RECURSO DE REVISÃO
NOVOS MEIOS DE PROVA
PERÍCIA PSIQUIÁTRICA
PRINCÍPIO DA LEALDADE PROCESSUAL
NOVOS FACTOS
IMPROCEDÊNCIA
Sumário


I - O recurso extraordinário de revisão apresenta-se como uma via de reação contra sentenças e/ou despachos, transitados em julgado, em que o caso julgado se firmou em circunstâncias patológicas, conducentes à criação de quadro de injustiça clamorosa, mostrando-se assim como meio para eliminar/ultrapassar o “escândalo” dessa injustiça.
II - Através desse mecanismo não se almeja uma revisão do julgado/decidido, mas antes um julgado novo com sustento em novos elementos, sendo que entre o interesse em dotar/atribuir firmeza e segurança a determinado ato jurisdicional, maxime uma sentença ou acórdão, e o contraposto interesse em que não prevaleçam/dominem decisões que contradigam ostensiva e gritantemente a verdade e, através dela, a justiça, o legislador tem que escolher e, utilizando determinados mecanismos, mitigar/temperar a ideia do dogma absoluto do caso julgado.
III - Para o uso do fundamento consagrado na al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP exige-se: que a decisão a rever haja transitado em julgado, requisito geral; que após o trânsito em julgado surjam factos novos ou novos meios de prova; que esses factos novos valham ou possam influir por si ou combinados com outros que hajam sido apreciados no processo; que da apreciação, ponderação e valoração desses novos factos ou meios de prova se crie e se estabeleça, num juízo apreciativo da situação julgada, uma dúvida séria, fundada e robusta sobre a justiça da condenação.
IV - Face ao que estatui o art. 449.º, n.º 3, do CPP, parece insofismável que não é admissível a revisão de sentença com fundamento em factos ou meios de prova novos quando, não se questionando a condenação, se pretenda, apenas, que a pena aplicada seja outra, já que esta pretensão podia e devia ser alcançada através de recurso ordinário.
V - É entendimento pacífico que os factos e/ou meios de prova novos têm de ser novos, no sentido de desconhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento ou, no mínimo, que a sua não exibição e consideração na decisão condenatória resulte de circunstâncias justificativas da sua não apresentação tempestiva.
VI - Apelando ao princípio da lealdade processual, se o interessado conhecia os factos e/ou provas anteriormente e não o invocou aquando do julgamento não o pode querer fazer em momento oportuno futuro e vir utilizar determinado meio processual previamente existente para suprir/ultrapassar/tornear deficiências e/ou estratégia inconsequente da sua defesa.
VII - Perante perícia ocorrida e consequente relatório efetuado, em tempo bastante anterior aos factos e julgamento em causa em determinados autos, tratando-se de factos conhecidos pessoalmente pelo arguido, não se pode falar de prova nova.

Texto Integral


Comarca de Viana do Castelo – Juízo de Competência Genérica de ...

Recurso de Revisão

Acordam em Conferência na 3ª Secção Criminal

I. Relatório

1. Vem o arguido AA (doravante Recorrente) melhor identificado nos autos, interpor recurso extraordinário de revisão da Sentença de 28 de outubro de 2024, transitada em julgado em 27 de novembro de 2024, proferida pelo Tribunal da Comarca de Viana do Castelo – Juízo de Competência Genérica de ..., onde foi condenado pela prática de:

- Um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 26º, 69º, nº 1, alínea a), e 292º, nº 1, do CPenal, por referência aos artigos 1º, alínea x), e 148º do Código da Estrada, na pena de 6 meses de prisão, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 18 meses;

- Um crime de falsificação ou contrafação de documento, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 14º, nº 1, 26º e 256º, nº 1, alíneas a), e) e f), e nº 3, por referência ao disposto no artigo 255º, alínea a), todos do CPenal, e artigo 369º do CCivil, na pena de 1 ano de prisão;

- Um crime de injúria agravada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 14º, nº 1, 26º, 181º, nº 1, e 184º, por referência ao disposto no artigo 132º, nº 2, alínea l), do CPenal, na pena de 4 meses de prisão;

- Um crime de resistência e coação sobre funcionário, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 14º, nº 1, 26º e 347º, nº 1, todos do CPenal, na pena de 15 meses de prisão.

- Em cúmulo jurídico de penas, nos termos do disposto no artigo 77º do CPenal, na pena única de 20 (vinte) meses de prisão e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 18 (dezoito) meses.

2. O Recorrente fundamenta esta sua pretensão no estipulado na alínea d), do nº 1, do artigo 449º, do CPPenal, considerando que, no seu entender, ante um exame que lhe foi realizado em 18/07/2024 e o relatório daí decorrente, (…) se o tribunal tivesse conhecimento (…) teria com muita probabilidade substituído a pena de prisão aplicada, por uma pena mais adequada (…), rematando o seu petitório, nos seguintes termos: (transcrição)

1º - O presente recurso de revisão tem como objeto a douta sentença proferida em 28/10/2024, que transitou em julgado em 27-11-2024 e que condenou o arguido AA pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, um crime de falsificação ou contrafacção de documento, um crime de injúria agravada e um crime de resistência e coacção sobre funcionário. Aplicando-lhe a pena única resultante de cúmulo jurídico de 20 meses de prisão e a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 18 meses.

2º - No âmbito do processo 154/23.8... que corre termos neste tribunal foi solicitado junto das instituições competentes o relatório da perícia psiquiátrica forense e o relatório social do arguido.

3º - O Relatório não foi entregue nos presentes autos, mas apenas no processo n.º 154/23.8..., apesar do arguido ser o mesmo.

4º - No relatório conclui-se que em virtude da anomalia psíquica do arguido, existe um fundado receio que o arguido viria a cometer factos da mesma espécie principalmente se sob o efeito de ingestão de bebidas alcoólicas.

5º - O relatório conclui pela imputabilidade diminuída do arguido, aferindo a sua perigosidade se não se submeter a tratamento adequado e não se abster de consumir bebidas alcoólicas.

6º-À data dos factos praticados e apreciados nos presentes autos o arguido encontrava-se no estado de embriaguez, logo por uma imputabilidade diminuída.

7º - Nos termos do artigo 449º do CPP, n.º 1 al. d) pressupõe a admissibilidade e fundamentos da revisão da sentença se for descoberto novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinado com os que forem apreciados no processo suscitem graves dúvidas sobre a justiça de condenação.

8º- São considerados factos novos e novos meios de prova, aqueles que não puderam ser apresentados e apreciados ao tempo do julgamento, quer por serem desconhecidos dos sujeitos processuais, quer por não terem sido apresentados a tempo de serem submetidos à apreciação do julgador.

9º - O relatório pericial nunca foi notificado ao arguido para seu conhecimento, desconhecendo o arguido o conteúdo do mesmo.

10º - O relatório pericial não foi entregue nos presentes autos.

11º- Para além que o que vem suscitado no relatório suscita graves dúvidas sobre a justiça da condenação, que pode pôr em causa, de forma séria, a condenação do arguido.

12º- Entende-se que se o tribunal tivesse conhecimento do presente relatório atempadamente, teria com muita probabilidade substituído a pena de prisão aplicada por uma pena mais adequada.

13º- Pelo exposto, deve o recurso de revisão ser admitido, pela subsistência de dúvidas graves sobre a justiça da condenação do arguido no que se refere à possibilidade de aplicação de uma pena mais adequada.

3. Recebido que foi o requerimento de revisão no Juízo de Competência Genérica de ..., e para tal notificado, o Digno Mº Pº, apresentou resposta, nos termos do plasmado no artigo 454º, nº 1, primeira parte –, em peça que finalizou com as seguintes conclusões: (transcrição)

1.ª A circunstância de, noutro processo, existir um relatório pericial que conclui que o condenado apresenta uma imputabilidade diminuída no que diz respeito a determinados factos, anteriores (02-07-2023), não convoca, desde logo, a necessidade de rever uma decisão que recaiu sobre factos posteriores (05-10-2024) que não o considerou.

2.ª Eventual anomalia psíquica anterior não configura um “novo facto”, nem, tão-pouco, o relatório pericial um “novo meio de prova”, pois que o alegado estado clínico e a sujeição anterior a uma perícia psiquiátrica eram do conhecimento do arguido, agora condenado, e não foram invocados.

3.ª O relatório pericial elaborado noutro processo conclui pela existência de uma “anomalia psíquica grave”, sem avançar um qualquer diagnóstico ou, sequer, hipótese de diagnóstico, pelo que, s.m.o., é absolutamente inócuo, desde logo, para fundamentar uma eventual revisão da sentença transitada em julgado nos presentes autos.

4.ª O condenado/recorrente não foi declarado inimputável.

5.ª A sensivelmente diminuída capacidade de avaliação da ilicitude do facto não traduz, sempre, uma diminuição da culpa do agente, havendo casos, como o presente, que a podem agravar.

6.ª Enquanto habitual/reincidente consumidor de bebidas alcoólicas, o condenado já conhecia os efeitos do álcool no seu comportamento e não se absteve de consumir, pelo que não há lugar a qualquer diminuição do juízo de culpa (antes à sua agravação).

7.ª O condenado não aproveitou as anteriores hipóteses que lhe foram sendo dadas para se afastar do consumo de bebidas alcoólicas.

8.ª Eventual tratamento do condenado à única questão clínica que lhe é conhecida – abuso do álcool – sempre poderá/deverá ser objecto de medidas específicas em sede de execução da pena de prisão.

9.ª A prevenção especial, o afastar o condenado/recorrente da reincidência, reclama um corte sério, forçado e prolongado do consumo regular de bebidas alcoólicas, que a execução da prisão em estabelecimento prisional comum poderá assegurar, não havendo fundamento que justifique o internamento do condenado/recorrente em estabelecimento destinado a inimputáveis pelo tempo correspondente à duração da pena que lhe foi aplicada.

4. De seu lado, a Senhora Juíza proferiu a seguinte informação sobre o mérito do pedido, em obediência ao consignado no artigo 454º - parte final - do CPPenal, concluindo pela sua concessão: (transcrição1)

(…)

O direito de recurso consiste numa garantia constitucional de defesa e num corolário de garantia de acesso ao direito e aos tribunais. O processo criminal assegura, nestes termos, todas as garantias de defesa incluindo o recurso. (cfr. art. 32º, nº 1 CRP)

Da leitura do requerimento de interposição de recurso apresentado, salvo melhor entendimento, resulta que o mesmo usa como fundamento a legal de recurso o disposto no art. 449º, nº1, al. d) do CPP, o qual estabelece o seguinte:

“1. A revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando: (…)

d) Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.(…)”

Conclui-se desta forma que o recorrente tem efetivamente o direito de recurso, mas terá agora de se atender à motivação do mesmo.

Analisado o teor do requerimento de interposição de recurso, salvo melhor entendimento, considera-se que o mesmo deve ser julgado procedente.

Na verdade, perante o descrito considera-se que do teor do relatório pericial junto ao processo nº154/23.8... se suscita graves dúvidas sobre a justiça da condenação, nos moldes de cumprimento da pena.

Acrescenta-se que a subscritora realizou a audiência de julgamento no processo nº154/23.8..., no dia em que foi doutamente promovido a emissão de mandados no processo nº224/24.5..., apercebendo-se, então, que o arguido era comum a ambos os processos.

E foi precisamente no decurso da realização do julgamento no processo nº154/23.8..., que se lhe suscitaram igualmente dúvidas sobre a emissão de mandados de detenção para cumprimento de pena de prisão aplicada no processo nº224/24.5..., em estabelecimento prisional normal.

E, de facto, o relatório pericial elaborado e junto ao processo nº154/23.8... nunca foi considerado nos presentes autos, o que por si só permite que se suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.

No âmbito do processo nº224/24.5... resulta que o arguido AA foi condenado, na pena única resultante de cúmulo jurídico em 20 meses de prisão e a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 18 meses, relativamente a factos ocorridos em 05/10/2024.

No entanto, no relatório pericial junto ao processo nº154/23.8..., conclui-se por uma imputabilidade diminuída do arguido à data dos factos daqueles autos em 02/07/2023, sendo que já há data existia fundado receio que este pudesse cometer factos da mesma espécie, principalmente sob o efeito de bebidas alcoólicas.

Acresce que no mesmo relatório se refere que o mesmo é possuidor de anomalia psíquica grave. Ou seja, uma anomalia psíquica grave é uma patologia crónica e deve ser medicamente assistida, sendo que obviamente não desaparece com o decurso do tempo. E que é potenciada no caso deste arguido de adição ao álcool, consumo esse que já motivou a condenação do arguido, noutros processos, sendo o mesmo conhecido por esse motivo neste Juízo.

Aliás, por esse motivo, deu-se sem efeito o despacho proferido no processo nº224/24.5..., no que se refere à emissão de mandados, considerando a conclusão do relatório pericial acima identificado.

Nestes termos, conclui-se que assiste razão ao recorrente, porquanto se considera que o mesmo não deverá cumprir a pena aplicada em estabelecimento prisional, dito normal, mas num adequado às suas necessidades de saúde e patologia de que padece. Pois, só assim se atinge, salvo melhor entendimento a finalidade da pena aplicada.

Nestes termos, conclui-se que o presente recurso deverá proceder, salvo melhor entendimento, por forma respeitar o princípio da adequação e finalidade das penas, bem como o direito a um processo justo e equitativo.

5. Já neste Supremo Tribunal de Justiça (STJ), no momento previsto no artigo 455º, o Senhor Procurador-Geral Adjunto, com sólida e atualizada fundamentação, emitiu parecer, no sentido da negação da revisão: (transcrição)2

(…)

Na concretização dos princípios consagrados nos artigos 29.º, n.º 6, da Constituição, que estatui que os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão da sentença e à indemnização pelos danos sofridos, e 4.º, n.º 2, do protocolo n.º 7 à Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, aprovado para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 22/90, de 27 de setembro de 1990, e ratificado pelo Decreto do Presidente da República n.º 51/90, de 27 de setembro de 1990, que prevê igualmente a reabertura do processo, nos termos da lei e do processo penal do Estado em causa, se factos novos ou recentemente revelados ou um vício fundamental no processo anterior puderem afetar o resultado do julgamento, o artigo 449.º, n.º 1, do Código de Processo Penal estabelece que a revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando:

a) Uma outra sentença transitada em julgado tiver considerado falsos meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão;

b) Uma outra sentença transitada em julgado tiver dado como provado crime cometido por juiz ou jurado e relacionado com o exercício da sua função no processo;

c) Os factos que serviram de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação;

d) Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação;

e) Se descobrir que serviram de fundamento à condenação provas proibidas nos termos dos n.ºs 1 a 3 do artigo 126.º;

f) Seja declarada, pelo Tribunal Constitucional, a inconstitucionalidade com força obrigatória geral de norma de conteúdo menos favorável ao arguido que tenha servido de fundamento à condenação;

g) Uma sentença vinculativa do Estado Português, proferida por uma instância internacional, for inconciliável com a condenação ou suscitar graves dúvidas sobre a sua justiça.

Segundo o artigo 449.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, com fundamento na alínea d) do n.º 1 do mesmo normativo, não é admissível revisão com o único fim de corrigir a medida concreta da sanção fixada.

In casu, à vista dos fundamentos do recurso, importa considerar apenas a hipótese do artigo 449.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Penal (v. a conclusão 7.ª do recurso).

Como é de jurisprudência, «para fazer operar o alicerce aqui em discussão – alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º do CPPenal – importa a verificação cumulativa de dois pressupostos: por um lado, a descoberta de novos factos ou meios de prova e, por outro lado, que tais novos factos ou meios de prova suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.

Quanto à primeira exigência, ultrapassando posicionamento existente durante largo período temporal de que essa novidade se dirigia apenas ao tribunal, sendo indiferente que o recorrente já conhecesse ou não a mesma, passou a dominar o entendimento de que os factos e/ou meios de prova novos têm de ser novos, no sentido de desconhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento ou, no mínimo, que a sua não apresentação e consideração na decisão condenatória resulte de circunstâncias justificativas da sua não apresentação tempestiva.

Na verdade, e em apelo ao princípio da lealdade processual, se o interessado conhecia os factos e/ou provas anteriormente e não o invocou aquando do julgamento não pode querer o fazer em momento oportuno futuro.

Este balizar, tanto quanto se crê, pretende evitar abrir a porta, com o recurso de revisão, a meras estratégias de defesa, ou dar cobertura a inépcias ou desleixos dos sujeitos processuais e, nesse ensejo, obviar à transformação deste mecanismo recursório em expediente banal, perigando, por essa via, o interesse na estabilidade do caso julgado, para além do aceitável.

De outra banda, e no que concerne ao segundo pressuposto, míster é que os novos factos ou as novas provas se revelem tão seguros e/ou relevantes que suscitem/desencadeiem/provoquem dúvidas qualificadas/graves sobre a justiça da condenação; que da sua produção e consideração resulte não uma qualquer dúvida, mas sé-rias/evidentes/sólidas/irrefragáveis interrogações sobre a bondade da condenação; aquelas que atinjam grave e profundamente um julgado passado na base de dados presentemente surgidos» 3.

A invocação de novos factos que excluam a ilicitude ou a culpa como fundamento de revisão «é admissível (…). Assim, se o novum demonstra que os factos foram praticados em legítima defesa (art. 32.º CP), que a conduta, embora típica, não é ilícita (v.g. arts. 34.º ou 36.º do CP) ou que o arguido agiu sem culpa (v.g. art. 35.º CP), a quebra do caso julgado deverá ser concedida. A condenação também é aqui injusta, não podendo subsistir (…) O mesmo se passa se o condenado era inimputável em razão de anomalia psíquica: também nesse caso, a sua culpa não poderá ser determinada e, sem prejuízo da aplicação de uma eventual medida de segurança, a sua conduta também não poderá ser punida»4.

O recorrente invoca como novo facto a imputabilidade diminuída e oferece como novo elemento de prova o relatório de perícia psiquiátrica realizada no processo comum 154/23.8... do qual – diz – nunca foi notificado.

Verifica-se, todavia, que à data do julgamento no processo sumário 224/24.5..., a que faltou injustificadamente, o arguido/recorrente não podia deixar de saber, por se tratarem de factos de natureza pessoal, que era acompanhado em consultas de psiquiatria desde 2019, que em 23 de setembro de 2022 sofreu um traumatismo crânio encefálico em razão do qual foi submetido a crâniotomia fronto-temporal parietal direita no Hospital de ..., que era seguido em consultas particulares de Neuropsicologia, que esteve internado em Psiquiatria na ... (Unidade Local de Saúde do ...) por episódio de alterações de comportamento e agitação psicomotora, que foi submetido a avaliação clínico-psiquiátrica no âmbito do processo comum de tratamento involuntário 485/23.7..., ou seja, não podia deixar de conhecer o seu historial de saúde e os factos que podiam fundamentar um pedido de imputabilidade diminuída (ou até de inimputabilidade).

Não o tendo feito nem tendo instruído o defensor nesse sentido, sibi imputet. Se um arguido escamoteia ao tribunal algum facto ou meio de prova não deve ser depois «compensado com o "prémio" de um recurso excepcional, que se destinaria afinal a suprir deficiências, voluntárias ou involuntárias, da sua defesa em julgamento»5.

Como consequência lógica, também a «nova prova» – relatório de perícia psiquiátrica realizada no processo comum 154/23.8... – que serviria para comprovar a sua imputabilidade diminuída, é inaproveitável para a revisão da condenação por não incidir sobre novos factos. Como refere o Supremo Tribunal de Justiça em termos que se revelam pertinentes para a situação em apreço, «as testemunhas oferecidas para demonstração de factos que não assumem a qualidade de "novos", no sentido que releva para a revisão, são prova imprestável e de nula utilidade, já que a prova é por sua natureza instrumental do(s) facto(s) probando(s)»6.

De todo o modo, em relação ao relatório psiquiátrico junto ao processo comum 154/23.8..., pode acrescentar-se ainda que (i) as suas conclusões não podem ser transpostas para o caso uma vez que dizem respeito a eventos ocorridos mais de um ano antes dos factos pelos quais o arguido foi condenado na sentença revidenda, que (ii) o mesmo é demasiado vago e lacónico uma vez que não diagnostica a «anomalia psíquica grave» de que o arguido padece nem esclarece se tem caráter permanente («não acidental») ou se as suas manifestações são incontroláveis («cujos efeitos [o arguido] não domina»), tudo circunstâncias essenciais para a caracterização e existência de uma imputabilidade sensivelmente diminuída (cf. o artigo 20.º, n.º 2, do Código Penal) e que são contrariadas pelos demais elementos que instruem o recurso, nomeadamente pelas duas entrevistas psiquiátricas pelas quais o arguido passou e nas quais se apresentou «vígil», «colaborante», «orientado no tempo e no espaço», «orientado em relação à sua pessoa», com «discurso fluente e de conteúdo adequado», «calmo», «com comportamento adequado e postura cordial», «não se apurando sintomatologia psicótica», e que, por fim (iii), alcançando-se igualmente a conclusão de que o arguido «era imputável criminalmente», este, na melhor das hipóteses, apenas poderia aspirar com o recurso de revisão a uma redução da pena [objetivo que, aliás, não procura disfarçar (v. a conclusão 12.ª)], algo que, repetimos, a lei não permite (artigo 449.º, n.º 3, do Código de Processo Penal), sendo igualmente certo que, neste caso, essa hipótese seria bastante improvável porquanto o mesmo, conforme referido, está plenamente ciente de «que o seu estado de saúde é incompatível com o consumo de bebidas alcoólicas» e essa consciência, tornando a sua conduta mais censurável, até reforçaria a necessidade de imposição de uma pena mais gravosa7.

As (legítimas) preocupações manifestadas pela Sr.ª juíza na sua informação podem e devem ser acauteladas ao nível da execução da pena [v. os artigos 19.º, n.ºs 1, alínea a), e 2, 20.º, n.º 1, alínea a), e 22.º, n.º 1, todos do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade (Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro)].

Aqui chegados, acompanhando em tudo o mais a competente resposta oferecida pelo Sr. procurador da República junto do Juízo de Competência Genérica de ..., emite-se parecer no sentido da negação da revisão.

6. Notificado deste parecer, para efeitos do exercício do contraditório, o Recorrente nada disse.

7. Mostrando-se o recurso instruído com os pertinentes elementos, e nada obstando ao seu conhecimento, colhidos os vistos foi o processo remetido à Conferência (artigo 455º, nºs 2 e 3, do CPPenal).

II. Fundamentação

O recurso extraordinário de revisão anuncia no plano infraconstitucional o direito fundamental dos cidadãos, injustamente condenados, à revisão da sentença e à indemnização

pelos danos sofridos, inscrito no artigo 29º, nº 6, da CRP8, emergindo como meio processual em cuja configuração legal se reflete a tensão entre o princípio da justiça e o da certeza e segurança do direito, e o da intangibilidade do caso julgado, que destes últimos é instrumental.

Estas máximas, também estruturantes do Estado de Direito, cedem perante novos factos ou a verificação da existência de falhas essenciais de julgamento ou de procedimento suscetíveis de abalar da decisão9.

Neste desiderato, o recurso de revisão apresenta-se como um expediente impugnatório que, contrariamente ao recurso de fixação de jurisprudência, também mecanismo de intervenção extraordinária, tem como escopo último oferecer um remédio contra erros que inquinem uma decisão judicial, provocando ulterior intervenção para que, através desta, se corrijam esses erros e se faça genuína e verdadeira justiça10.

Ou seja, é uma via de reação contra sentenças e / ou despachos, transitados em julgado, em que o caso julgado se firmou em circunstâncias patológicas, conducentes à criação de quadro de injustiça clamorosa, mostrando-se assim como meio para eliminar / ultrapassar o “escândalo” dessa injustiça11.

Tanto quanto se pensa, não se trata aqui de uma revisão do julgado / decidido, mas antes de um julgado novo com sustento em novos elementos12, sendo que entre o interesse em dotar / atribuir firmeza e segurança a determinado ato jurisdicional, maxime uma sentença ou um acórdão, e o contraposto interesse em que não prevaleçam / dominem decisões que contradigam ostensiva e gritantemente a verdade e, através dela, a justiça, o legislador tem que escolher e, utilizando determinados mecanismos, mitigar / temperar a ideia do dogma absoluto do caso julgado13.

Assim, face a determinados retratos, o princípio da imutabilidade da decisão deve ceder, e nas estritas e rigorosas condições da lei, sempre que tenha operado o injusto e o intolerável / inaceitável / inconcebível sacrifício da verdade no veredito tomado, envergando o recurso de revisão a natureza de um compromisso entre, por um lado, a salvaguarda do caso julgado, que assegura a certeza e a segurança do direito, condição essencial da manutenção da paz jurídica, e, por outro, as exigências da justiça material14.

Neste palco, a lei faz depender do conchavo de concretos pressupostos / requisitos a possibilidade de reabertura de um caso, apelando a um elenco de fundamentos, o qual, ao que transluz, é taxativo, não suportando quaisquer derivações15.

E entre esses assola, em boa verdade, o adiantado na alínea d), do nº 1 do artigo 449º do diploma que se vem mencionando, ou seja, o de Se descobrirem factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação de que o Recorrente aqui se socorre.

Conjeturando sobre esta normação, ao que se pensa, para a procedência da manifestação processual de revisão, o legislador clama pelos seguintes pressupostos: que a decisão a rever haja transitado em julgado, requisito geral; que após o trânsito em julgado surjam factos novos ou novos meios de prova; que esses factos novos valham ou possam influir por si ou combinados com outros que hajam sido apreciados no processo; que da apreciação, ponderação e valoração desses novos factos ou meios de prova se crie e se estabeleça, num juízo apreciativo da situação julgada, uma dúvida séria, fundada e robusta sobre a justiça da condenação16.

Assim, e grosso modo, para além de uma decisão transitada em julgado, para fazer operar o alicerce aqui em discussão - alínea d) do nº 1 do artigo 449º do CPPenal - importa a verificação cumulativa de dois pressupostos: por um lado, a descoberta de novos factos ou meios de prova e, por outro lado, que tais novos factos ou meios de prova suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação17.

Quanto à primeira exigência, ultrapassando posicionamento existente durante largo período temporal de que essa novidade se dirigia apenas ao tribunal, sendo indiferente que o recorrente já conhecesse ou não a mesma, passou a dominar o entendimento de que os factos e / ou meios de prova novos têm de o ser, no sentido de não conhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento ou, no mínimo, que a sua não apresentação e consideração na decisão condenatória resulte de circunstâncias justificativas da sua não apresentação tempestiva18.

Na verdade, e em apelo ao princípio da lealdade processual19, se o interessado conhecia os factos e / ou provas anteriormente e não o invocou aquando do julgamento não pode querer o fazer em momento oportuno futuro.

Este balizar, tanto quanto se crê, pretende evitar abrir a porta, com o recurso de revisão, a meras estratégias de defesa, ou dar cobertura a inépcias ou desleixos dos sujeitos processuais e, nesse ensejo, obviar à transformação deste mecanismo recursório em expediente banal / corriqueiro / trivial, perigando, por essa via, o interesse na estabilidade do caso julgado, para além do aceitável20.

De outro lado, e no que concerne ao segundo pressuposto, míster é que os novos factos ou as novas provas se revelem tão seguros e / ou relevantes que suscitem / desencadeiem / provoquem dúvidas qualificadas / graves sobre a justiça da condenação; que da sua produção e consideração resulte não uma qualquer dúvida, mas sérias / evidentes / sólidas / irrefragáveis interrogações sobre a bondade da condenação21; aquelas que atinjam grave e profundamente um julgado passado na base de dados presentemente surgidos22.

Partindo de todos estes enunciados considerandos, cabe olhar a todo o quadro concreto que aqui se exibe.

Em nota prévia, alguma fragilidade e nebulosidade despontam da iniciativa trazida pelo Requerente quando o pedido formulado, assentando na ideia de prova nova suscetível de questionar, de forma séria a sua condenação, sem concretizar efetivamente o que pretende, apela somente (…) à possibilidade de aplicação de uma pena mais adequada (…).

Faceando este intento, ao que se crê, será de cair por terra a pretensão do Recorrente, face ao que estatui o artigo 449º, nº 3 do CPPenal23. Parece insofismável que não é admissível a revisão de sentença com fundamento em factos ou meios de prova novos quando, não se questionando a condenação, se pretenda, apenas, que a pena aplicada seja outra, já que esta pretensão podia e devia ser alcançada através de recurso ordinário24.

Assim não se entendendo, o que se não aceita, diga-se que tal como o acertadamente propugnado pelo Digno Mº Pº - em primeira instância e junto deste STJ – calcorreando todo o processado, cristalina e prontamente se repara que não se mostram verificados os pressupostos da revisão requerida pelo Recorrente.

Desde logo o aspeto, novidade – do dado probatório aqui em referência - como algo desconhecido do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento realizado nestes autos ou, no mínimo, que a sua não apresentação tempestiva e consideração na decisão condenatória se deva a circunstâncias justificativas de assim isso ter acontecido.

Basicamente, na tese do Requerente, a prova nova trata-se de um Relatório datado de 4 de agosto de 2024, advindo de uma perícia psiquiátrica forense, realizada em 18 de julho de 2024, o qual foi junto ao processo nº 154/23.8..., onde o Recorrente também figura com arguido25.

Para a realização da dita perícia, o Recorrente foi entrevistado em 18 de julho de 2014.

Os factos em causa nos autos a que este intento recursivo respeita, ocorreram em 5 de outubro de 2024, sendo que a respeito dos mesmos o Recorrente foi julgado em 28 de outubro de 202426.

Ante estes dados objetivos e imediatamente apreensíveis, falar-se em prova nova como esta deve ser entendida nesta sede e especificidade recursiva, salvo melhor e mais avisada opinião, é pura miragem.

Na verdade, ao tempo em que o Recorrente foi julgado nestes autos, para além de já existir o dito relatório, é por demais evidente que aquele sabia / conhecia que havia sido sujeito a uma perícia psiquiátrica.

Mais, os factos alicerce e aqui em discussão, de 5 de outubro de 2024, como se fez notar, ocorreram mais de dois meses depois da data da realização de perícia e dois meses após o relatório respeitante à mesma.

Perante tal, não há qualquer novidade, sendo que, igualmente, não pode o Recorrente defender que há qualquer motivo / razão que justifique a não apresentação de tal dado probatório, atempadamente.

Efetivamente, para além de se não apontar qualquer referência ilustrando alguma razão atendível da não indicação / junção nestes autos, em tempo, daquele elemento, há um indicador que exubera como incontestável / incontornável. Estes autos e aqueles outros - processo nº 154/23.8... -, até correram termos no mesmo Tribunal, e ao que se indica, tramitados pela mesma Juíza, não havendo, também, por isso, qualquer razão para não ter havido menção / referenciação / alerta para o existente relatório.

A tudo isto soma o apontamento do Digno Mº Pº junto deste STJ que se segue inteiramente (…) à data do julgamento no processo sumário 224/24.5... (…) o arguido/recorrente não podia deixar de saber, por se tratarem de factos de natureza pessoal, que era acompanhado em consultas de psiquiatria desde 2019, que em 23 de setembro de 2022 sofreu um traumatismo crânio encefálico em razão do qual foi submetido a crâniotomia fronto-temporal parietal direita no Hospital de ..., que era seguido em consultas particulares de Neuropsicologia, que esteve internado em Psiquiatria na ... (Unidade Local de Saúde do ...) por episódio de alterações de comportamento e agitação psicomotora, que foi submetido a avaliação clínico-psiquiátrica no âmbito do processo comum de tratamento involuntário 485/23.7... (…) não podia deixar de conhecer o seu historial de saúde (…).

E, nesse desiderato, nunca o tendo transmitido ao Tribunal, nem partilhado, ao que transparece, toda esta informação com o seu Defensor, não pode vir utilizar este meio processual para suprir / ultrapassar / tornear deficiências e / ou estratégia inconsequente da sua defesa.

Assim sendo, conclui-se pela inexistência / não verificação do requisito em análise – meio de prova novo não conhecido do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento ou que a sua não apresentação e consideração na decisão condenatória resulte de circunstâncias justificativas da sua não apresentação tempestiva.

Todavia, caso assim se não considere, o que se não concede, sempre se dirá que o objetivo pretendido pelo Recorrente, como se anotou, pouco claro – aplicação de uma pena mais adequada –, e porque (…) no relatório conclui-se que em virtude da anomalia psíquica do arguido, existe um fundado receio que o arguido viria a cometer factos da mesma espécie (…) conclui pela imputabilidade diminuída do arguido (…) e espelhando tal nestes autos, a conclusão a retirar seria a mesma, parece de duvidoso / questionável alcance com êxito.

Desde logo, diga-se, a perícia em causa foi realizada num determinado contexto não incidindo a mesma sobre novos factos, ou seja, materialidade inédita / desconhecida27 pois, como se vem defendendo, novos são só os factos ou elementos de prova descobertos depois da condenação pela primeira vez, que eram inéditos, desconhecidos.

Por seu turno, todo o exame efetuado ao Recorrente, no âmbito da perícia em causa, reporta-se a situação ocorrida em tempo bastante anterior – julho de 2023 - à em causa neste processo – outubro de 2024 – sendo que, tal como sublinha o Digno Mº Pº junto deste STJ, (…) o mesmo é demasiado vago e lacónico uma vez que não diagnostica a «anomalia psíquica grave» de que o arguido padece nem esclarece se tem caráter permanente («não acidental») ou se as suas manifestações são incontroláveis («cujos efeitos [o arguido] não domina»), tudo circunstâncias essenciais para a caracterização e existência de uma imputabilidade sensivelmente diminuída (…).

Acresce que diversos elementos existentes neste processo recursivo, apresentam indicadores que apontam (…) exame do estado mental (…) apresenta-se calmo, colaborante (…) com comportamento adequado e postura cordial (…) discurso fluente, coerente e organizado, não se apurando sintomatologia psicótica (…) manifesta vontade de manter seguimento por Psiquiatria (…) com o seu médico psiquiatra assistente (…)28 (…) apresenta-se vigil, colaborante. Orientado no tempo e no espaço (…) com discurso fluente e de conteúdo adequado (…) fala sobre a sua revolta por tudo o que aconteceu na sua vida (…)29 que, ao que se pensa, dificilmente poderiam atestar como se pretende, a alegada imputabilidade diminuída.

Por todo este expendido, também, se mostra patente que nada há que possa traduzir a exigência (…) suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.

A concretização / ilustração da existência de graves dúvidas sobre a justiça da condenação, aponta para provas, ainda que alegadamente novas, o que como se viu aqui não se verifica, possuam a virtualidade / capacidade / potencialidade de atingirem / abaterem de forma profunda e essencial uma decisão transitada em julgado30; provas que causem uma dúvida relevante, qualificada, atingindo um patamar tal que seria escandaloso / clamoroso / insustentável manter a estabilidade razoavelmente reclamada por uma decisão transitada em julgado31.

Como se anteviu, não é aqui o caso.

*

III - DECISÃO

Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Supremo Tribunal de Justiça (3ª Secção Criminal) em:

a. Denegar a revisão do Acórdão peticionada por AA;

b. Condenar o Recorrente nas Custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC (artigos 456º, 1ª parte, do CPPenal e 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, em anexo)

*

O Acórdão foi processado em computador e elaborado e revisto integralmente pelo Relator (artigo 94º, nº 2, do CPPenal), sendo assinado pelo próprio, pelos Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos e pelo Senhor Juiz Conselheiro Presidente da Secção.

*

Supremo Tribunal da Justiça, 02 de abril de 2025

Carlos de Campos Lobo (Relator)

Maria Margarida Ramos de Almeida (1º Adjunto)

José Vaz Carreto (2º Adjunto)

Nuno António Gonçalves (Presidente da secção)

_____________________________________________

1. Expurgada da reprodução das conclusões do recurso.

2. Reprodução dos aspetos relevantes do Parecer, expurgando-se toda a parte relativa ao histórico processual, já vertida nos pontos anteriores do Relatório.

3. Acórdão de 31 de outubro de 2024, da 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça, relatado pelo conselheiro Carlos de Campos Lobo, processo 134/21.8JDLSB-C.S1, www.dgsi.pt.

4. João Conde Correia, Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo V, Almedina, edição de maio de 2024, páginas 529-530.

5. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de setembro de 2008, processo 08P1617, relatado pelo conselheiro Maia Costa, www.dgsi.pt.

6. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de janeiro de 2023, processo 14/16.9ZCLSB-C.S1, 3.ª secção, relatado pela conselheira Ana Barata Brito, não publicado, que seja do nosso conhecimento, em qualquer base de dados.

7. Como observa Jorge de Figueiredo Dias, «[s]e, nos casos de imputabilidade diminuída, as conexões objetivas de sentido entre a pessoa do agente e o facto são ainda compreensíveis e aquele deve, por isso, ser considerado imputável, então as qualidades especiais do seu caráter entram no objecto do juízo de culpa e por elas tem o agente de responder. Se essas qualidades forem especialmente desvaliosas de um ponto de vista jurídico-penalmente relevante, elas fundamentarão (…) uma agravação da culpa e um (eventual) aumento da pena; se, pelo contrário, elas fizerem com que o facto se revele mais digno de tolerância e de aceitação jurídico-penal, poderá justificar-se uma atenuação da culpa e a uma diminuição da pena» (Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, Coimbra Editora, 2.ª edição, 2007, página 585).

8. ARTIGO 29.º

(Aplicação da lei criminal)

1. (…)

2. (…)

3. (…)

4. (…)

5. (…)

6. Os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão da sentença e à indemnização pelos danos sofridos.

9. Neste sentido, CAVALEIRO DE FERREIRA, M., “Revisão Penal”, in Scientia Jurídica, XIV, nº 75, pp. 520 e 521 – (…) o direito não pode querer e não querer a manutenção duma condenação, em homenagem à estabilidade de decisões judiciais, a garantia dum mal invocado prestígio ou infabilidade do juízo humano, à custa postergação de direitos fundamentais dos cidadãos, transformados então cruelmente em vítimas ou mártires de uma ideia mais do que errada (…) da lei e do direito (…) é melhor aceitar como ónus da imperfeição humana, a existência de decisões injustas, que escondê-las, para salvaguardar um prestígio martelado sobre a infalibilidade do juízo humano e sob a capa de uma juridicidade directamente criada pelos tribunais(…).

10. FERREIRA, Amâncio, Manual dos Recursos em Processo Civil, 4ª edição, p. 334.

11. Neste sentido, ALBERTO DOS REIS, José, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, 1981, p. 158

12. OSÓRIO DA GAMA, Luís e BATISTA, Castro de Oliveira, Comentário ao Código de Processo Penal, Vol. IV, p. 403.

13. Neste sentido, ORBANEJA, Emílio e QUEMADA, Vicente, Derecho Procesal Penal, 11ª Edição, 1986, Madrid, p. 334.

Igualmente, ROMEIRO, Jorge Alberto, “A Valorização da Magistratura pela Revisão”, in Scientia Jurídica, XVII, nºs 92 a 94, pp. 616 e ss. – Não surgiu a revisão para salvar a causa julgada, mas para prestigiar o judiciário, permitindo que, na esfera deste, fossem corrigidos (…) alguns de seus erros, como bem comprovam a História e o Direito (…) conceituámos a revisão como o reexame jurisdicional de um processo penal já encerrado por decisão transitada em julgado, mirando à sua reforma, quando contenha erro cuja reparação pelo próprio judiciário possa valorizá-lo como órgão de Estado gerador da causa julgada (…) Uma justiça que reconhece os próprios erros e corrige, que não os procura manter e defender com fórmulas vãs, não é uma justiça edificante, que só confiança pode inspirar (…).
Também, na mesma linha de pensamento, o Acórdão do STJ, de 29/03/2007, proferido no Processo nº 625/2007 – 5º, referido em SIMAS SANTOS, Manuel, LEAL-HENRIQUES, Manuel, Recursos Penais, 9ª Edição, 2020, Rei dos Livros, p.208 – (…) nenhuma legislação moderna adoptou o caso julgado como dogma absoluto face à injustiça patente (…) foi escolhida entre nós, uma solução de compromisso entre o dotar o acto jurisdicional de firmeza e segurança e o interesse de que não prevaleçam as sentenças que contradigam ostensivamente a verdade, e através dela, a justiça (…).

14. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 04/07/2024, proferido no Processo nº 301/20.1T9MTS-A.S1, de 20/06/2024, proferido no Processo nº 18/18.7T9FND-B.S1 – (…) O recurso extraordinário de revisão de sentença, estabelecido no art. 449.ºe ss. do Código de Processo Penal constitui uma solução de compromisso entre a segurança que o caso julgado assegura e a alteração de decisões que seria chocante manter (…) – de 06/03/2024, proferido no Processo nº 361/18.5T9VPV-B.S1 - (…) Constitui jurisprudência pacífica que o recurso de revisão (…) visa reagir contra manifestos e intoleráveis erros judiciários; será a evidência de erro que permitirá sacrificar os valores da segurança do direito e do caso julgado, de modo a fazer prevalecer o princípio da justiça material, numa solução de compromisso entre a segurança que o caso julgado assegura e a reparação de decisões que seria chocante manter, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

15. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 08/05/2024, proferido no Processo nº 158/22.8JACBR-B.S1 – (…) o recurso de revisão, como meio de reacção processual excepcional, visa reagir contra manifestos e intoleráveis erros judiciários, disciplinando o art. 449.º do CPP os casos taxativos em que este recurso extraordinário é admissível (…), de 15/01/2014, proferido no Processo nº 13515/04.2TDLSB-C.S1 – (…) Os fundamentos do recurso extraordinário de revisão de sentença são os taxativamente enumerados no art.449º, nº 1, do CPP (…), disponíveis em www.dgsi.pt.

Ainda, GAMA, António, LATAS, António, CORREIA, João Conde, LOPES, José Mouraz, TRIUNFANTE, Luís Lemos, SILVA DIAS; Maria do Carmo, MESQUITA, Paulo Dá, ALBERGARIA, Pedro Soares de e MILHEIRO, Tiago Caiado, Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo V – artigos 399º a 524º, 2024, Almedina, p. 513 – O instituto jurídico extraordinário de revisão, ainda que em benefício do cidadão injustamente condenado, só é admissível nos casos expressamente previstos na lei (…).

16. Neste sentido, o Acórdão do STJ, de 20/09/2017, proferido no Processo nº 603/13.3GAPTL-A.S1, disponível em ww.dgsi.pt.

Igualmente, GASPAR, António Henriques, SANTOS CABRAL, José António Henriques dois Santos, COSTA, Eduardo Maia, OLIVEIRA MENDES, António Jorge de, MADEIRA, António Pereira, GRAÇA, António Pires Henriques da, Código de Processo Penal, Comentado, 2016, 2ª edição revista. Almedina, pp. 1508 e 1509 – (…) exige, como pressuposto da revisão, por um lado, o surgimento de factos novos (…) factos novos relativamente aos considerados na sentença revidenda e, por outro, que esses novos factos suscitem dúvidas qualificadas “graves” sobre a justiça da condenação (…).

17. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 08/01/2015, proferido no Processo nº 19/10.3GCRDD-E.S1, de 23/05/2024, proferido no Processo nº 401/19.0PAABT-C.S1 – (…) fundamento de revisão previsto na al. d) do n.º 1 do artigo 449º do CPP (…) nele se exige acerca da verificação cumulativa da novidade do facto ou meio de prova desconhecido ao tempo do julgamento ou, pelo menos, que a sua não apresentação e consideração na sentença condenatória resulte de circunstâncias justificativas da sua não apresentação tempestiva e que da sua produção e consideração resulte não uma qualquer dúvida, mas graves dúvidas sobre a justiça da condenação. disponível em www.dgsi.pt.

18. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ mencionado na nota anterior, de 08/01/2015 - (…) hoje em dia pode considerar-se maioritária a jurisprudência do STJ que entende que “novos” são tão só os factos e/ou os meios de prova que eram ignorados pelo recorrente ao tempo do julgamento e, porque aí não apresentados, não puderam ser considerados pelo tribunal (…)-, de 13/03/2024, proferido no Processo nº 19/21.8SFPRT-D.S1 – (…) a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a considerar de forma pacífica, desde já há algum tempo, que factos e/ou meios de prova novos têm de ser novos, no sentido de desconhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento ou, pelo menos, que a sua não apresentação e consideração na sentença condenatória resulte de circunstâncias justificativas da sua não apresentação tempestiva e que da sua produção e consideração resulte não uma qualquer dúvida, mas graves dúvidas sobre a justiça da condenação (…) e de 04/07/2024, proferido no processo nº 301/20.1T9MTS-A.S1- (…) Os factos e/ou as provas têm de ser “novos” no sentido de desconhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento, tendo desse desconhecimento resultado a sua não apresentação oportuna, considerando-se ainda equiparável ao desconhecimento a não apresentação em julgamento, embora conhecidos do recorrente, desde que sejam apresentadas razões atendíveis e ponderosas que possam justificar essa omissão, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

19. Máxima que não se assumindo como noção jurídica autónoma, sendo sobretudo de natureza essencialmente moral, reclama a todos os intervenientes no processo que se comportem de forma aberta e nessa medida, sugere que qualquer imperfeição notada, seja de pronto suscitada por forma a causar o menor dano na tramitação processual, e não como último argumento que se mantém resguardado para se utilizar como derradeiro recurso caso o resultado final não agrade.

20. Neste sentido, o Acórdão do STJ, de 12/09/2009, proferido no Processo nº 1077/00.4JFLSB-C.S1, disponível em www.dgsi.pt..

21. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 15/05/2024, proferido no Processo nº 1205/20.3SFLSB-A.S1 – (…) que factos e/ou meios de prova novos têm de ser novos, no sentido de desconhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento ou, pelo menos, que a sua não apresentação e consideração na sentença condenatória resulte de circunstâncias justificativas da sua não apresentação tempestiva e que da sua produção e consideração resulte não uma qualquer dúvida, mas graves dúvidas sobre a justiça da condenação (…) -, de 06/03/2024, proferido no Processo nº 361/18.5T9VPV-B.S1 – (…) os factos e as provas têm de ser novos, no sentido de desconhecidos do tribunal e do arguido ao tempo do julgamento, derivando a sua não apresentação oportuna desse desconhecimento ou, no limite, duma real impossibilidade de apresentação da prova em julgamento; e a dúvida sobre a justiça da condenação tem de ser séria e consistente (…) -, de 08/01/2015, proferido no Processo nº 19/10.3GCRDD-E.S1, disponíveis em www.dgsi.pt.

Também, GASPAR, António Henriques, SANTOS CABRAL, José António Henriques dois Santos, COSTA, Eduardo Maia, OLIVEIRA MENDES, António Jorge de, MADEIRA, António Pereira, GRAÇA, António Pires Henriques da, ibidem, p. 1509.

22. Neste sentido, LEAL-HENRIQUES, Manuel, Anotação e Comentário ao Código de Processo Penal de Macau, Volume III (Artigos 362º a 499º), 2014, Centro de Formação Jurídica e Judiciária, p.454.

23. Artigo 449.º

Fundamentos e admissibilidade da revisão

1 – (…)

2 – (…)

3 - Com fundamento na alínea d) do n.º 1, não é admissível revisão com o único fim de corrigir a medida concreta da sanção aplicada.

4 - (…)

24. Neste sentido, entre outros, o Acórdão do STJ, de 20/06/2024, proferido no Processo nº 18/18.7T9FND-B.S – (…) não é admissível a revisão de sentença com fundamento em factos ou meios de prova novos quando, concordando-se com a condenação, se pretenda, apenas, que a pena aplicada seja suspensa na sua execução, pretensão que pode ser alcançada através de recurso ordinário -, disponível em www.dgsi.pt.

25. Cf. Referência Citius ...86.

26. Cf. Referência Citius ...29.

27. Neste sentido, entre outros, os Acórdão do STJ, de 13/04/2023, proferido no Processo nº 261/10.7JALRA-D.S1 – (…) Novos” são só os factos ou elementos de prova descobertos depois da condenação pela primeira vez, que eram inéditos, desconhecidos. “A novidade dos factos e meios de prova afere-se pelo conhecimento do condenado (…) -, de 13/09/2023, proferido no Processo nº 7/22.7PBCHV-A.S1 - (…) Novos são só os factos ou elementos de prova descobertos depois da condenação pela primeira vez, que eram inéditos, desconhecidos. “A novidade dos factos e meios de prova afere-se pelo conhecimento do condenado -, disponíveis em www.dgsi.pt.

28. Relatório de Avaliação Clínico-Psiquiátrica, elaborado pelo Departamento de Saúde Mental – Serviço Local de saúde Mental.

29. Relatório da Perícia Psiquiátrica.

30. Neste sentido, entre outros, o Acórdão do STJ de 12/09/2024, proferido no Processo nº 127/20.2GAVNO-B.S1, disponível em www.dgsi.pt.

31. Neste sentido, os Acórdãos do STJ de 20/09/2017, proferido no Processo nº 603/13.3GAPTL-A.S1, de 10/03/2022, proferido no Processo nº 983/11.5TAOER-B.S1 e de 29/4/2009, proferido no Processo nº 15189/02.6.DLSB.S1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.