REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
RESIDÊNCIA ALTERNADA
Sumário

I – A residência alternada deixou de ser encarada, designadamente em termos jurisprudenciais, como um modelo a evitar, que só excepcionalmente deve ser adoptado, ou cujos méritos só se podem verificar a partir de determinada idade da criança, para, cada vez mais, ser encarada como um modelo que deve ser considerado independentemente da idade do descendente e da existência de acordo entre os progenitores, em virtude de ser aquele que, em cenário de separação conjugal, melhor permite que a criança mantenha relações afectivas próximas com ambos os progenitores e melhor respeita o princípio da equiparação do papel parental do homem e da mulher no plano familiar e da criação dos filhos.
II – Independentemente, porém, do mérito que se reconheça ao modelo de residência partilhada, considera-se fundamental que, perante cada caso, se afastem pré-juízos, pois, mesmo quando há uma relação afectiva sólida do menor com os dois pais e estes revelam as melhores competências parentais, a residência partilhada só deve ser adoptada quando corresponder ao superior interesse da criança, podendo haver sempre circunstâncias concretas que a desaconselhem.
III – É importante, por isso, ponderar cuidadosamente elementos como a solidez do vínculo afectivo existente entre a criança ou jovem e cada um dos seus pais, as competências parentais destes e as condições de que disponham para acolher os filhos, a sua disponibilidade para acompanhar a educação quotidiana dos descendentes e a retaguarda de apoio de que se possam socorrer para exercer todas as tarefas que isso envolve, a capacidade dos pais para cooperarem entre si e ajustarem as estratégias educativas que melhor sirvam os interesses dos filhos, as distâncias entre as residências dos progenitores e entre estas e a dos locais das principais actividades formativas dos menores, bem como todos os demais aspectos relevantes para aferir qual o modelo de residência que, em cada caso concreto, minora os efeitos adversos que decorrem da separação ou da ruptura de laços entre os progenitores das crianças ou jovens e melhor contribui para o bem-estar e o crescimento harmonioso destes.

Texto Integral

PROC. 4194/24.1T8VFR-A.P1


Relator: José Nuno Duarte; 1.ª Adjunta: Fernanda Almeida; 2.º Adjunto: Nuno Marcelo de Nóbrega dos Santos de Freitas Araújo.








Acordam os juízes signatários no Tribunal da Relação do Porto:





I – RELATÓRIO



AA requereu providência tutelar cível contra BB, para regulação do exercício das responsabilidades parentais do filho de ambos CC, nascido em ../../2019.
Alegou, em suma, que cessou em Junho de 2024 uma relação análoga à dos cônjuges com o requerido, da qual nasceu o menor CC. Desde a separação que a criança reside consigo. Ambos os progenitores do CC trabalham por turnos, com descansos semanais variáveis, pelo que a requerente sempre teve e continua a ter o apoio e auxílio dos seus pais, com quem actualmente reside. Mais refere que o requerido nem sempre contribui, na proporção de 50%, para pagamento das despesas relacionadas com o filho. Conclui, propondo que, no âmbito da regulação do exercício das responsabilidades parentais da criança, seja fixada a residência desta junto de si, com convívios com o progenitor nos dias e noites de folga do mesmo, sempre que este assim o queira, sem prejuízo das suas obrigações escolares.
O progenitor veio exercer contraditório, afirmando reconhecer a necessidade de regulação do exercício das responsabilidades parentais do filho, mas não concordar com a fixação da residência da criança somente com a progenitora, por tal implicar um afastamento dela do seu progenitor, desnecessário e prejudicial para o seu crescimento. Mais alegou que sempre contribuiu com o pagamento de metade das despesas do filho que lhe foram apresentadas pela mãe e que sempre manifestou disponibilidade para estar com o mesmo, sendo sua pretensão conviver mais assiduamente com ele, o que não tem acontecido apenas devido a obstáculos colocados pela progenitora. Requereu, por isso, que se fixe a residência da criança com ambos os progenitores, em regime de residência alternada, mais propondo que o filho fique aos seus cuidados quando está em horário laboral das 9.00 às 15.00 horas.
Foi realizada conferência de progenitores na qual não foi possível alcançar acordo entre os progenitores, por ambos manterem as posições acima referidas.
Nessa sequência, o Ministério Público promoveu a fixação de um regime provisório de exercício das responsabilidades parentais da criança CC regido pelos seguintes termos:
- O CC fixará residência com a progenitora, a qual reside com os avós maternos;
- As questões de particular importância para a vida do menor serão exercidas por ambos os progenitores;
- Os convívios com o progenitor ocorrerão nos dias de folga do progenitor, as quais são variáveis e sem cadência regular, e nos períodos de domingo em que só trabalhe de manhã, a ocorrer no período da tarde, a partir das 15:00 horas e até às 21:00 horas;
- O progenitor deverá recolher o CC na creche no final das atividades, e nos dias em que não exista creche pelas 09:00 horas no local onde se encontrar, devendo entregá-lo na residência da mãe até às 21:00 horas;
- O progenitor deverá ficar obrigado a uma prestação de alimentos no montante de 125,00€, comparticipando ainda em 50% das despesas de saúde e de educação do filho.
A mãe do menor afumou nada ter a requerer quanto a esta promoção.
O pai, por sua vez, declarou o seguinte: “O progenitor, para além da proposta apresentada pela Digníssima Magistrada do Ministério Público, gostaria ainda de ver comtemplado no regime provisório a possibilidade de o menor pernoitar na sua residência nos dias em que o mesmo labora no período das 09:00 às 15:00 horas, ou noutro em comum acordo com os progenitores. Para tal seria necessária a anuência da progenitora em contratar o prolongamento na creche a nível de horário, assumindo o progenitor qualquer despesa acrescida que tal implique, uma vez que, conforme já aqui demonstrado, o menor tem pernoitado, razão pela qual, com o devido respeito, não se afigura razão suficiente para alterar ou regredir esse convívio já alcançado, pedindo a V. Exa. melhor atenção”.
Após, a Juiz titular do processo suspendeu a conferência de pais e remeteu as partes para os Serviços Públicos de Mediação Familiar, ao abrigo do disposto nos art.os 38.º, al. a) e 24.º do RGPTC, e ordenou que os autos lhe fossem conclusos para proferir decisão quanto ao regime provisório do exercício das responsabilidades parentais da criança CC, o que veio a acontecer, através de despacho proferido em 21-01-2025, no qual foi definido o seguinte:
(Exercício de Responsabilidades Parentais e Residência)
1.º - O CC fixa residência com ambos os progenitores, com alternância semanal, com troca ao sábado de manhã, pelas 10horas da manhã, em casa do progenitor onde a criança se encontre, cabendo ao progenitor que irá iniciar a semana com o filho ir buscá-lo a casa do progenitor onde o mesmo se encontrar.
Cada um dos progenitores poderá estar com o filho na semana em que o mesmo esteja com o outro progenitor, indo buscar o CC ao estabelecimento de infantário e entregando-o no dia seguinte no mesmo estabelecimento no final e início das atividades, respetivamente, em dia concreto a acordar com o outro progenitor, com antecedência de, pelo menos, dois dias.
As entregas e recolhas da criança podem ser delegadas nos termos previstos no artigo 1906.º, n.º 4 do Código Civil.
Caso por razões laborais do progenitor/pai seja necessário contratar período de prolongamento no estabelecimento escolar para o período da mesma, caberá ao mesmo suportar em exclusivo o pagamento de tal custo.
(Férias e Festividades)
2.º- Nas férias de Verão o CC passará 15 dias consecutivos com cada um dos progenitores, em data a indicar até ao dia 31 de maio; no caso de existir coincidência entre os dias pretendidos pelo Pai e pela Mãe para o gozo de férias com a criança, nos anos pares escolhe a progenitora, nos anos ímpares escolhe o progenitor.
Caso o progenitor ou a progenitora se ausente de casa por motivo de férias, o progenitor ou a progenitora poderá falar todos os dias, por telefone, com o filho, entre as 18horas e as 19horas.
3.º- Nas festividades de Natal e Ano Novo, compreendendo o horário da Véspera desde as 16h até às 12h do dia seguinte, e o dia desde as 12h até às 21h30, serão passados de forma alternada com cada um dos progenitores e alternado entre o Natal e o Ano Novo, iniciando-se neste ano de 2024 a véspera de Natal com a progenitora e a véspera do Ano Novo com o progenitor.
4.º-No dia de aniversário do CC, o mesmo fará uma refeição com cada um dos progenitores, de forma alternada.
(Alimentos)
5.º-Cada um dos progenitores providenciará pelo sustento do CC nas semanas em que esteja consigo.
Os progenitores comparticiparão na proporção de metade nas despesas de saúde, médicas, medicamentosas, aquisição de livros e material escolar, refeições escolares e atividades extracurriculares, quanto a estas desde que a frequência seja de acordo de ambos os progenitores.
Caberá, porém, o pagamento em exclusivo ao progenitor o custo por eventual contratação de prolongamento de horário no estabelecimento escolar no período da manhã ou no período da tarde.
O progenitor que realizará a despesa deverá enviar o comprovativo de tal despesa no prazo de dez dias a contar da realização da despesa e o valor da comparticipação deverá ser pago pelo outro progenitor no prazo de dez dias a contar do comprovativo, por via de transferência bancária.

-

O Ministério Público, não se conformando com esta decisão, veio recorrer da mesma, apresentado alegações motivadas que finalizaram com as seguintes conclusões:
(…)
-
A requerente, mãe do menor CC, apresentou alegações de recurso, formulando, no final das mesmas, as seguintes conclusões:
(…)
-
O progenitor do menor CC também apresentou alegações, nas quais pugnou pela improcedência de recurso, formulando, no final, as seguintes conclusões:
(…)
-
O recurso foi admitido por despacho, que, correctamente, o classificou como sendo de apelação e lhe atribuiu efeito meramente devolutivo, ordenando a sua subida imediata a este Tribunal da Relação, em separado dos autos principais.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

***



II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Considerando que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos recorrentes, sem prejuízo da apreciação por parte do tribunal ad quem de eventuais questões que se coloquem de conhecimento oficioso, bem como da não sujeição do tribunal à alegação das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (cf. artigos 5.º, n.º 3, 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código do Processo Civil), há apenas uma questão a tratar:
→ aferir se a fixação de um regime de residência alternada com os dois progenitores, em sede de regulação provisória do exercício das responsabilidades parentais da criança CC, é a solução que melhor se adequa ao superior interesse da criança, ou se a residência da criança deve ser fixada em casa da mãe, com definição de um regime de visitas que assegure o seu convívio próximo com o pai e o pagamento por este de uma pensão de alimentos.
***


III – FUNDAMENTAÇÃO

A) Dos factos
Para a decisão a proferir, há que atender, ante a ausência de qualquer impugnação no âmbito do recurso interposto, aos factos que foram expressos na decisão recorrida, a saber:
1) CC nasceu no dia ../../2019 e está registado como filho de BB e de AA.
2) Os progenitores do CC estão separados há cerca de 6 meses (desde meados de 2024).
3) Após a separação dos pais, o CC passou a residir com a progenitora em casa dos avós maternos.
4) Após a separação dos pais, o CC convive com o progenitor somente nos dias de folga do progenitor, dormindo em casa do progenitor.
5) A progenitora do CC trabalha como auxiliar no Centro Hospitalar ..., auferindo mensalmente cerca de 900,00€. Trabalha por turnos, entre as 8:00 e as 14:30 horas, as 14:00 e as 20:30 horas e 20:00 e as 8:30 horas. Os turnos normalmente são divulgados ao dia 21 ou 22 de cada mês. Costuma cruzar o seu horário mensal com o progenitor.
6) A progenitora do CC reside com os seus pais. Nesta habitação tem um quarto para o CC. Ajuda os seus pais no pagamento das despesas mensais, o que ascende a cerca de 300,00€.
7) Durante a vivência em casal, o progenitor sempre assumiu e prestou cuidados ao filho CC, designadamente quando a depoente trabalhava no período da noite, o filho ficava sempre aos cuidados do pai.
8) O progenitor reside em ..., numa habitação de tipologia T2. Vive com a companheira e filha desta, de seis anos de idade, que reside com o pai em regime de residência partilhada, com alternância semanal.
9) A companheira do progenitor trabalha, mas não por turnos.
10) O progenitor do CC irá adquirir imóvel em compropriedade com a companheira, com encargo bancário mensal de €700,00.
11) Em ambos os imóveis (no que reside atualmente e no que irá adquirir) há um quarto para o CC.
12) A distância entre a casa do progenitor e o estabelecimento de infantário frequentado pelo CC demora cerca de 25 minutos a percorrer, da nova casa a adquirir pelo progenitor a distância será menor.
13) A distância entre a casa do progenitor e a casa da progenitora do CC demora cerca de 28 minutos a percorrer.
14) O progenitor assegura todos os cuidados ao filho e o CC gosta de estar com o pai em sua casa.
15) O CC tem bom relacionamento com a companheira do pai e filha desta.
16) A progenitora declarou que o filho diz que não gosta de dormir em casa do pai; o progenitor negou e declarou que o filho está bem em sua casa, mesmo durante a noite.
17) Desde que se separou, o progenitor não pagou prestação de alimentos ao filho, referiu que deixou dinheiro em conta bancária do filho.
18) O progenitor paga metade das despesas que a progenitora do CC lhe envia, nomeadamente refeições da escola, despesas de saúde
19) O progenitor do CC é vigilante no supermercado A..., atualmente em ..., e aufere mensalmente o salário de €1 200,00 a €1 300,00. Trabalha por turnos das 9h as 15h e das 15h às 22horas.

Inexistem factos não provados.

B) Do direito
As responsabilidades parentais comportam especificidades jurídicas complexas, em que avultam poderes funcionais, ao lado de deveres puros e simples, que, todos eles, se apresentam como irrenunciáveis e intransmissíveis em razão de o respectivo exercício se basear na ideia altruísta de acorrer ao interesse dos filhos, tendo em vista o seu integral e harmonioso desenvolvimento físico, intelectual e moral (cf. artigos 1874.º, 1878.º, 1882.º e 1885.º e seguintes, todos do Código Civil).
Assim, a partir da enunciação genérica do conteúdo das responsabilidades parentais que consta do artigo 1878.º, n.º1, do Código Civil – nos termos da qual “compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los ainda que nascituros, e administrar os seus bens” –, haverá sempre que considerar que os poderes/deveres atribuídos aos progenitores têm como contra-pólo aqueles que são os direitos dos menores no contexto familiar, escolar e social, nomeadamente o direito ao desenvolvimento são e normal ao nível psicológico, intelectual, educacional e moral, o direito ao respeito pelas ligações psicológicas e pela continuidade das suas relações afectivas, o direito a uma formação física, cívica e moral adequada e o direito à salvaguarda da sua intimidade com respeito pelas suas opções e opiniões.
No caso de os progenitores não manterem uma vida em comum, como sucede no caso dos autos, a concretização do interesse dos menores passa pela garantia das condições materiais, sociais, morais e psicológicas imprescindíveis ao seu desenvolvimento estável, à margem de tensões e conflitos que eventualmente oponham os progenitores e que possibilitem o estabelecimento de relações afectivas duradouras com ambos. Por isso, devem ser criadas condições que estimulem e garantam a participação interessada e coordenada de ambos os progenitores no acompanhamento e educação dos menores, assumindo particular relevância a repartição do exercício das responsabilidades parentais.
Deste modo, há que promover, antes de mais, o acordo entre os progenitores e apenas quando não se lograr alcançar um entendimento que, por corresponder ao interesse dos menores, mereça a homologação do tribunal é que se deve avançar para a decisão judicial que regule o exercício das responsabilidades parentais – cf. artigo 1905.º, n.º 2 do Código Civil. Tal regulação passa, no essencial, pela definição das seguintes matérias:
a) titularidade do exercício das responsabilidades parentais, a qual, de acordo com o disposto no artigo 1906.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil, deve caber, por norma, a ambos os progenitores, em regime de comunhão, só se admitindo que fiquem a cargo de um deles quando, fundadamente, se julgar que o exercício em comum das responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho é contrário aos interesses deste [1].
b) residência do filho, sede em que pode ser acolhido um modelo de ‘residência única’ (em que a criança ou jovem fica a residir com um dos progenitores) ou um modelo de ‘residência alternada’ (no qual a criança ou jovem divide o seu tempo entre as residências de ambos os progenitores, de forma tendencialmente igualitária), sem prejuízo de, em casos excepcionais, a residência do menor poder ser fixada junto de instituição ou de pessoa que não os pais.
c) convívios do filho com o progenitor com quem não esteja a residir (os quais devem, tanto quanto possível, promover a manutenção de uma relação de grande proximidade da criança ou jovem com o progenitor em causa, sem prejuízo das situações excepcionais em que os contactos sejam lesivos do bem-estar da criança, designadamente quando ocorram situações de abuso físico ou sexual, de maus-tratos ou de violência doméstica).
d) prestação de alimentos para o sustento, segurança, saúde e educação da criança ou jovem, o que, atentos os deveres de contribuição que incumbem a ambos os progenitores, implica, normalmente, a fixação de uma pensão de alimentos a cargo do progenitor com quem o menor não esteja a residir habitualmente. Nos casos de residência alternada, pode haver lugar também à fixação de uma pensão de alimentos, designadamente devido a eventuais diferenças das condições socioeconómicas dos progenitores ou a outras particularidades que se revelem na situação concreta, sem prejuízo de isso também poder não acontecer, uma vez que ambos os progenitores, tendencialmente, incorrerão em despesas com o menor de valor semelhante.
No caso sub judice, por não se ter logrado obter um entendimento entre os pais do menor CC na conferência prevista no artigo 35.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 8 de Setembro (RGPTC), o tribunal a quo, em conformidade com o previsto no artigo 38.º da mesma lei, proferiu decisão provisória sobre o pedido de regulação do exercício das responsabilidades parentais dessa criança, nos termos da qual ficou estabelecido, em resumo, que:
· as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores;
· a criança residirá com ambos os progenitores, com alternância semanal, com troca ao sábado de manhã, pelas 10.00 horas da manhã, em casa do progenitor onde a criança se encontre;
· cada um dos progenitores poderá estar com o filho na semana em que o mesmo esteja com o outro progenitor, indo busca-lo ao estabelecimento de infantário e entregando-o no dia seguinte no mesmo estabelecimento no final e início das actividades, respectivamente, em dia concreto a acordar com o outro progenitor;
· Nas férias de Verão, a criança passará 15 dias consecutivos com cada um dos progenitores e, nas festividades de Natal e Ano Novo, passará de forma alternada com cada um dos mesmos o período compreendido entre as 16h da véspera da festividade em causa e as 12h do dia seguinte, e o período subsequente compreendido entre as 12h e as 21h30 do dia da festividade;
· cada um dos progenitores providenciará pelo sustento do filho nas semanas em este que esteja consigo, comparticipando ambos, na proporção de metade, nas despesas de saúde, médicas, medicamentosas, aquisição de livros e material escolar, refeições escolares e de actividades extracurriculares da criança (quanto a estas desde que a frequência seja de acordo de ambos os progenitores), cabendo, porém, ao progenitor o pagamento em exclusivo do custo por eventual contratação de prolongamento de horário no estabelecimento escolar frequentado pela criança.
No presente recurso, o Ministério Público pugna pela revogação desta decisão, fundamentalmente, porque considera que o regime de residência alternada que foi fixado não é concordante com o superior interesse e com as actuais necessidades do menor CC e se revela, até, prejudicial para o seu desenvolvimento equilibrado (sendo violado, por isso, o vertido no artigo 1906.º, n.ºs 5, 6 e 8 do Código Civil). Para tal, lança mão, em síntese, dos seguintes argumentos:
- uma vez que os dois progenitores prestam o seu trabalho por turnos rotativos, sem folgas fixas, a decisão de uma residência semanal alternada determina alterações significativas e constantes nos hábitos da criança, por esta ter de se adaptar a diferentes rotinas, em função dos diferentes horários laborais dos progenitores que são semanalmente alterados;
- existem dificuldades do progenitor em assumir com efectividade o regime de residência alternada semanal fixada, já que, para cumprir com as suas responsabilidades parentais, terá que recorrer a soluções que “não só não assentam em elementos dos autos, como são elas próprias geradoras da instabilidade que se quer evitar e potenciam o afastamento da figura da progenitora de uma criança com cinco anos”;
- diferentemente, residindo com a mãe, como actualmente acontece, a criança beneficia, para além do mais, da retaguarda de apoio próxima que é assegurada pelos seus avós maternos, com os quais a progenitora do menor reside e que auxiliam esta nos cuidados que, nas suas ausências laborais, devem ser prestados ao CC;
- a criança irá enfrentar na casa do progenitor um quadro habitacional menos adequado, pois, num momento em que este reside com a sua companheira e a filha desta numa casa com apenas dois quartos, o agregado passará, nas semanas de residência alternada, a ser habitado por quatro pessoas.
Neste contexto, defende o Ministério Público que a solução que melhor salvaguarda o superior interesse da criança CC, face às suas actuais necessidades de estabelecimento de rotinas diárias com hábitos, actividades e tarefas estruturadas, é a fixação da sua residência com a respectiva progenitora, situação que “deve ser acompanhada de um regime convival que assegure a sucessiva aproximação da criança com o seu progenitor, devendo os convívios, a título provisório, ocorrer nos dias de folga daquele” e que deve levar, ainda, a que o progenitor fique provisoriamente “obrigado a uma prestação de alimentos no montante de € 125,00 e à comparticipação em 50% das despesas de saúde e de educação”.
Incidindo a discordância de fundo no Ministério Público no facto de ter sido provisoriamente decidida a fixação para a criança CC de um regime de residência alternada, cumpre observar que, na nossa lei, as condições em que o tribunal pode decretar residência alternada de crianças e jovens, em caso de divórcio ou separação, encontram-se definidas no n.º 6 do artigo 1906.º do Código Civil, cujo teor é o seguinte: “[q]uando corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes, o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores, independentemente de mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação da prestação de alimentos”. Esta norma foi aditada ao artigo 1906.º pela Lei n.º 65/2020, de 4-11, tendo, após desenvolvidos debates legislativos, tido como principais virtualidades a dissipação de dúvidas que pudessem haver quanto à possibilidade de o tribunal determinar que a criança ou jovem divida o seu tempo entre as residências de ambos os progenitores, de forma tendencialmente igualitária, e a clarificação de que este regime não depende do acordo dos progenitores (ou seja, pode ser fixado mesmo que um dos progenitores, ou até ambos, não concordem com o mesmo) e, também, de que a decisão de residência alternada não prejudica a possibilidade de fixação de uma pensão de alimentos. Todavia, os seus efeitos práticos não foram significativos, pois já era aceite de forma generalizada que o anterior n.º 7 do artigo 1906.º (que passou a ser o n.º 8) permitia que os tribunais determinassem a residência alternada do filho com cada um dos progenitores e, não obstante os debates havidos, não foi acolhida a proposta legislativa de tornar a residência alternada o regime preferencial em matéria de regulação das responsabilidades parentais. Desta forma, a lei, ao estabelecer que o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores, quando corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes, continuou a relegar nos tribunais a tarefa de, com base em conceitos bastante amplos e genéricos, aferir qual o modelo de residência que melhor se adequa a cada caso concreto.
Não obstante, a alteração legislativa de 2020 não deixou de constituir mais um passo no caminho que vem sendo trilhado na área do direito da família para acompanhar as profundas alterações que, desde as últimas décadas do século XX, se vêm verificando ao nível dos paradigmas da organização da sociedade e das famílias, muito especialmente daqueles que se relacionam com as dinâmicas das relações interpessoais e com os papéis dos pais na assistência, educação e acompanhamento dos filhos. Sob este enquadramento, a residência alternada deixou de ser encarada, designadamente em termos jurisprudenciais, como um modelo a evitar, que só excepcionalmente deve ser adoptado, ou cujos méritos só se podem verificar a partir de determinada idade da criança, para, cada vez mais, ser encarada como um modelo que deve ser considerado independentemente da idade do descendente e da existência de acordo entre os progenitores, em virtude de ser aquele que, em cenário de separação conjugal, melhor permite que a criança mantenha relações afectivas próximas com ambos os progenitores e melhor respeita o princípio da equiparação do papel parental do homem e da mulher no plano familiar e da criação dos filhos [2]. Não há soluções perfeitas e, obviamente, a residência alternada tem também desvantagens, fundamentalmente relacionadas com a menor estabilidade do quadro de vida das crianças e jovens e da maior exposição destes a problemas decorrentes das inevitáveis alterações de rotinas e, até, de eventuais desconformidades dos seus padrões educativos quotidianos. Todavia, conforme já se afirmava em 2006 no Ac. RL 14-11-2006, proc. 3456/2006-8 [3], também “[n]ão se deve exagerar o facto de representar inconveniente para a criança a mudança de residência pela instabilidade criada, considerando que a instabilidade é uma realidade presente e futura na vida de qualquer criança com pais separados e, por outro lado, na realidade o que a criança adquire são duas residências cada qual com as suas características próprias, que permitem o contacto mais constante e efectivo com os dois pais, não devendo esquecer-se a extraordinária adaptabilidade das crianças a novas situações”.
Independentemente, porém, do mérito que se reconheça ao modelo de residência partilhada, considera-se fundamental que, perante cada caso, se afastem pré-juízos, pois, mesmo quando há uma relação afectiva sólida do menor com os dois pais e estes revelam as melhores competências parentais, a residência partilhada só deve ser adoptada quando corresponder ao superior interesse da criança, podendo sempre haver circunstâncias concretas que a desaconselhem. Daí a importância de, tanto quando esteja em causa a regulação provisória como a regulação definitiva do exercício das responsabilidades parentais, sopesar o conjunto mais alargado de dados de que se disponha, ponderando-se elementos como a solidez do vínculo afectivo existente entre a criança ou jovem e cada um dos seus pais, as competências parentais destes e as condições de que disponham para acolher os filhos, a sua disponibilidade para acompanhar a educação quotidiana dos descendentes e a retaguarda de apoio de que se possam socorrer para exercer todas as tarefas que isso envolve, a capacidade dos pais para cooperarem entre si e ajustarem as estratégias educativas que melhor sirvam os interesses dos filhos, as distâncias entre as residências dos progenitores e entre estas e a dos locais das principais actividades formativas dos menores, bem como todos os demais aspectos relevantes para aferir qual o modelo de residência que, em cada caso concreto, minora os efeitos adversos que decorrem da separação ou da ruptura de laços entre os progenitores das crianças ou jovens e melhor contribui para o bem-estar e o crescimento harmonioso destes.
Analisada a decisão recorrida, verifica-se que a definição do regime de residência alternada para o menor CC foi objecto de cuidada ponderação conforme resulta dos seguintes excertos: «No que concerne à residência da criança, as partes divergem, sendo que a progenitora defende que a criança deve fixar residência consigo, alegando que o progenitor não dispõe de família de retaguarda que o auxilie nas ausências laborais face ao facto de trabalhar por turnos e, por sua vez, o progenitor defende que a criança deve fixar residência com ambos os progenitores dispondo de tempo, disponibilidade e capacidade no período em que trabalha no horário diurno para cuidar do filho. / Ambos reconhecem competências parentais ao outro progenitor, bem como relação de afeto da criança com ambos os progenitores. / A distância da residência do progenitor ao estabelecimento de ensino da criança demora cerca de 25 a 30 minutos a percorrer, distância que não é relevante e não prejudica a criança. / Ambos os progenitores dispõem de condições habitacionais para receber e acolher o CC. (…) O CC tem cinco anos de idade e sempre recebeu cuidados do pai. / O progenitor tem capacidade, disponibilidade e quer prestar cuidados ao filho em condições de igualdade com a progenitora. (…) É certo que a progenitora referiu que o filho lhe disse que não gosta de dormir em casa do pai, porém tal não foi confirmado pelo progenitor, que o negou e, por sua vez, a idade da criança não permite ainda concluir que tenha maturidade suficiente para que a sua alegada vontade veiculada à progenitora seja suficiente para afastar na ponderação da decisão em causa as vantagens supra elencadas quanto à residência da criança com ambos os progenitores / Nada se apurou, pelo contrário, que o progenitor não seja capaz de prestar os cuidados ao CC e satisfazer as suas necessidades físicas, psíquicas e emocionais. / Conforme resultou das próprias declarações da progenitora era o progenitor que cuidava do CC nos períodos de trabalho noturno da mãe. / Não há razão para impedir pernoitas da criança com o progenitor, pernoitas que aliás continuaram a ocorrer mesmo após a separação, com as quais a progenitora concorda, conforme resulta da proposta que apresentou ao Tribunal.». Mais se evidencia que foi com base nessa ponderação que o tribunal a quo chegou à conclusão de que “[n]ão há nenhuma razão para que a criança não resida com ambos os progenitores em condições de igualdade” e para que, subsequentemente, aderindo à posição da doutrina e da jurisprudência que vê vantagens na fixação, em contexto de separação dos progenitores, do regime de residência partilhada, tivesse tomado a decisão de estabelecer o regime provisório de exercício de responsabilidades parentais que contempla o modelo de residência relativamente ao qual o Ministério Público veio, no presente recurso, manifestar discordância.
Cumprindo agora apreciar de forma mais directa as razões invocadas pelo recorrente, Ministério Público, constata-se que a principal crítica tecida em relação à decisão tribunal a quo se relaciona com a instabilidade que o modelo de residência alternada causará nas rotinas quotidianas da criança, já que, num quadro em que os seus dois progenitores prestam o seu trabalho por turnos rotativos, sem folgas fixas, a mesma será confrontada com bastantes alterações de horários que, necessariamente, afectarão a tranquilidade do seu dia-a-dia e prejudicarão o equilíbrio e a harmonia do seu crescimento. Acontece, no entanto, que a necessidade de a criança se adaptar às modificações decorrentes das frequentes mudanças de residência e das diferenças dos horários dos seus progenitores é, como já se referiu, uma contingência própria do modelo de residência alternada, o que, por si só, não impede que este modelo se revele, em concreto, o que melhor corresponda ao superior interesse da criança, já que, logrando os progenitores proporcionar ao descendente um quadro de vida sadio, equilibrado e desprovido de conjunturas fracturantes, será possível a esta manter laços afectivos fortes com ambos e crescer inserida num contexto de vida em que sente bem sob o cuidado dos dois e com o qual se identifica, reconhecendo como seu tanto a casa materna, como a casa paterna. Ademais, no caso sub judice, existe até uma equiparação entre a situação dos dois progenitores no que respeita à variabilidade dos horários disponíveis para acompanhar o filho de forma mais próxima, já que, trabalhando ambos por turnos, tanto um como o outro se confrontam com iguais dificuldades em garantir a constância das rotinas do descendente. Esta realidade, porém, conduz-nos já para a questão da retaguarda de apoio de que cada um dos progenitores dispõe, bastante enfocada também pelo Ministério Público ao nível das razões da sua discordância com a decisão do tribunal a quo.
Com efeito, para sustentar que não deve ser adoptado um regime de residência alternada, o Ministério Público argumentou também que a criança, residindo com a mãe, beneficia do apoio próximo dos seus avós maternos, em casa de quem ambos vivem, o que contrasta com as soluções que o progenitor da criança é capaz de oferecer para suprir os seus impedimentos, por motivos laborais, as quais, segundo a alegação recursória, “não só não assentam em elementos dos autos, como são elas próprias geradoras da instabilidade que se quer evitar e potenciam o afastamento da figura da progenitora de uma criança com cinco anos”.
Sem dúvida que emerge dos autos que a mãe do menor CC, não obstante confrontar-se com impedimentos laborais equivalentes aos do progenitor, por residir na habitação dos seus pais (avós maternos da criança) e esta ficar a pouca distância do infantário frequentado pelo filho, dispõe de uma retaguarda de apoio mais próxima do que aquela de que dispõe o progenitor do menor, residente com a sua companheira a uma distância daqueles locais que implica a realização de percursos com uma duração estimada de quase 30 minutos. Esta distância, porém, como bem se assinala na decisão recorrida, sem prejuízo de, obviamente, causar alguns incómodos acrescidos a todos os envolvidos, não é muito significativa, tratando-se, afinal, mais uma consequência da necessidade de assegurar a manutenção de uma relação de grande proximidade da criança com os seus dois progenitores, desiderato cujos benefícios, seguramente, suplantam em muito esse ligeiro desconforto. Nesse sentido, de resto, constata-se que na sentença recorrida, certamente devido às preocupações expressas pelo pai, foi salvaguardada a eventual necessidade de ser contratado o prolongamento do horário de permanência da criança no seu estabelecimento escolar, no período da manhã ou no período da tarde, assumindo o progenitor a integralidade dos custos que isso possa implicar. Por outro lado, em relação à retaguarda de apoio do requerido, o mesmo não reside sozinho, mantendo vivência comum com uma nova companheira que, de acordo com os factos provados, mantém uma ocupação profissional regular sem estar sujeita a horários rotativos. É verdade que não foram desenvolvidas pelo tribunal diligências de instrução destinadas a melhor apurar qual a efectividade do apoio que a companheira do arguido, ou outros elementos do seu quadro familiar, podem prestar ao nível do exercício de algumas tarefas relativas aos actos da vida corrente da criança; todavia, em bom rigor, também não foi feita qualquer avaliação quanto à disponibilidade e à qualidade da retaguarda de apoio que é oferecida pelos avós maternos do menor, baseando-se todas as ilações que, a esse respeito, sejam formuladas naquilo que foi declarado por ambos os progenitores, sendo certo que, no caso em apreço, nenhuma indicação foi dada no sentido de que não estejamos perante elementos atenciosos e disponíveis para participar no processo educativo da criança. Devido a isso mesmo, também não se compreende muito bem o porquê do Ministério Público, nas alegações de recurso, manifestar reservas quanto às passagens da decisão recorrida em que se levantou a possibilidade de os próprios avós maternos do menor, caso isso se revele necessário, apoiarem não apenas a mãe do seu neto, como também o pai deste. Muito menos se compreende a afirmação de que a solução que foi acolhida na decisão recorrida poderá potenciar o afastamento da “figura da progenitora de uma criança com cinco anos”. Tudo quanto emerge dos autos aponta no sentido de que tanto a mãe como o pai do CC são dotados de boas competências parentais, conforme, aliás, foi reconhecido por ambos nas declarações que prestaram e, por isso, não se vislumbram motivos para, nesta sede, se adoptar uma posição de desconfiança quanto à sua capacidade de, sem prejuízo das particularidades da vida de cada um, contribuírem activamente para a manutenção de um ambiente estável em torno do filho e cooperarem para que o crescimento deste se processe num quadro tão harmonioso quanto possível.
Argumentou ainda o Ministério Público que a criança irá enfrentar na casa do progenitor um quadro habitacional menos adequado, já que o mesmo reside com a sua companheira e a filha desta num apartamento de tipologia 2. Com o devido respeito, parece-nos que este é um falso problema. Mais do que nos centrarmos no facto de, ao nível do recurso, não ter sido impugnada a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo – na qual, entre o mais, se refere que tanto no imóvel onde o progenitor da criança reside actualmente, como no que ele irá adquirir, “há um quarto para o CC” –, entendemos que, acima de tudo, se deve enfocar que não transparece dos autos que o quadro habitacional de qualquer dos progenitores seja inadequado. A própria progenitora, no requerimento inicial, expressou não vislumbrar óbices a que a criança pernoitasse algumas noites em casa do pai, como já acontece, nem que ela aí permanecesse durante períodos alargados, designadamente em períodos de férias. De igual forma, nas declarações que prestou, não expressou reservas quanto a essas possibilidades e, mais importante do que tudo, reconheceu competências parentais ao pai do seu filho. Não nos parece, pois, que, face aos elementos existentes nos autos, a realidade habitacional do progenitor da criança seja um obstáculo à definição de um regime de residência alternada, mais se acrescentando que, se não foram apurados dados mais exactos sobre a referida realidade, tal também aconteceu quanto à realidade habitacional da progenitora, relativamente à qual se podem colocar, pertinentemente, idênticas questões.
Aqui chegados, resta-nos apontar aquele que nos parece ser o único aspecto que não foi completamente ponderado ao nível da decisão recorrida: o facto de ter sido fixado para a criança um regime que vai alterar bastante as rotinas a que a mesma está habituada, cujos impactos talvez aconselhassem uma maior preparação e uma implementação mais gradual. Todavia, datando já a decisão de há mais de três meses, tendo sido fixado ao presente recurso efeito meramente devolutivo e emergindo também do próprio teor das alegações apresentadas que, no terreno, já está a ser dada execução àquilo que foi determinado pelo tribunal a quo, afigura-se-nos que, face aos méritos já assinalados do modelo de exercício das responsabilidades parentais implementado, não deve agora haver qualquer inversão no caminho traçado, antes se devendo investir na sua consolidação, sem prejuízo de, paralelamente, se proceder a uma avaliação, tão rigorosa quanto possível, dos seus efeitos. A decisão proferida foi tomada em sede de regulação provisória do exercício das responsabilidades parentais, podendo, por isso, ser alterada a todo o tempo, caso tal se mostre aconselhável. No presente momento, não se vislumbram motivos para que tal aconteça.
Concluindo-se, por tudo quanto foi explanado, que a decisão recorrida deve ser mantida, negando-se provimento ao recurso, cumpre referir ainda que, não obstante o recorrente ser o Ministério Público, face à autonomia tributária do recurso (cf. artigos 1.º, n.º 2 e 6.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais), ter-se-á que imputar a responsabilidade pelo pagamento das custas da presente apelação à requerente, AA, já que a mesma veio apresentar alegações autónomas, terminando vencida na totalidade (cf. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código do Processo Civil).

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III – DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, acorda-se em:
a) negar provimento ao recurso e, consequentemente, confirmar a decisão recorrida;
b) condenar a requerente, AA, no pagamento das custas da apelação.

Notifique.


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SUMÁRIO
(da exclusiva responsabilidade do relator - artigo 663.º, n.º 7, do C.P.C.)
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Porto, 28/4/025

Acórdão datado e assinado electronicamente
(redigido pelo primeiro signatário segundo as normas ortográficas anteriores ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990)


José Nuno Duarte;
Fernanda Almeida;
Nuno Marcelo de Nóbrega dos Santos de Freitas Araújo.



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[1] No que diz respeito às questões da vida corrente da criança, o n.º 3 do artigo 1906.º do Código Civil estabelece que o seu exercício compete ao progenitor com quem a criança se encontrar no momento.
[2] Vide, quanto a esta evolução ao nível da nossa jurisprudência, Nuno Cardoso Ribeiro, A Residência Alternada e a Jurisprudência nos Tribunais da Relação, Faculdade de Direito – Universidade de Lisboa, Novembro de 2019 <URL: https://divorciofamilia.com>.
[3] Rel. Bruto da Costa, <URL: http://www.dgsi.pt/>.