VENDA DE BENS DE CONSUMO
NULIDADE DE SENTENÇA
CONDENAÇÃO EM OBJECTO DIVERSO DO PEDIDO
REJEIÇÃO DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
DEFEITOS DA COISA VENDIDA
CADUCIDADE
ÓNUS DA PROVA
ABUSO DE DIREITO
Sumário


I - É pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso, seja quanto às pretensões da recorrente, seja quanto às questões de facto e de direito que coloca.
II - A garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto não pode dissociar-se da análise do objeto do recurso, cujo ónus de delimitação impende sobre a recorrente.
II - Não indicando a apelante a solução que defende para o litígio na hipótese de precedência da impugnação da decisão sobre a matéria de facto relativamente ao ponto 13.º dos factos provados e à ampliação da matéria de facto enunciada em ii), também não peticionando, ainda que subsidiariamente, qualquer alteração da decisão no que concerne à solução jurídica da causa, a reapreciação da decisão proferida pela 1.ª Instância quanto à matéria em questão configura a prática de um ato inútil e, como tal, proibido por lei, tanto mais que sobre tal matéria a sentença impugnada não retirou qualquer consequência jurídica, nem o autor/recorrido recorreu da decisão, ainda que subordinadamente, o que determina inevitavelmente a rejeição da correspondente impugnação da decisão relativa à matéria de facto.
III - Estando em causa a compra e venda com instalação de uma salamandra, alegadamente defeituosa, sendo o autor uma pessoa singular e o bem adquirido destinado ao seu uso pessoal, na casa onde reside (consumidor), enquanto o alienante (vendedora), ora 1.ª ré/recorrente, vendeu os bens no âmbito do comércio a que se dedica, mostra-se aplicável o regime jurídico da venda de bens de consumo.
IV - Cabe ao autor (consumidor) a prova do defeito de funcionamento da coisa (da falta de conformidade) - facto base da presunção -, por se tratar de facto constitutivo do seu direito - sem que sobre si impenda o ónus de alegar e provar a causa concreta da origem do mau funcionamento e a sua existência à data da entrega; à ré/vendedora cabe alegar e provar que o alegado direito do autor foi denunciado e/ou exercitado para além dos prazos previstos nos artigos 5.º e 5.º-A do DL n.º 67/03 de 8-04.
V - A falta de conformidade resultante de má instalação do bem de consumo é equiparada à falta de conformidade do bem, quando a instalação fizer parte do contrato de compra e venda e tiver sido efetuada pelo vendedor.

Texto Integral


Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. Relatório

AA, intentou ação de processo comum contra I - EMP01..., Lda., com sede na Travessa ..., ..., ..., ..., Portugal, e EMP02... S.L., com sede na Carretera ... (...), Km 78,2, ...00, ..., ..., pedindo a condenação das rés: a) a procederem à perfeita reparação da salamandra em causa, a expensas exclusivas das rés, no prazo que lhe vier a ser fixado; nessa impossibilidade, b) a substituir a salamandra por outra da mesma gama e características em perfeito estado de conservação e funcionamento; em todo o caso, c) a pagar ao autor a quantia de 5.578,00€ (cinco mil quinhentos e setenta e oito euros) referente ao preço de reparação dos danos patrimoniais; indemnizar ao A. pela quantia de 2.500,00€ (dois mil e quinhentos euros) a título de danos morais; pagar juros de mora à taxa legal a contar da data da citação até ao efetivo e integral pagamento.
No essencial, alegou ter adquirido à 1.ª ré uma salamandra, fabricada pela 2.ª ré, pelo preço de 2.152,67€, estando incluído neste preço a montagem da salamandra na sua habitação, bem como bem como a instalação dos necessários tubos de extração. Mais alega que a salamandra começou a apresentar defeitos e/ou anomalias, os quais provocaram uma fuga de fumo que fez com que a sua habitação ficasse com várias manchas negras, nomeadamente no teto, nas paredes e nos cortinados, ficando os tetos e as paredes danificadas em virtude da fuga de fumo do interior para o exterior da salamandra, havendo necessidade urgente de proceder à sua reparação, assim causando ao autor prejuízos patrimoniais e não patrimoniais, que descreve. Mais sustenta o autor ter denunciado às rés o defeito, exigindo a reparação ou a substituição da salamandra por uma nova, atendendo ao facto de a mesma provocar emissão de fumos para o interior da habitação, sendo que apenas no dia 18-08-2020, a salamandra foi retirada da sua casa por funcionários da 1.ª ré, de modo a ser enviada posteriormente para as instalações da 2.ª ré; que a mesma salamandra só voltou a ser entregue ao autor, supostamente reparada, no dia 26-10-2020; no dia seguinte à entrega, o autor inspecionou a salamandra e logo se apercebeu que a mesma vinha com vários riscos e amolgadelas e que não tinha quando foi recolhida pela 1.ª vez na sua habitação, bem como que algumas peças da parte da parte de trás estavam quase soltas, indiciando que a salamandra havia sofrido várias pancadas, o que reportou às rés, exigindo a substituição da salamandra por uma nova ou a restituição do valor pago pela sua aquisição, recusando-se as rés a reparar ou a substituir a salamandra.
Ambas as rés contestaram.
A 1.º ré defendeu-se por impugnação, sustentando que a salamandra vendida ao autor não padece de qualquer defeito ou desconformidade, nem apresenta quaisquer danos, designadamente “riscos”, “fendas” ou “aberturas”, “amolgadelas” cuja existência seja imputável à ré, e por exceção, invocando a caducidade do direito exercido pelo autor, uma vez que este não denunciou a pretensa falta de conformidade dentro do prazo de dois meses a contar da data em que alegadamente a detetou. Mais alega que a conduta do autor é de molde a excluir o dever de indemnizar, constituindo abuso do direito, na modalidade de venire contra factum proprium, pois a respetiva atuação contribuiu de forma decisiva e indispensável para a verificação e consumação dos danos que alega terem ocorrido, ao não interromper de imediato a utilização da referida salamandra, persistindo na utilização de uma salamandra que, desde cedo, reputou como defeituosa e emitindo fumos, por um total de 1293 horas em 232 ocasiões distintas. Termina pedindo a procedência da exceção de caducidade, pugnando pela improcedência da ação com a consequente absolvição do pedido contra si formulado.
Também a 2.ª ré suscitou a extinção do direito invocado pelo autor, por caducidade, já que este não denunciou os alegados defeitos no prazo de dois meses a contar da data em que alegadamente os detetou. No mais, nega que a salamandra vendida ao autor padecesse de defeitos e/ou anomalias, nomeadamente que tivesse uma alegada fuga de fumo. Sustenta que a salamandra foi sujeita a uma revisão e submetida a ensaios técnicos, no seu laboratório, tendo os seus técnicos verificado que a salamandra em causa já tinha já 1293 horas totais de funcionamento desde o seu arranque e 247 acendimentos (tinha sido ligada 247 vezes); comprovou-se também, que a referida salamandra nunca tinha sido limpa, nem efetuada a sua manutenção, contrariamente ao que consta no manual de instruções que acompanha a salamandra e que contém todas as informações referentes à instalação e manutenção da mesma. Conclui pela procedência da exceção perentória de caducidade ou, caso assim não se entenda, pela improcedência da ação.
Foi dispensada a audiência prévia bem como a fixação do objeto do litígio e dos temas da prova, relegando-se para final o conhecimento da exceção invocada por ambas as partes.

Realizou-se a audiência final, após o que foi proferida sentença julgando a ação parcialmente procedente, a qual se transcreve na parte dispositiva:
«Face ao exposto, julgo a presente acção declarativa de condenação intentada por AA contra EMP01... e EMP03... S.L., parcialmente procedente, por parcialmente provada, e em consequência;
a) Absolvo a Ré, EMP03... S.L. dos pedidos contra si deduzidos;
b) Condeno a Ré, EMP01..., Lda a, no prazo de 60 dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença proceder à reparação da instalação da salamandra, com substituição dos tubos ou mudança de local, reparação de paredes e/ou o mais necessário, a expensas suas;
c) Condeno a Ré, EMP01..., Lda a pagar ao autor a quantia de 5.578,00€, a título de danos patrimoniais e 1.500,00€, a título de danos não patrimoniais, perfazendo o montante global de 7.078,00€ (sete mil e setenta e oito euros)
d) No mais absolvo a Ré, EMP01..., Lda do restante peticionado.
e) Custas da acção, por autor e 1.ª Ré, no valor de 3 (três) UC’s, na proporção do decaimento fixando-se ¼ para o autor e ¾ para a segunda – art. 527.º do CPC e 6.º, n.º1 do RCP, por referência à Tabela I-A anexa».

Inconformada com tal decisão, a 1.ª ré - EMP01..., Lda., - dela veio interpor recurso de apelação.
Termina as alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem):

Vem o presente recurso de apelação interposto da douta sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a Ré, ora Recorrente, nos seguintes termos: (a fls. 35 da sentença)
“b) Condeno a Ré, EMP01..., Lda a, no prazo de 60 dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença proceder à reparação da instalação da salamandra, com substituição dos tubos ou mudança de local, reparação de paredes e/ou o mais necessário, a expensas suas;      
c) Condeno a Ré, EMP01..., Lda a pagar ao autor a quantia de 5.578,00€, a título de danos patrimoniais e 1.500,00€, a título de danos não patrimoniais, perfazendo o montante global de 7.078,00€ (sete mil e setenta e oito euros)”

Tem o mesmo por objecto, em primeira linha, a declaração de nulidade da sentença por omissão de pronúncia (art.º 615º n.º 1 alínea d) do CPC), ausência ou grave insuficiência da fundamentação de facto e de direito (art.º 615º n.º 1 alínea b) do CPC), por condenação em quantidade superior e objecto diverso do pedido (art.º 615º n.º 1 alínea e) do CPC) e ambiguidade ou obscuridade que a torna parcialmente ininteligível (art.º 615º n.º 1 alínea c) do CPC);

Tem o mesmo ainda por objecto a análise da decisão proferida quanto à matéria de facto e respectiva fundamentação, designadamente mediante a reapreciação da prova gravada, e a análise da decisão proferida quanto à matéria de Direito.

DA NULIDADE DA SENTENÇA:

Decorre da contestação apresentada pela Recorrente (artigos 59º a 69º e 80 a 91º do documento com Ref.ª Citius 11589158), e do relatado a fls. 05 a 11 da douta sentença em crise, que a mesma se defendeu invocando, além do mais, a exclusão da garantia decorrente do uso indevido da salamandra em causa nos autos, a culpa do lesado na produção do dano, excludente da obrigação de indemnizar, e o abuso de direito na modalidade de conduta contraditória ou venire contra factum proprium por parte do Autor.   

Sucede que, como decorre do segmento “III. QUESTÕES QUE IMPORTA SOLUCIONAR” (a fls 18 da sentença em crise) e, além do mais, se confirma pela análise da totalidade do remanescente teor da douta sentença do Tribunal a quo, a mesma é completamente omissa quanto à resposta a dar a todas essas questões.

Determina o n.º 2 do art.º 660º do CPC “o juiz deve resolver deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. (…)”

Todavia, todas estas questões ficaram por resolver, de facto, dado que na douta sentença em crise nada se diz sobre a resposta a dar às mesmas e não é feita a subsunção dos factos provados às normas legais e aos institutos jurídicos convocados pela aqui Recorrente na sua contestação.

Assim, ao omitir a pronúncia sobre estas questões, de carácter primordial para a decisão a proferir nos autos, incorreu o Tribunal a quo em nulidade da sentença, por violação do disposto no n.º 2 do art.º 608º do CPC, que aqui expressamente se invoca, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 615º n.º 1 alínea d) do CPC
Sem prescindir,

Mas ainda que se considerasse - o que só por cautela de patrocínio se concebe, sem conceder – que uma mera menção, numa única frase, sem qualquer análise crítica ou fundamentação (vide fls. 33 da douta sentença em crise), se traduz em “pronúncia” sobre a questão do abuso de direito,
10ª
Sempre padeceria a sentença em crise de flagrante ausência ou insuficiência de fundamentação, de facto e de direito, por não especificar os fundamentos que presidiram à não consideração e apreciação desse e de qualquer dos outros meios de defesa empreendidos pela aqui Recorrente nos termos supra descritos o que constitui, igualmente, causa de nulidade da sentença em apreço, como estabelece a alínea b) do n.º 1 do art.º 615 do CPC, o que igualmente se invoca.
Sem prescindir,
11ª
Tal como se verifica pela análise da sua douta p.i. (fls. 10 do documento com Ref.ª Citius 11396316) e, bem assim, pelo ponto “I - Relatório” da sentença ora em crise (pág. 1 da mesma), o pedido formulado pelo A., foi, no seu segmento não indemnizatório, o seguinte: 
“ Deve a presente ação ser declarada procedente, por provada e, em consequência, serem as Rés condenadas solidariamente a:
c) Procederem à perfeita reparação da salamandra em causa, a expensas exclusivas das Rés, no prazo que lhe vier a ser fixado;
Nessa impossibilidade,
d) Substituir a salamandra por outra da mesma gama e características em perfeito estado de conservação e funcionamento.”
12ª
A douta sentença em crise condenou a aqui Recorrente, entre o mais, nos seguintes termos: “ b) Condeno a Ré, EMP01..., Lda a, no prazo de 60 dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença proceder à reparação da instalação da salamandra, com substituição dos tubos ou mudança de local, reparação de paredes e/ou o mais necessário, a expensas suas”
13ª
Ora, como decorre da análise da respectiva petição inicial (documento com Ref.ª Citius 11396316), em ponto algum o Recorrido alega, ainda que de forma lateral, a existência de desconformidade com a instalação da salamandra, como igualmente não alega causalidade adequada à obtenção dos efeitos jurídicos em que a aqui Recorrente foi condenada e muito menos imputa à mesma quaisquer factos tendentes a obter condenação nos termos em que esta veio a verificar-se.
14ª
Da leitura do pedido formulado pelo A., aqui Recorrido, constata-se, outrossim, que não é peticionado qualquer dos efeitos jurídicos em que a douta sentença em crise condenou a aqui recorrente, neste particular segmento decisório.
15ª
Em face disto, a decisão de condenar a aqui Recorrente à “reparação da instalação da salamandra, com substituição dos tubos, ou mudança de local, reparação de paredes e/ou o mais necessário” excede, manifestamente, em termos qualitativos e quantitativos o peticionado pelo Autor, constituindo, objectivamente, condenação em quantidade superior e/ou em objecto diverso do pedido.
16ª
O que consubstancia causa de nulidade da sentença prevista na alínea e) do n.º 1 do art.º 615º do CPC, que aqui expressamente se invoca.
Acresce que,
17ª
Dispõe ainda o n.º 1 do art.º 615, alínea c), que é nula a sentença quando ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, o que se verifica, salvo melhor opinião, quanto ao segmento decisório final: 
(…) e/ou o mais necessário”, a expensas suas.”  
18ª
Efectivamente a decisão condenatória padece, neste ponto, de ambiguidade ou obscuridade que a torna parcialmente ininteligível, dado que não se mostra minimamente delimitado, em termos qualitativos ou quantitativos, o objecto da prestação em que a aqui Recorrente foi condenada neste particular segmento, redundando, na prática, numa condenação da ora Recorrente em objecto indeterminado (e até indeterminável…)  
19ª
O que constitui, igualmente, causa de nulidade da sentença, que aqui expressamente se invoca, pelo que a sentença em crise é, igualmente com este fundamento, nula, nos termos do citado no art.º n.º 1 do art.º 615, alínea c), in fine.

Sem prescindir,
DO ERRADO JULGAMENTO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO:
20ª
A douta sentença em crise padece de contradições entre factos dados como provados e na própria fundamentação quanto à resposta a dar a tal matéria, traduzidas quer na inconciliabilidade de factos dados como provados, entre si, quer das próprias conclusões retiradas em consequência da apreciação dos mesmos.
21ª
A matéria de facto dada (e bem) como provada sob os números 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28 e 29 e 30 (a fls, 20 e 21) da douta sentença em crise e os documentos não impugnados e levados em conta na decisão proferida, (mormente as fotografias juntas como Doc. n.º 3 com a contestação da aqui Recorrente), implicariam, por si, que tivesse sido proferida diferente decisão quanto à matéria de facto constante dos pontos nº 8, n.º 13, n.º 17, n.º 18 e n.º 33 dos factos provados, os quais deveriam ser dados como não provados.
22ª
Opta-se por dar como “certo”, sem fundamentação, algo que não só se afigura como totalmente incerto em face da realidade espelhada nos autos e da ausência de prova nesse sentido - designadamente prova de dano e de causalidade, totalmente inexistentes - como também altamente improvável - contrário às regras da experiência comum e da normalidade, se quisermos - e contraditório, se atendermos aos factos dados como provados no seu conjunto (e isto independentemente do que abaixo se dirá, em sede de impugnação de alguns deles)
23ª
Com efeito, da análise dos citados pontos da matéria de facto provada (n.ºs 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28 e 29 e 30), fica patente o total desprezo a que o Recorrido votou a utilização a salamandra em causa, fazendo da mesma uma utilização altamente intensiva em termos de número de horas de funcionamento e de ignições e completamente ausente em termos de manutenção, limpeza e até de reacção perante as advertências dos técnicos e dos alarmes emitidos pelo próprio equipamento (factos provados n.º 25, 26, 27 e 28)
24ª
Decorre também da matéria de facto provada (ponto 29) que só após a limpeza da salamandra foi possível efectuar os ensaios técnicos para verificar o funcionamento da mesma, pelo que se mostra infundada, contraditória com a demais factualidade provada nos autos e, além disso, ausente de prova nesse sentido, a consideração como provado do ponto 33 da matéria de facto
25ª
Na verdade, se daí facto se pode legitimamente extrair uma conclusão é, precisamente, a de que a salamandra não estava em condições de operar correctamente (nem mesmo de ser testada!) no estado de sujidade e falta de manutenção em que o Autor, aqui Recorrido, o vinha fazendo.  
26ª
Se a origem de uma suposta saída de fumos fosse, como se diz, o sistema de instalação da salamandra, que sentido faria que o Recorrido não o tivesse constatado logo após o início de utilização da salamandra, mas só depois de a utilizar durante sete meses sem qualquer limpeza ou manutenção, fazendo fogo por 1293 horas e acendendo a salamandra por 247 ocasiões distintas?
27ª
Seria impossível, de resto, que em Março de 2020 (sete meses volvidos desde o início da sua utilização diária), as traseiras da salamandra, o tubo de extracção de fumos e a parede onde a mesma estava instalada apresentassem o aspecto imaculado que apresentavam, como decorre do Doc. n.º 3 junto com a contestação da aqui Recorrente (documento com Ref.ª Citius 11589158), não impugnado.
28ª
Assim, sem prejuízo do que mais se diz em sede de impugnação específica de cada um desses pontos da matéria de facto, entende a Recorrente que, pelo facto de a resposta dada aos mesmos não se encontrar suficientemente fundamentada e, ademais, por se encontrarem em clara contradição com os factos provados n.º 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28 e 29 e 30, se imporia, desde logo, que os pontos nº 8, n.º 13, n.º 17, n.º 18 e n.º 33 da matéria de facto provada ficassem a constar como não provados, o que se requer.
Acresce que,
29ª
O Tribunal a quo incorreu igualmente em errado julgamento da matéria de facto ao dar como provados os pontos nº 8, n.º 13, n.º 17, n.º 18 e n.º 33 da matéria de facto provada (IV) na sentença em crise, que aqui vão expressamente impugnados (art.º 640º n.º 1 alínea a) do CPC), impondo-se alteração da decisão proferida acerca da matéria de facto nos seguintes termos:
a) DO PONTO 8 DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA:
30ª
Entende a aqui recorrente que o ponto 8 da matéria de facto deveria ter sido dado como não provado.  
31ª
A decisão quanto à resposta dada quanto a este ponto da matéria de facto não se encontra, efectivamente, fundamentada, uma vez que não é possível, mediante a respectiva análise, alcançar em que concretos meios probatórios se fundou a Mm.ª Juiz do Tribunal a quo para - e ainda mais perante depoimento de parte como o supra transcrito e para o qual abaixo se remeterá, mediante indicação temporal das passagens relevantes -, ter dado como provado o referido ponto 8 nos termos em que deu.   
32ª
A omissão dessa análise crítica e da fundamentação quanto à resposta dada a esse ponto da matéria de facto, se não igualmente causa de nulidade de sentença, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 615º do CPC, que aqui expressamente, e por uma questão de cautela, se argúi, sempre constituirá erro no julgamento quanto à matéria de facto, por ausência de fundamentação, com clara influência na decisão da causa, que imporia, desde logo, que este ponto da matéria de facto ficasse a constar como não provado.
Com efeito,
33ª
Ao contrário do que foi dado como provado, o Recorrido iniciou efectivamente a utilização da salamandra em apreço nos autos imediatamente após o seu “arranque”, que ocorreu no dia 12 de Setembro de 2019 (facto provado n.º 7) e a mesma não padece de quaisquer anomalias, não se verificando qualquer “fuga de fumo” ou “manchas negras” na habitação do Recorrido que possam ter decorrido da respectiva instalação e/ou da sua regular utilização.
34ª
Impunham decisão diversa da tomada pelo Tribunal a quo não só os já citados factos provados sob os n.ºs 7, 20, 21, 22, 23, 25, 26, 27, 28, 29 e 30 da douta sentença em crise, nos termos e com os fundamentos a que já acima se aludiu, mas também os seguintes meios probatórios:   
35ª
Documentos n.º 2 e n.º 3 (fotografias colhidas em Março de 2020 na deslocação do técnico da Ré, dada como provada no facto provado n.º 20 - vide transcrição do respectivo depoimento supra), juntos com a contestação da aqui Recorrente - Ref.ª Citius 11589158 - e não impugnados; Documentos n.º 13 e 14 juntos com a contestação da aqui Recorrente - Ref.ª Citius 11589158 - e não impugnados, correspondentes ao Relatório emitido pela có Ré EMP03..., de onde decorre claramente que para que os testes e ensaios pudessem ser efectuados foi necessário proceder previamente à limpeza da salamandra (“o director técnico da EMP03... ordenou a limpeza da salamandra, para poder verificar-se o seu funcionamento.”), Documentos n.º 22, 23, 24 juntos com a contestação da aqui Recorrente - Ref.ª Citius 11589158 - e não impugnados demonstrativos das menções feitas no Manual da salamandra em causa nos autos e das consequências do incumprimento das tarefas aí expostas para o funcionamento da salamandra e também em termos de garantia; Documento n.º 25 junto com a contestação da aqui Recorrente - Ref.ª Citius 11589158 - não impugnado correspondente a fotografia de uma salamandra igual à do Recorrido, com os registos de fumo devidamente desobstruídos, para efeitos de comparação com a imagem constante dos Doc. 13 e 14 e Documento junto pelo Recorrido através do Requerimento com Referência Citius 12427610 em 05/01/2022, correspondente ao livro de registo de arranque da salamandra, onde se mostra feita a certificação da instalação da mesma mediante a confirmação da análise dos vários parâmetros, designadamente “resistência”, “motoredutor”, “extrator fumos”, “turbina tangencial”, “sonda fumos”, “controle remoto” 
36ª
Depoimento e declarações de parte do Autor AA, prestados na audiência do dia 19-10-2022 e gravadas digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 29:19, (cfr. acta de audiência de 19-10-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 03:23 a 06:53 (vide transcrição nas alegações)
37ª
Depoimento e declarações de parte do Autor AA, prestados na audiência do dia 19-10-2022 e gravadas digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio" - reinício em 00:01 e Termo em 53:30 (resposta à matéria de facto solicitada na contestação da Ré EMP01... e da contestação da Ré EMP03...) (cfr. acta de audiência de 19-10-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 02:10 a 03:15 (vide transcrição  nas alegações)
38ª
Depoimento da testemunha BB, prestado na audiência do dia 07-11-2022 e gravado digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 41:40. (cfr. acta de audiência de 07-11-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 03:33 a 05:39, do minuto 11:46 a 13:12 e do minuto 14:05 a 14:43 (vide transcrição nas alegações)
39ª
Dos elementos probatórios supra descritos decorre que o Recorrido declarou expressamente e sem quaisquer dívidas que a utilização da salamandra em causa nos autos ocorreu “LOGO” ou “IMEDIATAMENTE” após o seu arranque, reiterando, para que não restassem dúvidas, que a utilizou desde logo porque as noites naquele local são frias, mesmo em Setembro.  
40ª
Resulta igualmente confessado pelo Autor, aqui Recorrido, que de Setembro de 2019 em diante a salamandra em apreço “aqueceu sempre maravilhosamente” e quando instado a pronunciar-se não quanto à capacidade de aquecimento, mas especificamente quanto à existência de “fugas” e se detectou as mesmas a resposta do Recorrido foi clara: “Aparentemente funcionou, que eu detectasse nada, não!”
41ª
O depoimento da testemunha BB (igualmente supratranscrito) é esclarecedor quanto à inexistência de sinais de fugas de fumos decorrentes da instalação ou de defeito da salamandra, e encontra total suporte no Doc. n.º 3 junto pela aqui Recorrente com a sua contestação, não impugnado, onde pode verificar-se, por fotografias colhidas pela dita testemunha na habitação do Recorrido, em Março de 2020, que a habitação, bem como as traseiras da salamandra e a parede onde esta estava instalada se apresentavam completamente limpas, sem sinais quaisquer de enegrecimento, fuligem ou qualquer indício de saída de fumos.
42ª
Em face de tudo quanto se expôs, impõe-se alteração à resposta dada ao ponto 8 da matéria de facto, o qual deverá ser dado como não provado, sendo, antes, considerado como provado nestes termos:
8) - O A. começou a utilizar a salamandra em 12 de Setembro de 2019, imediatamente após o seu arranque.”

Sem prescindir,
b) DO PONTO 13 DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA:
43ª
Entende a Recorrente a inclusão deste ponto na matéria de facto dada como provada se deverá a mero lapso manifesto, o que se extrai da fundamentação (a fls. 27), em que pode ler-se:
“O autor refere que a salamandra apresentava amolgadelas e um desnível com uma abertura de 2 cm. (…) Assim, nada mais restava ao Tribunal considerar tais factos como não provados.”
(realce nosso)
44ª
Pelo que desde já se requer a rectificação de tal lapso, nos termos do disposto no art.º 614º do CPC, passando este ponto, em consonância com a fundamentação da decisão, a constar como não provado.

Sem prescindir,
45ª
Ainda que se entendesse não ter ocorrido lapso na consideração deste ponto como provado, a realidade é que não existe nos autos um único elemento probatório que possa sustentar a consideração do mesmo enquanto tal e que, pelo contrário, impõem decisão diversa os seguintes meios probatórios:
46ª
Docs. n°s 13, 14 e 15 juntos pelo Recorrido com a sua p.i (fotografias), onde não são visíveis quaisquer riscos ou amolgadelas, sendo, ao contrário, patente que, na data em que lhe foi restituída, a salamandra se encontrava no mesmo estado em que foi recolhida pela Recorrente, Docs. n.º 3 (salamandra do Recorrido em Março de 2020), e 19, 20 e 21 (todos não impugnados) juntos pela Recorrente com a sua contestação, estes últimos demonstrativos da condição de uma salamandra em estado novo,  
47ª
Depoimento da testemunha BB, prestado na audiência do dia 07-11-2022 e gravado digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 41:40 (cfr. acta de audiência de 07-11-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 07:22 a 10:13, (vide transcrição nas alegações
48ª
Declarações de parte da legal representante da Recorrente, CC, prestadas na audiência do dia 19-10-2022 e gravadas digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 29:21. (cfr. acta de audiência de 19-10-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 12:19 a 16:08 (vide transcrição nas alegações)
49ª
Depoimento e declarações de parte do Autor AA, prestados na audiência do dia 19-10-2022 e gravadas digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio" - reinício em 00:01 e Termo em 53:30 (resposta à matéria de facto solicitada na contestação da Ré EMP01... e da contestação da Ré EMP03...) (cfr. acta de audiência de 19-10-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 14:29 a 16:03 (vide transcrição nas alegações)
50ª
Entende a Recorrente que, tanto por inexistir, nos autos, elemento probatório que aponte no sentido aí propugnado, como também pelo que decorre da análise dos elementos probatórios supra referenciados, o ponto 13 da matéria de facto dada como provada teria de constar como “não provado”,
51ª
Adicionalmente, e com suporte nos mesmos elementos probatórios indicados, que encerram confissão nesse sentido do Recorrido, infirmando a consideração como provado deste ponto 13, da matéria de facto provada deveriam ter ficado a constar como provados os seguintes pontos:
- No dia 26-10-2020, quando lhe foi restituída a salamandra, o Autor examinou a mesma e não apresentou qualquer reclamação, tendo apenas comunicado que pretendia que a salamandra fosse instalada em local diferente daquele onde se encontrava antes; 
- Nessa sequência o Autor deslocou-se no dia 27-10-2020 ao estabelecimento da Ré EMP01... no sentido de agendar a reinstalação e de tratar dos materiais necessários a tanto, tendo a reinstalação sido agendada para dia 29-10-2020, o que o Autor posteriormente não permitiu. 
 
c) DO PONTO 17 DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA:
52ª
Entende a aqui Recorrente que o ponto 17 da matéria de facto (“17.) O autor terá de despender a quantia de 5.578,00€ para limpeza e pintura de tectos e paredes.” Deveria ter sido dado como não provado,
53ª
A fundamentação quanto à resposta dada a este ponto, é unicamente a seguinte:
“A testemunha DD, vizinho e amigo do autor confirmou que o orçamento junto com a petição inicial foi elaborado por si e os trabalhos a efectuar são limpeza e pintura de tectos e paredes. Mais referiu ter sido o autor que comunicou a necessidade de pintar devido ao fumo, não tendo reparado se as cortinas também estavam enegrecidas ou manchadas de fumo.
(realce nosso)
54ª
Ora, não pode a Recorrente conformar-se com a consideração deste ponto como provado nem com a fundamentação avançada para tanto, dado que nenhuma prova foi feita quanto à existência de dano, de causalidade entre defeitos na salamandra em causa nos autos e esse pretenso dano, e também nada se provou quanto à necessidade de proceder aos trabalhos orçamentados e muito menos se fez prova quanto ao preço adequado dos mesmos.    
55ª
Diga-se, desde logo, que o “orçamento” emitido por este vizinho e amigo do Recorrido foi impugnado pela aqui Recorrente, na respectiva contestação e também que não foi devidamente levado em conta pelo Tribunal a quo o facto de a testemunha (autor do orçamento e do depoimento -indirecto - em que o Tribunal a quo sustentou, em exclusivo, a prova deste ponto da matéria de facto) ser vizinho e amigo do Autor há mais de 50 anos, o que aconselharia que o orçamento em causa e o respectivo depoimento fossem apreciados com especial distanciamento e ponderação, ainda mais quando se optou sustentar nos mesmos, em exclusivo, a procedência de uma pretensão indemnizatória de € 5.578,00
56ª
Além do já exposto, que salvo melhor opinião determinaria, desde logo, que se desse como não provado este ponto 17, impõem ainda que o mesmo fique a constar como não provado os seguintes meios probatórios:  
57ª
Documento n.º 3 (fotografias colhidas em Março de 2020 na deslocação do técnico da Recorrente, dada como provada no facto provado n.º 20), junto com a contestação - Ref.ª Citius 11589158 - e não impugnado, demonstrativo da inexistência de quaisquer manchas negras, vestígios de fumo, ou enegrecimento na habitação do Recorrido e Documento n.º 18 junto pela aqui Recorrente com a contestação - Ref.ª Citius 11589158 - não impugnado - correspondente a orçamento para a prestação dos mesmos serviços, de valor muito inferior, demonstrativo da exorbitância do montante reclamado pelo Recorrido;   
58ª
Depoimento da testemunha BB, prestado na audiência do dia 07-11-2022 e gravado digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 41:40. (cfr. acta de audiência de 07-11-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 03:33 a 05:39 e do minuto 14:05 a 14:43 (vide transcrição nas alegações)    
59ª
Depoimento da testemunha do Autor, DD, prestado na audiência do dia 07-11-2022 e gravado digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 17:18 (cfr. acta de audiência de 07-11-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 01:00 a 01:21, do minuto 04:51 a 05:10, do minuto 10:55 a 11:39 e do minuto 16:38 a 17:10 (vide transcrição nas alegações)
60ª
Depoimento da testemunha do Autor, EE prestado na audiência do dia 07-11-2022 e gravado digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 11:40. (cfr. acta de audiência de 07-11-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 08:14 a 08:26 e do minuto 11:01 a 11:20
61ª
Do depoimento da testemunha BB resultou demonstrada a inexistência de sinais de fugas de fumos decorrentes da instalação ou de defeito da salamandra, o que encontra total suporte no Doc. n.º 3 junto pela aqui Recorrente com a sua contestação, não impugnado, onde pode verificar-se, por fotografias colhidas pela dita testemunha na habitação do Recorrido, em Março de 2020, que a habitação, bem como as traseiras da salamandra e a parede onde esta estava instalada se apresentavam completamente limpas, sem sinais quaisquer de enegrecimento, fuligem ou qualquer indício de saída de fumos;
62ª
Do depoimento da testemunha EE, quanto à única matéria de que, de facto, tinha conhecimento directo, resulta que as fotografias juntas pelo Recorrido retratam apenas a sala e, alegadamente, a um dos quartos, pelo que, ainda que se tivesse provado a existência de danos e de causalidade, jamais se poderia ter dado como provada a necessidade de custear uma limpeza e pintura integral da habitação.
63ª
A testemunha DD referiu, por mais do que uma vez, que as únicas marcas de fumo visíveis eram duas diminutas manchas de fuligem (“manchazinhas”, “filetezinhos”), localizadas nos cantos superiores da porta situada na parte frontal da salamandra (vide Doc. n.º 3 junto com a contestação da aqui Recorrente (documento com Ref.ª Citius 11589158) e Doc. n.º 15 junto pelo Autor com a sua petição inicial) e que o Recorrido lhe transmitiu que era por aí (pelo local junto das manchazinhas ou filetezinhos) que saia o fumo, o que deita completamente por terra a tese de que uma saída de fumos pudesse dever-se à instalação, visto que esta é feita na parte traseira da salamandra, mediante a ligação de um tubo de extracção para o exterior.
64ª
Esta testemunha, que supostamente teria feito medições a toda a casa do Autor para orçamentar uma limpeza e pintura integral, por esta, alegadamente, se encontrar manchada com fumo, não soube sequer dizer quando teria feito esse orçamento e questionada se reparou se as cortinas do Autor estavam manchadas de fumo, primeiro, e se olhou para as paredes mas não viu as cortinas, depois, respondeu de forma evasiva, contrária às regras da experiência comum e aparentando o claro propósito de dar respostas que não viessem a comprometer a posição do seu vizinho e amigo.
65ª
Assim desde logo por não ter sido feita prova do facto em causa e muito menos da causalidade entre estes e o montante claramente exorbitante peticionado aqui Recorrido, para a sua pretensa reparação, por o documento (orçamento) em que se sustentou a decisão ter sido oportunamente impugnado pela aqui, por a Recorrente ter juntado orçamento (não impugnado) demonstrativo da exorbitância do montante peticionado pelo Autor, e, além do mais, por os depoimentos supra indicados, apontarem em sentido oposto ao da necessidade de proceder a limpeza e pintura integral da habitação do Recorrido, este ponto ser considerado como não provado.

d) DO PONTO 18 DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA:
66ª
Entende a aqui Recorrente que este ponto da matéria de facto (“18.) Mercê do referido em 8) o autor sentiu-se angustiado, transtornado e aborrecido.") deveria ter sido dado como não provado, desde logo por insuficiência de prova do facto e total ausência de prova da causalidade que ao mesmo está inerente.
67ª
Como fundamentação da resposta dada a este ponto, diz-se na douta sentença em crise unicamente o seguinte (fls. 24 da mesma): “O Tribunal considerou o depoimento da testemunha FF, vizinho e amigo do autor (…) Mais referiu que a situação da salamandra desgastou bastante o autor e que este sentia-se aborrecido e transtornado.
68ª
Não foi, desde logo, devidamente ponderado pelo Tribunal a quo o facto de a testemunha FF, arrolada pelo aqui Recorrido e autor do depoimento em que se sustentou, em exclusivo, a prova deste ponto da matéria de facto ser vizinho e amigo do Autor há mais de 20 anos, o que aconselharia uma apreciação crítica substancialmente mais exigente, ainda mais antes de decidir sustentar no mesmo, em exclusivo e sem suporte documental ou meio de prova adicional, a procedência de uma pretensão indemnizatória de € 1.500,00.
69ª
Ouça-se e analise-se o teor do citado depoimento, determinante para a condenação da aqui Recorrente, e os demais meios probatórios, que no entender da aqui Recorrente impunham que a decisão sobre este ponto fosse distinta, dando-se o mesmo como não provado:
70ª
Depoimento da testemunha do Autor, FF, prestado na audiência do dia 07-11-2022 e gravado digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 19:47 (cfr. acta de audiência de 07-11-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do segundo 00:32 a 00:46, do minuto 08:45 a 09:14, do minuto 15:43 a 15:54, do minuto 16:07 a 16:22 (vide transcrição nas alegações)
71ª
Depoimento da testemunha do Autor, DD, prestado na audiência do dia 07-11-2022 e gravado digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 17:18 (cfr. acta de audiência de 07-11-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): do minuto 08:30 a 09:03. (vide transcrição nas alegações)
72ª
Tendo apenas por base depoimento em que as únicas menções ao facto que se dá como provado são: “Desgastou-o bastante. Psicologicamente tem andado um bocado em baixo.” E “Andava “stressado”, andava preocupado, é normal.” ditas por um vizinho e amigo, há mais de 20 anos, da parte a quem tal depoimento aproveita, deu-se como provado o facto n.º 18 da matéria de facto provada, condenado-se a aqui Recorrente ao pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais.
73ª
Quer por inexistir, nos autos, prova apta a sustentar a verificação deste ponto como provado, quer por, além do mais, dos depoimentos supra referenciados resultar, bem pelo contrário, a normalidade com que o Recorrido encarou o diferendo, sem que tal tenha implicado alterações de relevo no seu humor e respectivo quotidiano, deveria este ponto da matéria de facto ter ficado a constar como não provado.

e) DO PONTO 33 DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA:
74ª
Entende a aqui Recorrente que o ponto 33 da matéria de facto (“33.) A fuga de fumo referida em 8) teve origem no sistema de instalação da salamandra efectuado pela 1.ª Ré” deveria ter sido dado como não provado,
75ª
Inexiste alegação nos autos que permitisse, sequer, que tal questão tivesse sido levada à matéria de facto, pelo que a consideração deste facto como provado é não só contraditória com restante matéria de facto provada nos autos, como também não encontra, nos mesmos, fundamento válido.
76ª
Estando provado (factos provados n.º 28, 29 e 30) que só depois da limpeza da salamandra é que foi possível verificar o seu funcionamento, não era lícito que se tivesse extraído do relatório ou das declarações prestadas nos autos uma conclusão como a que foi extraída.
77ª
Não foi devidamente ponderada a circunstância existir nos autos documento não impugnado, junto pelo próprio Recorrido (vide Documento junto pelo Recorrido através do Requerimento com Referência Citius 12427610 em 05/01/2022, também junto como n.º 2 junto pela aqui Recorrente com a sua contestação) que comprova a validação da instalação da salamandra pelo Serviço de Atendimento Técnico Oficial da 2ª Ré (e não da aqui Recorrente), e onde se pode constatar os diversos parâmetros verificados, entre os quais, “extrator fumos”, “turbina tangencial”, “sonda fumos”.
78ª
Por outro lado, em momento algum do seu depoimento a testemunha GG - depoimento prestado na audiência do dia 07-11-2022 e gravado digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 55:47(cfr. acta de audiência de 07-11-2022) - refere que a fuga de fumo teria de situar-se ao nível da instalação da salamandra, pelo que a menção a essa circunstância na fundamentação da sentença em crise só poderá dever-se a mero lapso ou a errada interpretação teor do referido depoimento
79ª
Os seguintes meios probatórios impunham a consideração do ponto 33 como não provado:
80ª
Documento junto pelo Recorrido através do Requerimento com Referência Citius 12427610 em 05/01/2022 (também junto como n.º 2 junto pela aqui Recorrente com a sua contestação) correspondente ao livro de registo de arranque e de revisões da salamandra, onde se mostra feita a certificação da instalação da mesma mediante a confirmação da análise dos vários parâmetros, designadamente “resistência”, “motoredutor”, “extrator fumos”, “turbina tangencial”, “sonda fumos”, “controle remoto”, Documento n.º 3 (fotografias) junto com a contestação da aqui Recorrente (documento com Ref.ª Citius 11589158), não impugnado, colhidas pelo técnico BB em Março de 2020, demonstrativas da inexistência de quaisquer sinais de enegrecimento, manchas negras, ou aspecto fumado tanto na parede junto ao tubo de instalação, a qual se mostra imaculada, como nas traseiras da salamandra e nas paredes por trás e ao lado da mesma, Documentos n.º 13 e 14 juntos com a contestação da aqui Recorrente - Ref.ª Citius 11589158 – e não impugnados, correspondentes ao Relatório emitido pela có Ré EMP03..., de onde decorre claramente que para que os testes e ensaios pudessem ser efectuados foi necessário proceder previamente à limpeza da salamandra , Documentos n.º 22, 23, 24 juntos com a contestação da aqui Recorrente - Ref.ª Citius 11589158 - e não impugnados demonstrativos das menções feitas no Manual da Salamandra em causa nos autos e das consequências do incumprimento das tarefas aí expostas para o funcionamento da salamandra e em termos de segurança e de garantia do seu funcionamento; Documento n.º 25 junto com a contestação da aqui Recorrente - Ref.ª Citius 11589158 - não impugnado correspondente a fotografia de uma salamandra igual à do Recorrido, com os registos de fumo devidamente desobstruídos, para efeitos de comparação com a imagem constante dos Doc. 13 e 14.
81ª
Depoimento e declarações de parte do Autor AA, prestadas na audiência
do dia 19-10-2022 e gravadas digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio" - reinício em 00:01 e Termo em 53:30 (resposta à matéria de facto solicitada na contestação da Ré EMP01... e da contestação da Ré EMP03...) (cfr. acta de audiência de 19-10-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 03:01 a 03:13 (vide transcrição nas alegações)
82ª
Depoimento da testemunha BB, prestado na audiência do dia 07-11-2022 e gravado digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 41:40.(cfr. acta de audiência de 07-11-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 02:47 a 03:04, do minuto 03:33 a 05:39, do minuto 11:46 a 13:12 e do minuto 14:06 a 14:43 (vide transcrição nas alegações)
83ª
Declarações de parte da legal representante da Recorrente, CC, prestadas na audiência do dia 19-10-2022 e gravadas digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 29:21.(cfr. acta de audiência de 19-10-2022) – Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 04:23 a 05:40 (vide transcrição nas alegações)
84ª
Depoimento da testemunha do Autor, DD, prestado na audiência do dia 07-11-2022 e gravado digitalmente no sistema "H@bilus Media Studio", com início em 00:01 e termo em 17:18 (cfr. acta de audiência de 07-11-2022) - Passagens relevantes deste depoimento (art.º 640º n.º 2, alínea a) do CPC): Do minuto 04:51 a 05:15, do minuto 16:38 a 17:10 (vide transcrição nas alegações)
85ª
Verifica-se, através da confissão da parte, confirmada por prova testemunhal (BB), e documental (Foto junta como Doc. 3 com a contestação da aqui Recorrente) que em Março de 2020 a salamandra em causa nos autos e a casa do Recorrido não apresentavam quaisquer sinais de enegrecimento, saída de fumos, manchas negras nas paredes ou tectos.
86ª
Do depoimento da testemunha DD resulta que as únicas manchas de fumo visíveis, como se confirma pelas fotografias da salamandra juntas aos autos (por todas, vide Doc. 3 junto pela recorrida com a contestação e Doc. n. 15 junto pelo Recorrido com a pi) eram duas diminutas manchas de fuligem (“manchazinhas”, “filetezinhos”), localizadas nos cantos superiores da porta situada na parte frontal da salamandra (vide novamente Doc. n.º 3 junto com a contestação da aqui Recorrente (documento com Ref.ª Citius 11589158) e Doc. n.º 15 junto pelo Autor com a sua petição inicial) as quais, jamais poderiam ser atribuídas a uma incorrecta instalação da salamandra, que é feita, naturalmente, pela parte traseira da mesma, mediante a ligação de um tubo de extracção para o exterior.
87ª
Uma eventual saída de fumos decorrente da instalação teria de se manifestar no local onde é feita a instalação, isto é, na parte traseira da salamandra, onde se mostra colocado tubo de extracção de gases e na parede onde o mesmo é instalado e logo após o seu arranque, o que manifestamente não sucede.
88ª
Deveria, em face de tudo isso, ser dado como não provado o ponto n.º 33 da matéria de facto provada na douta sentença em crise.

Em face disto,  
89ª
Através da análise e apreciação das supra referenciadas insuficiências e contradições na resposta dada à matéria de facto e na respectiva fundamentação, em todo caso e independentemente disso, por força da reapreciação da matéria de facto gravada, mormente dos excertos supratranscritos, e dos demais meios probatórios referenciados, impõe-se a alteração da resposta dada à matéria de facto, dando-se como não provados os pontos nº 8, n.º 13, n.º 17, n.º 18 e n.º 33 da matéria de facto provada (IV) na douta sentença em crise,
90ª
Dando-se como provado o ponto n.º 8 apenas nos seguintes termos:
8) - O A. começou a utilizar a salamandra em 12 de Setembro de 2019, imediatamente após o seu arranque.”
91ª
E aditando-se à matéria de facto provada os seguintes pontos:
- No dia 26-10-2020, quando lhe foi restituída a salamandra, o Autor examinou a mesma e não apresentou qualquer reclamação, tendo apenas comunicado que pretendia que a salamandra fosse instalada em local diferente daquele onde se encontrava antes;
- Nessa sequência, o Autor deslocou-se no dia 27-10-2020 ao estabelecimento da Ré EMP01... no sentido de agendar a reinstalação e de tratar dos materiais necessários a tanto, tendo a reinstalação sido agendada para dia 29-10-2020, o que o Autor posteriormente não permitiu.

Sem prescindir,
DO ERRADO JULGAMENTO SOBRE A MATÉRIA DE DIREITO:
92ª
Mas ainda que se entendesse não ser de alterar a matéria de facto dada como provada nos autos nos termos requeridos - o que por só por dever de patrocínio se concebe, sem conceder - sempre se imporia a improcedência da acção, tendo por base a devida aplicação do Direito, o que, salvo o devido respeito, não se verificou na douta sentença aqui em crise.    
93ª
Desde logo quanto à questão da caducidade do direito invocado pelo Recorrido, crê a Recorrente que a decisão em crise é contraditória com a realidade espelhada nos autos, visto que se tivermos por referência a forma como o próprio Autor configurou a acção – art.º 9º da p.i. – “pouco depois do início da sua utilização a mesma [salamandra] começou a apresentar defeitos e/ou anomalias” e estando provado que apenas comunicou à Recorrente a existência de pretenso defeito em meados de Março de 2020, isto é, sete meses após a instalação da salamandra e volvidas 1293 horas de utilização e 247 acendimentos distintos, sem qualquer limpeza ou manutenção, não subsiste a mínima dúvida de que o Recorrido excedeu claramente o prazo de dois meses para a denúncia do defeito, previsto no n.º 2 do art.º 5º-A então em vigor DL n.º 67/2003, de 08 de Abril.
94ª
E mesmo que tomemos por certo que o Recorrido apenas iniciou a utilização da salamandra “chegado o Inverno” - o que, naturalmente, não corresponde à realidade como já acima se deixou profusamente demonstrado, em sede de recurso quanto à matéria de facto - para que tivesse cumprido o ónus de denúncia atempada da pretensa falta de conformidade decorrente da instalação, dentro do prazo de dois meses, o mesmo teria, na pior das hipóteses de ter comunicado o suposto defeito até ao final do mês de Fevereiro de 2020, o que, como vimos, não sucedeu.
95ª
Assim, deveria o Tribunal a quo ter julgado verificada a excepção de caducidade dos direitos invocados pelo Autor, aqui Recorrido, caducidade esta que sempre se verificaria, ainda que não se promovesse alteração à matéria de facto provada nos autos, pelo que não o tendo feito, salvo melhor opinião, violou o Tribunal a quo o disposto nos art. ºs 40º, n.º 2 do art.º 298º, no n.º 1 do art.º 331º e art.º 333º todos do Código Civil e no n.º 2 do art.º 5º-A do DL n.º 67/2003, de 08 de Abril.
Sem prescindir,
96ª
Dos factos provados sob os n.ºs 7, 20, 21, 22, 23, 25, 26, 27, 28, 29 e 30 dos autos e da concatenação dos mesmos entre si e com os demais elementos probatórios nos autos, designadamente os elementos documentais considerados para a decisão aqui em crise resulta evidente que o Recorrido não cumpriu quaisquer dos procedimentos exigíveis a um consumidor médio, responsável e consciencioso na utilização que fez da salamandra em causa nestes autos.
97ª
Tal comportamento, nos termos gerais de Direito, e, ademais, em consonância com as advertências feitas ao Recorrido pelos Técnicos e constantes do manual da referida salamandra, era apto à exclusão da garantia de bom funcionamento da mesma o que, consequentemente, obstaria que o Recorrido pudesse validamente exercer os direitos que invocou, determinando a improcedência da acção.
98ª
Ao não se pronunciar, sequer, sobre esta questão violou o Tribunal a quo o disposto no n.º 2 do art.º 608º do CPC e ao não ter decidido nos termos supra expostos violou o Tribunal a quo o disposto no n.º 5 do art.º 4º do DL n.º 67/2003, de 08 de Abril.
Sem prescindir,
99ª
Estabelece o n.º 1 do artigo 570.º do Código Civil que quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao Tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída, dispondo o n.º 2 do mesmo artigo que sempre que a responsabilidade do lesante se basear numa simples presunção legal de culpa, a culpa do lesado na produção do dano, na falta de disposição em contrário, exclui o dever de indemnizar.
100ª
Dos factos provados sob os n.ºs 7, 20, 21, 22, 23, 25, 26, 27, 28, 29 e 30 dos autos e da concatenação dos mesmos entre si e com os demais elementos probatórios nos autos, resulta como inevitável a conclusão de que o aqui Recorrido, contribuiu, de forma decisiva e necessária, para a existência dos danos que alega terem-se verificado,
101ª
Ao não se pronunciar, sequer, sobre essa questão violou o Tribunal a quo o disposto no n.º 2 do art.º 608º do CPC o ao não ter decidido nos termos supra expostos violou o Tribunal a quo o disposto nos artigos 570.º e 572º do Código Civil;
Sem prescindir,
102ª
Os factos provados sob os n.ºs 7, 20, 21, 22, 23, 25, 26, 27, 28, 29 e 30 dos autos e concatenação dos mesmos entre si e com os demais elementos probatórios nos autos, são demonstrativos da utilização intensiva, em termos horas e de número de acendimentos, e completamente negligente, com total desprezo das tarefas mais básicas de limpeza e manutenção, das indicações dadas por Técnicos e dos avisos/alarmes apresentados pela salamandra por mais do que uma ocasião, a que o Recorrido votou a salamandra desde o início da sua utilização.  
103ª
A conduta do Recorrido, mediante a utilização continuada, em tais termos, de uma salamandra que reputava de defeituosa, para vir posteriormente exigir a reparação da danos (pretensamente) decorrentes desse uso, ofende de forma manifesta e grosseira, os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social ou económico dos direitos por si invocados, constituindo abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium,
104ª
Ao não se ter pronunciado, sequer, sobre tal questão violou o Tribunal a quo o disposto no n.º 2 do art.º 608º do CPC e ao não ter decidido verificada a excepção, nos termos supra expostos, violou o Tribunal a quo o disposto no art.º 334.º do Código Civil e no n.º 5 do art.º 4º do DL n.º 67/2003, de 08 de Abril

TERMOS EM QUE,
Com o mui douto suprimento de Vossas Excelências,
a) Deverá, desde logo, julgar-se nula a sentença proferida pelo Tribunal a quo, por nela se ter incorrido em omissão de pronúncia, por padecer de insuficiências na respectiva fundamentação, nela se haver condenado parcialmente em objecto diverso e superior ao pedido e conter, parcialmente, segmento condenatório ininteligível.
Sem prescindir,
b) Deverá, após análise da fundamentação de facto e reapreciação da prova gravada e documental dos autos, ser alterada a matéria de facto dada como provada em conformidade com o supra requerido e, após reapreciada a decisão de Direito, nos termos supra requeridos, ser proferida decisão que desde logo aprecie e julgue procedentes as excepções invocadas pela ora Recorrente,
Em consequência de tudo o que se impõe seja proferido douto acórdão que, julgando a acção improcedente, absolva a Recorrente dos pedidos, Com o que farão V. Exas. a já costumada
JUSTIÇA!».

O autor apresentou contra-alegações, sustentando a improcedência da apelação e a consequente manutenção do decidido em 1.ª instância.
O recurso foi admitido para subir de imediato, nos próprios autos, e com efeito devolutivo.
Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, foi determinada a baixa dos autos à 1.ª Instância, a título devolutivo, com vista à prolação do despacho previsto nos artigos 617.º, n.º 1, 641.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC), entendendo o Tribunal a quo não se verificarem as nulidades invocadas.
Os autos foram novamente remetidos a este Tribunal da Relação, confirmando-se a admissibilidade do recurso nos mesmos termos.

II. Delimitação do objeto do recurso

Face às conclusões das alegações da recorrente e sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso - artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC) -, o objeto do presente recurso circunscreve-se às seguintes questões:

A) se a decisão recorrida enferma das nulidades que lhe são imputadas pela recorrente; 
B) impugnação da decisão sobre a matéria de facto;
C) aferir se a sentença recorrida incorreu em erro na interpretação e aplicação do direito quanto ao mérito da ação: saber se estão reunidos os requisitos legais que possam determinar a procedência das pretensões deduzidas pelo autor; da exceção de caducidade invocada pela ré.
D) subsidiariamente, se existe abuso do direito por parte do autor.
Corridos os vistos, cumpre decidir.

III. Fundamentação

1. Os factos
1.1. Os factos, as ocorrências e elementos processuais a considerar na decisão deste recurso são os que já constam do relatório enunciado em I. supra relevando ainda os seguintes factos considerados provados pela 1.ª instância na decisão recorrida:
1. A 1.ª R. é uma sociedade por quotas que, no âmbito na sua atividade, e com intuito lucrativo, se dedica ao comércio a retalho de mobiliário, de artigos de iluminação e de outros artigos para o lar não especificados.
2. A 2.ª R. é uma sociedade que, no âmbito da sua atividade, e com intuito lucrativo, se dedica ao fabrico e venda de chaminés, fogões e outros aparelhos de aquecimento, dos respetivos acessórios e outros produtos metálicos.
3. No dia 1 de agosto de 2019 o A. dirigiu-se ao estabelecimento comercial da 1ª R. com o objetivo de comprar uma salamandra.
4. E depois de várias conversas e de analisadas as características de várias salamandras, foi o A. aconselhado por um funcionário a comprar uma salamandra a pellets, da marca ..., modelo ..., com a referência ...68.
5. Nesse mesmo dia, o A. adquiriu à 1.ª R. a salamandra referida em 4) fabricada pela 2.ª R., pelo preço de 2.152,67€ (dois mil, cento e cinquenta e dois euros e sessenta e sete cêntimos).
6. No preço final estava incluída a montagem da salamandra na habitação do A., bem como a instalação dos necessários tubos de extração.
7. Nesse sentido, o serviço de arranque da salamandra foi feito por um técnico de assistência da 2ª R. no dia 12 de setembro de 2019.
8. Chegado o inverno, o A. começou a utilizar a salamandra e algum tempo após a sua utilização, em janeiro de 2020, verificou que a mesma apresentava anomalias, as quais provocaram fuga de fumo, tendo a habitação do autor ficado com várias manchas negras, nomeadamente no teto, nas paredes e nos cortinados.
9. No dia 14 de março de 2020 o A. enviou um e-mail à EMP04... a comunicar que a salamandra estava a funcionar mal, deixando a habitação toda negra, desde o rés do chão ao 1.º andar, pedindo que a mesma fosse substituída ou em alternativa, a devolução do valor da compra.
10. No dia 16 de março de 2020 o autor remeteu email à 2.ª Ré, juntamente com fotografias do local da salamandra e de outras divisões da habitação, informando que a salamandra estava a funcionar mal, deixando a habitação toda negra, desde o rés do chão ao 1.º andar, pedindo que a mesma fosse substituída ou em alternativa, a devolução do valor da compra.
11. No dia 18 de agosto de 2020, a salamandra foi retirada da casa do A. por funcionários da 1.ª R., de modo a ser enviada posteriormente para as instalações da 2.ª Ré.
12. A salamandra só voltou a ser entregue ao A., no dia 26 de outubro de 2020.
13. No dia seguinte à entrega, o autor foi inspecionar a salamandra e apercebeu-se que a mesma vinha com vários riscos e amolgadelas.
14. No dia 27.10.2020 o Autor enviou um e-mail à 2.ª Ré, com conhecimento à 1.ª Ré, a informar que a salamandra lhe tinha sido entregue com várias amolgadelas, que só foram detetadas nesse mesmo dia por volta das 21:00, e, nesse e-mail exigiu a substituição da salamandra por uma nova ou a restituição do valor pago pela sua aquisição.
15. No dia 28.10.2020, o Autor enviou um outro e-mail à 2.ª Ré, com conhecimento à 1.ª Ré, referindo que a salamandra apresentava uma abertura por cima da porta de quase 2cm, o que levou a que o A. não procedesse à sua ligação com receio que a mesma apresentasse fugas atenta a fenda existente.
16. Após a data referida em 15) o A. voltou a examinar a salamandra e verificou que algumas peças da parte da parte de trás estavam quase soltas, indiciando que a salamandra havia sofrido várias pancadas, facto que, uma vez mais, o A. comunicou à 1.ª Ré, com conhecimento da 2.ª Ré, por e-mail de 01.11.2020, o que voltou a reiterar, por email, de 02.11.2020 e 03.11.2020.
17. O autor terá de despender a quantia de 5.578,00€ para limpeza e pintura de tetos e paredes.
18. Mercê do referido em 8) o autor sentiu-se angustiado, transtornado e aborrecido.
19. Em meados de março de 2020 o autor deslocou-se ao estabelecimento da 1.ª ré, referindo que a salamandra libertava fumo quando em funcionamento.
20. Na sequência do referido em 19) a 1.ª Ré fez deslocar um Técnico à habitação do autor, o qual testou durante cerca de uma hora, o funcionamento da referida salamandra não tendo constatado qualquer fuga de fumo, problema de funcionamento ou defeito ou desconformidade na mesma, facto de que deu conta ao Autor.
21. Mais informou o Autor que deveria contactar o Serviço de Atendimento Técnico da marca para proceder à manutenção que a mesma deveria reclamar, em virtude da utilização com que já contava.
22. Os Serviços de Atendimento Técnico Oficial da 2.ª Ré, em Portugal diligenciaram no sentido de agendar com o Autor a assistência na sua residência, não obstante os constrangimentos provocados pelo COVID 19, sendo que as mesmas foram proteladas pelo Autor, por o mesmo se encontrar de férias.
23. No dia 3 de agosto de 2020, o Técnico Oficial dos SAT da 2ª Ré, deslocou-se de ... a ..., à residência do Autor, sendo que a assistência não se realizou, porque o Autor não permitiu a entrada do referido Técnico na sua residência, impedindo assim, que o mesmo verificasse a salamandra e fizesse a manutenção da mesma.
24. Após o referido em 23), a 2.ª Ré decidiu recolher a salamandra, das instalações da 1ª Ré, para a sua fábrica em ..., a fim de efetuar uma revisão à mesma e verificar se a mesma estava a funcionar corretamente.
25. A salamandra foi sujeita a uma revisão e submetida a ensaios técnicos, no laboratório da 2.ª Ré, tendo os seus técnicos, verificado pelos resultados de tais ensaios técnicos, que a salamandra em causa já tinha já 1.293 horas totais de funcionamento e 247 acendimentos, desde o seu arranque.
26. Dos referidos ensaios resultou que a salamandra, contrariamente ao que consta no Manual de Instruções de Instalação, Uso e Manutenção que a acompanha e que contém todas as informações referentes à instalação e manutenção da mesma, nunca tinha sido limpa, nem efetuada a sua manutenção.
27. A salamandra apresentava as passagens de fumos cheias de fuligem e cinza devidas à falta de manutenção e tinha em memória, um alarme de falha de ignição (AL-5) e quatro alarmes de falha de pressão (AL-8).
28. Os Técnicos da 2.ª Ré, atendendo às horas de funcionamento e ao estado de sujidade que a salamandra apresentava realizaram as tarefas próprias de uma limpeza sazonal (manutenção): limpeza profunda de todas as passagens de fumo da salamandra, mudança do cordão da porta, reset das horas parciais de operação.
29. Após o referido em 28) o diretor técnico da 2.ª Ré ordenou a limpeza da salamandra, para poder verificar-se o seu funcionamento.
30. 2.ª Ré, após ter efetuado a limpeza e manutenção da salamandra, bem como os ensaios técnicos, que demonstraram, que a salamandra em causa, não apresentava qualquer defeito, anomalia ou desconformidade, enviou, no dia 14 de outubro de 2020, através de uma transportadora, a salamandra para a 1.ª Ré em Portugal.
31. A salamandra saiu da fábrica da 2.ª Ré embalada e não apresentava riscos, nem amolgadelas e foi enviada para a 1.ª Ré por transportadora, sendo que a 1.ª Ré quando a recebeu, assinou a respetiva guia, nada fazendo constar na mesma, sobre o estado da salamandra.
32. A salamandra foi transportada para a residência do autor pelos funcionários da 1.ª ré.
33. A fuga de fumo referida em 8) teve origem no sistema de instalação da salamandra efetuado pela 1.ª Ré.
1.2. Factos considerados não provados pela 1.ª instância na sentença recorrida:
a) O autor quando começou a utilizar a salamandra seguiu escrupulosamente todas as instruções de uso e manutenção constantes do folheto informativo e as orientações dadas tanto pelo vendedor da 1ª R. aquando da compra, como pelo técnico da 2ª R. aquando do arranque.
b) O email referido em 10) foi remetido para a 1.ª ré
c) Na visita à casa do A. efetuada no dia 03 de Agosto de 2020, o técnico de assistência da 2.ª R. concluiu que a mesma deveria ser de imediato recolhida e levada para a fábrica a fim de ser testada e reparada.

2. Apreciação sobre o objeto do recurso

2.1.  Das invocadas nulidades da decisão recorrida
A apelante suscita a nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia (art.º 615.º, n.º 1 al. d) do CPC), ausência ou grave insuficiência da fundamentação de facto e de direito (art.º 615.º, n.º 1, al. b) do CPC), por condenação em quantidade superior e objeto diverso do pedido (art.º 615.º, n.º 1, al. e), do CPC) e ambiguidade ou obscuridade que a torna parcialmente ininteligível (art.º 615.º, n.º 1, al. c), do CPC).

As causas de nulidade da sentença encontram-se previstas no n.º 1 do artigo 615.º do CPC, nos termos do qual é nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.

Conforme esclarecem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa[1], em anotação ao artigo 615.º do CPC, «[i]mporta que se estabeleça uma separação entre nulidades de processo e nulidades de julgamento, sendo que o regime do preceito apenas a estas se aplica; as demais deverão ser arguidas pelas partes ou suscitadas oficiosamente pelo juiz, nos termos previstos noutros normativos. Ademais, no que respeita às nulidades decisórias, as mesmas apenas podem ser suscitadas perante o tribunal que proferiu a decisão nos casos em que esta não admita recurso, já que na situação inversa deverão ser inseridas nas alegações do recurso de apelação».
Por outro lado, as nulidades de decisão são vícios intrínsecos (quanto à estrutura, limites e inteligibilidade) da peça processual que é a própria decisão (trata-se, pois, de um error in procedendo), nada tendo a ver com os erros de julgamento (error in iudicando) seja em matéria de facto seja em matéria de direito.
As nulidades da sentença são vícios formais, intrínsecos de tal peça processual, taxativamente consagrados no nº 1, do art. 615º, sendo tipificados vícios do silogismo judiciário, inerentes à sua formação e à harmonia formal entre premissas e conclusão, não podendo ser confundidas com hipotéticos erros de julgamento (error in judicando) de facto ou de direito.
Assim, as nulidades da sentença, como seus vícios intrínsecos, são apreciadas em função do texto e do discurso lógico nela desenvolvidos, não se confundindo com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento, estes, a sindicar noutro âmbito[2].
Como tal, as causas de nulidade taxativamente enumeradas neste preceito não visam o chamado erro de julgamento e nem a injustiça da decisão, ou tão pouco a não conformidade dela com o direito aplicável, configurando realidades distintas[3].
A nulidade prevista na al. d), do citado preceito deriva do incumprimento do disposto no artigo 608.º, n.º 2 do CPC, onde se prevê que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento de outras.
A propósito do fundamento de nulidade enunciado na alínea d) do n.º 1 do citado artigo 615.º, referem Lebre de Freitas-Isabel Alexandre[4]: «[d]evendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (608-2), o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença, que as partes hajam invocado (…)».
A par da doutrina, também a jurisprudência que entendemos de sufragar tem vindo a considerar que a referida nulidade só se verifica quando determinada questão colocada ao tribunal - e relevante para a decisão do litígio por se integrar na causa de pedir ou em alguma exceção invocada - não é objeto de apreciação, não já quando tão só ocorre mera ausência de discussão das “razões” ou dos “argumentos" invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas[5], sendo que o conhecimento de uma questão pode fazer-se tomando posição direta sobre ela, ou resultar de ponderação ou decisão de outra conexa que a envolve ou exclui[6].
Ademais, nos termos previstos no artigo 608.º, n.º 2 do CPC, o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, não se verifica omissão de pronúncia quando o não conhecimento de questões fique prejudicado pela solução dada a outras[7].
Por outro lado, importa salientar que o conhecimento de uma questão pode fazer-se tomando posição direta sobre ela, ou resultar de ponderação ou decisão de outra conexa que a envolve ou exclui[8].
Conforme decorre da fundamentação da decisão recorrida, o Tribunal a quo entendeu, entre o mais, que, não obstante o vertido em 26) a 29), o certo é que não foi a falta de manutenção e limpeza da salamandra que originou a fuga de fumos, como a 1.ª Ré defende, invocando até um abuso de direito e culpa do autor, o que diga-se, desde já, não se verifica.
Nestes termos, é legítimo concluir que o Tribunal a quo entendeu que não foi a falta de manutenção e limpeza da salamandra que originou a fuga de fumos, como a 1.ª ré defende, assim não determinando as consequências invocadas por esta em face do alegado uso indevido pelo autor da salamandra em causa nos autos.
Neste enquadramento, a análise do juízo decisório formulado no âmbito da fundamentação constante da decisão em referência configura a discussão de razões, motivos e/ou argumentos justificativos das conclusões formuladas pelo Tribunal a quo a propósito das questões suscitadas nos autos, o que não preenche a nulidade da decisão por omissão de pronúncia, antes traduzindo a discordância da apelante quanto ao mérito da decisão proferida.
A nulidade prevista na citada al. b), do n.º 1, do artigo 615.º do CPC está diretamente relacionada com a violação do preceituado no artigo 154.º do CPC, que impõe ao juiz o dever de fundamentar as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo (n.º 1), sendo que a justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade (n.º 2).
O aludido artigo 154.º do CPC está em consonância com o artigo 205.º, n. º1 da Constituição da República Portuguesa, o qual prevê que as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.
Neste contexto, a generalidade da doutrina e da jurisprudência vem sustentando que só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de indicação dos fundamentos de facto ou de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do n.º 1 do citado artigo 615.º do CPC, não se verificando perante uma fundamentação meramente deficiente, incompleta, não convincente[9].
Revertendo ao caso em apreciação, observa-se que o Tribunal recorrido enunciou os fundamentos que determinaram o sentido e alcance da decisão impugnada, tomando por referência os factos que considerou provados, tal como decorre do seguinte segmento que releva para a apreciação da nulidade agora em causa:
«(…)
Não obstante o vertido em 26) a 29), o certo é que não foi a falta de manutenção e limpeza da salamandra que originou a fuga de fumos, como a 1.ª Ré defende, invocando até um abuso de direito e culpa do autor, o que diga-se, desde já, não se verifica».
Constata-se, assim, que a sentença recorrida apresenta de forma expressa, ainda que sucinta, os fundamentos que determinaram o sentido e o âmbito da decisão proferida, o que fez em moldes que necessariamente implicam a improcedência das questões suscitadas pela ora apelante em face do alegado uso indevido pelo autor da salamandra em causa nos autos.
No corpo das alegações, a apelante invoca o errado julgamento da matéria de facto, impugnando, entre outros, o concreto enunciado fáctico vertido no ponto 8 dos factos provados e alegando, entre o mais, que a resposta dada pelo Tribunal a este ponto da matéria de facto não se encontra fundamentada, uma vez que não é possível, mediante a respetiva análise, alcançar em que concretos meios probatórios se fundou a Mm. ª Juiz do Tribunal a quo para ter dado o mesmo como provado, o que, alega, constitui causa de nulidade de sentença, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC.
A propósito do fundamento de nulidade enunciado na alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, referem ainda Lebre de Freitas-Isabel Alexandre[10]: «[f]ace ao actual código, que integra na sentença tanto a decisão sobre a matéria de facto como a fundamentação desta decisão (art. 607, n.os 3 e 4), deve considerar-se que a nulidade consagrada na alínea b) do n.º1 (falta de especificação dos fundamentos que justificam a decisão) apenas se reporta à primeira, sendo à segunda, diversamente, aplicável o regime do art. 662, n.º s 2-d e 3, alíneas b) e d)».
Assim, o vício em causa será eventualmente subsumível ao regime específico previsto no artigo 662.º, n.º 2, al. d) do CPC, do qual resulta que a Relação deve, mesmo oficiosamente determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados, mas não configura uma nulidade da sentença.
Por outro lado, estando em causa a deficiente fundamentação da decisão da matéria de facto, eventualmente subsumível ao regime específico previsto no artigo 662.º, n.º 2, al. d) do CPC, «a devolução do processo deve ser guardada para casos em que, além de serem efetivamente relevantes, não possam sequer ser remediados através do exercício autónomo do poder de reapreciação dos meios de prova»[11].
Analisando a sentença recorrida verifica-se que na mesma foram discriminados os factos que o Tribunal considerou provados, em conformidade com o preceituado no artigo 607.º, n.º 3 do CPC.
Assim, da fundamentação da sentença constam os elementos, de facto e de direito, que permitem evidenciar os fundamentos em que se alicerça, conforme decorre da própria alegação da recorrente que alude aos factos enunciados na decisão recorrida, impugnando a decisão quanto à matéria de facto.
Ora, como se viu, se a fixação da matéria de facto padecer de deficiência, obscuridade, contradição ou falta de motivação da decisão, tal poderá determinar, mesmo oficiosamente, a alteração proferida sobre a matéria de facto, nos termos do artigo 662.º, n.ºs 2, als. c) e d), e n.º 3, do CPC, mas não determina o vício arguido.
Por conseguinte, não se verifica a invocada nulidade da decisão por falta de fundamentação, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. b), do CPC, improcedendo, nesta parte, a apelação.
A nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, al. e), do CPC, deriva da violação do disposto no artigo 609.º, n.º 1, do CPC, segundo o qual a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.
A este propósito salientam Lebre de Freitas/Isabel Alexandre[12]: «[l]imitado pelos pedidos das partes, o juiz não pode, na sentença, deles extravasar: a decisão, seja condenatória, seja absolutória, não pode pronunciar-se sobre mais do que o pedido ou sobre coisa diversa daquela que foi pedida.
(…)
O objecto da sentença coincide assim com o objecto do processo, não podendo o juiz ficar aquém nem ir além do que lhe foi pedido».
Deste modo, a análise da nulidade suscitada pressupõe a ponderação da sentença recorrida tendo por base o princípio da coincidência entre o teor da sentença e o objeto do litígio (a pretensão formulada pelo autor, que se identifica pela providência concretamente solicitada pelo mesmo e pelo direito que será objecto dessa tutela), o qual, por sua vez, constitui um corolário do princípio do dispositivo, tal como previsto no artigo 3.º, n.º 1 do CPC[13], nos termos do qual, o Tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a ação pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição.
Neste domínio, revela-se consensual na jurisprudência a aplicabilidade das normas que disciplinam a interpretação da declaração negocial no âmbito da interpretação de declarações vertidas em atos processuais, designadamente nos articulados apresentados pelas partes, numa ou em despacho judicial, considerando que constituem verdadeiros atos jurídicos (artigo 295.º do CC), o que implica que os mesmos devam ser interpretados com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do seu contexto (artigo 236.º do CC), sem esquecer a especificidade dos atos jurisdicionais relativamente aos negócios jurídicos e que a interpretação da sentença não pode assentar exclusivamente na análise do sentido da parte decisória, devendo considerar os seus antecedentes lógicos, toda a fundamentação que a suporta, sem deixar de ter em conta outras circunstâncias relevantes, mesmo posteriores à respetiva elaboração[14].
Por outro lado, estando em causa a indagação, interpretação e aplicação das regras do direito, o Tribunal não está sujeito à alegação das partes e pode/deve, interpretar o pedido, tal como interpretaria uma declaração negocial[15].
Tal como se salienta de forma elucidativa no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4-10-2018[16], «o novo modelo de processo civil por nós adotado, assente no primado do direito substantivo sobre o direito adjetivo e no princípio da gestão processual, consagrado no art. 6º do NCPC e que, nas palavras de Miguel Mesquita, “ atribui ao juiz o poder de exercer influência sobre o processo, quer a nível do procedimento propriamente dito, quer ao nível do «coração» do processo, ou seja, do pedido, da causa de pedir e das provas”, torna inevitável a flexibilização do princípio do pedido contido no citado art. 609º, nº1, no sentido da necessidade de se apreender realmente o âmbito objetivo do pedido que foi formulado na ação.
No mesmo sentido adverte o Acórdão do STJ, de 11.02.2015 (processo nº 607/06.2TBCNT.C1. S1), que o art. 609º, nº1 do CPC, carece de um esforço interpretativo suplementar, defendendo que «o princípio do dispositivo impede que o Tribunal decida para além ou diversamente do que foi pedido, mas não obsta a que profira decisão que se inscreva no âmbito da pretensão formulada».
Por seu turno, a causa de pedir corresponde ao facto ou factos jurídicos concretamente invocados para sustentar o direito que o autor se propõe fazer declarar, o efeito jurídico pretendido ou o pedido formulado - cf. artigo 581.º, n.ºs 3 e 4 CPC - cabendo às partes alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir (artigo 5.º, n.º 1 do CPC).
Neste domínio, importa salientar que, como é reconhecido pela jurisprudência, o vício de nulidade da sentença por condenação ultra petitum (al. e), do nº1, do artigo 615º, do CPC), que se reporta a limites, verifica-se quando, em violação do princípio do dispositivo, se condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido, ultrapassando/extravasando o pedido formulado interpretado no contexto da respetiva causa de pedir[17].
Tal como salienta o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-04-2016[18] « é lícito ao tribunal, através de uma requalificação ou reconfiguração normativa do pedido, atribuir ao A., por uma via jurídica não coincidente com a que estava subjacente à pretensão material deduzida, o bem jurídico que ele pretendia obter; mas já não será processualmente admissível atribuir-lhe, sob a capa de tal reconfiguração da materialidade do pedido, bens ou direitos substancialmente diversos do que o A. procurava obter através da pretensão que efectivamente, na sua estratégia processual, curou de formular».
No caso vertente, a recorrente sustenta que, em ponto algum da petição inicial o recorrido/autor alega, ainda que de forma lateral, a existência de desconformidade com a instalação da salamandra, como igualmente não alega causalidade adequada à obtenção dos efeitos jurídicos em que a aqui recorrente foi condenada e muito menos imputa à mesma quaisquer factos tendentes a obter condenação nos termos em que esta veio a verificar-se - « Condeno a Ré, EMP01..., Lda a, no prazo de 60 dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença proceder à reparação da instalação da salamandra, com substituição dos tubos ou mudança de local, reparação de paredes e/ou o mais necessário, a expensas suas”».
O primeiro pedido formulado na petição inicial é o de reparação da salamandra em causa, a expensas exclusivas das rés, no prazo que lhe vier a ser fixado. Nessa impossibilidade (como tal, a título subsidiário), o autor peticionou a condenação das rés a substituir a salamandra por outra da mesma gama e características em perfeito estado de conservação e funcionamento; em todo o caso, c) a pagar ao autor a quantia de 5.578,00€ (cinco mil quinhentos e setenta e oito euros) referente ao preço de reparação dos danos patrimoniais; indemnizar ao A. pela quantia de 2.500,00€ (dois mil e quinhentos euros) a título de danos morais; pagar juros de mora à taxa legal a contar da data da citação até ao efetivo e integral pagamento.
Porém, de acordo com a configuração dada pelo autor na petição inicial, o objeto do litígio assenta em alegadas anomalias/defeitos/falta de qualidade do equipamento fornecido e instalado - cf. os pontos 9.º e 10.º da petição inicial -, abrangendo, como tal, eventuais desconformidades da instalação da salamandra ou dos respetivos tubos de extração, com a particularidade, ou traço específico, de terem provocado fuga de fumo que fez com que a habitação do autor ficasse com manchas negras, nomeadamente no teto, nas paredes e nos cortinados.
Acresce que foi alegado - e ficou provado (ponto 6.º dos factos provados) - que no preço final da salamandra estava incluída a montagem da salamandra na habitação do A., bem como a instalação dos necessários tubos de extração, pelo que, sendo a falta de conformidade resultante de má instalação do bem de consumo equiparada à falta de conformidade do bem, quando a instalação fizer parte do contrato de compra e venda e tiver sido efetuada pelo vendedor (artigo 2.º, n.º 4 do Dec. Lei n.º 67/2003, de 8-04, com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei n.º 84/2008, de 21-05, aplicável ao caso em análise), resta reconhecer que a condenação na reparação da instalação da salamandra, com substituição dos tubos ou mudança de local, a expensas suas, se contém no âmbito do pedido formulado, interpretado à luz de todo o circunstancialismo fáctico alegado na petição inicial, integrando a condenação parte do que vem pedido[19].
Já no que concerne ao segmento da condenação atinente à “reparação de paredes e/ou o mais necessário”, resulta manifesto que a sentença recorrida padece da nulidade consagrada na al. e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, tendo havido pronúncia ultra petitum e efetiva condenação em objeto diverso do pedido (artigo 609.º, n.º 1 do CPC), representando, entre o mais, uma duplicação da tutela judicial concedida pelo Tribunal, visto que na mesma decisão o Tribunal a quo condenou a ré, EMP01..., Comércio de Móveis e Eletrodomésticos, Lda. a pagar ao autor a quantia de 5.578,00€, a título de danos patrimoniais, sendo que de acordo com a configuração dada pelo autor na petição inicial, o valor reclamado a título de danos patrimoniais visava precisamente a reparação dos danos verificados nos tetos e paredes da habitação do autor em virtude da fuga de fumo do interior para o exterior da salamandra.
Neste contexto, é manifesto que o segmento da condenação atinente à “reparação de paredes e/ou o mais necessário”, padece da nulidade consagrada na al. e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, tendo havido pronúncia ultra petitum e efetiva condenação em objeto diverso do pedido (artigo 609.º, n.º 1 do CPC).
Como tal, procedem parcialmente, nesta parte, as conclusões da apelação, o que implica a revogação da parte final do segmento decisório em que se condenou a ora recorrente, EMP01..., Comércio de Móveis e Eletrodomésticos, Lda., a proceder à reparação de paredes e/ou o mais necessário, não se verificando a suscitada nulidade quanto ao restante segmento condenatório em causa.
Em face do assim decidido, fica prejudicada a apreciação da invocada ambiguidade ou obscuridade da decisão recorrida, porquanto a mesma incidia sobre o objeto da prestação em que a ora recorrente foi condenada no segmento decisório agora revogado.

2.2. Impugnação da decisão relativa à matéria de facto

A apelante/ré impugna a decisão relativa à matéria de facto incluída na decisão recorrida, nos seguintes termos:
i) os factos descritos nos pontos 8., 17., 18., 33., dos factos provados devem transitar para a matéria não provada; ou provado apenas (relativamente ao ponto 8), o seguinte: «8) O A. começou a utilizar a salamandra em 12 de setembro de 2019, imediatamente após o seu arranque»;
ii) o facto descrito no ponto 13., dos factos provados deve transitar para a matéria não provada; adicionalmente, e com suporte nos elementos probatórios indicados no âmbito da impugnação deduzida quanto a este ponto, defende o aditamento à matéria provada dos seguintes factos: - «No dia 26-10-2020, quando lhe foi restituída a salamandra, o Autor examinou a mesma e não apresentou qualquer reclamação, tendo apenas comunicado que pretendia que a salamandra fosse instalada em local diferente daquele onde se encontrava antes»; - «Nessa sequência o Autor deslocou-se no dia 27-10-2020 ao estabelecimento da Ré EMP01... no sentido de agendar a reinstalação e de tratar dos materiais necessários a tanto, tendo a reinstalação sido agendada para dia 29-10-2020, o que o Autor posteriormente não permitiu».
Tal como resulta da análise conjugada do disposto nos artigos 639.º e 640.º do CPC, o recurso de apelação pode envolver a impugnação da decisão da matéria de facto provada ou não provada (antecipando alguma das soluções previstas no art. 662º), devendo o recorrente concretizar quer os segmentos que considera erradamente julgados, quer os meios de prova que determinam uma decisão diversa[20].
Porém, a impugnação da decisão da matéria de facto, atento o seu carácter instrumental, não constitui um fim em si mesma, mas antes um meio ou mecanismo para atingir um determinado objetivo, mostrando-se por isso absolutamente pacífica a orientação jurisprudencial dos nossos Tribunais superiores no sentido de que a Relação não deverá reapreciar a matéria de facto se a sua reapreciação se afigurar inútil ou inócua do ponto de vista da decisão a proferir, sob pena de levar a cabo uma atividade processual inconsequente e inútil que, por isso, lhe está vedada pela lei, atento o disposto no artigo 130.º do CPC[21].
Deste modo, o exercício dos poderes de controlo da Relação sobre a decisão da matéria de facto só se justifica quando recaia sobre matéria com relevância para a decisão da causa[22].
Tal como elucida o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11-02-2015[23], no contexto da jurisprudência antes enunciada, «[a] garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto visa corrigir erros de julgamento que facultem ao impugnante a modificação daquela de modo a obter, por essa via, um efeito juridicamente útil, pelo que se o facto a que se dirige a impugnação for irrelevante para a decisão a proferir, é inútil e contrário aos princípios da economia e da celeridade processuais (art. 2.º, n.º 1 e art. 130.º, ambos do NCPC (2013)), a actividade de reapreciação do seu julgamento».
Neste enquadramento, revela-se manifesto que a garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto não pode dissociar-se da análise do objeto do recurso, cujo ónus de delimitação impende sobre o recorrente.
Com efeito, nos termos do disposto no artigo 639.º, n. º1 do CPC, o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
Tal como esclarece Abrantes Geraldes[24], «[e]m resultado do que consta do art. 639.º, n.º 1, as conclusões delimitam  a área de intervenção do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido, na petição inicial, ou à das exceções, na contestação. Salvo quando se trate de matéria de conhecimento oficioso que, no âmbito do recurso interposto pela parte vencida, possam ser decididas com base nos elementos constantes do processo e que não se encontrem cobertas pelo caso julgado, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem».
A este propósito, referem António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa[25], em anotação ao referido preceito: «[a] lei exige que o recorrente condense em conclusões os fundamentos por que pede a revogação, a modificação ou a anulação da decisão. Com as necessárias distâncias, tal como a motivação do recurso pode ser associada à causa de pedir, também as conclusões, com proposições sintéticas, encontram paralelo na formulação do pedido que deve integrar a petição inicial. Rigorosamente, as conclusões devem (deveriam) corresponder a fundamentos que, com o objetivo de obter a revogação, alteração ou anulação da decisão recorrida, se traduzam na enunciação de verdadeiras questões de direito (ou de facto) cujas respostas interfiram com a decisão recorrida e com o resultado pretendido (…).
As conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso (…). Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo».
Resulta do exposto que é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso, seja quanto às pretensões do recorrente, seja quanto às questões de facto e de direito que coloca.
Na situação em análise, como já vimos, a apelante impugna o julgamento da matéria de facto constante da sentença recorrida.
Porém, ao longo das alegações de recurso e das correspondentes conclusões, a apelante não retira qualquer consequência jurídica da alteração da decisão da matéria de facto que preconiza relativamente ao ponto 13.º dos factos provados e aos factos que pretende aditar - enunciados em ii) supra -, não explicitando que alcance poderia ter o conhecimento dessa matéria relativamente ao resultado do recurso ou de que forma daí resultaria uma diversa aplicação do direito ao caso concreto, nem peticiona, ainda que subsidiariamente, qualquer modificação da decisão recorrida.
Deste modo, considerando que a recorrente não retira qualquer consequência jurídica da alteração da decisão da matéria de facto que preconiza em ii) supra, nem peticiona, ainda que subsidiariamente, qualquer alteração da decisão em face de tal matéria, torna-se evidente que sobre tais questões não tem este Tribunal de se debruçar e decidir, mesmo ponderando, como mera hipótese de raciocínio, uma eventual procedência da impugnação da matéria de facto, sob pena de extravasar o objeto do recurso delimitado pela própria recorrente e incorrer em excesso de pronúncia, seja quanto às pretensões formuladas em sede recursiva, seja quanto às questões de direito suscitadas.
Aliás, a sentença impugnada também não retirou qualquer consequência jurídica do facto vertido no ponto 13.º dos factos provados, tal como decorre dos respetivos segmentos condenatórios.
Acresce que parte dos aditamentos pretendidos pela recorrente consubstanciam matéria essencialmente inovadora, porquanto não foram oportunamente alegados nos articulados, consubstanciando uma nova alegação de factos apenas trazida em sede de recurso, sem que antes a recorrente tenha manifestado a intenção de se aproveitar dos mesmos, como é o caso da alegação de que no dia 26-10-2020, quando lhe foi restituída a salamandra, o Autor examinou a mesma.
Nestes termos, não indicando a apelante a solução que defende para o litígio, na hipótese de precedência da impugnação da decisão sobre a matéria de facto enunciada em ii) supra, também não peticionando, ainda que subsidiariamente, qualquer alteração da decisão no que concerne à solução jurídica da causa em face da alteração proposta sobre esta matéria, resta concluir que a respetiva reapreciação em sede recursiva configura a prática de um ato inútil e, como tal, proibido pelo artigo 130.º do CPC, tanto mais que sobre tal matéria a sentença impugnada não retirou qualquer consequência jurídica, nem o autor recorreu da decisão, ainda que subordinadamente, o que determina inevitavelmente a rejeição da impugnação da decisão relativa à matéria de facto relativamente ao ponto 13.º dos factos provados e à ampliação da matéria de facto enunciada em ii), o que se decide.
Relativamente agora à impugnação supra enunciada em i), pretende a apelante a alteração para negativa da resposta constante dos pontos 8., e 33., dos factos provados; ou provado apenas (relativamente ao ponto 8), o seguinte: «8) O A. começou a utilizar a salamandra em 12 de setembro de 2019, imediatamente após o seu arranque».
Segundo a apelante, em face da prova produzida resultou demonstrado que o recorrido iniciou efetivamente a utilização da salamandra após o seu arranque, que se verificou em 12-09-2019, e que a salamandra não padece de quaisquer anomalias, não se podendo dar como verificada a fuga de fumos ou a existência de manchas negras na habitação do recorrido que possam ter decorrido da respetiva instalação.
Conforme prevê o artigo 662.º, n.º 1 do CPC, com a epígrafe Modificabilidade da decisão de facto, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Tal como ressalta deste último preceito, a reapreciação da decisão proferida sobre determinados pontos da matéria de facto deve ter a mesma amplitude que o julgamento efetuado em 1.ª Instância, dispondo para tal a Relação de autonomia decisória de forma a assegurar o duplo grau de jurisdição.
A este propósito, refere Abrantes Geraldes[26]: «(…) sendo a decisão do tribunal a quo o resultado da valoração de meios de prova sujeitos à livre apreciação, tais como documentos particulares sem valor confessório, relatórios periciais ou declarações de parte a que não corresponda confissão, desde que a parte interessada cumpra o ónus de impugnação prescrito pelo art. 640.º, a Relação, assumindo-se como verdadeiro tribunal de instância, está em posição de proceder à sua reavaliação, expressando, a partir deles, a sua convicção com total autonomia. Afinal, nestes casos, as circunstâncias em que se inscreve a sua atuação são praticamente idênticas às que existiam quando o tribunal de 1.ª instância proferiu a decisão impugnada, apenas cedendo nos fatores da imediação e da oralidade».
Como tal, a necessária ponderação dos princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova implica que «o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1.ª instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados»[27].
No caso, cumpre aferir se os concretos meios de prova valorados pelo Tribunal a quo, em conjunto com a matéria de facto já definitivamente assente, são suficientes para considerar assentes os factos impugnados, o que importa a prévia determinação do padrão de prova exigível em processo civil, isto é, do standard de prova aplicável, o qual consiste numa regra de decisão que indica o nível mínimo de corroboração de uma hipótese para que esta possa considerar-se provada, ou seja, possa ser aceite como verdadeira[28].

Tal como explica Luís Filipe Pires de Sousa[29], «o standard de prova que opera no processo civil é o da «probabilidade prevalecente ou “mais provável que não”. Este standard consubstancia-se em duas regras fundamentais:
(i) Entre as várias hipóteses de facto deve preferir-se e considerar-se como verdadeira aquela que conte com um grau de confirmação relativamente maior face às demais;
(ii) Deve preferir-se aquela hipótese que seja “mais provável que não”, ou seja, aquela hipótese que é mais provável que seja verdadeira do que seja falsa.
(…) este critério da probabilidade lógica prevalecente - insiste-se - não se reporta à probabilidade como frequência estatística mas sim como grau de confirmação lógica que um enunciado obtém a partir das provas disponíveis.
Em segundo lugar, o que o standard preconiza é que, quando sobre um facto existam provas contraditórias, o julgador deve sopesar as probabilidades das diferentes versões para eleger o enunciado que pareça ser relativamente “mais provável”, tendo em conta os meios de prova disponíveis».
Abrantes Geraldes[30] sublinha a necessidade de o juiz adotar um critério de razoabilidade no que concerne à afirmação da prova ou da falta de prova dos factos controvertidos: «Cientes de que a verdade absoluta é estranha ao Direito e que, por conseguinte, a formulação de juízos judiciários deve assentar, conforme as circunstâncias e a natureza do caso, em critérios que se orientem pela verosimilhança ou pela maior ou menor probabilidade, não devem ser feitas exigências probatórias irrealistas que, na prática, acabem por revelar uma situação de denegação de justiça».
Neste domínio, refere José Lebre de Freitas[31]: «No âmbito do princípio da livre apreciação da prova, não é exigível que a convicção do julgador sobre a realidade dos factos alegados pelas partes equivalha a uma absoluta certeza, raramente atingível pelo conhecimento humano. Basta-lhe assentar num juízo de suficiente probabilidade ou verosimilhança, que o necessário recurso às presunções judiciais (arts. 349 e 351 CC) por natureza implica, mas que não dispensa a máxima investigação para atingir, nesse juízo, o máximo de segurança».
No que concerne à impugnação atinente aos pontos 8., e 33., dos factos provados, a apelante indica, como meios de prova a atender, o depoimento/declarações de parte do autor - AA -, da legal representante da 1.ª ré - CC -, em conjunto com a reapreciação dos depoimentos das testemunhas BB, DD e de GG,  de acordo com as passagens que identifica e transcreve no corpo da alegação, com os documentos juntos aos autos como docs. 2., 3., 13., 14., 22., 23., 24., 25., da contestação da 1.ª ré, documento junto pelo autor com o requerimento apresentado em 05-01-2022, e das conclusões que entende deverem ser retiradas da ponderação dos factos já provados sob os pontos 7., 20., 21., 22., 25., 26., 27., 28., 29., e 30. 
No caso, não estão em causa factos sujeitos a prova vinculada, nem a apelante invoca o desrespeito de norma reguladora do valor legal dos meios de prova concretamente invocados no recurso, vigorando neste domínio o princípio da livre apreciação das provas quanto aos depoimentos das testemunhas, o mesmo sucedendo quanto aos documentos apresentados nos autos e às declarações de parte, tudo em conformidade com o disposto nos artigos 341.º a 396.º do Código Civil (CC).
Com vista à completa perceção da facticidade impugnada pela recorrente, e no intuito de evitar conclusões descontextualizadas sobre tal matéria, uma vez que a prova terá de ser analisada globalmente e não de forma parcial ou restrita a certos meios de prova que a recorrente entende serem favoráveis à sustentação da impugnação deduzida, foram revistos e analisados criticamente e de forma atenta todos os meios de prova, o que envolve a globalidade dos depoimentos/declaração produzidos em sede de audiência final e os documentos juntos pelas partes ao processo, sem esquecer os factos já devidamente consolidados no autos.
Com relevo para a matéria agora em causa foi analisado integralmente o extenso registo de gravação das declarações de parte do autor, AA, confirmando a aquisição da salamandra, a instalação desta na sua habitação, o respetivo arranque, e explicando, no essencial, que a salamandra ficou a funcionar e até aquecia muito bem, até que, em meados de janeiro de 2020,  se apercebeu que os tetos, as paredes e as cortinas, mesmo no 1.º andar da sua habitação, apareceram enegrecidos/defumados, apresentando marcas visíveis de fumo, ainda que o fumo não fosse percetível no ar.
Por seu turno, a testemunha FF, vizinho e amigo do autor, referiu ter conhecimento da aquisição da salamandra pelo autor, por morar a vinte metros deste e frequentar a sua casa. De relevante, esclareceu que no início a salamandra funcionava bem, mas a partir de janeiro de 2020 a casa apareceu toda preta, tendo-se deslocado à casa do autor e verificado que as paredes estavam negras de fumo e as cortinas escurecidas. Foi confrontado com os registos fotográficos juntos como docs. 4 e 5 da petição inicial, tendo confirmado que as mesmas correspondem à casa do autor, reproduzindo as paredes, os tetos e as cortinas da referida habitação, no estado em que ficaram a partir de janeiro de 2020. Garantiu que ainda hoje estão assim.
A testemunha DD, construtor civil, vizinho e amigo do autor, confirmou ter elaborado o orçamento junto com a petição inicial, bem como a necessidade dos trabalhos de limpeza e pintura de tetos e paredes a efetuar na habitação do autor. Mais referiu ter sido o autor que comunicou a necessidade de pintar devido ao fumo, não tendo reparado se as cortinas também estavam enegrecidas ou manchadas de fumo. Contudo, confirmou que a casa estava bastante manchada por ação de fumos e, portanto, havia e há necessidade de limpar com produto próprio para limpeza de fumos e aplicar depois primário contra fumos, para depois pintar. Referiu que mediu a casa toda, inclusive as casas de banho (estas só os tetos), confirmando que todas as paredes e os tetos da habitação estavam fumados.
Por seu turno, a testemunha EE confirmou ter sido a pessoa que recolheu as fotografias da casa do autor a pedido deste e bem assim da salamandra após o regresso de .... Foi confrontado com diversos registos fotográficos, entre os quais os docs. 4 e 5 da petição inicial, tendo confirmado que os mesmos correspondem à casa do autor, reproduzindo as paredes, os tetos e as cortinas da referida habitação no estado em que os percecionou aquando da deslocação à mesma residência. Garantiu que as paredes estavam todas negras e que tirou fotos no 1.º andar, onde se situavam os quartos, e no R/C da habitação. Esclareceu que o autor lhe disse que as paredes estavam negras por causa da salamandra.
A testemunha BB - técnico instalador, funcionário da 1.ª ré, há 10 anos - referiu que procedeu à instalação da salamandra na casa do autor, após a aquisição, no local que este indicou para o efeito. Mais referiu que na sequência do autor ter reportado uma fuga de fumos à sua entidade patronal, o mesmo voltou à casa do autor e testou a salamandra, colocando-a em funcionamento, tendo constatado que a mesma efetuou corretamente todas as fases de aquecimento, não tendo detetado qualquer fuga. Também não havia nenhum sinal de fumo na parte traseira da salamandra, designadamente na saída de fumos para o exterior. Confirmou que na mesma ocasião tirou fotografias à parte frontal e à zona traseira da salamandra, com as quais foi confrontado em audiência (doc. 3 da contestação da 1.ª ré). Referiu, entre o mais, que na mesma ocasião, em março de 2020, constatou que a memória da salamandra indicava cerca de seiscentas e tal horas de funcionamento e tinha um registo de alarme de blackout (que explicou ocorrer quando há falha de eletricidade) e um registo de falha de acendimento.
Com relevo para o apuramento da matéria em análise, destacamos o depoimento da testemunha HH - administrador da empresa EMP04..., que presta serviços de atendimento técnico (SAT) para a 2.ª ré, EMP03..., sendo o centro de assistência desta ré em Portugal -, esclarecendo que, inicialmente, quando o técnico da EMP04... foi efetuar o “arranque” da salamandra na habitação do autor (na sequência da sua aquisição pelo autor e da instalação da mesma salamandra pela 1.ª ré), constatou que a instalação da salamandra na casa do autor não estava em conformidade. Esta testemunha esclareceu de forma consistente que a 1.ª ré, na pessoa do Sr. II, foi então alertada pelos serviços da EMP04... para a necessidade de retificar a instalação da salamandra na habitação do autor, alertando-a de que a conduta de escoamento não tinha os dois metros verticais, antes de sair para o exterior, e depois no exterior tem de ter uma conduta em tubo duplo, como é obrigatório, e que a 1.ª ré se prontificou então a retificar a instalação. Mais esclareceu que, naquela situação em concreto, o tubo de escoamento de fumos era direto para a rua, não estando em conformidade com os procedimentos normais para aquele tipo de aparelho. Asseverou que a deficiente instalação da salamandra pode determinar a fuga de fumos. Já se houver uma deficiência no próprio equipamento, este dá um alarme e deixa de funcionar. Garantiu que a 1.ª ré nunca chegou a fazer qualquer alteração/retificação na instalação da salamandra. Foi confrontado com o teor do documento junto com o requerimento apresentado em 05-01-2022, confirmando que uma parte do mesmo foi preenchida na casa do cliente pelo funcionário da EMP04... aquando do arranque da salamandra, mas que os pontos nele assinalados apenas significam ou certificam que os respetivos componentes do aparelho ficaram a funcionar na data do respetivo arranque, não significando que a instalação estava em conformidade com os procedimentos recomendados. Referiu que se a instalação não estiver de acordo com as regras, contactam o profissional, no caso a ré EMP01..., para retificar a instalação, o que afirmou ter sido feito na ocasião.
Também a testemunha JJ, engenheiro, funcionário da EMP03..., SL, apesar de não ter revelado qualquer perceção direta da instalação da salamandra, já que nunca se deslocou ao local da mesma, confirmou que o Sr. HH, da empresa EMP04..., lhe transmitiu que, após fazerem o arranque da salamandra, contactaram a EMP01... a informar que a extração de fumos deveria ser revista.
No mais, esclareceu, de relevante, que determinou a recolha da salamandra e o seu transporte para as instalações da EMP03... em ... a fim de analisar a salamandra e aferir se a mesma tinha algum problema que comprometia o seu funcionamento. Os técnicos da EMP03... efetuaram a análise da salamandra e não detetaram nenhuma fuga, de cheiros ou cinzas. Confirmou que a salamandra registava então 1293 horas de funcionamento e 247 acendimentos. Explicou que, dado o estado de sujidade da mesma, limparam as passagens de fumo. Explicou que uma incorreta instalação, a falta de manutenção ou a utilização de combustível (pellets) de baixa qualidade podem ser causa(s) dos alarmes de falta de pressão. Referiu que a salamandra foi testada pelos serviços técnicos da EMP03... e funcionava corretamente, o que foi exarado em relatório junto aos autos, sendo seguro que a salamandra não tinha qualquer problema. Referiu que a salamandra foi devidamente embalada e enviada para Portugal através de uma transportadora. Esclareceu que, inicialmente, aquando da reclamação feita pelo cliente a propósito do funcionamento da salamandra, informou a 1.ª ré que seria importante verificar, no local, se o problema viria da salamandra (aparelho) ou da ligação (instalação), o que resulta de forma expressa do email de sua autoria, junto como doc. 8 - fls. 3 - com a petição inicial, no qual aliás o engenheiro JJ expressa a sua convicção quanto a ser muito provável a existência de fuga de fumos na tubagem/conduta.
De salientar ainda que esta testemunha foi confrontada em audiência com o teor do email que lhe foi enviado pela legal representante da 1.ª ré (doc. 2 - fls. 2 - junto com a petição inicial), do qual consta, entre o mais, que esta aceita a existência de fuga de fumo, nos seguintes termos: «(…) Depois de solicitar a ida do funcionário da EMP01... à casa do Sr. AA, a fim de verificar algum problema na extração de fumos, o mesmo não foi detetado por parte do colaborador. Ao invés, a fuga de fumo que existe ocorre na parte traseira e superior da salamandra (zona onde podem ser colocados a saída de ar quente) bem como na parte frontal por cima da porta, como comprovam imagens em anexo, que à volta do tubo de extração encontra-se limpa.
(…)».
Acresce que a salamandra foi sujeita a ensaios técnicos no laboratório da 2.ª ré, fabricante do equipamento, em ..., que demonstraram que a salamandra não apresentava qualquer defeito, anomalia ou desconformidade, como aliás decorre do ponto 30., dos factos provados, não concretamente impugnado nos autos.
Ao invés, nenhuma prova foi feita no sentido de que a fuga de fumos verificada durante a utilização da salamandra tivesse resultado do seu uso intenso e/ou da falta de manutenção e limpeza da mesma, não obstante as circunstâncias elencadas nos pontos 26., a 29., dos factos provados.
Aliás, a testemunha BB começou por esclarecer que na ocasião em que analisou a salamandra, em março de 2020 (após o autor se ter deslocado ao estabelecimento da 1.ª ré, referindo que a salamandra libertava fumo quando em funcionamento), constatou que a memória indicava cerca de seiscentas e tal horas de funcionamento e tinha um registo de alarme de blackout (que explicou ocorrer quando há falha de eletricidade) e um registo de falha de acendimento. Por outro lado, de acordo com a mesma testemunha, se o aparelho tiver os registos obstruídos, por falta de manutenção, a salamandra não trabalha. Porém, como se viu, esta testemunha referiu que quando testou a salamandra, colocou-a em funcionamento e a mesma efetuou corretamente todas as fases de aquecimento.
Por todo o exposto, feita a reapreciação crítica e concatenação de todos os meios de prova e dos factos antes enunciados, à luz das regras gerais da experiência comum, alicerçadas em juízos de probabilidade e de normalidade social, entendemos que se justifica a prevalência da credibilidade dos meios de prova em que assentou a convicção do Tribunal a quo para dar como provado o enunciado fáctico constante do ponto 33 dos factos provados, mantendo-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre este facto.
Já no que respeita ao impugnado ponto 8 da matéria de facto provada, resulta indiscutível que os meios de prova antes ponderados e os segmentos fácticos já definitivamente tidos como provados nos autos - cf., os pontos 24., 25., e 30., dos factos provados - impedem necessariamente a referência dele constante às anomalias apresentadas pela salamandra, ainda que as mesmas decorram da sua instalação, manifestando-se por isso no decurso da sua utilização.
Por outro lado, ainda que das declarações de parte do autor resulte, no essencial, que a salamandra ficou a funcionar logo após o seu arranque, que se verificou em 12-09-2019, aquele apenas confirmou uma utilização intensiva e diária do equipamento a partir de novembro/dezembro de 2019, sendo que apenas em meados de janeiro de 2020 se apercebeu que os tetos, as paredes e as cortinas, mesmo no 1.º andar da sua habitação, apareceram enegrecidos/defumados, apresentando marcas visíveis de fumo, ainda que o fumo não fosse percetível no ar, o que impõe a necessária alteração do impugnado ponto 8., dos factos provados.
 Em conformidade com a ponderação antes efetuada, o ponto 8., dos factos provados passará a vigorar com a seguinte redação:
8. «O A. começou a utilizar a salamandra em novembro de 2019 e algum tempo após, em meados de janeiro de 2020, verificou que da sua utilização resultava fuga de fumo, tendo a habitação do autor ficado com várias manchas negras, nomeadamente no teto, nas paredes e nos cortinados».
Pretende a apelante a alteração para negativa da resposta constante do ponto 17., dos factos provados - «O autor terá de despender a quantia de 5.578,00€ para limpeza e pintura de tetos e paredes».
Sobre esta matéria, a recorrente insurge-se de forma genérica contra o relevo probatório atribuído na sentença ao depoimento da testemunha DD, por ser vizinho e amigo do autor, sustentando que tais circunstâncias não foram ponderadas pelo Tribunal recorrido, antes implicando que o depoimento em causa, bem como o orçamento apresentado como doc. 18 da petição inicial, fossem analisados com redobrado rigor e apreciados criticamente de forma mais exigente. Mais indica, como meios de prova a atender, os depoimentos das testemunhas BB, DD e de EE, de acordo com as passagens que identifica e transcreve no corpo da alegação, em conjunto com os documentos juntos aos autos como doc. 18 da petição inicial, e docs. 3 e 18 da contestação.
Ora, em primeiro lugar, constata-se que o Tribunal recorrido revelou estar ciente da referenciada relação de vizinhança e de amizade da testemunha DD com o autor, pois aludiu à mesma em sede de motivação da decisão de facto.
Por outro lado, a testemunha DD, no âmbito do interrogatório preliminar e ao longo do seu depoimento, reportou expressamente a referenciada relação de vizinhança e de amizade com o autor, descrevendo-a e situando-a temporalmente, indicando e procurando justificar a razão de ciência invocada.
Ademais, em matéria de eventual interesse no pleito e/ou de relacionamento de proximidade com as partes, é preciso não esquecer que a testemunha BB, também indicada pela recorrente para sustentar a presente impugnação, referiu ser funcionário da 1.ª ré, há 10 anos.
Revisto o depoimento da testemunha DD, constata-se que as referências e os esclarecimentos que apresentou perante o Tribunal foram plausíveis, não se eximindo a responder de forma direta às questões formuladas e procurando esclarecer o Tribunal sobre o orçamento por si elaborado e que foi junto como doc. 18 da petição inicial, com o qual foi confrontado em audiência de julgamento. Neste domínio, confirmou ter elaborado o orçamento junto com a petição inicial, bem como a necessidade dos trabalhos de limpeza e pintura de tetos e paredes nele especificados, a efetuar na habitação do autor. Mais referiu ter sido o autor que comunicou a necessidade de pintar devido ao fumo, não tendo reparado se as cortinas também estavam enegrecidas ou manchadas de fumo. Contudo, confirmou que a casa estava bastante manchada por ação de fumos e, portanto, havia e há necessidade de limpar com produto próprio para limpeza de fumos e aplicar depois primário contra fumos, para depois pintar. Referiu que mediu a casa toda, inclusive as casas de banho (estas só os tetos), confirmando que todas as paredes e os tetos da habitação estavam fumados.
Por outro lado, também não vemos que os depoimentos das testemunhas BB e EE, em conjunto com os documentos juntos aos autos como docs. 3 e 18 da contestação permitam infirmar de forma decisiva a verosimilhança do relato apresentado pela testemunha DD sobre esta matéria.
Com efeito, do depoimento prestado pela testemunha EE não decorreram quaisquer relatos aptos a infirmar as circunstâncias vertidas no ponto da matéria de facto em apreciação, antes confirmando que recolheu as fotografias da casa do autor a pedido deste. Foi confrontado com diversos registos fotográficos, entre os quais os docs. 4 e 5 da petição inicial, tendo confirmado que os mesmos correspondem à casa do autor, reproduzindo as paredes, os tetos e as cortinas da referida habitação no estado em que os percecionou aquando da deslocação à mesma residência. Garantiu que as paredes estavam todas negras e que tirou fotos no 1.º andar, onde se situavam os quartos, e no R/C da habitação. Esclareceu que o autor lhe disse que as paredes estavam negras por causa da salamandra.
Por seu turno, o conhecimento declarado pela testemunha BB, não incidiu de forma direta e específica sobre os concretos aspetos em causa no ponto da matéria de facto em apreciação, nem os aspetos sobre que depôs permitem afastá-los em face da ponderação do conjunto da prova produzida nos autos.
Por outro lado, as fotografias referentes à parte frontal e à zona traseira da salamandra (doc. 3 da contestação da 1.ª ré) têm um objeto muito restrito, não permitindo apreender de forma nítida e rigorosa se as paredes e os tetos da habitação estavam ou não fumados/enegrecidos.
Por último, o teor do orçamento junto pela 1.ª ré como doc. 18 da contestação não foi confirmado em sede de audiência de julgamento, permanecendo indefinido o objeto a que se reporta, atento o seu teor genérico.
Por conseguinte, reapreciados os depoimentos e os documentos em referência, não vemos razões para alterar a resposta vertida pelo Tribunal a quo relativamente ao facto vertido no ponto 17., dos factos provados, improcedendo nesta parte a impugnação.
Por fim, a recorrente impugna o facto considerado provado sob o n.º 18.º - «Mercê do referido em 8) o autor sentiu-se angustiado, transtornado e aborrecido» - defendendo o respetivo aditamento à matéria não provada, por total ausência de prova do facto e da causalidade que lhe é inerente.
Para o efeito requer a reapreciação dos depoimentos das testemunhas FF e de DD, ambos amigos e vizinhos do autor, de acordo com as passagens que identifica e transcreve no corpo da alegação.
Atendendo então à ponderação crítica de todos os meios de prova analisados, julgamos que dos mesmos não decorre um juízo de suficiente probabilidade para dar como provado o aludido segmento da matéria de facto.
Assim, as referências feitas pela testemunha FF consubstanciam juízos eminentemente conclusivos ou argumentativos, não evidenciando ocorrências relevantes que permitam firmar a genérica alegação quanto à dimensão e amplitude das consequências em apreciação, não circunstanciadas em termos fácticos.
Sobre esta matéria, a testemunha FF limitou-se a referências vagas, genéricas e/ou irrelevantes, como “psicologicamente, tem andado um bocado em baixo…porque tudo isto…ele foi lá várias vezes, ao senhor (…)” ou “andava chateado porque queria o problema resolvido e não era resolvido” ou “ele andava stressado”, o que não permite sustentar de forma convincente e credível a concreta materialidade impugnada.
Por outro lado, a testemunha DD reportou-se à situação da esposa do autor, como sendo a pessoa que ele via mais abatida, nada referindo em concreto relativamente ao autor.
Atendendo à ponderação crítica dos meios de prova produzidos sobre esta matéria, entendemos que da sua análise não decorre um juízo de suficiente probabilidade da verificação do facto constante do impugnado ponto 18., dos factos provados, pelo que cumpre julgá-lo não provado, passando o mesmo a integrar a factualidade não provada.
Procede, assim, ainda que parcialmente, nos termos expostos, a impugnação da matéria de facto apresentada pela recorrente.
2.3. Da reapreciação do mérito da decisão de direito
Atenta a parcial procedência da impugnação da decisão sobre a matéria de facto deduzida pela apelante/ré, os factos a considerar na apreciação da questão de direito são os que se mostram enunciados em 1.1., supra, com as seguintes alterações:
- Alteração da redação do ponto 8., dos factos provados, que passa a ter a seguinte redação: 8. «O A. começou a utilizar a salamandra em novembro de 2019 e algum tempo após, em meados de janeiro de 2020, verificou que da sua utilização resultava fuga de fumo, tendo a habitação do autor ficado com várias manchas negras, nomeadamente no teto, nas paredes e nos cortinados»;
- Eliminação do facto contido no ponto 18., dos factos provados, que passa a integrar os factos não provados.
Cumpre, então, verificar se a solução de direito dada ao caso sub judice é a adequada tendo por base a matéria de facto agora definitivamente dada por assente.
A sentença recorrida considerou - e bem - que, estando em causa a compra e venda com instalação de uma salamandra, alegadamente defeituosa, sendo o autor uma pessoa singular e o bem adquirido destinado ao seu uso pessoal, na casa onde reside (consumidor), enquanto o alienante (vendedora), ora 1.ª ré/recorrente, vendeu os bens no âmbito do comércio a que se dedica, mostra-se concretamente aplicável o regime jurídico da venda de bens de consumo, previsto no Dec. Lei n.º 67/2003, de 08-04, na redação introduzida pelo Dec. Lei n.º 84/2008, em vigor à data da celebração do contrato em causa nos presentes autos (01-08-2019) - cf. o artigo 53.º, n.º1 do Dec. Lei n.º 84/2021, de 18-10.
 A salamandra, por seu turno, na medida em que é um bem móvel corpóreo adquirido por consumidor a profissional, qualifica-se, à luz do diploma, como bem de consumo, nos termos do artigo 1.º-B, al. b) do Dec. Lei n.º 67/2003, de 08-04.
O Dec. Lei n.º 67/2003, de 08-04, procedeu à transposição para o ordenamento jurídico português da Diretiva n.º 1999/44/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25-05, elencando os direitos atribuídos ao consumidor em caso de falta de conformidade do bem com o contrato - reparação ou substituição da coisa vendida, redução do preço ou resolução do contrato (artigo 4.º, n.º 1) -, prevendo ainda um prazo de garantia - dois anos a contar da entrega do bem, no caso de bem móvel (artigo 5.º, n.º 1), o qual pode ser reduzido a um ano, por acordo das partes e tratando-se de coisa móvel usada - e sujeita o exercício dos direitos do consumidor a prazos de caducidade.
 Nestes termos, ao contrato de compra e venda em análise é aplicável, em primeira linha, o regime jurídico da venda de bens de consumo, previsto no Dec. Lei n.º 67/2003,  de 8-04, em conjugação com a Lei n.º 24/96 de 31-07 (Lei de Defesa do Consumidor) e só subsidiariamente as regras previstas no Código Civil para o mesmo tipo contratual[32].
O artigo 2.º, n.º 1, do citado diploma, com a epígrafe «Conformidade com o contrato», estabelece que o vendedor tem o dever de entregar ao consumidor bens que sejam conformes com o contrato de compra e venda, presumindo o n.º 2 do mesmo preceito, que os bens de consumo não são conformes com o contrato se se verificar algum dos seguintes factos:
a) Não serem conformes com a descrição que deles é feita pelo vendedor ou não possuírem as qualidades do bem que o vendedor tenha apresentado ao consumidor como amostra ou modelo;
b) Não serem adequados ao uso específico para o qual o consumidor os destine e do qual tenha informado o vendedor quando celebrou o contrato e que o mesmo tenha aceitado;
c) Não serem adequados às utilizações habitualmente dadas aos bens do mesmo tipo;
d) Não apresentarem as qualidades e o desempenho habituais nos bens do mesmo tipo e que o consumidor pode razoavelmente esperar, atendendo à natureza do bem e, eventualmente, às declarações públicas sobre as suas características concretas feitas pelo vendedor, pelo produtor ou pelo seu representante, nomeadamente na publicidade ou na rotulagem.
De salientar que, de acordo com o disposto no artigo 3.º do Dec. Lei n.º 67/03 de 8-04, o vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue (n.º 1), sendo que as faltas de conformidade que se manifestem num prazo de dois ou de cinco anos a contar da data de entrega de coisa móvel corpórea ou de coisa imóvel, respetivamente, presumem-se existentes já nessa data, salvo quando tal for incompatível com a natureza da coisa ou com as características da falta de conformidade (n.º 2).

Por seu turno, o artigo 4.º do Dec. Lei n.º 67/03 de 8-04, com a epígrafe Direitos do consumidor, prevê o seguinte:

1 - Em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato.
2 - Tratando-se de um bem imóvel, a reparação ou a substituição devem ser realizadas dentro de um prazo razoável, tendo em conta a natureza do defeito, e tratando-se de um bem móvel, num prazo máximo de 30 dias, em ambos os casos sem grave inconveniente para o consumidor.
3 - A expressão «sem encargos», utilizada no n.º 1, reporta-se às despesas necessárias para repor o bem em conformidade com o contrato, incluindo, designadamente, as despesas de transporte, de mão-de-obra e material.
4 - Os direitos de resolução do contrato e de redução do preço podem ser exercidos mesmo que a coisa tenha perecido ou se tenha deteriorado por motivo não imputável ao comprador.
5 - O consumidor pode exercer qualquer dos direitos referidos nos números anteriores, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais.
6 - Os direitos atribuídos pelo presente artigo transmitem-se a terceiro adquirente do bem.

Tal como se refere no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12-09-2017[33], «[n]o regime geral da venda de coisas defeituosas, os direitos a exercer pelo comprador não surgem como alternativos, mas subordinados, em razão do que normalmente se designa por um princípio de eticização da escolha, decorrente do princípio da boa-fé (…).
Porém, no regime especial sob análise, com evidentes objectivos de alargamento da tutela dos interesses do consumidor/comprador, é expressamente prevista a alternatividade da escolha, sem prejuízo da salvaguarda de um grau suficiente de tal “eticização” pela omnipresença do princípio da boa-fé, bem como do regime do abuso de direito».
Ademais, o consumidor tem ainda direito à indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos, nos termos previstos no artigo 12.º, n. º1 da Lei n.º 24/96 de 31-07.
 No caso, importa ainda considerar que, nos termos do disposto no artigo 2.º, n.º 4 do Dec. Lei n.º 67/03 de 8-04, a falta de conformidade resultante de má instalação do bem de consumo é equiparada a uma falta de conformidade do bem, quando a instalação fizer parte do contrato de compra e venda e tiver sido efetuada pelo vendedor.
No caso vertente, as patologias evidenciadas nos pontos 8., e 33., dos factos provados enquadram-se indiscutivelmente no conceito de vício, tal como previsto no artigo 913.º do CC, posto que impedem a realização do fim normal a que a utilização da salamandra é destinada, configurando, além do mais, um caso de desconformidade do bem em causa, nos termos e para os efeitos do preceituado no artigo 2.º do Dec. Lei n.º 67/03 de 8/04, uma vez que o preço de aquisição incluía a respetiva instalação, a cargo da 1.ª ré, aqui recorrente, e resultou devidamente provado que a fuga de fumo referida em 8) teve origem no sistema de instalação da salamandra efetuado pela 1.ª ré, sendo certo que se manifestaram no decurso do prazo de garantia de dois anos a contar da sua entrega/instalação (artigo 5.º, n.º 1 do Dec. Lei n.º 67/03 de 8-04).
Acresce que a ré não demonstrou que a fuga de fumos verificada durante a utilização da salamandra tivesse resultado do seu uso intenso e/ou da falta de manutenção e limpeza da mesma, não obstante as circunstâncias elencadas nos pontos 26., a 29., dos factos provados, não sendo tais circunstâncias suscetíveis de afastar a sua culpa na verificação das enunciadas desconformidades, a qual se presume, nos termos do artigo 799.º, n.º 1 do CC.
Aliás, conforme vem sendo amplamente entendido na jurisprudência dos Tribunais Superiores, «ao comprador basta fazer a prova do mau funcionamento da coisa no período de duração da garantia, sem necessidade de identificar ou individualizar a causa concreta impeditiva do resultado prometido e assegurado nem de provar a sua existência no momento da entrega; ao vendedor que queira ilibar-se da responsabilidade é que cabe a prova de que a causa concreta do mau funcionamento é posterior à entrega da coisa, ilidindo assim a presunção da anterioridade ou contemporaneidade do defeito que caracteriza a garantia convencional, imputável ao comprador, a terceiro ou devida a causa fortuita»[34] .
Tal como salienta o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03-04-2003[35], «[d]a garantia de bom funcionamento resulta, por isso, uma presunção ilidível de que o vício ou defeito que a coisa venha a revelar após a entrega já existia a essa data.
Tudo isto tem importantes reflexos na questão do ónus da prova, já que, para o exercício dos direitos cobertos pela garantia, o cliente (comprador) só terá de alegar e provar o mau funcionamento da coisa, durante o prazo da garantia, sem necessidade de alegar e provar a específica causa do mau funcionamento e a sua existência à data da entrega».
Por conseguinte, a aqui ré/recorrente está efetivamente obrigada a proceder à reparação da instalação da salamandra, com substituição dos tubos ou mudança de local, a expensas suas, como já explicitado em 2.1., supra.
Cumpre, porém, analisar se está verificada a caducidade do direito do autor, tal como pretende a recorrente, ao sustentar que o recorrido excedeu o prazo de dois meses para a denúncia dos defeitos, previsto no artigo 5.º-A, n.º 2 do Dec. Lei n.º 67/03 de 8-04.
Com relevo para a apreciação da questão suscitada verifica-se que a decisão recorrida julgou improcedente a referida exceção por considerar que incumbia às rés provar que a denúncia dos defeitos foi efetuada após o prazo de 2 (dois) meses a contar do seu conhecimento, o que não lograram fazer, na medida em que resultou provado que a denúncia dos defeitos foi efetuada dentro do prazo de dois meses a contar do conhecimento da falta de conformidade.
Como se viu, no caso é aplicável o disposto nos artigos 5.º e 5.º-A do Dec. Lei n.º 67/03 de 8-04, dos quais resulta que os direitos conferidos ao consumidor pelo referido regime especial, em caso de desconformidade de bem móvel, estão dependentes da denúncia da falta de conformidade, a efetuar no prazo de dois meses a contar da data em que a tenha detetado (artigo 5.º-A, n.º 2), e ao prazo de garantia de dois anos (artigo 5.º, n. º1). Já no que concerne ao prazo para o exercício judicial do direito verifica-se que os respetivos direitos caducam decorridos dois anos, a contar da denúncia (artigo 5.º-A, n.º 3).
Sobre esta matéria cabia ao autor (consumidor) a prova do defeito de funcionamento da coisa (da falta de conformidade) - facto base da presunção -, por se tratar de facto constitutivo do seu direito, nos termos do artigo 342.º, n. º1 do CC - sem que sobre si impenda o ónus de alegar e provar a causa concreta da origem do mau funcionamento e a sua existência à data da entrega. Por seu turno, à ré/vendedora cabe alegar e provar que o alegado direito do autor foi denunciado e/ou exercitado para além dos prazos previstos nos artigos 5.º e 5.º-A do DL n.º 67/03 de 8-04[36], nos termos do artigo 342.º, n.º 2 do CC.
No caso, a ré não logrou demonstrar que o autor/comprador não denunciou a falta de conformidade no prazo de dois meses, a contar da data em que a detetou, antes resultando dos autos que o autor apenas verificou que da utilização da salamandra resultava fuga de fumo, tendo a habitação do autor ficado com várias manchas negras, nomeadamente no teto, nas paredes e nos cortinados, em meados de janeiro de 2020 - ponto 8 dos factos provados - razão pela qual a denúncia foi tempestiva (cf. o ponto 19 dos factos provados).
Improcede, assim, a exceção de caducidade invocada pela ré.
Passando agora aos pedidos indemnizatórios formulados, o Tribunal recorrido condenou a 1.ª ré, aqui recorrente, a pagar ao autor a quantia de 5.578,00€, a título de danos patrimoniais, uma vez provado que a habitação do autor ficou com várias manchas negras, nomeadamente no teto, nas paredes e nos cortinados, bem como que o autor terá de despender a quantia de 5.578,00€ para limpeza e pintura de tetos e paredes - cf. os pontos 8., e 17., dos factos provados.
Quanto a esta questão, resulta manifesto que a solução que a recorrente defende para o litígio assenta exclusivamente no peticionado aditamento à matéria não provada dos factos elencados nos aludidos pontos 8., e 17., dos factos provados, o que não se verificou, devendo, por isso, confirmar-se o decidido na sentença recorrida quanto à procedência da pretensão de ressarcimento desses danos ou prejuízos, formulada pelo autor/recorrido, por resultarem da má instalação do bem de consumo, a qual é equiparada a uma falta de conformidade do bem, nos termos e para os efeitos previstos no art.º 2.º, n.º 4 do Dec. Lei n.º 67/03 de 8-04, e art.º 12.º, n. º1 da Lei n.º 24/96 de 31-07, tal como concluiu a sentença recorrida.
Assim, a indemnização fixada no montante de 5.578,00€ revela-se adequada para compensar o autor pelos danos patrimoniais sofridos, improcedendo, nesta parte, a apelação.
O autor peticionou o pagamento da quantia de 2.500,00€ a título de indemnização por danos morais.
A sentença recorrida apreciou este pedido indemnizatório, entendendo que perante a factualidade vertida nos autos a situação do autor merecia a tutela do direito, julgando adequado condenar a ré a indemnizar o autor no valor de 1.500,00€.
O artigo 496.º, n.º 1 do CC prevê que na fixação da indemnização se atenda aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Trata-se de indemnização que visa compensar o lesado pela dor ou sofrimento, de ordem física ou psicológica, ou outras consequências de natureza não patrimonial, através do recebimento de uma quantia pecuniária que possa mitigar os efeitos do ato lesivo. Deste modo, «ante a imaterialidade dos interesses em jogo, a indemnização dos danos não patrimoniais não pode ter por escopo a sua reparação económica. Visa sim, por um lado, compensar o lesado pelo dano sofrido, em termos de lhes proporcionar uma quantia pecuniária que permita satisfazer interesses que apaguem ou atenuem o sofrimento causado pela lesão; e, por outro lado, servir para sancionar a conduta do agente»[37].
Tal como referem Pires de Lima e Antunes Varela[38], «o Código Civil aceitou, em termos gerais, a tese da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais, embora limitando-a àqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos», cabendo assim ao tribunal, em cada caso, dizer se o dano é ou não merecedor da tutela jurídica.
A este propósito os Autores antes citados enunciam ainda algumas situações possivelmente relevantes, como a dor física, a dor psíquica resultante de deformações sofridas, a ofensa à honra ou reputação do indivíduo ou à sua liberdade pessoal, o desgosto pelo atraso na conclusão dum curso ou duma carreira, sublinhando ainda a propósito, que os simples incómodos ou contrariedades não justificam a indemnização por danos não patrimoniais, citando para o efeito vários acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça.
Neste enquadramento, «a gravidade do dano afere-se, no entendimento da jurisprudência e da doutrina, segundo critérios objetivos - de acordo com um padrão de valorações ético-culturais aceite numa determinada comunidade, num certo momento histórico, e tendo em conta o circunstancialismo do caso - e não de harmonia com perceções subjetivas ou de uma particular sensibilidade do lesado (…). O recurso a um critério objetivo na apreciação da gravidade do dano justifica-se para negar as pretensões ressarcitórias por meros incómodos, contrariedades ou prejuízos insignificantes, que cabe a cada um suportar na vida em sociedade, evitando-se, deste modo, uma extensão ilimitada da responsabilidade. (…) Apelando aos critérios supra referidos, a jurisprudência tem considerado que os meros incómodos ou as simples contrariedades não são indemnizáveis (…)»[39].
Densificando os critérios legais aplicáveis, em termos que entendemos de sufragar, refere-se no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10-01-2022[40]: «um dano considerável é aquele que, no mínimo, espelha a intensidade de uma dor, angústia, desgosto, um sofrimento moral que, segundo as regras da experiência e do bom senso, se tornam inexigíveis em termos de resignação».
Por outro lado, atualmente a doutrina e jurisprudência dominantes acolhem um princípio favorável à compensação do dano não patrimonial na responsabilidade contratual, a aplicar com certa prudência e segundo uma específica valoração do dano contratual: deve ser balizado por critérios de adequação e previsibilidade do dano para o devedor[41].
Para tanto impõe-se que, para além da verificação dos demais requisitos da obrigação de indemnizar, se demonstre que os danos são objetivamente graves[42].
Revertendo ao caso dos autos, julgamos que os factos dados como provados não são suficientes para permitir reconhecer a existência de danos diretos, de cariz não patrimonial, com gravidade suficiente para merecerem a tutela do direito.
Assim, entendemos que dos factos dados como provados não resultam evidenciadas consequências que a conduta da ré tenha produzido sobre a integridade física e/ou psicológica do autor e que sejam suscetíveis de ressarcimento autónomo, sendo evidente que o quadro factual antes enunciado apenas permite consubstanciar a produção de incómodos, aborrecimentos, inquietações ou contrariedades cuja gravidade e consequências restaram indemonstradas.
Termos em que a pretensão indemnizatória formulada pelo autor a título de indemnização por danos não patrimoniais terá que improceder, com a consequente revogação da sentença recorrida nesta parte.
Por último, defende a recorrente que os factos provados sob os n.ºs 7, 20, 21, 22, 23, 25, 26, 27, 28, 29 e 30 dos autos são demonstrativos da utilização intensiva, em termos horas e de número de acendimentos, e completamente negligente, com total desprezo das tarefas mais básicas de limpeza e manutenção, das indicações dadas por técnicos e dos avisos/alarmes apresentados pela salamandra por mais do que uma ocasião, a que o recorrido votou a salamandra desde o início da sua utilização, pelo que a conduta do recorrido/autor, mediante a utilização continuada, em tais termos, de uma salamandra que reputava de defeituosa, para vir posteriormente exigir a reparação da danos (pretensamente) decorrentes desse uso, ofende de forma manifesta e grosseira, os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes e pelo fim social ou económico dos direitos por si invocados, constituindo abuso do direito na modalidade de venire contra factum proprium.
Como já vimos, o Tribunal a quo entendeu que não foi a falta de manutenção e limpeza da salamandra que originou a fuga de fumos, como a 1.ª ré defende, assim não determinando as consequências invocadas por esta em face do alegado uso indevido pelo autor da salamandra em causa nos autos, julgando não verificado o invocado abuso do direito.
O artigo 334.º do CC com a epígrafe «Abuso do direito» dispõe que é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.
Tal como decorre do citado preceito legal, a verificação do abuso do direito pressupõe o exercício anormal, excessivo ou ilegítimo dos poderes inerentes a determinado direito.
Deste modo, para que o exercício do direito seja abusivo, é preciso que o titular, observando embora a estrutura formal do poder que a lei lhe confere, exceda manifestamente os limites que lhe cumpre observar, em função dos interesses que legitimam a concessão desse poder. Em qualquer caso, para que haja lugar ao abuso do direito, é necessária a existência de uma contradição entre o modo ou o fim com que o titular exerce o direito e o interesse ou interesses a que o poder nele consubstanciado se encontra adstrito[43].
Neste domínio, há que atender de modo especial às conceções ético-jurídicas dominantes na coletividade para determinar os limites impostos pela boa-fé e pelos bons costumes[44].
Tal como esclarece Luís A. Carvalho Fernandes[45], a propósito do citado artigo 334.º do CC, «[o] preceito  identifica como abusivo o exercício de um direito com manifesto excesso dos limites que assim lhe são impostos. Esta nota, que, num exame preliminar, parece conduzir o abuso a uma figura unitária, não tem, porém, esse significado, porquanto das diferentes fontes desses limites resultam múltiplas e diversas situações de exercício abusivo, que não é possível reduzir a uma única categoria dogmática, pelo que respeita às suas modalidades e às suas consequências».
Daí que o citado autor proceda de forma autónoma à identificação dos modos de exercício que são sancionados como abusivos, por referência a cada um dos limites nele elencados[46], salientando, no que ao caso releva: «[a] ideia geral que preside ao tipo venire contra factum proprium é a da proibição de comportamentos contraditórios que, no plano do exercício do direito, considera inadmissível uma actuação contrária a outra antes assumida pelo seu titular.
Os comportamentos em presença podem ser - e, em regra, são -, em si mesmos lícitos, mas o anteriormente adoptado e que se contraria verificou-se em circunstâncias tais que criam na outra parte a confiança de ele ser mantido e de o titular do direito agir, na sua actuação futura, em conformidade com o seu significado objectivo.
Em geral, a situação de abuso assenta na verificação destes dois elementos; não é, porém, de excluir que ele ocorra também no exercício contraditório sem exigência de confiança».
Como refere António Menezes Cordeiro, o abuso do direito na modalidade de venire contra factum proprium «exprime o exercício de uma posição jurídica em contradição com uma conduta antes assumida ou proclamada pelo agente. A conduta sinuosa é socialmente desprimorosa, pondo em causa a credibilidade do agente e fazendo oscilar a confiança nas relações humanas. O Direito proíbe condutas contraditórias: mas apenas em certas circunstâncias, historicamente reunidas em torno da boa-fé e do abuso do direito»[47].
Ora, em face do regime jurídico da venda de bens de consumo, entendemos que as circunstâncias invocadas pela apelante não permitem configurar em termos objetivos a existência de uma situação de exercício anormal do direito próprio do autor, tanto mais que a denúncia dos defeitos foi efetuada dentro dos prazos previstos nos artigos 5.º e 5.º-A do DL n.º 67/03 de 8-04, sendo certo que também aqui a solução que a recorrente defende para o litígio assenta em pressupostos fácticos complexos, os quais não se mostram suficientemente demonstrados nos autos.
Deste modo, os factos em apreciação não permitem configurar o invocado exercício abusivo ou ilegítimo do direito do autor, enquanto consumidor, em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, improcedendo nesta parte a apelação.

IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a presente apelação e, revogando na mesma medida a sentença recorrida, decidem:
A) revogar a sentença recorrida na parte em que condenou a 1.ª ré no pagamento de uma indemnização ao autor no montante de 1.500,00€ a título de danos não patrimoniais, absolvendo a ré de tal segmento do pedido;
B) Alterar a al. b) do dispositivo da sentença recorrida, o qual se substitui por outra decisão a condenar a ré, EMP01..., Comércio de Móveis e Eletrodomésticos, Lda. a, no prazo de 60 dias a contar do trânsito em julgado da presente sentença proceder à reparação da instalação da salamandra, com substituição dos tubos ou mudança de local, a expensas suas;
C) Confirmar a sentença recorrida no restante.
Custas da ação e da apelação por autora e 1.ª ré, na proporção do decaimento/vencimento, fixando-se ¼ para o autor/recorrente e ¾ para a segunda.

Guimarães, 30 de abril de 2025
(Acórdão assinado digitalmente)

Paulo Reis
(Juiz Desembargador - relator)
Afonso Cabral de Andrade
(Juiz Desembargador - 1.º adjunto)
Carla Maria da Silva Sousa Oliveira
(Juíza Desembargadora - 2.º adjunto)


[1] Cf. Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Coimbra, Almedina, 2018, p. 736.
[2] Cf. o Ac. TRG de 04-10-2018 (relatora: Eugénia Cunha), p. 1716/17.8T8VNF.G1, disponível em www.dgsi.pt.
[3] Cf. o Ac. TRL de 16-05-2024 (relatora: Ana Paula Nunes Duarte Olivença), p. 11769/19.9T8LSB-A. L1-8, disponível em www.dgsi.pt.
[4] Código de Processo Civil Anotado, 2.º Volume, 3.ª edição, Coimbra, Almedina, 2017, p. 737.
[5] Cf. por todos, os acórdãos do STJ de 8-11-2016 (relator: Nuno Cameira) - revista n.º 2192/13.0TVLSB.L1. S1 - 6.ª Secção; de 21-12-2005 (relator: Pereira da Silva), revista n.º 05B2287; ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
[6] Cf. o Ac. do STJ de 6-06-2000 (relator: Ferreira Ramos), revista n.º 00A251, disponível em www.dgsi.pt.
[7] A propósito, cf., por todos, os Acs. do STJ de 29-03-2023 (relator: Mário Belo Morgado) p. 15165/19.0T8LSB.L1. S1; STJ de 08-03-2023 (relator: Ramalho Pinto), p. 5987/19.7T8LSB.L3. S1; ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
[8] Cf. o Ac. do STJ de 6-06-2000 (relator: Ferreira Ramos), revista n.º 00A251, disponível em www.dgsi.pt.
[9] Neste sentido, cf. Alberto dos Reis Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Reimpressão, Coimbra, Coimbra Editora, 1984, p. 140; Antunes Varela, M. Bezerra e S. e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª ed. Coimbra, Coimbra Editora, 1985, p. 687; Lebre de Freitas-Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2.º, 3.ª edição, Coimbra, Almedina, p. 736. Na Jurisprudência cf. por todos, o Ac. STJ de 02-06-2016 (relator: Fernanda Isabel Pereira), proferido na revista n.º 781/11.6TBMTJ.L1. S1 - 7.ª Secção, acessível em www.dgsi.pt.
[10] Cf. Lebre de Freitas-Isabel Alexandre - obra citada - p. 736
[11] Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa - obra citada -, p. 798.
[12] Obra citada, pgs. 714-715.
[13] Cf. o Ac. do STJ de 8-02-2018 (relatora: Maria da Graça Trigo), proferido na revista n.º 33/15.0T8VCT.G1. S1 - 2.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt.
[14] Cf. por todos, o acórdão do STJ de 12-03-2014 (relator: António Leones Dantas) - Revista n.º 177/03.3TTFAR.E1.S1 disponível em www.dgsi.pt citando, a propósito, diversa doutrina e jurisprudência
[15] Cf. o Ac. TRL de 7-05-2009 (relator: Vaz Gomes), p. 125-B/2002.L1-2 disponível em www.dgsi.pt.
[16] Relatora: Rosa Tching, proferido na revista n.º 588/12.3TBPVL.G2. S1 - 2.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt.
[17] Neste sentido, cf., por todos, o Ac. TRP de 07-10-2024 (relatora: Eugénia Cunha), p. 564/12.6TBPVZ.P1, disponível em www.dgsi.pt.
[18] Relator Lopes do Rego, p. 842/10.9TBPNF.P2. S1, disponível em www.dgsi.pt.
[19] Em sentido idêntico, cf., o Ac. TRL de 18-06-2019 (relatora: Higina Castelo), p. 23046/17.5T8SNT.L1-7, disponível em www.dgsi.pt.
[20] Cf. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta, Luís Filipe Pires de Sousa - obra citada - p. 770.
[21] Neste sentido, cf., por todos, os acórdãos do STJ de 09-02-2021 (relatora: Maria João Vaz Tomé), p. 26069/18.3T8PRT.P1. S1; 14-03-2019 (relatora: Maria do Rosário Morgado), p. 8765/16.16.1T8LSB.L1. S2; 13-07-2017 (relator: Fonseca Ramos), p. 442/15.7T8PVZ.P1. S1; 17-05-2017 (relatora: Fernanda Isabel Pereira), p. 4111/13.4TBBRG.G1. S1; disponíveis em www.dgsi.pt.
[22] Cf., o ac. do STJ de 24-05-2022 (relator: Tibério Nunes da Silva), p. 1610/20.5T8STR.E1. S1 disponível em www.dgsi.pt.
[23] Relator Gregório Silva Jesus, p. 422/2001.L1. S1 - 1.ª Secção - com o sumário disponível em www.stj.pt.
[24] Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª edição, Coimbra, Almedina, 2018, p. 115.
[25] Obra citada, pgs. 767-768.
[26] Obra citada, p. 290.
[27] Neste sentido, cf. por todos, o Ac. TRG de 30-11-2017 (relator: António Barroca Penha) p. 1426/15.0T8BGC-A. G1, disponível em www.dgsi.pt.
[28]   Cf. Luís Filipe Pires de Sousa, Prova Testemunhal, Coimbra, Almedina, 2016 - Reimpressão -, p. 373.
[29] Obra citada -, p. 373.
[30] Obra citada, p. 598 - nota 10.
[31] Cf. José Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, 4.ª edição, Coimbra, Gestlegal, 2017, pgs. 734 e 735.
[32] Cf., por todos, o Ac. do TRG de 13-05-2021 (relatora: Maria Cristina Cerdeira), p. 2927/18.4T8VCT.G1, disponível em www.dgsi.pt.
[33] Relator Rui Moreira, p. 3922/12.2TBVLG.P1, disponível em www.dgsi.pt.
[34] Cf., o Ac. do STJ de 02-03-2010 (Relator: Urbano Dias), p. 323/05.2TBTBU.C1. S1; em idêntico sentido, cf. o Ac. do STJ de 26-04-2012 (Relator: Serra Baptista), p. 1386/06.9TBLRA.C1. S1; Ac. TRP de 08-03-2019 (relator: José Igreja Matos), acessíveis em www.dgsi.pt.
[35] Relator Quirino Soares, p. 03B809, disponível em www.dgsi.pt.
[36]  Neste sentido cf. por todos, os Acs. do TRP de 24-01-2022 (relatora: Eugénia Cunha), p. 271/20.6T8MLD.P1; TRC de 10-12-2020 (relator: Emídio Santos), p. 231/19.0T8MBR.C1; TRG de 12-10-2017 (relatora: Maria de Fátima Almeida Andrade), p. 4001/15.6T8VCT.G1; do TRC de 13-09-2016 (relator: Moreira do Carmo) p. 59/15.6T8OLR.C1; do TRG de 27-03-2012 (relator: Fernando Freitas), p. 98/10.3TBAMR.G1; disponíveis em www.dgsi.pt.
[37] Cf. o Ac. do STJ de 13-07-2017 (relator: Manuel Tomé Soares Gomes), p. n.º 3214/11.4TBVIS.C1. S1 - 2.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt.
[38] Cf. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 1987, pg. 499.
[39] Cf. Gabriela Páris Fernandes, Comentário ao Código Civil, Direito das Obrigações - Das Obrigações em Geral - Coord. José Brandão Proença, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2021 - p. 359.
[40] Relator Miguel Baldaia de Morais, p. 8064/18.4T8SNT.P2, disponível em www.dgsi.pt.
[41] Cf. Gabriela Páris Fernandes - Obra citada -, p. 357.
[42] Cf., por todos, o acórdão TRE de 04-11-2004 (relator: Bernardo Domingos), p. 1873/04-22, disponível em www.dgsi.pt.
[43] Cf. Antunes Varela, Das Obrigações em geral, vol. I, 6.ª edição, Coimbra, Almedina, 1989, pgs. 515-516.
[44] Cf., Pires de Lima e Antunes Varela - Obra citada - p. 299.
[45] Cf. Luís A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil II, Fontes, Conteúdo e Garantia da Relação Jurídica, 5.ª edição - revista e actualizada, Lisboa, 2017, Universidade Católica Editora, p. 624.
[46] Obra Citada, p. 628.
[47] Cf., António Menezes Cordeiro, Código Civil Comentado, I - Parte Geral, Coordenação António Menezes Cordeiro, CIDP, Almedina, 2020, p. 933.