REGULAÇÃO PROVISÓRIA DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
RESPONSABILIDADES PARENTAIS
DEFICIENTE
IDADE
Sumário

SUMÁRIO (artigo 663.º, n.º 7, do CPCivil):
I. Revela-se deficiente a decisão de regulação provisória das responsabilidades parentais que fundamenta o regime de pernoitas do menor tão-só na idade deste, de cerca de um ano e meio de idade.
II. Tal deficiência deve ser suprida pela Relação, conforme artigo 665.º do CPCivil, caso os autos lhe confiram elementos probatórios para tal.
III. Não sendo esse o caso, deve o Tribunal da Relação anular a decisão recorrida e determinar que os autos baixem à 1.ª instância a fim de aí serem produzidas provas e fixados os factos pertinentes a uma regulação provisória do exercício das responsabilidades parentais.

Texto Integral

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
I.
RELATÓRIO.
O Requerente, AA instaurou contra a Requerida BB processo especial de regulação do exercício das responsabilidades parentais relativamente à menor CC, nascida em ...2023.
Em 08.07.2024, com gravação, realizou-se a conferência de pais, sem que tenha sido obtido acordo.
Após audição dos pais do menor e promoção do Ministério Público, o Juízo de Família e Menores de Lisboa proferiu a seguinte decisão provisória:
«Ponderadas as declarações dos Progenitores e ouvidas as suas Ilustres Mandatárias e a Digna Magistrada do Ministério Público, e com o fito de salvaguardar os superiores interesses da Criança CC, nascida a ...2023, ao abrigo da conjugação das normas constantes dos artigos 28.º, nº 1 e 37º, nº 5 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC), estabeleço o regime provisório nos seguintes termos:
I- A Criança CC, nascida a ...2023, fica aos cuidados da
Mãe, com quem fixa residência.
II- As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida da filha são exercidas em comum por ambos os Progenitores, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos Progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informação ao outro logo que possível.
III- O exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente da filha cabe ao Progenitor com quem a Criança se encontrar.
IV- A CC estará com o Pai nos seguintes termos:
- dia 27 e 28 de julho, sem pernoita.
- dias 29, 30 e 31 de julho, sem pernoita.
- 01 e 02 de agosto, com pernoita.
- 5, 6, 7, 8 e 9, 10 e 11 de agosto, com pernoitas de 09 para 10 e 10 para 11 de agosto.
- no hiato temporal compreendido entre 12 a 16 de agosto a Menor estará e pernoitará com o Pai em dia e horas de recolha e entrega, a ajustar entre ambos os Progenitores.
- 24 e 25 de agosto, com pernoita.
- no hiato temporal compreendido entre 26 e 30 de agosto, a Menor estará e pernoitará com o Pai em dia e horas de recolha e entrega, a ajustar entre ambos os Progenitores
- A partir de 02 de setembro, a filha pernoitará com o Pai todas as quartas feiras, iniciando-se também o regime de fins de semana alternados junto do Pai, indo este para o efeito recolher a Criança na escola às sextas-feiras findas as atividades letivas e entregando-a aos domingos ao final da tarde em casa da Progenitora, correspondendo o primeiro fim de semana do Pai ao hiato temporal compreendido entre 06 de setembro findas as atividades letivas a 08 de setembro ao final da tarde.
V- A título de alimentos, e sem prejuízo de ulterior avaliação, o Pai procederá ao pagamento da quantia de €150,00 (cento e cinquenta euros), a creditar até ao dia 08 de cada mês na conta bancária que vier a ser indicada pela Progenitora, sendo tal quantia a atualizar anualmente em função da publicação do índice de preços no consumidor atualizada pelo Instituto Nacional de Estatística.
VI- O Pai comparticipará em 50% do valor das despesas médicas, medicamentosas e escolares que não sejam comparticipadas pelo Estado, seguros ou subsistemas de saúde».
A conferência de pais continuou em 07.11.2024, igualmente com gravação, altura em que se ouviram de novo as partes e notificaram-se as mesmas para apresentarem proposta de alteração ou complemento ao regime provisório estabelecido até à prolação de sentença, caso não lograssem em 15 dias alcançar acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais.
Apresentadas tais propostas e ouvido o Ministério Público, em 09.12.2024 o Juízo de Família e Menores de Lisboa proferiu a seguinte decisão, igualmente provisória:
«Na primeira conferência de pais datada de 08.07.2024 foi regulado, provisoriamente, o exercício das responsabilidades parentais, no que à economia deste despacho concerne, nos termos seguintes:
(…)
Decorridos que são mais de cinco meses, ambos os progenitores se mostram recetivos a alterações do regime provisório, no que concerne aos convívios filioparentais da díade pai-filha.
Por um lado, a progenitora sugere que:
(…)
Por sua vez, o progenitor propõe a seguinte alteração:
(…)
O Ministério Público sufraga a proposta apresentada pelo progenitor, no que diz respeito à alteração do regime a curto prazo.
Pois bem, considerando a tenra idade da criança temos presente a lição do psicólogo Pedro Strecht, (…).
No mesmo sentido o Ac. da RL de 18/03/2013, Proc.º nº 3500/10.0TBBRR.L1-6 (…).
Na mesma esteira o Ac. da Relação do Porto de 13/05/2014, Proc.º nº 5253/12.9TBVFR-A.P: (…)
Ponderadas as razões aduzidas e respaldado nos entendimentos supra, procedo à alteração do regime provisório estabelecido, no que a convívios da díade pai filha concerne, nos termos seguintes:
1. A CC passa fins de semana alternados com o Pai com pernoita, com início à sexta-feira, procedendo este à sua recolha na creche, e entrega no domingo às 18 horas, na casa da mãe.
2. Na semana que antecede o fim de semana do pai, a CC pernoita todas as terças feiras com o pai, procedendo este à sua recolha na creche e entrega no mesmo estabelecimento no dia seguinte, respetivamente no final e início das atividades.
3. Na semana que antecede o fim de semana da mãe, a CC pernoita com o pai todas as quartas-feiras, procedendo este à sua recolha e entrega na creche no final e início das atividades, respetivamente.
4. A CC passa alternadamente as festividades de Natal e Passagem de Ano com os Progenitores, cabendo ao Pai a Consoada e Passagem de Ano e à Mãe o dia de Natal e Ano Novo nos anos pares, e à Mãe nos anos ímpares, devendo a entrega em ambos os casos ocorrer às 11h00m.
5. A CC passa alternadamente o período de Sexta-feira Santa e Sábado Santo com um dos Progenitores, cabendo ao outro o Domingo de Páscoa e Segunda-feira de Pascoela, fixando-se que nos anos ímpares caberá à Mãe o primeiro bloco de dias e ao Pai nos anos Pares, devendo a entrega no Domingo ocorrer às 10h00m.
6. A CC passa com o Progenitor o dia de aniversário deste e o Dia do Pai, e com a Progenitora o dia de aniversário desta e o Dia da Mãe, incluindo pernoita, independentemente do regime em curso, devendo a entrega no dia seguinte ocorrer na Escola ou às 9h30m se não ocorrer em dia útil.
7. No dia de Aniversário das irmãs os Progenitores promovem que a CC passe o dia com a respetiva irmã, o que poderá incluir pernoita.
8. Nos aniversários de parentes mais próximos, como sejam, avós, tios e primos direitos, os Progenitores promovem que a CC esteja nas festividades dos mesmos, devendo aquele a quem respeita comunicar essa intenção ao outro com pelo menos 3 dias de antecedência.
9. Nos aniversários da CC, esta toma uma refeição com cada um dos Progenitores, sendo que nos anos ímpares almoça com o Pai e janta com a Mãe invertendo-se no ano seguinte. A entrega da menor é feita pelas 09:30 horas ao progenitor com quem almoça e pelas 16:30 horas ao progenitor com quem janta e a quem cabe a pernoita nesse dia».
Inconformado com tal decisão, o Requerente veio dela interpor recurso, apresentando as seguintes conclusões:
«A. O presente recurso é interposto do Despacho que fixou/alterou o Regime Provisório de regulação das responsabilidades parentais em relação à filha comum do Recorrente, AA e da Requerida BB a menor CC
B. O Recorrente não se conforma com tal decisão e demonstrará que o Tribunal a quo atuou em desconformidade com o superior interesse da CC.
C. Em primeiro lugar, a verdade é que o Tribunal a quo não efetuou alteração de facto ao regime no que diz respeito ao (aumento) tempo dos convívios da CC com o Pai, aqui Recorrente.
D. Pelo contrário, o Tribunal a quo manteve o regime provisório relativamente aos tempos de convívio da menor com o Pai, ora Recorrente, e limitou-se a complementar o regime anterior ao fixar o regime aplicável às épocas festivas (Natal, Passagem de Ano, Páscoa e Aniversários).
E. Ora o Regime de Regulação das Responsabilidades Parentais deve ser fixado tendo em vista o superior interesse da CC, o qual pressupõe, em princípio, a presença de ambos os Progenitores na sua vida quotidiana, na vivência e residência com ambos e respetiva família, e que no caso inclui irmãs de ambos os lados.
F. Aliás, tanto o Recorrente, como a Recorrida, nas propostas apresentadas para alteração do Regime Provisório, previram o aumento de tempo da CC com o Pai, incluindo maior número de pernoitas durante a semana, de forma gradual.
G. Todavia, incompreensivelmente, o Tribunal a quo apesar de reconhecer no Despacho que “Decorridos que são mais de cinco meses, ambos os Progenitores se mostram recetivos a alterações do regime provisório, no que concerne aos convívios filioparentais da díade pai-filha”, não logrou atuar em conformidade, não procedendo a alterações de facto, decisão que o Recorrente não acompanha e que deverá ser revogada.
H. Em segundo lugar, salienta-se que o Tribunal a quo decidiu em plena contradição com a Promoção do Ministério Público a este respeito.
I. No referido Parecer, a Digna Magistrada do Ministério Público, acompanhou as propostas de alteração ao regime provisório apresentadas pelo Recorrente, por serem as mais equilibradas e estáveis para a CC e que promovem um regime equitativo para ambos os Progenitores.
J. Ora, contrariamente ao que resulta da Decisão sob recurso, não podemos ignorar que o Ministério Público atua enquanto garante das crianças, e que a posição assumida por este órgão no decurso do processo tem em vista a garantia do superior interesse da menor CC.
K. Pelo que, o Tribunal deveria ter atendido (ou pelo menos considerado) a posição assumida pelo Ministério Público, que foi ao encontro do superior interesse da CC e que veio devidamente sustentada, ao invés de, como se verifica no caso subjacente ao presente recurso, decidir à margem mesma, fazendo-lhe mera menção, sem a contestar e/ou rebater.
L. Em terceiro lugar, não pode o Recorrente acompanhar a fundamentação do Tribunal a quo para sustentar a respetiva posição, a qual se revela obsoleta, desatualizada e desadequada ao superior interesse da CC.
M. Para sustentar a manutenção do regime provisório com duas pernoitas ao fim de semana (quinzenalmente) e uma pernoita durante a semana, decorre da leitura do despacho, salvo melhor interpretação, que o Tribunal a quo recorre aos seguintes argumentos: (i) tenra idade da criança; (ii) relação de comunicação e capacidade de diálogo entre os Progenitores; e (iii) prevalência da figura materna em termos de ligação afetiva e prestação de cuidados, invocando doutrina e jurisprudência arcaica para sustentar a posição.
N. Para o efeito, o Tribunal a quo invoca conclusões de estudos publicados no ano de 2010, os quais estão, como é evidente, desadequados e desatualizados perante aqueles que entretanto foram publicados, que concluem pela importância igualitária da Mãe e do Pai no crescimento das crianças, desempenhando cada um o respetivo papel, conforme doutrina praticamente unânime.
O. As mesmas conclusões têm tido respaldo nos acordos de Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais Homologados, nas Decisões judiciais de primeira instância e bem assim na Jurisprudência dos Tribunais superiores – a título de exemplo: Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 12.04.2018, proferido no processo n.º 670/16.8T8AMD.L1-2, Relatora Ondina Carmo Alves; Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 10.07.2019, proferido no processo n.º 1947/19.6T8BRG-H.G1, Relator Paulo Reis; Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 27.06.2022, proferido no processo n.º 682/18.7T8VCD.P1, cuja relatora é Eugénia Cunha, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
P. As quais têm evoluído em consonância com os novos estudos que demonstram que o papel de ambos os Progenitores, e em concreto do Pai, é essencial no desenvolvimento das crianças desde tenra idade – donde se destacam, a título de exemplo, os artigos de opinião da Psicóloga Rute Agulhas e estudos de Edward Kruk, Professor Catedrático da Universidade da Colômbia Britânica, especialista
em política da família e da criança.
Q. Para além dos estudos, os quais são acompanhados pela doutrina portuguesa – Helena Bolieiro e Ana Teresa Leal – na determinação da residência, os Tribunais atendem ao princípio do superior interesse da criança, princípio da igualdade entre os progenitores e a disponibilidade manifestada por cada um dos progenitores para promover relações habituais do filho com o outro progenitor.
R. Sendo que, em especial, quanto ao princípio da igualdade entre progenitores, este encontra enquadramento legal na Convenção sobre os Direitos da Criança (artigo 18.º) e na Constituição da República Portuguesa (artigo 36.º).
S. Posto isto, resulta de forma clara que o Pai tem, à semelhança da Mãe, um papel determinante no desenvolvimento da criança, pelo que, a divisão do tempo com cada um dos progenitores, deve ser repartida de forma igualitária, o que passa por incluir no regime de regulação das responsabilidades parentais visitas e pernoitas da CC na casa do Pai, ora Recorrente, de forma gradual, até atingir a situação ideal de guarda conjunta em regime de residência alternada.
T. Neste sentido, requer-se a revogação do Despacho subjacente ao presente recurso, substituindo- se por acórdão que fixe o seguinte regime de regulação das responsabilidades parentais:
1.ª (Residência e Responsabilidades Parentais)
1.1. A CC fica entregue aos cuidados da Mãe, com quem atualmente reside, até ao mês de maio de 2025, convivendo com o Pai nos seguintes termos:
i. Os fins-de-semana quinzenais ocorrem de sexta-feira a segunda-feira, mantendo-se os convívios com pernoita todas as quartas-feiras e acrescendo convívio com pernoita às terças-feiras subsequentes aos fins de-semana da CC com a Mãe;
ii.A partir de março e até final de maio de 2025 (2 anos da menor), ao regime mencionado em i. deverá acrescer um convívio com pernoita nas quintas-feiras subsequentes aos fins de semana da CC com o Pai, seguindo a menor para fim-de-semana com a Mãe nessa sexta-feira.
1.2. A partir de junho de 2025, a CC residirá com ambos os Pais, devendo, até setembro de 2025 – e sem prejuízo das férias escolares de verão -, repartir o seu tempo passando com um dos Progenitores a segunda e terça-feiras e com o outro a quarta e a quinta-feiras, retornando ao primeiro para passar o fim de semana até domingo, alternando a ordem na semana seguinte (2-2-3).
1.3. A partir de setembro de 2025 a CC passará a residir com ambos os progenitores de forma alternada semanalmente com o dia de troca à segunda-feira, devendo esta ser interrompida à quinta-feira com jantar e pernoita com o outro Progenitor, interrupção esta cuja manutenção deverá ser reavaliada em maio de 2026.”
U. Por último, por ter sido omisso o Tribunal a quo, requer-se a fixação de um Regime Provisório que contemple as comunicações entre os Progenitores, o que, apesar de proposto por ambos não foi regulado pelo Despacho de que ora se recorre, sugerindo-se a cláusula a fixar nos seguintes termos:
3ª (Comunicações)
3.1. A CC poderá contactar por videochamada com o progenitor com quem não estiver todos os dias entre as 19h e as 20h;
3.2. Os Progenitores deverão promover a saudável e cordial comunicação entre si, utilizando as mensagens/WhatsApp para temas rotineiros, devendo utilizar o email para comunicar questões de maior importância bem como para tomar decisões conjuntas de relevo quanto à vida da menor.”
Nestes termos e nos demais de Direito, e tudo com o mui douto suprimento de V. Exas., requer-se:
a) a revogação do Despacho de que se recorre, substituindo-o por acórdão que ordene a alteração ao regime provisório de regulação das responsabilidades parentais da CC nos exatos termos supra propostos e em conformidade com a Promoção do Ministério Público;
Ou, em alternativa
b) a remessa dos autos para o tribunal de 1.ª instância, para que este altere o Regime Provisório da CC, com aumento (efetivo) dos tempos de convívios desta com o Pai, incluindo proliferação das pernoitas, fixando ainda a gradualidade com que tais pernoitas deverão vir a ser aumentadas, até uma repartição mais equiparada do tempo da menor em casa de ambos os Progenitores.
O Ministério Público contra-alegou, sustentando a procedência do recurso, ao passo que a Requerida, nas suas contra-alegações, concluiu no sentido da manutenção da decisão recorrida.
Colhidos os vistos, cumpre ora apreciar a decidir.
II.
OBJETO DO RECURSO.
Atento o disposto nos artigos 663.º, n.º 2, 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, todos do CPCivil, as conclusões do recorrente delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo do conhecimento de questões que devam oficiosamente ser apreciadas e decididas por este Tribunal da Relação.
Nestes termos, atentas as conclusões deduzidas pelo Recorrente, no presente recurso está em causa apreciar e decidir tão-só se deve ou não ser alterada a decisão provisória de regulação das responsabilidades parentais relativa à CC e, sendo-o, em que termos deve ocorrer uma tal alteração.
III.
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A factualidade a considerar na motivação de direito é a que consta do relatório deste acórdão, a qual se dá aqui por integralmente reproduzida.
IV.
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
A decisão recorrida regulou provisoriamente o exercício das responsabilidades parentais relativamente à menor CC.
Não indicou, contudo, os factos indiciários que fundamentam tal decisão e as respetivas provas, com exame crítico das mesmas.
Ou seja, em termos factuais, em sede de decisão de facto, a decisão recorrida nada refere em concreto, limitando-se genericamente a invocar «a tenra idade da criança», sem, porém, sequer a concretizar.
Nestes termos, em termos factuais a decisão recorrida configura-se deficiente, mesmo para o desiderato pretendido, a prolação de uma decisão provisória de regulação do exercício das responsabilidades parentais.
Tal deficiência é suscetível de ser suprida por este Tribunal da Relação, conforme disposto no artigo 665.º do CPCivil, por aplicação da «regra da substituição ao tribunal recorrido».
Contudo, in casu tal não se mostra possível, pois os autos não fornecem elementos factuais que habilitem este Tribunal da Relação a substituir na matéria o Tribunal recorrido.
Com efeito, ouvidas integralmente as gravações feitas das conferências de pais de 08.07 e 07.11.2024, a partir do medio studio do citius, única prova pertinente produzida nos autos, não é possível daí retirar factos, mesmo indiciários, que suportem, minimamente que seja, o regime provisório de pernoitas da CC com os seus progenitores e, muito menos ainda, determinar desde já o modo como deve ser estipulado tal regime a curto prazo, em função designadamente da idade da menor, matéria que constitui objeto do recurso.
A audição das gravações das conferências de pais pouco mais são que uma negociação quanto ao regime de pernoitas da menor, uma conversa entre as partes, seus Ilustre Mandatários, Ministério Público e Juiz, quase sempre entrecruzada e entrecortada.
Se a idade do menor constituísse só por si elemento determinante do regime de pernoitas por certo o legislador tê-lo-ia fixado em abstrato, em letra de lei, dispensando discussões relativas ao tema.
Em situações como a vertente, no supremo interesse do menor, a fixação de um regime provisório de pernoitas implica que se atenta na pessoa daquele e dos seus progenitores, no respetivo contexto, designadamente sócio afetivo, habitacional e educativo, com recurso a diversos elementos probatórios, que não apenas as declarações dos pais.
Nestes termos, na falta de elementos factuais que permitam estabelecer uma regulação provisória do exercício das responsabilidades parentais importa anular a decisão recorrida e determinar que os autos baixem ao Tribunal recorrido a fim de aí serem produzidas provas e fixados os factos pertinentes a uma tal regulação provisória, conforme o referido artigo 662.º, n.º 2, alínea c), do CPCivil.
Como referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil, Volume I, edição de 2020, página 826, «[q]uanto a segmentos da decisão que (sendo imprescindíveis para a decisão) se revelem deficientes, obscuros ou contraditórios (STJ 12-5-16, 2325/12), a Relação deverá supri-los, desde que constem do processo (ou da gravação) os elementos em que o tribunal se fundou (cf., no sentido da constitucionalidade, o Ac. do Trib. Const. nº 346/2009; STJ 7-11-19, 2929/17). Não sendo o caso, deve anular a decisão recorrida e remeter o processo para a 1ª instância».
A prolação de nova decisão pelo Tribunal recorrido nos termos indicados fica prejudicada caso, entretanto, em função do ulterior decurso dos autos principais, tal decisão se mostrar supervenientemente inútil.

V. DECISÃO
Pelo exposto, anula-se a decisão recorrida e determina-se que os autos baixem ao Tribunal recorrido a fim de aí serem produzidas provas e fixados os factos pertinentes a uma regulação provisória do exercício das responsabilidades parentais caso o ulterior decurso dos autos não prejudique a prolação de uma tal decisão provisória.
Custas pela parte vencida a final, conforme artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPCivil.

Lisboa, 08 de maio de 2025
Paulo Fernandes da Silva
Arlindo Crua
António Moreira