ACÇÃO PARA DECLARAÇÃO DE EXTINÇÃO DE SINDICATO
LEGITIMIDADE
Sumário

Se, relativamente aos motivos de extinção das associações sindicais a que aludem os artigos 447.º n.º 8 e 456.º n.º 1 do Código do Trabalho, é o Ministério Público que goza de legitimidade para interpor a acção para declaração de extinção, no caso dos motivos enumerados no n.º 2 do artigo 182.º do Código Civil, o artigo 183.º n.º 2 do mesmo Código estende essa legitimidade a qualquer interessado.

Texto Integral

Acordam os Juízes na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:
Relatório
AA, residente na ... ......, veio intentar acção declarativa para extinção de associação contra Sindicato dos Profissionais das Indústrias Transformadoras do Distrito de Angra do Heroísmo, com sede na ... Angra do Heroísmo, invocando, para tanto e em síntese, e daquilo que foi possível perceber, o seguinte:
- Apesar de o artigo 3.º do Estatuto do Sindicato Réu estatuir que este tem a sua sede em Angra do Heroísmo, o Sindicato não existe materialmente, não tem sede, tem falso domicílio fiscal na ..., Angra do Heroísmo e é desconhecido nessa morada;
- A Direcção para o biénio 2021-2023 não tem sócios permitidos pelos Estatutos, o Presidente é carpinteiro por conta própria, o 1.º Secretário é funcionário da Santa Casa da Misericórdia e o 2.º Secretário é condutor, o que significa que não tem um fim em especial;
- O Sindicato não é dono dos prédios nem é possuidor com animus domini dos prédios que identifica;
- O Sindicato não teve 1.º Secretário e Presidente no ano de 2017 e de 2021, não foi possível a livre discussão de todas as questões sindicais no Sindicato, não foi feita a Assembleia Geral Ordinária até 31.03.2018 e 2019, o Sindicato não tem cartão para os seus membros, porque não tem membros, o 1.º Secretário não foi eleito, não pagou as quotas, não escolheu o Presidente na primeira reunião da Direcção, não representou o Sindicato em Juízo, não admitiu ou rejeitou os pedidos de inscrição de novos sócios, o Sindicato não tem actividade, o 1.º Secretário não elaborou as contas de gerência e orçamento, nem administrou os fundos do Sindicato, por falta de bens e de fundos, não elaborou o inventário dos haveres do Sindicato por falta de haveres, não reuniu uma vez por semana com a Direcção, por falta de Direcção, o 1.º Secretário não pagou as despesas e encargos do Sindicato, não foi criado um fundo de reserva para os trabalhadores em greve, por falta de trabalhadores sócios e o alegado Presidente não foi eleito pelo 1.º Secretário.
- O Sindicato não é proprietário, constando ilegalmente como sujeito passivo na Certidão Permanente da Conservatória do Registo Predial, freguesia de São Bento, nem tem documentos que provem a aquisição dos prédios inscritos na matriz sob os artigos... e ...;
- Não existe qualquer inscrição na Conservatória do Registo Predial a favor do Sindicato sobre os prédios inscritos na matriz predial sob os artigos ... e ...;
- O Sindicato é sujeito passivo em processos de execução fiscal por falta de pagamento do IMI, tendo sido detectadas quatro vendas fiscais impossíveis dado que o Sindicato não é proprietário do imóvel inscrito na matriz sob o artigo .../ficha ... da Conservatória do Registo Predial de São Bento;
- O Autor é compossuidor, desde Junho de 1994, do prédio inscrito na matriz sob o artigo .../ficha ..., freguesia de São Bento, enquanto que o Sindicato Réu nunca foi possuidor ou adquiriu por usucapião esse prédio;
- O Autor tem um interesse directo e legítimo em adquirir o mencionado prédio por usucapião;
- O Sindicato, pelo falecimento ou desaparecimento dos seus sócios não tem sócios trabalhadores por conta de outrem, não tem dinheiros, tem dívidas e não prossegue qualquer fim;
- No dia 26.06.2022, na ..., a porta comum a dois apartamentos do prédio inscrito na matriz sob o artigo … foi partida pelo Presidente do Sindicato e o filho; e
- No dia 29.03.2023, o Presidente e o 2.º Secretário do Sindicato Réu, no âmbito de “bulling imobiliário”, ameaçaram o Autor de que o matavam e lançavam o seu cadáver ao mar se não desaparecesse de imediato da Ilha Terceira, pondo em causa o seu direito à vida e praticando actos contra a ordem pública; e
-O Sindicato Réu deve ser extinto nos termos do disposto no artigo 182.º, n.º 1 als. d) e e) e n.º 2, als. a) e d) do Código Civil, ou deve declarar-se a sua insolvência nos termo do artigo 182.º, n.º 1 al. e) do Código Civil ou deve ser extinto nos termos do disposto no artigo 447.º, n.º 8 do Código do Trabalho.
A, final, formulou os seguintes pedidos:
“a) Se declare a extinção do “Sindicato” Réu pelo falecimento ou desaparecimento de todos os associados (trabalhadores por conta de outrem, permitidos pelos seis núcleos do anexo n.º 1 do Estatuto;
b) Se declare a extinção do Sindicato por decisão judicial que declare a sua insolvência;
c) Se declare a extinção do “Sindicato” Réu quando o seu fim se tenha esgotado ou se haja tornado impossível;
d) Se declare a extinção do “Sindicato” Réu quando a sua existência se torne contrária à ordem pública por razão das ameaças, sem testemunhas, de morte do Autor e abater o seu cadáver no mar, pela parte contrária o “Sindicato dos Profissionais das Indústrias Transformadoras do Distrito de Angra do Heroísmo”.
e) Se declare a extinção do “Sindicato” Réu por forma a que ele não possa registar quaisquer direitos por exemplo propriedade dentro da “Caderneta Predial Urbana”, matriz predial n.º ..., freguesia de São Bento, concelho de Angra do Heroísmo, ilha Terceira da Conservatória do Registo Predial;
f) Se ordene e condene o Sindicato Réu no cancelamento pelo o Autor de quaisquer registos, nomeadamente titularidade do Réu, propriedade plena 1/1 dentro da “Caderneta predial urbana”, matriz predial urbana n.º ..., freguesia de São Bento, concelho Angra do Heroísmo, ilha Terceira, da Conservatória do Registo Predial operados com base de alegada propriedade;
g) Se ordene o Senhor Agente de Execução BB, substituído pela Senhora CC, Escritório Angra do Heroísmo, Açores, ..., Tel: ... (chamada para a rede fixa nacional), Email: ... depois o trânsito em julgado da condenação executar a extinção do “Sindicato” como proprietário.
1.) Dentro da “Caderneta Predial Urbana”, Serviço das Finanças de Angra do Heroísmo para prédio na ..., matrícula predial urbana ..., freguesia São Bento, Concelho Angra do Heroísmo, ilha Terceira;
2.) A extinção, cancelamento e levantamento das todas penhoras dentro da “Certidão Permanente”, ficha ..., freguesia São Bento, concelho Angra do Heroísmo, ilha Terceira da Conservatória do Registo Predial;
3.) Publicação da Sentença e a Extinção da Associação dentro do Jornal Oficial da Região Autónoma dos Açores, Inspeção do trabalho, Ministério da Segurança Social, Solidariedade e do trabalho e quaisquer outros registos.”
Em 20.10.2023 foi lavrada cota nos autos por se terem suscitado dúvidas ao Sr. Funcionário sobre como deviam ser distribuídos os presentes autos tendo, em 25.10.2023, a Mma. Sra. Juíza Coordenadora do Núcleo de Angra do Heroísmo, proferido o seguinte despacho:
“Ao abrigo do disposto no art.126.º n.º 1, al. r) da LOSJ, distribua-se no Juízo Misto.”
Em 02.11.2023, foi proferido despacho que determinou a notificação do Autor para dizer o que tivesse por conveniente sobre a sua legitimidade para propor a presente acção.
Em 10.11.2023, o Autor respondeu ter legitimidade processual para intentar a acção nos termos do artigo 30.º do CPC e 183.º n.º 2 do Código Civil para o que invocou, além do mais, o seguinte: “O Autor pode dizer-se interessado quando espera obter pela extinção do “Sindicato” um benefício de vida, direitos humanos, integridade pessoal, moral e física, sem torturas, sem penas sindicais, cruéis, degradantes, desumanos e viver sem ameaças de morte e abater seu cadáver no mar, no prédio ...”; Por outro lado, Autor pode dizer-se interessado quando espera obter pela extinção do “Sindicato” um benefício de vida sem “bulling immobiliário”; O Autor pode dizer-se interessado quando espera obter pela extinção do “Sindicato” um benefício de propriedade do imóvel onde é compossuidor e se encontra em posição de o receber. Portanto, “interessado” é aquele que espera e pode obter um benefício de propriedade do imóvel onde é compossuidor. Imóvel esse que vem sendo penhorado pela administração fiscal por falta de pagamento de IMI, sendo de recear a respetiva venda em processo de execução fiscal”; A extinção do “Sindicato” é que abre a porta para a aquisição da propriedade pela invocação da Usucapião pelo Autor como Usucapiente sobre o prédio onde é compossuidor por via extrajudicial da justificação notarial nos termos do artigo n.º 89.º do Código do Notariado ou justificação predial nos termos do artigo 116.º, 117.º, etc. do Código do Registo Predial. Podendo, assim, o aqui autor regularizar fiscalmente a situação do imóvel, ficando o mesmo sem risco de voltar a ser penhorado”; O interesse é “directo” porque o benefício resultante da extinção do “Sindicato” tem repercussão imediata no interessado. O Autor pode voltar à ilha Terceira sem ameaças de morte pelo “Sindicato”; e “O interesse é “directo” porque o benefício resultante da extinção do “Sindicato” tem repercussão imediata no interessado. O Autor tem interesse directo porque vive muitos anos como compossuidor e é de imediato proprietário registado invocando a Usucapião como Usucapiente, sobre o prédio ......, ficha ..., Conservatória do Registo Predial por via extrajudicial através da justificação notarial nos termos do artigo n.º 89.º do Código do Notariado ou justificação predial nos termos do artigo 116.º, 117.º, etc. do Código do Registo Predial.”
Em 24.11.2023 a Ilustre Patrona juntou aos autos substabelecimento com reserva a favor do Dr. DD que, em 04.12.2023, veio aos autos declarar que ratificava a petição inicial apresentada pelo Autor.
Em 26.11.2023 foi proferido o seguinte despacho:
“Nos termos do art.º 456º, nº 1 do C.Trabalho, compete ao Ministério Público promover a declaração judicial de extinção de associação sindical, não sendo atribuída legitimidade a qualquer outra entidade.
Neste contexto, forçoso é concluir que AA carece de legitimidade para peticionar a referida declaração, razão pela qual absolvo o réu da instância (art.º 278º, n º1, al. d) do C.P.Civil).
Custas pelo requerente.
Notifique e arquive.”
Inconformado, o Autor recorreu e formulou as seguintes conclusões:
“A. Nos presentes autos, foi proferido despacho de liminar de absolvição do réu da instancia nos termos seguintes: Nos termos do art.º 456º, nº 1 do C.Trabalho, compete ao Ministério Público promover a declaração judicial de extinção de associação sindical, não sendo atribuída legitimidade a qualquer outra entidade. Neste contexto, forçoso é concluir que AA carece de legitimidade para peticionar a referida declaração, razão pela qual absolvo o réu da instância (art.º 278º, n º1, al. d) do C.P.Civil).
B. Nos termos dispostos pelo Artigo 629.º do Código de Processo Civil a presente decisão é recorrível.
C. Nos termos do artigo 637.º n.º 2 do CPC o fundamento específico da recorribilidade é o Despacho liminar, Ref.ª Doc.: 56212402 de Domingo, 26-11-2023 às 16:04 de indeferimento liminar da petição inicial concluindo que AA carece de legitimidade para peticionar a referida declaração.
D. O Recorrente nunca intentou a presente ação ao abrigo do “artigo 456.º, n.º 1” do Código de Trabalho, onde compete ao Ministério Público promover a declaração judicial de extinção de associação sindical, não sendo atribuída legitimidade a qualquer outra entidade.
E. O Recorrente requereu como qualquer interessado, nos termos do “artigo 182.º (Causas de extinção) 1. As associações extinguem-se: d) Pelo falecimento ou desaparecimento de todos os associados; e) Por decisão judicial que declare a sua insolvência. 2. As associações extinguem-se ainda por decisão judicial: a) Quando o seu fim se tenha esgotado ou se haja tornado impossível; d) Quando a sua existência se torne contrária à ordem pública.” e “Artigo 183.º (Declaração da extinção)
2. Nos casos previstos no n.º 2 do artigo precedente, a declaração da extinção pode ser pedida em juízo pelo Ministério Público ou por qualquer interessado.” do Código Civil.
F. Nos presentes autos foi violado o artigo 182.º do Código Civil.
G. No sentido da extinção imediata do “Sindicato”, no entender do recorrente, milita o “artigo 182.º do Código Civil que constitui o fundamento jurídico da decisão que devia ter sido interpretada e aplicada.
H. Assim, o Recorrente considera haver erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada foi “artigo 182.º do Código Civil.
Nestes termos, nos melhores de direito deve o presente recurso ser recebido e julgado procedente e, em consequência, o despacho recorrido ser revogado substituindo-se por outro que ordene a prossecução dos presentes autos.
JUSTIÇA”
Não consta do histórico do processo que tenham sido apresentadas contra-alegações.
Em 18.12.2023 foi proferido despacho que admitiu o recurso.
Subidos os autos a este Tribunal da Relação, por despacho da Relatora de 05.01.2024, foi determinada a remessa dos autos ao Tribunal de 1.ª instância a fim de ser fixado o valor da causa e cumprido o disposto no artigo 641.º n.º 7 do CPC.
Em 21.06.2024 a Ilustre Patrona do Autor comunicou aos autos o seu pedido de escusa do patrocínio, ao que se seguiram sucessivas nomeações de patrono e sucessivos pedidos de escusa por parte dos patronos nomeados.
Remetidos os autos a este Tribunal, ao abrigo do disposto no artigo 87.º, n.º 3 do CPT, a Digna Procuradora-Geral Adjunta emitiu o seguinte Parecer:
O objecto do recurso é determinado pelas conclusões das alegações de recurso que se delimitando-se, a partir destas o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do mesmo Código).
Em sede de recurso não se visa criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.
Nos presentes autos o autor pretende que seja declarado extinto o “sindicato dos profissionais das indústrias transformadoras do Distrito de Angra do Heroísmo”
A decisão recorrida declarou a ilegitimidade do autor para a referida acção nos termos previstos no artigo 456 n.º 1 do Código do Trabalho.
A acção define-se pelo pedido formulado, bem como pelos fundamentos aduzidos para tal.
A competência material dos tribunais de trabalho esta definida no artigo 126 da lei 62/2013.
A qual prevê na al. r) do n.º 1 que esta competência relativamente a “todas questões relativas ao controlo da legalidade da constituição, dos estatutos e respetivas alterações, do funcionamento e da extinção das associações sindicais, associações de empregadores e comissões de trabalhadores;
A norma prevista no artigo 456 do Código de trabalho esta prevista para as situações em que a entidade sindical não dê no espaço de seis meses cumprimento ao disposto no artigo 454 n.º 1 do código do trabalho, o que de acordo com a factualidade vertida na petição inicial ( não obstante a sua difícil inteligibilidade) é o caso.
Compete ao Ministério Publico a legitimidade para interpor as acções tendentes à extinção da associação sindical.
Assim, não carece o despacho recorrido de censura.”
O Recorrente pronunciou-se sobre o Parecer invocando, em suma, que, contrariamente ao defendido pelo Ministério Público, o despacho recorrido merece censura posto que o pedido do Recorrente foi feito ao abrigo do disposto no artigo182.º, n.º 2 do Código Civil e não ao abrigo do disposto no artigo 456.º, n.º 1 do Código do Trabalho, pelo que, face ao disposto no artigo 183.º, n.º 2 do mesmo Código tinha legitimidade para interpor a acção sendo certo que tem interesse direto em demandar, uma vez que é titular de um direito que se materializa com a extinção do Sindicato Réu.
Concluiu que o despacho recorrido violou as normas dos artigos 182.º e 183.º do Código Civil, sendo o Recorrente parte legítima para a presente acção, pelo que o recurso deve ser julgado procedente.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
Objecto do recurso
O âmbito do recurso é delimitado pelas questões suscitadas pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (arts. 635.º n.º 4 e 639.º do CPC, ex vi do n.º 1 do artigo 87.º do CPT), sem prejuízo da apreciação das questões que são de conhecimento oficioso (art.608.º, nº 2 do CPC).
Assim, face às conclusões formuladas pelo Recorrente, a única questão que se coloca a este Tribunal é a de saber se o Autor tem legitimidade para intentar a presente acção para extinção do Sindicato dos Profissionais das Indústrias Transformadoras do Distrito de Angra do Heroísmo.
Fundamentação de facto
Os factos com interesse para a decisão são os que decorrem do relatório que antecede para o qual se remete.
Fundamentação de direito
Analisemos, então, se o Autor tem legitimidade para intentar a presente acção para extinção do Sindicato dos Profissionais das Indústrias Transformadoras do Distrito de Angra do Heroísmo.
O despacho recorrido, fundamentando-se no disposto no artigo 456.º, n.º 1 do Código do Trabalho, considerou que o Recorrente não tem legitimidade para intentar a acção e que apenas o Ministério Público a detém.
Por seu lado, sustenta o Recorrente que goza de legitimidade para propor a acção, pois esta nunca foi intentada ao abrigo do disposto no artigo 456.º do Código do Trabalho, mas sim, nos termos do artigo182.º do Código Civil, pelo que, a sua legitimidade resulta do artigo 183.º, n.º 2 deste Código que atribui ao Ministério Público e a qualquer interessado esse poder, concluindo que houve erro do Tribunal a quo na determinação da norma aplicável e que, no caso, seria o artigo 182.º do Código Civil.
Vejamos:
O Autor pretende que seja declarada a extinção de um sindicato.
E na petição inicial concluiu que o Réu deve ser extinto nos termos do disposto no artigo 182.º, n.º 1 als.d) e e) e n.º 2, als.a) e d) do Código Civil, ou deve declarar-se a sua insolvência nos termo do artigo 182.º, n.º 1 al. e) do Código Civil ou deve ser extinto nos termos do disposto no artigo 447.º, n.º 8 do Código do Trabalho. E formulou o seguinte pedido:
a) Se declare a extinção do “Sindicato” Réu pelo falecimento ou desaparecimento de todos os associados (trabalhadores por conta de outrem, permitidos pelos seis núcleos do anexo n.º 1 do Estatuto;
b) Se declare a extinção do Sindicato por decisão judicial que declare a sua insolvência;
c) Se declare a extinção do “Sindicato” Réu quando o seu fim se tenha esgotado ou se haja tornado impossível;
d) Se declare a extinção do “Sindicato” Réu quando a sua existência se torne contrária à ordem pública por razão das ameaças, sem testemunhas, de morte do Autor e abater o seu cadáver no mar, pelo parte contrária o “Sindicato dos Profissionais das Indústrias Transformadoras do Distrito de Angra do Heroísmo”.
e) Se declare a extinção do “Sindicato” Réu por forma a que ele não possa registar quaisquer direitos por exemplo propriedade dentro da “Caderneta Predial Urbana”, matriz predial n.º ..., freguesia de São Bento, concelho de Angra do Heroísmo, ilha Terceira da Conservatória do Registo Predial;
f) Se ordene e condene o Sindicato Réu no cancelamento pelo o Autor de quaisquer registos, nomeadamente titularidade do Réu, propriedade plena 1/1 dentro da “Caderneta predial urbana”, matriz predial urbana n.º ..., freguesia de São Bento, concelho Angra do Heroísmo, ilha Terceira, da Conservatória do Registo Predial operados com base de alegada propriedade;
g) Se ordene o Senhor Agente de Execução BB, substituído pela Senhora CC, Escritório Angra do Heroísmo, Açores, ..., Tel: ... (chamada para a rede fixa nacional), Email: ... depois o trânsito em julgado da condenação executar a extinção do “Sindicato” como proprietário.
1.) Dentro da “Caderneta Predial Urbana”, Serviço das Finanças de Angra do Heroísmo para prédio na ..., matrícula predial urbana n. ..., freguesia São Bento, Concelho Angra do Heroísmo, ilha Terceira;
2.) A extinção, cancelamento e levantamento das todas penhoras dentro da “Certidão Permanente”, ficha ... freguesia São Bento, concelho Angra do Heroísmo, ilha Terceira da Conservatória do Registo Predial;
3.) Publicação da Sentença e a Extinção da Associação dentro do Jornal Oficial da Região Autónoma dos Açores, Inspeção do trabalho, Ministério da Segurança Social, Solidariedade e do trabalho e quaisquer outros registos.”
Ou seja, não obstante o Autor, na petição inicial, também ter aludido ao disposto no artigo 447.º n.º 8 do Código do Trabalho, o pedido formulado alicerça-se nos fundamentos enunciados no artigo 182.º do Código Civil e não naquela outra norma que se refere a vícios de constituição das associações sindicais ou de empregadores (que não resultam da petição inicial) e que foi avocada em termos subsidiários.
Ora, o Réu é um Sindicato, que é uma associação de trabalhadores, sendo esta, por seu turno, uma estrutura de representação colectiva dos trabalhadores (artigo 404.º al. a) do Código do Trabalho).
O artigo 442.º, n.º 1 al. a) do Código do Trabalho define o conceito de Sindicato como sendo “a associação permanente de trabalhadores para defesa e promoção dos seus interesses sócio-profissionais”.
Assim, versando o pedido formulado pelo Recorrente a extinção de uma associação permanente de trabalhadores-sindicato-, nos termos do artigo 126.º, n.º 1, al. r) da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário), compete aos juízos do trabalho conhecer, em matéria cível, de todas as questões relativas ao controlo da legalidade da constituição, dos estatutos e respetivas alterações, do funcionamento e da extinção das associações sindicais, associações de empregadores e comissões de trabalhadores.
Ou seja, são os Juízos do Trabalho os competentes para apreciar a extinção das associações sindicais, do que resultou que a presente acção tivesse sido distribuída, e bem, no Juízo Misto de Família e Menores e do Trabalho da Praia da Vitória, Comarca dos Açores.
Resta, pois, saber se o Recorrente tinha legitimidade para pedir a extinção do Sindicato, considerando os fundamentos que invoca.
O despacho recorrido, repetimos, fundamentou-se no que dispõe o artigo 456.º, n.º 1 do Código do Trabalho.
O artigo 456.º do Código do Trabalho está inserido no TÍTULO III Direito colectivo, SUBTÍTULO I Sujeitos, CAPÍTULO I, Estruturas de representação colectiva dos trabalhadores, SECÇÃO III Associações sindicais e associações de empregadores e SUBSECÇÃO II Constituição e organização das associações.
Estatui a mencionada norma, sob a epígrafe Extinção de associações e cancelamento do registo, o seguinte:
“1 - Quando a associação sindical ou de empregadores não tenha requerido a publicação nos termos do n.º 1 do artigo 454.º da identidade dos membros da direcção num período de seis anos a contar da publicação anterior, o serviço competente do ministério responsável pela área laboral deve comunicar o facto ao magistrado do Ministério Público no tribunal competente, o qual promove, no prazo de 15 dias a contar da recepção dessa comunicação, a declaração judicial de extinção da associação.
2 - A extinção judicial ou voluntária de associação sindical ou associação de empregadores deve ser comunicada ao serviço competente do ministério responsável pela área laboral:
a) Pelo tribunal, mediante cópia da decisão que determine a extinção, transitada em julgado;
b) Pelo presidente da mesa da assembleia geral, mediante certidão ou cópia certificada da acta da assembleia que delibere a extinção, com as folhas de presenças e respectivos termos de abertura e encerramento.
3 - A comunicação deve ser acompanhada da identificação dos filiados na associação de empregadores em causa abrangidos por cada um dos contratos coletivos de que esta seja outorgante.
4 - O serviço referido no número anterior procede ao cancelamento do registo dos estatutos da associação em causa e promove a publicação imediata de aviso no Boletim do Trabalho e Emprego.
5 - O serviço referido nos números anteriores remete ao magistrado do Ministério Público no tribunal competente certidão ou cópia certificada da acta da assembleia que delibere a extinção, acompanhada de apreciação fundamentada sobre a legalidade da deliberação, nos oito dias posteriores à publicação do aviso.
6 - No caso de a deliberação de extinção da associação ser desconforme com a lei ou os estatutos, o magistrado do Ministério Público promove, no prazo de 15 dias a contar da recepção, a declaração judicial de nulidade da deliberação.
7 - O tribunal comunica a declaração judicial de nulidade da deliberação de extinção da associação, transitada em julgado, ao serviço referido nos números anteriores, o qual revoga o cancelamento e promove a publicação imediata de aviso no Boletim do Trabalho e Emprego.
8 - A extinção da associação ou a revogação do cancelamento produz efeitos a partir da publicação do respectivo aviso.”
Ainda sobre a extinção das associações sindicais rege o n.º 8 do artigo 447.º do Código do Trabalho que determina:
“8 - Caso a constituição ou os estatutos iniciais da associação sejam desconformes com a lei imperativa, o magistrado do Ministério Público no tribunal competente promove, no prazo de 15 dias a contar da recepção dos documentos a que se refere a alínea b) do n.º 4, a declaração judicial de extinção da associação ou, no caso de norma dos estatutos, a sua nulidade, se a matéria for regulada por lei imperativa ou se a regulamentação da mesma não for essencial ao funcionamento da associação.”
Para além destas, não encontramos enumeradas no Código do Trabalho outras causas de extinção das associações sindicais.
Porém, estabelece a norma remissiva constante do n.º 1 do artigo 441.º do Código do Trabalho que “1 - As associações sindicais e as associações de empregadores estão sujeitas ao regime geral do direito de associação em tudo o que não contrarie este Código ou a natureza específica da respectiva autonomia.”
E resulta do n.º 2 do mesmo artigo que apenas as normas do regime geral do direito de associação susceptíveis de determinar restrições inadmissíveis à respectiva liberdade de organização é que não são aplicáveis às associações sindicais e às associações de empregadores.
Sobre a extinção das associações sindicais, escreve a Professora Doutora Maria do Rosário Palma Ramalho, na obra “Tratado de Direito do Trabalho, Parte III-Situações Laborais Colectivas, 2015, 2.ª Edição Actualizada, Almedina, pág. 64: “As associações sindicais podem ser extintas, por via voluntária ou judicial (art.º 456.º n.º 2, corpo, do CT). A extinção voluntária ocorre por deliberação da assembleia geral, nos termos dos estatutos. A extinção judicial ocorre por iniciativa do Ministério Público (e não, em caso algum, por determinação da Administração Pública, em obediência ao princípio da independência das associações sindicais perante o Estado), por um dos seguintes motivos: detecção de vício na constituição da associação (nos termos do artigo 447 nº 8 do CT), não comunicação da identidade dos membros da direcção durante seis anos (art.456º n.º 1 conjugado com o artigo 454º nº 1), qualquer um dos motivos gerais de extinção das associações, constante do artigo 182.º do CC, aplicável por força da remissão do art.º 441º nº 1 do CT.
A extinção da associação sindical deve ser comunicada ao Ministério Público responsável pela área laboral, para efeitos de cancelamento do registo”
E nas págs. 63 e 64 da mesma obra, escreve-se: “Com o registo dos estatutos, a associação sindical torna-se, pois, uma pessoa colectiva em sentido próprio. É esta qualificação como pessoa colectiva, de base associativa que justifica que o regime geral das associações (constante dos artigos 157.º ss. do CC), seja subsidiariamente aplicável a estas associações, com ressalva das disposições que possam contender com a especificidade da autonomia sindical, nos termos do artigo 441.º nº 1 do CT.”
Também sobre a extinção das associações sindicais, escreve o Professor Pedro Romano Martinez, na obra “Direito do Trabalho”, 2010, 5.ª Edição, IDIT e Almedina, pag.1182 e 1183:
“I. Os sindicatos podem extinguir-se por decisão judicial ou voluntária.
II. A associação sindical extingue-se por decisão judicial, em primeiro lugar, se os estatutos não se mostrarem conformes à lei. O artigo 447.º, n.º 8, do CT2009 prescreve que, quando os parâmetros estabelecidos pela lei para a elaboração dos estatutos não tiverem sido respeitados, pode o Ministério Público promover a declaração judicial de extinção da associação sindical.
No Código do Trabalho não se acrescentaram outras formas de extinção judicial. Deste modo, será necessário recorrer às regras gerais do direito civil para a determinação de outros modos de extinção da associação sindical.
Não é opinião unânime, mas parece que nada obsta à aplicação do art.º 182.º do CC com respeito às associações sindicais.
(…).
Com respeito às situações previstas nas quatro alíneas do n.º 2 do art.º 182.º do CC, tais como impossibilidade de prossecução do fim (alínea a)) ou existência contrária à ordem pública (al. d)), não parece poder questionar-se que estas sejam igualmente causas de extinção de associações sindicais.”
Assim, da doutrina exposta e do já citado artigo 441.º n.º 1 do Código do Trabalho, resulta que é aplicável às associações sindicais o disposto no artigo 157.º e seguintes do Código Civil, donde, para além das causas de extinção previstas nos artigos 447.º n.º 8 e 456.º n.º 1 do Código do Trabalho, ainda constituem motivos de extinção das associações sindicais as identificadas no artigo 182.º do Código Civil.
De acordo com o artigo 182.º do Código Civil:
“1. As associações extinguem-se:
a) Por deliberação da assembleia geral;
b) Pelo decurso do prazo, se tiverem sido constituídas temporariamente;
c) Pela verificação de qualquer outra causa extintiva prevista no acto de constituição ou nos estatutos;
d) Pelo falecimento ou desaparecimento de todos os associados;
e) Por decisão judicial que declare a sua insolvência.
2. As associações extinguem-se ainda por decisão judicial:
a) Quando o seu fim se tenha esgotado ou se haja tornado impossível;
b) Quando o seu fim real não coincida com o fim expresso no acto de constituição ou nos estatutos;
c) Quando o seu fim seja sistematicamente prosseguido por meios ilícitos ou imorais;
d) Quando a sua existência se torne contrária à ordem pública.”
O Recorrente invocou o disposto nas alíneas d) e e) do n.º 1 e nas alíneas a) e d) do n.º 2 do artigo 182.º do CC.
E se relativamente aos motivos de extinção das associações sindicais a que aludem os artigos 447.º, n.º 8 e 456.º, n.º 1 do Código do Trabalho, é o Ministério Público que goza de legitimidade para interpor a acção para declaração de extinção, no caso dos motivos enumerados no n.º 2 do artigo 182.º do Código Civil, o artigo 183.º n.º 2 estende essa legitimidade a qualquer interessado estatuindo que: “Nos casos previstos no n.º 2 do artigo precedente, a declaração de extinção pode ser pedida em juízo pelo Ministério Público ou por qualquer interessado.”
Na petição inicial, além de outras, o Recorrente invocou as causas de extinção previstas nas alíneas a) e d) do n.º 2 do artigo 182.º do Código Civil.
Por outro lado, aferindo-se a posição de interessado pelos parâmetros do artigo 30.º do CPC, isto é, pela relação que aquele tem com o objecto da acção e pelo interesse directo em demandar que dessa relação lhe advém, considerando os fundamentos invocados na petição inicial, entendemos que o Recorrente tem um interesse directo em demandar. E, nessa medida, tem legitimidade para intentar a presente acção.
Procede o recurso, devendo ser revogado o despacho recorrido com o consequente prosseguindo da acção, sem prejuízo da apreciação pelo Tribunal de 1.ª instância de qualquer outra causa que o impeça.
Decisão
Face ao exposto, acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa em revogar o despacho recorrido e determinar o prosseguimento dos autos, sem prejuízo da apreciação pelo Tribunal de 1.ª instância de outra causa que a tal obste.
Sem custas.
Notifique e registe.

Lisboa, 30 de Abril de 2025
Celina Nóbrega
Alda Martins
Sérgio Almeida