VALOR DA ACÇÃO
ALTERAÇÃO
TAXA DE JUSTIÇA
GUIAS
MULTA
Sumário

I. A mera deficiência de fundamentação não é susceptível de gerar a nulidade de um despacho/sentença, nos termos do art.º 615.º, n.º, al. b) do CPC, a qual ocorre quando falte em absoluto a indicação dos fundamentos de facto ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão.
II. A regra geral quanto ao momento da determinação do valor do processo, nos termos do art.º 299.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, é a de que deve atender-se ao momento em que a ação é proposta.
III. Alterado o valor da acção pelo juiz, e salvo despacho judicial, nenhuma norma legal impõe expressamente o imediato pagamento de qualquer reforço da taxa de justiça em função da alteração do valor da ação.
IV. Não tendo a secção emitido, nem a parte solicitado, guias para pagamento desse reforço, não se justifica a emissão de guias para pagamento da segunda prestação de taxa de justiça, acrescida de multa de igual valor, com vista ao pagamento daquele complemento devido.
(Sumário elaborado pela Relatora).

Texto Integral

Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa

I. Relatório
GESFIMO ESPÍRITO SANTO IRMÃOS, SOCIEDADE GESTORA DE ORGANISMOS DE INVESTIMENTO COLETIVO, S.A. veio, em representação de HERDADE DA COMPORTA - FUNDO ESPECIAL DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO, propor a presente acção declarativa de simples apreciação positiva, sob a forma de processo comum, contra RIO FORTE INVESTMENTS, SA (“en faillite”) – Massa Insolvente – com sede na 9, rue Pierre d’Aspelt, L-1142 Luxembourg, Grand Duchy of Luxemburg, matriculada no registo do Comércio e das Sociedades do Luxemburgo, sob o nº B13474, representada pelos seus administradores judiciais AA e BB pedindo:
- se declare que o FUNDO “ HERDADE DA COMPORTA”, considerando a falta de estipulação por escrito da taxa de juros devidos, está vinculado face à lei Portuguesa aplicável, para além da restituição das importâncias recebidas, a pagar à Ré juros à taxa legal supletiva de 4%, prevista no art.º 559º nºs 1 e 2 do CC, e não à taxa remuneratória acordada nos contratos formalizados por escrito supra referidos.
Atribuiu à presente acção o valor de € 30 000,01.
Devidamente citada, a Ré veio apresentar contestação.
Em 25-10-2021 foi proferido o seguinte despacho “Perspetivando-se fixar o valor da causa, notifique a autora para esclarecer o critério com que indicou o valor de 30.000,01 euros.
Vindo, tem a parte contrária prazo legal para se pronunciar, quanto à mesma matéria, querendo.”
Por requerimento de 11-11-2021 veio a Autora responder alegando que em virtude de não ser possível determinar qual o valor certo da utilidade económica do pedido nos termos do art.º 296º do CPC, entendeu que o valor a atribuir aos autos deve respeitar o critério previsto no artigo 303º n.º 1 do CPC (uma vez que os interesses em causa não são susceptíveis de uma quantificação precisa e imediata), e como tal, deverá considerar-se o valor equivalente à alçada da Relação, mais € 0,01.
A Ré secundou o entendimento da Autora.
A 28-03-2022 foi proferido o seguinte despacho:
“Notificada a autora para esclarecer o critério utilizado para fixar o valor à causa (30.000,01 euros), veio a mesma dizer “à luz do art.º 296º, n.º 1 do CPC, a utilidade económica imediata do pedido não se traduz no pagamento do montante de juros, mas somente, a declaração de qual a concreta taxa de juro a aplicar/fixar aos contratos de empréstimos. Não se se requer a imposição da realização de uma determinada conduta, in casu, o pagamento de juros, mas tão só, pôr fim a uma incerteza existente entre as partes. Em virtude dessa particularidade, não é possível determinar qual o valor certo da utilidade económica do pedido nos termos do art.º 296º do CPC. Em conclusão, Entendeu a A. que o valor a atribuir aos autos deve respeitar o critério previsto no artigo 303º n.º 1 do CPC, uma vez que os interesses em causa não são suscetíveis de uma quantificação precisa e imediata, e como tal, deverá considerar-se o valor equivalente à alçada da Relação, mais € 0,01.” A contraparte veio corroborar tal entendimento.
Vejamos.
Dispõe o n.º 1 do artigo 296.º do CPC que “a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”.
Segue-se o 297º, nº 1, onde se estatui, “se pela ação se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário; se pela ação se pretende obter um benefício diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse benefício.”
Ora, pese embora não se tenha levado a cabo um pedido de condenação no pagamento de juros, “por fim a uma incerteza existente entre as partes” quanto aos juros devidos é efectivamente um benefício diverso e que claramente equivale a uma quantia em dinheiro.
Equivalerá, designadamente:
- à diferença
- entre o montante obtido através do cálculo de juros como pretendido pela autora
- e o montante obtido através do cálculo de juros como pretendido pela ré.
***
Para efeito de apurar o benefício que pretende a autora obter com a ação, e fixar o respetivo valor, deve a mesma vir aos autos em 10 dias explicitar qual a diferença do montante de juros liquidados até ao momento da entrada da ação em juízo, considerando, por um lado, a declaração por si pretendida quanto ao respetivo cálculo e, por outro, a taxa de juro pretendida aplicar pela ré.”
Por requerimento de 07-06-2022 veio a Autora dar cumprimento ao despacho supra informando que considerando os cálculos indicados pelas partes a diferença em causa é de € 2.387.986,31: (€ 6.208.764,38 - € 3.820.778,07).
A 12-01-2023 foi proferido o seguinte despacho:
“Fixação do Valor da Causa
Dispõe o n.º 1 do artigo 296.º do CPC que “a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”.
Segue-se o 297º, nº 1, onde se estatui, “se pela ação se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário; se pela ação se pretende obter um benefício diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse benefício.”
Ora, pese embora não se tenha levado a cabo um pedido de condenação no pagamento de juros, “por fim a uma incerteza existente entre as partes” quanto aos juros devidos é efetivamente um benefício diverso e que claramente equivale a uma quantia em dinheiro.
Equivalerá, designadamente à diferença entre o montante obtido através do cálculo de juros como pretendido pela autora e o montante obtido através do cálculo de juros como pretendido pela ré.
Para efeito de apurar o benefício que pretende a autora obter com a ação, e fixar o respetivo valor, veio a mesma, a convite do Tribunal, explicitar qual a diferença do montante de juros liquidados até ao momento da entrada da ação em juízo, considerando, por um lado, a declaração por si pretendida quanto ao respetivo cálculo e, por outro, a taxa de juro pretendida aplicar pela ré, concluindo, em termos bem explicitados, ascender ao valor de 2.387.986,31: (€ 6.208.764,38 - € 3.820.778,07).
Notificada, a contraparte não se opôs à conclusão.
Fixo, pois, o valor da ação em 2.387.986,31 euros.
***
Face ao exposto e ao valor da causa, ora fixado, é este Juízo Local Cível incompetente em razão do valor para o conhecimento da presente ação, o que constitui uma exceção dilatória, cujo conhecimento é oficioso, determinando assim a remessa para o tribunal competente – cf. 102.º, 104.º n.º 2 e 105.º n.º 3, todos do CPC – no caso, aos Juízos Centrais de Lisboa – artigo 117º, nº 1 al. a) da Lei 63/2013.
Notifique, aguarde o trânsito e após remeta.”
Foi designada data para a realização de audiência prévia, e, no decurso da mesma, declarou-se a suspensão da instância por acordo das partes, tendo-se – desde logo – designado data para a sua continuação.
Após vicissitudes várias foi proferido despacho saneador a 02-07-2024, no qual:
i. Se admitiu liminarmente o pedido reconvencional;
ii. Se proferiu despacho saneador tabelar;
iii. Se identificou o objecto do litígio
iv. Elencaram os temas de prova;
v. Se proferiu despacho sobre requerimentos probatórios
vi. Se designou data para realização de audiência de discussão e julgamento;
Por notificação com certificação Citius de 03-02-2025 foi o mandatário da Autora notificado nos seguintes termos:
“Assunto: Pagamento 2ª prestação da taxa de justiça – art.º 14º, nº 3 do RCP
Idêntica notificação foi elaborada Ao Sr. Dr. CC
Não tendo até ao momento comprovado no processo acima identificado, o pagamento da 2ª prestação da taxa de justiça nem a concessão do benefício do apoio judiciário, fica notificado, na qualidade de Mandatário do Autor Gesfimo Espírito Santo Irmãos, Soc. Gest.De Organismos de Investimento Coletivo, SA, para, no prazo de 10 dias, proceder ao pagamento da prestação em falta, acrescido da multa de igual montante, sob pena de, não o fazendo, ficar sujeito às cominações previstas no nº 4 do referido artigo.
Limites da multa:
1 - Se a taxa de justiça devida for inferior a 1 UC, a multa terá o valor de 1 UC.
2 - Se a taxa de justiça devida for superior a 10 UC, a multa terá o valor de 10 UC.
Pagamento da taxa de justiça e da multa
O pagamento da taxa de justiça e da multa em falta deverá ser efetuado, nos termos do n.º 1 do artigo 21.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, por Guia DUC, dentro do prazo concedido.
Prazo de pagamento
O prazo de pagamento, bem como o montante, locais e o modo de pagamento da taxa de justiça e da respetiva multa constam da guia anexa.
Solicita-se a V. Ex.ª em face alteração do art.º 247º CPC, para informar se os advogados constantes da procuração junta aos autos se mantêm. (…)”
Em 06-02-2025 a Autora apresentou o seguinte requerimento:
“GESFIMO ESPÍRITO SANTO IRMÃOS. S.A,
Autora, nos autos supra, notificada para proceder ao “pagamento da 2ª prestação da taxa de justiça-14, n.º 3 do RCP”, com a referência para pagamento do valor total de € 2.040,00, vem dizer e solicitar o seguinte:
1. Com a Petição Inicial o autor liquidou (11.12.2020) o valor da Taxa de Justiça devida, correspondente, então, ao valor total indicado para a ação (€ 30.000,01), ou seja, o montante de € 612,00.
2. Assim, aquando da notificação da data para realização da audiência de julgamento, não havia lugar ao pagamento de uma segunda prestação que fosse devida, nos termos do estatuído no art.º 14.º RCP.
3. Entende, pois, a Autora, que não é aplicável in casu a cominação prevista no nº 3 do art.º 14.º RCP. Esta, salvo o devido respeito, só pode ser aplicada, conforme a letra do mesmo preceito, se “não tiver sido comprovada a realização do pagamento da segunda prestação” que seja devida.
4. Sobre a Autora recaí, é verdade, o ónus de liquidação do complemento da taxa de justiça devida, em virtude de por douta decisão, já transitada, ter sido fixado o valor da ação em € 2.387.985, 51.
5. A Autora penitencia-se por o não ter feito após esta última decisão, mas não pode deixar de expressar o seu entendimento de que a cominação aplicada não está legalmente prevista para a falta em causa.
Pelo que, com o douto suprimento que se solicita, deverá dar-se sem efeito a notificação que antecede.”
Tal requerimento foi apreciado por despacho de 11-02-2025 (despacho recorrido) no qual se decidiu:
“Atento o valor da causa fixado por decisão transitada em julgado o I. Advogado não podia ignorar que a taxa de justiça paga não era a correta e que precisa de ser reforçada, o que não fez.
Nestes termos, não tendo liquidado a 2.ª prestação da taxa de justiça, a mesma é devida, bem como a multa cobrada.
Notifique.
Emita-se nova guia.”
Notificada de tal despacho veio a Autora dele interpor recurso de apelação, apresentando as seguintes CONCLUSÕES:
A. Vem o presente recurso da decisão do Tribunal a quo que que decidiu — indeferindo a reclamação apresentada — ser devida a “multa cobrada”, por não ter sido “liquidada a 2 prestação da taxa de justiça”, no montante € 816,00.
B. Decidiu/considerou o Tribunal a quo que “Atento o valor da causa fixado por decisão transitada em julgado o I. Advogado não podia ignorar que a taxa de justiça paga não era a correta e que precisa de ser reforçada, o que não fez. Nestes termos, não tendo liquidado a 2.ª prestação da taxa de justiça, a mesma é devida, bem como a multa cobrada.”
C. Não se encontrando na Decisão impugnada qualquer fundamentação de Direito a mesma é nula, assim decorrendo da al. b) do n.º 1 e 3 do art.º 615º, ex vi n.º 3 do art.º 613º do CPC. Por que razão, o Tribunal a quo entendeu que havia lugar ao pagamento da 2º prestação da taxa de Justiça e aplicou a cominação do seu pagamento em dobro?
D. In casu não poderia determinar-se a cominação prevista no n.º 3 do art.º 14º do RCP, porquanto o âmbito de aplicação deste preceito se cinge, na letra da lei, à circunstância de “não ter sido comprovada a realização do pagamento da segunda prestação”.
E. A recorrente à data da emissão da guia para pagamento da 2ª Prestação e multa não tinha, é certo, cumprido aquele ónus, mas para esta omissão a lei não estatui a cominação determinada (art.º 14. nº 3 do RCP)
Nestes termos e nos melhores de Direito, com o muito douto suprimento de V.Exas., requer-se seja concedido provimento ao presente recurso,
Devendo, em conformidade:
(i) ser declarada nula a decisão proferida pelo Tribunal a quo por omissão de fundamentação.
(ii) E, em qualquer, caso revogar a Decisão impugnada, substituindo-a por outra que declare não ser devida a multa aplicada à Recorrente de € 816,00.”
*
O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida em separado e efeito meramente devolutivo.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II. O objecto e a delimitação do recurso
Consabidamente, a delimitação objectiva do recurso emerge do teor das conclusões do recorrente, enquanto constituam corolário lógico-jurídico correspectivo da fundamentação expressa na alegação, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio.
De outra via, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo.
No caso, a decisão directamente impugnada no recurso é o despacho da Exma. Sr.ª Juiz de Direito que desatendeu a reclamação da Autora no que concerne ao pagamento da segunda prestação da taxa de justiça acrescida de multa, cabendo-nos apreciar:
- da falta de fundamentação da mesma;
- da obrigação de pagamento por parte da Autora da 2.ª prestação da taxa de justiça, acrescida de multa de igual valor, sob as cominações do art.º 14.º, n.º 3, do CPC.
*
III. Os factos
Os factos relevantes para a decisão desta questão são os que constam do Relatório supra.
V. O Direito
Da Falta de fundamentação
Alega a este respeito a Autora que o despacho recorrido carece de fundamentação, circunstância essa geradora de nulidade do mesmo, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. b) do CPC.
As causas de nulidade da sentença e/ou dos despachos encontram-se enumeradas, de forma taxativa, no artigo 615º do Código de Processo Civil, dispondo esse preceito que, para além das demais situações contempladas nesse normativo, é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (alínea b), e os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível (nº 1, al. c); ou o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar (n.º 1 al. d).
Dispõe o artigo 615.º, n.º 1, b) do Código de Processo Civil que “1 - É nula a sentença quando: (…) b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; (…)”.
Dispõe o artigo 154.º n.º 1 do CPC que “as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas”, acrescentando o seu n.º 2 que “a justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição…”.
Conforme vem sendo decidido uniformemente pela jurisprudência, a falta de motivação a que alude a alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, motivo de nulidade da decisão, é a total omissão dos fundamentos de facto ou de direito em que assenta a decisão. «Uma especificação dessa matéria apenas incompleta ou deficiente não afecta o valor legal da sentença» - Acórdão do STJ de 05/05/2005, in www.dgsi.pt/jstj.
Veja-se, também, o Acórdão da Relação de Guimarães de 17/11/2004, in www.dgsi.pt/jtrg, onde se pode ler «O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), repetidamente aconselha que: a extensão da obrigação de motivação pode variar consoante a natureza da decisão e deve analisar-se à luz das circunstâncias do caso concreto; a motivação não deve revestir um carácter exageradamente lapidar, nem estar por completo ausente (cf. Vincent e Guinchard, Procédure Civile, Dalloz, §1232, e arestos aí citados). Mostra-se ainda útil esclarecer, a este propósito, que a exegese do disposto no art.º 668º nº1 al. b) C.P.Civ., de há muito vem entendendo que a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso – veja-se, por todos, Teixeira de Sousa, in «Estudos», página 222. Só a ausência de qualquer fundamentação é susceptível de conduzir à nulidade da decisão. Ao aludir-se a “ausência de qualquer fundamentação” quer referir-se a falta absoluta de fundamentação, a qual, porém pode reportar-se seja apenas aos fundamentos de facto, seja apenas aos fundamentos de direito.
Também a doutrina se pronuncia em sentido idêntico. Veja-se Teixeira de Sousa in «Estudos sobre o Processo Civil», pág. 221, «esta causa de nulidade verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (artigo 208.º, n.º 1 CRP e artigo 158.º, n.º 1 CPC) …o dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo (…) e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão (…); a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível».
Lebre de Freitas in «Código de Processo Civil Anotado», vol 2.º, pág. 669, refere que «há nulidade quando falte em absoluto indicação dos fundamentos de facto da decisão ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão, não a constituindo a mera deficiência de fundamentação».
De igual modo Antunes Varela in «Manual de Processo Civil», 2.ª edição, pág. 687, entende que a nulidade existe quando falte em absoluto a indicação dos fundamentos de facto ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão e não a mera deficiência de fundamentação.
O Tribunal recorrido não se limitou a desatender a pretensão da Autora. Embora de forma sucinta e lacónica referiu o porquê do seu entendimento: a circunstância de o Autor não ter efectuado o reforço da taxa de justiça em virtude da alteração do valor da causa.
Pelo que inexiste qualquer absoluta falta de fundamentação por parte da decisão recorrida.
Subsiste, não obstante, a questão da bondade desse mesmo despacho e dos argumentos em que o mesmo se esgrimiu.
da obrigação de pagamento por parte da Autora da 2.ª prestação da taxa de justiça, acrescida de multa de igual valor, sob as cominações do art.º 14.º, n.º 3, do CPC.
As custas, em sentido amplo, assumem, grosso modo, a natureza de taxa paga pelo utilizador do aparelho judiciário, reduzindo os custos do seu funcionamento no âmbito do Orçamento Geral do Estado (cfr., José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 2.º, 3.ª edição, p. 418). Esta, traduz a “prestação pecuniária que, em regra, o Estado exige aos utentes do serviço judiciário no quadro da função jurisdicional por eles causada ou de que beneficiem, como contrapartida do serviço judicial desenvolvido, sendo fixada (…) em função do valor e complexidade da causa, nos termos constantes do Regulamento das Custas Processuais” (assim, o Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, n.º 40/2011, de 19-04-2012, publicado no DR, II, n.º 113, p. 21078).
Isto porque, como já ensinava Alberto dos Reis (in “Código de Processo Civil Anotado”, Volume II - Coimbra Editora, 1981, pág. 199), a garantia constitucional do acesso ao Direito, prevista constitucionalmente no art.º 20.º da Constituição da República Portuguesa, não postula a gratuidade no acesso à justiça.
As custas processuais (lato sensu) compreendem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte, como dispõem o artigo 529º, n.º 1 do Código de Processo Civil e artigo 3º do Regulamento das Custas Processuais.
Muito concretamente, a taxa de justiça corresponde ao “montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixado em função do valor e complexidade da causa, nos termos do Regulamento das Custas Processuais” (cfr. artigo 529.º, n.º 2, do CPC).
Remete este preceito para o RCP, no qual a fixação da taxa de justiça se fixará nos termos dos artigos 5.º a 7.º, 11.º, 13.º a 15.º e das tabelas I e II anexas.
Nos termos previstos no n.º 1 do artigo 6.º do RCP, “a taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A”, que faz parte integrante do RCP.
O elemento que implica o pagamento da taxa de justiça é, assim, o impulso processual do interessado que corresponde à prática do acto de processo que dá origem a “núcleos relevantes de dinâmicas processuais” como a acção, a execução, o incidente, o procedimento cautelar e o recurso (cfr., Salvador da Costa, As Custas Processuais - Análise e Comentário, 7ª edição, Almedina, p. 15).
Quanto ao modo como se efectiva, a taxa de justiça é paga nos termos fixados no CPC - cfr. artigo 13.º, n.º 1, do RCP-, sendo a oportunidade do seu pagamento regulada no artigo 14.º do RCP, devendo ser paga no momento do respectivo impulso processual, em uma ou duas prestações, por meio de autoliquidação da parte, para o que esta deverá socorrer-se das tabelas anexas ao diploma e, no caso de processo cuja taxa seja variável, liquidará a taxa pelo seu valor mínimo, pagando o excedente, se o houver, a final (cf. artigo 6.º, n.º 6 do RCP).
Dispõe o artigo 14.º do RCP (com as alterações introduzidas pela Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro, pelo D.L. n.º 126/2013, de 30 de agosto e pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março) que:
“1 - O pagamento da primeira ou única prestação da taxa de justiça faz-se até ao momento da prática do acto processual a ela sujeito, devendo:

a. Nas entregas eletrónicas, ser comprovado por verificação eletrónica, nos termos da portaria prevista no n.º 1 do artigo 132.º do Código de Processo Civil;
b. Nas entregas em suporte de papel, o interessado proceder à entrega do documento comprovativo do pagamento.
2 - A segunda prestação da taxa de justiça deve ser paga no prazo de 10 dias a contar da notificação para a audiência final, devendo o interessado entregar o documento comprovativo do pagamento ou comprovar a realização desse pagamento no mesmo prazo.
3 - Se, no momento definido no número anterior, o documento comprovativo do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça ou da concessão do benefício de apoio judiciário não tiver sido junto ao processo, ou não tiver sido comprovada a realização do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, a secretaria notifica o interessado para, no prazo de 10 dias, efectuar o pagamento, acrescido de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC.
4 - Sem prejuízo do prazo adicional concedido no número anterior, se no dia da audiência final ou da realização de qualquer outra diligência probatória não tiver sido junto ao processo o documento comprovativo do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça e da multa ou da concessão de benefício do apoio judiciário, ou não tiver sido comprovada a realização do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, o tribunal determina a impossibilidade de realização das diligências de prova que tenham sido ou venham a ser requeridas pela parte em falta.
5 - Nos casos em que não haja lugar a audiência final, não sendo dispensada a segunda prestação nos termos do artigo seguinte, esta é incluída na conta de custas final.
6 - Quando se trate de causa que não importe a constituição de mandatário e o acto seja praticado directamente pela parte, só é devido o pagamento após notificação de onde conste o prazo de 10 dias para efectuar o pagamento e as cominações a que a parte fica sujeita caso não o efectue.
7 - O documento comprovativo do pagamento perde validade 90 dias após a respectiva emissão, se não tiver sido, entretanto, apresentado em juízo ou utilizado para comprovar esse pagamento, caso em que o interessado solicita ao Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça, I. P., no prazo referido no número seguinte, a emissão de novo comprovativo quando pretenda ainda apresentá-lo.
8 - Se o interessado não pretender apresentar o documento comprovativo em juízo, requer ao Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça, I. P., no prazo de seis meses após a emissão, a sua devolução, mediante entrega do original ou documento de igual valor, sob pena de reversão para o referido Instituto.
9 - Nas situações em que deva ser pago o remanescente nos termos do n.º 7 do artigo 6.º, o responsável pelo impulso processual que não seja condenado a final fica dispensado do referido pagamento, o qual é imputado à parte vencida e considerado na conta a final.”.
Cumpre relembrar os seguintes factos que, a esse propósito resultam do processado:
A Autora pagou, com a apresentação da petição inicial, 612 € de taxa de justiça, na modalidade de prestação única, quando os autos tinham o valor indicado pela Autora de 30.001€.
Em face do disposto no ponto 2 da Tabela I-A para que remete o artigo 6º, número 1 do Regulamento das Custas Processuais, a taxa de justiça devida em função do valor então dado à acção era de 6 Uc, ou seja, de 612 €.
A Autora pagou, assim, a totalidade da taxa de justiça devida aquando da apresentação da petição inicial.
O que vale dizer que, a manter-se o valor da acção, a Autora não teria, com a notificação da designação de data para julgamento, de proceder ao pagamento de qualquer outra prestação a título de taxa de justiça.
Sucede que, posteriormente, o valor da acção foi alterado por virtude de decisão transitada em julgado.
Com efeito, em A 12-01-2023 foi proferido o seguinte despacho:
“Fixação do Valor da Causa
Dispõe o n.º 1 do artigo 296.º do CPC que “a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal o qual representa a utilidade económica imediata do pedido”.
Segue-se o 297º, nº 1, onde se estatui, “se pela ação se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário; se pela ação se pretende obter um benefício diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse benefício.”
Ora, pese embora não se tenha levado a cabo um pedido de condenação no pagamento de juros, “por fim a uma incerteza existente entre as partes” quanto aos juros devidos é efetivamente um benefício diverso e que claramente equivale a uma quantia em dinheiro.
Equivalerá, designadamente à diferença entre o montante obtido através do cálculo de juros como pretendido pela autora e o montante obtido através do cálculo de juros como pretendido pela ré.
Para efeito de apurar o benefício que pretende a autora obter com a ação, e fixar o respetivo valor, veio a mesma, a convite do Tribunal, explicitar qual a diferença do montante de juros liquidados até ao momento da entrada da ação em juízo, considerando, por um lado, a declaração por si pretendida quanto ao respetivo cálculo e, por outro, a taxa de juro pretendida aplicar pela ré, concluindo, em termos bem explicitados, ascender ao valor de 2.387.986,31: (€ 6.208.764,38 - € 3.820.778,07).
Notificada, a contraparte não se opôs à conclusão.
Fixo, pois, o valor da ação em 2.387.986,31 euros.”
Em virtude de tal despacho o Tribunal declarou-se incompetente em razão do valor, ordenou a remessa dos autos para os Juízos Centrais cíveis, sem que a Autora tivesse procedido ao pagamento dos adequados complementos da taxa de justiça devida ou tivesse sido notificada pelo Tribunal para o efeito.
A Recorrente argumenta que, por que tinha procedido ao pagamento da totalidade da taxa de justiça devida no momento em que apresentou a petição, entendeu que não havia lugar a qualquer pagamento de taxa de justiça após a notificação da marcação da audiência de julgamento.
Isso mesmo por ela foi argumentado quando, a 21-09-2023 pediu a anulação da guia para pagamento que lhe fora enviada pela secção.
Sobre tal requerimento, pronunciou-se o Tribunal nos seguintes termos:
“Atento o valor da causa fixado por decisão transitada em julgado o I. Advogado não podia ignorar que a taxa de justiça paga não era a correta e que precisa de ser reforçada, o que não fez.
Nestes termos, não tendo liquidado a 2.ª prestação da taxa de justiça, a mesma é devida, bem como a multa cobrada.
Notifique.
Emita-se nova guia.”
São estes os factos a relevar para o conhecimento da questão por apreciar.
Estabelece o artigo 11º do Regulamento das Custas Processuais que a base tributável para efeitos de taxa de justiça corresponde ao valor da causa, com os acertos constantes da tabela I a ele anexa, e fixa-se de acordo com as regras previstas na lei do processo respetivo.
A regra geral quanto ao momento da determinação do valor do processo, nos termos do art.º 299.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, é a de que deve atender-se ao momento em que a ação é proposta.
Do n.º 3 do mesmo artigo resulta que o aumento do valor da ação decorrente de pedido formulado pelo réu ou por interveniente só produz efeitos quanto aos actos e termos posteriores à reconvenção ou intervenção.
Todavia, nos termos do n.º 4 desse preceito, “Nos processos de liquidação ou noutros em que, analogamente, a utilidade económica do pedido só se define na sequência da ação, o valor inicialmente aceite é corrigido logo que o processo forneça os elementos necessários.”.
Depois dessa fixação do valor, na fase final de articulados e em momento prévio ao despacho saneador, o Tribunal não ordenou o pagamento de qualquer reforço da taxa de justiça e nem a secção o liquidou.
O artigo 21º da Portaria 419-A/2009, prevê que:
“1 - O pagamento das custas e o pagamento antecipado de encargos, multas, taxa sancionatória excecional e outras penalidades é efetuado mediante a emissão de guia acompanhada do DUC, para além dos demais casos previstos na presente portaria, quando caiba à secretaria notificar a parte para o pagamento da taxa de justiça.
2 - A emissão da guia pelo tribunal é feita em duplicado, contendo os seguintes elementos:
a) Número sequencial;
b) Identificação do tribunal, juízo ou secção emitente e respectivos códigos;
c) Natureza, tipo e número do processo;
d) Nome do responsável pelo pagamento;
e) Discriminação dos descritivos e respectivos montantes;
f) Indicação do total a pagar;
g) Data limite de pagamento;
h) Data de emissão e assinatura.
3 - A guia é emitida a solicitação do responsável pelo pagamento ou, oficiosamente, sempre que se inicie o decurso de um prazo de pagamento de quantias pagáveis por guia, sem prejuízo no artigo 10.º da presente portaria, e poderá integrar no mesmo documento o DUC.
4 - Quando solicitada, a guia é imediatamente emitida e entregue ao responsável pelo pagamento ou enviada ao responsável que não estiver presente.”
Conforme se afirma no Ac. da R.P. de 03-06-2024, “Nenhuma norma legal impõe expressamente o imediato pagamento de qualquer reforço da taxa de justiça em função da alteração do valor da ação e, no caso, tal pagamento não só não foi ordenado pelo Tribunal como não foi liquidado de imediato pela secção de processos nos termos do transcrito preceito (…)”.
Certo é, contudo, que no momento em que foi designada a audiência de julgamento o valor da ação estava já fixado em 2.387.986,31 €.
O despacho recorrido confunde, por isso, desde logo duas situações distintas – 2.ª prestação da taxa de justiça e reforço da taxa de justiça - dando-lhes igual tratamento: uma coisa é a 2.ª prestação da taxa de justiça (a que alude o art.º 14.º, n.º 2 do CPC), outra coisa é o reforço da taxa de justiça por virtude da alteração do valor da acção.
Ou bem que o que está em causa é a falta de pagamento da 2.ª prestação da taxa de justiça – como se refere na guia de pagamento – ou bem que o que está em causa é a falta de pagamento do reforço da taxa de justiça por virtude da alteração do valor da acção – como se refere no despacho recorrido.
Cumpre, todavia, referir que o pagamento da segunda prestação da taxa de justiça só é devido quando a mesma não foi integralmente paga com a petição inicial/contestação. É efectivamente isso que resulta do art.º 14.º do Regulamento das Custas processuais que aqui se convoca:
“1- O pagamento da primeira ou única prestação da taxa de justiça faz-se até ao momento da prática do acto processual a ela sujeito, devendo:
a) Nas entregas eletrónicas, ser comprovado por verificação eletrónica, nos termos da portaria prevista no n.º 1 do artigo 132.º do Código de Processo Civil;
b) Nas entregas em suporte de papel, o interessado proceder à entrega do documento comprovativo do pagamento.
(…).”.
Ora, a Autora, ora Recorrente, havia pago a taxa de justiça devida na sua totalidade no momento em que apresentou a petição inicial pelo que entendeu - e bem - não haver lugar ao pagamento de qualquer segunda prestação quando foi notificada da designação da audiência de julgamento.
Muito embora nessa data estivesse já alterado o valor da causa por virtude do despacho de 12-01-2023, o facto é que não foi pedido às partes (quer à Autora, quer à Ré – que até então não havia solicitado beneficio de apoio judiciário e que só o fez posteriormente) qualquer reforço da taxa de justiça até esse momento.
Seria, efectivamente, de esperar que se o Tribunal entendesse que a alteração do valor implicava o pagamento de reforço da taxa de justiça, o mesmo devesse ter solicitado/determinado tal pagamento em momento prévio, em consequência da referida alteração do valor da causa, e não apenas no momento destinado ao pagamento da segunda prestação da taxa de justiça.
Da consulta dos autos resulta que a secção tratou da questão como sendo de 2.ª prestação da taxa de justiça e o tribunal recorrido, emendando a mão da secção, trata a questão como de reforço da taxa de justiça, mas num despacho pouco fundamentado e dúbio, convola a guia para pagamento da 2.ª prestação da taxa de justiça numa guia para pagamento do reforço da taxa de justiça, equiparando as duas situações.
Acontece que as duas situações não são equiparáveis e acarretam, consigo, consequências diversas.
O Tribunal apreciou o requerimento apresentado pela Autora afirmando ser devido o pagamento da referida 2.ª prestação da taxa de justiça fundamentando tal decisão na circunstância de a Autora não ter procedido a qualquer reforço do pagamento da taxa de justiça, na sequência da decisão que alterou o valor da causa, bem como o pagamento da multa de igual valor.
Se o Tribunal entendesse ser devido o pagamento de um reforço da taxa de justiça aquando da designação da audiência de julgamento na decorrência da anterior alteração do valor da causa, sempre seria de atender a reclamação da Autora quando argumenta que não podia legitimamente contar com tal entendimento pelo que, pelo menos, não teria de pagar a multa que lhe foi liquidada por falta de pagamento atempado.
Com efeito, na falta de reforço da taxa de justiça, o regime a seguir é substancialmente diverso do da falta de pagamento da 2.ª prestação da taxa de justiça.
A pagamento da 2.ª prestação da taxa de justiça é efectuado por autoliquidação, não carecendo de qualquer notificação ou emissão de guia para o efeito. E, por essa mesma razão, não sendo tal pagamento efectuado nos termos que constam do art.º 14º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais, a consequência é a emissão oficiosa de guias e a notificação, pela secretaria, para pagamento do valor da prestação acrescida de multa de igual montante.
Já diferentemente se passa na situação de necessidade de reforço da taxa de justiça. Como se referiu supra, nenhuma norma legal impõe às partes, expressamente, o imediato pagamento de qualquer reforço da taxa de justiça em função da alteração do valor da acção.
Impõe, isso sim, o imediato pagamento – por autoliquidação - da taxa de justiça aquando da apresentação da petição inicial.
Depois disso, deverá ser a secção a emitir guias, ou o Autor a solicitá-las, querendo, para pagamento do reforço. Mas a falta de pagamento, sem qualquer notificação para o efeito, não determina a aplicação imediata de multa.
Assim, em nosso entender, fixado novo valor à acção que determine um reforço da taxa de justiça inicialmente paga, e caso o Autor não venha solicitar a emissão de guias, impõe-se:
- que a secção emita guias em conformidade – e em singelo - e notifique a parte para proceder a tal pagamento;
Depois, e só depois desta notificação, se colocará a questão das consequências da omissão do pagamento do complemento da taxa de justiça decorrente do aumento do valor da acção.
Quanto a esta última questão, e na falta de disposição expressa da lei, são várias as posições que se podem assumir, todas elas numa lógica de analogia ou de argumento de igualdade de razões.
Não obstante, afigura-se-nos que, neste momento não importa convocar tal questão.
Neste concreto momento dos autos, importa que o Tribunal, concluindo pela desnecessidade de pagamento de 2.ª prestação da taxa de justiça, determine a emissão de guias para pagamento do reforço da taxa de justiça devida, tendo em atenção o valor fixado à causa.
Assiste, assim, inteira razão à Recorrente, devendo ser revogada a decisão que julgou devido o pagamento da 2.ª prestação da taxa de justiça, acrescida de multa de igual valor – e consequente restituição do valor pago - e determinada a emissão de guia para pagamento do reforço da taxa de justiça, tendo em atenção o valor fixado à acção de 2.387.986,31.
*
V. Decisão
Pelo exposto, os Juízes da 6.ª Secção da Relação de Lisboa acordam, na total procedência da apelação, revogar a decisão recorrida, que deverá ser substituída por outra que determine a emissão de guias para pagamento do reforço da taxa de justiça, em singelo, tendo em atenção o valor fixado à acção no despacho de 12-01-2023, restituindo-se à Autora o valor do pagamento efectuado, na sequência da emissão da guia de 12-02-2025, com a referência 703480101584334.
Sem custas.
Notifique e registe.
*
Lisboa, 8 de Maio de 2025
Maria Teresa F. Mascarenhas Garcia
António Santos
Vera Antunes