o contrato no seu décimo ano de duração.”

Se o acórdão ficasse por aqui, apesar de a Ré não partilhar da orientação do expressou corretamente, a decisão seria inatacável. No entanto, continua o acórdão no paragrafo seguinte dizendo que: “Deste modo, conclui-se ser válida e eficaz a declaração de oposição à renovação do contrato feita pelo Autor, e consequentemente o contrato de arrendamento cessou em 31 de Dezembro de 2023”.

Ora, não há qualquer declaração de oposição à renovação do contrato, havendo sim entre mandatários “conversações que anteviam a vontade do Autor não renovar (novamente) o contrato de arrendamento, ao que o representante da demandada arguiu que o contrato seria válido até 2028, sob a epitome de o A. não se poder opor à renovação”.

Uma vez que em parágrafos consecutivos este tribunal conclui dois factos distintos e inconciliáveis – Direito do senhorio a opor-se à renovação de um contrato VS declaração válida e eficaz de oposição à renovação do contrato feita pelo Autor (que não existiu, não foi alegada nem tão pouco requerida).

Assim, entende a ré que o acórdão é ambíguo indo inclusive além do pedido do Autor, consubstanciando nos termos das alíneas d) e) do artigo 615º do CPC uma nulidade, que por mera cautela, desse já se invoca.

2.- O Autor respondeu, opondo-se.

3.- Cumpre decidir em conferência.

Conforme jurisprudência consolidada, as nulidades da sentença ou acórdão consubstanciam erros de actividade ou de construção e não devem ser confundidos com eventuais erros de julgamento, de facto e/ou direito.

O acórdão decidiu no seu ponto 1):

“Julgar procedente a revista e revogar o acórdão recorrido, reconhecendo ao Autor o direito de se opor à renovação do contrato de arrendamento com antecedência mínima de 120 dias antes do termo deste (31 de Dezembro de 2023), sendo de 5 anos o prazo do contrato de arrendamento para fins não habitacionais.”

Não se verifica pronúncia indevida, nem ocorre violação do pedido, porque o tribunal decidiu a questão submetida à sua apreciação, designadamente o pedido formulado c), que seja reconhecido o direito ao A. de se opor à renovação do contrato de arrendamento com antecedência mínima de 120 dias antes do termo deste (31 de Dezembro de 2023).

Note-se, contrariamente ao que alega a reclamante, foi julgado provado que:

“10 – Em momento não concretamente apurado, o Autor comunicou à Ré a intenção de não renovar o contrato de arrendamento.”

Por outro lado, mesmo que assim não fosse, como já há muito ensinava o Prof Alberto dos Reis, não há pronúncia indevida, logo nulidade da sentença ou acórdão, quando o tribunal toma conhecimento de factos de que não podia servir-se por não terem sido alegados pelas partes (Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pág.145 e 146).

Acresce que, contrariamente ao alegado, e com o devido respeito, não se verifica a nulidade prevista no art.615 nº1 c) CPC que apenas se tem por adquirida quando a decisão é ininteligível, conforme orientação deste tribunal. Como se afirma no Ac STJ de 3-5-2023 (proc nº 309/20), em www dgsi – “A ambiguidade ou obscuridade prevista na al. c) do n.º 1 do art. 615.º do CPC só releva quando torne a parte decisória ininteligível e, por outro lado, só torna a parte decisória ininteligível quando um declaratário normal, nos termos dos arts. 236.º, n.º 1, e 238.º, n.º 1, do CC, não possa retirar da decisão um sentido unívoco, mesmo depois de recorrer à fundamentação para a interpretar”.

O acórdão não enferma de ambiguidade, tanto assim que a reclamante revela ter compreendido o sentido da decisão, manifestando a sua discordância, significando que a decisão se mostra inteligível.

4. – Pelo exposto, decidem:

Julgar improcedente a reclamação e manter o acórdão reclamado.

Condenar a Reclamante nas custas…».


*

Em conformidade com o teor do Acórdão que antecede o Supremo Tribunal de Justiça foi decidido o seguinte: «.. III – DECISÃO

Pelo exposto, decidem:

1)

Julgar procedente a revista e revogar o acórdão recorrido, reconhecendo ao Autor o direito de se opor à renovação do contrato de arrendamento com antecedência mínima de 120 dias antes do termo deste (31 de Dezembro de 2023), sendo de 5 anos o prazo do contrato de arrendamento para fins não habitacionais.

2)

Determinar a remessa do processo à Relação para apreciação do pedido formulado em d) (“O direito do A. em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias”).

3)

Condenar a Ré nas custas…».(sic).


*

Face ao teor do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça - «« Determinar a remessa do processo à Relação para apreciação do pedido formulado em d) (“O direito do A. em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias”).»- e dando cumprimento ao determinado nesse Acórdão cumpre ao Tribunal da Relação apreciar o pedido formulado em d) pelo autor em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias”).

Nada obstando ao conhecimento do objecto dos recursos, cumpre decidir.


***

II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos recorrentes, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. arts. 635º, nº 4, 637º, nº 2, 1ª parte e 639º, nºs 1 e 2, todos do Cód. Processo Civil.

Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pelo apelante, e em face ao determinado pelo Supremo Tribunal de Justiça resulta que é o seguinte o ponto a analisar: « O direito do A. em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias”).».

Consigna-se que face ao determinado pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça este é o único objeto do recurso, sendo que o pedido reconvencional não foi admitido atento o teor do acórdão da Relação transitado neste segmento.

III- FUNDAMENTOS DE FACTO

A sentença recorrida fixou a seguinte matéria de facto: «…

III – Fundamentação

Ficaram provados os seguintes factos:

1 – O Autor e a Ré, representada por BB e CC, celebraram a 25 de Abril de 2009 um contrato de arrendamento que tinha por objecto o prédio com a matriz predial ...14 no concelho ..., união de freguesias ..., ... e ... - fração autónoma designada por Lote nº..., correspondente a parte do terreno para construção urbana (actualmente serviços) com 1410 m2 em ....

2 – Este contrato foi objecto de diversas renovações corporizadas em novos contratos e aditamentos.

3 - Em 2018, decorria um contrato, datado de um de Janeiro de 2017, que terminava em 2021.

4 - Nesse contrato a cláusula terceira tinha a seguinte formulação:

“A renda mensal para os anos de 2017 e 2018 é de 550.00 € e para os anos de 2019, 2020 e 2021 é de 600,00 €”

5 – E a cláusula sexta tinha a seguinte formulação:

“Findo o contrato, a fracção arrendada, deverá ser entregue nas mesmas condições em que o recebeu em 1 de Julho de 2009”

6 - A Ré, representada por BB, pediu para que fosse alterada a data do termo da relação contratual para 2024.

7 – Assim, com data de 1 de janeiro de 2019, foi elaborado novo contrato, estabelecendo-se na cláusula segunda que o seu o prazo é de “cinco anos” “com início em 1 de Janeiro de 2019 e termo em 31 de Dezembro de 2023”.

8 - Na cláusula sexta refere-se que no fim do contrato o prédio “deverá ser entregue ao senhorio, nas mesmas condições em que o recebeu nesta data”.

9 - Foi ainda acordado que a renda que estava estipulada em 600 €, no contrato que decorria, fosse reduzida para 500,00 €.

10 – Em momento não concretamente apurado, o Autor comunicou à Ré a intenção de não renovar o contrato de arrendamento.

11 - A ré recebeu do autor o prédio descrito em 1, sem qualquer construção.

12 - Tendo as partes convencionado que a ré procederia ao licenciamento da construção e edificaria o prédio a fim de corresponder às funções de uma lavagem de carros, o que foi efectuado pela Ré.

13- No licenciamento a Ré despendeu as seguintes quantias:

- Projecto de arquitectura, alteração, loteamento e licenciamento – Torre de Papel – 6.500.40€;

- Estradas de Portugal – Legalização da Obra e acessos à EN1 – 499,45 €; - EDP – 209,60 €; - Câmara Municipal ... – Licenças de Construção – 795,34 €.

14 - Na construção, realizada em 2009, a Ré despendeu, pelo menos, as seguintes quantias: - Pavidalle – Obra Civil- 21.000,00 €; - Fossas Residuais – 1100,00 €; - Cobertura e túneis – Boxes – 80.400,00 €.

15 - As obras realizadas no local têm um valor, em novo, de 72.750,00 €, assim distribuído: Pavimentos – 24.750,00 €; Fossa águas residuais – 1.500,00 €; Separação de hidrocarbonetos – 750,00 €; Cobertura lavagem – 25.000,00 €; Cobertura aspiração – 16.000,00 €; Rede de alimentação de água – 1.500,00 €; Rede de drenagem de águas residuais – 2.500,00 €; Iluminação – 750,00 €.

16 - Atendendo a depreciação sofrida em função da idade e do estado de conservação essas obras têm, actualmente, um valor de 38.000,00 €, assim distribuída: Pavimentos – 12.375,00 €; Fossa águas residuais – 1.050,00 €; Separação de hidrocarbonetos – 525,00 €; Cobertura lavagem – 12.500,00 €; Cobertura aspiração – 8.000,00 €; Rede de alimentação de água – 1.125,00 €; Rede de drenagem de águas residuais – 1.875,00 €; Iluminação – 562,00 €.

Não se provou que

a) Na renovação do contrato referida em 7 as partes acordassem, mercê da redução da renda e do alargamento do prazo de arrendamento referidos em 7 e 9, que as benfeitorias efectuadas, ficassem, sem pagamento de qualquer indemnização, como parte do locado

b) O motivo da realização de um novo contrato em janeiro de 2019 se prendesse com o facto de em 2017 o representante da ré, Sr. BB, ter intenção de comprar a quota ao seu anterior sócio, considerando que tal negócio só seria viável se conseguisse garantir junto do Autor a renovação do contrato de arrendamento do estabelecimento.

c) Quando no inicio de 2018 se apercebesse que o filho do Autor, Sr. DD, iria abrir um negocio semelhante, o representante da Ré sentisse uma enorme revolta,

d) Disto deu conta ao Autor, dizendo-lhe ainda que o iria denunciar às finanças por todos estes anos que andava a passar recibos de valor inferior ao que efetivamente recebia, tanto quanto à Ré, como quanto aos outros inquilinos.

e) O Autor, em consequência destas afirmações oferecesse um novo contrato à Ré, com o valor que efetivamente a ré paga, isto é 500 €,

f) Fosse nessa sequência que fosse alterada, em relação ao contrato anterior, a clausula sexta.

g) A Ré tenha gasto 2000,00 € no jardim, 896,27 € num separador de hidrocarbonetos, 547,20 na bomba e fossa de águas residuais e 400,00 € na Baixada BT.

h) A Ré tenha gasto 2150,00 € na vedação do imóvel…»


***

IV - FUNDAMENTOS DE DIREITO

Dando-se cumprimento ao determinado no referido Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, cumpre apreciar o pedido formulado em d) pelo autor em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias”).

O autor intentou acção declarativa de condenação em processo comum contra A... Unipessoal Lda, alegando em resumo que: O Autor é senhorio da Ré desde 2009, mercê da celebração de contrato de arrendamento que tem vindo a ser sucessivamente renovado.

Em 2019 foi feito novo contrato de arrendamento pelo período de cinco anos.

O Autor pretende pôr fim ao contrato de arrendamento, no final do prazo deste, a 31 de

Dezembro de 2023.

No entanto, a Ré a tal se opõe, alegando que o Autor não se pode opor à renovação do contrato até 2028, o que não corresponde ao que vem previsto na lei.

Conclui pedindo que a acção seja julgada procedente por provada e, consequentemente, ser reconhecido:

a) O prazo de 5 anos do contrato de arrendamento para fins não habitacionais.

b) Que a norma redigida em 2019 (Artº 1110, nº4) não se aplica ao presente contrato por esta não ter a capacidade de modificar relações já constituídas, ou ainda que se entenda que se aplica, não produz os efeitos pretendidos pela Ré.

c) O direito ao A. de se opor á renovação do contrato de arrendamento com antecedência mínima de 120 dias antes do termo deste (31 de Dezembro de 2023).

d) O Direito do A. em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias.

Verifica-se que por Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça foi proferida decisão quanto a todos os pedidos formulados pelo autor á excepção do pedido da alínea d), sendo este o único segmento do recurso a decidir.

Tendo o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça determinado ter sido válida e eficaz a declaração de oposição à renovação do contrato feita pelo Autor, e consequentemente o contrato de arrendamento cessou em 31 de Dezembro de 2023, assiste o direito ao autor o direito de exigir a restituição do prédio ou locado como o mesmo se encontrava á data da celebração do contrato vigente (Janeiro de 20219) com as respetivas benfeitoras.

Tal resulta do teor da clausula sexta (refere-se que no fim do contrato o prédio “deverá ser entregue ao senhorio, nas mesmas condições em que o recebeu nesta data”).

Consigna-se que o direito do autor, é sem prejuízo da eventual futura e hipotética apreciação, do direito da ré atinente ao valor de eventuais benfeitorias (sendo que no caso destes autos o pedido reconvencional não foi admitido).


***

 

V- DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação procedente e, em conformidade, revoga-se a sentença recorrida e, em substituição da mesma, julga-se procedente o direito do autor em receber o prédio como se encontrava à data da celebração do contrato vigente (1 de Janeiro de 2019), com as respetivas benfeitorias.

Custas a cargo da ré.

Porto, 2025/5/8.

Ana Vieira

Isabel Rebelo Ferreira

Judite Pires

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[1] Diploma a atender sempre que se citar disposição legal sem menção de origem.