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PROPRIEDADE HORIZONTAL
DELIBERAÇÃO
ANULAÇÃO
POSSE
INVERSÃO DE TÍTULO
Sumário
Sumário (artº 663º nº 7 do CPC) 1-A posse é o poder de facto exercido sobre uma coisa, mas, para além desse poder de facto, exige-se, para que exista posse, a intenção de domínio em sentido amplo; isto é, além do corpus, a posse implica um animus possidendi. 2- A aquisição originária da posse é aquela em que a posse do adquirente surge ex-novo na esfera da disponibilidade empírica desse sujeito porque não depende, geneticamente, de uma posse anterior; depende apenas do facto aquisitivo que integra, necessariamente, o corpus e o animus. 3- Uma das formas de aquisição originária da posse é a inversão do título de posse, previsto nos artºs 1263, al. d) e 1265º do CC. 4- A inversão do título de posse consiste na conversão de uma mera detenção em posse por acto do próprio detentor: alguém que exerce poderes de facto sobre a coisa com simples animus detinendi (detentor ou possuidor precário) converte a sua detenção em verdadeira posse, passando a agir com animus possidendi ou verdadeiro animus. 5-A inversão do título da posse, nos termos do artº 1265º pode dar-se por uma de duas vias: (i) oposição do detentor ao possuidor; (ii) ou acto de terceiro. 6- A oposição do detentor ao possuidor tem de assumir um carácter inequívoco de arrogação de uma posição real mais densa do que aquela que vinha assumindo, devendo consistir numa oposição séria e traduzindo um propósito inequívoco de a fazer valer. 7- Sendo explicita, exige-se que a oposição seja levada ao conhecimento do possuidor de quem se pretende retirar a posse.
Texto Integral
Acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:
1-BB, entretanto falecido e substituído pela herdeira habilitada, AA, instaurou acção declarativa, com processo comum, contra:
1º-Condomínio do Prédio sito na ..., nºs... e...-A, representado pelo seu administrador;
2º-Bimovipre- Sociedade de Gestão de Imóveis, SA;
3º-Monte Estalo, Sociedade de Gestão de imóveis, SA;
4º-Bestisafil, Sociedade de Gestão de imóveis, SA;
5º-Junqueiragest, Sociedade de Gestão de Imóveis, SA;
6º- Sernetoimob, Sociedade de Gestão de imóveis, SA;
7º- Gestifalder, Sociedade de Gestão de imóveis, SA;
8º-Quinta das Necessidades Empreendimentos, Sociedade Gestora de Imóveis, SA; Pedindo:
- Seja declarada a nulidade da deliberação tomada na assembleia do condomínio datada de 17 de Maio de 2018, que determinou a aprovação de um “regulamento para utilização da cave e seus espaços de estacionamento”; e:
A) Condenado o Condomínio (1º Réu) a realizar as alterações necessárias no piso das garagens do prédio tendo em vista a restituição à situação existente antes da tomada da deliberação nula:
i)- proceder à remarcação dos 7 lugares de garagem (AC, AD, AF, AE, AH e AI) atribuídos nos termos do título constitutivo de propriedade horizontal, de uso exclusivo, respectivamente, às seguintes fracções: fracção O (8º Dto), fracção G (4ºDto), fracção X (12º Dto, fracção Q (9º Dto), fracção P (8º Esqº), fracção U (11º Dto) e fracção S (10º Dto), eliminando os novos lugares marcados;
ii)- reparar as coretes de modo a que as mesmas sejam restituídas à sua condição anterior às alterações decorrentes da deliberação nula;
B) Condenar os condóminos a quem estejam (ou venham a ser) atribuídos os três novos lugares de garagem (actualmente JunqueiraGest, Soc. De Gestão de Imóveis, SA; Sernetoimob – Soc. Gestão de Imóveis, SA; Monte Estalo, Soc. Gestão de Imóveis, SA a absterem-se de utilizar os lugares que lhes foram atribuídos pela deliberação nula datada de 17.5.2018, ou qualquer outra decisão que lhe suceda e tenha na sua génese a deliberação posta em crise nesta acção;
C) Condenar os condóminos indicados no número anterior a uma sanção pecuniária compulsória por cada infracção diária cometida, no valor unitário de Euros 150 (cento e cinquenta euros), nos termos do artigo 829-A do Código Civil.
Alegou, em síntese, ser proprietário de uma fracção autónoma, que identifica, sito no prédio em propriedade horizontal e, os réus são proprietários de diversas fracções autónomas, que identifica. Em 2012, houve alteração do título de propriedade horizontal, dele passando a constar “Após alterações efectuadas nas partes comuns do prédio, foi eliminada a casa da porteira e um estacionamento de automóveis comum na cave para 7 lugares (…). Em substituição do estacionamento de automóveis comuns na cave para 7 lugares, ficam a fazer parte do uso exclusivo sete garagens denominadas AC, AD, AF, AE, AH e AI para uso exclusivo do 8º direito (fracção O), 4º diteito (fracção G), 12º direito (fracção X), 9º direito (fracção Q), 8º esquerdo (fracção P), 11º direito (fracção U) e 10º direito (fracção S) respectivamente”.
No dia 17 de Maio de 2018 a assembleia geral do condomínio deliberou o seguinte:
“ (…) 7º ponto da ordem de trabalhos: foi distribuído e apresentado pelo senhor CC uma proposta de Regulamento para a utilização da cave e seus espaços de estacionamento do prédio sito na ..., nº..., em Lisboa, a qual contemplava os seguintes pontos:
1. A cave do prédio sito na ..., nº..., em Lisboa, conta com 10 lugares de estacionamento, os quais se encontram assinalados na planta anexa ao presente regulamento, identificados com os números 1 a 10.
2. Os 7 (sete) lugares de estacionamento que se encontram atribuídos são os seguintes:
- fração “O” (8º D) – Lugar 2;
- fração “G” (4º D) – Lugar 1;
- fração “X” (12º D) – Lugar 6;
- fração “Q” (9º D) – Lugar 4;
- fração “P” (8º E) – Lugar 8;
- fração “U” (11º D) – Lugar 9;
- fração “S” (8º D) – Lugar 7;
3. Aos três proprietários detentores actualmente das maiores permilagens na totalidade do prédio, Junqueiragest, Sernetoimob e Monte Estalo, serão atribuídos um lugar adicional de estacionamento a cada, sendo tais lugares os nº 3, nº 5 e 10, respectivamente.
4. Por cada um dos lugares extras referidos no número anterior os respectivos utilizadores pagarão ao condomínio a quantia de Eur.30 (trinta euros) por mês.
5. Caso algum dos proprietários identificados em 3 proceder à transmissão de alguma das frações, será necessário proceder ao recálculo das permilagens totais de cada condómino, de forma a apurar quem são os três que detêm as maiores permilagens, sendo atribuído a cada um destes um lugar adicional de estacionamento. Posteriormente e a todo o momento, os titulares das três maiores permilagens será detentor de um lugar de estacionamento adicional.
6. Serão distribuídos comandos por todas as frações com lugar de estacionamento.
Após análise e discussão da proposta de Regulamento foi decidido acrescer os seguintes pontos aos apresentados:
7. Fica desde já proibido a ocupação de qualquer espaço comum fora das delimitações dos estacionamentos, seja por bicicletas, motos ou qualquer outro objecto.
8. O tamanho das viaturas terá de ser adaptado à delimitação dos lugares de estacionamento, não podendo as mesmas, em caso algum, exceder essas limitações.
9. Independentemente dos lugares de estacionamento atribuídos neste regulamento, fica desde já autorizada a possibilidade dos condóminos poderem permutar entre si os lugares de estacionamento de acordo com as dimensões das suas viaturas.
A proposta de regulamento com as alterações acrescidas foi colocada à votação, tendo sido aprovada por maioria.
Em face da deliberação supra transcrita, a administração considerou-se mandatada para:
1. “Efectuar a marcação dos lugares de acordo com a nova planta, anexa à presente ata e identificada no anexo 1;
2. Alterar as coretes dos pilares de modo a diminuir a sua dimensão;
3. Facultar comandos aos três condóminos que passarão a usufruir do espaço de estacionamento.
A deliberação é nula porque altera o título constitutivo da propriedade horizontal e não houve acordo unânime de todos os condóminos.
Além disso, a criação de mais lugares de garagem tornam quase impossível o estacionamento no lugar de estacionamento exclusivo do autor.
2-Foram citados os réus.
2.1- O réu condomínio, contestou.
Diz, em síntese, que com a deliberação em causa não foi alterado o título constitutivo da propriedade horizontal, mas apenas elaborado regulamento de utilização dos espaços comuns.
Invoca a excepção de caducidade do direito de interpor esta acção, por não ter cumprido os prazos do artº 1433º nº 4 do CC.
Arrolou uma testemunha.
2.2- A ré Monte Estalo, contestou.
Invoca a excepção de caducidade do direito de interpor esta acção, por não ter cumprido os prazos do artº 1433º nº 4 do CC.
Por impugnação, diz que a deliberação sob impugnação mais não fez que dar expressão à realidade prática de utilização dos lugares de estacionamento que vinha sendo feita há mais de 40 anos e que o autor já conhecia antes de ter adquirido a sua fracção autónoma e que o autor mantém o uso exclusivo do respectivo lugar de estacionamento.
Invoca a excepção de abuso de direito.
Invoca a aquisição, por usucapião, dos lugares de estacionamento 3, 5 e 10 pela Junquiragest, Sernetoimob e Monte Estalo.
Conclui pedindo, além do mais, seja determinado que os lugares 3, 5 e 10 estão adquiridos por usucapião; e, a consequente alteração à propriedade horizontal com a inclusão do lugar 10 na fracção da co-ré.
Arrolou testemunhas e requereu a realização de perícia.
2.3- A co-ré Sernetoimob contestou.
Invoca a mesmas questões que foram suscitadas pela co-ré Monte Estalo e deduz as mesmas pretensões que aquela co-ré apresentou.
2.4- As co-rés Bimovipre e Bestisafil contestaram.
Invocam a excepção peremptória de caducidade do direito do autor à anulação da deliberação.
Defendem que a deliberação não altera o título constitutivo da propriedade horizontal mas apenas criou um regulamento de utilização do espaço comum, consagrando uma realidade há muito existente no prédio.
Requereram inspecção judicial ao espaço de estacionamento e arrolaram testemunhas.
2.5- A ré Junqueiragest contestou.
Invoca a excepção peremptória de caducidade do direito do autor à anulação da deliberação.
Defende que a deliberação não altera o título constitutivo da propriedade horizontal mas apenas criou um regulamento de utilização do espaço comum, consagrando uma realidade há muito existente no prédio.
Arrolou testemunhas.
3- O autor veio responder às excepções, pugnando pela improcedência da excepção de caducidade, improcedência da excepção de abuso de direito e improcedência da excepção de usucapião.
4- Com data de 04/12/2021, foi proferido saneador/sentença que julgou a acção procedente.
5- Dessa decisão interpuseram recurso as rés Monte Estalo, Sernetoimob.
6- Por acórdão deste colectivo, de 20/09/2022, foi decidido anular o saneador/sentença e ordenar o prosseguimento do processo.
7- Por decisão de 03/09/2023, foi habilitada como única herdeira do autor, AA.
8- Foi dispensada a realização de audiência prévia e prolatado despacho saneador, em 27/02/2024, que decidiu:
-Julgar improcedente a excepção de caducidade do direito do autor de anulação da deliberação;
Foi enunciado o tema de prova e admitidos os meios de prova.
7- Com data de 22/04/2024 teve lugar a realização da audiência final e, com data de 23/05/2024 foi proferida sentença com o seguinte teor decisório:
“V – Decisão Em face do exposto, vistas as já indicadas normas jurídicas e os princípios expostos, o Tribunal julga a acção procedente, por provada, e declara nula a deliberação tomada na Assembleia de Condóminos do prédio sito na ..., nº... e...º A em Lisboa, de 17.05.2018. Em consequência: a) Condena o 1º réu, Condomínio do Prédio sito na ..., n.º... a n.º...-A, a realizar as alterações necessárias no piso das garagens do prédio tendo em vista a restituição à situação existente antes da tomada da deliberação, a saber: - proceder à remarcação dos 7 lugares de garagem (AC, AD, AF. AE. AH e AI) atribuídos nos termos do título constitutivo de propriedade horizontal, de uso exclusivo, respectivamente, às seguintes fracções: fracção O (8º Dto), fracção G (4ºDto), fracção X (12º Dto, fracção Q (9º Dto), fracção P (8º Esqº), fracção U (11º Dto) e fracção S (10º Dto), eliminando os novos lugares marcados; - a reparar os coretes de modo a que os mesmos sejam restituídos à sua condição anterior às alterações decorrentes da deliberação; b) Condena os 3º, 5º e 6º réus, Monte Estalo, Sociedade de Gestão de Imóveis, S.A., Junqueiragest, Sociedade de Gestão de Imóveis, S.A., e Sernetoimob, Sociedade de Gestão de Imóveis, S.A. a absterem-se de utilizar os lugares que lhes foram atribuídos pela deliberação declarada nula; c) Condena os 3º, 5º e 6º réus, Monte Estalo, Sociedade de Gestão de Imóveis, S.A., Junqueiragest, Sociedade de Gestão de Imóveis, S.A., Sernetoimob, Sociedade de Gestão de Imóveis, S.A. no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada infracção diária cometida, no valor unitário de €150,00 (cento e cinquenta euros), nos termos do artigo 829-A, nº1 do Código Civil.”
8- Inconformadas, as rés Bimovipre, Bestisafil, Monte Estalo e Sernetoimob, interpuseram o presente recurso de apelação, formulando as seguintes CONCLUSÕES:
Primeira - não poderá deixar de se concluir que a testemunha DD, a ter sido fiel à realidade, não pode ter deixado de transmitir devidamente ao A. que os lugares 3, 5 e 7 são usados há mais de 50 anos, o que significa que não deve ser atribuído ao facto nº. 15 toda a relevância que lhe é conferida na sentença.
Segunda - Alegaram as R.R., nomeadamente, que a usucapião está mais que verificada, quer em função da natureza pacífica da posse, prévia à PH (constituição e alteração), quer da sua histórica duração desde sempre.
Terceira - As R.R. alegaram ter a posse pacífica dos lugares em causa desde “sempre”, o que é rigorosamente verdadeiro.
Quarta -Verificou-se a inversão do título da posse (ao contrário do referido na sentença), com todas as inerentes consequências, tendo as R.R. adquirido por usucapião a propriedade sobre os três lugares (3, 5 e 7) ou, caso assim não se entenda, um direito pessoal ou real de gozo sobre os mesmos.
Quinta - Independentemente da natureza do direito que os condóminos atribuem, ou seja, se é um direito pessoal ou real, o certo é que criaram as R.R. desde sempre a confiança e as expectativas de que o uso dos três lugares em causa lhes estava e está exclusivamente
atribuído.
Sexta - Salvo o devido respeito, a Meritíssima Juíza a quo interpretou e aplicou de forma menos correcta nomeadamente o disposto no art. 1419º do Código Civil, que deveria ter sido aplicado da forma supra sustentada.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a Sentença recorrida e substituindo- se a mesma por uma outra nos termos da qual seja a acção julgada totalmente improcedente.
9- A autora habilitada contra-alegou, apresentando as seguintes CONCLUSÕES:
a. Vem o recurso interposto da decisão do Tribunal a quo que julgou a presente ação totalmente procedente, tendo condenado, uma outra vez!, todos os Réus em tudo o quanto foi peticionado pelo Autor, ora Recorrido.
b. Não tendo concordado, apresentaram as Recorrentes supra identificadas as suas alegações de recurso, pelo que cumpre agora ao Recorrido responder às mesmas.
c. As Recorrentes, nas suas palavras, cingem o recurso à matéria da aquisição do direito à utilização dos lugares 3, 5 e 7 por efeito de usucapião.
d. A este respeito, alegaram as RR que a usucapião está mais que verificada,
e. querendo fazer crer que utilizam os três lugares desde sempre,
f. mas, como refere a Douta Sentença, “nada alegaram ou demonstraram que permita concluir no sentido de que utilizaram os lugares com intenção de intenção de possuir a coisa no exercício de um direito próprio, de um direito de propriedade exclusiva.”
g. De resto, note-se que as RR mantêm a sua forma de agir, também no que respeita ao Tribunal,
h. tentando levar a sua pretensão por diante, sob forma, no nosso entender, completamente fantasiosa.
i. Ou seja, a questão que se gera nos presentes autos, comporta o apuramento da existência de fundamento para declarar a nulidade da deliberação tomada na Assembleia de Condóminos.
j. E a resposta é por demais óbvia.
k. Por essa razão, foi a usucapião invocada, em aflição e pela primeiríssima vez, nos presentes autos, como forma de seduzir uma defesa para o indefensável.
l. Tal figura jurídica nunca se havia sequer colocado, nem na Assembleia de Condóminos,
nem em qualquer outro momento.
m. Naturalmente, não se pode dar espaço a uma usucapião imaginária, nunca promovida, apenas conjecturada para ser invocada em hora de conveniência (e que, ainda assim, não seria apta a resolver o pretendido pelas RR).
n. A documentação junta aos Autos é demonstrativa de que os lugares de estacionamento que estão consagrados na PH sempre foram 7 (sete), e nunca 10 (dez).
o. Não é plausível afirmar que a alteração de uma PH não quer colocar em causa a existência e a vivência históricas dos 3 (três) lugares supostamente já existentes, porquanto, se houve uma alteração da mesma que respeitou os requisitos legais, não se vislumbra razão para que estes lugares, existentes desde sempre, segundo as Recorrentes, não versarem nesta alteração, não conseguindo as Recorrentes explicar também o porquê.
p. O que só vem justificar a necessidade de utilização de um regulamento de condomínio, para fazer operar estas mudanças, em virtude da unanimidade exigida para alteração da PH, que sabiam não ser possível conseguir de outra forma.
q. Não obstante ser inegável que o espaço em causa não é compatível com os lugares de estacionamento posteriormente adicionados, tal é uma estrita consequência da deliberação (nula) que foi tomada.
r. E que não poderia deixar de ser invocada, uma vez que é claramente atentatória dos direitos do Recorrido, que vê o seu direito, que está expressamente previsto em título próprio, ser lesado.
s. Pelo que, andou bem o Tribunal a quo ao considerar os devidos factos como provados.
t. Alterações estas que, para além de ilegais, prejudicam o direito exclusivo que o Recorrido tem de aceder ao seu lugar de estacionamento.
u. Dispõe o art. 1419.º do CC, no seu n.º 1 que o título constitutivo da propriedade horizontal pode ser modificado por escritura pública ou por documento particular autenticado, havendo acordo de todos os condóminos.
v. Tal como resulta da ata da assembleia, já junto aos Autos pelo Recorrido com o n.º 28, o mesmo votou contra tal deliberação, o que vem impedir qualquer unanimidade, exigida
legalmente.
w. No título constitutivo da PH está indicada a forma de ocupação dos espaços comuns, designadamente onde os respetivos titulares do direito de uso, podem estacionar as suas viaturas.
x. Através da prova documental carreada para os Autos é consabido que as alterações que disseram respeito à atribuição de lugares de estacionamento, foram sempre precedidas da devida alteração no título da PH.
y. Não pode o condomínio refugiar-se em deliberações da Assembleia que vão diretamente contra o título constitutivo da PH que define a propriedade e compropriedade dos bens e por isso se mostram contaminadas com vícios insanáveis.- art.º 1422.º do CC.
z. Desta forma, apenas podemos concluir pela nulidade da deliberação, por violação da norma imperativa prevista no art. 1419, n.º 1 do CC.
aa. Acompanhando totalmente a decisão do Tribunal a quo, a qual deve ser mantida.
bb. A deliberação de 17/05/2018 criou lugares novos, sendo que tal se denota no n.º 1 do ponto 7 da ordem de trabalhos, documento n.º 28, junto nos Autos pelo Recorrido, segundo o qual A cave do Prédio sito na ..., n.º..., em Lisboa, conta com 10 (dez) lugares de estacionamento, os quais se encontram assinalados na planta anexa ao presente regulamento, identificados com os números 1 a 10.
cc. Este ponto consta do próprio Regulamento apresentado pelo Sr. CC, Regulamento esse que originou a deliberação impugnada, que em nada prova, pelo contrário, que os lugares efetivamente existiam antes.
dd. Claramente não se verificarem os requisitos necessários para que se possa fazer operar
a usucapião invocada.
ee. De acordo com o postulado no art.º 1296.º do CC Não havendo registo do título nem da mera posse, a usucapião só pode dar-se no termo de quinze anos, se a posse for de boa fé, e de vinte anos, se for de má fé.
ff. Tendo sido constituída a PH em 2010 e, posteriormente, alterada, em 2012, não se vislumbra que tenha decorrido o prazo suficiente para que possa vir a ser considerada, sequer, a possibilidade de aquisição por usucapião.
gg. De igual forma, não se verifica qualquer posse da mesma sobre qualquer dos 3 (três) lugares de estacionamento indicados prévia à implementação no terreno das obras de alteração da garagem na sequência da deliberação de 17/05/2018.
hh. Pelo que, não se verificam quaisquer atos materiais de posse que conduzam a uma posse pública e pacífica dos atuais (ou anteriores) lugares 3, 5 e 10 da garagem do prédio em causa; muito menos por tempo suficiente para fazer operar a usucapião (vide arts. 1287.º, 1293.º e ss do CC).
ii. E não podia o Tribunal a quo ter decidido de forma distinta, porquanto as Recorrentes
limitam-se, nas suas contestações, a discorrer sobre jurisprudência, não adiantando factos que demonstrem – pois não existem! – os requisitos necessários para se estar perante a usucapião alegada.
jj. O legislador atribui o ónus da prova dos factos constitutivos do direito a quem o invoca – de acordo com o art.º 342.º, n.º 1 do CC – e, atribui contra quem o direito é alegado, o ónus de provar os factos impeditivos, modificativos e extintivos desse direito - n.º 2 do artigo 342.º do CC.
kk. Assim, o Recorrido acompanha a decisão proferida pelo Tribunal a quo, por ter andando bem e não poder decidir de forma distinta, em função de tudo o quanto foi alegado nos presentes Autos.
ll. Pelo exposto, deve a sentença recorrida ser mantida de forma integral!
*** II-FUNDAMENTAÇÃO. 1-Objecto do Recurso.
1-É sabido que o objecto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC) pelas conclusões (artºs 635º nº 4, 639º nº 1 e 640º do CPC) pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (artº 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (artº 633º CPC) e, ainda pelas questões de conhecimento oficioso cuja apreciação ainda não se mostre precludida.
Assim, em face das conclusões apresentadas pelas recorrentes, é a seguinte a questão que importa analisar e decidir:
- A revogação da sentença, com a consequente improcedência da acção.
*** 2- Matéria de Facto. A 1ª instância decidiu a matéria de facto nos seguintes termos:
-Factos Provados:
1. O Autor é proprietário da fracção autónoma designada pela letra “U”, correspondente a habitação localizada no 11º andar direito do prédio urbano sito na ..., números... e...-A, na freguesia de São Mamede, no concelho e cidade de Lisboa.
2. A 2ª R. é proprietária das fracções “B”, “M”, “N”, e “Z” do prédio sito na ..., números... e...-A, em Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de . Lisboa sob o número ... da freguesia de S. Mamede.
3. A 3ª R. é proprietária das fracções “V”, “Q”, “T” e “R” do mesmo prédio.
4. A 4ª Ré é proprietária da fracção “X” do mesmo prédio.
5. A 5ª Ré é proprietária das fracções “A”, “AA”, “P”, “H”, “I”, “J” do mesmo prédio.
6. A 6ª Ré é proprietária das fracções “K”, ”C”, “D”, “L”, ”S” do mesmo prédio.
7. A 7ª Ré é proprietária das fracções “F” e “O” do mesmo prédio.
8. A 8ª Ré é proprietária das fracções “G”, “E” e “AB” do mesmo prédio.
9. A fracção autónoma propriedade do Autor está descrita na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número ... da freguesia de S. Mamede e afecta ao regime de propriedade horizontal inicialmente nos termos da Ap. ... de 16 de Agosto de 2010.
10. No título constitutivo da propriedade horizontal de 2010 consta:
“um estacionamento de automóveis comum na cave”
11. No dia 10 de Outubro de 2012, o título de propriedade horizontal foi alterado, passando a dele constar que:
“Após alterações efectuadas nas partes comuns do prédio, foi eliminada a casa da porteira e um estacionamento de automóveis comum na cave para 7 lugares (…). Em substituição do estacionamento de automóveis comuns na cave para 7 lugares, ficam a fazer parte do uso exclusivo sete garagens denominadas AC, AD, AF, AE, AG, AH e AI para uso exclusivo do 8º direito (fracção O), 4º direito (fracção G), 12º direito (fracção X), 9º direito (fracção Q), 8º esquerdo (fracção P), 11º direito (fracção U) e 10º direito (fracção S) respectivamente”. * (a referência/aditamento da fracção AG resulta do que consta na certidão do Registo Predial junta aos autos como documento nº 1 e, por manifesto lapso não constar da enumeração das fracções de garagem da sentença).
12. Tal título serviu de base ao registo da alteração, que foi efectuado através da Ap. ... do mesmo dia 10 de Outubro de 2012.
13. No dia 17 de Maio de 2018, a assembleia geral do condomínio deliberou o seguinte: “(…) 7º ponto da ordem de trabalhos: foi distribuído e apresentado pelo senhor CC uma proposta de Regulamento para a utilização da cave e seus espaços de estacionamento do prédio sito na ..., nº..., em Lisboa, a qual contemplava os seguintes pontos:
1. A cave do prédio sito na ..., nº..., em Lisboa, conta com 10 lugares de estacionamento, os quais se encontram assinalados na planta anexa ao presente regulamento, identificados com os números 1 a 10.
2. Os 7 (sete) lugares de estacionamento que se encontram atribuídos são os
seguintes:
- fração “O” (8º D) – Lugar 2;
- fração “G” (4º D) – Lugar 1;
- fração “X” (12º D) – Lugar 6;
- fração “Q” (9º D) – Lugar 4;
- fração “P” (8º E) – Lugar 8;
- fração “U” (11º D) – Lugar 9;
- fração “S” (8º D) – Lugar 7;
3. Aos três proprietários detentores actualmente das maiores permilagens na
totalidade do prédio, Junqueiragest, Sernetoimob e Monte Estalo, serão atribuídos um lugar adicional de estacionamento a cada, sendo tais lugares os nº 3, nº 5 e 10, respectivamente.
4. Por cada um dos lugares extras referidos no número anterior os respectivos utilizadores pagarão ao condomínio a quantia de Eur.30 (trinta euros) por mês.
5. Caso algum dos proprietários identificados em 3 proceder à transmissão de alguma das frações, será necessário proceder ao recálculo das permilagens totais de cada condómino, de forma a apurar quem são os três que detêm as maiores permilagens, sendo atribuído a cada um destes um lugar adicional de estacionamento. Posteriormente e a todo o momento, os titulares das três maiores permilagens será detentor de um lugar de estacionamento adicional.
6. Serão distribuídos comandos por todas as frações com lugar de estacionamento.
Após análise e discussão da proposta de Regulamento foi decidido acrescer os seguintes pontos aos apresentados:
7. Fica desde já proibido a ocupação de qualquer espaço comum fora das delimitações dos estacionamentos, seja por bicicletas, motos ou qualquer outro objecto.
8. O tamanho das viaturas terá de ser adaptado à delimitação dos lugares de estacionamento, não podendo as mesmas, em caso algum, exceder essas limitações.
9. Independentemente dos lugares de estacionamento atribuídos neste regulamento, fica desde já autorizada a possibilidade dos condóminos poderem permutar entre si os lugares de estacionamento de acordo com as dimensões das suas viaturas.
A proposta de regulamento com as alterações acrescidas foi colocada à votação, tendo sido aprovada por maioria, com a seguinte votação:
- Voto contra da fração U, representante de 41%º;
- Abstenção das frações A, H, I, J, O e AA representantes de 211%º;
- Votos favoráveis das restantes frações presentes, representantes de 572%º. (…)”
14. Em face da deliberação supra transcrita, a administração considerou-se mandatada para:
“1. Efectuar a marcação dos lugares de acordo com a nova planta, anexa à presente ata e identificada no anexo 1;
2. Alterar as coretes dos pilares de modo a diminuir a sua dimensão;
3. Facultar comandos aos três condóminos que passarão a usufruir do espaço de estacionamento.”.
15. O Autor comprou a fracção acima identificada porque a mesma incluía o uso exclusivo de um lugar de garagem e porque a utilização da garagem previa apenas a ocupação de 7 lugares.
16. O acesso ao lugar de garagem do autor (n.º 9) é difícil e implica a necessidade de realização de diversas manobras.
17. A criação do lugar de garagem n.º 10 aumenta a dificuldade de realização de tais manobras.
18. O espaço de circulação na zona onde se encontra o lugar n.º 10 tem uma largura de 5,3 metros, de parede a parede.
19. Com a criação do lugar nº 10 estaciona um veículo, o espaço de circulação fica reduzido em cerca de 2,90 metros.
20. O lugar n.º 9 atribuído ao autor tem 4,67 metros de comprimento.
21. O lugar n.º 10 tem 3,68 metros de comprimento.
22. Um automóvel de médio porte, como um Volkswagen Golf, mede de comprimento 4,25 metros.
23. Um Volkswagen Passat tem um comprimento de 4,76 metros.
24. Os lugares n.ºs 3, 5 e 7 são utilizados para estacionamento de veículos pelos condóminos pelo menos desde 1974.
*** 3- A Questão Enunciada: Se há fundamento para revogar a sentença determinando a improcedência da acção.
Antes de entrarmos na apreciação da questão acima enunciada, cumpre salientar duas notas: -Primeira: as apelantes não impugnaram a decisão sobre a matéria de facto, pelo que a questão em análise terá em consideração a factualidade tal como decidida pela 1ª instância, com a correcção acima feita. Segunda: as apelantes restringem, expressamente, o objecto do recurso à pretensão de aquisição, por usucapião, dos lugares de garagem 3, 5 e 7. Assim, o recurso apenas incidirá sobre esta questão.
Vejamos, então, a pretensão das rés.
Entendem as apelantes que em face do facto provado 24, está provada a natureza pacífica da posse, prévia à constituição da propriedade horizontal e à alteração da propriedade horizontal.
Mais sustentam que se verificou a inversão do título da posse e que sempre as rés tiveram a confiança de que o uso dos três lugares de garagem lhes estavam exclusivamente atribuídos.
Ou seja, as rés/apelantes baseiam a sua pretensão de aquisição dos três lugares de garagem, por usucapião, em dois argumentos:
i)- Que em face do ponto 24, ficou provada a posse pacífica (desses lugares) previamente à constituição e modificação da propriedade horizontal;
ii)- Inverteram o título de posse.
Vejamos cada um destes fundamentos.
Assim:
- Da alegada posse pacífica
As rés/apelantes invocam o facto dado como provado no ponto 24, para dele concluírem que se mostra provado que têm a posse pacífica dos três lugares de estacionamento.
Será como dizem?
Recordemos o que ficou provado no ponto 24: “Os lugares n.ºs 3, 5 e 7 são utilizados para estacionamento de veículos pelos condóminos pelo menos desde 1974”.
Poder-se-á retirar, deste facto, que as quatro rés/apelantes, Bimovipre, Bestisafil, Monte Estalo e Sernetoimob, têm a posse desses três lugares de garagem?
A resposta à questão assim colocada passa por perceber em que consiste a posse.
O artº 1252º dá a seguinte noção de posse: “Posse e o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real.”
Em termos simples, seguindo a lição do Sr. Professor Orlando Carvalho (RLJ, ano 122, nº 3781, pág. 104 e seg.) “…no direito português, a posse é o exercício de poderes de facto sobre uma coisa em termos de um direito real (rectius: do direito real correspondente a esse exercício). Envolve, portanto, um elemento empírico – exercício de poderes de facto – e um elemento psicológico jurídico – em termos de um direito real. Ao primeiro é o que se chama corpus e ao segundo animus. O poder de facto é menos um contacto com a coisa do que uma imissão desta na zona de disponibilidade empírica do sujeito. (…) “…a intenção de domínio em sentido amplo não tem de explicitar-se muito por palavras. O que importa é que se infira do próprio modo de actuação ou de utilização (lato sensu). Na dúvida quanto aos termos em que se processa, ao direito em termos do qual se possui (…) deve entender-se que é em termos de propriedade…”.
Quer dizer, a posse é o poder de facto exercido sobre uma coisa, mas, para além desse poder de facto, exige-se, para que exista posse, a intenção de domínio em sentido amplo; isto é, além do corpus, a posse implica um animus possidendi.
Este animus possidendi contrapõe-se ao simples animus detendi, ou mera detenção. O animus possidendi há-de resultar, rectius, ser demonstrado pela actuação do sujeito sobre a coisa, ou seja, que se infira do próprio modo de actuação ou de utilização.
Do animus possidendi distingue-se o animus detinendi, que se carateriza, nos termos do artº 1253º, pelo exercício de um poder de facto sobre a coisa “…sem intenção de agir como beneficiário do direito” (al. a)), ou os que “…aproveitam a tolerância do titular do direito” (al. b); ou “…os que possuem em nome de outrem.” (al. c)).
Ora, no caso em apreço, não se pode retirar do ponto 24 dos factos provados que, as quatro rés/apelantes, Bimovipre, Bestisafil, Monte Estalo e Sernetoimob, têm a posse desses três lugares de garagem.
Na verdade, desse ponto de facto somente se retira que os lugares de garagem em causa, 3, 5 e 7, são utilizados pelos “condóminos” (moradores), pelo menos desde 1974. E percebe-se a lógica do facto: até à constituição da propriedade horizontal, registada pela Ap. 1832 de 2010/08/16, os moradores do prédio (não condóminos) utilizavam a garagem do edifício. Nada se refere, no facto 24, ou em qualquer outro facto, serem as quatro rés, Bimovipre, Bestisafil, Monte Estalo e Sernetoimob, quem utilizava, exclusivamente, os espaços do estacionamento correspondentes aos posteriores lugares 3, 5 e 7. Muito menos se refere, nesse facto, ou em qualquer outro, o animus possidendi destas quatro rés ou doutros moradores, sobre esses três lugares de estacionamento.
Ou seja, destas constatações decorre que as quatro rés não demostram ter a posse, rectius, o corpus e o animus, sobre aqueles três lugares de garagem.
O mesmo é dizer que não pode considerar-se demonstrada a alegada posse pacífica das quatro rés sobre aqueles três lugares de garagem.
Em suma, improcede esta fundamentação das rés/apelantes de pretenderem ter a posse pacífica dos lugares 3, 5 e 7 de estacionamento. - Da Inversão do Título de Posse.
Alegam as rés/apelantes que se verificou a inversão do título da posse e que sempre as rés tiveram a confiança de que o uso dos três lugares de estacionamento lhes estavam exclusivamente atribuídos.
Vejamos então.
Em primeiro lugar, desde já se adianta que não está provado qualquer facto de que resulte a alegada “…confiança de que o uso dos três lugares de estacionamento lhes estavam exclusivamente atribuídos.”.
Sem necessidade de outros considerandos, esta pretensa “atribuição exclusiva dos três lugares de estacionamento” ás quatro rés, fica, digamos, “arrumada”. Quanto à pretendida inversão do título de posse.
Principie-se por referir que a aquisição originária da posse é aquela em que a posse do adquirente surge ex-novo na esfera da disponibilidade empírica do sujeito porque não depende geneticamente de uma posse anterior; depende apenas do facto aquisitivo que integra, necessariamente, o corpus e o animus.
Ora, uma das formas de aquisição originária da posse é, justamente a inversão do título de posse, previsto nos artºs 1263, al. d) e 1265º.
Pois bem, a inversão do título de posse consiste na conversão de uma mera detenção em posse por acto do próprio detentor. Ou seja, “…Alguém que exerce poderes de facto sobre a coisa com simples animus detinendi (detentor ou possuidor precário) converte a sua detenção em verdadeira posse, passando a agir com animus possidendi ou verdadeiro animus.” (Orlando Carvalho, RLJ, nº 3810, pág. 261).
O acto de inversão do título de posse exige a verificação de dois factos ou pressupostos: (i) que o inversor já esteja antes numa situação de detenção, simples tolerância ou acto facultativo; (ii) que passe a agir em termos de um direito real.
A inversão do título da posse, nos termos do artº 1265º pode dar-se por uma de duas vias: (i) oposição do detentor ao possuidor; (ii) ou acto de terceiro.
A oposição do detentor ao possuidor tem de assumir um carácter inequívoco de arrogação de uma posição real mais densa do que aquela que vinha assumindo, devendo consistir numa oposição séria e traduzindo um propósito inequívoco de se fazer valer. Sendo explicita, exige-se que a oposição seja levada ao conhecimento do possuidor de quem se pretende retirar a posse. “Em regra, acompanhará actos que confirmam a sua seriedade, o propósito de se traduzir na prática efectiva da utilização ou disposição empírica da coisa (…) a declaração é que é importante e só ela.” (Orlando Carvalho, RLJ nº 3810, pág. 263). A declaração do inversor tem de ser levada ao conhecimento do possuidor e não apenas para que a posse seja pública, mas para que a própria inversão se verifique e, por conseguinte, se adquira a posse.
Carvalho Fernandes (Lições de Direitos Reais, 4ª edição, pág. 298) salienta “…a inversão exige a oposição do detentor contra aquele em cujo nome possuía, para ter lugar, é necessário que o comportamento exterior do detentor signifique essa alteração do título por que pratica os actos de exercício do direito.”
Importa ainda salientar, com Bonifácio Ramos (Manual de Direitos Reais, 2017, pág. 153 e seg.) que “…a oposição não pode prefigurar um mero autoconvencimento ou vontade, vagamente manifestada no exercício de alguns actos materiais. Nem pode representar uma actuação representativa de uma posição implícita ou indirecta mas, ao invés, deve significar uma actuação que indique ao titular do direito, a mudança de modo inequívoco. Só assim terá lugar a aquisição possessória.” (ainda sobre a questão, veja-se Fernando Pereira Rodrigues, Usucapião – Constituição Originária de Direitos Através da Posse, pág. 53 e seg.).
No caso dos autos, salvo o devido respeito, as rés/apelantes não provaram qualquer factualidade que permita concluir pela alegada inversão do título de posse!
Desde logo, não alegaram nem provaram em que momento concreto, por que meio e perante quem declararam a oposição com animus de retirar a posse a quem a vinha exercendo. E sem a prova destes factos não se pode falar em inversão do título de posse.
Enfim, também este fundamento da pretensão das rés/apelantes de terem adquirido, por usucapião, os três lugares de estacionamento, 3, 5 e 7, não merece provimento.
A esta luz, mantem-se a sentença sob recurso que, salienta-se, se apresenta bem estruturada e fundamentada. Em suma: o recurso improcede.
*** III- DECISÃO.
Em face do exposto, acordam os juízes desembargadores que compõem este colectivo da 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, julgar o recurso improcedente e, por consequência, mantêm a sentença sob impugnação. Custas na instância de recurso, pelas apelantes.
Lisboa, 24/04/2025
Adeodato Brotas
Vera Antunes
Jorge Almeida Esteves