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COMPRA E VENDA DE COISA DEFEITUOSA
RESOLUÇÃO
INDEMNIZAÇÃO PELO INTERESSE CONTRATUAL POSITIVO
CADUCIDADE
Sumário
(da responsabilidade da Relatora) I - O que está em causa na presente acção é a compra pela Autora de uma coisa defeituosa, i.e. que sofria de vício que impedia a realização do fim a que era destinada e que não tinha as qualidades essenciais asseguradas pelo vendedor e necessárias para a realização deste fim, e não um contrato de empreitada, e muito menos de empreitada de construção, modificação ou reparação de imóvel como parece sugerir a Recorrente em sede de conclusões de recurso sem qualquer respaldo nos factos que alegou no âmbito do seu articulado de petição inicial. II - A circunstância da Recorrente pretender a resolução do contrato de compra e venda que celebrou com a Ré e simultaneamente uma indemnização pelo interesse contratual positivo não afasta a aplicação ao caso em análise do prazo de caducidade previsto no artigo 917º, nº 1, do C. Civil. III- Pelo contrário, tem sido entendimento consolidado da jurisprudência que “o prazo de caducidade do art.º 917º do C. Civil é aplicável não apenas ao direito de anulação do contrato, mas também aos demais direitos legalmente conferidos ao adquirente de coisa defeituosa”.
Texto Integral
Acordam os Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:
I – RELATÓRIO
M., identificada nos autos, instaurou acção declarativa de condenação com processo comum contra CTEL, Companhia de Tecnologias de Empresa, Unipessoal, Lda., identificada nos autos, pedindo que a Ré seja condenada a:
1 – A devolver à Autora, o valor do capital de compra da referida UPS no valor de 3.690,00€, com IVA, que foi pago pela Autora à Ré em 02-03-2022.
2 – A desinstalar, recolher a UPS objecto destes autos, deixando as instalações dos escritórios da Autora, no estado em que se encontravam antes da instalação, ligação.
3 – A determinar pelo Mmo. Juiz, um valor, a ressarcir a Autora, a pagar pela Ré, por cada dia, pela ocupação, guarda, depósito, que a UPS causa no escritório, sem utilidade desde a data de 15 de Março de 2022, até à data que a Ré realize a sua recolha,
nunca menos de 50.00€/mês., ou seja, nesta data 550,00€, com IVA o valor de 676,5€.
4- Indemnizar pelo valor do juro de 3.690,00€ à taxa comercial, a contar de 02-03-2022, até completo pagamento, nesta data a indemnização, no valor de 277,56€.
5 – Indemnizar pelo valor do juro, à taxa comercial, no mínimo oportunamente a corrigir, face ao valor das obras realizadas no piso «0» que ascenderam a 100.000,00€ privando a Autora do seu uso e exploração, até completo pagamento, nesta data a indemnização no valor de 7.521,92€.
Para tanto alegou, em síntese, que contratou com a Ré o fornecimento por esta de uma UPS de 10 KVA, pelo preço de € 3690,00, que pagou na totalidade.
Mais alegou que a 25 e 28 de Março de 2022 denunciou à Ré os defeitos da UPS fornecida pela mesma, a saber, o excessivo ruído, o excessivo consumo de energia e a “avaria n.º 45” (inversor desligado), fixando o prazo de 1 de Abril de 2022 para a Ré resolver os defeitos sob pena de resolução do contrato e de reclamar da mesma indemnização pelos prejuízos causados.
Por último alegou que a Ré, até ao presente, nada reparou, nada substituiu, nem veio desinstalar, desligar, recolher a UPS, nem devolver o valor pago e encargos com a UPS.
A Ré contestou, por impugnação e arguindo a caducidade do direito da Autora propor a presente acção.
Foi proferida sentença que julgou procedente a arguida excepção peremptória de casducidade, absolvendo a Ré do pedido.
Inconformada com a decisão a Autora veio interpor recurso, apresentando as seguintes conclusões, que se transcrevem: A. Está em causa um negócio jurídico que teve como finalidade, ser escolhido pela Ré, Recorrida, face à utilidade, finalidade que a Autora, Recorrente pretendia, uma UPS a ser construída ou fornecida e instalada como parte integrante do imóvel e a receber energia eléctrica através da rede eléctrica do imóvel e depois, alimentar a rede eléctrica de UPS existente para o efeito, e assim permitir fornecer energia eléctrica na rede eléctrica de UPS do imóvel destinado a escritórios, B. UPS a se fazer integrar em circuitos de sistemas de abertura de emergência de grades metálicas em caso de corte de energia e de fogo assim como alimentar os sistemas de detenção de alarme de incêndio e de CCTV e de intrusão e de abertura e fecho de portas automáticas e ainda para manter ligados e fazer guardar documentos que estivessem a ser trabalhados nos computadores e servidores e ainda para proteger os equipamentos, sistemas dos picos de intensidade da corrente eléctrica e consequentemente também fazer poupança de energia eléctrica. C. A Ré, Recorrida, que é a empreiteira, fornecedora do serviço, vendedora, publica nas redes sociais que os seus negócios de fornecimento de UPS, são do tipo Chave na Mão e dão a garantia de um ano de bom funcionamento e ainda depois deste prazo fornecem o serviço de manutenção/reparação. D. A Ré, Recorrida, visitou previamente o imóvel da Autora, Recorrente, as instalações, rede, circuitos eléctricos e fez os cálculos para a UPS necessária e foi a Ré que tudo realizou desde a escolha, fabricação ou aquisição da UPS até à montagem, ligação da UPS à rede do imóvel. E. Ocorreram contactos preliminares e de informação, desde 21 de Agosto de 2021 a 2 de Março de 2022, data que foi paga a integralidade do preço pela Autora, Recorrente, no valor de 3.690,00€, seguia-se a 15 de Março de 2022, a montagem da UPS pela Ré, Recorrida a qual informou pelo seu técnico que o barulho que a mesma fazia era apenas enquanto inicialmente carregava as baterias, F. Em 18 de Março a Autora, Recorrente interpela a Ré, e também em 25 de Março de 2022, foi outra vez a Ré, Recorrida interpelada para em 10 dias a Ré reparar a UPS (barulho excessivo, problemas no inversor, consumos excessivos, não funcionamento da UPS) e se não reparasse o negócio considerava-se resolvido, seguindo-se e-mail e carta registada de 28 de Março de 2022, para a Ré reparar até dia 1 de Abril de 2022, e caso não reparasse considera-se como resolvido o contrato, e a Ré informa em 01 de Abril para a Autora resolver judicialmente o assunto e a Ré mantém inserida a UPS no local, não a reparou e nada quer indemnizar, pagar à Autora, Recorrente. G. A acção foi interposta a 08 de Março de 2023 e a sentença a quo decidiu ter ocorrido a caducidade da acção, mas a Autora, Recorrente fundamenta, que não ocorreu a caducidade, nomeadamente pelos seguintes motivos: a) A UPS instalada no imóvel, é coisa integrante e não é parte componente e segue os direitos aplicáveis às coisas imóveis (art.ºs 204.º/3, 210.º, 204.º/2 e ainda conjugar art.º 204.º/3 com 691.º/2/3 do CC e ainda art.º 204.º/3 com art.º 1421/1 al. d) e e) e 1225/2 do CC). b) A obra foi inadequada, não funcional ao fim a que se destinava (art.ºs 436/1/2, 1222/1 e 1225/3 do CC) c) O contrato celebrado foi de obrigação de resultado, cujo ónus da prova é da Ré, presumindo-se a culpa da Ré, Recorrida (art.ºs 342/2 e 799 do CC) e a Autora, Recorrente não excluiu antecipadamente os seus direitos (art.º 809.º do CC) d) A Autora, Recorrente, face ao prazo peremptório e consequência do não cumprimento sob condição de ser resolvido o contrato, a Autora, Recorrente goza do beneficio do prazo (art.º 777.º/1, 779, 808.º/1, 799.º/2 do CC) e estamos perante o não cumprimento de obrigações. e) A opção da Autora, Recorrente ter dado à Ré, Recorrida em cumprir ou não cumprir, é uma obrigação alternativva, pelo que face às interpelações e citação, coube à Autora, Recorrente o direito de escolha que foi o da resolução e indemnização (art.ºs 548.º, 549.º, 542 CC). f) Ocorreu dolo da Ré, Recorrida antes da entrega/instalação da UPS em perfeição o que equivale à não entrega, pelo que não se aplica o regime dos vícios redibitórios e tendo ocorrido resolução por declaração da Autora, Recorrente (art.º 436.º /1 e 224.º /1 do CC) não faz caducar o direito de resolução nem de indemnização da Autora, Recorrente. g) Que face ao comportamento inadmissível da Ré, Recorrida em apenas querer ficar com o dinheiro pago e não cumprir a obrigação de resultado (art.º 227.º do CC) e manter-se a causar danos, a Autora, Recorrente tem direito a ser indemnizada (art.º 913.º e 909.º e 915.º do CC); h) Estamos perante ainda, a violação dos deveres de esclarecimento, informação da Ré, Recorrida, que permite até a desnecessidade da Autora, Recorrente em denunciar as desconformidades, estamos perante o incumprimento do contrato e ainda face ao dolo da Ré, Recorrida constar que a Recorrida não quer cumprir as obrigações (art.º 253.º/1, 227.º do CC e art.ºs 38.º e 40.º da Convenção de Viena; 287.º /2, 309.º, 917.º, 918.º do CC; 253.º/1, 254.º/1 e 287.º/1/2, 916.º/1 in fine, 917.º in fine do CC; 217.º, 331.º.º/2 e 1220.º/2 do CC). i) E ao dolo da Ré, Recorrida a ser aplicável o artigo 917.º ex vi 916.º/3 do CC, e é aplicável o art.º 918.º e 799.º e ss do CC, que se aplica o prazo de prescrição ordinária (art.º 309.º do CC) j) Note-se ainda, estarmos perante um contrato bilateral em que a Autora, Recorrente que cumpriu pontualmente a sua prestação por inteiro tem direito à restituição por inteiro e indemnização pelos prejuízos que a Ré causou pelo incumprimento (art.ºs 801.º/2, 562.º, 566.º/2, 433.º, 434.º/1, 289 do CC) H. Face ao incumprimento da Ré, Recorrida e dos direitos que emergem a favor da Autora, Recorrente, que não permitem ter ocorrido a caducidade da acção, ainda se permite circunscrever, concluir o seguinte: a. Verificando-se que ocorreu uma situação de incumprimento definitivo por parte da Ré, Recorrida, designadamente, verificando-se qualquer uma das circunstâncias referidas no artigo 808.º, n.º 1, perda de interesse ou interpelação admonitória, faz transformar a mora em incumprimento definitivo. b. Ora, havendo incumprimento definitivo por parte da Ré, Recorrida, há que aplicar as regras gerais do incumprimento contratual onde a Autora, Recorrente, pode resolver o contrato, nos termos dos artigos 432.º e seguintes, sem prejuízo do seu direito a ser indemnizada (artigo 801.º, n.º 2, do CC). Nos termos do artigo 406.º n.º 1 e 762.º do CC, a estabilidade dos contratos pode ser limitada ou restringida em caso de inexecução em que o legislador permite não serem mantidas as relações contratuais, permitindo ao contraente lesado reagir a tal injustiça, através de uma desvinculação unilateral, que tem logo em primeira vista o restabelecimento daquilo que prestou, pelo que, a lei concede a resolução, como ocorre nomeadamente previsto nos artigos 801.º n.º 2 e 432.º n.º 1 do CC. c. Assim também aqui se verifica que a resolução difere da anulabilidade (art.º 916.º/3, 287.º/2 ex vi, 917.º in fine do CC), porquanto a anulabilidade visa invalidar o próprio negócio, enquanto que o instituto da resolução remete-nos para o contrato como um todo e com todos os efeitos, ou seja a resolução “tutela o duplo interesse liberatório recuperatório e permite ou pode permitir, ao contraente adimplente (ou com aptidão para tal) uma nova composição contratual”. d. Ou seja o fundamento primário da resolução é sempre o facto típico de um incumprimento contratual, pelo que o direito de resolução se insere na esfera dos contratos bilaterais ou sinalagmáticos, sendo uma ocorrência que ocorre quando há falhas no cumprimento das obrigações inerente aos contraentes, a resolução visa tutelar as relações contratuais na fase executiva, além do vínculo de estabilidade entre prestação e contraprestação. e. A caducidade do direito à resolução perante a devedora, Ré, Recorrida, está prevista nos termos gerais do art.º 436.º n.º 2, do CC, podendo-se recorrer, em último, por recurso ao prazo geral de prescrição, art.º 436.º n.º 2 e 298.º n.º 1 do CC e face ao facto ser continuado o prazo só se completaria com a sua cessação e não após o conhecimento na medida que continuam a ser produzidos fundamentos concretos de resolução e apenas quando terminarem esses fundamentos, e só após continuando a devedora, Ré, Recorrida sem cumprir, nomeadamente os actos de resolução e de indemnização, f. Porque a resolução se insere dentro dos direitos dos contratos, é aqui que se inicia o prazo de caducidade que corresponde ao prazo geral de prescrição, pelo que a PI foi interposta em prazo, g. E como a resolução é um facto de extinção do contrato, pode originar diversos prejuízos, previstos nos artigos 801.º n.º 2, 802.º n.º 1 e 808.º n.º 1 do CC, onde a culpa da Ré, Recorrida, é apenas uma condição natural ou normal e não um pressuposto essencial para a existência do direito de resolução, conforme flui dos artigos 793.º n.º 2 e 801.º n.º 2 e 802.º n.º 1 e 808.º n.º 1 do CC e tanto o interesse contratual positivo como o negativo abrange os danos emergentes e os lucros cessantes nos termos do art.º 564.º n.º 1 do CC, sendo que, h. A Ré, Recorrida adquiriu o preço pago pela Autora, Recorrente, o que também face ao incumprimento da Ré, Recorrida, tal valor estar dentro do valor global de indemnização pelos danos causados à Autora, Recorrente (art.º 803.º n.º 1 e 2 do CC), ou seja, a Autora, Recorrente também à cautela exigiu o commodum de representação. i. E a jurisprudência vem afirmando a possibilidade de, numa apreciação casuística, compatibilizar a resolução contratual com a indemnização do interesse contratual positivo, se no caso tal não contender com o equilíbrio da relação e o princípio da boa fé. Pelo que a PI foi interposta em prazo, j. Assim a resolução do contrato é compatível com a indemnização pelo interesse contratual positivo, que só não será admitida quando revele desequilíbrio grave na relação de liquidação ou se traduza em benefício injustificado para o credor, ponderado à luz do princípio da boa fé, hipótese em que se indemnizará antes pelo interesse contratual negativo e a Autora, aqui recorrente, na sua PI se pode verificar uma situação e cúmulo, face a todos os danos, incluindo desde a devolução do valor pago, acrescido de juros, a ocupação da maquina de UPS e de sua caixa nos escritórios da Autora, ainda, os danos que indica por cada dia em que a UPS não está em funcionamento, assim como os riscos de incêndio, e de não subida de grade metálica para permitir a saída nomeadamente em caso de incêndio e consequente falha de energia eléctrica, de intrusão, perda de dados e não utilização dos computadores e demais equipamentos, assim como de não utilizar plenamente os escritórios, privação de uso ou de privação de colher frutos civis, ou de perda do valor empregue nas obras pelo tempo sem UPS, a indemnizar. k. Ou seja a Autora, Recorrente pretende ver-lhe ser reconhecido o primado, do princípio geral da obrigação de indemnizar o credor lesado, consagrado no artigo 562.º do CC, segundo o método da teoria da diferença acolhido pelo artigo 566.º, n.º 2, do mesmo diploma, como escopo fundamental reintegrador dos interesses atingidos pelo incumprimento do contrato”. permitindo ainda a indemnização (art.º 563.º do CC), pelo interesse contratual positivo que se destina a reparar os danos como causa do valor da indemnização - art.º 458.º, 909.º, 915.º, 1223.º 562.º do CC. l. Do supra, também se extrai que as normas do incumprimento na compra e venda e também na empreitada artigos 905.ºss e 913.º ss e 1221.º e ss referem-se à venda de bens onerados, venda de coisas defeituosas, e eliminação dos defeitos, convergentes e aplicáveis aos tipos contratuais de venda e ou de empreitada, ora fora destes paradigmas estando em causa o incumprimento do contrato, existindo interpelação admonitória incumprida e querendo a Autora, Recorrente a resolução do contrato e indemnização, o regime a aplicar é o das regras gerais da responsabilidade contratual dos artigos 798.º, 799.º e ss 808.º e 562.º e ss do CC, que o artigo 918.º do CC, permite a sua aplicação ao remeter para o não cumprimento (artigo 801.º do CC), o que permite à Autora, Recorrente, face ao contrato bilateral incumprido e desta já ter pago o preço, o direito à resolução do contrato e indemnização e ainda, tal artigo 918.º do CC permite também manter o risco, na Ré, Recorrida, face nomeadamente aos artigos 796.º e 807.º do CC, pelo que a PI da Autora, Recorrente foi interposta em prazo. m. Ainda, quanto à indemnização e sua agravação face ao dolo da Ré, Recorrida, na Conv. de Viena, por força dos artigos 38.º a 40.º a Ré, Recorrida ao ter agido com dolo não lhe é permitido se prevalecer do facto de eventualmente a Autora, Recorrente não ter examinado a obra, a UPS, e também nesses termos a Ré, Recorrida também não se pode prevalecer pelo eventual facto de não ter denunciado o defeito de conformidade, o que face aos artigos 908.º e 909.º do CC, quanto ao que indemnizar, na conjugação dos dois preceitos, o artigo 909.º estabelece uma responsabilidade objectiva, cuja indemnização abrange os danos emergentes do contrato, ou seja, o interesse contratual positivo, e no artigo 908.º baseia-se na culpa e engloba todos os danos que integram o interesse contratual negativo. Pelo que no direito à indemnização não existe uma alternativa mas sim uma situação de cúmulo, face a todos os danos, prejuízos que a Ré causou à Autora e esta ser indemnizada por aquela. n. E pelo princípio da especialidade, as publicidades, conversações, comunicações, preliminares da contratação inserem-se no contrato, assumindo para o caso em discussão a responsabilidade contratual, cuja acção de indemnização pode ser intentada no prazo da prescrição ordinária, pelo que a PI foi interposta em prazo. o. Mas ainda, como se sabe, os prazos de prescrição, do direito à indemnização, por responsabilidade civil quando é extracontratual, são os fixados, no artigo 498, n. 1, do C.C. de 3 anos, e este prazo curto é note-se como excepção ao prazo prescricional ordinário, do artigo 309.º, do mesmo diploma substantivo que é 20 anos, ou seja mesmo a considerar a data de 15 de Março de 2022, como início do prazo para interpor a acção de responsabilidade civil se entendesse ser apenas de responsabilidade aquiliana e nada de responsabilidade contratual, o prazo se exauriria em 15 de Março de 2025, pelo que também caso assim fosse aplicável a PI teria sido interposta em prazo. I. Como em supra se permite facilmente extrair, não estamos perante questões que sejam reconduzidas como venda de bens onerados, venda de coisas defeituosas, ou de vícios redibitórios, nem para a eliminação dos defeitos convergentes aplicáveis aos tipos de contrato de venda e ou de empreitada, que sejam aplicáveis as previsões dos artigos 905.º e ss, 913.º e ss e 1221.º e ss. J. Está em causa isso sim, o incumprimento do contrato, existindo interpelações admonitórias incumpridas e querendo a Autora, Recorrente a resolução do contrato e indemnização, o regime aplicável é o das regras gerais da responsabilidade contratual (art.ºs 798.º, 799.º e ss, 808.º e 562.º CC) em que o artigo 918.º permite a sua aplicação ao remeter para o incumprimento (art.º 801.º do CC) e estando a Autora, Recorrente perante um contrato bilateral incumprido e esta ter cumprindo completa e pontualmente o pagamento do preço, tem a Autora, Recorrente o direito à resolução e indemnização, ficando ainda o risco a manter-se na responsabilidade da Ré, Recorrida (art.ºs 918.º, 796.º e 807.º do CC). K. Sendo a Ré, Recorrida responsável por todos os prejuízos face ao dolo (art.ºs 38.º e 40.º da Conv de Viena, art.ºs 908.º, 909.º do CC). L. Pelo supra com todo o devido respeito, s.m.o. é forçoso se concluir que não ocorreu a caducidade da acção, e em consequência, a Autora, Recorrente mantem o Direito à Indemnização em capital e em juros, quer do valor, prestação que pagou à Ré, Recorrida, quer do valor que a Ré, Recorrida, lesou, causou e vem causando danos, não apenas pelos custos desta acção, recurso, mas em especial pelo incumprimento do contrato que não permitiu nem vem permitindo a fruição plena, suas rentabilidades dos espaços de escritório e que também afecta em diminuir o valor do activo imóvel da Autora, além de manter em perigo as instalações da Autora, Recorrente, assim como a Autora, Recorrente tem direito a que a Ré, Recorrida, faça obra para desligar, separar da rede de eléctrica e de UPS, a máquina de UPS do imóvel da Autora, e que a Ré, Recorrida a separe do imóvel, rede, a recolha e leve para fora do imóvel tal máquina de UPS, assim como recolha, leve as embalagens, materiais de empacotamento da referida Máquina de UPS, que se mantêm dentro do referido imóvel da Autora, Recorrente.
A Recorrida contra-alegou, pronunciando-se pela improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
II – OBJECTO DO RECURSO
O âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões formuladas pelo Recorrente na motivação do recurso em apreciação, estando vedado a este Tribunal conhecer de questões aí não contempladas, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se impõe (artigos 635º, nº 2, 639º, nº1 e nº 2, 663º, nº2 e 608º, nº 2, do C.P.C.)
Deste modo, e considerando as conclusões do recurso interposto, a questão que cumpre apreciar é a de saber se o tribunal errou quando julgou verificada a excepção peremptória de caducidade.
III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
O tribunal a quo julgou provado que:
1.
A Autora alegou na petição inicial que:
a) A Ré dedica-se aos sistemas de alimentação de energia e eléctrica e de potência, nomeadamente, fabricação/comercialização/venda de Unidades de Alimentação Ininterrupta, designadas por UPS, incluindo baterias e UPS trifásicas, estas desde os 10 KVA até aos 600 KVA.
b) Exerce a profissão de Administradora Judicial,
c) “não tendo os conhecimentos especializados da Ré”.
d) Contratou a aquisição/compra e colocação em funcionamento de uma UPS trifásica de 10 KVA, obrigação a ser cumprida na A., com entrada pelo n.º…, O....
e) Fez obras de remodelação no domicílio profissional/escritórios, que ascenderam a mais de cem mil euros.
f) Nas obras dos escritórios, foi instalada uma rede eléctrica para UPS trifásica, que alimenta todas as dependências do escritório e equipamentos,
g) Carecendo de dispor os escritórios com um sistema de alimentação secundário de energia eléctrica que entrasse em acção, alimentando os dispositivos a ele ligados, quando ocorresse a interrupção no fornecimento de energia primária, nomeadamente, para proteger os aparelhos em casos de quedas energia, assim como para poupar energia e conter subtensão ou sobretensão na rede eléctrica, sobrecarga, descarga das baterias, curto circuito nas saídas, picos de tensão, fornecer uma energia limpa e ininterrupta,
h) Destinando-se a UPS ao piso «0», nomeadamente, para os seguintes equipamentos: a. 10 CPUs portáteis, router (onde se incluem retroprojectores/monitores, NAS, sistema de videoconferência e replicadores de sinal wireless); b. 2 vídeo porteiros (porteiros interligados com sistema de assiduidade, de controle de acessos com cartão e reconhecimento facial); c. 1 central telefónica com 10 telefones (permitindo, em caso de falha de energia, fogo ou intrusão, chamadas automáticas); d. 1 central de incêndio (com sirenes interiores e exteriores, detectores de fogo e fumo e térmicos, com betoneiras de fogo); e. 1 central de intrusão (com sirenes interiores e exteriores que, em caso de quebra de energia eléctrica, são accionadas, com sensores de detecção por imagem e por volume/movimento, teclados de armar e desarmar, comutados com CCTV); f. 6 câmaras de videovigilância e gravador (que, em caso de falha de energia, activa alarme); g. 1 grade de enrolar (da porta do piso «0» de entrada/saída para a rua, permitindo que, em caso de incêndio e falha de energia eléctrica, existisse alimentação eléctrica do motor da grade, com a finalidade de a fazer subir e permitir a saída em segurança das pessoas que estivessem no interior dos escritórios, assim como a entrada dos bombeiros).
i) Estabeleceu contacto com a Ré em 25 de Agosto de 2021, a fim de contratar a substituição das baterias de uma antiga UPS monofásica.
j) A Ré, a seu pedido, verificou pelo colaborador que veio substituir as baterias da UPS monofásica (piso «1»), no local dos escritórios, que uma UPS trifásica seria necessária para os escritórios (piso «0»).
k) Após negociações, em 24 de Fevereiro de 2022, a Ré enviou um e-mail, com a sua melhor proposta, para o fornecimento de uma UPS de 10 KVA, com a ref.ª CT/2K21.2076.Adit2/MD, com o preço unitário sem IVA de € 3.000,00.
l) Em 25 de Fevereiro de 2022, por e-mail, comunicou à Ré que aceitava a proposta.
m) Em 2 de Março de 2022, a Ré enviou a confirmação da encomenda n.º 22/039 e a factura proforma 22/69, para pagamento, identificando o equipamento como «Master System Simply 10KVA 3/3 – 10 min, no valor sem IVA de € 3.000,00 e total com IVA de € 3690,00;
n) No mesmo dia, procedeu, por intermédio de Carlos Soares Teixeira, ao pagamento da totalidade.
o) Em 15 de Março de 2022, o técnico da Ré, na presença dos técnicos da sua obra, procedeu à ligação da UPS, a qual, ligada, ficou a fazer ruído, que se ouvia no piso superior.
p) Em 18 de Março de 2022, informou a Ré sobre o excessivo ruído e excessivo consumo de energia.
q) Em 25 de Março de 2022, por e-mail dirigido à Ré, informou que o ruído persistia, com medição de mais de 60 decibéis.
r) Em 28 de Março de 2022, por e-mail, denunciou mais defeitos, juntando fotos da “avaria n.º 45” (inversor desligado), e informando que o consumo de energia aumentou consideravelmente, declarando que aguardava até às 16h30 do dia 01-04-2022 para a Ré dar uma solução final, dizendo ainda que decerto a Ré não quererá uma acção com vista à resolução da compra e venda e indemnização por todos os danos que vem causando.
s) No mesmo dia, por carta registada, declarou à Ré: “…os defeitos em supra estão causar prejuízos que se estimam por ora que poderão ascender a 250,00€/dia, não obstante, damos a V/Exa. a oportunidade até 01 de Abil de 2022, ou de resolver os defeitos ou resolver o negócio.”
t) A Ré, até ao presente, nada reparou, nada substituiu, nem veio desinstalar, desligar, recolher a UPS, nem devolver o valor pago e encargos com a UPS.
2.
A presente acção foi proposta em 8 de Março de 2023.
IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Insurge-se a Recorrente contra a decisão do tribunal a quo de julgar verificada a excepção de caducidade da presente acção invocada pela Ré sustentando a inaplicabilidade do prazo de caducidade previsto no artigo 917º, nº 1, do C. Civil ao caso objecto dos presentes autos, por entender não se tratar aqui de venda de coisa defeituosa mas antes de incumprimento do contrato ao qual são aplicáveis as regras gerais da responsabilidade contratual.
De acordo com o disposto pelo artigo 913º, nº 1, do C. Civil, existe venda de coisa defeituosa se a coisa vendida sofrer de vício que a desvalorize ou impeça a realização do fim a que é destinada, ou não tiver as qualidades essenciais asseguradas pelo vendedor ou necessárias para a realização deste fim.
Conforme decidido pelo Acórdão da Relação de Évora de 14.10.2021, “ há venda de coisa defeituosa sempre que no contrato de compra e venda, tendo por objecto a transmissão da propriedade de uma coisa, a coisa vendida sofre dos vícios ou carece das qualidades abrangidas no artigo 913º 913º do Código Civil, quer a coisa entregue corresponda, quer não, à prestação a que o vendedor se encontra vinculado “. (rel. Manuel Bargado, disponível em www.dgsi.pt)
Com efeito, “a coisa entregue pelo vendedor pode estar afectada de vícios materiais ou vícios físicos, vale dizer, defeitos intrínsecos, inerentes ao seu estado material, e não ser, portanto conforme ao contrato, dada a sua não correspondência às características acordadas ou legitimamente esperadas pelo comprador”. (Calvão da Silva, Da compra e venda de coisas defeituosas, 2002, pág. 39)
Ora no articulado de petição inicial a Autora alegou os seguintes factos para fundar o direito que invoca e o pedido que formula:
- contratou com a Ré o fornecimento por esta de uma UPS de 10 KVA, pelo preço de € 3690,00, que pagou na totalidade;
- a 25 e 28 de Março de 2022 denunciou à Ré os defeitos da UPS fornecida pela mesma, a saber, o excessivo ruído, o excessivo consumo de energia e a “avaria n.º 45” (inversor desligado), fixando o prazo de 1 de Abril de 2022 para a Ré resolver os defeitos sob pena de a Autora resolver o contrato e reclamar da mesma indemnização pelos prejuízos causados;
- a Ré, até ao presente, nada reparou, nada substituiu, nem veio desinstalar, desligar, recolher a UPS, nem devolver o valor pago e encargos com a UPS.
Resulta assim evidente que a causa de pedir invocada pela Autora é o contrato de compra e venda de uma UPS de 10 KVA, pelo preço de € 3690,00, celebrado entre as partes, a invocada venda defeituosa do bem objecto desse contrato, referente aos defeitos que apresenta a UPS fornecida pela Ré, a saber, o excessivo ruído, o excessivo consumo de energia e a “avaria n.º 45” (inversor desligado), bem como a consequente resolução do contrato e os prejuízos sofridos em consequência desses defeitos.
Deste modo o que está em causa na presente acção é a compra pela Autora de uma coisa defeituosa, i.e. que sofria de vício que impedia a realização do fim a que era destinada e que não tinha as qualidades essenciais asseguradas pelo vendedor e necessárias para a realização deste fim, e não um contrato de empreitada, e muito menos de empreitada de construção, modificação ou reparação de imóvel como parece sugerir a Recorrente em sede de conclusões de recurso sem qualquer respaldo nos factos que alegou no âmbito do seu articulado de petição inicial.
Dispõe o artigo 917º, nº 1, do C. Civil que a acção de anulação por simples erro caduca, findo qualquer dos prazos fixados no artigo anterior sem o comprador ter feito a denúncia, ou decorridos sobre esta seis meses, sem prejuízo, neste último caso, do disposto no n.º 2 do artigo 287.º
A caducidade “corresponde a um esquema geral de cessação de situações jurídicas, mercê da superveniência de um facto a que a lei ou outras fontes atribuam esse efeito. Ou, se se quiser, ela traduz a extinção de uma posição jurídica pela verificação de um facto stricto sensu dotado de eficácia extintiva”. (Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, volume I, 2007, pág.207)
Não suscita dúvidas que “quando o vendedor de uma coisa defeituosa não cumpre a obrigação de reparação do defeito ou substituição da coisa, nada impede o comprador de mostrar que perdeu objectivamente o interesse na prestação ou lançar mão da interpelação admonitória para converter o incumprimento imperfeito e a mora na sua rectificação em incumprimento definitivo e assim, resolver o contrato”. (Acórdão da Relação do Porto de 15.7.2004, rel. Pinto Almeida, disponível em www.dgsi.pt)
A circunstância da Recorrente pretender a resolução do contrato de compra e venda que celebrou com a Ré e simultaneamente uma indemnização pelo interesse contratual positivo não afasta a aplicação ao caso em análise do prazo de caducidade previsto no artigo 917º, nº 1, do C. Civil.
Pelo contrário, tem sido entendimento consolidado da jurisprudência que “o prazo de caducidade do art.º 917º do C. Civil é aplicável não apenas ao direito de anulação do contrato, mas também aos demais direitos legalmente conferidos ao adquirente de coisa defeituosa”. (Acórdão da Relação de Lisboa de 20.3.2016, rel. Tibério Silva, disponível em www.dgsi.pt; no mesmo sentido ver Acórdãos do S.T.J. de 7.5.2009, rel. Pires da Rosa; do S.T.J. de 20.4.2023, rel. José Rainho; do S.T.J. de 24.4.2012, rel. Serra Baptista; da Relação do Porto de 19.12.2023, rel. José Eusébio Almeida; da Relação de Lisboa de 6.12.2022, rel. Carlos Oliveira; da Relação de Guimarães de 7.3.2024, rel. Raquel Tavares, todos disponíveis em www.dgsi.pt)
Conforme decidido pelo Acórdão do S.T.J. de 7.5.2009, “ainda que só a indemnização por violação do interesse contratual positivo seja pedida, ela não deixa de ter a sua origem na venda defeituosa, e não deixa de ser, em caso algum o sucedâneo com o qual se pretende assegurar a prestação pontual que o defeito não deixou cumprir”, e daí “que a acção respectiva não possa deixar de ser tratada no mesmo âmbito temporal que a acção definitiva para o essencial remédio do defeito: ou a acção de anulação ou a redução do preço, ou a reparação e substituição da coisa, ou a resolução”, e por conseguinte “o prazo de caducidade do art.º 917º do C Civil aplica-se, por isso, por interpretação extensiva, a todas as acções propostas pelo credor vítima do cumprimento defeituoso de um contrato de compra e venda, incluindo as de simples indemnização” (rel. Pires da Rosa, disponível em www.dgsi.pt; no mesmo sentido Acórdão do S.T.J. de 24.4.2012, rel. Serra Baptista; Acórdão da Relação do Porto de 19.12.2023, rel. José Eusébio Almeida; Acórdão da Relação de Guimarães de 7.3.2024, rel. Raquel Tavares, todos disponíveis em www.dgsi.pt)
Ora tendo a Autora denunciado os defeitos em 28.3.2022 quando a presente acção foi proposta em 8.3.2023 já tinha decorrido o prazo de caducidade preconizado pelo artigo 917º, nº 1, do C. Civil, com a consequente extinção do direito invocado pela Autora.
Não merece assim censura a decisão recorrida.
V – DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso interposto e, em consequência, confirmam a sentença recorrida,
Custas do recurso pela Recorrente (artigo 527º, do C.P.C.).
L., 30-04-2025
Maria Carlos Duarte do Vale Calheiros
Marília dos Reis Leal Fontes
Vítor Manuel Leitão Ribeiro