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CONVENÇÃO COLECTIVA
CADUCIDADE
PREMIO DE ANTIGUIDADE
COMPLEMENTO DE PENSÃO DE REFORMA
DIREITOS EM FORMAÇÃO
Sumário
Sucessão de convenções colectivas de trabalho – Denuncia de acordo de empresa – Período de sobrevigência – Caducidade – Pós eficácia – Efeitos normativos das cláusulas do acordo de empresa após a caducidade – Natureza retributiva do prémio de antiguidade – Alteração do regime complementar de reforma – Tutela dos direitos em formação ––Artigo 11.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem – Artigo 6.º da Carta Social Europeia de 1961 (revista em 1996) – Artigo 152.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia – Artigo 28.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia - Artigos 2.º e 56.º da Constituição da Republica Portuguesa – Artigos 129.º n.º 1 – d), 258.º n.º 3, 260.º n.º 1 – c) e n.º 3, 478.º, 501.º e 503.º do Código do Trabalho
Texto Integral
Recorrente/autora AA, titular do número de identificação fiscal ..., residente na ...
Recorrido/réu Sindicato da Banca, Seguros e Tecnologias - mais sindicato, (anteriormente Sindicato dos Bancários Sul e Ilhas), titular do número único de pessoa colectiva e de identificação fiscal ..., com sede na rua ...Lisboa
Acordam em conferência, na 4.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa Sentença recorrida
1. Na presente acção intentada pela recorrente contra o recorrido, com vista a obter o reconhecimento e condenação do recorrido a pagar à recorrente os complementos de reforma e prémio de antiguidade previstos em acordo de empresa, acrescidos dos respectivos juros, o 7.º Juízo do Trabalho de Lisboa, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, (doravante também Tribunal de primeira instância, Tribunal recorrido ou Tribunal a quo), por sentença de 17.7.2024 (referência citius 435591455), absolveu o recorrido do pedido, conforme dispositivo a seguir citado: “Em face de tudo o exposto, julgo a acção improcedente e, em consequência, decido: 1. Absolver o réu Sindicato da Banca, Seguros e Tecnologias – Mais Sindicato do pedido. 2. Custas a cargo do réu (art.º 537º do CPC). Fixo o valor da acção em € 15.000,01 (quinze mil euros e um cêntimo).” Alegações da recorrente
2. Inconformada com a sentença mencionada no parágrafo anterior, a recorrente (autora) dela veio interpor o presente recurso, mediante requerimento com a referência citius 40427131 de 17.9.2024, formulando o seguinte pedido: “(...) ser reconhecido o direito da recorrente ao pagamento por parte do recorrido dos montantes por si reclamados com referência ao complemento de reforma e quanto ao prémio de antiguidade, respetivamente, que, no mínimo, deverão ser apurados proporcionalmente até à data de 28 de abril de 2019, por ter sido apenas nesta data que se extinguiram os efeitos do AE em que se previa o pagamento aos trabalhadores de tais benefícios retributivos, sem prejuízo dos juros de mora legalmente devidos a contar desde a data de vencimento de cada quantia devida até efetivo e integral pagamento (...)”
3. Nas suas alegações vertidas nas conclusões, a recorrente pugna, em síntese:
• Pela aplicação das cláusulas 92 (complemento de reforma) e 103 (prémio de antiguidade) do Acordo de Empresa publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 19 de 22.5.2003, celebrado entre o Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas e a FETESE – Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Serviços, doravante também AE de 2003;
• Na óptica da recorrente, apesar de esse Acordo de Empresa ter caducado em 28.4.2019, mantêm-se na esfera jurídica individual da recorrente/trabalhadora, os direitos adquiridos quanto ao complemento de reforma e prémio de antiguidade, na sua totalidade ou, pelo menos, apurados proporcionalmente até 28.4.2019;
• Ao julgar impendia sobre a recorrente o ónus da prova do preenchimento de requisitos adicionais aos anos de antiguidade no serviço, o Tribunal a quo incorreu em erro na interpretação da cláusula 103 do AE de 2003;
• O Tribunal a quo interpretou erradamente o regime transitório previsto na cláusula 60 do Acordo de Empresa publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 9 de 8.3.2021, celebrado entre o Sindicato da Banca Seguros e Tecnologias – MAIS Sindicato e a Federação dos Sindicatos da Indústria e Serviços – FETESE, doravante também AE de 2021;
• A solução pela qual optou a sentença recorrida viola os direitos adquiridos pela recorrente e o princípio da confiança consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa (CRP). Contra-alegações do recorrido
4. O recorrido (réu) contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e defendendo, em síntese, que:
• Quando a recorrente completou 25 anos de serviço (em Julho de 2021) e quando passou à reforma (em 30.8.2022) já tinha caducado o AE de 2003, conforme aviso de caducidade publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 23 de 22.6.2020;
• Em tais datas, já era aplicável o AE de 2021, que prevê na cláusula 60 um regime transitório de acordo com o qual, os trabalhadores reformados até 22.6.2020 mantêm os direitos e regalias decorrentes do anterior AE de 2003 e aos trabalhadores reformados após 22.6.2020, aplicam-se as normas do AE de 2021;
• Além disso, na ótica do recorrido, o artigo 501.º n.º 8 do Código do Trabalho (CT) (na redacção atualmente em vigor) não engloba o prémio de antiguidade, na medida em que o mesmo não deve ser qualificado como retribuição à luz do disposto no artigo 260.º n.º 1 -c) do CT. Parecer do Ministério Público
5. O digno magistrado do Ministério Público junto ao Tribunal da Relação, emitiu parecer (cf. referência citius 22304290 de 6.11.2024), ao abrigo do disposto no artigo 87.º n.º 3 do CPT, no qual pugnou por que seja negado provimento ao recurso, em síntese, porque:
• Os direitos invocados pela recorrente não se encontram protegidos para além da data em que o AE de 2003 cessou por caducidade;
• Acresce, no que respeita ao prémio de antiguidade, que impendia sobre a recorrente o ónus de provar que prestou bom e efectivo serviço, para dele poder beneficiar.
6. As partes não responderam ao parecer mencionado no parágrafo anterior. Delimitação do âmbito do recurso
7. Tem relevância para a decisão do recurso as seguintes questões, vertidas nas conclusões:
A. Pós eficácia das cláusulas do acordo de empresa que caducou
B. Efeitos da sucessão de acordos de empresa no direito ao prémio de antiguidade
C. Efeitos da sucessão de acordos de empresa no regime complementar de reforma Factos
8. Os factos provados constantes da sentença recorrida serão a seguir agrupados num parágrafo, antecedidos da numeração pela qual foram ali indicados, para facilitar a leitura e remissões.
9. Factos provados constantes da sentença recorrida:
1 - A autora trabalhou por conta, ao serviço e sob a direcção do réu, mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado desde 1 de julho de 1996 até 30 de agosto de 2022.
2 - Ultimamente tinha atribuída a categoria profissional de Auxiliar de Acção Médica, com uma retribuição mensal de 755,52€, acrescido de subsídio de alimentação.
3 - A autora é sócia do SITESE – Sindicato dos Trabalhadores e Técnicos de Serviços, Comércio, Restauração e Turismo, com o número 139179;
4 - A autora cessou o seu contrato de trabalho por ter passado à reforma em 30.08.2022.
5 - Desde a sua admissão ao serviço do réu que este procedia ao desconto na retribuição da autora de um montante mensal equivalente a 0,50% da mesma sob a designação Fundo Sindical de Assistência.
6 - Desde a passagem da autora à situação de reforma, em 31 de agosto de 2022, a autora jamais foi beneficiária dos complementos previstos nas alíneas a) b) e c) da cláusula 92.ª do AE.
7 - Em 2021 a autora perfez 25 anos de antiguidade ao serviço do réu.
10. Factos não provados constantes da sentença recorrida:
Nenhuns. Quadro normativo relevante
11. Para a apreciação do recurso tem relevo, essencialmente, o quadro normativo seguinte:
Convenção Europeia dos Direitos do Homem
Artigo 11.º
Liberdade de reunião e de associação
1. Qualquer pessoa tem direito à liberdade de reunião pacífica e à liberdade de associação, incluindo o direito de, com outrem, fundar e filiar-se em sindicatos para a defesa dos seus interesses.
2. O exercício deste direito só pode ser objecto de restrições que, sendo previstas na lei, constituírem disposições necessárias, numa sociedade democrática, para a segurança nacional, a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do crime, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros. O presente artigo não proíbe que sejam impostas restrições legítimas ao exercício destes direitos aos membros das forças armadas, da polícia ou da administração do Estado.
Carta Social Europeia de 1961 (revista em 1996)
Artigo 6.º
Direito à negociação colectiva
Com vista a assegurar o exercício efectivo do direito à negociação colectiva, as Partes comprometem-se:
1) A favorecer a consulta paritária entre trabalhadores e empregadores;
2) A promover, quando necessário e útil, a instituição de processos de negociação voluntária entre os empregadores ou suas organizações, de um lado, e as organizações de trabalhadores, de outro, com o fim de regulamentar as condições de emprego através de convenções colectivas;
3) A favorecer a instituição e utilização de processos apropriados de conciliação e arbitragem voluntária para resolução dos conflitos de trabalho; e reconhecem:
4) O direito dos trabalhadores e dos empregadores a acções colectivas no caso de conflitos de interesses, incluindo o direito de greve, sob reserva das obrigações decorrentes das convenções colectivas em vigor.
Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia
Artigo 151.º
A União e os Estados-Membros, tendo presentes os direitos sociais fundamentais, tal como os enunciam a Carta Social Europeia, assinada em Turim, em 18 de outubro de 1961 e a Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores, de 1989, terão por objetivos a promoção do emprego, a melhoria das condições de vida e de trabalho, de modo a permitir a sua harmonização, assegurando simultaneamente essa melhoria, uma proteção social adequada, o diálogo
entre parceiros sociais, o desenvolvimento dos recursos humanos, tendo em vista um nível de emprego elevado e duradouro, e a luta contra as exclusões.
Para o efeito, a União e os Estados-Membros desenvolverão ações que tenham em conta a diversidade das práticas nacionais, em especial no domínio das relações contratuais, e a necessidade de manter a capacidade concorrencial da economia da União.
A União e os Estados-Membros consideram que esse desenvolvimento decorrerá não apenas do funcionamento do mercado interno, que favorecerá a harmonização dos sistemas sociais, mas igualmente dos processos previstos nos Tratados e da aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas.
Artigo 152.º
A União reconhece e promove o papel dos parceiros sociais ao nível da União, tendo em conta a
diversidade dos sistemas nacionais. A União facilita o diálogo entre os parceiros sociais, no respeito
pela sua autonomia.
A Cimeira Social Tripartida para o Crescimento e o Emprego contribui para o diálogo social.
Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia
Artigo 28.º
Direito de negociação e de ação coletiva
Os trabalhadores e as entidades patronais, ou as respetivas organizações, têm, de acordo com o direito da União e as legislações e práticas nacionais, o direito de negociar e de celebrar convenções coletivas aos níveis apropriados, bem como de recorrer, em caso de conflito de interesses, a ações coletivas para a defesa dos seus interesses, incluindo a greve.
Constituição da República Portuguesa ou CRP
Artigo 2.º
(Estado de direito democrático)
A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa.
Artigo 56.º
(Direitos das associações sindicais e contratação colectiva)
1. Compete às associações sindicais defender e promover a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que representem.
2. Constituem direitos das associações sindicais:
a) Participar na elaboração da legislação do trabalho;
b) Participar na gestão das instituições de segurança social e outras organizações que visem satisfazer os interesses dos trabalhadores;
c) Pronunciar-se sobre os planos económico-sociais e acompanhar a sua execução;
d) Fazer-se representar nos organismos de concertação social, nos termos da lei;
e) Participar nos processos de reestruturação da empresa, especialmente no tocante a acções de formação ou quando ocorra alteração das condições de trabalho.
3. Compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva, o qual é garantido nos termos da lei.
4. A lei estabelece as regras respeitantes à legitimidade para a celebração das convenções colectivas de trabalho, bem como à eficácia das respectivas normas.
Código do Trabalho ou CT
Artigo 129.º
Garantias do trabalhador
1 - É proibido ao empregador:
a) Opor-se, por qualquer forma, a que o trabalhador exerça os seus direitos, bem como despedi-lo, aplicar-lhe outra sanção, ou tratá-lo desfavoravelmente por causa desse exercício;
b) Obstar injustificadamente à prestação efectiva de trabalho;
c) Exercer pressão sobre o trabalhador para que actue no sentido de influir desfavoravelmente nas condições de trabalho dele ou dos companheiros;
d) Diminuir a retribuição, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho;
e) Mudar o trabalhador para categoria inferior, salvo nos casos previstos neste Código;
f) Transferir o trabalhador para outro local de trabalho, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, ou ainda quando haja acordo;
g) Ceder trabalhador para utilização de terceiro, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho;
h) Obrigar o trabalhador a adquirir bens ou serviços a ele próprio ou a pessoa por ele indicada;
i) Explorar, com fim lucrativo, cantina, refeitório, economato ou outro estabelecimento directamente relacionado com o trabalho, para fornecimento de bens ou prestação de serviços aos seus trabalhadores;
j) Fazer cessar o contrato e readmitir o trabalhador, mesmo com o seu acordo, com o propósito de o prejudicar em direito ou garantia decorrente da antiguidade.
k) Obstar a que o trabalhador exerça outra atividade profissional, salvo com base em fundamentos objetivos, designadamente segurança e saúde ou sigilo profissional, ou tratá-lo desfavoravelmente por causa desse exercício.
2 - O disposto na alínea k) do número anterior não isenta o trabalhador do dever de lealdade previsto na alínea f) do n.º 1 do artigo anterior nem do disposto em legislação especial quanto a impedimentos e incompatibilidades.
3 - Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.
Artigo 258.º
Princípios gerais sobre a retribuição
1 - Considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho.
2 - A retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie.
3 - Presume-se constituir retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador.
4 - À prestação qualificada como retribuição é aplicável o correspondente regime de garantias previsto neste Código.
Artigo 260.º
Prestações incluídas ou excluídas da retribuição
1 - Não se consideram retribuição:
a) As importâncias recebidas a título de ajudas de custo, abonos de viagem, despesas de transporte, abonos de instalação e outras equivalentes, devidas ao trabalhador por deslocações, novas instalações ou despesas feitas em serviço do empregador, salvo quando, sendo tais deslocações ou despesas frequentes, essas importâncias, na parte que exceda os respectivos montantes normais, tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador;
b) As gratificações ou prestações extraordinárias concedidas pelo empregador como recompensa ou prémio dos bons resultados obtidos pela empresa;
c) As prestações decorrentes de factos relacionados com o desempenho ou mérito profissionais, bem como a assiduidade do trabalhador, cujo pagamento, nos períodos de referência respectivos, não esteja antecipadamente garantido;
d) A participação nos lucros da empresa, desde que ao trabalhador esteja assegurada pelo contrato uma retribuição certa, variável ou mista, adequada ao seu trabalho.
2 - O disposto na alínea a) do número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, ao abono para falhas e ao subsídio de refeição.
3 - O disposto nas alíneas b) e c) do n.º 1 não se aplica:
a) Às gratificações que sejam devidas por força do contrato ou das normas que o regem, ainda que a sua atribuição esteja condicionada aos bons serviços do trabalhador, nem àquelas que, pela sua importância e carácter regular e permanente, devam, segundo os usos, considerar-se como elemento integrante da retribuição daquele;
b) Às prestações relacionadas com os resultados obtidos pela empresa quando, quer no respectivo título atributivo quer pela sua atribuição regular e permanente, revistam carácter estável, independentemente da variabilidade do seu montante.
Artigo 478.º
Limites do conteúdo de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho
1 - O instrumento de regulamentação colectiva de trabalho não pode:
a) Contrariar norma legal imperativa;
b) Regulamentar actividades económicas, nomeadamente períodos de funcionamento, regime fiscal, formação dos preços e exercício da actividade de empresas de trabalho temporário, incluindo o contrato de utilização;
c) Conferir eficácia retroactiva a qualquer cláusula que não seja de natureza pecuniária.
2 - O instrumento de regulamentação colectiva de trabalho pode instituir regime complementar contratual que atribua prestações complementares do subsistema previdencial na parte não coberta por este, nos termos da lei.
Artigo 501.º [Redacção aplicável ratione temporis, dada pelo seguinte diploma: Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro]
Sobrevigência e caducidade de convenção colectiva
1 - A cláusula de convenção que faça depender a cessação da vigência desta da substituição por outro instrumento de regulamentação colectiva de trabalho caduca decorridos cinco anos sobre a verificação de um dos seguintes factos:
a) Última publicação integral da convenção;
b) Denúncia da convenção;
c) Apresentação de proposta de revisão da convenção que inclua a revisão da referida cláusula.
2 - Após a caducidade da cláusula referida no número anterior, ou em caso de convenção que não regule a sua renovação, aplica-se o disposto nos números seguintes.
3 - Havendo denúncia, a convenção mantém-se em regime de sobrevigência durante o período em que decorra a negociação, incluindo conciliação, mediação ou arbitragem voluntária, ou no mínimo durante 18 meses.
4 - Decorrido o período referido no número anterior, a convenção mantém-se em vigor durante 60 dias após qualquer das partes comunicar ao ministério responsável pela área laboral e à outra parte que o processo de negociação terminou sem acordo, após o que caduca.
5 - Na ausência de acordo anterior sobre os efeitos decorrentes da convenção em caso de caducidade, o ministro responsável pela área laboral notifica as partes, dentro do prazo referido no número anterior, para que, querendo, acordem esses efeitos, no prazo de 15 dias.
6 - Após a caducidade e até à entrada em vigor de outra convenção ou decisão arbitral, mantêm-se os efeitos acordados pelas partes ou, na sua falta, os já produzidos pela convenção nos contratos de trabalho no que respeita a retribuição do trabalhador, categoria e respectiva definição, duração do tempo de trabalho e regimes de protecção social cujos benefícios sejam substitutivos dos assegurados pelo regime geral de segurança social ou com protocolo de substituição do Serviço Nacional de Saúde.
7 - Além dos efeitos referidos no número anterior, o trabalhador beneficia dos demais direitos e garantias decorrentes da legislação do trabalho.
8 - As partes podem acordar, durante o período de sobrevigência, a prorrogação da vigência da convenção por um período determinado, ficando o acordo sujeito a depósito e publicação.
9 - O acordo sobre os efeitos decorrentes da convenção em caso de caducidade está sujeito a depósito e publicação.
Artigo 503.º
Sucessão de convenções colectivas
1 - A convenção colectiva posterior revoga integralmente a convenção anterior, salvo nas matérias expressamente ressalvadas pelas partes.
2 - A mera sucessão de convenções colectivas não pode ser invocada para diminuir o nível de protecção global dos trabalhadores.
3 - Os direitos decorrentes de convenção só podem ser reduzidos por nova convenção de cujo texto conste, em termos expressos, o seu carácter globalmente mais favorável.
4 - No caso previsto no número anterior, a nova convenção prejudica os direitos decorrentes de convenção precedente, salvo se forem expressamente ressalvados pelas partes na nova convenção.
Lei n.º 32/2002 de 20 de Dezembro (Aprova as bases da segurança social), doravante apenas Lei 32/2002
Artigo 21.º
Princípio da conservação dos direitos adquiridos e em formação
O princípio da conservação dos direitos adquiridos e em formação visa assegurar o respeito por esses direitos nos termos da presente lei.
Artigo 94.º
Composição
1 - O sistema complementar compreende regimes legais, regimes contratuais e esquemas facultativos.
2 - Os regimes complementares legais visam a cobertura de eventualidades ou a atribuição de prestações em articulação com o sistema público de segurança social nos casos previstos na lei.
3 - Os regimes complementares contratuais visam a atribuição de prestações complementares do subsistema previdencial na parte não coberta por este, designadamente incidindo sobre a parte das remunerações em relação às quais a lei determina que não há incidência de contribuições obrigatórias, bem como a protecção face a eventualidades não cobertas pelo subsistema previdencial.
4 - Os esquemas complementares facultativos visam o reforço da auto-protecção voluntária dos respectivos interessados.
5 - Os regimes complementares podem ser de iniciativa do Estado, das empresas, das associações sindicais, patronais e profissionais.
Artigo 95.º
Articulação dos regimes complementares
A lei reconhece e promove em articulação com o sistema fiscal os diferentes regimes do sistema complementar convencionados no âmbito da contratação colectiva.
Artigo 103.º
Regulamentação
1 - O sistema complementar é objecto de regulamentação específica que:
a) Salvaguarde a protecção efectiva dos beneficiários das prestações;
b) Preveja uma articulação e harmonização com o sistema público de segurança social;
c) Salvaguarde a equidade, a adequação e a efectiva garantia das prestações;
d) Estipule regras de regulação, supervisão prudencial e de fiscalização quanto à garantia e financiamento dos planos de pensões;
e) Estipule regras de gestão e controlo da solvência dos patrimónios afectos aos planos de pensões e respectivas entidades gestoras;
f) Garanta padrões de transparência e clareza de informação aos beneficiários e aos participantes ou seus representantes, quer no que se refere aos planos de pensões, quer no que se refere aos respectivos patrimónios, assegurando a adequada publicidade dos regimes;
g) Respeite os direitos adquiridos e em formação e defina as demais regras gerais de vinculação;
h) Garanta igualdade de tratamento fiscal entre os diferentes regimes complementares;
i) Enuncie, com clareza e estabilidade, o quadro fiscal aplicável às contribuições, benefícios e património afecto à realização de planos de pensões;
j) Defina os incentivos fiscais ao seu desenvolvimento gradual e progressivo, em particular quanto às deduções no âmbito do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares que devem garantir igualdade de oportunidades independentemente do valor do rendimento colectável;
l) Respeite os direitos adquiridos e assegure a sua portabilidade;
m) Garanta a não discriminação em função do sexo;
n) Determine as regras de protecção jurídica dos direitos adquiridos e em formação, em caso de extinção e de insuficiência financeira dos patrimónios afectos a planos de pensões e em situações de extinção dos regimes;
o) Defina as regras de constituição e funcionamento das entidades gestoras;
p) Fixe a natureza dos activos que constituem o património afecto à realização de planos de pensões, os respectivos limites percentuais, bem como as regras prudências e os princípios gerais de congruência e de avaliação desses activos.
2 - Poderão ser acordados em convenção colectiva instrumentos de gestão e controlo com a participação dos beneficiários e participantes ou seus representantes.
Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro (As bases gerais do sistema de segurança social), doravante também Lei 4/2007
Artigo 20.º
Princípio da tutela dos direitos adquiridos e dos direitos em formação
O princípio da tutela dos direitos adquiridos e dos direitos em formação visa assegurar o respeito por esses direitos, nos termos da presente lei.
Artigo 86.º
Regulamentação, supervisão e garantia dos regimes complementares
1 - A criação e modificação dos regimes complementares de iniciativa colectiva e individual e a sua articulação com o subsistema previdencial são definidas por lei que regula, designadamente, o seu âmbito material, as condições técnicas e financeiras dos benefícios e a garantia dos respectivos direitos.
2 - A regulamentação dos regimes complementares de iniciativa colectiva deve ainda concretizar o princípio da igualdade de tratamento em razão do sexo e a protecção jurídica dos direitos adquiridos e em formação, e fixar as regras relativas à portabilidade daqueles direitos, à igualdade de tratamento fiscal entre regimes e ao direito à informação.
3 - A regulação, a supervisão prudencial e a fiscalização dos regimes complementares previstos na presente secção é exercida nos termos da lei e pelas entidades legalmente definidas.
4 - A lei prevê ainda a instituição de mecanismos de garantia dos regimes complementares referidos na presente secção.
Artigo 100.º
Salvaguarda dos direitos adquiridos e em formação
O desenvolvimento e a regulamentação da presente lei não prejudicam os direitos adquiridos, os prazos de garantia vencidos ao abrigo da legislação anterior, nem os quantitativos de pensões que resultem de remunerações registadas na vigência daquela legislação.
Acordo de Empresa entre o Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas e a FETESE — Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores
de Serviços, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego 1.ª série, n.º 19 de 22.5.2003(doravante AE de 2003)
Cláusula 92.ª
Reforma
Quando os trabalhadores passarem à situação de reforma da segurança social, o SBSI garante-lhes:
a) Um complemento de pensão de reforma, pago 12 vezes por ano, em função do tempo de serviço no SBSI, cujo montante mensal se calculará de acordo com a fórmula referida na alínea d);
b) Um complemento de pensão de reforma, referente ao subsídio de Natal, de montante igual ao referido na alínea a), a satisfazer no mês de Novembro;
c) Um complemento de pensão de reforma, referente ao 14.o mês, de montante igual ao referido na alínea a), a satisfazer no mês de Abril, sendo-lhe aplicável o princípio estabelecido no n.º 3 da cláusula 66.ª;
d) O montante mensal do complemento de pensão de reforma referida na alínea a), calculado de acordo com a fórmula seguinte:
0,5 % × N ×RME× FHTS
sendo:
N o número de anos completos de efectivo serviço, até um máximo de 30;
RME a remuneração mensal efectiva,
devendo qualquer das prestações previstas na alínea b) do n.º 2 da cláusula 58.a ter sido paga ininterruptamente nos cinco anos imediatamente anteriores à passagem à reforma;
FHTS o factor de horas de trabalho semanal, que só deverá ter aplicabilidade nas situações de trabalhadores que tenham trabalhado em regimes de horário de trabalho a tempo parcial, casos
em que FHTS é igual à média de horas de trabalho semanal dos anos de actividade ao serviço do SBSI a dividir pelas horas de trabalho semanal de horário a tempo completo.
Cláusula 95.ª
Fundo de pensões
1 — Para garantia dos benefícios previstos nas cláusulas 92.a, 93.a e 94.a, o SBSI criará um fundo de pensões.
2 — Os trabalhadores abrangidos por este fundo de pensões com contratos de trabalho sem termo, que após o decurso do período experimental os façam cessar, por sua iniciativa, quando passarem à situação de reforma por parte da segurança social, têm garantia do complemento referido na cláusula 92.a, calculado com base nas retribuições consideradas para esse efeito e na antiguidade que detinham à data da demissão.
3 — O SBSI no acto de admissão dos trabalhadores providenciará uma detalhada explicação sobre os benefícios decorrentes do respectivo fundo de pensões.
Cláusula 103.ª
Prémio de antiguidade
1 — Os trabalhadores no activo que completem 15, 25 e 35 anos de bom e efectivo serviço têm direito, nesse ano, a um prémio de antiguidade de valor igual, respectivamente, a um, dois ou três meses da sua retribuição mensal efectiva.
2 — Os trabalhadores no activo que forem colocados na situação de invalidez ou reforma, com mais de 25 e menos de 35 anos de bom e efectivo serviço, no momento da passagem a essa situação têm direito à parte proporcional do prémio de antiguidade atribuído aos trabalhadores que perfazem 35 anos de bom e efectivo serviço, calculada na base de um décimo por cada ano completo de bom e efectivo serviço para além do 25.o ano.
3 — Para aplicação dos números anteriores considerar-se-ão todos os anos ao serviço do SBSI.
4 — Para efeitos da determinação dos anos de bom e efectivo serviço, referidos nos n.ºs 1 e 2 desta cláusula, só não são contados:
a) Os anos em que os respectivos trabalhadores tenham sido punidos com qualquer sanção disciplinar superior a repreensão verbal;
b) Os anos em que, para além das férias, os trabalhadores tenham estado ausentes do serviço mais de 22 dias úteis.
5 — Não são considerados, para efeitos do número anterior, as ausências motivadas por:
a) Acidente de trabalho, incluindo o ocorrido em deslocação de serviço;
b) As previstas nos n.ºs 1 a 6 da cláusula 97.a e nos n.ºs1 a 4 da cláusula 98.ª;
c) Suspensão do contrato de trabalho por prestação de serviço militar obrigatório;
d) Internamento hospitalar e os períodos imediatamente anteriores e posteriores ao internamento, um e outros devidamente comprovados;
e) Exercício de funções nos corpos gerentes de associações sindicais, comissão de trabalhadores, comissões ou secções sindicais e delegados sindicais;
f) As previstas nas alíneas a), b), c), d), e), g) e
h) do n.º 2 da cláusula 47.a, no n.º 2 da cláusula 90.a e na cláusula 99.a
6 — Quando o trabalhador estiver incurso no n.º 4 da presente cláusula, o prémio a que terá direito só se vencerá após decorrido período igual ao descontado, sem prejuízo de o trabalhador abrangido apenas pela alínea b) desse número o receber antes da passagem à situação de invalidez ou reforma.
Acordo de empresa o Sindicato da Banca, Seguros e Tecnologias - MAIS Sindicato e a Federação dos Sindicatos da Indústria e Serviços – FETESE, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 9 de 8.3.2021(doravante AE de 2021)
Cláusula 38.ª
Noção de retribuição
1- Considera-se retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalha-
dor tem direito como contrapartida do seu trabalho.
2- A retribuição compreende a retribuição de base e outras prestações regulares e periódicas feitas, direta ou indireta-
mente, em dinheiro ou em espécie.
3- Os anexos III e IV estabelecem a retribuição a atribuir no âmbito do período normal de trabalho.
4- Os trabalhadores que, nos termos da cláusula 16.ª, número 2, prestem a sua atividade num período normal de trabalho de 8 horas diárias ou 40 horas semanais, têm direito a retribuição acrescida, proporcional ao número de horas de trabalho prestadas para além das 7 horas diárias e 35 horas semanais, conforme anexo IV.
5- A retribuição do período de férias não inclui as prestações retributivas relativas ao trabalho noturno e ao trabalho prestado em dias feriados.
6- O subsídio de natal inclui a retribuição base, diuturnidades e a retribuição por isenção de horário de trabalho.
Cláusula 60.ª
Regime transitório
1- Os trabalhadores reformados até 22 de junho de 2020 mantêm os direitos e regalias vigentes na mencionada data e decorrentes do anterior AE.
2- Aos trabalhadores que tenham passado à situação de reforma após 22 de junho de 2020 aplicam-se as normas do presente AE.
Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas – Estatutos - Publicados no Boletim do Trabalho e Emprego 1.ª série n.º 14 de 15.4.2002
Artigo 101.º
Fundos especiais
1 — Entre outros que, por proposta da direcção, o conselho geral delibere criar e cuja utilização defina em regulamento próprio, o Sindicato terá os seguintes fundos especiais:
a) Fundo sindical, destinado à cobertura de eventuais saldos negativos do exercício;
b) Fundo de greve e de solidariedade, a ser aplicado, exclusivamente, em auxílio a sócios cujos vencimentos tenham sido diminuídos como resultado da adesão à greve declarada ou apoiada pelos órgãos do Sindicato estatutariamente competentes. Este fundo destina-se também a permitir que o Sindicato preste auxílio a sócios cujos vencimentos tenham sido suspensos ou diminuídos em virtude de represálias, prisão, ou outro motivo decorrente da sua acção ou actuação, estatutariamente legítima, em defesa dos direitos do Sindicato, ou do desempenho de qualquer cargo ou missão que por este lhes tenham sido cometidos ou, ainda, que hajam sido despedidos como resultado da adesão a greve declarada ou apoiada pelos órgãos do Sindicato estatutariamente competentes, a uns e a outros, apenas enquanto se mantiverem naquelas situações;
c) Fundo de auxílio económico, destinado a ser utilizado no apoio a sócios e seus familiares, que se encontrem em situações englobáveis no respectivo regulamento;
d) Fundo de reformas, destinado a cobrir os encargos suplementares diferidos, resultantes da diferença entre as pensões de reforma pagas pela segurança social aos empregados do Sindicato e aquelas que por imperativo contratual são devidas por este, se não existir fundo de pensões, para esse fim.
2 — Sem prejuízo do estabelecido no regulamento do fundo de greve e de solidariedade, o conselho geral poderá, ao deliberar declarar ou apoiar uma greve, deliberar também, por razões fundamentadas, que o referido fundo não seja afectado.
3 — As despesas que o Sindicato tenha de efectuar e que possam ser imputáveis aos fundos citados no n.º 1 deste artigo apenas por estes podem ser suportadas, devendo as contas de cada exercício apresentar uma relação das utilizações relativas a cada fundo.
4 — Na medida em que as regras de uma correcta gestão financeira o permitam, o fundo de greve e de solidariedade deverá ser representado por valores facilmente mobilizáveis
Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas – Estatutos - Publicados no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 19 de 22.5.2008
Artigo 80.º
Fundos especiais
1 — O Sindicato terá os seguintes fundos especiais, cuja regulamentação é aprovada pelo conselho geral, sob proposta da direcção:
a) Fundo sindical, destinado à cobertura de eventuais saldos negativos do exercício;
b) Fundo de greve e de solidariedade, a ser aplicado, exclusivamente, em auxílio a sócios cujos vencimentos tenham sido diminuídos como resultado da adesão à greve declarada ou apoiada pelos órgãos do Sindicato estatutariamente competentes. Este fundo destina-se também a permitir que o Sindicato preste auxílio a sócios em situações de carência;
c) Fundo de auxílio económico, destinado a ser utilizado no apoio a sócios e seus familiares que se encontrem em situações previstas no respectivo regulamento;
d) Fundo de reformas, caso não exista fundo de pensões, destinado a cobrir os encargos suplementares diferidos, resultantes da diferença entre as pensões de reforma pagas pela segurança social aos empregados do Sindicato e aquelas que por imperativo contratual são devidas por este.
2 — Sem prejuízo do estabelecido no regulamento do fundo de greve e de solidariedade, o conselho geral poderá, ao deliberar declarar ou apoiar uma greve, deliberar também, por razões fundamentadas, que o referido fundo não seja utilizado nessa situação.
3 — As despesas que o Sindicato tenha de efectuar e que possam ser imputáveis aos fundos citados no n.º 1 deste artigo apenas por estes podem ser suportadas.
4 — Na medida em que as regras de uma correcta gestão financeira o permitam, o fundo de greve e de solidariedade deverá ser representado por valores facilmente mobilizáveis.
Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas – Estatutos - Publicados no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 4 de 29.1.2024
Artigo 60.º
Fundos especiais
O sindicato terá os fundos especiais que sejam aprovados pelo conselho geral, sob proposta da direção. Doutrina e jurisprudência
12. O Tribunal leva em conta os seguintes elementos que serão mencionados infra no presente acórdão: Doutrina
• Abílio Neto, Novo Código do Trabalho e Legislação Complementar Anotados, 3.ª Edição, Ediforum,
• António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 21.ª Edição, Almedina
• J.J. Gomes Canotilho, Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, Coimbra Editora
• Pedro Romano Martinez, Luís Miguel Monteiro, Joana Vasconcelos, Pedro Madeira de Brito, Guilherme Dray , Luís Gonçalves da Silva, Código do Trabalho Anotado, 8.ª Edição, 2009, Almedina
• Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª Edição, Coimbra Editora, Limitada Jurisprudência
• Acórdãos do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, Swedish Engine Drivers´Union v. Sweeden, processo 5615/72, Gustafsson c. Suède, processo 15573/89 e Demir et Baykara c. Turquie, processo 34503/97, disponíveis em hudoc.echr.coe.int
• Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, C-311/21, disponível em curia.eu
• Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 306/03, n.º 338/10 e n.º 862/2013, disponíveis em tribunalconstitucional.pt
• Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo 07S3656, disponível em juris.stj.pt
• Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo 4624/21.4T8GMR.L1.S1, disponível em stj.pt Apreciação do recurso
A. Pós eficácia das cláusulas do acordo de empresa que caducou
13. A recorrente defende que, ao contrário do que decidiu o Tribunal a quo, os direitos ao prémio de antiguidade e ao complemento de reforma previstos na convenção colectiva que caducou, se mantêm após a caducidade. Para apreciar esse motivo de discordância, importa antes de mais saber se os direitos aqui em litígio estão abrangidos pela pós eficácia do acordo de empresa que caducou ou seja, se fazem parte dos direitos dos trabalhadores relativamente aos quais se mantém a eficácia normativa das cláusulas do acordo de empresa mesmo depois de terminado o período de sobrevigência e de o acordo de empresa ter caducado.
14. Nessa análise, o Tribunal começa por recordar que entre a recorrente, como trabalhadora e o recorrido, como empregador, foi celebrado um contrato de trabalho que teve início em 1.7.1996 e cessou em 30.8.2022 com a reforma da recorrente; assim, a recorrente passou a estar reformada a partir de 31.8.2022 (cf. factos provados 1 e 4). Em 2021 a recorrente completou 25 anos de antiguidade ao serviço do recorrido (cf. facto provado 7).
15. No presente recurso está assente e não é litigioso entre as partes, que a relação laboral que existiu entre ambas está abrangida pelo âmbito de aplicação dos seguintes instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho, que se sucederam no tempo:
• Acordo de Empresa (AE) publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE) n.º 19 de 22.5.2003, celebrado entre o Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas e a FETESE – Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Serviços, também aqui designado por AE de 2003, que entrou em vigor em 25.5.2003 e caducou em 28.4.2019;
• Acordo de Empresa (AE) publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE) n.º 9 de 8.3.2021, celebrado entre o Sindicato da Banca Seguros e Tecnologias – MAIS Sindicato e a Federação dos Sindicatos da Indústria e Serviços – FETESE, também aqui designado por AE de 2021, que entrou em vigor em 1.4.2021.
16. As cláusulas dos instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho que estão em causa no presente recurso são as cláusulas 92 (complemento de pensão), 95 (fundo de pensões) e 103 (prémio de antiguidade) do AE de 2003 e a cláusula 60 (regime transitório em caso de reforma) do AE de 2021.
17. A adopção, cessação e sucessão dos instrumentos de regulamentação colectiva aqui em causa convocam a aplicação no tempo da seguinte legislação:
• Os artigos 2.º n.º 1 e 6.º da Lei 519-C1/79 (regime jurídico das relações colectivas de trabalho), estavam em vigor e regulavam a situação na data em que foi celebrado e entrou em vigor o AE de 2003; desses preceitos resulta que a forma de regulamentação colectiva em que se enquadra o AE de 2003 é a convenção colectiva e que as partes não estavam impedidas de aí prever regimes complementares de pensão de reforma, como acontece com a cláusula 92 do AE de 2003;
• Sucedeu-se o artigo 533.º n.º 2 do CT de 2003, que previa expressamente que os instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho podiam instituir regimes complementares contratuais; tal preceito passou a ser aplicável ratione temporis por força do artigo 8.º n.º 1 da Lei 99/2003 de 27 de Agosto, que aprova o CT de 2003;
• Ao CT de 2003 sucedeu-se o CT de 2009, cujos artigos 2.º (instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho), 258.º a 260.º (retribuição), 478.º n.º 2 (instituição de um regime complementar contratual em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho) passaram a aplicar-se ratione temporis, por força do artigo 7.º n.º 1 da Lei n.º 7/2009 de 12.2, que aprova o CT de 2009;
• No presente litígio, o artigo 501.º do CT de 2009 com a redacção da Lei 7/2009 de 12.2, continua a ser aplicável ratione temporis ao período de sobrevigência, à caducidade e à pós eficácia do AE de 2003, por força do artigo 4.º da Lei 55/2004 de 25.8 que prevê que o artigo 501.º do CT, com a redação dessa lei, não se aplica às convenções coletivas denunciadas até 31 de maio de 2014, como sucedeu no presente caso;
• À sucessão de convenções colectivas de trabalho (acordos de empresa) aplica-se o artigo 503.º do CT de 2009, cuja redacção se manteve inalterada (cf. artigo 7.º n.º 1 da Lei n.º 7/2009 de 12.2 que aprova o CT de 2009);
• O regime complementar de pensões de reforma, não substitutivo do regime geral, instituído pela cláusula 92 do AE de 2003 está coberto pelo âmbito de aplicação temporal dos artigos 21.º e 94.º a 106.º da Lei 32/2002 (bases da segurança social);
• A alteração desse regime complementar de pensões que resultou da caducidade do AE de 2003 e da cláusula 60 do AE de 2021, está abrangida pelo regime transitório previsto na Lei 4/2007 (bases gerais do sistema de segurança social) que entrou em vigor em 17.1.2007 e revogou a Lei 32/2002 (cf. artigos 83.º a 86.º, 100.º, 109.º e 110.º da lei 4/2007).
18. Feito este enquadramento, convém sublinhar que o acordo de empresa (AE) é uma das formas que pode assumir a convenção colectiva que faz parte dos instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho de natureza negocial, previstos no artigo 2.º n.ºs 2 e 3- c) do CT de 2009.
19. O AE de 2003 entrou em vigor em 25.5.2003(cf. cláusula 3 n.º 1 do AE de 2003). No capítulo XI do AE de 2003, intitulado “Benefícios Sociais”, estão incluídas as seguintes cláusulas cuja aplicação está em litígio no presente recurso: a cláusula 92, que prevê o pagamento de um complemento de reforma, conjugada com a cláusula 95 que prevê a criação de um fundo de pensões para esse efeito; e a cláusula 103, que prevê pagamento de um prémio de antiguidade.
20. O AE de 2003 foi denunciado pelo recorrido/empregador em 21.9.2011 e caducou em 28.4.2019 (cf. aviso de caducidade publicado no BTE n.º 23 de 22.6.2020). A denúncia dessa convenção colectiva tanto podia conduzir à sua revogação mediante celebração de nova convenção colectiva, como à sua caducidade, por se frustrar a negociação que permitiria a sua substituição antes de completado o prazo de caducidade.
21. O caso em análise enquadra-se na segunda situação acima descrita, a saber: à denuncia do AE de 2003 seguiu-se o período de sobrevigência de todas as suas cláusulas, previsto no artigo 501.º n.ºs 3 e 4 primeira parte do CT (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2); findo esse período de sobrevigência, o AE de 2003 caducou em 28.4.2019, nos termos previstos no artigo 501.º n.º 4 do CT, segunda parte (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2) sem que até à data da caducidade tenha entrado em vigor outra convenção colectiva que o substituísse.
22. Só posteriormente, em 1.4.2021 é que entrou em vigor uma nova convenção colectiva, o AE de 2021, cujo âmbito de aplicação abrange as partes (cf. cláusulas 2 e 3 n.º 1 do AE de 2021) e que sucedeu ao AE de 2003.
23. Assim, entre 28.4.2019, data em que caducou o AE de 2003, e 1.4.2021 data em que entrou em vigor o AE de 2021, existe um vazio na regulamentação colectiva do trabalho. Nesse período que medeia entre a caducidade de uma convenção colectiva e a entrada em vigor de outra, já não se aplica o regime da sobrevigência do AE de 2003, mas antes o regime da pós eficácia do AE de 2003, previsto no artigo 501.º n.º 6 do CT (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2), que é provisório (até à entrada em vigor de outra convenção) e limitado a certas cláusulas do AE de 2003 (as que incidem sobre as matérias enunciadas no artigo 501.º n.º 6 na redacção da Lei 7/2009 de 12.2) – cf. sobre o regime da pós eficácia – cf. António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 21.ª Edição, Almedina, página 973.
24. Com efeito, o artigo 501.º n.º 6 do CT (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2) prevê que após a caducidade e até à entrada em vigor de outra convenção, mantêm-se os efeitos acordados pelas partes ou, na sua falta, os já produzidos pela convenção nos contratos de trabalho, no que respeita à retribuição, categoria e respectiva definição, duração do tempo de trabalho e regimes de protecção social substitutivos aí previstos.
25. Daqui decorre que as estipulações ou normas de contratação colectiva, contidas no AE de 2003 que caducou, sobre as matérias ressalvadas pelo artigo 501.º n.º 6 do CT (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2), mantêm-se como estipulações individuais ou regras concretas, integradas no contrato individual de trabalho da recorrente, como se tivessem sido acordadas entre a recorrente e o recorrido. É com esse sentido, de que tais regras colectivas foram absorvidas pelo contrato individual de trabalho, que o Tribunal interpreta o segmento do artigo 501.º n.º 6 do CT (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2) que se refere aos efeitos já produzidos pela convenção no contrato individual de trabalho celebrado entre a recorrente e o recorrido – cf. António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 21.ª Edição, Almedina, página 975.
26. À luz do regime legal acima mencionado, a vigência das cláusulas 92 e 103 do AE de 2003 manteve-se durante o período de sobrevigência dessa convenção colectiva (cf. artigo 501.º n.ºs 3 e 4 primeira parte do CT, na redacção da Lei 7/2009 de 12.2).
27. Depois da caducidade do AE de 2003, ocorrida em 28.4.2019, importa verificar se as cláusulas aqui em litígio estão abrangidas pelo regime da pós eficácia provisória e limitada, consagrado no artigo 501.º n.º 6 do CT (na redação a Lei 7/2009 de 12.2). Para esse efeito é necessário apreciar a natureza das prestações em causa.
28. No que respeita ao complemento de pensão de reforma previsto na cláusula 92 do AE de 2003, tal como foi acima indicado, a obrigação de pagar esse complemento pode validamente ser instituída pelos parceiros sociais numa convenção colectiva, como sucedeu.
29. Não se apurou que a recorrente fizesse contribuições para o regime complementar de pensões. Com efeito, as contribuições que a recorrente alegou ter feito (cf. artigos 6.º a 11.º da petição inicial junta com a referência citius 36624757 de 24.7.2023) e que nos termos do artigo 57.º do CPT se consideram confessadas e constam do facto provado 5, destinaram-se ao fundo sindical de assistência, que tem por objectivo financiar prestações de natureza médico-social e não o regime complementar de pensões. É o que resulta do artigo 1.º do regulamento do fundo sindical de assistência, documento particular junto aos autos pelo recorrido com o requerimento de 29.4.2024/referência citius 39208004, que não foi impugnado e tem a força probatória prevista no artigo 376.º do Código Civil (CC); no mesmo requerimento, o recorrido, que foi notificado pelo Tribunal a quo, a pedido da recorrente, para juntar o regulamento do fundo sindical de assistência e o contrato constitutivo do fundo de pensões, informou o Tribunal que não juntava cópia do contrato constitutivo do fundo de pensões por não existir tal documento, não tendo a recorrente impugnado essa informação.
30. Daqui resulta que não se provou que o recorrido tenha instituído um fundo de pensões como previsto na cláusula 95 do AE de 2003. Nesse contexto, porém, nem a decisão sobre a matéria de facto é impugnada no presente recurso, nem se verificam as condições previstas no artigo 662.º n.º 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 87.º n.º 1 do CPT, para que o Tribunal da Relação proceda oficiosamente à alteração da decisão sobre a matéria de facto sobre este tema, nomeadamente porque o que está em causa não é o erro na apreciação do valor probatório do documento junto pelo recorrido, intitulado regulamento do fundo sindical de assistência, mas a irrelevância desse meio de prova para apurar qual foi o instrumento criado pelo recorrido para definir as condições de pagamento do complemento da pensão previsto na cláusula 92 do AE de 2003 e que a cláusula 60 n.º 1 do AE de 2021 mantém para trabalhadores reformados até à data nela prevista.
31. Dito isto, independentemente da criação do fundo de pensões previsto na cláusula 95, o certo é que a cláusula 92 do AE de 2003 instituiu um regime complementar de pensões de reforma, não substitutivo do regime geral e coberto pelo âmbito de aplicação dos artigos 94.º a 106.º da Lei 32/2002 (bases da segurança social), preceitos que não exigem a contribuição dos trabalhadores. Em particular, o artigo 103.º n.º 1 – g) da Lei 32/2002 estabelece o dever de salvaguarda dos direitos adquiridos e dos direitos em formação nos regimes complementares, como a seguir será explicado na análise da questão C.
32. A Lei 32/2003 foi posteriormente revogada pela Lei 4/2007 (bases gerais do sistema de segurança social) que entrou em vigor em 17.1.2007 e prevê igualmente o dever de salvaguarda dos direitos adquiridos e em formação nos regimes complementares (cf. artigos 86.º n.º 2, 100.º, 109.º e 110.º da lei 4/2007). Nos termos do artigo 83.º da Lei 4/2007, o regime complementar instituído pela cláusula 92 do AE de 2003 é agora designado por regime profissional complementar, estando expressamente previsto que não são obrigatórias as contribuições dos trabalhadores. O artigo 85.º n.º 2 da Lei 4/2007 atualmente em vigor, exige que a administração do regime complementar seja atribuída a entidade diversa daquela que o instituiu.
33. No que releva para a análise desta questão, é forçoso constatar que o complemento de pensão previsto na cláusula 92 do AE de 2003 é um regime complementar, profissional, não substitutivo do regime geral da segurança social e, portanto, não está abrangido pela pós-eficácia do AE de 2003 prevista no artigo 501.º n.º 6 do CT (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2). Em consequência, a cláusula 92 do AE de 2003 em princípio caduca na data em que ocorre a caducidade do AE de 2003 excepto se a sua aplicação vier a ser salvaguardada pelo AE de 2021, o que sucedeu na cláusula 60 do AE de 2021 mas apenas para trabalhadores reformados até 22.6.2020, o que não foi o caso da recorrente.
34. Importa agora verificar se o prémio de antiguidade previsto na cláusula 103 do AE de 2003 está ou não abrangido pela pós eficácia do AE de 2003. A solução desse problema convoca a aplicação dos artigos 258.º e 260.º do CT de 2009 (aplicáveis ratione temporis por força do artigo 7.º n.º 1 da Lei n.º 7/2009 de 12.2).
35. A esse propósito, o Tribunal recorda que a cláusula 103 n.º 1 do AE 2003 prevê que os trabalhadores no activo que completem 15, 25 e 35 anos de bom e efectivo serviço têm direito, nesse ano, ao prémio de antiguidade aí previsto; o n.º 4 dessa cláusula prevê que para efeitos de determinar os anos de bom e efectivo serviço, apenas não são contados os anos em que os trabalhadores tenham sido punidos com sanção disciplinar “superior” a repreensão verbal e os anos em que tenham estado ausentes mais de 22 dias úteis, além das férias, com execepção das ausências previstas no n.º 5 dessa cláusula (cf. acidente de trabalho, serviço militar obrigatório e outras situações ai enunciadas).
36. O Tribunal a quo julgou que impendia sobre a recorrente o ónus de provar que prestou bom e efectivo serviço, em particular, que se verificaram as condições previstas na cláusula 103 n.º 4 do AE de 2003. O Tribunal da Relação não acompanha essa solução pelas seguintes razões. Em primeiro lugar porque da redacção da cláusula 103 n.º 4 do AE de 2003 “Para efeitos da determinação dos anos de bom e efectivo serviço, referidos nos n.ºs 1 e 2 desta cláusula, só não são contados:a)Os anos (...)” resulta que os factos previstos no n.º 4 dessa cláusula são impeditivos e não constitutivos do direito ao prémio de antiguidade. Ora o ónus da prova dos factos impeditivos impende sobre o recorrido, como estabelece o artigo 342.º n.º 2 do CC. Em segundo lugar porque, ainda que assim não fosse, se impendesse sobre a recorrente o ónus da prova das condições previstas na cláusula 103 n.º 4 do AE de 2003 isso reconduzir-se-ia à prova de factos negativos (cf. não ter sido punida com sanção disciplinar de gravidade superior a advertência verbal; não ter estado ausente por determinado período). Ora é a dificuldade de provar factos negativos que justifica a opção do legislador de, nesse caso, fazer incidir sobre o réu (recorrido) o ónus da prova, como resulta do 343.º n.º 3 CC (cf. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª Edição, Coimbra Editora, Limitada, página 307). Assim, à luz do regime legal acabado de mencionar neste parágrafo, o Tribunal julga que, em qualquer desses casos, impendia sobre o recorrido e não sobre a recorrente, o ónus da prova dos factos mencionados na cláusula 103 n.º 4 do AE de 2003, prova essa que o recorrido não fez.
37. Adicionalmente, o recorrido defende que o prémio de antiguidade previsto na cláusula 103 do AE de 2003 se enquadra nas prestações excluídas da noção de retribuição pelo artigo 260.º n.º 1 – c) do CT.
38. A esse propósito, convém sublinhar que a alínea c) do n.º 1 do artigo 260.º do CT estabelece que não se consideram retribuição as prestações decorrentes de factos relacionados com o desempenho, o mérito ou a assiduidade do trabalhador cujo pagamento, nos períodos de referência respectivos, não esteja antecipadamente garantido. Porém, no caso em análise, o pagamento do prémio de antiguidade com a regularidade correspondente aos períodos de referência previstos na cláusula 103 do AE de 2003, a saber, 15, 25 e 35 anos de antiguidade, respectivamente, está antecipadamente garantido por essa cláusula. Ainda que assim não fosse, quod non, e que se admita, por hipótese, que a cláusula 103 do AE de 2003 condiciona a atribuição do prémio de antiguidade ao bom e efectivo serviço do trabalhador, essa prestação não estaria excluída da retribuição como resulta do artigo 260.º n.º 3 -a) primeira parte, do CT.
39. Pelo que, o prémio de antiguidade previsto na cláusula 103 do AE de 2003 beneficia da presunção retributiva consagrada no artigo 258.º n.º 3 do CT. Em conformidade, impendia sobre o recorrido/empregador, o ónus de ilidir tal presunção retributiva mediante prova em contrário (cf. artigo 350.º do CC), o que o recorrido não fez.
40. Assim, o prémio de antiguidade previsto na cláusula 103 n.º 1 do AE de 2003 tem a natureza de retribuição e, por isso, está abrangido pela ressalva prevista no artigo 501.º n.º 6 do CT (na redação da Lei 7/2009 de 12.2). Pelo que, a cláusula 103 do AE de 2003 manteve-se em vigor após a caducidade do AE 2003 e até à entrada em vigor do AE de 2021. Com efeito, o artigo 501.º n.º 6 do CT (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2) prevê uma absorção contratual parcial e provisória das cláusulas colectivas que regulam as matérias nele previstas (entre as quais se inclui a cláusula 103 do AE de 2003), com efeitos futuros até que surja nova convenção que as abranja.
41. Não tendo o recorrido provado, como lhe cabia, que se verifica alguma das circunstâncias previstas na cláusula 103 n.º 4 do AE de 2003, a recorrente adquiriu o direito a essa componente da retribuição, como será a seguir explicado na análise da questão B.
42. Do acima exposto resulta que as consequências da caducidade do AE de 2003 são diferentes consoante se trate da cláusula 92 ou da cláusula 103 dessa convenção colectiva. Enquanto a cláusula 92 do AE de 2003 em princípio caduca em 28.4.2019 a não ser que na nova convenção colectiva as partes prevejam a sua aplicação, o que sucedeu apenas para os trabalhadores reformados até 22.6.2020, nos termos do regime transitório consagrado na cláusula 60 n.º 1 do AE de 2021; já a cláusula 103 do AE de 2003 manteve-se em vigor até 1.4.2021 data em que entrou em vigor o AE de 2021, por estar abrangida pela pós eficácia prevista no artigo 501.º n.º 6 do CT (na redação da Lei 7/2009 de 12.2).
B. Efeitos da sucessão de acordos de empresa no direito ao prémio de antiguidade
43. A partir da altura em que entrou em vigor a nova convenção – o AE de 2021 – aplica-se o artigo 503.º n.ºs 3 e 4 do CT à sucessão de convenções (António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 21.ª Edição, Almedina,página 976).
44. A articulação entre, por um lado, o regime da caducidade previsto no artigo 501.º n.º 6 do CT (na redação da Lei 7/2009 de 12.2, cujo teor é idêntico ao n.º 8 do mesmo preceito legal na redacção atualmente em vigor) e, por outro lado, o regime da sucessão de convenções previsto no artigo 503.º n.º 3 do CT, coloca vários problemas que o Tribunal analisará a seguir na medida em que isso releve para decisão de mérito.
45. Com efeito, o AE de 2021, ao suceder ao AE de 2003 pode modificar ou eliminar os direitos mantidos na esfera jurídica da recorrente por aplicação do artigo 501.º n.º 6 (na redação da Lei 7/2009 de 12.2) – cf. António Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 21.ª Edição, Almedina, página 976.
46. Porém, afigura-se que os direitos consagrados no AE de 2003 que se mantiveram a coberto da pós eficácia dessa convenção colectiva só podem ser reduzidos ou eliminados pelo AE de 2021 se do seu texto constar, em termos expressos, o carácter globalmente mais favorável da nova convenção colectiva, como exige o artigo 503.º n.º 3 do CT.
47. O artigo 503.º n.º 3 do CT acolhe o princípio da conglobação, segundo o qual as vantagens conferidas aos trabalhadores por um instrumento de regulamentação colectiva do trabalho apenas podem ser reduzidas ou eliminadas por um novo instrumento de regulamentação colectiva do trabalho do qual conste em termos expressos o seu carácter globalmente mais favorável.
48. Sobre o princípio da conglobação, o Tribunal acompanha a seguinte jurisprudência que julgou indispensável que a nova convenção colectiva de trabalho mencione em termos expressos o seu caracter mais favorável, para que a redução ou eliminação de direitos seja admissível (cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo 07S3656, pontos IV e V do sumário): “IV - A ideia da conglobação constante do art.º 15.º da LRCT (e mantida no art.º 360.º do CT) admite que “vantagens” conferidas aos trabalhadores por um instrumento de regulamentação colectiva possam ser reduzidas – ou eliminadas – em novo instrumento “desde que dele conste, em temos expressos, o seu carácter globalmente mais favorável”. V - A lei não exige a demonstração efectiva do carácter mais favorável da nova convenção, sendo indispensável, mas também suficiente, que dela conste, em termos expressos, essa maior favorabilidade.”
49. A salvaguarda dos direitos dos trabalhadores acolhida pelo artigo 503.º n.º 3 do CT é também designada na doutrina por princípio da progressividade irredutível: “Em matéria de sucessão de convenções colectivas de trabalho, a regra tradicional é que a convenção se mantém em vigor até ser substituída por uma nova convenção, mas esta não pode estabelecer um regime globalmente menos favorável para os trabalhadores do que o regime previsto na convenção colectiva anterior, salvaguardando-se, por esta via, os chamados “direitos adquiridos”. Esta regra assenta no pressuposto de que a evolução da situação jurídica dos trabalhadores subordinados deve ser sempre no sentido ascendente (é o princípio clássico do Direito do Trabalho que identificámos noutra sede como “princípio da progressividade irredutível”) e tem também grande tradição no nosso sistema juslaboral, sendo até hoje mantida pelo Código do Trabalho (art.503)” (Maria do Rosário Palma Ramalho, Negociação Colectiva Atípica, 2009, os. 50 e s.).” – cf. autora citada por Abílio Neto, Novo Código do Trabalho e Legislação Complementar Anotados, 3.ª Edição, Ediforum, página 1091.
50. Ora, o AE de 2021 não consagra em termos expressos no seu texto, que tem carácter globalmente mais favorável do que o AE de 2003 e simultaneamente, no capítulo dos benefícios sociais (cf. cláusulas 56 a 58 do AE de 2021), não contém uma cláusula que preveja o pagamento de um prémio de antiguidade, idêntica à cláusula 103 inserida no capítulo dos benefícios sociais do AE de 2003 (cf. cláusulas 91 a 103 do AE de 2003).
51. No que respeita à retribuição, a cláusula 38 do AE de 2021 consagra a noção de retribuição, prevendo no n.º 1 que se considera retribuição a prestação a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho.
52. Ao prever o regime de caducidade das convenções colectivas foi intenção do legislador, expressa na letra do artigo 501.º n.ºs 6 e 7 do CT (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2), preservar dos efeitos da caducidade apenas as cláusulas da negociação colectiva que incidem sobre o núcleo essencial dos direitos que integram o estatuto do trabalhador. Nesse núcleo de direitos enquadra-se o direito à retribuição. Adicionalmente, pelos motivos que a seguir serão explicados na análise da questão C, para os quais o Tribunal remete, afigura-se que o artigo 503.º n.º 3 do CT acolhe um princípio geral do direito do trabalho que se insere na tradição jurídica nacional e que tem reflexos na legislação da União. É certo que nem todos os autores defendem a imprescindibilidade de uma norma como a prevista no artigo 503.º n.º 3 do CT, mas mesmo esses autores reconhecem que “(...) razões históricas continuam – eventualmente – a justificar a sua manutenção.” – cf. Pedro Romano Martinez, Luís Miguel Monteiro, Joana Vasconcelos, Pedro Madeira de Brito, Guilherme Dray , Luís Gonçalves da Silva, Código do Trabalho Anotado, 8.ª Edição, 2009, Almedina, página 1215.
53. Adicionalmente, resulta do artigo 501.º n.º 7 do CT (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2) que em caso de caducidade da convenção colectiva, além efeitos referidos no número 6 desse preceito, o trabalhador continua a beneficiar dos demais direitos e garantias decorrentes da legislação do trabalho, entre as quais, a garantia da irredutibilidade da retribuição prevista no artigo 129.º n.º 1 - d) do CT.
54. É forçoso reconhecer que a irredutibilidade da retribuição pode ser afastada por instrumento de regulamentação colectiva do trabalho (cf. artigos 129.º n.º 1 – d) e 478.º n.º 1 – c) do CT). Porém, tendo em conta que a retribuição integra o núcleo essencial do estatuto do trabalhador que o legislador preserva no período de pós vigência, como prevê o artigo 501.º n.º 6, afigura-se que quando período de pós vigência termina com a entrada em vigor de nova convenção colectiva, a diminuição do direito à retribuição previsto na anterior convenção colectiva só pode ocorrer com respeito pela regra imperativa da conglobação prevista no artigo 503.º n.º 3 do CT.
55. Pelo que, não obstante a caducidade do AE de 2003, as cláusu las de natureza retributiva nele previstas, entre as quais a cláusula 103, continuam a produzir efeitos no contrato de trabalho individual celebrado entre a recorrente e o recorrido porque foram absorvidas por tal contrato e com a entrada em vigor do AE de 2021 só poderiam ser alteradas mediante a observância do princípio da conglobação previsto no artigo 503.º n.º 3 do CT.
56. Em consequência, do AE de 2021 não pode resultar a eliminação do direito da recorrente ao prémio de antiguidade, que faz parte da sua retribuição, fora das condições previstas no artigo 503 n.º 3 do CT, que aqui não se verificam, uma vez que o AE de 2021 não menciona expressamente no seu texto ter carácter globalmente mais favorável do que o AE de 2003.
57. Assim sendo, uma vez que a recorrente completou 25 anos de serviço em 2021 (cf. facto provado 7), quando o contrato de trabalho ainda estava em execução, tem direito ao respectivo prémio de antiguidade previsto na cláusula 103 n.º 1 do AE de 2003, equivalente a dois meses da sua retribuição mensal efectiva em 2021, porque tal prestação: (i) beneficia da presunção retributiva; (ii) foi absorvida pelo seu contrato individual de trabalho, tal como foi explicado supra; (iii) et pour cause, está abrangida pela noção de retribuição prevista na cláusula 38 n.º 1 do novo AE de 2021, no que ao contrato de trabalho da recorrente diz respeito.
58. No artigo 30.º da petição inicial (cf. referência citius 36624757 de 24.7.2023) a recorrente alega que o valor da retribuição mensal que recebia em 2021 multiplicado por 2, é de 1491,04 euros. O Tribunal a quo não inseriu esse facto no elenco dos factos provados, mas como a contestação não foi admitida, por extemporânea (cf. despacho de 12,1.2024 com a referência citius 431648172), nos termos do artigo 57.º do CPT, tal facto considera-se confessado.
59. Em consequência, o Tribunal da Relação, ao abrigo do disposto nos artigos 607.º n.º 4 segunda parte e 663.º n.º 2 do CPC, leva em consideração no presente acórdão o facto alegado no artigo 30.º da petição inicial por se tratar de um facto provado por confissão.
60. Da clausula 103 do AE de 2003 resulta que o prémio de antiguidade devia ser pago em 2021, pelo que se venceu em 31.12.2021.
61. Assim, tendo essa obrigação prazo certo, pela mora no seu cumprimento o recorrido deve pagar à recorrente os juros de mora sobre a quantia devida pelo prémio de antiguidade, à taxa legal anual de 4%, vencidos desde 1.1.2022 e vincendos até integral pagamento – cf. artigos 559.º n.º 1 e 805.º n.º 2 – a) do CC e Portaria 291/2003 de 8.4.
62. Motivos pelos quais procede este segmento da argumentação da recorrente, é revogada nessa parte a sentença recorrida e substituída por outra que condena o recorrido pagar à recorrente a quantia de 1491,04 euros de prémio de antiguidade, acrescida dos juros de mora à taxa legal anual de 4% vencidos desde 1.1.2022 e vincendos até integral pagamento.
C. Efeitos da sucessão de acordos de empresa no regime complementar de reforma
63. Já para saber qual é o efeito da sucessão de acordos de empresa no direito ao complemento da pensão de reforma previsto na cláusula 92 do AE de 2003, que em princípio caducou com a caducidade do AE de 2003, excepto na medida em que foi salvaguardado pelo AE de 2021 para os trabalhadores reformados até 22.6.2020, o Tribunal leva em conta os seguintes factores.
64. A recorrente reformou-se em 31.8.2022 (cf. facto provado 6), pelo que não está abrangida pelo limite temporal previsto na cláusula 60.º n.º 1 do AE de 2021, que prevê que os trabalhadores reformados até 22.6.2020 mantêm os direitos e regalias vigentes na mencionada data e decorrentes do anterior AE.
65. Tendo a recorrente passado à reforma posteriormente a 22.6.2020, a cláusula 60 n.º 2 do AE de 2021 prevê que se lhe aplicam as normas do AE de 2021 que não consagram, para além do período transitório mencionado no n.º 1 dessa cláusula, um sistema complementar de pensões.
66. A recorrente argumenta que a cláusula 60 do AE de 2021 é inconstitucional, por infringir o princípio da protecção da confiança ínsito no artigo 2.º da CRP. Para apreciar essa argumentação o Tribunal leva em conta os seguintes factores.
67. O Tribunal Constitucional já se pronunciou, como se segue, a propósito do princípio da confiança ínsito no artigo 2.º da CRP e das condições a observar para que a protecção das expectativas dos pensionistas cujas pensões já estão em pagamento possa ser limitada por lei (cf. acórdão do Tribunal Constitucional n.º 862/2013): “Uma medida que pudesse intervir de forma a reduzir o montante de pensões a pagamento teria de ser uma medida tal que encontrasse um forte apoio numa solução sistémica, estrutural, destinada efetivamente a atingir os três desideratos acima explanados: sustentabilidade do sistema público de pensões, igualdade proporcional, e solidariedade entre gerações. (...) “Em suma: a redução e recálculo do montante das pensões dos atuais beneficiários, com efeitos imediatos, é uma medida que afecta desproporcionadamente o princípio constitucional da proteção da confiança ínsito no princípio do Estado de Direito democrático plasmado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa.”
68. No que aqui releva, convém sublinhar que o artigo 2.º da CRP atribui relevância ao princípio social, sendo acima de tudo uma norma de natureza interpretativa e integradora, que confere sentido unitário a outros princípios que a revelam ou concretizam (cf. J.J. Gomes Canotilho, Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, Coimbra Editora, página 211).
69. No plano do direito nacional, importa então conjugar e interpretar à luz do disposto no artigo 2.º da CRP, os seguintes preceitos legais:
• O artigo 56.º n.ºs 3 e 4 da CRP, que garante às associações sindicais o direito de contratação colectiva;
• O artigo 501.º (na redação da Lei 7/2009 de 12.2), que prevê a caducidade da convenção colectiva e um regime de pós eficácia provisório e limitado a certas matérias;
• O artigo 503.º n.º 3 do CT, que consagra o princípio da conglobação ou da progressividade irreversível;
• Os artigos 21.º e 103.º n.º 1 – g) da Lei 32/2002 e os artigos 20.º, 86.º n.º 2 e 100.º da Lei 4/2007 (que revogou a Lei 32/2002), que prevêem a protecção dos direitos adquiridos e dos direitos em formação nos regimes profissionais complementares da segurança social.
70. Adicionalmente, o Tribunal levará em conta na análise que se segue, os instrumentos legais internacionais que vinculam Portugal e a jurisprudência que sobre eles tem incidido, no que respeita ao direito de contratação colectiva, à margem de autonomia dos parceiros sociais e à progressividade irredutível dos direitos garantidos aos trabalhadores.
71. Assim, no plano nacional o artigo 56.º n.ºs 3 e 4 da CRP consagra o direito de contratação colectiva como um direito fundamental atribuído unicamente às associações sindicais e garantido nos termos da lei. Porém, a lei não pode impor a caducidade retroactiva de normas de uma convenção colectiva de modo a afectar a estabilidade dos contratos de trabalho abrangidos por essas normas ou nos quais elas se incorporaram (cf. nesse sentido, J.J. Gomes Canotilho, Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, Coimbra Editora, página 745).
72. Nesse contexto, o Tribunal Constitucional apreciou a questão de saber se a caducidade da convenção colectiva uma vez decorrido o prazo da sobrevigência sem que tenha sido celebrada nova convenção ou sem que se tenha iniciado a arbitragem, infringe o disposto no artigo 56.º n.ºs 3 e 4 da CRP. A resposta do Tribunal Constitucional a essa questão foi negativa, com base no raciocínio seguinte: “(...) Entende, porém, o Tribunal (posição que não é acompanhada pelo relator) que a questionada solução legislativa, impondo limites que se consideram mitigados à sobrevigência, se mostra razoável e equilibrada. Desde logo, ela surge como mera solução supletiva, competindo às partes, em primeira linha, a adopção do regime que reputem mais adequado. Depois, é assegurado, após a denúncia e até ao início da arbitragem, um período de sobrevigência que pode atingir os dois anos e meio. Finalmente, seria contraditório com a autonomia das partes, que é o fundamento da contratação colectiva, a imposição a uma delas, por vontade unilateral da outra, da perpetuação de uma vinculação não desejada. Constituiu, no entanto, pressuposto desta posição o entendimento de que a caducidade da eficácia normativa da convenção não impede que os efeitos desse regime se mantenham quanto aos contratos individuais de trabalho celebrados na sua vigência e às respectivas renovações.” – cf. acórdão do Tribunal Constitucional n.º 306/03
73. Em particular, quanto à conformidade constitucional do artigo 501.º do CT, na redação da Lei 7/2009 de 12.2, aqui aplicável, o Tribunal Constitucional decidiu não declarar a inconstitucionalidade desse artigo com base no seguinte raciocínio: “Por fim deve notar-se que, não obstante as diversas posições doutrinárias que se enunciaram, se é verdade que o estatuto dos trabalhadores só se mantém, nos termos do n.º 6 do artigo 501.º, em relação a alguns aspectos da relação de trabalho, aquilo que se mantém - retribuição, categoria, tempo de trabalho e benefícios sociais - é, sem dúvida, o mais relevante e importante da posição contratual de qualquer trabalhador, integrando, assim, o respectivo “núcleo essencial”, relativo ao estatuto do trabalhador. E se no artigo 10.º da Lei n.º 7/2009, não se contém uma tal cláusula de salvaguarda da posição individual dos trabalhadores, tal não significa que esses trabalhadores não tenham uma protecção semelhante. Na verdade, deve desde logo adiantar-se que o conteúdo essencial do artigo 501.º, n.º 6, resulta já em boa parte dos termos gerais em que a lei prevê as "garantias do trabalhador" (artigo 129.º do Código do Trabalho), pretendendo "preservar a situação funcional básica do trabalhador", não só no que se refere à retribuição e à categoria (expressamente previstas no catálogo legal de garantias dos trabalhadores), mas inclusivamente no que respeita aos tempos de trabalho, uma vez que, quanto a este último ponto, "a solução contrária envolveria a diminuição da retribuição/hora do trabalhador (veja-se Bernardo Xavier, ("Vigência e sobrevigência das Convenções colectivas de Trabalho", in RDES, ano XLIX-2008, pp. 92-95, incluindo a nota 142). Simplesmente, não será necessário invocar tais garantias gerais do trabalhador, havendo norma especial. O artigo 501.º, n.º 6, confere uma protecção mais ampla aos trabalhadores, abrangendo nomeadamente os benefícios sociais que não estão contidos nas garantias do artigo 129.º do Código do Trabalho. (...) Não pretende o legislador regular nem o modo de induzir à celebração de uma nova convenção colectiva nem a situação individual dos trabalhadores após a caducidade das convenções antigas. Essa matéria está regulada no Código do Trabalho e, mais especificamente, no que respeita à posição individual dos trabalhadores, no artigo 501.º, n.º 6 (a que acresce o n.º 7 que se limita a afirmar o óbvio: a caducidade das convenções colectivas não prejudica os direitos e garantias dos trabalhadores consagrados na lei laboral). Assim, se uma convenção colectiva caduca, o trabalhador que estava por ela abrangido continuará a beneficiar de todos os direitos que o contrato de trabalho, as leis e a Constituição lhe reconhecem. Beneficiará, ainda, dos direitos relativos à retribuição, categoria, tempos de trabalho e benefícios sociais que a convenção caducada lhe concedia (artigo 501.º, n.º 6 do Código do Trabalho). Quanto ao resto, estará dependente daquilo que - dentro dos prazos de sobrevigência das convenções e, eventualmente, com recurso à mediação, conciliação ou arbitragem - venha a resultar de um novo contrato colectivo. Mas não poderá validamente invocar o direito de contratação colectiva (artigo 56.º, n.º 3 da Constituição) como direito a manter intactas todas as condições de que beneficiaria se a convenção colectiva de que outrora beneficiou se mantivesse plenamente em vigor. O legislador pode validamente estabelecer limites ou restrições à eficácia temporal das convenções colectivas (artigo 56.º, n.º 4 da Constituição). Nestes termos, o artigo 501.º do Código do Trabalho e o artigo 10.º da Lei n.º 7/2009, não violam o direito de contratação colectiva (artigo 56.º, n.ºs 3 e 4, da Constituição) não padecendo, por isso, de qualquer vício de inconstitucionalidade.” – cf. acórdão do Tribunal Constitucional n.º 338/10.
74. Da jurisprudência do Tribunal Constitucional acima mencionada resulta, em síntese, que:
• Uma norma que aplique reduções imediatas a pensões de reforma já em pagamento, não é conforme ao artigo 2.º da CRP excepto se for justificada por razões de sustentabilidade do sistema público de pensões, igualdade proporcional e solidariedade entre gerações;
• A conformidade constitucional do regime consagrado no artigo 501.º do CT de 2009 na redacção da Lei 7/2009 de 12.2, tem por pressuposto que a caducidade da eficácia normativa da convenção não impeça que os seus efeitos se mantenham quanto aos contratos individuais de trabalho celebrados na sua vigência e respectivas renovações;
• O Tribunal Constitucional julga bastante para preencher esse pressuposto que se mantenham apenas alguns direitos, relativos à retribuição, categoria, tempos de trabalho e benefícios sociais que a convenção caducada concedia aos trabalhadores, como prevê o artigo 501.º, n.º 6 do Código do Trabalho na redacção da Lei 7/2009 de 12.2, assim como os direitos que já resultam da lei, como prevê o n.º 7 desse preceito;
• Quanto aos restantes direitos (entre os quais se inclui o complemento da pensão em litígio nos presentes autos), o Tribunal Constitucional julga que o trabalhador não poderá validamente invocar o direito de contratação colectiva previsto no artigo 56.º, n.º 3 da CRP como direito a manter intactas todas as condições de que beneficiaria se a convenção colectiva de que outrora beneficiou se mantivesse plenamente em vigor;
• No que respeita à autonomia dos parceiros sociais, reduzida através do limite temporal à duração da convenção colectiva introduzido pelo legislador, o Tribunal Constitucional julgou que o legislador pode validamente estabelecer limites ou restrições à eficácia temporal das convenções colectivas ao abrigo do disposto no artigo 56.º n.º 4 da CRP.
75. Já no plano do direito da União, o direito de negociação colectiva está consagrado no artigo 28.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Por seu lado, o artigo 151.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia faz referência expressa à Carta Social Europeia de 1961 e estabelece como objectivo da União e dos Estados Membros o diálogo entre os parceiros sociais. Adicionalmente, o artigo 152.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia reconhece e promove o papel dos parceiros sociais no espaço da União, tendo em conta a diversidade dos sistemas nacionais e prevê que a União facilita o diálogo entre os parceiros sociais, no respeito pela sua autonomia.
76. À luz desse quadro legal, o Tribunal de Justiça da União Europeia, no contexto de um reenvio prejudicial que teve por objecto a Directiva 2008/104/CE (relativa ao trabalho temporário), interpretou o artigo 28.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e o artigo 152º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, no sentido de que tais preceitos conferem uma ampla margem de autonomia aos parceiros sociais; todavia, quando o direito à negociação coletiva for abrangido pelas disposições do direito da União, o mesmo deve, no âmbito de aplicação do referido direito, ser exercido em conformidade com este (cf. acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia o C-311/21, parágrafos 71 a 75).
77. Adicionalmente, ainda no plano internacional, o direito de contratação colectiva está previsto no artigo 6.º da Carta Social Europeia de 1961 (revista em 1996), ratificada por Portugal, sendo aí conferido tanto aos trabalhadores como aos empregadores. Embora o direito de contratação colectiva não esteja consagrado na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem interpretou repetidas vezes o direito de contratação colectiva, no contexto da apreciação de alegadas desconformidades com o direito à liberdade de reunião e de associação, incluindo associação sindical para defesa dos interesses dos trabalhadores, consagrado no artigo 11.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (cf. acórdãos do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, Swedish Engine Drivers´Union v. Sweeden, processo 5615/72; Gustafsson c. Suède, processo 15573/89; Demir et Baykara c. Turquie, processo 34503/97).
78. Dito isto, é forçoso constatar que ao consagrar o regime da caducidade previsto no artigo 501.º do CT, o legislador português quis introduzir limites à eficácia temporal das convenções colectivas preservando apenas uma parte, nuclear, dos direitos que integram o estatuto do trabalhador, mas não garantindo a preservação da restante parte dos direitos adquiridos que resultavam da convenção colectiva anterior (cf. jurisprudência do Tribunal Constitucional mencionada no parágrafo 73). Ora, ainda que essa solução legislativa não tenha sido julgada inconstitucional, o certo é que levanta dificuldades práticas.
79. Uma dessas dificuldades, consiste precisamente em saber como conciliar o regime da caducidade da convenção colectiva com o princípio da conglobação ou da progressividade irredutível, consagrado no artigo 503.º n.º 3 do CT. É que, ainda que o Tribunal Constitucional tenha isentado de inconstitucionalidade o regime da caducidade da convenção colectiva previsto no artigo 501.º do CT, fica por resolver a questão da articulação desse preceito com o artigo 503.º 3 do CT no caso de a nova convenção suceder a uma convenção que caducou. Ora, a discordância da recorrente prende-se com a destruição retroactiva do seu direito ao complemento de pensão que estava em formação na data em que caducou a anterior convenção e que a nova convenção manteve apenas para os trabalhadores que se reformassem até 22.6.2020 (o que não sucede com a recorrente).
80. Ainda que não seja de exigir a verificação do condicionalismo previsto no artigo 503.º n.º 3 do CT relativamente a cláusulas, como a cláusula 92 do AE de 20003, cuja eficácia normativa o legislador previu expressamente que cessava na data da caducidade desse AE, como estabelece o artigo 501.º n.º 4 do CT (na redacção da Lei 7/2002 de 12.2), sem consagrar quanto a elas a salvaguarda prevista no n.º 6 desse preceito legal, o certo é que a lei não pode impor a caducidade retroactiva de normas de uma convenção colectiva de modo a afectar a estabilidade dos contratos de trabalho abrangidos por essas normas, incluindo os direitos adquiridos e em formação. É o que parece resultar não só do disposto no artigo 56.º da CRP, interpretado à luz do artigo 2.º da CRP, como dos instrumentos legais internacionais que vinculam o Estado Português.
81. Com efeito, a propósito da destruição retroactiva das cláusulas de uma convenção colectiva o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, depois de sublinhar que as excepções ao artigo 11.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem devem ser interpretadas restritivamente e de reafirmar que as limitações aos direitos aí consagrados têm de estar previstas na lei, prosseguir um fim legítimo e ser necessárias numa sociedade democrática, julgou que não é conforme ao artigo 11.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem a destruição retroactiva dos efeitos das normas de uma convenção colectiva, motivada pelo não reconhecimento de um sindicato e do seu direito à negociação colectiva, quando daí resultou uma diminuição da protecção que era conferida aos trabalhadores por essa convenção colectiva (cf. Acórdão do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, Demir at Baykara c. Turquie, processo 34503/97, parágrafos 117 a 119 e 157 e 159).
82. Por seu lado, no plano do direito da União, a ampla margem de autonomia dos parceiros sociais no exercício do direito à contratação colectiva tem por limite a proibição de os parceiros sociais reduzirem o nível global de protecção dos trabalhadores previsto pelo direito da União, como resulta da jurisprudência do Tribunal de justiça acima citada no parágrafo 76 e da parte final do considerando (38) da Directiva (EU) 1152/2019 (sobre condições de trabalho transparentes e previsíveis) a seguir citado: (...) Por conseguinte, os Estados-Membros deverão poder autorizar os parceiros sociais a manter, negociar, celebrar e aplicar convenções coletivas que diferem de certas disposições constantes da presente diretiva, desde que o nível global de proteção dos trabalhadores não seja reduzido.”
83. De acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia, o efeito derrogatório dos direitos dos trabalhadores resultante de uma convenção colectiva deve ser acompanhado de vantagens compensatórias (cf. acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia o C-311/21, parágrafo 77): “77. A fim de assegurar a plena eficácia da Diretiva 2008/104, como salientou o advogado‑geral no n.º 79 das suas conclusões, incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se as convenções coletivas que, por força do artigo 5.º, n.º 3, desta diretiva, derrogam o princípio da igualdade de tratamento, garantem adequadamente a proteção geral dos trabalhadores temporários concedendo‑lhes, em contrapartida, vantagens compensatórias para qualquer derrogação ao referido princípio da igualdade de tratamento.”
84. Ora, tendo a recorrente suscitado a questão da interpretação do regime transitório previsto na cláusula 60 do AE de 2021 por discordar da destruição retroactiva do seu direito ao complemento de reforma que dai possa resultar, o conteúdo normativo dessa cláusula deve ser interpretado à luz dos critérios previstos no artigo 9.º do CC, levando em conta, nomeadamente, que a letra dessa cláusula não se refere aos direitos em formação e que o sistema juridico no seu todo tutela os direitos em formação nos regimes complementares como o que aqui está em causa.
85. A esse propósito, convém sublinhar que para obter a anulação e interpretação de cláusulas de uma convenção colectiva, a lei põe ao dispor do interessado uma forma de processo diversa da que segue a presente acção, prevista nos artigos 183.º a 186.º do CPT, no âmbito da qual teriam de ser citados todos os outorgantes da convenção colectiva. Não sendo esse o objeto da presente acção, isso não obsta a que o Tribunal interprete o conteúdo normativo da cláusula 60.º do AE de 2021 no quadro da relação jurídica entre as partes, que aqui está em causa.
86. Feita esta clarificação, é forçoso constatar que ocorreu uma alteração do plano complementar de reforma instituído pela cláusula 92 do AE de 2003 que resultou da sucessão de convenções colectivas, designadamente da caducidade do AE de 2003 e do regime transitório previsto na cláusula 60 do AE de 2021 que não manteve a aplicação do regime complementar anteriormente instituído para trabalhadores que, como a autora, se reformaram após 22.6.2020.
87. Pelo que, a argumentação da recorrente, na parte em que defende a protecção do seu direito ao complemento da pensão calculado pelo menos de modo proporcional aos anos de serviço que tinha à data em que caducou o AE de 2003, deve ser analisada sob o ângulo dos efeitos, nos direitos em formação, dessa alteração ao plano complementar resultante da sucessão de convenções colectivas.
88. A solução desse problema convoca a aplicação dos artigos 21.º, 94.º, 95.º e 103.º n.º 1 – g) da Lei 32/2002 e dos artigos 20.º, 86.º n.º 2 e 100.º da Lei 4/2007 (que revogou a Lei 32/2002), preceitos legais que tutelam os direitos em formação nos regimes complementares da segurança social. Tais preceitos legais devem ser interpretados em conformidade com o artigo 2.º da CRP, nomeadamente tendo em conta o princípio social nele consagrado e a jurisprudência acima citada.
89. A esse propósito, o Tribunal recorda que a cláusula 95 do AE 2003 estabelece que para garantia dos benefícios previstos na cláusula 92 o recorrido criará um fundo de pensões. Porém, o instrumento de criação do fundo de pensões previsto na cláusula 95 do AE de 2003 não foi incorporado nesse AE e, apesar de a recorrente ter alegado que tal fundo de pensões foi criado, o recorrido informou o Tribunal que o respectivo documento constitutivo não existe, tal como já foi mencionado.
90. De acordo com os estatutos do recorrido que o Tribunal leva em conta ao abrigo do disposto no artigo 412.º n.º 1 do CPC, por se tratar de um facto notório publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, que não carece de alegação nem prova, o recorrido previu que na falta de um fundo de pensões manteria um fundo de reformas para dar cumprimento às obrigações resultantes dos regimes complementares de reforma dos seus empregados – cf. artigo 101.º n.º 1 – d) dos estatutos do recorrido publicados no BTE n.º 14 de 15.4.2002 e artigo 80.º n.º 1 – d) dos estatutos do recorrido publicados no BTE n.º 19 de 22.5.2008. Em 2024, os estatutos do recorrido publicados no BTE n.º 4 de 29.1.2024 passaram a prever de forma genérica que o recorrido terá os fundos especiais que sejam aprovados pelo conselho geral, sob proposta da direção.
91. Caso o recorrido tivesse criado o fundo de pensões previsto na cláusula 95 do AE de 2003, esse fundo atualmente estaria sujeito à disciplina prevista na Lei 27/2020 de 23.7, no que respeita ao seu funcionamento e supervisão, e do DL 40/2018 de 11.6, que transpõe a Directiva 2014/50/EU, no que respeita à aquisição, manutenção e portabilidade dos direitos adquiridos e em formação. Não se tendo provado a constituição do fundo de pensões, a alternativa viável nos termos da lei e dos estatutos do recorrido, para executar o regime complementar colectivo previsto na cláusula 92 do AE de 2003, seria a criação de um fundo poupança reforma numa das modalidades previstas no DL 158/2002 de 2.7, sendo-lhe subsidiariamente aplicável a legislação dos fundos de investimento, dos fundos de pensões ou da actividade seguradora, consoante a sua natureza (cf. artigos 1.º, 2.º e 10.º do DL 158/2002).
92. Porém, não se provou a criação de um fundo de pensões, nem a constituição alternativa do fundo de reformas (fundo poupança reforma) previsto nos estatutos do recorrido.
93. Pelo que, dentro dos limites do provado e tendo em conta o estipulado nas convenções colectivas aqui em causa e nos estatutos do recorrido, todos eles publicados no BTE, o Tribunal julga que, independentemente da natureza do instrumento que define as condições de execução do plano complementar de reforma (eg. um fundo de pensões ou um fundo poupança reforma ou outro), o certo é que o sistema complementar aqui em causa foi instituído pela cláusula 92 do AE de 2003 que prevê os factores a levar em conta, designadamente os anos de serviço, a remuneração efectiva a considerar, a fórmula de acordo com a qual deve ser calculado o complemento da pensão de reforma, o número de prestações por ano e a periodicidade com que deve ser paga a pensão complementar.
94. Por isso, qualquer alteração a esse plano complementar de reforma resultante da caducidade do AE de 2003 que o instituiu e da celebração do novo AE em 2021, tem de respeitar os direitos em formação da recorrente na data da caducidade do AE de 2003, como estabelecem imperativamente os artigos 21.º e 103.º n.º 1 – g) da Lei 32/2002 (Bases da segurança social), em vigor à data da celebração do AE de 2003. A mesma tutela imperativa dos direitos em formação foi mantida pelo legislador nos artigos 20.º, 86.º n.º 2 e 100.º da Lei 4/2007 (Bases gerais do sistema de segurança social), que revogou a Lei 32/2002). Em particular, o artigo 100.º da Lei 4/2007 prevê a salvaguarda dos direitos adquiridos e em formação estabelecidos pelos regimes anteriores, nomeadamente dos quantitativos de pensões que resultem de remunerações registadas na vigência da legislação anterior.
95. Com efeito, quer o artigo 21.º da Lei 32/2002, quer o artigo 20.º da Lei 4/2007, consagram o princípio da conservação dos direitos adquiridos e em formação, como um princípio geral aplicável a todos os sistemas de segurança social ali previstos, incluindo o sistema complementar aqui em causa, seja qual for a natureza do instrumento que define as condições da sua execução.
96. No sentido de que o artigo 20.º da Lei 4/2007 tutela imperativamente os direitos adquiridos e em formação, o Tribunal acompanha a seguinte jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, num caso que não é idêntico, mas é análogo (cf. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo 4624/21.4T8GMR.L1.S1, parágrafos 21 e 22): “21. (...) Vale dizer que desta forma se desenhou um sistema diferente do anteriormente aplicável, o qual, ao estipular que aos trabalhadores em causa deixaria de ser aplicável a supracitada cláusula 23.ª do AE (cfr. supra nº 17), lhes retirou o regime de proteção de doença previsto, nomeadamente, na cláusula 95ª do ACT, ao qual teriam direito, caso preencham os respetivos requisitos. 22. Ora, tal conteúdo normativo viola, desde logo, o princípio da manutenção dos direitos adquiridos (...) princípio consagrado em termos mais amplos no art.º 20.º das Bases Gerais do Sistema de Segurança Social (Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro), disposição legal que – imperativamente – tutela os direitos adquiridos e os direitos em formação e é aplicável aos regimes do sistema previdencial, nos termos do seu art.º 66º, nº 1. Segundo o nº 2 deste mesmo artigo 66º, consideram-se direitos adquiridos os que já se encontram reconhecidos ou possam sê-lo por se encontrarem reunidos todos os requisitos legais necessários ao seu reconhecimento; e direitos em formação os correspondentes aos períodos contributivos e valores de remunerações registadas em nome do beneficiário. (...)”
97. À luz do regime legal e da jurisprudência acima citados nos parágrafos 94 a 96, a recorrente, embora em 28.4.2019, data em que caducou o AE de 2003, ainda não tivesse adquirido o direito à reforma (apenas veio a reformar-se em 31.8.2022), gozava de um direito em formação ao complemento da pensão de reforma, determinado com base nos factores previstos na cláusula 92 do AR de 2003, a saber, a antiguidade e as retribuições consideradas/registadas para esse efeito.
98. Por seu lado, não resulta da letra da cláusula 60 do AE de 2021 qualquer referência expressa aos direitos em formação até ao momento em que caducou o AE de 2003 e, pelos motivos já acima explicados, essa cláusula não pode afectar a estabilidade dos direitos em formação no âmbito dos regimes complementares de reforma, nem derrogar ao regime de sobrevigência previsto o artigo 501.º n.º 4 do CT (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2).
99. Pelo que, o recorrido tem a obrigação de pagar à recorrente o complemento de reforma previsto na cláusula 92 do AE de 2003 com a periodicidade aí prevista, levando em conta os anos de serviço da recorrente até 27.4.2019 (data até à qual a cláusula 92 do AE de 2003 manteve a eficácia normativa) e as remunerações que, nos termos dessa cláusula devem ser consideradas, ainda que não se tenha provado que a recorrente contribuísse para esse sistema complementar, pois não é exigida a contribuição dos trabalhadores, como já foi acima explicado.
100. Por tais motivos, procede parcialmente este segmento da argumentação da recorrente, é revogada nessa parte a sentença recorrida e substituída por outra que condena o recorrido pagar à recorrente o valor correspondente ao complemento da pensão de reforma calculado com base nas retribuições que nos termos da cláusula 92 do AE de 2003 devem consideradas para esse efeito, na antiguidade que a recorrente detinha em 27.4.2019, nos factores, na fórmula e com a periodicidade, previstos na cláusula 92 do AE de 2003, conforme se vier a liquidar em execução de sentença – cf. artigo 609.º n.º 2 do CPC.
101. O direito ao complemento da pensão de reforma, em formação até 27.4.2019, venceu-se pelo menos a partir de 31.8.2022, data em que a recorrente se reformou, sem que lhe passasse a ser pago com a periodicidade mensal prevista na cláusula 92 do AE de 2003, a saber, 12 vezes por ano, acrescido do complemento devido em Novembro e do 14.º mês devido em Abril. Assim sendo, pela mora no cumprimento das prestações mensais já vencidas são devidos juros de mora à taxa legal anual de 4%, vencidos e vincendos até integral pagamento – artigos 559.º n.º 1 e 805.º n.º 2 – a) do CC e Portaria 291/2003 de 8.4. Tais juros de mora contam-se desde a data da citação para a presente acção porque, sendo a falta de liquidez da obrigação imputável ao devedor/recorrido, o mesmo constituiu-se em mora desde a data da citação para a presente acção, como prevê o artigo 805.º n.º 1 e n.º 3, primeira parte do CC. Em síntese
102. As consequências da caducidade do AE de 2003 são diferentes consoante se trate da cláusula 92 ou da cláusula 103 desse AE.
103. Os efeitos normativos da cláusula 92 do AE de 2003 que institui um regime complementar de reforma, mantêm-se durante o período de sobrevigência mas cessam com a caducidade dessa convenção ocorrida em 28.4.2019, a não ser que na nova convenção as partes prevejam a sua aplicação (o que sucedeu apenas nos termos da cláusula 60 n.º 1 do AE de 2021 para os trabalhadores reformados até 22.6.2020, entre os quais não se encontra a recorrente que se reformou em 31.8.2022 ) – cf. artigo 501.º n.º s 1 a 4 do CT na redação da Lei 7/2009 de 12.2.
104. Já a cláusula 103 do AE de 2003, que prevê o pagamento do prémio de antiguidade e tem carácter retributivo por beneficiar da presunção constante do artigo 258.º n.º 3 do CT, manteve-se em vigor até 1.4.2021 data em que entrou em vigor o AE de 2021, por estar abrangida pelo regime de pós eficácia do AE de 2003 que se seguiu à caducidade – cf. artigo 501.º n.º 6 do CT, na redação da Lei 7/2009 de 12.2.
105. A cláusula 103 do AE de 2003, sendo de natureza retributiva, foi absorvida pelo contrato de trabalho individual da recorrente e uma vez que a sua eficácia normativa se manteve até à data da entrada em vigor do AE de 2021, aplica-se-lhe o princípio da irredutibilidade da retribuição previsto no artigo 129.º n.º 1 – d) do CT, apenas podendo ser reduzida ou eliminada pelo novo AE se for observado o condicionalismo previsto no artigo 503.º n.º 3 do CT, o que não sucede.
106. Uma vez que a recorrente completou 25 anos de serviço em 2021 quando o contrato de trabalho ainda estava em execução, tem direito ao respectivo prémio de antiguidade previsto na cláusula 103 n.º 1 do AE de 2003; tal prémio faz parte da noção de retribuição que nos termos da cláusula 38.º n.º 1 do novo AE de 2021 o recorrido é obrigado a pagar-lhe.
107. No âmbito da presente acção o Tribunal deve interpretar o conteúdo normativo da cláusula 60.º do AE de 2021 e os seus efeitos na relação entre as partes, à luz dos critérios de interpretação previstos no artigo 9.º do CC, designadamente a letra dessa cláusula e a unidade do sistema jurídico.
108. Tendo a recorrente alegado que a cláusula 60 do AE de 2021 viola o disposto no artigo 2.º da CRP, o Tribunal leva em conta que o artigo 2.º da CRP atribui relevância ao princípio social, sendo acima de tudo uma norma de natureza interpretativa e integradora, que confere sentido unitário a outros princípios que a revelam ou concretizam, nomeadamente o artigo 56.º da CRP e o artigo 501.º do CT.
109. Da caducidade e sucessão de convenções colectivas – o AE de 2003 a que se sucedeu o AE de 2021 – resultou uma alteração do regime complementar de segurança social instituído pela cláusula 92 do AE de 2003.
110. Independentemente da existência e natureza de um instrumento destinado a executar o regime complementar instituído pela cláusula 92 do AE de 2003, que não se apurou, o certo é que esse regime complementar foi instituído pelo AE de 2003 e, nesse contexto, a argumentação da recorrente deve ser analisada à luz dos efeitos, nos direitos em formação, da alteração ao regime complementar operada pela sucessão de convenções.
111. A solução desse problema convoca a aplicação dos artigos 21.º, 94.º, 95.º e 103.º n.º 1 – g) da Lei 32/2002 e dos artigos 20.º, 86.º n.º 2 e 100.º da Lei 4/2007 (que revogou a Lei 32/2002), preceitos legais que tutelam imperativamente os direitos em formação provenientes do sistema complementar instituído através da contratação colectiva, de que gozava a recorrente até à data em que caducou o AE de 2003, independentemente da natureza do instrumento através do qual era executado esse plano complementar e sem que seja exigida a contribuição dos trabalhadores para o sistema complementar colectivo aqui em causa.
112. Quer o artigo 21.º da Lei 32/2002, quer o artigo 20.º da Lei 4/2007, consagram o princípio da conservação dos direitos adquiridos e em formação, como um princípio geral aplicável a todos os sistemas de segurança social ali previstos, incluindo o sistema complementar, profissional e colectivo, instituído pela cláusula 92 do AE de 2003.
113. A cláusula 60 do AE de 2021 não se refere expressamente aos direitos em formação da recorrente na data em que caducou o AE de 2003; no âmbito dos efeitos que produz no sistema complementar de reforma da recorrente, tal cláusula deve ser interpretada em conformidade com os artigos 2.º e 56.º da CRP dos quais resulta a proibição da destruição retroactiva dos efeitos normativos de cláusulas de convenções colectivas que afecte a estabilidade dos direitos em formação; nesse contexto, a cláusula 92 do AE de 2003 manteve-se em vigor até à data da caducidade desse AE tal como prevê o artigo 501.º n.º 4 do CT (na redacção da Lei 7/2009 de 12.2); os direitos da recorrente ao complemento de pensão, em formação até 27.4.2019 (data até à qual se manteve o efeito normativo da cláusula 92 do AE de 2003), beneficiam da tutela imperativa prevista no artigo 21.º da Lei 32/2002, tutela essa que o legislador manteve nos artigo 20.º e 100.º da Lei 4/2007, que lhe sucedeu.
114. Pelo que, a recorrente tem direito ao complemento da pensão de reforma calculado com base nas retribuições consideradas/registadas para esse efeito e na antiguidade que tinha em 27.4.2019, por ser um direito em formação, que não se encontra abrangido pelo âmbito de aplicação da cláusula 60 do AE de 2021 nem pode ser derrogado por essa cláusula.
115. Por tais motivos, procede parcialmente o recurso, é revogada parcialmente a sentença recorrida e substituída por outra que condena o recorrido pagar à recorrente:
• A quantia de 1491,04 euros de prémio de antiguidade, acrescida dos juros de mora à taxa legal anual de 4% vencidos desde 1.1.2022 e vincendos até integral pagamento;
• O valor correspondente ao complemento da pensão de reforma calculado com base nas retribuições registadas que nos termos da cláusula 92 do AE de 2003 devem consideradas para esse efeito, na antiguidade que a recorrente detinha em 27.4.2019, nos factores, na fórmula e com a periodicidade, previstos na cláusula 92 do AE de 2003, conforme se vier a liquidar em execução de sentença, acrescido dos juros de mora à taxa legal anual de 4% vencidos desde a data da citação sobre cada uma das prestações mensais vencidas e não pagas (porque a falta de liquidez é imputável ao recorrido) e vincendos até integral pagamento – cf. artigos 559.º n.º 1 e 805.º n.ºs 1, 2 – a) e n.º 3 do CC e Portaria 291/2003 de 8.4.
116. Mantém-se a sentença recorrida na parte em que absolveu o recorrido da restante parte do pedido. Custas
117. Pelas custas do presente recurso são responsáveis ambas as partes na proporção do respectivo decaimento, que o Tribunal fixa em 3/4 a cargo do recorrido e 1/4 a cargo da recorrente.
118. A recorrente está isenta do pagamento de custas por força do disposto no artigo 4.º n.º 1 – h) do Regulamento das Custas Processuais (RCP).
119. Como tal isenção não abrange os reembolsos à parte contrária, a recorrente deverá suportar tais reembolsos na proporção em que decaiu – cf. artigo 4.º n.º 7 do RCP.
Decisão
Acordam os Juízes desta secção em julgar parcialmente procedente o recurso e, em conformidade:
I. Revogar parcialmente a sentença recorrida e substituí-la por outra que condena o recorrido pagar à recorrente
• A quantia de 1491,04 euros (mil quatrocentos e noventa e um euros e quatro cêntimos) de prémio de antiguidade, acrescida dos juros de mora à taxa legal anual de 4% vencidos desde 1.1.2022 e vincendos até integral pagamento;
• O valor correspondente ao complemento da pensão de reforma calculado com base na antiguidade que a recorrente detinha em 27.4.2019 e nos demais factores previstos na cláusula 92 do Acordo de Empresa entre o Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas e a FETESE — Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Serviços, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego 1.ª série, n.º 19 de 22.5.2003, incluindo as retribuições registadas que nos termos dessa cláusula devem ser consideradas para o efeito, a fórmula e a periodicidade de pagamento previstas nessa cláusula, conforme se vier a liquidar em execução de sentença, acrescido dos juros de mora à taxa legal anual de 4% vencidos desde a data da citação sobre cada uma das prestações mensais vencidas e não pagas e vincendos até integral pagamento.
II. Manter a sentença recorrida na parte em que absolveu o recorrido da restante parte do pedido.
III. Condenar o recorrido nas custas do recurso na proporção de 3/4 em que decaiu.
IV. Isentar a recorrente de custas na proporção de 1/4 em que decaiu, sem prejuízo do disposto no artigo 4.º n.º 7 do RCP.
Lisboa, 30.4.2025
Paula Pott
Sérgio Almeida
Alexandra Lage, com seguinte declaração: Revendo a posição por mim subscrita quanto à questão do prémio de antiguidade, no acórdão n.º 17245/23.8T8LSB.L1, em que fui relatora.