INJUNÇÃO
TÍTULO EXECUTIVO
EXCEPÇÃO DILATÓRIA INOMINADA
INDEFERIMENTO LIMINAR PARCIAL
Sumário

I. - A injunção à qual foi aposta fórmula executória abarcando valor de indemnização de despesas com encargos associados à cobrança da dívida mostra-se afectada de vício que constitui excepção dilatória inominada justificativa do indeferimento parcial liminar da execução;
II. - O conhecimento da excepção inominada de uso indevido do procedimento de injunção é oficioso.

Texto Integral

Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

I – Relatório:
NOS Comunicações S.A., aqui Recorrente, propôs ação executiva contra Numerus Eruditos, Unipessoal, Lda com base em requerimento de injunção ao qual foi aposta formula executória, dando à execução um requerimento de injunção no valor de € 2.912,82 e no qual reclamara: o pagamento de faturas emitidas e que permanecem em divida no montante de € 2.315,28 e a título de indemnização pelos encargos associados à cobrança da dívida o montante de €463,06.
Na sequência de notificação pelo Tribunal a quo, foram juntas aos autos pela exequente as facturas identificadas no requerimento injuntivo e esclarecido que a ultima factura (doc. N.º 10) no montante de € 1.126,77 corresponde ao valor em dívida relativo à cláusula penal, de € 1.126,77 incluído no requerimento injuntivo que fundamenta a execução.
Foi proferida decisão a 06.11.2024 que, ao abrigo do disposto nos artigos 726°. n°. 2 al. a) e 734° do Código de Processo Civil, rejeitou a execução por verificação da exceção dilatória inominada do uso indevido do procedimento de injunção e consequente falta de título executivo.
É a seguinte a fundamentação da decisão que importa convocar:
«Nos termos do disposto no artigo 734.º do CPC, “o juiz pode conhecer oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726.º, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo” (nº1), sendo que, “rejeitada a execução ou não sendo o vício suprido ou a falta corrigida, a execução extingue-se, no todo ou em parte” (nº2).
No caso em apreço, como supra se referiu, o exequente veio dar à execução requerimento de injunção ao qual foi aposta força executiva por secretário de justiça, do qual consta peticionado o pagamento de valores correspondentes, além do mais, a cláusula penal convencionada para a rescisão antecipada do contrato e indemnização pelos encargos associados à cobrança da dívida.
O procedimento de injunção é aplicável às obrigações pecuniárias diretamente emergentes de contratos, sendo certo que tal prestação só pode ter por objeto imperativamente uma obrigação pecuniária, isto é, uma entrega em dinheiro em sentido restrito.
Este regime processual só é aplicável às obrigações pecuniárias diretamente emergentes de contratos, pelo que não tem a virtualidade de servir para a exigência de obrigações pecuniárias resultantes, por exemplo, de responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, de enriquecimento sem causa ou de relações de condomínio.
Nesta medida, a jurisprudência tem concluído, de forma praticamente unânime, no sentido da inadmissibilidade do pedido de pagamento da cláusula penal por incumprimento contratual e/ou de indemnização nesta forma processual.
[ver, neste sentido, Acs. RL 08.10.2015, processo 154495/13.0YIPRT.L1-8; 12.05.2015, processo 154168/13.YIPRT.L1-7; RL 15-10-2015, processo 96198/13.1YIPRT.A.L1-2; RL 17.12.2015, Processo 122528/14.9YIPRT-L1.2; Ac. RL, de 15.10.2015, relatado por Teresa Albuquerque (in www.dgsi.pt); Ac. RL, de 23.11.2021, relatado por Edgar Taborda Lopes, proc.88236/19.0YIPRT.L1-7; Ac. RP, de 15.01.2019, relatado por Rodrigues Pires, proc.141613/14.0YIPRT.P1 (in www.dgsi.pt); acórdão da Relação de Lisboa, de 28.04.2022, relatado por Cristina Pires Lourenço, proc.28046/21.8YIPRT.L1-8 (in www.dgsi.pt), Ac. RC, de 14.03.2023, relatado por Henrique Antunes (in www.dgsi.pt), Acs. RP de 31.05.2010 (Maria de Deus Correia), de 26.09.2005 (Sousa Lameiras); Acs. RL, de 07.06.2011 (Rosário Gonçalves), de 08.11.2007 (Ilídio Sacarrão Martins); Ac. RE, de 16.12.2010, relatado por Mata Ribeiro (in www.dgsi.pt). acórdão da Relação de Lisboa, de 15.02.2018, processo 2825/17.9T8LSB.L1-6; Ac. RL, de 12.07.2018, relatado por Jorge Leal (in www.dgsi.pt); Ac. RP, de 27.09.2022, relatado por Anabela Dias da Silva; Ac. RP, de 08.11.2022, relatado por Alexandra Pelayo (in www.dgsi.pt); Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, datados, ambos, de 18.04.2024 – processo 12308/19.7T8SNT.L1, relatado por Carla Mendes e processo 18156/20.4T8SNT.L1, relatado por Eduardo Petersen Silva; e Ac. RL, de 16.05.2024, relatado por Teresa Sandiães, processo 11350/23.8T8SNT.L1 –, que recaíram sobre decisões proferidas por este Juízo de Execução; Acs. RL, de 10.10.2024, relatados por Eduardo Petersen Silva (processo 4709/23.2T8SNT.L1-6), Maria Tersa F. Mascarenhas Garcia (processo 5820/24.8T8SNT.L1-6), João Paulo Raposo (processo 5765/24.1T8SNT.L1-2), Arlindo Crua (processo 21181/22.7T8SNT.L1-2); de 22.10.2024, relatado por João Bernardo Peral Novais (processo 5533/24.0T8SNT.L1); Decisão de 20.09.2024, proferida por Nuno Gonçalves (processo 5851/23.5T8SNT.L1).]
Com efeito, o procedimento de injunção é regulado pelo Decreto-Lei n.º 269/98, de 1.09, retificado pela Declaração de Rectificação n.º 16-A/98, de 30.09, que aprovou o regime dos procedimentos para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à alçada do tribunal de 1.ª Instância.
As alterações introduzidas, pelo DL n.º107/2005, de 1.07, com a redação que lhe foi conferida pela Declaração de Rectificação n.º 63/2005, de 19.08 e pelo DL n.º303/2007 de 24.08, que veio alterar o âmbito de aplicação do DL n.º 269/98, mantendo o objetivo de descongestionar os tribunais de processos destinados ao cumprimento de obrigações pecuniárias, pois alargou o seu âmbito de aplicação para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a €15.000,00.
O Dec. Lei nº 259/98, de 1/9 foi sucessivamente alterado pelos seguintes diplomas: Dec. Lei 3889, de 23-09; Dec. Lei 183/2000, de 10-08; Dec. Lei 232/2001, de 17-12; Dec. Lei 32/2003, de 12-02; Dec. Lei 38/2003, de 08-03; Dec. Lei 324/2003, de 27-12 ; Dec. Lei 107/2005, de 01-07 ; Lei 14/2006, de 26-04; Dec. Lei 303/2007, de 31-12; Lei 67-A/2007, de 31-12; Dec. Lei 34/2008, de 26-02; Dec. Lei 226/2008, de 20-11; e Lei 117/2019, de 13-09.
Portanto, atualmente a injunção constitui a providência que tem por fim conferir força executiva ao requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a 15.000,00€ ou das obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo DL n.º 32/2003, de 17.02.
Nos termos do artº. 7º do Dec. Lei 269/98, de 1/9, na redação dada pelo Dec. Lei 107/ 2005, de 1/7 “Considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1º. do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo Dec. Lei 32/2003, de 17 de Fevereiro.”
O citado Dec. Lei 32/2003, de 17/2, transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva nº 2000/35/ CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Junho, a qual estabelece medidas de luta contra os atrasos de pagamento nas transações comerciais. (cfrº artº 1º).
O DL 32/2003 foi revogado pelo DL 62/2013 de 10-5 que transpôs a Diretiva nº2011/7/EU que estabelece que o atraso de pagamentos em transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito de recorrer à injunção, independentemente do valor da divida.
Nos termos do artº. 1º do diploma preambular ex vi artº. 7º do Dec. Lei 269/98 de 1/9, esta forma processual só pode ser instaurada tendo por fundamento o incumprimento de obrigações emergentes de transações comerciais ou de obrigações pecuniárias emergentes de contratos.
Dispõe o artº.2º, nº 1 do citado diploma "O presente diploma aplica-se a todos os pagamentos efectuados como remunerações de transacções comerciais."
Por sua vez o artº. 3º , al. a) e b) do mesmo diploma refere: "Para efeitos do presente diploma, entende-se por: "Transacção comercial" qualquer transacção entre empresas ou entre empresas e entidades públicas, qualquer que seja a respectiva natureza, forma ou designação, que origem ao fornecimento de mercadorias ou à prestação de serviços contra uma remuneração; " e por Empresa “qualquer organização que desenvolva uma actividade económica ou profissional autónoma, mesmo que exercida por pessoa singular”
Pelo exposto, a injunção é aplicável:
- A requerimento destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15.000,00 (cf., o citado art. 1º do Diploma Preambular – DL nº 269/98, na redação do art. 6º do DL nº 303/2007, de 24/08 – e os artigos 1º a 5º do anexo ao mesmo Decreto-Lei); e
- A obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo DL nº. 32/2003, de 17/02.
Enquanto o art. 7º, na redação conferida pelo DL nº 107/2005, de 01/07, prescrevia que:
«1- O atraso de pagamento em transacções comerciais, nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito a recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida.
2- Para valores superiores à alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum.
3- Recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes a aperfeiçoar as peças processuais.
4- As acções destinadas a exigir o cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transacções comerciais, nos termos previstos no presente diploma, de valor não superior à alçada da Relação seguem os termos da acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos.»
Entretanto, foi publicado o DL nº 62/2013, de 10/05, prevendo acerca de medidas contra os atrasos no pagamento de transacções comerciais, que, no seu artigo 13º, revogou o DL nº 32/2003, com exceção dos artigos 6º e 8º, mantendo ainda este em vigor «no que respeita aos contratos celebrados antes da entrada em vigor do presente diploma», ou seja, celebrados até 30/06/2013 – cf., o art. 15º.
Na sequência da alteração introduzida pelo artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 107/2005, de 1.07, o n.º 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 32/2003 passou a dispor que “[O] atraso de pagamento em transações comerciais nos termos previstos no presente diploma, confere ao credor o direito a recorrer à injunção, independentemente do valor da dívida”, sendo que, nos termos do seu n.º 2, “Para valores superiores à alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum”, enquanto, de acordo com o seu nº 4, “As ações destinadas a exigir o cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transações comerciais, nos termos previstos no presente diploma, de valor não superior à alçada da Relação seguem os termos da ação declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos”.
Resulta, assim, que, «desde que o art 8º do DL 32/2003 alterou a redacção do art 7º do DL 269/98, o procedimento da injunção passou a ser utilizável no caso do cumprimento das obrigações a que se refere o art 1º do diploma preambular – obrigações pecuniárias emergentes de contrato – e a obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo DL 32/2003 de 17/2, aqui independentemente do valor.
Será, pois, o conceito de obrigação pecuniária em sentido estrito o que está pressuposto nesta forma de processo, de tal modo que se poderá dizer que «quando o dinheiro funcionar como substituto do valor económico de um bem ou da reintegração do património, não estará preenchido o pressuposto objectivo de admissibilidade do processo de injunção.
Conforme refere Salvador da Costa (in A injunção e as Conexas Ação e Execução, Almedina-5ª. edição, 2005, pág. 41), o regime processual em causa só é aplicável às obrigações pecuniárias diretamente emergentes de contratos, pelo que não tem a virtualidade de servir para a exigência de obrigações pecuniárias resultantes, por exemplo, de responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, de enriquecimento sem causa ou de relações de condomínio.
Paulo Teixeira Duarte, em Os Pressupostos Objetivos e Subjetivos do Procedimento de Injunção, publicado na “Themis”, VII, nº 13, págs. 184/185, demarca negativamente a pretensão substantiva que pode ser processualizada no processo de injunção referindo que são “apenas aquelas que se baseiam em relações contratuais cujo objeto da prestação seja diretamente a referência numérica a uma determinada quantidade monetária”, concluindo que, “Daqui resulta que pode ser objeto do pedido de injunção o cumprimento de obrigações pecuniárias diretamente emergentes do contrato, mas não pode ser peticionado naquela forma processual obrigações com outra fonte, nomeadamente, derivada de responsabilidade civil. O pedido processualmente admissível será, assim, a prestação contratual estabelecida entre as partes cujo objeto seja em si mesmo uma soma de dinheiro e não um valor representado em dinheiro”.
Estando o procedimento de injunção limitado ao cumprimento de obrigações pecuniárias diretamente emergentes de contrato, não pode o mesmo ser utilizado quando o que se visa, é a exigência de uma soma pecuniária decorrente da resolução de um contrato e onde estão em causa quantias que resultam da aplicação da penalização estipulada no próprio contrato. Mesmo que a cláusula penal se traduza numa quantia pecuniária desde logo fixada contratualmente, e obtida por uma mera operação matemática, consideramos, estar excluída do âmbito da injunção, isto porque, «não estamos perante uma obrigação pecuniária em sentido estrito, mas sim perante uma indemnização pré-fixada, e depois porque a mesma não se baseia numa pretensão de cumprimento, mas sim meramente ressarcitória» (vide Paulo Duarte Teixeira, obra citada).
O procedimento de injunção visa a cobrança, rápida e simples, de dívidas pecuniárias, acompanhada das consequências indemnizatórias imediatas e certas (juros).
Todavia, estando em causa uma obrigação secundária derivada do incumprimento do contrato, e não se vise o seu cumprimento, estar-se-á a extravasar o âmbito deste procedimento.
Conclui-se, assim, que as injunções, incluindo as decorrentes de transação comercial, e a ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, não são a via processual adequada para acionar a cláusula penal, mesmo que compulsória, decorrente da mora ou de qualquer vicissitude na execução do contrato, assim como não cabe no âmbito do procedimento de injunção geral, o pedido de pagamento de encargos associados à cobrança da dívida, os quais constituem danos decorrentes do incumprimento contratual, não sendo obrigação directamente emergente do contrato” (sublinhado nosso) – cf. Ac. RP, de 04.07.2024, relatado por Ana Vieira, processo 3368/23.7T8VLG-A.P1 (in www.dgsi.pt).
Portanto, a cláusula penal convencionada para a rescisão antecipada do contrato e a indemnização pelos encargos associados à cobrança da dívida peticionadas no procedimento injuntivo de que emergiu o requerimento/documento dado à execução não consubstanciam “obrigações pecuniárias diretamente emergente de um contrato”.
Assim, relativamente ao pedido de pagamento do montante correspondente à cláusula penal convencionada para a rescisão antecipada do contrato e à indemnização pelos encargos associados à cobrança da dívida, foi lançado mão de uma forma processual que legalmente não é a prevista para tutela jurisdicional respetiva.
O objetivo do legislador com o procedimento de injunção não foi o da economia processual, mas sim o de facilitar a cobrança das obrigações pecuniárias como instrumento essencial da regulação do sistema económico, ou seja, das dívidas que, pela sua própria natureza, implicam uma tendencial certeza da existência do direito de crédito.
A exequente não poderia ter recorrido ao requerimento de injunção e, tendo-o feito, deu causa à verificação de uma exceção dilatória inominada, prevista nos artigos 555.º, n.º 1, 37.º, n.º 1, primeira parte, e geradora de absolvição da instância ao abrigo do vertido nos artigos 576.º, n.ºs 1 e 2, 577.º, 578.º e 278.º, n.º 1, alínea e), todos do Código de Processo Civil.
Tal exceção atinge e contagia todo o procedimento de injunção, por não se mostrarem reunidos os pressupostos legalmente exigíveis para a sua utilização, e não apenas o pedido referente ao valor da cláusula penal peticionada.
Ver, neste sentido:
- Ac. RL, de 23.11.2021, relatado por Edgar Taborda Lopes, proc.88236/19.0YIPRT.L1-7, assim sumariado:
“I– A absolvição da instância no caso do conhecimento oficioso de uma excepção dilatória inominada de uso indevido do procedimento de injunção, quando a acção está transmutada em acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato (por ter um valor inferior ao da alçada da Relação), inquina todo o processo, implicando a sua inaproveitabilidade total (também para os créditos que efectivamente poderiam ser peticionados por aquela via).
II– Esta consequência gravosa penaliza quem, usando uma ilegítima estratégia de risco, decide iniciar um procedimento de injunção (na expectativa da notificação e não oposição do Requerido), sabendo que o(s) crédito(s) invocado(s) não lho permitia(m) (por ausência de condições substantivas para ser decretada a injunção), para, assim defraudando as exigências legais obter com mais facilidade um título executivo.”
- Ac. RP, de 15.01.2019, relatado por Rodrigues Pires, proc.141613/14.0YIPRT.P1 (in www.dgsi.pt), assim sumariado:
“I - pode ser objeto do pedido de injunção o cumprimento de obrigações pecuniárias diretamente emergentes de contrato, mas não podem ser peticionadas naquela forma processual obrigações com outra fonte, nomeadamente, derivada de responsabilidade civil.
II - A cláusula penal, mesmo que se traduza numa quantia pecuniária desde logo fixada contratualmente, está excluída do âmbito da injunção por não se tratar de uma obrigação pecuniária em sentido estrito.
III - Quando o autor/requerente use de forma indevida ou inadequada o procedimento de injunção verifica-se uma exceção dilatória inominada, que obsta ao conhecimento do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância.
IV - Tal exceção dilatória inominada, afetando o conhecimento e o prosseguimento da ação especial em que se transmutou o procedimento de injunção, por não se mostrarem reunidos os pressupostos legalmente exigidos para a sua utilização, não permite qualquer adequação processual ou convite a um aperfeiçoamento.
- Ac. RL, de 28.04.2022, relatado por Cristina Pires Lourenço, proc.28046/21.8YIPRT.L1-8 (in www.dgsi.pt), assim sumariado:
O uso indevido do procedimento de injunção inquina na totalidade a ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias em que se se transmutou, consubstanciando exceção dilatória inominada (art. 577º, do Código de Processo Civil), de conhecimento oficioso, que conduz à absolvição da instância, impedindo qualquer apreciação de mérito, designadamente, dos créditos cuja cobrança poderia ter sido peticionada por via daquele procedimento.”
- Ac. RC, de 14.03.2023, relatado por Henrique Antunes (in www.dgsi.pt), assim sumariado:
“I - Não é admissível, através do procedimento de injunção, a exigência de créditos pecuniários objecto de reconhecimento unilateral do devedor;
II - Ainda que através de negócio jurídico unilateral o devedor tenha reconhecido a dívida, o credor está vinculado, no procedimento de injunção, a alegar o contrato objecto da relação jurídica fundamental do qual a obrigação emerge;
III - O procedimento de injunção não é o adequado à exigência de créditos resultantes de cláusula penal com função indemnizatória ou despesas feitas pelo credor com a actuação ou exercício do crédito de que se diz titular;
IV- O uso inadmissível ou inadequado, ainda que meramente parcial do procedimento inquina e torna inaproveitável, in totum, a acção especial para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato em que o procedimento, por virtude da oposição, se convolou, e lugar a uma excepção dilatória, conducente à absolvição do requerido da instância.” (sublinhado e negrito, nossos).
Portanto, terá sempre o juiz de apreciar e decidir, analisada a pretensão do requerente, se o recurso ao procedimento de injunção como meio de obter a satisfação do crédito reclamado era admissível.
O recurso ao processo de injunção, quando não se mostram preenchidos os pressupostos legalmente exigidos para o efeito, configura uma verdadeira situação de uso indevido daquele meio como forma de exigir o cumprimento das obrigações a que se reporta o art.º do referido diploma preambular e tal, como tem vindo a ser decidido, consubstancia uma verdadeira excepção dilatória inominada.[15]
E, verificando-se que o procedimento de injunção não era o adequado porque por via dele não era possível ao credor obter a cobrança de valores atinentes a cláusulas penais acordadas, como se concluiu nos autos, o vício está a montante e a acção especial para cobrança de obrigações pecuniárias de valor inferior à alçada da Relação, iniciada em consequência de transmutação do procedimento de injunção também não poderá ser permitida, nem aproveitada por qualquer forma por ter tido origem em procedimento não admissível, estando comprometida a própria instância o que obsta ao conhecimento de mérito da totalidade do pedido.” – cf. Ac. RL, de 25.01.2024, relatado por Ana Paula Nunes Duarte Olivença, processo nº101821/22.2YIPRT.L1-8 (in www.dgsi.pt).
- Ac. RP, de 04.07.2024, relatado por Ana Vieira, processo 3368/23.7T8VLG-A.P1 (in www.dgsi.pt):
“I - A providência de injunção, para que possa ser decretada mediante a aposição da fórmula executória, pressupõe a reclamação de cumprimento de obrigações emergentes de contratos de valor não superior a 15.000 ou, independentemente desse valor, créditos de natureza contratual emergentes de transacções comerciais que deram origem ao fornecimento de bens ou à prestação de serviços.
II - pode ser objeto do pedido de injunção o cumprimento de obrigações pecuniárias diretamente emergentes do contrato, mas não pode ser peticionado naquela forma processual obrigações com outra fonte, nomeadamente, derivada de responsabilidade civil.
III - O uso, de forma indevida, do procedimento de injunção, configura uma excepção dilatória inominada, que obsta ao conhecimento do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância.
IV - Não cabe no âmbito do procedimento de injunção geral, o pedido de pagamento de encargos associados à cobrança da dívida, os quais constituem danos decorrentes do incumprimento contratual, não sendo obrigação directamente emergente do contrato.” – sublinhado e negrito, nossos.
Ac. RL, de 10.10.2024, relatado por Maria Teresa F. Mascarenhas Garcia, processo 5820/24.8T8SNT.L1-6 (in www.dgsi.pt):
“I. A tramitação da execução sumária não prevê a prolação despacho liminar (art.º 855.º, n.º 1, do CPC), mas tal não obsta a que o juiz venha a conhecer questões que sejam passíveis de conhecimento oficioso, designadamente as de falta ou de insuficiência do título executivo.
II. O regime processual especial de cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos é aplicável às obrigações pecuniárias directamente emergentes de contratos, pelo que não tem a virtualidade de servir o credor obter, por esta via, indemnização por encargos decorrentes da cobrança da divida.
III. O uso indevido do procedimento de injunção (numa concreta situação que não permitia o recurso ao mesmo), sem oposição do requerido, do qual resulta a obtenção de um título executivo, inquina todo o processo, implicando a inaproveitabilidade total do título, justificando assim o indeferimento liminar in totum.
IV. Não obstante a perda de economia processual que tal solução acarreta, a opção por um indeferimento liminar parcial (na dicotomia indeferimento liminar parcial/ indeferimento liminar in totum) apenas contribuiria para aumentar o risco de os credores procurarem obter títulos executivos por via de injunção (quando tal direito não se lhes assistia), aproveitando-se do facto de o controlo não ser exercido jurisdicionalmente.
V. A prolação da decisão de indeferimento liminar da execução sem exercício prévio do contraditório não constitui violação do artigo 3.º do CPC”.
Ver, ainda, no mesmo sentido, as recentes decisões/acórdãos do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa que recaíram sobre sentenças de rejeição proferidas neste Juízo de Execução de Sintra, nas quais a ora exequente era, também, exequente/recorrente: Processo 5765/24.1T8SNT.L1; Processo nº5797/24.0T8SNT.L1; Processo nº17042/23.0T8SNT.L1; Acs. RL de 22.10.2024, relatado por João Bernardo Peral Novais (processo
5533/24.0T8SNT.L1) e de 10.10.2024, relatado por João Paulo Raposo (processo 5765/24.1T8SNT.L1-2); Decisão de 20.09.2024, proferida por Nuno Gonçalves (processo 5851/23.5T8SNT.L1).
Nesta conformidade, ao requerimento de injunção dado à execução não deveria ter sido aposta força executiva, uma vez que não podia deixar-se prosseguir ação especial/comum para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos que houvesse resultado da transmutação de injunção interposta para acionamento dessa cláusula, pois, de contrário, estar-se-ia a admitir que o credor, para obter título executivo, que bem sabia, à partida, que não podia obter, defraudasse as exigências prescritas nas disposições legais que disciplinam o procedimento de injunção.
Caso tivesse sido submetido a apreciação jurisdicional, deveria ter tido lugar um juízo de improcedência total do pedido, por recurso indevido ao procedimento de injunção, o que, repita-se, constitui exceção inominada de conhecimento oficioso – neste sentido, além dos arestos supra citados, Acs. RP de 31.05.2010 (Maria de Deus Correia), de 26.09.2005 (Sousa Lameiras); Acs. RL, de 07.06.2011 (Rosário Gonçalves), de 08.11.2007 (Ilídio Sacarrão Martins).
Porém, o recurso ao procedimento de injunção quando este não se ajusta à pretensão formulada, porque acarreta exceção inominada, nulidade de conhecimento oficioso, pode esta ser conhecida em sede execução cujo título executivo é o requerimento injuntivo ao qual, embora ao arrepio da lei, tenha sido atribuída força executória por secretário judicial – neste sentido, Ac. RE, de 16.12.2010, relatado por Mata Ribeiro (in www.dgsi.pt).
Com efeito, a aposição de fórmula executória pelo Secretário Judicial, na sequência de falta de oposição, não tem força constitutiva de caso julgado, não precludindo a apreciação do aludido vício de uso indevido de procedimento injuntivo. Como se refere no acórdão da Relação de Lisboa, de 15.02.2018, relatado por Anabela Calafate, processo 2825/17.9T8LSB.L1-6, consultável em www.dgsi.pt, “não pode ser equiparada a decisão judicial a aposição da fórmula executória por um secretário de justiça. Por isso a rejeição por despacho judicial da execução baseada em injunção não constitui violação de caso julgado.
Por outro lado, a omissão ou insuficiência de título executivo são de conhecimento oficioso e podem ser apreciadas e declaradas até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados (artigos 734.º n.º 1 e 726.º n.º 2 al. a) do CPC). Sendo irrelevante, para esse efeito, que o/s executado/s se tenha/m abstido de invocar tal vício, nomeadamente em sede de oposição à execução – ver, neste sentido, Ac. RL, de 12.07.2018, relatado por Jorge Leal (in www.dgsi.pt).
Como recentemente se entendeu no Ac. RP, de 27.09.2022, relatado por Anabela Dias da Silva, o procedimento de injunção não é meio processual próprio para se peticionar o pagamento de uma quantia a título de cláusula penal indemnizatório ou qualquer outra quantia a título de indemnização pelos encargos com a cobrança da dívida. Intentando-se a execução dando-se como título executivo injunção de onde resulte que abrange semelhantes quantias, há que se verificar exceção dilatória de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância, devendo-se indeferir liminarmente o requerimento executivo.
No sentido de que a injunção à qual foi aposta fórmula executória nestas circunstâncias está assim afetada de vício que constitui exceção dilatória inominada justificativa do indeferimento liminar da execução, ver, ainda, Acs. RP, de 26.09.2022, relatado por Maria José Simões, e de 08.11.2022, relatado por Alexandra Pelayo, bem como o Ac. RE, de 28.04.2022, relatado por Mata Ribeiro (in www.dgsi.pt), assim sumariado:
“1 - O procedimento de injunção não é meio adequado para peticionar o pagamento da obrigação resultante da aplicação da cláusula penal acordada para o incumprimento do período de fidelização.
2 - No procedimento de injunção não se pode obter título executivo cumulando pretensão por dívidas referentes a prestações pecuniárias emergentes de contrato com indemnização por incumprimento contratual.
3 - A injunção à qual foi aposta fórmula executória nestas circunstâncias está assim afectada de vício que constitui exceção dilatória inominada justificativa do indeferimento liminar da execução.
Veja-se, ainda quanto a esta questão, o decidido nos recentíssimos Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, datados, ambos, de 18.04.2024 – processo 12308/19.7T8SNT.L1, relatado por Carla Mendes e processo 18156/20.4T8SNT.L1, relatado
por Eduardo Petersen Silva –, que recaíram sobre decisões proferidas por este Juízo de Execução (nos quais a ora exequente era, também, exequente e recorrente), confirmando-as, podendo ler-se, no último, o seguinte:
“(…)
Assim posta a questão, ela é simplesmente esta: - o tribunal pode conhecer de ofício a excepção dilatória de uso indevido do procedimento de injunção?
Vejamos as disposições legais que a recorrente invoca violadas.
Dispõe o artigo 14º - A do DL 269/98 de 1.9, epigrafado “Efeito cominatório da falta de dedução da oposição”:
“1 - Se o requerido, pessoalmente notificado por alguma das formas previstas nos n.ºs 2 a 5 do artigo 225.º do Código de Processo Civil e devidamente advertido do efeito cominatório estabelecido no presente artigo, não deduzir oposição, ficam precludidos os meios de defesa que nela poderiam ter sido invocados, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
2 - A preclusão prevista no número anterior não abrange:
a) A alegação do uso indevido do procedimento de injunção ou da ocorrência de outras exceções dilatórias de conhecimento oficioso;
b) A alegação dos fundamentos de embargos de executado enumerados no artigo 729.º do Código de Processo Civil, que sejam compatíveis com o procedimento de injunção;
c) A invocação da existência de cláusulas contratuais gerais ilegais ou abusivas;
d) Qualquer exceção perentória que teria sido possível invocar na oposição e de que o tribunal possa conhecer oficiosamente”.
Dispõe o artigo 726º do Código de Processo Civil:
“1 - O processo é concluso ao juiz para despacho liminar.
2 - O juiz indefere liminarmente o requerimento executivo quando: a) Seja manifesta a falta ou insuficiência do título;
b) Ocorram exceções dilatórias, não supríveis, de conhecimento oficioso; c) (…) 3 - (…)
4 - Fora dos casos previstos no n.º 2, o juiz convida o exequente a suprir as irregularidades do requerimento executivo, bem como a sanar a falta de pressupostos, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 2 do artigo 6.º.
5 - Não sendo o vício suprido ou a falta corrigida dentro do prazo marcado, é indeferido o requerimento executivo.
6 (…)”.
Isto posto, verifica-se ainda que não é actualmente unânime a orientação doutrinária e jurisprudencial, aliás reconhecida pela recorrente, de que o procedimento injuntivo não pode ser usado para obter a (fórmula executória que permite a) execução de obrigação resultante de cláusula penal, como também não dúvida e de resto a jurisprudência citada pela sentença bem o demonstra que também quanto à questão de saber se a excepção dilatória inominada de uso indevido do procedimento de injunção, pode ser conhecida oficiosamente e pode determinar o indeferimento liminar da execução baseada em requerimento de injunção ao qual, por via da não oposição, haja sido aposta fórmula executória. Isto é, é dominante, e de resto nem a recorrente nos aporta jurisprudência ou doutrina em sentido diverso, a orientação que entende que a excepção em causa pode ser conhecida oficiosamente e se pode ser conhecida oficiosamente, não precisa de ser invocada, e é indiferente que não tenha sido invocada, precisamente note-se, porque excede a disponibilidade das partes a definição de meios e termos processuais legalmente regulados, ou seja, as partes não podem à partida, sob pena de violação aberta e abusiva das normas processuais que taxativamente definem os títulos executivos, garantes, elas mesmas, da assertividade da obrigação e consequentemente do exercício pressuposto do direito constitucional de defesa previsto no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa o que significa do mesmo passo que não ocorre preclusão, como de resto resulta literalmente dos termos do artigo 14º - A, alínea a) acima transcrito, nem se podendo entender que a lei pudesse ser interpretada sem garantir um mínimo de correspondência com o elemento literal confronte-se o artigo do Código Civil. E consequentemente, é também claro que ao afirmar expressamente a não preclusão, a lei excepciona a regra da concentração da defesa invocada pela recorrente a partir do artigo 573º do Código de Processo Civil. E finalmente, é cristalino que se a lei excepciona a preclusão, a invocação e ou a aplicação da excepção de uso indevido do procedimento cautelar não ofende a força executória aposta ao requerimento de injunção que precisamente, não pode incidir sobre o que não pode ser peticionado por essa via.
E se está expressamente prevista na alínea a) a excepção de uso indevido do procedimento injuntivo, e nele equiparada, pela previsão subsequente a “outras”, a excepção dilatória de conhecimento oficioso, é evidente que o caso cai sob a previsão desta alínea a), sendo espúria a invocação da alínea b) do mesmo preceito, como fundamento do recurso.
De resto, sobre a aplicabilidade do artigo 729º do Código de Processo Civil, reiteramos o entendimento da não equiparação da aposição da fórmula executória a uma decisão judicial, que manifestamos no acórdão proferido no processo 2825/17.9T8LSB.L1-6 em 15-02-2018, pelo relator subscrito enquanto adjunto, e relatado pela Exmª Senhora Desembargadora Anabela Calafate, ora segunda adjunta, acórdão que se encontra publicado no sítio electrónico da dgsi, e para cujo teor se remete.”
Cumpre, por fim, em jeito de conclusão, citar o Ac. RL, de 16.05.2024, relatado por Teresa Sandiães, processo 11350/23.8T8SNT.L1 – que recaiu sobre decisão proferida por este Juízo de Execução, confirmando-a –, podendo ler-se, no sumário, o seguinte:
“Decorre do artº do diploma preambular do DL 268/98, de 01/09 e artº do anexo que o regime processual especial nele previsto apenas pode ter por objeto obrigações pecuniárias, em sentido estrito, diretamente emergentes de contratos, visando-se o cumprimento daquelas.
Tal não sucede quando o requerimento de injunção se destina ao exercício da responsabilidade civil contratual, onde se peticionam valores que não integram a categoria de obrigações pecuniárias em sentido estrito (cláusula penal, bem como a globalidade das prestações previstas no contrato, por vencimento imediato de todas elas, com fundamento em resolução contratual), pelo que se fez uso indevido deste meio processual.
Tendo sido aposta fórmula executória à injunção que padece do apontado vício, que se reconduz a uma exceção dilatória inominada, impunha-se a rejeição oficiosa da execução. – sublinhado e negrito, nossos.
Entende, assim, este Tribunal não dispor a exequente de título executivo eficaz, por a pretensão formulada não se ajustar à finalidade do procedimento de injunção, vício que inquinou a formação do título.
* Decisão:
Em face de todo o exposto, por verificação da exceção dilatória inominada do uso indevido do procedimento de injunção e consequente falta de título executivo, decido rejeitar a presente execução – cf. artigos 734.º n.º 1 e 726.º n.º 2 al. a) do CPC).
Custas pela Exequente.»
*
A Recorrente insurge-se contra esta decisão, alegando, em suma:
- que não pode o Tribunal a quo, ex officio, determinar a verificação de tal exceção, atendendo a que, enquanto vício que incide sobre o título executivo, apenas cabe ao tribunal pronunciar-se caso tal exceção seja invocada pelo executado em sede de embargos à execução;
- de entre as causas admissíveis de indeferimento liminar do requerimento executivo que são estipuladas pelo artigo 726.º do CPC não resulta o uso indevido do procedimento de injunção;
- e que mesmo se acolhendo o entendimento de que o procedimento injuntivo não configura um meio adequado para o pagamento de valores relativos a cláusula penal e despesas de cobrança, e que é admissível a sua apreciação judicial oficiosa em sede de instância executiva, a ocorrência de tal excepção do uso indevido de procedimento injuntivo não determina o indeferimento total do requerimento executivo, mas apenas a absolvição da instância relativamente aos valores que integram a injunção a tal título.
São as seguintes as conclusões do recurso:
1. Considerou o Tribunal a quo existir exceção dilatória de uso indevido do procedimento de injunção, absolvendo o Apelado da instância;
2. Por a Recorrente ter lançado mão de injunção destinada a exigir o cumprimento de obrigação emergente de contrato e de despesas associadas à cobrança da dívida;
3. Salvo, porém, o devido respeito, tal decisão carece de oportunidade e fundamento, sendo contrária à Lei;
4. Desde logo porque a lei não habilita o Tribunal a quo a conhecer oficiosamente de exceções dilatórias relacionadas com o conteúdo do título executivo;
5. Das causas admissíveis de indeferimento liminar do requerimento executivo constantes do artigo 726.º do CPC não resulta o uso indevido do procedimento de injunção;
6. Permitir-se ao juiz da execução pronunciar-se ex officio relativamente à exceção dilatória de uso indevido do procedimento de injunção esvaziaria de função o artigo 14.º-A n.º 2 do DL 269/98, de 01 de setembro, e atentaria contra o princípio da concentração da defesa ínsito no artigo 573.º do CPC;
7. Não obstante, a injunção constitui um meio adequado para o pagamento das despesas associadas à cobrança das faturas relativas à prestação dos serviços contratados pelo Apelado;
8. Dado que, à semelhança do que sucede com os juros de mora, também as despesas de cobrança resultam diretamente da falta de pagamento da obrigação pecuniária principal e, por conseguinte, constituem uma obrigação pecuniária em sentido estrito, isto é, diretamente emergente do contrato;
9. Sem prescindir, o entendimento de que as despesas de cobrança não podem integrar o procedimento injuntivo não determina que a extinção total da instância executiva, mas somente a recusa do título executivo relativamente à parte que integra tais custos administrativos.
10. A sentença proferida pelo Tribunal a quo trata-se de um indeferimento liminar da petição inicial, o que legitima a apresentação do presente recurso;
De tudo quanto ficou exposto, resulta que, a decisão recorrida, ao rejeitar, liminarmente, a execução, violou, nomeadamente:- o artigo 726.º n.º 2 do C.P.C.;- o artigo 1.º do diploma preambular associado ao DL 269/98,de 01 de setembro;- o artigo 10.º n.º 2 al. e) do regime anexo ao DL 269/98;- o artigo 14.º-A n.º 2 do regime anexo ao DL 269/98;- o artigo 193.º do CPC. Deverá, consequentemente, ser revogada e substituída por decisão que admita o requerimento executivo e mande prosseguir os autos nos termos acima expostos.»
*
Dos autos não constam contra-alegações.
*
O processo foi remetido a este Tribunal da Relação, onde o recurso foi admitido nos termos em que o fora na 1ª instância.
Colhidos os vistos, cumpre decidir..
II- Quaestio Iudicio:
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da apelante, tal como decorre das disposições legais dos artºs 635º nº4 e 639º do CPC, não podendo o tribunal conhecer de quaisquer outras questões, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso (art.º 608º nº2 do CPC).
As questões a resolver são as que constam das conclusões da apelação, acima reproduzidas e que se resumem a apreciar:
1. Da possibilidade de conhecimento oficioso da excepção de uso indevido do procedimento de injunção;
2. Do indeferimento liminar do requerimento executivo fundado em injunção, a que foi aposta fórmula executória, com base na sua inadequação para peticionar ao devedor o pagamento de custos administrativos relacionados com diligências de cobrança de dívidas;
III - Fundamentação
Além do que consta do relatório, acima sumariado, resulta ainda dos autos, com interesse para o presente recurso a consideração dos seguintes factos, documentados nos autos, que aqui importa destacar:
- o título executivo indeferido tinha por base requerimento de injunção a que foi aposta fórmula executória e que tinha o seguinte teor:
« A Req.te (Rte), celebrou com o Req.do (Rdo) um contrato de prestação de bens e serviços telecomunicações a que foi atribuido o n.º .... No âmbito do contrato, a Rte obrigou-se a prestar os bens e serviços solicitados pelo Rdo, e este obrigou-se a efetuar o pagamento tempestivo das faturas, a devolver com a cessação do contrato os equipamentos da Rte e a manter o contrato pelo período acordado, sob pena de, não o fazendo, ser responsável pelo pagamento de cláusula penal convencionada para a rescisão antecipada do contrato. Das facturas emitidas, permanece(m) em dívida a(s) seguinte(s): €74,63 de 11/10/2021, €142,82 de 09/11/2021, €167,01 de 10/12/2021, €136,85 de 11/01/2022, €178,75 de 11/04/2022, €127,82 de 10/05/2022, €84,2 de 09/06/2022, €167,02 de 11/07/2022, €110,06 de 09/08/2022, €1126,12 de 09/09/2022, vencidas, respectivamente em 04/11/2021,04/12/2021,04/01/2022,04/02/2022,04/05/2022,04/06/2022,04/07/2022,04/08/2022,04/09 /2022 e 04/10/2022. Enviada(s) ao Rdo logo após a data de emissão e apesar das diligências da Rte, não foi(ram) a(s) mesma(s) paga(s), constituindo-se o Rdo em mora e devedor de juros legais desde o seu vencimento. Mais, é o Rdo devedor à Rte de €463,06, a título de indemnização pelos encargos associados à cobrança da dívida. Termos em que requer a condenação do Requerido a pagar a quantia peticionada e juros vincendos.
O valor em dívida poderá ser pago, nos próximos 15 dias, realizando uma transferência bancária para o IBAN PT...0...39999.»
- A factura n.º FT 202291/2294003, datada de 09-09-2022, no montante de € 1.126,77 corresponde ao valor relativo à cláusula penal;
- Não obstante ter sido notificado no âmbito da injunção que serve de base à presente execução, não procedeu o Executado ao pagamento integral do valor aí reclamado.
- Foi aposta fórmula executória a tal requerimento de injunção, por Secretário de Justiça;
- A Recorrente intentou, com base nesse título executivo, execução a seguir a forma de processo sumário.
-Após diligências com vista à penhora foi o executado citado.
*
Apreciando:
A decisão recorrida, indeferiu liminarmente a execução, com base na sustentação de a exequente não dispor de título executivo eficaz, por a pretensão formulada não se ajustar à finalidade do procedimento de injunção, entendendo que o procedimento de injunção não é meio processual próprio para se peticionar o pagamento de uma quantia a título de indemnização pelos encargos com a cobrança da dívida.
E concluindo, assim, que intentando-se a execução e dando-se como título executivo injunção de onde resulte que abrange semelhantes quantias, há que se verificar exceção dilatória de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância, devendo-se indeferir liminarmente o requerimento executivo.
*
A recorrente insurge-se contra esta decisão e, como acima enunciado, invoca a indevida prolação de decisão de conhecimento oficioso da excepção de uso indevido do procedimento de injunção.
Importa considerar que o despacho de indeferimento liminar é uma espécie dentro do género da “rejeição liminar”, e ocorre no caso de inviabilidade “lato sensu” da pretensão (onde se insere a falta insuprível de pressupostos processuais), em que a lei elenca taxativamente as causas relevantes da rejeição (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa datado de 11.05.2021 in www.dgsi.pt ).
*
A presente execução segue a forma sumária nos termos das disposições conjugadas dos artigos 550°, número 2 b) e 855° e seguintes do Código de Processo Civil.
A tramitação da execução sumária não prevê a prolação de despacho liminar, como resulta do previsto no artigo 855°, número 1 do Código de Processo Civil que determina que o executado seja citado “sem precedência de despacho judicial prosseguindo os autos para as diligências de penhora, após o que ocorre a citação.
Tal não obsta, naturalmente, a que o juiz venha a conhecer questões que sejam passíveis de conhecimento oficioso, designadamente as de falta ou de insuficiência do título executivo, nos termos do artigo 726°, número 2 a) do Código de Processo Civil que é invocado como fundamento legal do despacho recorrido.
O artigo 734° CPC prevê precisamente que o juiz conheça oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726° CPC, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo (neste sentido cfr. Ac. TRL de 24 de Outubro de 2024 relatado por Eduardo Petersen Silva in www.dgsi.pt ).
Tal norma é aplicável ao processo sumário por força da remissão prevista no número 3 do artigo 551° do Código de Processo Civil.
Pelo exposto, nada obsta a que em sede de execução sumária o juiz conheça oficiosamente das questões que poderiam suscitar indeferimento liminar do requerimento executivo caso a execução seguisse a forma ordinária, e que são as elencadas no artigo 726°, número 2 do Código de Processo Civil.
*
Por outro lado, invoca a Recorrente que o tribunal recorrido não podia indeferir liminarmente o requerimento executivo com base em exceção dilatória inominada de uso indevido do procedimento de injunção, alegando violação do disposto no artigo 726°, número 2 a) do Código de Processo Civil.
In casu, o título executivo é um requerimento de injunção ao qual foi aposta a fórmula executória. Ora, o Tribunal a quo indeferiu a execução por insuficiência do título na medida em que entende que a Exequente se socorreu do procedimento de injunção para se fazer munir de título executivo relativo a quantias que não podia reclamar por essa via. Entende-se na decisão recorrida que o objetivo do legislador com o procedimento de injunção não foi o da economia processual, mas sim o de facilitar a cobrança das obrigações pecuniárias como instrumento essencial da regulação do sistema económico, ou seja, das dívidas que, pela sua própria natureza, implicam uma tendencial certeza da existência do direito de crédito e que o secretário judicial deveria ter recusado a aposição da formula executória.
Invoca, pois, a decisão objecto de recurso que, relativamente ao pedido de pagamento do montante correspondente à indemnização pelos encargos associados à cobrança da dívida, foi lançado mão de uma forma processual que legalmente não é a prevista para tutela jurisdicional respetiva e como tal por verificação da falta de titulo executivo decidiu rejeitar a execução com base na al. a) do art.º 726.º n.º 2 do CPC.
Ora, o regime processual especial de cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos só é aplicável às obrigações pecuniárias directamente emergentes de contratos, pelo que não tem a virtualidade de servir para a exigência de obrigações pecuniárias resultantes de responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, de enriquecimento sem causa ou de relações de condomínio, e com tal não comporta a possibilidade de cobrança da indemnização por encargos decorrentes da cobrança da divida (cfr Acórdão do Tribunal da Relação de Évora datado de 15.09.2022, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 27.11.2014; Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 28.10.2015, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24 de Outubro de 2024 relatado por Eduardo Petersen Silva; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10 de Abril de 2025, relatado por Anabela Calafate, todos in www.dgsi.pt ).
E, não obstante a questão não tenha sido suscitada no procedimento de injunção pelo requerido, uma vez que não deduziu oposição, nada obsta a que na ação executiva ela possa ser apreciada, visto estarmos perante um caso de inadequação do procedimento de injunção para a formulação de um pedido de indemnização por encargos com cobrança da dívida e de valor relativo a clausula penal o vício redunda numa excepção dilatória inominada. E, como tal, pelo menos em parte, a injunção à qual foi aposta fórmula executória nestas circunstâncias está, assim, afectada de vício que constitui excepção dilatória inominada justificativa do indeferimento liminar da execução, em parte, e que se traduz numa manifesta insuficiência do título executivo, tendo a ora exequente feito um uso indevido do procedimento de injunção no segmento a que se reporta a indemnização pelos encargos associados à cobrança da dívida e clausula penal.
Pelo exposto, tendo presente o disposto no art.º 726.º e 734.º CPC e particularmente o fundamento legal invocado em sede da decisão recorrida previsto na al. a) do n.º 2 do art.º 726.º CPC que elencando as causas admissíveis de indeferimento liminar da execução elege como primeira causa a « manifesta falta ou insuficiência do título», importa tão só saber se a execução se extingue no todo ou em parte.
Considerando que a jurisprudência encontra-se dividida, elencamos no sentido do indeferimento total os acórdãos desta Relação proferidos nos processos 88236/19.0YIPRT.L1-7 em 23.11.2021 (Rel. Edgar Taborda Lopes) e 28046/21.8YIPRT.L1-8 – Cristina Lourenço 28.4.2022 e os acórdãos neles mencionados, bem como outros inéditos. E no sentido do indeferimento parcial, os acórdãos da Relação de Évora proferido no processo 2274/20.1T8ENT.E1 em 15.09.2022 (Rel. Tomé Carvalho) e da Relação do Porto de 8.11.2022 no processo 901/22.5T8VLG-A.P1 (Rel. Alexandra Pelayo) e o Acórdão do TRL de 24 de Outubro de 2024 relatado por Eduardo Petersen Silva.
Neste ultimo Acórdão considera-se, de forma clara e pertinente, que secundamos, o seguinte:
«Pensemos: - o devedor não paga. O credor interpela-o para pagar a dívida e pagar outras quantias, incluída uma cláusula penal. O devedor paga voluntariamente. Não há necessidade de recurso a injunção.
Segundo cenário: - o devedor, interpelado, não paga. O credor recorre ao procedimento especial de injunção, onde inclui quantias relativas a cláusula penal, por exemplo. Se o devedor não se opõe, obtém fórmula executiva, obtém um título executivo que o dispensa da acção declarativa, sem que esteja nas condições substanciais que a lei que institui o procedimento especial autoriza. Se, obtida a fórmula, o devedor paga voluntariamente, estamos de regresso ao primeiro cenário, nenhuma censura havendo a fazer.
Se o devedor não paga e o credor dá o título obtido à execução, a partir do momento em que maioritariamente admitimos o conhecimento oficioso da excepção inominada de utilização indevida do procedimento injuntivo, qual é o risco de beneficiar alguém que indevidamente recorreu ao procedimento injuntivo? Nenhum.
Assim, quando se defende o indeferimento total, que cobre as dívidas para as quais inequivocamente o legislador permitiu o recurso ao procedimento de injunção, esse indeferimento funciona só como sanção, porque para essas dívidas nenhum obstáculo havia a recorrer ao procedimento. Donde, aplicamos uma sanção – obrigamos o “infractor” a tudo repetir em sede de acção declarativa – para quem além de pedir as quantias em dívida resultantes do contrato, também pede uma indemnização por incumprimento do contrato ou os custos com a cobrança de um contrato incumprido pela contraparte. Com o devido respeito, quando o legislador quer sancionar, assim o faz e assim o diz.
O propósito da instituição do procedimento especial de injunção foi o de agilizar a vida económica (agilizar cobranças) e simultaneamente o de libertar os tribunais das acções declarativas subjacentes.
Defender a absolvição total, o indeferimento total, é fazer exactamente o contrário, ou seja, estamos perante uma interpretação que se revela contrária ao propósito e à lógica do legislador, havendo de presumir-se que o legislador sabe exprimir o que quer, e que não legisla sem sentido. Repare-se que o legislador, ou melhor dizendo, a lei, por definição, é geral e abstracta. Não pode o intérprete não a considerar como tal, como tendo sido feita nesses termos. Se há credores que têm condições para saber como devem legalmente fazer e se esses credores recorrem massivamente a este tipo de procedimento, em função dos seus negócios e dos volumes de negócio, não quer isto dizer que não haja credores sem essas condições nem nessas condições de volume de negócios, que não tenham interesse em agilizar as suas cobranças.
Em suma, entendemos que não se encontra na lei qualquer indício de um propósito sancionatório nem discriminatório dos credores, de modo que, por efectivo e racional princípio de aproveitamento dos actos processuais, por um princípio de utilidade, e porque em sede executiva se prevê realmente esse aproveitamento, como assim resulta claramente do artigo 726º nº 3 do Código de Processo Civil, não podemos, em conclusão, concordar com a posição jurisprudencial que defende o indeferimento total. Em cada caso, ou processo, o indeferimento será parcial ou total, consoante a origem das dívidas relativamente às quais houve recurso ao procedimento de injunção.».
Neste particular, face ao princípio do máximo aproveitamento dos actos presente no direito adjectivo português relativamente a nulidades, erros ou outros vícios de natureza processual, impõe-se a utilização do título obtido na parte remanescente porquanto o mesmo é válido e encontra-se apenas parcialmente viciado pela inclusão de um pedido não admissível e todos os outros aos quais foi conferida força executiva são aproveitáveis em nome das regras da economia processual e da proporcionalidade e no carácter tendencialmente definitivo da decisão administrativa não impugnada (neste sentido cfr. os acórdãos da Relação de Évora proferido no processo 2274/20.1T8ENT.E1 em 15.09.2022 (Rel. Tomé Carvalho); da Relação do Porto de 8.11.2022 no processo 901/22.5T8VLG-A.P1 (Rel. Alexandra Pelayo); da Relação de Lisboa de 24 de Outubro de 2024 (Rel. Eduardo Petersen Silva).
Destafeita, procede parcialmente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida na parte em que conheceu oficiosamente da excepção dilatória inominada de uso indevido do procedimento de injunção quanto à factura relativa à indemnização por incumprimento do prazo de duração do contrato e quanto à quantia reclamada a título de “Outras quantias” com a necessária repercussão nas quantias de juros vencidos pedidos, mas não se confirma a decisão quanto ao indeferimento da execução relativamente às demais quantias dadas à execução e sobre as quais foi obtida a fórmula executiva.
Em suma, esta pretensão que extravasa o objecto contratual admissível nos procedimentos de injunção, dá origem a uma excepção dilatória inominada e isso implica que na parte referente ao montante de «€463,06 a titulo de indemnização por encargos com cobrança da divida» e «€ 1.126,77 correspondente ao valor relativo à cláusula penal», a decisão de rejeição da execução seja mantida, mas na parte restante a recorrente dispõe de um título válido e suficiente para prosseguir a acção executiva.
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IV- Decisão
Por tudo o exposto, acorda-se em conceder parcial provimento ao recurso e em consequência:
- confirmar a decisão recorrida na parte em que conheceu oficiosamente da excepção dilatória inominada de uso indevido do procedimento de injunção quanto à factura relativa à cláusula penal (€ 1.126,77 - indemnização por incumprimento do prazo de duração do contrato) e quanto à quantia reclamada a título de “Outras quantias” (€463,06), e bem assim quanto aos valores reclamados a título de juros vencidos dessas quantias;
- revogar a decisão recorrida na parte em que indeferiu a execução e absolveu a executada relativamente às demais quantias dadas à execução e sobre as quais foi obtida a fórmula executiva.
Custas do presente recurso a cargo da recorrente na proporção do respectivo decaimento, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Registe e notifique

Lisboa, 24.04.2025
Elsa Melo
Gabriela de Fátima Marques (com voto de vencido)
Anabela Calafate

Voto de vencida:
No requerimento executivo a exequente junta como título executivo um requerimento injuntivo ao qual foi aposto fórmula executória por ausência de contestação, e refere que “(…)o Rte obrigou-se a prestar os bens e serviços solicitados pelo Rdo, e este obrigou-se a efetuar o pagamento tempestivo das faturas, a devolver com a cessação do contrato os equipamentos da Rte e a manter o contrato pelo período acordado, sob pena de, não o fazendo, ser responsável pelo pagamento de cláusula penal convencionada para a rescisão antecipada do contrato”, alude ás facturas em dívida, respectivas datas, concluindo por um valor a título de capital de € 2.315,28. Refere ainda que: “Mais, é o Rdo devedor à Rte de €463,06, a título de indemnização pelos encargos associados à cobrança da dívida”.
Por despacho foi dado o contraditório à requerente, anunciando-se a possibilidade de existir um uso indevido do procedimento injuntivo, susceptível de integrar excepção dilatória inominada e vício na formação do título executivo, referindo-se que tal inquina todo o título executivo. Alude-se em tal despacho que a execução tem na sua base um “requerimento de injunção ao qual foi aposta força executiva por secretário de justiça, nos termos da qual vem peticionado, além do valor das prestações alegadamente em dívida (relativas ao cumprimento do/s contrato/s celebrado/s com o/a executado/a), o valor cláusula penal convencionada para a rescisão antecipada do contrato e da indemnização pelos encargos associados à cobrança da dívida”.
Em resposta veio a exequente juntar as facturas, sendo que a última corresponde à cláusula penal no valor de 1.126,00€, mas no requerimento também sustentou que pode pedir tal cláusula em injunção, refere que tal não é de conhecimento oficioso, pede o indeferimento parcial quanto a tal valor e, à cautela, até desiste da execução nessa parte.
Resulta do requerimento injuntivo que relativamente a todas as facturas peticionadas na injunção, contou juros, à taxa de 8% , sendo que nesta execução com base em tal título, formula o pedido total exequendo tendo por base o capital e juros constante na injunção, dizendo que o valor em dívida é de 3.399, 89€, a que acrescem juros de mora vencidos e vincendos, contabilizados à taxa legal comercial desde a data de entrada da injunção até efectivo e integral pagamento, à taxa de 5% ao ano, calculados sobre o título executivo desde a data de aposição da fórmula executória até efectivo e integral pagamento.
Logo, formula pedido de pagamento de juros desde a data da aposição da fórmula executória, considerando o valor total onde inclui a clausula penal, com taxa de juros de 8% devidos desde a data de vencimento da factura, a 4/10/2022, bem como o valor devido pelas despesas de cobrança igualmente com juros, mas desde a data da aposição da fórmula executória nos termos sobreditos.
Manifestamente mais de metade do pedido na injunção é relativo a tais valores.
Foi com estas premissas que ocorreu o indeferimento da execução, ou seja, considerando que “consta peticionado o pagamento de valores correspondentes, além do mais, a cláusula penal convencionada para a rescisão antecipada do contrato e indemnização pelos encargos associados à cobrança da dívida.”.
Ora, como bem se afirmou neste Tribunal e secção, em Acórdão proferido a 20/02/2025 (Proc. nº19396/21.4T8SNT.L1 ) Relator: Nuno Gonçalves( in Sumários TRL): - Não é de admitir o uso do procedimento de injunção para reclamar o pagamento de quantia relativa a indemnização devida no âmbito contratual;(…)- Não constando do título executivo apresentado pela exequente o montante devido a título de indemnização, não é possível afirmar "a exequibilidade parcial do título dado à execução e determinada a continuação da execução para cobrança das obrigações pecuniárias directamente emergentes do contrato celebrado entre as partes".
Outrossim, em posição que também assumimos, foi entendimento seguido no Acórdão desta mesma secção e Tribunal, no proc. nº 11554/24.6T8SNT.L1-6 (Adeodato Brotas), de 6/03/2025, que: ”O uso indevido do procedimento de injunção consubstancia um vício que implica a inexequibilidade do título e, por conseguinte, afecta a possibilidade de obtenção coerciva de todas as quantias que a exequente pretendia alcançar. Não há título executivo válido, não pode haver execução (nulla executio sine titulo).”.
Com efeito, no artº 14º-A nº 2, al. a), do DL 269/98, o legislador não elegeu o erro da forma de processo, mas antes uma excepção “nova” dilatória, agora nominada, uso indevido do procedimento de injunção, ao lado das outras excepções dilatórias de conhecimento oficioso. Logo, relativamente a esta seguir-se-á o regime geral quanto às excepções dilatórias, existindo assim, indeferimento total. (igual entendimento, foi seguido, entre outros, também referidos na decisão recorrida, no Acórdão desta Relação e secção de 05/12/2024- Proc. nº50425/22.3YIPRT.L1, Maria Teresa Mascarenhas Garcia).
Em conclusão, confirmaria a decisão recorrida.
Gabriela de Fátima Marques