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ACÇÃO ESPECIAL DE ACOMPANHAMENTO DE MAIOR
EXAME PERICIAL
NATUREZA FACULTATIVA
PRINCÍPIO DA CONVENIÊNCIA
DECISÃO SURPRESA
RECURSO AUTÓNOMO
DESIGNAÇÃO DO ACOMPANHANTE
CRITÉRIOS
Sumário
Sumário[1]: I – As eventuais deficiências existentes no recurso da matéria de facto não são sanáveis pela via do aperfeiçoamento, o qual está apenas reservado aos recursos da matéria de direito e no que se refere às conclusões (como decorre dos artigos 639.º e 640.º do Código de Processo Civil). II – A acção especial de acompanhamento de maior tem um regime que começa por decorrer dos artigos 546.º, n.ºs 1 e 2 e 891.º a 904.º do Código de Processo Civil, é complementado pelas disposições gerais e comuns que, com as necessárias adaptações, lhe sejam aplicáveis (uma vez que se não se tratando de um processo de jurisdição voluntária - artigos 891.º, n.º 1 e 986.º e seguintes -, estas podem ser-lhe aplicadas). III - Dos artigos 139.º do Código Civil, 897.º e 898.º do Código de Processo Civil resulta a concretização dos princípios ordenadores que decorrem da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. IV– A decisão sobre as diligências probatórias a realizar no âmbito de um processo especial de acompanhamento de maior obedece ao critério da sua conveniência para a justa decisão da causa, à luz de todos os princípios substantivos e processuais orientadores deste tipo de processo, obrigando a uma indispensável ponderação casuística. V – O exame pericial, no processo especial de acompanhamento de maior, é facultativo e não obrigatório, como resulta da conjugação do previsto no n.º 1 do artigo 899.º, com o previsto no n.º 1 do artigo 897.º, e no n.º 2 do artigo 898.º (o que permite a dispensa do perito ou da elaboração do respectivo relatório pericial, por Despacho proferido antes da elaboração da Sentença). VI - O despacho que indefere a realização de uma perícia médica por a considerar desnecessária à luz de um critério de conveniência (em face dos dados já constantes dos autos e depois da audição do/a Beneficiário/a) apenas pode ser impugnado no recurso interposto da sentença final (artigo 644.º, n.º 3), pois não se trata de um despacho de rejeição de um meio de prova, nos termos e para os efeitos da parte final da alínea d) do n.º 2 do mesmo artigo. VII – O Despacho referido em VI não constitui qualquer decisão-surpresa. VIII – Conjugando os artigos 140.º e 143.º do Código Civil, o critério a observar na designação do/a Acompanhante é o do “imperioso interesse do beneficiário” (que se reporta aos direitos humanos e liberdades fundamentais da pessoa, nomeadamente aos seus direitos à solidariedade, ao apoio e à ampliação da sua autonomia), relevando – em primeira linha - a escolha do Acompanhado (nos termos do n.º 1 do artigo 143.º), a qual pode incidir sobre pessoa maior e no pleno exercício dos seus direitos e que esteja nas melhores condições para promover o bem-estar emocional do Beneficiário, assegurando-lhe, na medida do possível, uma vida autónoma e independente. IX – Apesar de uma hierarquização tendencial, inexiste uma ordem de prevalência entre os/as nomeáveis como Acompanhante. X – É lúcida e equilibrada a nomeação como Acompanhante do Beneficiário, da filha que o tem acompanhado, quando a cônjuge tem mais de oitenta anos e está também incapacitada.
[1] Da responsabilidade do Relator, em conformidade com o n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil.
Texto Integral
Decide-se na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa[1]
Relatório
O MINISTÉRIO PÚBLICO intentou acção especial para acompanhamento de maior de G, peticionando que, ao abrigo do artigo 145.º do Código Civil, seja decretado o seu acompanhamento por razões de saúde, “requerendo-se a aplicação das seguintes medidas de acompanhamento:
i. Representação geral, com administração total de bens, previstas no artigo 145.º, ns.º 2, alíneas b) e c )e 4 do Código Civil, com exclusão do direito de sufrágio, nos termos do disposto no artigo 147.º, n.os 1 e 2, todos do Código Civil.
ii. Limitação do direito de testar, previsto no artigo 147.º, n.º 2 do Código Civil.
iii. Dispensar a constituição do conselho de família”. Em síntese, alega o Ministério Público que o beneficiário sofre de síndrome demencial e está diagnosticado com doença de Alzheimer, não sendo capaz de descrever o dia-a-dia, não dispondo de capacidade de orientação no espaço, andar sozinho na rua ou regressar a casa, não logrando situar-se no tempo, não conseguindo cozinhar a sua alimentação, não conseguindo tomar a medicação sozinho sem a orientação de terceiros, não tendo a capacidade para realizar a sua higiene pessoal sem ajuda, nem conseguindo efectuar os pagamentos relativos às despesas inerentes à casa, nem manter uma conversa simples e com sentido, pelo que se encontra, em suma, impossibilitado de gerir o seu património, de exercer plena, pessoal e conscientemente os seus direitos e cumprir os seus deveres (para além de ser agressivo e sofrer frequentes alterações de humor).
Frustrada a citação pessoal do Requerido, foi nomeado defensor oficioso que contestou. Procedeu-se à audição pessoal do Beneficiário e à inquirição da pessoa indicada para acompanhante.
Em Despacho prévio à prolação da Sentença, o Tribunal a quo dispensou a realização de exame pericial[2].
Foi prolatada Sentença, que concluiu pelo seguinte Dispositivo:
“Face ao exposto, julgo a ação totalmente procedente e, em consequência, nomeio M, residente na Rua ------, como acompanhante de G, residente na --------, e atualmente institucionalizado no Lar ---, sito no Funchal, a quem cometo as seguintes medidas de acompanhamento:
• • Representação especial as instituições e organismos oficiais, incluindo Instituições de Saúde, Finanças, Segurança Social, Tribunais, Conservatórias de Registo, Centro Nacional de Pensões, Lares, Centros de Dia, Instituições de Solidariedade Social, Entidades Bancárias e Correios.
• • Administração total dos bens e rendimentos do beneficiário.
Mais declaro que o beneficiário não tem capacidade para testar.
Fixo como data da necessidade das medidas aplicadas, 31/01/2023.
As medidas aplicadas deverão ser revistas no prazo de 5 anos.
Dispenso a composição do conselho de família.
Consigno que não há registo de que o beneficiário outorgou testamento vital ou procuração de cuidados de saúde.
Valor da ação: 30.000,01€.
Sem custas.
Registe e notifique”.
É desta Sentença que o Beneficiário veio apresentar Recurso, juntando Alegações, que culminou com as seguintes Conclusões:
“1 -O presente Recurso, assenta assim na letra do disposto nos artigos 607.º, n.º2, 3, 4, e 5, 615º n.º 1 als. b), c) e d) e nº 4 a contrario, 629.º, n.º 1, 630.º n.º 1 a 645.º, 646.º e 647.º, 901.º, todos do C.P.C., padecendo a Sentença do douto Tribunal de enferma de nulidade por vício insanável e violação do disposto no nº 4 do artigo 20.º, 29.º e 32.º da C.R.P., do direito a um processo equitativo, do princípio do processo justo e equitativo, do princípio do contraditório e do princípio da igualdade de armas ínsito no direito à prova, havendo deste modo uma decisão surpresa por parte do douto Tribunal a quo. 2- O Recorrente, discorda da douta Sentença, referente à fundamentação e Decisão que recaiu na Ação de Maior Acompanhado, determinando-se aparentemente sujeito ao regime legal do Maior Acompanhado, sem demais considerações e fundamentação, e com fundamento, salvo melhor entendimento, contra legem, até porque, em sede de Sentença, o Tribunal a quo, e mal, começa ab initio com Despacho, violando não só a letra da Lei como ultrapassando os limites legais adstritos à mesma, subsistindo adstrita a estes factos, uma nulidade de Sentença por omissão de pronúncia. 3-Invoca o Recorrente uma inquestionável violação de Lei e nulidade insanável (Despacho em sede de Sentença)! 4-Sem necessidade de considerações extensas por se considerar, salvo o devido respeito, que é evidente e exacerbada a violação de Lei, pois, Contra legem facit quid id facit quod lex prohibet, ou seja, não é permitido por Lei, proferir Despachos em sede de Sentença, no sentido de deferir ou indeferir, in casu, meio de prova à boa decisão da Causa.
5- Nulidades estas, insanáveis, que desde já se invocam para os devidos efeitos legais, nos termos dos artigos 607.º do C.P.C., sendo evidente e exacerbada a violação de Lei nos termos do art.º 20.º e 29.º da C.R.P., por denegação de justiça e omissão de pronúncia. 6-E, salvo melhor entendimento, não há lugar a Despachos sejam eles quais forem em sede de Sentença, até porque, tal, denegaria justiça, violando o preceito do art.º 20.º e 29.º da C.R.P., o que acontece in casu.
7-A fundamentação de facto provada, e não provada, com a indicação dos meios de prova que levaram à Decisão, bem como, a fundamentação da convicção do julgador deve de ser feita de forma clara, objetiva e discriminada, de modo que as partes, destinatárias imediatas da Decisão, saibam o que o Tribunal considerou provado e não provado e qual a fundamentação dessa Decisão.
8-O que não aconteceu nos presentes autos, não tendo sido indicados nomeadamente quais os factos não provados. 9-Existe o dever quanto aos factos julgados provados e não provados, de especificar os fundamentos decisivos para a formação da convicção do Tribunal, o que não aconteceu no presente processo, consubstanciando uma nulidade que desde já se invoca.
10-Aliás, o mesmo raciocínio aplica-se a tudo o exposto, e a tudo o solicitado em sede de Resposta, inexistindo pronúncia pelo Tribunal a quo nos presentes autos.
11-Nulidade que desde já se alega para os devidos efeitos legais.
12-Ao Recorrente, apenas foi notificado em sede de Sentença, um Despacho, não existindo outro meio, se não o presente Recurso, para reagir contra tal Despacho. 13-Não obstante, e por outro meio não existir, o Recorrente, desde já alega as presentes nulidades para os devidos efeitos legais, consubstanciando as mesmas, em diversas omissões de pronúncia quanto à Resposta apresentada e demais situações expostas, bem como, uma violação de Lei por determinar Despacho em sede de Sentença, nos termos dos já alegados artigos no ponto 1 das presentes conclusões. 14-Conforme o alegado no presente Recurso, e com enorme surpresa, constata o Requerido, ora Recorrente, de uma inquestionável denegação de justiça adstrita a uma nulidade insanável, que só poderá repercutir-se na repetição de todos os atos que se demonstrem necessários, antecedentes à prolação da Sentença, de modo a acautelar-se o superior interesse do Beneficiário aqui em causa.
15-Sem prescindir, da nulidade da criação de um interveniente incidental não indicado em sede de Sentença, nem interveniente como parte no processo.
16-O Recorrente alega ainda a nulidade quanto ao nomeado interveniente incidental, que aparece após a prolação de Sentença, sendo notificado de um processo sigiloso, sem qualquer consentimento do ora Recorrente, e sem qualquer Despacho ou Decisão nesse mesmo sentido, ou seja, que o constitua nessa qualidade e para esse efeito!
17-Vide ponto V – Dispositivo da Sentença, onde inexiste tal Decisão, tal indicação e tal constituição de interveniente incidental!
18-Nulidade insanável, e postura altamente gravosa assumida, por quem por sua própria e livre iniciativa, sobrepõe-se ao Tribunal a quo, e à douta Decisão, notificando elemento (parte) estranha ao processo, que não teve qualquer intervenção e que não está indicada ou constituída como interveniente incidental!
19-Salienta-se ainda a devassa da vida privada, dos dados clínicos e dos dados que constam no processo que deviam estar protegidos não só à luz do R.G.P.D., como por o presente processo consubstanciar um processo sigiloso!
20-Termos em que, não se compreende nem se aceita, tal postura adotada pelo Tribunal a quo, que denega, novamente, justiça ao Recorrente nos termos do art.º 20.º e 29.º da C.R.P., como viola de forma exacerbada, a vida do ora Recorrente. 21-Não sendo admissível, que se adotem comportamentos, de introdução de partes alheias ao processo, por iniciativa própria, e que não constam em Sentença, ou em qualquer elemento do Processo. 22-Assim, a notificação, efetuada na qualidade de Interveniente Acidental, relativamente ao processo supra, consubstancia uma nulidade insanável, e uma violação expressa de Lei e da própria Sentença, que desde já se alega para os devidos efeitos legais, sendo inquestionável a denegação de justiça na presente situação, e o abuso de poder, por quem, detém acesso ao Processo e abusivamente dele, faz uso próprio! 23-Da denegação de justiça quanto à falta de entrega da gravação indicada em sede de Ata de Audição do Beneficiário.
24-Sendo que, para todos os efeitos legais, impugna-se o teor da Ata por não corresponder ao efetivamente ocorrido na Audição do Beneficiário.
25-Novamente, com enorme surpresa, constata o Recorrente, de uma inquestionável denegação de justiça adstrita a uma nulidade insanável, que só poderá repercutir-se na repetição de todos os atos que se demonstrem necessários, quanto ao facto de requerer a gravação efetuada em sede de audição do mesmo e a mesma ter sido negada em sede presencial na Secretaria dos presentes autos.
26-Tendo sido referido pelo Sr. Oficial de Justiça que, para ter acesso à dita gravação, teria de exarar requerimento escrito a solicitar a dita autorização à Mma. Juiz do Processo, pelo que, o Recorrente assim o fez.
27-Sendo que, até hoje, não obteve qualquer resposta ou qualquer Despacho pela Mm. Juiz de Direito, continuando a ser negado pelo Sr. Oficial de Justiça a entrega da dita gravação, para efeitos do presente Recurso, o que não se concebe, por violação da letra da lei, nomeadamente do artigo 646.º do C.P.C., onde se inclui, a gravação da Audição que consta do suporte físico do sistema de gravação do Tribunal, conforme exarado em Ata da Audição do Beneficiário. 28-É inquestionável, a denegação de justiça nos presentes autos, o que só se pode consubstanciar numa nulidade insanável, e num abuso de poder, por quem, detém acesso ao Processo e dele, faz uso abusivo, limitando e recusando a entrega de elementos necessários ao fim do presente recurso. 29-Sem prescindir, desde já se invoca a nulidade da fundamentação de Facto e de Direito.
30-A fundamentação de facto provada, e não provada (inexistente), com a indicação dos meios de prova que levaram à Decisão, bem como, a fundamentação da convicção do julgador deve de ser feita de forma clara, objetiva e discriminada. 31-Tal é exigido com o fundamento de as partes, que são destinatárias imediatas, saibam efetivamente e sem dúvidas, o quê que, o Tribunal considerou e, qual foi a sua convicção.
32-A fundamentação de facto e de direito gravemente insuficiente, aliás, no modesto entender do Recorrente, omissa, é em termos tais que não permite ao respetivo destinatário a perceção das razões de facto e de direito da decisão judicial, pelo que, deve ser equiparada à falta absoluta de especificação dos fundamentos de facto e de direito e, consequentemente, determinar a nulidade do ato decisório, que desde já se invoca.
33-Aliás, dúvidas existissem, é impossível constatar em sede de Sentença, qual a fundamentação de facto e de direito, bem como, em que termos clínicos foi merecedora de livre arbítrio em Sentença tais fundamentos, e em que termos e como, até porque, denote-se que até ao presente dia, não foram elucidados os esclarecimentos requeridos pelo próprio Recorrente, nem foi realizada a perícia, existindo Despacho só na própria Sentença, que deveria ter existido anteriormente! 34-E, nem se dignou o Tribunal a quo, até à data da prolação da Sentença, a proferir Decisão sobre os esclarecimentos solicitados pelo Recorrente, fundamentais à boa decisão da causa!
35-Pois certo de que, foram requeridos diversos esclarecimentos, não tendo, o Tribunal a quo, se dignado a dar Despacho sobre tais matérias.
36-Despacho esse inexistente, termos em que, não se compreende, como é que, esquece o Tribunal a quo de tal direito, exarando em Sentença fundamentos, como se, tal Despacho tivesse sido proferido de acordo com a letra da Lei.
37-O que, consubstancia uma nulidade, extremamente gravosa em sede de fundamentação.
38-Sendo certo que, posteriormente às Alegações orais, e no momento da notificação da Sentença, não restam instrumentos ao Recorrente de reação contra tal situação, como aliás, bem sabe o Tribunal a quo, nos termos dos art.º 630.º e ss C.P.C.
39-Ora, tal postura, consubstancia uma denegação de justiça in casu, infelizmente, reiterada!
40-Quanto à ainda nulidade da sentença por omissão de pronúncia
41-Ora, em primeiro lugar, o Tribunal a quo, assume conhecer que o Recorrente é casado, sendo essa a primeira pessoa segundo os termos da Lei, a pessoa a exercer o cargo de acompanhante, conforme já alegado pelo Recorrente, e alegado pelo Ministério Público, e bem, em sede de Alegações. 42-No entanto, não procura sanar a presente nulidade, fazendo letra morta, dos próprios factos provados pelo Tribunal a quo. 43-Ora, tal como um copo vazio não tem qualquer conteúdo, também o regime jurídico do maior acompanhado por si só, sem que sejam fundamentadas de facto e de direito inequivocamente quais as medidas, constitui um recipiente vazio, sem conteúdo.
44-Na verdade, trata-se apenas do nome de um instituto cuja configuração concreta é dado pelas medidas que são aplicadas e respetiva fundamentação.
45-Pois vejamos, o Tribunal a quo, em sede de III – Motivação de facto, fá-lo de forma parca e incompleta, contendo inclusive, erros supra enunciados, e em sede de fundamentação de Direito ponto IV – Do Direito, fá-lo confundindo Direito com matéria de facto de forma incompreensível, enunciando a aplicação dos factos in casu. 46-Aliás, a fls. 6, 7 e 8 da douta Sentença, tidas todas elas como ponto IV – Do Direito, o Tribunal a quo, por manifesto lapso, faz referência aos factos dos presentes autos, referindo em Matéria de direito, factos tidos como provados, e elementos constitutivos, que a indicar, seriam em sede própria, e não em Matéria de Direito.
47-Assim, consubstancia o exposto uma verdadeira omissão de pronúncia, que aqui expressamente se invoca, que acarreta a nulidade da sentença - 615.º, n.º 1, d), do C.P.C., podendo ser invocada em sede de recurso, uma vez que a sentença é recorrível – artigo 615.º, n.º 4 e 901.º do C.P.C.
48-Tal omissão verifica-se, por um lado, porque o Tribunal não pode deixar de aplicar medidas concretas no âmbito do regime do maior acompanhado, conforme resulta da estrutura de todo o seu regime e, em concreto, do artigo 145.º do Código Civil e do artigo 900.º, n.º 1, do C.P.C., e por outro lado porque, quanto ao fundamento de facto e de Direito, não pode omitir factos, provados e não provados, nem confundir a fundamentação de Direito em facto e vice versa. 49-A omissão verifica-se ainda porquanto a aplicação de medidas (no caso, representação geral) foi expressamente requerida pelo Ministério Público no requerimento inicial, pelo que, de todo o modo, o Tribunal estava obrigado a conhecer daquele pedido, não podendo abster-se de se pronunciar quanto ao mesmo, nomeadamente, porque em sede de Alegações orais, o Ministério público, e bem, alertou de algumas nulidades aqui expostas, não tendo em conta o Tribunal a quo de tais elementos.
50-E, sem prescindir, sempre se dirá que o mesmo se aplica à Resposta dada pelo ora Recorrente, não podendo abster-se de se pronunciar quanto à mesma, até porque, tal seria, e, é, in casu, uma Denegação de Justiça.
51-Ainda que se entenda que não existe uma nulidade, por omissão de pronúncia, a aplicação de medidas de acompanhamento é, em qualquer caso, obrigatória, pelo que o Tribunal estava obrigado a aplicá-las e, ao fazer, tem de fazê-lo devidamente fundamentado!
52-Violou assim, o Tribunal a quo, além do mais, as disposições supra referidas, o que, em qualquer caso, e à cautela, constitui fundamento subsidiário deste recurso, pois certo é que, o Tribunal não pode alegar um desconhecimento da Lei.
53-Requer-se assim, a Vas. Exas., que seja tido em conta tudo o exposto em sede de Resposta, do presente Recurso e Conclusões, declarando-se a sentença como Nula por falta de fundamentação e omissão de pronúncia, e por se fundamentar incorretamente, sob pena de, a assim se manter, ser manifestamente incompreensível, o que é de Direito, e o que é de facto.
54-Pois, certo é que no referente aos factos expostos, tal consubstancia uma nulidade, nos termos dos art.º (s) 607.º, n.º4, e 615.º, n.º1, als. c) e d) do C.P.C., que deverá ser tida em conta para os devidos efeitos legais, e que desde já se invoca para todos os efeitos legais.
55 - Quanto à ponderação da natureza instrumental do processo civil e dos princípios da cooperação e adequação formal, as decisões que, relevam decisivamente para a decisão justa da questão de mérito, devem ser fundamentadas de modo claro e indubitável, pois só assim, ficam salvaguardados os direitos das partes, o que não ocorreu, consubstanciando uma nulidade insanável, tal como já invocado supra.
56-Pelo que, será de considerar a referente Decisão com deficiente ou obscura alusão aos factos provados ou não provados comprometendo o direito ao Recurso da matéria de facto e, nessa perspetiva, contender com o acesso à Justiça e à tutela efetiva, consagrada como direito fundamental no art.º 20º da C.R.P.
57-O teor da Sentença deve indicar a matéria de facto provada e a fundamentação e, após proceder à indicação dos factos provados e, não provados (o que não fez), bem como, fazer expressamente a indicação discriminada com base nos articulados, determinar a sua Decisão quanto à causa. Termos estes, ocultos na Sentença ora recorrida.
58-Nulidades estas, que, desde já, se invocam nos termos do disposto no artigo 640.º C.P.C., consubstanciando, esta Decisão ainda, numa decisão surpresa, sendo de forma clara e inequívoca violado o princípio do dispositivo, e do contraditório.
59-Ora, a omissão por parte do Douto Tribunal, acarreta, dessa forma, nulidade da sentença, tal como decorre do art.º 615.º n.º 1 al. d) do C.P.C., que desde já, se invoca para os devidos efeitos legais.
60-Não podendo o Tribunal deixar de se pronunciar quanto ao mesmo, tal como referido supra.
61-É ainda de salientar que, o direito à jurisdição não implica apenas o direito de aceder aos Tribunais, propondo ações e contraditando ações alheias, mas também o direito efetivo, a uma jurisdição, que a todos seja acessível em termos equitativos e conduza a resultados individual e socialmente justos, salvaguardando a aceção ampla que levou à consagração expressa, no nº 4 do artigo 20º da Constituição da República (aquando da revisão de 1997), do direito a um processo equitativo, anteriormente derivado do artigo 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
62-Chegamos, pois, a este momento, com a certeza vincada de que, para um Tribunal, aparentemente, não importa a fundamentação de uma medida de Maior Acompanhado.
63-A verdade dos factos é que o desconhecimento da Lei não aproveita ninguém, e neste caso, torna-se injustificável, que a um Tribunal se branqueie a letra da Lei, na tentativa, e sucesso neste caso.
64-Sem prescindir do já exposto, desde já se invoca a nulidade da designada Acompanhante.
65-Por todo o exposto, o ora Recorrente, da douta Sentença recorre, e requer a consequente revogação, com as legais consequências, sendo clara, expressa e exacerbada a denegação de justiça no presente caso, bem como, a violação de todos os princípios anteriormente expostos, nomeadamente, o direito a um processo equitativo, o princípio do processo justo e equitativo, o princípio do contraditório e o princípio da igualdade de armas ínsito no direito à prova, e, o ora Recorrente, por não se conformar e não compreender o alcance e medidas tidas pelo Tribunal a quo, que em tudo são infundadas e infundamentadas, requer a Vas. Exas., que se dignem revogar a douta Sentença, com todas as legais consequências, uma vez, que in casu, subsiste uma Decisão surpresa por parte do douto Tribunal, adstrita a todas as nulidades invocadas em sede do presente recurso. Termos em que deverá ser julgado procedente e por provado o disposto no presente Recurso, com todas as demais consequências legais, e consequentemente ser declarada Nula a douta Sentença, com os fundamentos ora expostos, sob pena de Denegação de justiça. Assim, se fará a tão acostumada JUSTIÇA!”.
O Ministério Público não veio apresentar Contra-Alegações.
Admitido o Recurso, foi proferido a 15 de Março de 2025 o seguinte Despacho:
“Invoca a Ilustre Defensora Oficiosa do beneficiário um conjunto de nulidades da sentença proferida nos presentes autos.
Em primeiro lugar, cumpre elucidar que, não obstante constar na mesma conclusão um despacho e uma sentença, tal não significa que tenha sido dado um despacho “numa” sentença, mas antes que foi proferido um despacho (que indeferiu a realização de uma prova e que, como tal, é passível de recurso que corre em separado e não tem efeito suspensivo do processo – cfr. art.ºs 644.º, n.º 2, al. d), 645.º, n.º 2 e 647.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil) e, de seguida, foi proferida sentença (também ela passível de recurso, o que, aliás, foi interposto).
Em segundo lugar, conforme se constata de uma breve consulta dos autos, resulta inequívoco que foi proferido despacho a satisfazer a gravação dos presentes autos, sendo certo que o mesmo foi proferido dentro do prazo de recurso. Aliás, também cumpre mencionar que o recurso interposto deverá ter em vista apenas e tão só a sentença proferida, evitando-se comentários laterais aos Srs. Funcionários Judiciais.
Em terceiro lugar e último lugar, importa mencionar que não se vislumbra qualquer outra nulidade da sentença proferida, sendo ainda mais certo que as mesmas se encontram devidamente enumeradas no art.º 615.º do Código de Processo Civil.
Pelo exposto, entendo que a sentença proferida nos presentes autos não padece de qualquer nulidade, assim se indeferindo as nulidades arguidas, por falta de fundamento legal.
Notifique”. Questões a Decidir
São as Conclusões da Recorrente que, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, delimitam objectivamente a esfera de actuação do Tribunal ad quem (exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial, como refere, Abrantes Geraldes[3]), sendo certo que, tal limitação, já não abarca o que concerne às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil), aqui se incluindo qualificação jurídica e/ou a apreciação de questões de conhecimento oficioso. In casu, e na decorrência das (particularmente confusas) Conclusões do Recorrente, importará verificar: i)- das consequências da prolação do despacho a dispensar a realização de exame pericial prévio à Sentença (que considera uma “violação de Lei e nulidade insanável (Despacho em sede de Sentença)!”); ii)- da existência de uma “nulidade da criação de um interveniente incidental não indicado em sede de Sentença, nem interveniente como parte no processo”; iii)- da existência de uma situação de“denegação de justiça quanto à falta de entrega da gravação indicada em sede de Ata de Audição do Beneficiário”; iv)- da eventual nulidade da Sentença por omissão de pronúncia; vi)- da eventual “nulidade da designada Acompanhante”.
*
Cumpre decidir. Das nulidades
Quanto a esta matéria importa começar por sublinhar – até porque o Recurso interposto é disso paradigmático – que a invocação deste tipo de nulidades surge na linha do que Abrantes Geraldes constata no seu “Recursos em Processo Civil”: “É frequente a enunciação nas alegações de recurso de nulidades da sentença, numa tendência que se instalou (e que a racionalidade não consegue explicar), desviando-se do verdadeiro objeto do recurso que deve ser centrado nos aspetos de ordem substancial. Com não menos frequência a arguição de nulidades da sentença ou do Acórdão da Relação acaba por ser indeferida, e com toda a justeza, dado que é corrente confundir-se o inconformismo quanto ao teor da sentença com algum dos vícios que determinam tais nulidades previstas no art. 615.º, n.º 1”[4].
i) Assim e quanto à primeira questão em causa (o despacho prévio à Sentença), estranha-se a confusão feita pelo Beneficiário.
De facto, não só o Despacho é claro, compreensível e absolutamente razoável, como está bem justificado, nomeadamente por se seguir a uma (expressiva) diligência de audição de Beneficiário[5] e de indigitada acompanhante e após verificação da documentação junta aos autos.
O Despacho está claramente autonomizado da Sentença e o facto de ter sido notificado com ela, apenas faz que se o quisesse colocar em causa, dele haveria que ter interposto o devido recurso, com o recurso da Sentença[6].
Mas importa deixar claro[7], para que não subsistam dúvidas, que em face do que decorre do n.º 1 do artigo 897.º do Código de Processo Civil “findos os articulados, o juiz analisa os elementos juntos pelas partes, pronuncia-se sobre a prova por elas requerida e ordena as diligências que considere convenientes, podendo, designadamente, nomear um ou vários peritos».
Na leitura de Nuno Piçarra “a este preceito subjazem (...) os princípios da efetividade, do inquisitório e da gestão processual”, sendo que a “decisão sobre as diligências probatórias obedece a um singelo critério: a sua conveniência.
Conveniência para quê?
Conveniência para a justa decisão da causa, à luz de todos os princípios substantivos e processuais orientadores do processo de acompanhamento. É, naturalmente, indispensável uma ponderação casuística.
Entre todas as diligências probatórias que podem ser ordenadas pelo juiz, há duas que merecem autónoma regulação legal: a perícia à pessoa do beneficiário e a audição pessoal do mesmo”.
Assim, ao contrário do que dispunha o anterior artigo 896.º[8] “que obrigava à realização de exame pericial em todas as ações de interdição e nas de inabilitação não fundadas em mera prodigalidade, os atuais arts. 897.º, n.º 1 e 898.º, n.º 2, fazem da perícia uma diligência facultativa.
A nosso ver, a consagração da perícia como diligência probatória a ordenar pelo juiz apenas quando a “considere conveniente” (...) tem a sua razão de ser à luz dos princípios orientadores do processo especial de acompanhamento, máxime da celeridade, do inquisitório e da gestão processual»[9].
Na mesma linha, Ema Conde-Bruno Trancas-Fernando Vieira, escrevem que a “conjugação do previsto no n.º 1 do artigo 899.º do CPC (“1 - Quando determinado pelo juiz, o perito ou os peritos elaboram um relatório...”) com o previsto no n.º 1 do artigo 897.º do CPC (“1 - Findos os articulados, o juiz analisa os elementos juntos pelas partes, pronuncia-se sobre a prova por elas requerida e ordena as diligências que considere convenientes, podendo, designadamente, nomear um ou vários peritos.”) e ainda do n.º 2 do artigo 898.º do CPC (“2 - As questões são colocadas pelo juiz, com a assistência do requerente, dos representantes do beneficiário e do perito ou peritos, quando nomeados, podendo qualquer dos presentes sugerir a formulação de perguntas.”) faz com que seja efectivamente possível dispensar a presença do perito no processo ou a elaboração do respectivo relatório pericial. Dito de outra forma, o exame pericial tornou-se não obrigatório”[10]. Marta Sofia Caldas Viana conclui, no mesmo sentido, que “para além da audição, o juiz pode ainda determinar a elaboração de um relatório pericial, que precise, sempre que possível, a afeção de que sofre o beneficiário, as suas consequências, a data provável do seu início e os meios de apoio e de tratamento aconselháveis» (art. 899.º, n.º 1, do CPC). Todavia, ao contrário do acontecia no pretérito, este relatório é hoje facultativo. Como seria de esperar, isto acabou por gerar, inevitavelmente, algum dissenso, uma vez que não se pode olvidar a importância da perícia médico-legal na boa e justa decisão da causa, ainda que com isto se procure a simplificação e agilização do processo»[11].
Ora, foi exactamente isso que o Tribunal a quo fez: depois de ouvir o Beneficiário e a indigitada Acompanhante e verificar a documentação junta ao processo, decidiu de forma cristalina que “Uma vez que, na presente ação, a única diligência probatória legalmente exigível é a audição direta do beneficiário e tendo em conta que, in casu, atenta a audição do beneficiário e a documentação junta aos autos, entende o Tribunal estar em condições de proferir sentença, não determino a realização de exame pericial ao beneficiário. Notifique.”.
Ou seja, o Tribunal a quo justificou a não realização da perícia, entendendo que os elementos probatórios constantes do processo, conjugados com o resultado da audição a que acabara de proceder, face às medidas de acompanhamento propostas e à luz dos princípios do que é hoje o regime do maior acompanhado, lhe permitiam - de imediato - proferir, sem necessidade de [12]mais provas, decisão determinativa das medidas de acompanhamento susceptíveis de suprirem «as necessidades» reveladas pelo Beneficiário.
Não está em causa no presente recurso, sublinhe-se, verificar se o Tribunal a quo decidiu bem ou mal, se incorreu em qualquer erro de julgamento, pois o Beneficiário não recorreu do despacho que decidiu pela não realização da perícia (podia tê-lo feito e teria de o ter feito no recurso da sentença final, nos termos do artigo 644.º, n.º 3, uma vez que não está em causa um despacho de rejeição de um meio de prova - artigo 644.º, n.º 2, alínea d), in fine -, mas um despacho de indeferimento de um meio de prova).
Em vez do recurso do Despacho em causa, o Beneficiário preferiu recorrer da Sentença, produzindo - pela pena da Ilustre Advogada que o patrocina - considerações que acabam por ser meros desabafos inconsequentes, com invocação sem critério de nulidades inexistentes, e sem que faça sentido invocar qualquer violação de contraditório, qualquer decisão surpresa, qualquer violação do constitucional direito ao acesso aos Tribunais, ou qualquer denegação de Justiça, uma vez que o Tribunal a quo tudo decidiu, tudo fundamentou e tudo notificou, sem que possa, assim, configurar-se (mesmo que longinquamente), qualquer decisão surpresa (artigo 3.º, n.º 3).
Mais importa sublinhar, aliás, que as Alegações do Beneficiário padecem de alguma confusão quanto às nulidades que invoca, tornando-se particularmente relevante chamar à colação consideração do texto que Miguel Teixeira de Sousa publicou no Blog do IPPC, a 18 de Abril de 2018, intitulado “O que é uma nulidade processual?”[13]:
“1. Tem-se vindo a observar que o conceito de nulidade processual tem originado algumas confusões.
Importa procurar desfazer estas confusões (o que, aliás, nem sequer é difícil).
2. Todo o processo comporta um procedimento, ou seja, um conjunto de actos do tribunal e das partes. Cada um destes actos pode ser visto por duas ópticas distintas:
-- Como trâmite, isto é, como acto pertencente a uma tramitação processual;
-- Como acto do tribunal ou da parte, ou seja, como expressão de uma decisão do tribunal ou de uma posição da parte.
No acto perspectivado como trâmite, considera-se não só a pertença do acto a uma certa tramitação processual, como o momento em que o acto deve ou pode ser praticado nesta tramitação.
Em contrapartida, no acto perspectivado como expressão de uma decisão do tribunal ou de uma posição da parte, o que se considera é o conteúdo que o acto tem de ter ou não pode ter.
3. Do disposto no art. 195.º, n.º 1, CPC decorre que se verifica uma nulidade processual quando seja praticado um acto não previsto na tramitação legal ou judicialmente definida ou quando seja omitido um acto que é imposto por essa tramitação.
Isto demonstra que a nulidade processual se refere ao acto como trâmite, e não ao acto como expressão da decisão do tribunal ou da posição da parte.
O acto até pode ter um conteúdo totalmente legal, mas se for praticado pelo tribunal ou pela parte numa tramitação que o não comporta ou fora do momento fixado nesta tramitação, o tribunal ou a parte comete uma nulidade processual.
Em suma: a nulidade processual tem a ver com o acto como trâmite de uma tramitação processual, não com o conteúdo do acto praticado pelo tribunal ou pela parte.
É, aliás, fácil comprovar, em função do direito positivo, o que acaba de se afirmar:
- A única nulidade processual nominada que decorre do conteúdo do acto é a ineptidão da petição inicial (cf. art. 186.º); mas não é certamente por acaso que esta nulidade é também a única que constitui uma excepção dilatória (cf. art. 186.º, n.º 1, 278.º, n.º 1, al. b), e 577.º, al, b), CPC);
- As nulidades da sentença e dos acórdãos decorrem do conteúdo destes actos do tribunal, dado que estas decisões não têm o conteúdo que deviam ter ou têm um conteúdo que não podem ter (cf. art. 615.º, 666.º, n.º 1, e 685.º CPC); também não é por acaso que estas nulidades não são reconduzidas às nulidades processuais reguladas nos art. 186.º a 202.º CPC.
4. Em conclusão:
-- Só há nulidade processual quando o vício respeita ao acto como trâmite, não ao acto como expressão de uma decisão do tribunal ou de uma posição da parte;
-- Em especial, não é correcto reconduzir qualquer vício relativo ao conteúdo de um acto processual do tribunal ou da parte ao disposto no art. 195.º, n.º 1, CPC”.
* In casu, a putativa nulidade respeitante à Sentença prolatada nem sequer leva em consideração o que decorre do artigo 615.º do Código de Processo Civil.
As nulidades da decisão estão previstas no artigo 615.º[14] do Código de Processo Civil e constituem-se como deficiências da Sentença que não podem confundir-se com erro de julgamento: este corresponde a uma desconformidade entre a decisão e o direito (substantivo ou adjectivo) aplicável (haverá erro de julgamento - e não deficiência formal da decisão - se o Tribunal decidiu num certo sentido, mesmo que, eventualmente, mal à luz do Direito).
Assim, prevê o n.º 1 do referido normativo, que será nula a Sentença quando:
“a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido”.
Por outro lado, e ser se fosse relevar a existência de uma qualquer violação do princípio do contraditório ou a presença de uma qualquer decisão surpresa (completamente infundada como decorre do ocorrido na sessão de audição do Beneficiário e do próprio regime processual do Maior Acompanhado), como se assinala com clareza no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Outubro de 2020 (Processo n.º 392/14.4.T8CHV-A.G1.S1-António Magalhães), essa violação daria “origem não a uma nulidade processual nos termos do art. 195º do CPC, que origina a anulação do acórdão, mas a uma nulidade do próprio acórdão, por excesso de pronúncia, nos termos arts. 615º, nº 1, al. d), 666º, n.º 1, e 685º do mesmo diploma”.
Este Acórdão acompanhou a posição que, a propósito, e para além do texto mais recente e já acima citado, vem sendo defendida por Miguel Teixeira de Sousa no Blog do IPPC[15], desde 2015, quando assinala que “o proferimento de uma decisão-surpresa, é um vício que afecta esta decisão (e não um vício do procedimento e, portanto, no sentido mais comum da expressão, uma nulidade processual)”, acrescentando haver - pelo menos - dois argumentos para assim se entender:
“- O primeiro é o de que, até haver o proferimento da decisão-surpresa, não há nenhum vício processual contra o qual a parte possa reagir; a parte pode suspeitar de que o tribunal vai aplicar um regime não discutido no processo e de que vai proferir uma decisão-surpresa; todavia, é apenas no momento do proferimento desta decisão que o vício se manifesta e se constitui;
- O segundo argumento é o de que o vício que afecta uma decisão-surpresa é um vício que respeita ao conteúdo da decisão proferida; a decisão só é surpreendente porque se pronuncia sobre algo de que não podia conhecer antes de ouvir as partes sobre a matéria; a decisão padece de um vício de conteúdo e, por isso, é nula por excesso de pronúncia (art. 615.º, n.º 1, al. d), CPC); estranho seria, aliás, que o vício que afecta a decisão-surpresa, sendo um vício de conteúdo, não tivesse o mesmo tratamento e não originasse as mesmas consequências dos demais vícios de conteúdo que, segundo o disposto no art. 615.º, n.º 1, CPC, conduzem à nulidade da sentença”.
E este mesmo entendimento foi, pelo mesmo Autor, repetido e reforçado em 2020[16], quando assinalou que “Menos feliz é a adesão à orientação que qualifica a omissão do contraditório das partes como uma nulidade processual. Não o é por duas razões simples:
- O vício decorrente da falta da audição prévia das partes é - como é indiscutível e indiscutido - o proferimento de uma decisão-surpresa; há, assim, uma decisão-surpresa, mas não uma "nulidade-surpresa"; basta este aspecto linguístico para justificar que o vício não é a nulidade processual, mas antes a decisão-surpresa; esta expressão indicia um desvalor da decisão, pelo que não é compreensível desconhecer este desvalor e recorrer ao da nulidade processual (e menos ainda pretender duplicar o desvalor da decisão-surpresa com o da nulidade processual); acresce que o CPC trata diferentemente as nulidades processuais (arts. 186.º ss.) e as nulidades da decisão (arts. 615.º, 666.º, n.º 1, e 685.º), pelo que fica por justificar como é que, contra a sistemática do CPC, um decisão viciada é uma nulidade processual;
- O objecto do recurso é (sempre) uma decisão (não pode ser outra coisa); há uma decisão recorrida, mas não uma "nulidade recorrida"; logo, o objecto do recurso é a decisão-surpresa, o que significa que o recorrente tem de fundamentar a interposição do recurso num vício dessa decisão; em concreto, a decisão-surpresa é uma decisão nula por excesso de pronúncia, dado que conhece de matéria que, perante a omissão da audição das partes, não podia conhecer (arts. 615.º, n.º 1, al. d), 666.º, n.º 1, e 685.º CPC)”.
Por fim, em Setembro de 2020[17], o mesmo Autor, completou o ciclo, sistematizando e consolidando ideias, expondo o seguinte:
“O CPC trata das nulidades processuais nos art. 186.º a 202.º e das nulidades da sentença e do acórdão nos art. 615.º, 666.º e 685.º. Perante isto, pode colocar-se a questão: por que motivo têm tratamento em diferentes lugares do CPC as nulidades processuais e as nulidades da sentença? Ou noutra formulação: dado que a sentença é um acto processual, qual o motivo para que a nulidade da sentença não esteja tratada em conjunto com as nulidades processuais? Ou noutra formulação ainda mais precisa: constando do art. 195.º CPC uma regra geral sobre a nulidade dos actos, qual a justificação para que exista uma regulamentação específica sobre a nulidade da sentença?
A resposta tem a ver com a dupla perspectiva pela qual a sentença pode ser considerada (assim como qualquer outro acto processual) e é a seguinte: a sentença pode ser vista como trâmite ou como acto: no primeiro caso, atende-se à sentença no quadro da tramitação da causa; no segundo, considera-se o conteúdo admissível ou necessário da sentença.
Disto decorre que uma sentença pode constituir uma nulidade processual, se for considerada na perspectiva da sentença como trâmite: basta, por exemplo, que ela seja proferida fora do momento apropriado na tramitação processual. Um exemplo (naturalmente académico): se, no procedimento comum, o juiz proferir uma decisão logo a seguir ao termo da fase dos articulados, verifica-se uma nulidade processual nos termos do art. 195.º, n.º 1, CPC, porque foi praticado um acto que a lei, naquele momento, não permite.
Importa notar, no entanto, que, atendendo à diferença da sentença como trâmite e como acto, a nulidade processual do art. 195.º CPC nada tem a ver com a nulidade da sentença dos art. 615.º, 666.º e 685.º CPC. É fácil verificar que assim é.
A nulidade processual decorrente do disposto no art. 195.º, n.º 1, CPC existe mesmo que a sentença não padeça de nenhum outro vício, nomeadamente daqueles que estão enumerados no art. 615.º CPC. Quer dizer: a sentença pode conter toda a fundamentação exigível, pode não padecer de nenhuma contradição entre os fundamentos e a decisão, pode não conter nenhuma omissão ou nenhum excesso de pronúncia e pode não condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido, mas, ainda assim, porque é proferida fora do momento adequado, verifica-se a nulidade processual imposta pelo art. 195.º, n.º 1, CPC.
Voltando ao exemplo (académico) acima referido: o proferimento da sentença logo depois da fase dos articulados constitui uma nulidade processual; no entanto, essa sentença pode não padecer de nenhum dos fundamentos de nulidade enumerados no art. 615.º, n.º 1, CPC.
O inverso também é possível (e é, aliás, a situação mais frequente): se a sentença é proferida no momento processualmente adequado, mas se a mesma não contém toda a fundamentação exigível, padece de uma contradição entre os fundamentos e a decisão, contém uma omissão ou um excesso de pronúncia ou condena em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido, não há nenhuma nulidade processual nos termos do art. 195.º, n.º 1, CPC, embora se trate de sentença que é nula segundo o disposto nos art. 615.º, n.º 1, 666.º e 685.º CPC.
3. Assente esta distinção básica entre a sentença considerada como trâmite e a sentença considerada como acto, importa tratar agora do problema relacionado com as decisões-surpresa e com a sua correcta solução jurídica. A questão a resolver é a seguinte: uma decisão-surpresa é uma nulidade processual nos termos do art. 195.º, n.º 1, CPC ou uma nulidade da sentença de acordo com o estabelecido nos art. 615.º, 666.º e 685.º CPC?
Segundo se pode imaginar, as dificuldades sentidas pela jurisprudência decorrem da circunstância de a decisão-surpresa resultar da omissão da audição prévia das partes e de, portanto, parecer que a ela está subjacente uma nulidade processual nos termos do art. 195.º, n.º 1, CPC. Há aqui, no entanto, uma confusão que importa procurar desfazer.
A audição prévia das partes é um pressuposto ou uma condição para que a decisão não seja considerada uma decisão-surpresa. Quer dizer: a decisão-surpresa é um vício único e próprio: a decisão é uma decisão-surpresa quando tenha sido omitida a audição prévia das partes. Noutros termos: há um vício (que é a decisão-surpresa), e não dois vícios independentes (a omissão da audiência prévia das partes e a decisão-surpresa).
Em concreto: há um vício processual que é consequência da omissão de um acto. Se assim é, claro que o que há que considerar é o vício em si mesmo (a decisão-surpresa), e não separadamente a causa do vício e o vício. Em parte alguma do direito processual ou do direito substantivo se considera a causa do vício e o vício como duas realidades distintas. A única distinção que é possível fazer é ontológica: é a distinção entre a causa e a consequência.
Dado que a decisão-surpresa corresponde a um único vício e porque este nada tem a ver com a decisão como trâmite, o vício de que padece a decisão-surpresa só pode ser um vício que respeita à decisão como acto.
Em concreto, a decisão-surpresa é uma decisão nula por excesso de pronúncia (art. 615.º, n.º 1, al. d), CPC), dado que se pronúncia sobre uma questão sobre a qual, sem a audição prévia das partes, não se pode pronunciar.
Note-se que, como se tem vindo a repetir neste Blog, esta solução é a única que é compatível com a impugnação da decisão-surpresa através de recurso e com o objecto do recurso. O objecto do recurso é sempre uma decisão, pelo que, se houvesse uma nulidade processual, a mesma não poderia constituir objecto de recurso e teria de ser reclamada no tribunal a quo”.
No caso dos autos, está em causa - claramente - uma decisão do Tribunal e não um acto como trâmite, pois é da Sentença que o Beneficiário recorre (pelo que é a esse nível, o da decisão em si, que a questão poderia ser colocada, seja quanto à existência de uma nulidade por excesso de pronúncia, seja quanto à correcção da própria decisão).
O Beneficiário-Recorrente diz que não pode pronunciar-se sobre a dispensa da perícia, mas não tinha de o ser: o Tribunal tinha um momento próprio para fazer essa análise e ponderação e foi o que fez (sendo certo que se pressupõe que o Beneficiário – pois é para isso que tem um patrono nomeado – conhece o regime processual legal acima descrito).
O Tribunal fez, no momento oportuno (depois da audição do Beneficiário e da indigitada acompanhante), a ponderação que tinha de fazer e, por Despacho, dispensou (fundamentadamente) a realização da perícia.
E a seguir proferiu a Sentença. Situação linear e respeitadora de todos os trâmites, pelo que só pode considerar-se inexistir qualquer nulidade da Sentença, por excesso de pronúncia, ou violação de qualquer direito do Beneficiário, pela circunstância desta ter sido proferida após a dispensa da realização da perícia: não há qualquer “violação de Lei”, nem - muito menos - qualquer “nulidade insanável”.
**
ii) Invoca o Beneficiário a existência de uma “nulidade da criação de um interveniente incidental não indicado em sede de Sentença, nem interveniente como parte no processo”.
O Beneficiário reporta-se à notificação que da Sentença foi feita ao Lar onde o Beneficiário se encontra internado.
Também aqui, o Beneficiário-Recorrente demonstra alguma confusão de conceitos.
De facto, trata-se de uma situação posterior à Sentença e que não tem que ver com ela e que haveria de ter sido colocada junto do Tribunal a quo em requerimento autónomo e não em sede de recurso (que, como a Ilustre Advogada que patrocina o Beneficiário certamente sabe, serve para apreciar decisões proferidas pelo Tribunal a quo e não sobre actos praticados pela Secretaria)[18].
Como se referiu no Acórdão de 07 de Maio de 2024 (Processo n.º 279/14.0T8SCR-C-Ana Mónica Pavão)[19] - no qual o ora Relator e o 2.º Adjunto, foram Adjuntos - é consabido que,” no nosso sistema processual civil os recursos constituem um mecanismo destinado a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, não sendo lícito invocar questões que não tenham sido objecto de apreciação da decisão recorrida.
Sendo os recursos meios de impugnação das decisões judiciais, pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação, não comportam, assim, ius novarum, ou seja, a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo (cf. art.ºs 627.º/1, 631º/1 e 639.º do CPC).
Tem sido este o entendimento pacífico firmado na doutrina e na jurisprudência, afirmando-se, neste conspecto, no acórdão do STJ de 29/9/2016 (P. 291/12.4TTLRA.C1.S2, relator Ribeiro Cardoso, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj), que «Os recursos não visam criar e emitir decisões novas sobre questões novas (salvo se estas forem de conhecimento oficioso), mas impugnar, reapreciar e, eventualmente modificar as decisões do tribunal recorrido sobre pontos questionados e “dentro dos mesmos pressupostos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento em que a proferiu”» e concluindo-se que «não pode o tribunal de recurso “conhecer de questões que não tenham sido objeto da decisão recorrida ou que as partes não suscitaram perante o tribunal recorrido (arts. 627º, n.º 1 e 635º, n.º 2 e 4 do CPC).»
No mesmo sentido, vide, por todos, o acórdão STJ de 7/7/2016, P. 156/12.0TTCSC.L1.S1, relator Gonçalves Rocha e ampla jurisprudência aí citada; e o acórdão do TRG, de 9-11-2023, P. 2275/14.9T8VNF-B.G1, relator Pedro Maurício.
Não sendo a questão suscitada pelas partes, o tribunal só poderá apreciá-la caso seja de conhecimento oficioso do julgador. A este propósito, escreveu-se no acórdão do STJ de 17-04-2018, P. 1530/15.5T8CSC-C.P1.S1, relator João Camilo: “O julgador, na elaboração da sentença, nos termos do art. 608º, nº 2 apenas pode conhecer das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. Sendo as questões levantadas nas conclusões das alegações dos recorrentes que delimitam os poderes de cognição do tribunal de recurso, há que aplicar a este limite a exceção decorrente da ressalva da parte final do nº 2 do art. 608º.”
Transpondo estas considerações para o caso vertente e não sendo a questão suscitada pela recorrente matéria de conhecimento oficioso, não pode esta Relação pronunciar-se sobre aquela concreta questão, porquanto a mesma, não tendo sido suscitada perante a 1.ª instância, não foi objecto de apreciação na decisão recorrida, constituindo, pois, questão nova”.
Assim sendo, nada há a determinar quanto a esta matéria, indeferindo-se a pretensão anulatória formulada pelo Beneficiário-Recorrente.
***
iii) O Beneficiário-Recorrente vem ainda arguir a existência de uma situação de “denegação de justiça quanto à falta de entrega da gravação indicada em sede de Ata de Audição do Beneficiário”.
Só pode estranhar-se o comportamento da Ilustre Advogada que patrocina o Beneficiário, uma vez que para além de desde o dia 20 de Janeiro de 2025 as gravações estarem disponíveis no CITIUS, de a Sentença ter sido proferida a 29 e de a 10 de Fevereiro o Tribunal ter expressamente ter concedido o acesso às gravações, o certo é que nada mais por si foi dito (e se mais algum problema de acesso a tais gravações tivesse ocorrido, certamente isso haveria de teria sido comunicado ao Tribunal a quo para permitir que o Recorrente pudesse beneficiar dos prazos de recurso, mas isso não ocorreu).
O Beneficiário-Recorrente utiliza um discurso persecutório que não encontra qualquer arrimo no que dos autos consta.
Mais. O Beneficiário-Recorrente chega a dizer que, em sede recurso (!)“impugna o teor da Ata por não corresponder ao efetivamente ocorrido na Audição do Beneficiário”, o que não faz sentido, por não ser o momento de o fazer, nem se compreender bem o que pretenderia com isso (uma vez que já tinha requerido a disponibilização das gravações e já lhe fora concedido).
Se alguma coisa lhe houvesse sido negada no Tribunal de 1.ª Instância, era lá que haveria de ter procurado fazer valer a sua pretensão e perante a decisão que sobre tal fosse tomada, interpor os recursos que entendesse.
Tal como o Beneficiário-Recorrente actua no presente recurso, cria apenas uma amálgama de comentários e putativas divergências absolutamente inconsequentes. Assim sendo, também aqui inexiste qualquer “denegação de justiça” e, muito menos, qualquer “nulidade” susceptível de inquinar o processo.
****
iv)-Invoca o Beneficiário-Recorrente uma “nulidade da Sentença por omissão de pronúncia”, nos termos previstos no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), numa – no mínimo – confusa (e a raiar o absurdo) amálgama de alegações, por não ser referida a patologia de que padecerá no Facto 5, por haver uma referência no feminino no Facto 8, por o referido no Facto 9 não ter sido objecto de pergunta concreta na Audição, por na matéria de Direito se indicarem factos que deviam estar noutra sede, por o Tribunal não poder deixar de aplicar “medidas concretas no âmbito do regime do maior acompanhado, conforme resulta da estrutura de todo o seu regime e, em concreto, do artigo 145.º do Código Civil e do artigo 900.º, n.º 1, do C.P.C., e por outro lado porque, quanto ao fundamento de facto e de Direito, não pode omitir factos, provados e não provados, nem confundir a fundamentação de Direito em facto e vice versa”, e ainda por o Tribunal estar obrigado a conhecer do pedido formulado pelo Ministério Público.
De novo se constata a enorme confusão em que labora o Beneficiário-Recorrente, que chega a aproximar-se perigosamente da fronteira da litigância de má fé, nas referências aos Factos 5 e 8, que correspondem a lapsus calamiabsolutamente evidentes e dos quais procura tirar nem se percebe que dividendos[20].
Tais lapsos foram já corrigidos na descrição da factualidade apurada não se vislumbrando sequer qual seria a nulidade que com eles teria sido cometida.
Do mesmo modo, a referência ao Facto 9 é despropositada, uma vez que o Beneficiário-Recorrente nem sequer impugna a factualidade apresentada como provada (como adiante melhor se referirá), e não parece ter compreendido que, independentemente de ter sido ou não perguntado, corresponde a um facto que decorre da apreciação que o Tribunal a quo fez da - clara - prova produzida (e nem nas Alegações de recurso é sequer defendido que o Facto devia ser dado como não provado…).
Por outro lado, a referência a que na matéria de Direito são referidos factos provados que não constam descritos como tal, é um “tiro de pólvora seca”, uma vez que nem sequer diz quais são esses factos. Ou seja, simplesmente não corresponde à verdade esta alegação do Recorrente.
E quanto à circunstância de o Tribunal “confundir” factos e Direito, omitir factos provados e não provados e conhecer do pedido formulado pelo Ministério Público, não parece que o Beneficiário-Recorrente esteja a falar deste processo, uma vez que a Sentença diz quais são os factos provados e os não provados, fundamenta-os e, apreciando-os, escolhe as medidas de protecção a aplicar ao Beneficiário[21].
A Sentença cumpre tudo o que se lhe exigia: o n.º 3 do artigo 607.º manda que o/a juiz/a especifique os fundamentos de facto e de direito da decisão e isso é o que foi feito.
O n.º 2 do artigo 608.º, assinala (o que faz a correspondência com a alínea d) do artigo 615.º, fazendo substanciar o seu incumprimento numa nulidade) que, o “juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.
O que sucede, normalmente, é que a discordância quanto ao resultado da acção, deriva e acaba por confundir-se com invocação de putativas nulidades, nomeadamente por se considerar que a falta de resposta a algum argumento de entre os que são convocados pelas partes as gera.
Chama-se a isto confundir “questões” com “argumentos”[22].
É que dever de decidir[23] reporta-se às questões suscitadas no processo (ou que o processo suscite, para aqui incluir também as de conhecimento oficioso), não impondo, como tal, que tenham de ser apreciados todos os argumentos suscitados pelas partes[24].
Ou seja, o/a juiz/a deve apreciar e decidir sobre todos os pedidos formulados e todas causas de pedir que tenham sido invocadas na acção, bem como conhecer de todas as excepções invocadas (ou que lhe caiba – oficiosamente – conhecer), não tendo de escrutinar todos os argumentos que, de acordo com as várias possíveis soluções de Direito para resolver o processo, tenham sido apresentados pelos intervenientes processuais - ou possam ter sido inicialmente admitidos pelo juiz[25].
Recorrendo ao sempre claro, útil e pertinente, Alberto dos Reis, são “na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão”[26].
Retomando o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Outubro de 2022, nele se afirma, que a nulidade “de sentença/acórdão, por omissão de pronúncia, só ocorre quando o julgador deixe de resolver questões que tenham sido submetidas à sua apreciação pelas partes, a não ser que esse conhecimento fique prejudicado pela solução a outras questões antes apreciadas”, concluindo que o “conceito de “questão”, deve ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência/improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, dele sendo excluídos os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos/aduzidos pelas partes” (…).
“O que importa é que o julgador conheça de todas as questões que lhe foram colocadas, excepto aquelas cuja decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras.
Deste modo, só haverá nulidade da sentença por omissão ou por excesso de pronúncia, quando o julgador tiver omitido pronúncia relativamente a alguma das questões que lhe foram colocadas pelas partes ou quando tiver conhecido de questões que aquelas não submeteram à sua apreciação.
Nesses casos, só não haverá nulidade da sentença se a decisão da questão de que não se conheceu tiver ficado prejudicada pela solução dada à(s) outra(s) questões, ou quando a questão de que se conheceu era de conhecimento oficioso”.
Por fim e quanto a esta questão, há ainda que levar em consideração o que com particular acuidade se assinalou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Janeiro de 2019 (Processo n.º 4568/13.3TTLSB.L2.S1-Júlio Gomes) onde, depois de se sumariar que para “determinar se existe omissão de pronúncia há que interpretar a sentença na sua totalidade, articulando fundamentação e decisão”, se desenvolve a ideia, escrevendo que, ainda “que a lei processual distinga a fundamentação e a decisão a sentença constitui um todo pelo que, como a nossa jurisprudência há muito tem afirmado, designadamente em situações em que importa aferir os limites da decisão para efeitos de caso julgado, é frequentemente necessário ler o dispositivo da decisão à luz dos seus fundamentos “para se determinar o verdadeiro alcance da decisão”. (Nesse sentido veja-se já o Acórdão do STJ de 11 de março de 1949, publicado no BMJ n.º 12 (Maio de 1949): “Embora, em regra, só o dispositivo da decisão constitua caso julgado, frequentemente há que relacioná-lo com os seus fundamentos, para se determinar o verdadeiro alcance da decisão”. E muito mais recentemente este Tribunal reiterou no Acórdão do STJ de 05/11/2009, processo n.º 4800/05.TBAMD-A.S1 (OLIVEIRA ROCHA), que “a interpretação da sentença exige (…) que se tome em consideração a fundamentação e a parte dispositiva, fatores básicos da sua estrutura”)
É o que afirmou, recentemente, FRANCISCO MANUEL LUCAS FERREIRA DE ALMEIDA:
“É da sentença no seu todo (que não apenas de uma parte dela) que hão-de extrair-se os verdadeiros sentido, conteúdo e objeto do julgado; importa, por isso, ponderar e sopesar devidamente os motivos, isto é, a parte justificativa (motivatória) da decisão, em ordem a surpreender nela uma qualquer restrição ou ampliação do dispositivo, ou mesmo a concluir que determinadas questões não foram objeto de resolução explícita ou sequer implícita (apesar da amplitude da redação da parte dispositiva) ou ainda, e ao invés, que foram consideradas e decididas questões não compreendidas na parte dispositiva. No fundo, tornar-se-á, amiúde, necessário recorrer ao arrazoado da sentença para captar o verdadeiro pensamento do julgador. Do que se trata é de reconstituir o itinerário valorativo e cogniscitivo seguido pelo julgador ao decidir como decidiu.” (Direito Processual Civil, vol. II, Almedina, Coimbra, 2015, p. 646)
Em suma, e seguindo agora o ensinamento de ANTONIO NASI, a sentença é um todo, uma unidade incindível, em que “motivar (e motivar bem) constitui parte integrante de julgar” (Interpretazione della sentenza, Enciclopedia del Diritto, vol. XXII, Guiffrè Editore, Milano, 1972, pp. 293 e ss., p. 303), pelo que não se pode isolar um segmento da sentença como sendo aquele que é exclusiva ou mesmo predominantemente preceptivo, sendo que a motivação se apresenta como “o prius lógico imprescindível para a compreensão do sentido preceptivo da sentença”. (Aut. e ob. cit., p. 304.). Pelo que a interpretação da mesma exige a compreensão do seu iter genético e a aceitação de uma visão articulada e dinâmica de todo o processo”.
Tudo visto, importa tirar conclusões.
E a única conclusão a tirar é no sentido de o Réu carecer totalmente de razão.
Quer quanto à nulidade, quer quanto ao seu absurdo “argumento”.
A acção destinava-se a apreciar a necessidade de ser “decretado o acompanhamento, por razões de saúde, do(a) beneficiário(a) G, requerendo-se a aplicação” das medidas de acompanhamento de “Representação geral, com administração total de bens”, “Limitação do direito de testar” e , “Dispensar a constituição do conselho de família”.
Ora, para o que nos interessa neste ponto, a Sentença aborda a questão colocada e decide-a, inexistindo – portanto – qualquer nulidade por omissão de pronúncia.
***** v)- da eventual nulidade por falta de fundamentação
Entende o Beneficiário-Recorrente, que a Sentença nula por falta de fundamentação, uma vez que “a aplicação de medidas de acompanhamento é, em qualquer caso, obrigatória, pelo que o Tribunal estava obrigado a aplicá-las e, ao fazer, tem de fazê-lo devidamente fundamentado”, pelo que se deveria declarar a “sentença como Nula por falta de fundamentação e omissão de pronúncia, e por se fundamentar incorretamente, sob pena de, a assim se manter, ser manifestamente incompreensível, o que é de Direito, e o que é de facto”.
Mais uma vez parece que o Beneficiário-Recorrente se refere a uma realidade virtual.
De facto, a Sentença prolatada pelo Tribunal a quo, depois de doze parágrafos explicando o regime legal da matéria do maior acompanhado, aprecia a situação dos autos nos seguintes termos:
“No caso dos presentes autos, conforme resulta provado e com interesse para a boa decisão da causa, o beneficiário não só consegue ler e escrever, como também não consegue compreender o conteúdo de contratos, procurações, extratos bancários ou outros documentos, nem é capaz de utilizar os serviços existentes na comunidade nem de tratar de quaisquer assuntos que lhe digam respeito, para além de que necessita de supervisão para a sua higiene, se vestir, comer, confecionar alimentos e tomar a medicação.
Efetivamente, o beneficiário padece de alzheimer desde, pelo menos, 31/01/2023 e que não é passível de tratamento ou melhoria, pelo que se exige o seu acompanhamento (cfr. art.º 138.º do Código Civil).
Prevê o art.º 147.º do Código Civil que “o exercício pelo acompanhado de direitos pessoais e a celebração de negócios da vida corrente são livres, salvo disposição da lei ou decisão judicial em contrário” (n.1), considerando-se “pessoais, entre outros, os direitos de casar ou de constituir situações de união, de procriar, de perfilhar ou de adotar, de cuidar e de educar os filhos ou os adotados, de escolher profissão, de se deslocar no país ou no estrangeiro, de fixar domicílio e residência, de estabelecer relações com quem entender e de testar” (n.º 2). In casu, com exceção de ter resultado provado que, tendo em conta as capacidades cognitivas do beneficiário, este não poderá testar, não resulta dos factos provados a existência de qualquer circunstância impeditiva relativamente ao exercício dos demais referidos direitos pessoais, entre outros, inerentes à própria existência humana e que se traduzem na capacidade de pensar, na essência de sentir e revelar emoções, sendo certo que no caso de se verificarem alterações quanto a esta matéria sempre a decisão pode ser revista a requerimento ou oficiosamente no prazo estabelecido, de acordo com o disposto no art.º 155.º do Código Civil.
Relativamente aos negócios da vida corrente, não obstante ter ficado provado que o beneficiário não é capaz de operar com o dinheiro, a verdade é que não resulta provado que este celebre, atualmente, este tipo de negócios ou que exista risco considerável de os celebrar, até porque passa os dias sempre acompanhado junto do Lar da Ajuda III onde reside, razão pela qual o mesmo não tem qualquer contacto com o dinheiro.
Quanto a termos pessoais, consideramos que o beneficiário carece de representação pessoal perante as instituições e organismos oficiais, incluindo Instituições de Saúde, Finanças, Segurança Social, Tribunais, Conservatórias de Registo, Centro Nacional de Pensões, Lares, Centros de Dia, Instituições de Solidariedade Social, Entidades Bancárias e Correios.
Na verdade, a simplicidade da vida do beneficiário e a retaguarda conferida tanto pela sua família, como pelo Lar onde se encontra, protegem-no das exigências da vida hodierna do comum dos cidadãos no que concerne à realização de atos jurídicos.
No que tange ao património do beneficiário, conforme resulta da factualidade dada como provada, o mesmo aufere uma pensão, bem como é cotitular de uma conta bancária.
Nesta senda, afigura-se necessária uma administração total dos seus bens e rendimentos.
Uma vez que resulta dos factos provados que o beneficiário padece de alzheimer desde, pelo menos, 31/01/2023, fixo como data da necessidade das medidas supra aplicadas o dia 31/01/2023.
De acordo com o preceituado no art.º 143.º, n.º 1 do Código Civil, o “acompanhante, maior e no pleno exercício dos seus direitos, é escolhido pelo acompanhado ou pelo seu representante legal, sendo designado judicialmente”.
Ora, no caso dos autos, entendo deve ser nomeada como acompanhante a sua filha M, que lhe presta apoio diariamente em todos os atos da sua vida e o acompanha de facto, por melhor salvaguardar o superior interesse do beneficiário.
Por outro lado, tendo em conta os poderes conferidos à acompanhante e aos bens e rendimentos do beneficiário, é nosso entender ser dispensável a constituição do conselho de família.
Uma vez que o beneficiário não reside com a supranomeada acompanhante, face às circunstâncias do caso concreto deverá manter-se o contacto entre ambos de, pelo menos, três vezes por semana, fixando-se este regime de visitas.
Dado que não resulta dos autos que o beneficiário tenha realizado quaisquer atos jurídicos desde 31/01/2023 e se encontra acompanhado de facto, afigura-se-nos ser dispensável a publicidade da decisão, de acordo com o disposto no art.º 153.º do Código Civil e no art.º 893.º, n.º 1 do Código de Processo Civil”.
Seria difícil ser mais claro, objectivo e pragmático na abordagem de tudo o que havia para abordar e decidir nos presentes autos.
Perante o acabado de transcrever, encontrar uma nulidade por falta de fundamentação é surreal.
A nulidade em causa, sublinhe-se, reconduz-se à falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito na Sentença, ou mesmo à sua ininteligibilidade, sendo certo que a jurisprudência tem até – de forma uniforme – entendido que apenas se considera abrangida a absoluta falta de fundamentação[27], mas já não uma fundamentação que (alegadamente) pudesse ser considerada insuficiente ou desacertada.
Com este entendimento, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02 de Junho de 2016 (Processo n.º 781/11.6TBMTJ.L1.S1-Fernanda Isabel Pereira) escreveu que o “dever de fundamentar as decisões tem consagração expressa no artigo 154º do Código de Processo Civil e impõe-se por razões de ordem substancial, cumprindo ao juiz demonstrar que da norma geral e abstracta soube extrair a disciplina ajustada ao caso concreto, e de ordem prática, posto que as partes precisam de conhecer os motivos da decisão, em particular a parte vencida, a fim de, sendo admissível o recurso, poder impugnar o respectivo fundamento ou fundamentos[…]. Não pode, porém, confundir-se a falta absoluta de fundamentação com a fundamentação insuficiente, errada ou medíocre, sendo que só a falta absoluta de motivação constitui a causa de nulidade prevista na al. b) do nº 1 do artigo 668º[28]citado, como dão nota A. Varela, M. Bezerra e S. Nora (Manual de Processo Civil, 2ª ed., 1985, p. 670/672), ao escreverem “Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”. Só a total omissão dos fundamentos, a completa ausência de motivação da decisão pode conduzir à nulidade suscitada”[29].
No mesmo sentido, vide, também, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03 de Março de 2021 (Processo n.º 3157/17.8T8VFX.L1.S1-Leonor Rodrigues), onde se destaca de forma assertiva que:
- só “a absoluta falta de fundamentação – e não a errada, incompleta ou insuficiente fundamentação – integra a previsão da nulidade do artigo 615.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil”;
- esta nulidade “pressupõe um erro de raciocínio lógico consistente em a decisão emitida ser contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto ou de direito de que o juiz se serviu ao proferi-la. Ocorre quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente”;
- se verifica “tal nulidade quando existe contradição entre os fundamentos e a decisão e não contradição entre os factos provados e a decisão, ou contradições da matéria de facto, que a existirem, configuram eventualmente erro de julgamento”.
O sempre pertinente José Alberto dos Reis, sobre a matéria escrevera já no V volume do seu Código de Processo Civil Anotado, que havia “que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada” e que o “que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto”[30].
Neste contexto, facilmente se conclui que não assiste qualquer razão ao Beneficiário-Recorrente quanto a esta putativa nulidade: a decisão está (bem) fundamentada e é coerente e compreensível, sendo perceptíveis as razões que levaram a decisora às suas conclusões (e por referência aos factos que deu como provados).
A Decisão até poderia estar errada, até poderia ter incorrido num qualquer erro de julgamento, o que não há é um qualquer vício que a afecte, pela via invocada. O Tribunal mostra ter apreciado a situação concreta, ter ponderado os factos apurados e ter decidido - em concreto - o que era necessário, perante a também concreta realidade vivida pelo Beneficiário, optando – fundamentadamente – por lhe aplicar as medidas concretas que definiu (e o Tribunal, com clareza e ponderação explicou até porque é que não eram necessárias mais). Improcede, assim, a invocação da nulidade em causa.
******
vi)- da eventual “nulidade da designada Acompanhante”.
O Beneficiário-Recorrente discorda da nomeação da Acompanhante, por ser casado e dever ser o cônjuge a exercer tais funções, sendo que, “no mínimo deveria a mesma ser notificada para a sua não oposição da indicada acompanhante pelo Tribunal a quo”.
Eis-nos de novo em sede de confusão do que é ou não nulidade…
Matéria que já foi abordada neste Acórdão.
E volta a não assistir qualquer razão ao Beneficiário-Recorrente: o Tribunal faz o que se lhe exigia ao nomear uma Acompanhante, explicando porque é que nomeia para essas funções a filha e fá-lo de forma clara e objectiva.
De facto, é verdade que na Sentença não se diz porque é que não se escolhe o cônjuge, mas, sem prejuízo de se entender que o deveria ter feito expressamente, não é difícil perceber porque é que o faz, tal qual a realidade se apresenta (a cônjuge do beneficiário, é-o desde 1960 e terá uma idade próxima dos 90 anos, sendo que, como resulta da própria inquirição da designada Acompanhante, está também a seu cargo e com profundas limitações, sendo que é esta mesma quem tem assumido o acompanhamento do pai[31]).
Mas diz porque é que escolhe esta acompanhante e isso é o essencial.
Ou seja, poderia ter dito mais, mas diz o essencial, afastando qualquer arbitrariedade na nomeação efectuada[32]. Inexiste, portanto qualquer nulidade respeitante a esta matéria.
******* Os Factos
O Tribunal considerou provada a seguinte factualidade:
1. O Beneficiário nasceu a 30/05/1933, na freguesia e concelho de ----, sendo filho de J e de F.
2. O Beneficiário é casado e tem duas filhas.
3. Desde Agosto de 2024, o Beneficiário encontra-se institucionalizado no Lar ---, sito no Funchal, sem perspetivas de regresso à habitação.
4. O Beneficiário padece de Alzheimer, pelo menos, desde 31/01/2023.
5. A condição referida em 4.[33] não é passível de tratamento ou melhoria.
6. O Beneficiário necessita de supervisão para a sua higiene, se vestir, comer, confecionar alimentos e tomar a medicação.
7. O Beneficiário não consegue andar.
8. O Beneficiário[34] não consegue ler, escrever, nem fazer cálculos.
9. Não reconhece o valor do dinheiro e não é capaz de operar com o mesmo.
10. Não tem capacidade para a gerir e movimentar contas bancárias.
11. Não consegue compreender o conteúdo de contratos, procurações, extratos bancários ou outros documentos, nem é capaz de nem é capaz de utilizar os serviços existentes na comunidade nem de tratar de quaisquer assuntos que lhe digam respeito.
12. Tendo em conta as capacidades cognitivas, o Beneficiário não poderá testar.
13. Não se orienta no espaço, nem conhece a sucessão dos dias, meses e anos.
14. O Beneficiário aufere mensalmente uma pensão de velhice no valor mensal de €639,98.
15. O Beneficiário é cotitular, conjuntamente com a mulher e as duas filhas do casal, de uma conta bancária no Banco ---, S.A.
16. O Beneficiário não é proprietário de bens imóveis ou móveis sujeitos a registo.
17. Não há registo de que o Beneficiário tenha outorgado testamento vital ou procuração de cuidados de saúde.
18. A filha do Beneficiário, M é quem lhe presta todo o apoio que necessita.
*** O Tribunal considerou que “Com relevo para a boa decisão da causa, não existem factos não provados”. ** Apreciação da Matéria de Facto
O artigo 607.º, n.º 5, do Código de Processo Civil dispõe que o Tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em conformidade com a convicção que haja firmado acerca de cada facto controvertido, salvo se a lei exigir para a existência ou prova do facto jurídico qualquer formalidade especial, caso em que esta não pode ser dispensada.
Neste momento processual releva ainda o artigo 662.º do Código de Processo Civil, que começa por afirmar que a “Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”[35].
Como, aliás, assinala o Conselheiro Tomé Gomes no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07 de Setembro de 2017 (Processo n.º 959/09.2TVLSB.L1.S1) é “hoje jurisprudência corrente, mormente do STJ, que a reapreciação, por parte do tribunal da 2.ª instância, da decisão de facto impugnada não se deve limitar à verificação da existência de erro notório, mas implica uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, pelo tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir, para só, em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do erro invocado, mantendo ou alterando os juízos probatórios em causa”. Quando uma parte em sede de recurso pretenda impugnar a matéria de facto[36], nos termos do artigo 640.º, n.º 1, impõe-se-lhe o ónus de:
1) indicar (motivando) os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (sintetizando ainda nas conclusões) – alínea a);
2) especificar os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada (indicando as concretas passagens relevantes – n.º 2, alíneas a) e b)), que impunham decisão diversa quanto a cada um daqueles factos, propondo a decisão alternativa quanto a cada um deles – n.º 1, alíneas b) e c).
Está aqui em causa, como sublinha com pertinência Abrantes Geraldes, o “princípio da autorresponsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo”[37], sempre temperado pela necessária proporcionalidade e razoabilidade[38], sendo que, basicamente, o essencial que tem de estar reunido é “a definição do objecto da impugnação (que se satisfaz seguramente com a clara enunciação dos pontos de facto em causa), com a seriedade da impugnação (sustentada em meios de prova indicados e explicitados e com a assunção clara do resultado pretendido)”[39].
Como pano de fundo da apreciação a fazer dos factos que estejam em causa, também a circunstância de não se proceder à reapreciação da matéria de facto quando os factos objecto de impugnação “não forem susceptíveis, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, de ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2º, nº 1, 137º e 138º, todos do C.P.C.)” (Acórdãos da Relação de Guimarães de 15 de Dezembro de 2016, Processo n.º 86/14.0T8AMR.G1-Maria João Matos[40] e da Relação de Lisboa de 26 de Setembro de 2019, Processo n.º 144/15.4T8MTJ.L1-2-Carlos Castelo Branco).
Assim, caberá ao Tribunal da Relação apreciar a matéria de facto de cuja apreciação o/a Recorrente discorde e impugne (fazendo sobre ela uma nova apreciação, um novo julgamento, após verificar a fundamentação do Tribunal a quo, os elementos e argumentos apresentados no recurso e a sua própria percepção perante a totalidade da prova produzida), continuando a ter presentes os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e que “o julgamento humano se guia por padrões de probabilidade e não de certeza absoluta”, pelo que “o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados.
Por outras palavras, a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando o mesmo, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direcção diversa, e delimitam uma conclusão diferente daquela que vingou na 1ª Instância”[41] (sublinhado e carregado nossos). Ana Luísa Geraldes sublinha mesmo que, em “caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte»[42].
O Tribunal da Relação deve usar aquilo a que Miguel Teixeira de Sousa chama de “um critério de razoabilidade ou de aceitabilidade dessa decisão. Este critério conduz a confirmar a decisão recorrida, não apenas quando for indiscutível que a mesma é correcta, mas também quando aquela se situar numa margem de razoabilidade ou de aceitabilidade reconhecida pela Relação”[43]. Verificadas as Alegações e Conclusões do Recorrente importa começar por verificar se algum impugnação dos factos se mostra correctamente efectuada.
E a resposta é clara: Não!
E eventuais deficiências existentes no recurso da matéria de facto não são sanáveis pela via do aperfeiçoamento, o qual está apenas reservado aos recursos da matéria de direito e no que se refere às conclusões (como decorre dos artigos 639.º e 640.º do Código de Processo Civil): como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Junho de 2020 (Processo n.º 1008/08.3TBSI.E1.S1-AntónioMagalhães), a “cominação para a falta de especificações constantes das als. a), b) e c) do n.º 1 do art. 640.º do CPC é a rejeição da impugnação da decisão de facto, não havendo lugar a qualquer despacho de aperfeiçoamento nos termos do n.º 3 do art. 639.º do CPC” (e é isso também que diz Abrantes Geraldes, quando assinala a ausência de “paliativos”, nestes casos)[44].
O que constata à saciedade é que o Recorrente - em momento algum - cumpre os ónus que se lhe impunham para impugnar de forma adequada e processualmente relevante qualquer dos factos considerados provados e não provados na Sentença proferida pelo Tribunal a quo, limitando-se a discordar, fazer comentários, tecer considerações, apresentar narrativas, misturar apreciação de factos, com a apreciação de Direito, e tudo sem ter o cuidado - que se lhe exigia - de identificar expressamente os pontos de factos que impugna, de explicar porquê e baseado em quê (que factos e que material probatório os imporiam), e de propor, quanto a esses mesmos pontos uma qualquer redacção alternativa ou expressa indicação de como haveriam de ser julgados.
E era o mínimo que se lhe exigiria: o legislador pretende a já assinalada responsabilização das partes e faz exigências processuais sérias, para evitar que os recursos se tornem comentários, desabafos ou “achismos” sobre a prova produzida: como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Março de 2018 (Processo n.º 290/12.6TCFUN.L1.S1-Tomé Gomes), a “natureza e estrutura da decisão de facto, bem como a economia da sua sindicância pelo tribunal ad quem, justificam o ónus, por banda do impugnante, de delimitar com precisão o objeto do recurso e o sentido da pretensão recursória nesse particular”, sendo que, “os requisitos formais de admissibilidade da impugnação da decisão de facto, mormente os constantes do artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) e c), do CPC, têm em vista, no essencial, garantir uma adequada inteligibilidade do objeto e alcance teleológico da pretensão recursória, de forma a proporcionar o contraditório esclarecido da contraparte e a circunscrever o perímetro do exercício do poder de cognição pelo tribunal de recurso”.
Ora, in casu, não é feita uma individualização por facto concreto, nem é feita a análise crítica perante essa individualização.
Convém, aliás, lembrar, que em face do n.º 2 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, quando “os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”. O que, não sendo feito, implica a imediata rejeição do recurso.
Como se diz de forma linear no Acórdão da Relação de Lisboa de 12 de Setembro de 2017 (Processo n.º 3310/11.8TBALM.L1-7-Luís Filipe Pires de Sousa), cabe “ao apelante actuar numa dupla vertente:
(i) rebater, de forma suficiente e explícita, a apreciação crítica da prova feita no tribunal a quo,
(ii) tentando demonstrar que a prova produzida inculca outra versão dos factos.
Assim, não chega sinalizar a existência de meios de prova em sentido divergente, cabendo ao apelante aduzir argumentos no sentido de infirmar directamente os termos do raciocínio probatório adoptado pelo tribunal aquo, evidenciando que o mesmo é injustificado e consubstancia um exercício incorreto da hierarquização dos parâmetros de credibilização dos meios de prova produzidos, ou seja, que é inconsistente. Em suma, não observa o ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida o apelante que se abstém de desconstruir a apreciação crítica da prova feita pelo tribunal a quo, limitando-se a assinalar que existem meios de prova em sentido diverso do aceite como prevalecente pelo tribunal a quo; ou o apelante que sustenta apenas que o tribunal a quo faz uma incorreta valoração da prova produzida”.
Repare-se, por outro lado, que não só existe prova gravada e o Tribunal a quo produziu uma fundamentação clara, congruente e assertiva:
“O Tribunal formou a sua convicção com base nos documentos juntos aos autos, nomeadamente, nos certificados de assentos de nascimento do beneficiário e da pessoa indicada para acompanhante, nos relatórios médico e clínico (donde se retira quais os problemas de saúde de que padece), bem como nas informações prestadas pela Segurança Social e pelo Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira, EPERAM.
Procedeu-se à audição pessoal do beneficiário que apenas soube identificar-se pelo nome, estado civil, nome completo do pai e primeiro nome da mãe.
Quanto às demais questões colocadas, não soube responder às mesmas, demonstrando não compreender o seu teor, com exceção de ter abanado a cabeça e confirmar que conhecia a pessoa indicada para acompanhante, M, sem, contudo, explicar donde a conhece.
Foi inquirida a filha do beneficiário (M) que confirmou os factos dados como provados, de forma detalhada e coerente”.
É para permitir verificar se o Tribunal a quo errou que a lei processual civil faz todas as aludidas exigências quanto à impugnação da decisão de facto, com vista a permitir a sua reapreciação séria, porque, como se assinala no Acórdão da Relação de Lisboa de 06 de Julho de 2023 (Processo n.º 489/21.4T8TVD.L1-2-Carlos Castelo Branco) “a função da Relação não é a de realizar um novo julgamento de facto: “Quando o Tribunal da Relação é chamado a pronunciar-se sobre a reapreciação da prova, no caso de se mostrarem gravados os depoimentos ou estando em causa a análise de meios prova reduzidos a escrito e constantes do processo, deve o mesmo considerar os meios de prova indicados pela partes e confrontá-los com outros meios de prova que se mostrem acessíveis, a fim de verificar se foi cometido ou não erro de apreciação que deva ser corrigido, seja no sentido de decidir em sentido oposto ou, num plano intermédio, alterar a decisão no sentido restritivo ou explicativo; Importa, porém, não esquecer que se mantêm-se em vigor os princípios de imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, pelo que o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados. Assim, em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira instância, em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 30-11-2017, Processo 1426/15.0T8BGC-A.G1, relator ANTÓNIO JOSÉ SAÚDE BARROCA PENHA)”.
O Recorrente, fazendo tábua rasa das exigências legais faz umas Alegações e produz umas Conclusões como se o artigo 640.º não existisse. Assim sendo e quanto a esta matéria, só podemos concluir inexiste uma verdadeira impugnação de qualquer facto, por não terem sido minimamente respeitadas as exigências do artigo 640.º, n.º 1, alíneas a), b) e c) (o que se impõe decidir, uma vez que a lei - repete-se – nem prevê a prolação de qualquer despacho de aperfeiçoamento dirigido à parte incumpridora).
O Tribunal julgará com os factos apurados e não colocados em causa.
* O Direito
Iniciando o enquadramento do presente recurso, importa dizer que ele surge no âmbito de uma acção especial de acompanhamento de maior, cujo regime começa por decorrer dos artigos 546.º, n.ºs 1 e 2 e 891.º a 904.º do Código de Processo Civil, sendo ainda complementado pelas disposições gerais e comuns que, com as necessárias adaptações, lhe sejam aplicáveis (uma vez que se não se tratando de um processo de jurisdição voluntária - artigos 891.º, n.º 1 e 986.º e seguintes -, estas podem ser-lhe aplicadas).
Trata-se de um processo novo que traz consigo um passado ligado aos processos de interdição e de inabilitação, mas que traduz uma nova abordagem, que importa considerar.
O enquadramento que deste regime faz Maria Inês Costa - num estudo exaustivo e essencial sobre a temática - ajuda a compreender o porquê da relevância dos interesses em jogo:
“Numa altura em que, em virtude da evolução social e demográfica, a população tem vindo a envelhecer e a esperança média de vida a aumentar, a sociedade moderna enfrenta a complexa problemática da “desarmonia entre gerações”[45].
Neste desequilíbrio geracional surgem, com particular relevo, os cidadãos adultos especialmente vulneráveis, seja em razão da idade ou de outra situação de maior vulnerabilidade (diagnóstico psiquiátrico, deficiência…).
É precisamente em virtude destas condições que se torna problemática a manutenção da autonomia em relação a estes adultos especialmente vulneráveis, uma vez que a certa altura das suas vidas se vêem “desapossados” das suas decisões, conduzidos a uma espécie de alienação social (sem retorno), em resultado da construção de cruéis papéis sociais que caracterizam a sociedade – nas palavras de BAUMAN[46] –, “líquida” em que vivemos e que leva ao gradual e silencioso afastamento do indivíduo da vida em sociedade
Essa tomada de consciência da necessidade de cuidado acrescido com as pessoas carecidas de maior protecção deu lugar a um movimento jurídico internacional de peso – onde se destaca a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência[47] – e o Direito Civil, como não podia deixar de ser, não foi excepção, não obstante tradicionalmente virado para a actividade do cidadão na plena posse de todas as faculdades[48].
Seguindo as exigências dos tempos, Portugal[49] implementou o novo regime jurídico do maior acompanhado, aprovado pela Lei n.º 49/2018, de 14 de Agosto – e abandonou o sistema dualista e rígido dos institutos da interdição/inabilitação que provinha do Código Civil de 1966[50] – introduzindo um regime monista, flexível, norteado pelos princípios da “primazia da autonomia da pessoa”, construindo assim um modelo de acompanhamento – e não já de substituição – da pessoa carecida de protecção[51].
As alterações incidiram sobretudo nos artigos 138.º a 156.º do Código Civil (interdição e inabilitação), sobre as regras do processo correspondente (artigos 891.º a 905.º do Código de Processo Civil – transformado em processo urgente e ao qual se aplicam as regras da jurisdição voluntária) e em disposições dispersas do Código Civil que estabelecem restrições à capacidade, mas sempre na perspectiva da menor limitação possível à capacidade do maior que necessita de acompanhamento.
Tal como também já sucedia anteriormente com a interdição e a inabilitação[52] é ao tribunal que compete a decisão de aferir se há ou não lugar ao regime do acompanhamento; mas agora manda a lei que o tribunal deva ouvir primeiro, pessoal e directamente, o beneficiário, só assim ficando em condições de adoptar as “soluções à medida” das necessidades de cada caso, que deverão ser sempre orientadas à socialização do maior numa perspectiva de cidadania inclusiva.
Uma das principais novidades do novo regime do maior acompanhado respeita, precisamente, à audição do beneficiário (artigos 139.º do Código Civil e 897.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), onde se prevê a reintrodução da audição pessoal e directa do beneficiário, apelidada de “interrogatório” na redacção do Código de Processo Civil de 2013, com longa tradição jurídico-processual no nosso ordenamento jurídico.
Desaparece a regra introduzida pela redacção do Código de Processo Civil 2013 e que permitia o decretamento da interdição/inabilitação sem o interrogatório do requerido, na ausência de contestação, prevendo-se agora a audição do beneficiário por parte do juiz enquanto meio de prova obrigatório em qualquer processo de acompanhamento de maiores (cf. n.º 2 e 3 do artigo 897.º do Código de Processo Civil).
A pessoa carecida de protecção é assim chamada ao palco da vida judiciária, sendo não só convidada a participar como também a “conversar” no processo decisório que lhe respeita.
Esta novidade corresponde, conforme se discutirá infra, à inflexão da opção que o legislador tomou por altura da reforma do Código Processo Civil em 2013, colocando, contudo, problemas ao nível da sua efectivação, aqui se destacando as situações de mudança de domicílio por parte do beneficiário na pendência da acção, bem como, em última análise, da eventual (des)conformidade com os princípios ordenadores da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, de uma audição feita por deprecada ou realizada através de meios de comunicação à distância”[53].
Partindo daqui, e anotando-se a total conformidade do processado nos presentes autos com estes princípios e exigências processuais (nomeadamente decorrentes dos artigos 139.º do Código Civil - Decisão judicial -, 897.º - Poderes instrutórios e 898.º - Audição pessoal - do Código de Processo Civil[54], os quais dão – por seu turno – corpo às imposições ordenatórias decorrentes da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência[55]), em face de já se ter transcrito a apreciação jurídica formulada pelo Tribunal a quo, a qual pela exemplaridade da sua estrutura, conjugada com a sua clareza, linearidade, compreensibilidade e solidez de análise jurídica, impõe a conclusão de que não merece qualquer reparo.
No essencial, que se reporta ao regime jurídico aplicável e princípios orientadores da decisão, bem assim como à leitura da situação em que o Beneficiário se encontra e à conclusão óbvia pela necessidade de aplicação do regime do maior acompanhado (face ao irreversível Alzheimer, com as consequências limitativas visíveis), bem assim como às medidas de representação tomadas, nada haveria mesmo a dizer, nem a alterar, pois em nada objectivo o Recorrente sequer as coloca em causa, o que sempre tornaria despicienda a sua reapreciação.
De todo o modo, verifica-se que o foco da divergência (depois da já referida amálgama de nulidades despropositadas), acaba por ainda poder retirar-se do que respeita à nomeação da filha como Acompanhante (e não à da cônjuge).
Apreciando a questão, efectivamente, o primeiro critério para essa nomeação é o da escolha do Acompanhado: o artigo 143.º, n.º 1 (Acompanhante), do Código Civil é claro quando diz que o “acompanhante, maior e no pleno exercício dos seus direitos, é escolhido pelo acompanhado ou pelo seu representante legal, sendo designado judicialmente”, sendo que, na falta de escolha, acrescenta do n.º 2, “o acompanhamento é deferido, no respetivo processo, à pessoa cuja designação melhor salvaguarde o interesse imperioso do beneficiário, designadamente[56]:
a) Ao cônjuge não separado, judicialmente ou de facto;
b) Ao unido de facto;
c) A qualquer dos pais;
d) À pessoa designada pelos pais ou pela pessoa que exerça as responsabilidades parentais, em testamento ou em documento autêntico ou autenticado;
e) Aos filhos maiores
f) A qualquer dos avós;
g) À pessoa indicada pela instituição em que o acompanhado esteja integrado;
h) Ao mandatário a quem o acompanhado tenha conferido poderes de representação;
i) A outra pessoa idónea”.
Como refere Paula Távora Vítor, as “exigências relativamente à figura do acompanhante prendem-se com a sua capacidade. Deve, desde logo, ser pessoa “maior” de dezoito anos (v. art. 130.º). A referência ao “pleno exercício dos seus direitos” seria mais facilmente descortinável no âmbito do sistema anterior, uma vez que se identificaria com a ausência de interdição ou inabilitação. Ora, face ao novo regime, podemos ter alguém que não assistiu à limitação judicial da sua capacidade, mas que, ainda assim, está sujeito a medida de acompanhamento. Não poderá, portanto, identificar-se o maior acompanhado como alguém que não está no “pleno exercício dos seus direitos” e, ainda que haja uma limitação da capacidade no âmbito de tal processo, pode ter um âmbito muito restrito, que não afete o exercício da função de acompanhante. Face a este recorte impreciso será preferível remeter para uma avaliação da sua capacidade em concreto para assumir tal cargo”[57].
O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Março de 2022 (Processo n.º 2076/16.0T8CSC.L2.S1-Rosa Tching) é também particularmente expressivo quando escreve que:
- resulta “da conjugação dos artigos 140º e 143º, ambos do Código Civil que o critério a observar na designação do acompanhante é o do “imperioso interesse do beneficiário” que se reporta aos direitos humanos e liberdades fundamentais da pessoa, nomeadamente aos seus direitos à solidariedade, ao apoio e à ampliação da sua autonomia”;
- na “designação do acompanhante, a lei atribui preferência à escolha feita pelo próprio acompanhado/beneficiário, pois não só a dignidade da pessoa humana implica que se respeite a sua vontade como uma pessoa da confiança do acompanhado é, por regra, aquela que está em melhores condições para promover o seu bem-estar emocional e assegurar-lhe, na medida do possível, a sua vida autónoma e independente”;
- só “não será de respeitar a escolha do acompanhado se as suas faculdades mentais não lhe permitirem fazer uma tal avaliação, isto é, se não tiver capacidade para compreender e avaliar a realidade que o cerca, ou se a pessoa por ele escolhida não se revelar idónea para o exercício do cargo”;
- cabe ao Tribunal, “de acordo com o critério do “ imperioso interesse do beneficiário ”, confirmar, ou não, a escolha do próprio acompanhado ou do seu representante legal ou, na falta de escolha por parte destes, designar o acompanhante ou acompanhantes, que devem estar em condições de exercer um conjunto de poderes-deveres de cuidado e diligência, dirigidos a promover, nos termos do artigo 146.º, n.º 1, do Código Civil, o bem-estar e a recuperação do acompanhado, na concreta situação considerada”.
Por outro lado e como se notou no Acórdão da Relação do Porto de 26 de Setembro de 2019 (Processo n.º 13569/17.1T8PRT.P1-Joaquim Correia Gomes), a “designação judicial do(s) acompanhante(s) deve estar (…) centrada na pessoa maior que em concreto, e não em abstracto, vai ser legalmente acompanhada, concluindo-se que aquela está em melhor posição para assumir as funções de acompanhamento legal, o que passa por:
(i) assegurar as medidas de apoio que foram determinadas pelo tribunal;
(ii) prestar-lhe os cuidados devidos, atento o respectivo contexto pessoal, social e ambiental;
iii) participar juridicamente na representação legal determinada pelo tribunal;
iv) assegurar em todos os domínios a vontade e os desejos da pessoa acompanhada, tanto a nível pessoal, como patrimonial, que não foram judicialmente reservados ou restringidas”.
Assim, a conclusão que começa por saltar à vista é a de que inexiste uma ordem de prevalência entre os nomeáveis (e, daí, a escolha propositada do termo “designadamente”) [58].
A mesma Paula Távora Vítor acrescenta ainda que, na “falta de escolha do acompanhante, cabe ao tribunal designá-lo segundo o critério do “interesse imperioso do beneficiário”, um padrão que tem de ser interpretado em primeira linha não por referência a um critério puramente objetivo do melhor interesse, mas concedendo prevalência à vontade reconhecível, ainda que não expressa do beneficiário, a razões de proximidade com o acompanhante e às necessidades pessoais daquele”[59].
E acrescenta: “O carácter aberto da norma não exclui que exista uma tendencial hierarquização do elenco que deve iluminar a decisão judicial, uma vez que as várias alíneas parecem estar ordenadas segundo um critério de proximidade relativamente ao beneficiário. Em primeiro lugar, encontramos o cônjuge, cuja situação de proximidade existencial é garantida pelo facto de não estarmos perante cônjuge separado (por via judicial ou administrativa) de pessoas e bens ou separado de facto. Compreende-se que encabece a lista, não só pelo facto de a realidade nos demonstrar como o cuidado é assumido em primeira linha pelo cônjuge (al. a)), mas também pelo facto de o cônjuge estar adstrito a uma panóplia de deveres conjugais e, com particular relevância neste contexto, ao dever de cooperação (art. 1674.º)”, sendo que, “quando tratamos da instituição desta medida em idades mais avançadas, o papel será mais facilmente atribuído aos filhos maiores (al. e), cuja referência merece a interpretação extensiva de “descendentes” – v. art. 144.º), sem que se estabeleça, como anteriormente, um critério etário na escolha” [60].
Ora, no caso dos autos, não havia uma escolha do/a Acompanhante por parte do Beneficiário, sendo que, a escolha do Tribunal se centrou na filha que mais o tem acompanhado.
Recorrendo ao quinteto de epigramas de Hipócrates, citado por João Lobo Antunes[61], dir-se-á que a “vida é curta, a arte é longa, a oportunidade fugidia, a experiência traiçoeira e o juízo difícil", mas, no caso concreto, o juízo formulado nem sequer era difícil e só podia ser o que foi, tratando-se da escolha natural e necessária (não fazendo qualquer sentido o recurso à cônjuge, atenta a sua idade -muito- avançada e a circunstância de - como resultou claro da inquirição da indigitada Acompanhante - estar já também muito dependente e com uma altíssima taxa de incapacidade).
O Tribunal a quo avançou directamente para a filha M por ser quem “lhe presta apoio diariamente em todos os atos da sua vida e o acompanha de facto, por melhor salvaguardar o superior interesse do beneficiário”. E era exactamente isso que teria de decidir!
Será, portanto, à designada Acompanhante que caberá agora – formalmente – um novo papel, não muito distinto daquele que já fazia, enquanto filha preocupada com o pai e o seu bem-estar, fugindo – dentro do humanamente possível – a tentações de individualismo ou egoísmo[62].
A Sentença sob recurso é, deste modo, uma peça jurídica completa, sólida, fundamentada, nada havendo a alterar-lhe ou a acrescentar-lhe, por desnecessário ou redundante, em consequência do que o Recurso interposto improcede na totalidade.
Faça-se ainda aqui um sublinhado para as considerações manifestamente desajustadas formuladas nas alegações de recurso quanto à decisão tomada, nomeadamente no que concerne à manutenção da situação existente, como se a situação de saúde do Beneficiário não fosse irreversível, como se este não estivesse a ser bem tratado e como se o esforço da designada acompanhante fosse desvalorizável.
É evidente que o que interessa é lograr proporcionar ao Beneficiário o melhor tipo de cuidados possível nesta fase (irreversível) da sua vida. E também o é que esses cuidados têm vindo a ser proporcionados, desde logo na procura de um Lar que o pudesse acolher em condições dignas, canalizando para o seu pagamento quer os recursos do Beneficiário (pensão), quer a renda de um imóvel pertença das filhas.
O bem-estar do Beneficiário, com a medida tomada, pode continuar a ser assegurado, assentando-se juridicamente e para efeitos de representação e gestão da sua vida e bens o apoio ds filha que o tem acompanhado mais de perto e que assim fica nomeada como Acompanhante. Situação linear e em que falar de comodidade é apenas desrazoável.
*
Nas palavras de Eric Voegelin as “sociedades dependem para a sua génese, a sua existência harmoniosa continuada e a sobrevivência, das acções dos seres humanos componentes. A natureza do homem e a liberdade da sua acção para o bem e para o mal, são factores essenciais na estrutura da sociedade"[63].
O Recorrente escolheu o seu caminho de actuação.
Ao Tribunal resta, no "acto de julgar", não lhe dar razão e fazer improceder o seu recurso (tendo, na linha de Paul Ricoeur, como "horizonte um equilíbrio frágil entre os dois componentes da partilha" - "demasiado próximos no conflito e demasiado afastados um do outro na ignorância, no ódio, ou no desprezo" - mas impondo-se, "por um lado, pôr fim à incerteza, separar as partes; por outro, fazer reconhecer a cada um a parte que o outro ocupa na mesma sociedade, em virtude do que o ganhador e o perdedor do processo seriam reputados ter cada qual a justa parte no esquema de cooperação que é a sociedade"[64]).
** DECISÃO
Com o poder fundado no artigo 202.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, e nos termos do artigo 663.º do Código de Processo Civil, acorda-se, nesta 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, face à argumentação expendida e tendo em conta as disposições legais citadas, em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar a Sentença sob recurso.
*
Sem custas, por delas esta isento o Apelante (artigo 4.º, n.º 2, alínea l)[65], do Regulamento das Custas Processuais)
*
Notifique e, oportunamente, remeta à 1.ª Instância (artigo 669.º do Código de Processo Civil).
***
Lisboa, 29 de Abril de 2025 Edgar Taborda Lopes Ana Mónica Mendonça Pavão Carlos Oliveira[66]
_______________________________________________________ [1] Por opção do Relator, o Acórdão utilizará a grafia decorrente do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1945 (respeitando nas citações a grafia utilizada pelos/as citados/as).
A jurisprudência citada no presente Acórdão, salvo indicação expressa noutro sentido, está acessível em http://www.dgsi.pt/ e/ou em https://jurisprudencia.csm.org.pt/. [2]“Uma vez que, na presente ação, a única diligência probatória legalmente exigível é a audição direta do beneficiário e tendo em conta que, in casu, atenta a audição do beneficiário e a documentação junta aos autos, entende o Tribunal estar em condições de proferir sentença, não determino a realização de exame pericial ao beneficiário. Notifique.”. [3]António Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 6.ª edição Atualizada, Almedina, 2020, página 183. [4]António Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 6.ª edição Atualizada, Almedina, 2020, página 213. O que é também corroborado colectivamente por António Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Volume I, 2.ª edição, Almedina, 2020, página 763. [5] Que este Tribunal teve o cuidado de escutar com atenção. [6] Não tem mesmo qualquer cabimento afirmar que “não há lugar a Despachos sejam eles quais forem em sede de Sentença”, desde logo porque o Despacho em causa foi prévio à Sentença (para além de nada obstar a que em sede de Sentença essa decisão poder nela ser assumida e proferida). [7] E seguiremos de perto o que se teve oportunidade de escrever no (não publicado) Acórdão de 08 de Abril de 2025 (Processo n.º 2616/24.0T8FNC.L1-José Capacete), no qual o ora Relator teve intervenção como Adjunto (assim sumariado: “I - A ausência de despacho sobre um requerimento probatório não acarreta a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d), 1.ª parte, do Código de Processo Civil, pois que o mesmo não constitui, por si, uma questão a resolver nos termos do artigo 608.º, n.º 2, do mesmo código. II - A decisão sobre as diligências probatórias a realizar no âmbito de um processo especial de acompanhamento de maior deve obedecer ao singelo critério da sua conveniência para a justa decisão da causa, à luz de todos os princípios substantivos e processuais orientadores daquele tipo de processo, para o que é indispensável uma ponderação casuística. III - A conjugação do previsto no n.º 1 do artigo 899.º, com o previsto no n.º 1 do artigo 897.º, e ainda do n.º 2 do artigo 898.º, faz com que seja possível dispensar a presença do perito no processo ou a elaboração do respetivo relatório pericial, o que vale por dizer que o exame pericial é, presentemente, no processo especial de acompanhamento de maior, não obrigatório. IV - O despacho que indefere a realização de uma perícia médica por a considerar desnecessária à luz do referido critério da conveniência, apenas pode ser impugnado no recurso interposto da sentença final (artigo 644.º, n.º 3), pois não se trata de um despacho de rejeição de um meio de prova, nos termos e para os efeitos da parte final da alínea d) do n.º 2 do mesmo artigo”). [8] Na versão de 2013 (do Decreto Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho) este artigo dispunha que “Quando se trate de ação de interdição, ou de inabilitação não fundada em mera prodigalidade, procede-se, findos os articulados, à realização do exame pericial ao requerido e, tendo havido contestação, ao seu interrogatório”. [9]Nuno Piçarra, Comentário aos artigos 891.º a 904.º do Código de Processo Civil, in Processo Especial de Acompanhamento de Maiores, AAFDL Editora, Lisboa, 2023, páginas 132-135. [10]Ema Conde-Bruno Trancas-Fernando Vieira, O maior (des)acompanhado e as perícias médico-legais, in Julgar, n.º 41, Almedina, 2023, páginas 133-134. [11]Marta Sofia Caldas Viana, O regime jurídico do maior acompanhado: desafios, potencialidades e constrangimentos, [em linha] Dissertação de Mestrado em Direito das Crianças, Família e Sucessões, Universidade do Minho – Escola de Direito, 2020, página. 99, disponível em https://repositorium.sdum.uminho.pt/bitstream/1822/74361/1/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20Marta%20Sofia%20Caldas%20Viana.pdf[consultado a 10/04/2025]. [12] Que, diga-se, sempre estaria condenado ao insucesso, face aos dados constantes dos autos. [13] Disponível em https://blogippc.blogspot.com/search?updated-max=2018-04-19T07:00:00%2B01:00&max-results=12&start=163&by-date=false [consultado a 11/04/2025]. [14] Que apresenta um elenco de causas de nulidade da sentença que pode ser considerado como taxativo, no sentido de que apenas os vícios aí enumerados constituem causa de nulidade da sentença.
É o que já concluíam (perante os Códigos de Processo Civil de 1939 e 1961, que neste aspecto não sofreram alterações relevantes) José Alberto dos Reis (Código de Processo Civil Anotado, Volume V, 3.ª edição-reimpressão de 1981-, Coimbra Editora, página 137), Jacinto RodriguesBastos (Notas ao Código de Processo Civil, Volume III, Lisboa, 1972, página 245) e Antunes Varela-J-M.Bezerra-Sampaio e Nora (Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 1985, páginas 666-668).
Na jurisprudência, vd., por exemplo, o recente Acórdão da Relação do Porto de 06 de Fevereiro de 2025 (Processo n.º 9815/13.9TBVNG-F.P1-Judite Pires), onde se escreve que “Como o n.º 1 do artigo 668.º do anterior diploma, também o n.º 1 do artigo 615.º do actual Código de Processo Civil contém uma enumeração taxativa das causas de nulidade da sentença, nelas não se inserindo o designado erro de julgamento, que apenas pode ser atacado por via de recurso, quando o mesmo for legalmente admissível”. [15] “Proibição de decisões-surpresa; nulidade da decisão-surpresa”, texto publicado a 23 de Março de 2015 e disponível em https://blogippc.blogspot.com/2015/03/jurisprudencia-105.html [consultado a 11/04/2025]. [16] “Decisão-surpresa; nulidade da decisão”, [em linha] texto publicado a 20 de Maio de 2020 e disponível em https://blogippc.blogspot.com/2020/05/jurisprudencia-2019-242.html[consultado a 11/04/2025]. [17] “Nulidades do processo e nulidades da sentença: em busca da clareza necessária”, [em linha] texto publicado a 22 de Setembro de 2020, disponível em https://blogippc.blogspot.com/2020/09/[consultado a 11/04/2025].
Com interesse, sobre esta matéria, vide ainda, Luís Correia Mendonça, O Contraditório e a proibição das decisões-surpresa, [em linha] Revista da Ordem dos Advogados (ROA), Ano 82 - Vol. I/II - Jan./Jun. 2022, páginas 185 a 239, disponível em https://portal.oa.pt/media/135588/luis-correia-de-mendonca.pdf[consultado a 11/04/2025]. [18] Sendo certo que, diga-se desde já, também não vislumbramos nada de estranho em que se notifique a Sentença proferida à entidade em que o Beneficiário está internado, mais ainda quando o processo que levou a esse internamento e os seus custos e condições foram descritos de forma linear e espontânea pela filha deste em sede das suas declarações. [19] Não publicado. [20] É mesmo inqualificável que o Beneficiário-Recorrente tenha a coragem de vir dizer que o Tribunal omite qual é a patologia que o afecta, quando ela está descrita no Facto 4. [21]“(…)a quem cometo as seguintes medidas de acompanhamento: • Representação especial as instituições e organismos oficiais, incluindo Instituições de Saúde, Finanças, Segurança Social, Tribunais, Conservatórias de Registo, Centro Nacional de Pensões, Lares, Centros de Dia, Instituições de Solidariedade Social, Entidades Bancárias e Correios. • Administração total dos bens e rendimentos do beneficiário. Mais declaro que o beneficiário não tem capacidade para testar”. [22] No Acórdão da Relação de Lisboa de 23 de Abril de 2015 (Processo n.º 185/14.9TBRGR.L1-2-Ondina do Carmo Alves) escreve-se que a “questão a decidir não é a argumentação utilizada pelas partes em defesa dos seus pontos de vista fáctico-jurídicos, mas sim as concretas controvérsias centrais a dirimir e não os factos que para elas concorrem”. [23] No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Novembro de 2005 (Processo n.º 05S2137-Sousa Peixoto), sublinha-se que é “a violação daquele dever que torna nula a sentença e tal consequência justifica-se plenamente, uma vez que a omissão de pronúncia se traduz, ao fim e ao cabo, em denegação de justiça e o excesso de pronúncia na violação do princípio dispositivo que contende com a liberdade e autonomia das partes”. [24] Assim, António Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Volume I – Parte Geral e Processo de Declaração, 2.ª edição, Almedina, 2020, página 764. [25] Assim, vd. José Lebre de Freitas-Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 4.ª edição, Almedina, 2019, páginas 713 e 737. [26]José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, 3.ª edição (reimpressão de 1981), Coimbra Editora, páginas 143-144. [27] Que a torna - como se conclui no Acórdão da Relação de Lisboa de 19 de Novembro de 2019 (Processo n.º 23151/16.5T8SNT.L1-7-Micaela Sousa) – numa “figura de muito difícil verificação, dado que a doutrina e a jurisprudência têm salientado que tal só se verifica em situações de falta absoluta de indicação das razões de facto e de direito que justificam a decisão e não também quando tais razões constem da sentença, mas de tal forma que pela sua insuficiência ou laconismo, se deve considerar a fundamentação deficiente”. [28]Sublinhado e carregado nossos. [29]Sublinhado e carregado nossos. [30] José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, V Volume, cit., página 140. [31] Demonstrando, aliás, na sua audição, uma enorme preocupação, esforço, critério, lucidez e exigência, na descrição da evolução da doença do pai e no processo que levou à escolha do Lar em que se encontra internado, tudo no sentido de lhe garantir condições dignas e o maior bem estar possível. [32] Que, aliás, vinha já proposta pelo Ministério Público no Requerimento Inicial. [33] Por ostensivo e manifesto lapso, o Tribunal a quo escreveu “5”, o que aqui se corrige directamente, ao abrigo do artigo 249.º do Código Civil . [34] Por ostensivo e manifesto lapso, o Tribunal a quo escreveu “A Beneficiária”, o que aqui se corrige directamente, ao abrigo do artigo 249.º do Código Civil. [35]“O atual art. 662º representa uma clara evolução no sentido que já antes se anunciava. Como se disse, através dos n.ºs 1 e 2, als. a) e b), fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis e com observância do princípio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia” - Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 6.ª edição Atualizada, Almedina, 2020, página 332. [36] Por todos, vd. António Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 6.ª edição Atualizada, Almedina, 2020, páginas 193 a 210. [37]António Abrantes Geraldes, Recursos…, cit., página 200. [38]António Abrantes Geraldes, Recursos…, cit., páginas 201-205. [39]António Abrantes Geraldes, Recursos…, cit., páginas 206-207. [40] Que acrescenta, relevantemente, que “este instrumento processual tem por fim último possibilitar alterar a matéria de facto que o tribunal a quo considerou provada, para, face à nova realidade a que por esse caminho se chegou, se possa concluir que afinal existe o direito que foi invocado, ou que não se verifica um outro cuja existência se reconheceu; ou seja, que o enquadramento jurídico dos factos agora tidos por provados conduz a decisão diferente da anteriormente alcançada. O seu efetivo objetivo é conceder à parte uma ferramenta processual que lhe permita modificar a matéria de facto considerada provada ou não provada, de modo a que, por essa via, obtenha um efeito juridicamente útil ou relevante» (Ac. da RC, de 24.04.2012, Beça Pereira, Processo nº 219/10…). Logo, «por força dos princípios da utilidade, economia e celeridade processual, o Tribunal ad quem não deve reapreciar a matéria de facto quando o(s) facto(s) concreto(s) objeto da impugnação for insuscetível de, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente» (Ac. da RC, de 27.05.2014, Moreira do Carmo, Processo nº 1024/12…). Por outras palavras, se, «por qualquer motivo, o facto a que se dirige aquela impugnação for, "segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito", irrelevante para a decisão a proferir, então torna-se inútil a atividade de reapreciar o julgamento da matéria de facto, pois, nesse caso, mesmo que, em conformidade com a pretensão do recorrente, se modifique o juízo anteriormente formulado, sempre o facto que agora se considerou provado ou não provado continua a ser juridicamente inócuo ou insuficiente. Quer isto dizer que não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto objeto da impugnação não for suscetível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe, antemão, ser inconsequente, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processual consagrados nos artigos 2.º n.º 1, 137.º e 138.º.» (Ac. da RC, de 24.04.2012, Beça Pereira, Processo nº 219/10…. No mesmo sentido, Ac. da RC, de 14.01.2014, Henrique Antunes, Processo nº 6628/10)”. [41]Acórdão da Relação de Guimarães de 15 de Dezembro de 2016, Processo n.º 86/14.0T8AMR.G1-Maria João Matos. [42] Assinalando ainda que “nessa reapreciação da prova feita pela 2ª instância, não se procura obter uma nova convicção a todo o custo, mas verificar se a convicção expressa pelo Tribunal “a quo” tem suporte razoável, atendendo aos elementos que constam dos autos, e aferir se houve erro de julgamento na apreciação da prova e na decisão da matéria de facto, sendo necessário, de qualquer forma, que os elementos de prova se revelem inequívocos no sentido pretendido” (Ana Luísa Geraldes, Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, publicado nos Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Vol I, Coimbra Editora, 2013, páginas 589 e seguintes(609), com o texto disponível on line em http://www.cjlp.org/materias/Ana_Luisa_Geraldes_Impugnacao_e_Reapreciacao_da_Decisao_da_Materia_de_Facto.pdf, páginas 17-18 [consultado a 12/04/2025] [43] Blog do IPPC, 19/05/2017, Jurisprudência (623), em anotação ao Acórdão da Relação de Coimbra de 07/02/2017, disponível em https://blogippc.blogspot.com/2017/05/jurisprudencia-623.html[consultado a 12/04/2025].
Vd. também, neste sentido, o Acórdão da Relação do Porto de 14 de Dezembro de 2022 (Processo n.º 1720/20.9T8GDM.P1-Fernanda Pinheiro). [44]Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, cit., páginas 198 e 199. [45] NEVES, Alexandra Chícharo das, O estatuto jurídico dos “Cidadãos Invisíveis”, O longo caminho para a plena cidadania das pessoas com deficiência, Tese para obtenção do grau de Doutor em Direito, UAL, Lisboa, Setembro de 2011, disponível em https://repositorio.ual.pt. [46] BAUMAN, Zygmunt, Amor Líquido, Relógio d’água, 2003. [47] Portugal ratificou a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) no ano de 2009 (em simultâneo com o Protocolo Facultativo), pelas Resoluções da Assembleia da República n.º 56/2009 e 57/2009, ambas de 30 de Julho. E ratificou-os pelas Decisões do Presidente da República n.º 71/2009 e 72/2009, ambas de 30 de Julho. [48] MONTEIRO, Menezes Cordeiro e António Pinto, Da situação jurídica do maior acompanhado, Estudo de política legislativa relativo a um novo regime das denominadas incapacidades dos maiores, Revista de Direito Civil, n.º 3, Almedina, 2018, pág. 473. [49] Quanto à evolução económico-social e demográfica, vd. ALVAREZ M., SOUSA. T., SÁ R. E TEIXEIRA Z., A longevidade e o Envelhecimento: Escritos de Direito da Saúde – Envelhecimento, edição FAF, Fevereiro de 2018 e ainda COSTA, Marta, A desejável flexibilidade da incapacidade das pessoas maiores de idade, Lusíada, Direito, Lisboa, n.º 7 (2010). [50] COSTA, Américo de Campos, Incapacidades e formas do seu suprimento – anteprojecto do Código Civil, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 111, 1961. [51] O legislador português subscreveu assim as novas tendências mundiais e europeias, perfilhando a “doutrina da alternativa menos restritiva” situando a pessoa carecida de protecção numa posição de igualdade de direitos em relação aos demais. Neste sentido, vd. na doutrina, MOREIRA, Sónia, A reforma do regime das incapacidades: o maior acompanhado, Temas de Direito e Bioética – Vol. I, Novas questões do Direito da Saúde, dezembro de 2018. [52] Cf. nomeadamente, CORDEIRO, Menezes, Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo III, Pessoas, Coimbra, Almedina, 2004, págs. 409-427; VASCONCELOS, Pais de, Teoria Geral do Direito Civil, 8.ª Ed., Coimbra, Almedina, 2015, págs. 110-116. [53]Maria Inês Costa, A audição do beneficiário no regime jurídico do maior acompanhado: notas e perspectivas, Julgar-on line, Julho de 2020, disponível em http://julgar.pt/a-audicao-do-beneficiario-no-regime-juridico-do-maior-acompanhado-notas-e-perspectivas/[consultado a 12/04/2025]. [54] Para além do elemento interpretativo em que se traduz o que consta da Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 110/XIII, que deu origem à Lei n.º 49/2018, de 28 de Agosto: “Os fundamentos finais da alteração das denominadas incapacidades dos maiores (…) são, em síntese, os seguintes: a primazia da autonomia da pessoa, cuja vontade deve ser respeitada e aproveitada até ao limite do possível; a subsidiariedade de quaisquer limitações judiciais à sua capacidade, só admissíveis quando o problema não possa ser ultrapassado com recurso aos deveres de proteção e de acompanhamento comuns, próprios de qualquer situação familiar; a flexibilização da interdição/inabilitação, dentro da ideia de singularidade da situação; a manutenção de um controlo jurisdicional eficaz sobre qualquer constrangimento imposto ao visado; o primado dos seus interesses pessoais e patrimoniais; a agilização dos procedimentos, no respeito pelos pontos anteriores; a intervenção do Ministério Público em defesa e, quando necessário, em representação do visado.
Para prosseguir estes objetivos, opta-se, por um lado, por um modelo monista – em claro detrimento de um modelo de dupla via ou múltiplo – por se considerar ser o dotado de maior flexibilidade e de amplitude suficiente, por compreender todas as situações possíveis, e por outro, por um modelo de acompanhamento e não de substituição, em que a pessoa incapaz é simplesmente apoiada, e não substituída, na formação e exteriorização da sua vontade. Por comparação com o regime atual, é radical a mudança de paradigma. Este modelo é o que melhor traduz o respeito pela dignidade da pessoa visada, que é tratada não como mero objeto das decisões de outrem, mas como pessoa inteira, com direito à solidariedade, ao apoio e proteção especial reclamadas pela sua situação de vulnerabilidade” (acessível, junto com todos os pareceres produzidos no decurso do processo legislativo, no e-book do CEJ, O Novo Regime Jurídico do Maior Acompanhado, Colecção Formação Contínua, Fevereiro de 2019, páginas 139 e seguintes, disponível em https://cej.justica.gov.pt/LinkClick.aspx?fileticket=_nsidISl_rE%3D&portalid=30) [consultado a 12/04/2025]. [55] O que nos permite concluir, com Margarida Paz, que a “audição pessoal e direta do beneficiário, na concretização dos princípios constantes do artigo 3.º da Convenção, constitui o respeito pela dignidade inerente, autonomia individual, incluindo a liberdade de fazer as suas próprias escolhas, e independência da pessoa com deficiência [alínea a)], bem como a sua participação e inclusão plena e efetiva na sociedade [alínea c)]. Neste contexto, audição pessoal e direta do beneficiário não deve apenas ocorrer relativamente à tomada de decisão da medida ou medidas de acompanhamento a decretar pelo tribunal. Na verdade, o acompanhado deve ser ouvido relativamente a todas as decisões que sejam tomadas e que lhe digam diretamente respeito” (Margarida Paz, O regime do acompanhamento de maiores: alguns aspectos processuais, in O Novo Regime Jurídico do Maior Acompanhado, [em linha] Colecção Formação Contínua, Fevereiro de 2019, páginas 130-131, disponível em https://cej.justica.gov.pt/LinkClick.aspx?fileticket=_nsidISl_rE%3D&portalid=30[consultado a 12/04/2025]. [56] Carregado e sublinhado nossos. [57]Paula Távora Vítor, em anotação ao artigo 143.º do Código Civil, in Ana Prata, Código Civil Anotado, Volume I, Almedina, 2019, páginas 177 e 178. [58] Assim, também, PedroCalapez, Acompanhamento de Maiores, in Processos Especiais, Volume I, Centro de Investigação de Direito Privado-AAFDL Editora, 2020, página 115. [59]Paula Távora Vítor, em anotação ao artigo 143.º do Código Civil, in Ana Prata, cit., páginas 179-180. [60]Paula Távora Vítor, em anotação ao artigo 143.º do Código Civil, in Ana Prata, cit., páginas 179-180. [61]João Lobo Antunes, Numa Cidade Feliz, Gradiva, 1999, página 203. [62] Escreve Victoria Camps que, numa “perspectiva individualista, a humanidade parece empenhada na sua extinção como tal, tão escassas são as manifestações de autêntica humanidade e dignidade. Existem, sem dúvida, mulheres e homens que cumprem satisfatoriamente o papel que lhes foi dado viver, não são más pessoas, mas poucas vezes – talvez só perante situações limite como a morte – fazem o esforço de se distanciar do seu cenário específico e envolver-se no seio de uma circunstância um pouco mais ampla” (Paradoxos do Individualismo, Relógio D’Água, 1996, páginas 16-17). [63]Eric Voegelin, A Natureza do Direito e outros textos jurídicos, Vega, 1998, página 95. [64]Paul Ricoeur, O Justo ou a Essência da Justiça, Instituto Piaget, 1997, páginas 168-169; cfr., também, com interesse, François Ost, A Natureza à Margem da Lei - A Ecologia à Prova do Direito, Instituto Piaget, 1997, páginas 19 a 24. [65]“Estão isentos de custas: (…) l) Os menores, maiores acompanhados, ausentes e incertos quando representados pelo Ministério Público ou por defensor oficioso, mesmo que os processos decorram nas conservatórias de registo civil”. [66] Assinaturas digitais, cujos certificados estão visíveis no canto superior esquerdo da primeira página (artigos 132.º, n.º 2 e 153.º, n.º 1, do Código de Processo Civil e 19.º, n.ºs 1 e 2, e 20.º, alínea b), da Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto).