I – A aplicação aos jovens do regime da atenuação especial da pena do artigo 4° do DL 401/82, de 23-09 não é excecional, mas antes o regime-regra para os jovens delinquentes.
II – Na maioria dos casos, a conclusão a retirar será, dada a natureza das coisas – da imaturidade da personalidade ainda em desenvolvimento do jovem delinquente e das consequências dessocializadoras, criminógenas e duras da prisão, dessa ‘região mais sombria do aparelho de justiça’, como lhe chama Michel Foucault -, a de que da atenuação resultam vantagens para a ressocialização do jovem condenado, que assim verá a sua pena reduzida e com mais probabilidades de escapar total ou parcialmente às pressões negativas daquele meio.
III – A ausência de confissão do arguido que se remeteu ao silêncio em sede de audiência é circunstância sem qualquer relevo para a conclusão pela vantagem da atenuação especial do regime penal especial dos jovens delinquentes.
IV – A regra do «ou confessas ou não aplicamos a atenuação de pena do regime especial dos jovens delinquentes» é insuportável num Estado de Direito Democrático e Social fundado na dignidade da pessoa humana como o nosso.
V – O direito ao silêncio do arguido é ‘sagrado’ no processo penal das nações civilizadas, como a nossa pretende ser, e não o pode prejudicar, dele não se podendo retirar qualquer conclusão ou consequência, designadamente que o arguido ao exercer o seu direito ao silêncio impede que se conclua pela vantagem para a sua ressocialização da atenuação especial do regime penal especial dos jovens delinquentes.
VI – Assim, fazendo o balanço entre a personalidade imatura do arguido, desconforme com a pressuposta pela ordem jurídica face aos factos cometidos – dois crimes de roubo, um consumado com uso efetivo de violência e outro tentado, tendo cometido um outro anteriormente, mas julgado posteriormente -, algumas dificuldades de integração em Portugal, mas considerando todos os fatores positivos, desde o apoio familiar coeso, o estudo, o trabalho, a namorada, o hobby da música, a imaturidade própria dos 17 anos de idade, tudo junto, afigura-se que desde que seja devidamente apoiado há razões sérias para se formar um juízo favorável no sentido de a atenuação especial da pena ser vantajosa na criação de condições para a ressocialização do arguido, no sentido de no futuro não voltar a praticar crimes.
(Sumário da responsabilidade do Relator)
Relator: William Themudo Gilman
1º Adjunto: Elsa Paixão
2º Adjunto: Maria Deolinda Dionísio
No processo comum, com intervenção do Tribunal Coletivo, nº 725/22.0PJPRT, do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Central Criminal do Porto - Juiz 6, após julgamento, foi proferido acórdão final com o seguinte dispositivo:
«Por todo o exposto:
As Juízas que compõem este Tribunal Coletivo decidem:
1) CONDENAR O ARGUIDO AA PELA PRÁTICA, EM COAUTORIA MATERIAL E EM CONCURSO EFETIVO:
A) DE UM CRIME DE ROUBO, na forma tentada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 14º, n.º 1, 22º, 23º, 26º, 73º, n.º 1, alíneas a) e b) e n.º 2, 210º, n.º 1, todos do Código Penal, na pessoa do ofendido BB, na pena de 8 (oito) meses de prisão;
B) DE UM CRIME DE ROUBO, na forma consumada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 14º, n.º 1, 26º, 210º, n.º 1, do Código Penal, na pessoa do ofendido CC, na pena de 3 (três) anos de prisão;
-SENDO QUE, EM CÚMULO JURÍDICO, VAI O ARGUIDO CONDENADO NA PENA ÚNICA DE 3 (TRÊS) ANOS E 3 (TRÊS) MESES DE PRISÃO,
-SUSPENSA NA SUA EXECUÇÃO POR 5 (CINCO) ANOS,
-COM REGIME DE PROVA E,
-COM A CONDIÇÃO DE PROCEDER AO PAGAMENTO DAS QUANTIAS REFERIDAS EM 4) E 5):
-da quantia de €300 (trezentos euros) ao ofendido BB;
-e da quantia de €1.000 (mil euros) ao ofendido CC,
-no prazo de 1 (um) ano a contar do trânsito em julgado do Acórdão, devendo comprovar tal pagamento nos autos.
2) NÃO APLICAR O PERDÃO DE PENAS AO ARGUIDO, face ao tipo de criminalidade que está em causa, nos termos da Lei n.º 38-A/2023, de 02 de agosto.
3) CONDENAR O ARGUIDO AA A PAGAR À DEMANDANTE “UNIDADE LOCAL DE SAÚDE ..., E.P.E.” O MONTANTE DE €246,67 (DUZENTOS E QUARENTA E SEIS EUROS E SESSENTA E SETE EUROS), respeitante à assistência prestada ao ofendido CC, acrescido dos juros de mora, à taxa legal desde a notificação do pedido até efetivo e integral pagamento.
4) CONDENAR OFICIOSAMENTE O ARGUIDO AA A PAGAR AO OFENDIDO BB O MONTANTE DE €300 (TREZENTOS EUROS) PELOS DANOS SOFRIDOS POR ESTE, ao qual acresce os respetivos juros de mora, à taxa supletiva de 4%, até efetivo e integral e pagamento.
5) CONDENAR OFICIOSAMENTE O ARGUIDO AA A PAGAR AO OFENDIDO CC O MONTANTE DE €1.000 (MIL EUROS) PELOS DANOS SOFRIDOS POR ESTE, ao qual acresce os respetivos juros de mora, à taxa supletiva de 4%, até efetivo e integral e pagamento.
(…) »
«II – CONCLUSÕES:
1.Por douto acórdão proferido pelo tribunal a quo em 07/11/2024, foi o arguido condenado, em cúmulo jurídico, numa pena única de três anos e três meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de cinco anos, pela prática, em coautoria material, de dois crimes de roubo, um na forma consumada e outro na forma tentada, previstos e puníveis pelos artigos 22º, 23º (crime tentado) e 210º, nº 1, todos do Código Penal.
2.Não se conformando com tal decisão, em que sobressaem, por um lado, a severidade da pena aplicada e, por outro, o elevado tempo da suspensão da sua execução, dela vem o arguido interpor recurso, que fundamenta com as razões seguidamente elencadas.
3. O Tribunal a quo, na ponderação de todos os elementos disponíveis, concluiu que a prognose sobre a ressocialização do arguido, de apenas 17 anos de idade à data dos factos, merece muitas reservas, considerando assim desaconselhável a aplicação do regime penal especial previsto no Decreto-Lei n.°401/82, de 23 de setembro.
4. Venia facta, esteve mal o tribunal a quo ao decidir da referida forma, pois que a mesma, para além de padecer de errada apreciação do contexto vivencial do arguido há mais de dois anos, também lavrou em apodítica contradição com o conteúdo de um outro trecho do acórdão recorrido.
5. O citado contexto deve ser colhido, fundamentalmente, no Relatório Social (doravante RS), produzido a pedido do tribunal a quo mas que foi praticamente ignorado, mostrando-se o seu conteúdo, em grande parte, transcrito do acórdão recorrido para a Motivação do presente recurso.
6. Tal RS apresenta-se muito positivo e favorável ao processo de ressocialização em curso do arguido, merecendo realce o seu afastamento das más companhias, o constante envolvimento e empenhamento dos seus pais, pessoas de bons princípios morais, honestas e trabalhadoras, respeitadas e respeitáveis, na consecução desse desiderato.
7. Mais, a informação do RS é de tal modo abonatória ao arguido, que é o próprio tribunal a quo a “desfiar” todos os predicados expostos no aludido documento para fundamentar a aplicação da suspensão da execução da pena de prisão aplicada.
8 . Assim, não se percebe que o contexto familiar e social atual do arguido seja favorável à sua ressocialização integral para o tribunal a quo nela ancorar a decisão de suspender a execução da pena, mas que deixe de o ser em sede de ponderação da aplicação do Regime Penal Especial, porquanto aquele, mal a nosso ver, optou pelo afastamento de tal Regime na determinação da pena imputada ao arguido.
9. O douto acórdão recorrido, com o devido respeito, que é muito, traduz assim uma ponderação errónea e falaciosa por parte do tribunal a quo sobre o arguido e prognostica negativamente o seu futuro em sede criminal, sem verdadeiramente justificar a realização desse juízo.
10. Tal ponderação mostra-se fortemente afetada por aparente fundamentalismo, apertado critério de análise e excessiva subjetividade, com apriorísticos reflexos negativos no que tange à avaliação da personalidade efetiva do arguido, seu grau de perigosidade e potencial ameaça que o mesmo possa constituir para a sociedade, que objetiva e seriamente, salvo melhor opinião, não têm razão de ser.
11. Na verdade, o douto acórdão, na avaliação das condutas do arguido, reflete total insensibilidade e alheamento quanto às dificuldades de integração por que passaram o próprio, então com apenas 14 anos, e a sua família, todos de nacionalidade brasileira, quando decidiram rumar a Portugal na procura, legítima e louvável, de uma vida melhor.
12. A personalidade do arguido e as necessidades de prevenção que a mesma suscita, parecendo ser normais, afiguram-se objetivamente compagináveis com um juízo de prognose favorável sobre a evolução do processo da sua reintegração social, reconhecendo-se vantagens em que o mesmo possa/deva ser prosseguido na fruição dos benefícios da aplicação do Regime Penal Especial.
13.O exame crítico que o mesmo vem fazendo à sua conduta passada, manifestados na adequada interiorização e autocensura da desvalia ético-jurídica correspetiva, e o compromisso da alteração radical da mesma, que já hoje é bem visível, permitem expectar que o arguido continuará a interagir com a sua sociedade, de forma saudável, pacífica e em plena observância do direito em vigor.
14. O facto de o arguido, no exercício do seu direito, ter optado pelo silêncio durante o julgamento, sem que isso pudesse prejudicá-lo, como bem referido no douto acórdão “em crise”, ao contrário do que resulta do que ali está escrito, com consequências funestas para a aplicação da pena e afastamento do Regime Penal Especial, não legitima qualquer inferência de que o mesmo não possa sentir arrependimento, dor e sofrimento psicológicos pelo que fez, porquanto os mesmos repousam apenas no interior da sua consciência.
15. Este prognóstico sobre o arguido promana, para além do quantum abonatório constante do RS, da comprovada inexistência nosautos de outros processos-crimes a correr contra si, podendo assim concluir-se, com segurança, por um lado, que o arguido está afastado da criminalidade há mais de dois anos e, por outro, que as duas incriminações que sofreu resultaram de factualidades delituosas episódicas, augurando-se, por isso, que as mesmas não voltarão a repetir-se no futuro.
16. Resulta claramente também que a aplicação ou não aplicação do Regime Penal Especial, ou seja, do estatuído no Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de setembro, não resultaduma decisão arbitrária do julgador, antes constituindo um seu “poder-dever”, uma conduta vinculada que lhe é imposta por lei, como se mostra amplamente sufragado pela jurisprudência.
17. O juízo de prognose sobre o comportamento futuro do arguido, a realizar naponderação dospressupostos paraa aplicação do Regime Especial, basta que não seja “negativo”e também não tem de ter necessariamente em conta o grau de ilicitude e de culpa inerentes aos factos delituosos perpetrados.
18. Na base deste regime e do carácter injuntivo que, face ao referido, lhe está associado, estão razões de fundo de natureza político-criminal em que se acredita no carácter efémero da delinquência juvenil e na convicção do legislador de que a reintegração social, como objetivo precípuo perseguido na reação sancionatória, deverá ocorrer, preferencialmente, no quadro da aplicação do Regime Penal Especial atualmente vigente.
19. Este Regime inscreve-se numa observação ideológico-política do fenómeno da criminalidade juvenil (entre os 16 e os 21 anos), fundada nas suas típicas especificidades e também na crença de que a mesma é passageira, tendendo a desvanecer-se gradualmente com o atingimento da maturidade plena dos seus agentes.
20. Donde, a resposta penal, no sentido literal das normas ínsitas no instituto jurídico-penal, que está exarado, mormente, no artigo 4º do Decreto-Lei nº 401/82, de 23/9, e que exige do julgador elevada sensibilidade e condescendência na avaliação jurídico-criminal do agente tipificado naquele Diploma Legal, deverá apresentar um cariz muito mais reeducativo e pedagógico do que punitivo, infamante e estigmatizador.
21. O recorrente, face ao que antecede, ao esperado desenvolvimento saudável da sua personalidade, às normais necessidades de prevenção especial que, incasu, se fazem sentir, apresenta um contexto favorável a que o processo da sua reintegração social, que está em curso, possa e deva operar-se no seio/quadro do benefício da atenuação especial da pena prevista no nº 4 do Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de setembro, mostrando-se simultaneamente realizadas as finalidades da punição.
22. E, se assim for, rematando o presente recurso com a evocação do pensamento filosófico citado no preâmbulo desta peça processual, o arguido poderá seguramente esquecer o passado e construir, com felicidade e sem anátema, o seu próprio futuro.
23. Face ao que antecede, procedendo o presente recurso, requer-se a V. Exas, Venerandos Juízes Desembargadores, que seja revogado o douto acórdão recorrido e que, em sua substituição, seja proferido outro em que, por aplicação do artigo 4º do Decreto-Lei 401/82, de 23 de setembro, seja especialmente atenuada a pena aplicada ao arguido nos termos do artigo 73º, nº 1 do Código Penal, incluindo o tempo de suspensão que, a nosso ver, eporisso se requer, não deveria exceder os três anos, mantendo-se o regime de prova.
Assim se fazendo, VENERANDOS JUÍZES DESEMBARGADORES, como sempre, a melhor e mais sã JUSTIÇA!»
«CONCLUSÕES:
1 - O arguido, ora recorrente, foi condenado pela prática, em coautoria material e em concurso efetivo de um crime de roubo, na forma tentada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 14º, n.º 1, 22º, 23º, 26º, 73º, n.º 1, alíneas a) e b) e n.º 2, 210º, n.º 1, todos do Código Penal, na pessoa do ofendido BB, na pena de 8 (oito) meses de prisão e de um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 14º, n.º 1, 26º, 210º, n.º 1, do Código Penal, na pessoa do ofendido CC, na pena de 3 (três) anos de prisão, sendo que, em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 3 (três) anos e 3 (três) meses de prisão, suspensa na sua execução por 5 (cinco) anos com regime de prova.
2 - O Ministério Público considera que a decisão recorrida fez uma correta aplicação do regime de atenuação especial da pena, consagrado no art.º 4º do DL nº 401/82, de 23/9 impondo-se, por isso, a sua manutenção pois, na aplicabilidade deste regime, tal como determina o art.º 4º do referido DL nº 401/82, de 23/9, importa averiguar se há razões sérias para crer que da atenuação especial da pena resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado, devendo, na formulação deste juízo de prognose favorável à sua reinserção, atender-se às circunstâncias do crime, aos traços essenciais da personalidade em formação do jovem condenado, à sua conduta anterior e posterior ao crime, às suas condições de vida e à sua situação familiar, educacional e profissional, com vista a avaliar se o mesmo é, ou não, sensível à aceitação dos valores tutelados pelo direito penal e, por outro lado, indagar se, com a atenuação especial da pena, ficam, ou não, satisfeitas as exigências de prevenção geral da criminalidade.
3 - No caso em apreço, razões de prevenção geral, associadas à necessidade de uma punição exemplar dos crimes cometidos para tranquilização da ordem pública; razões de prevenção especial, associadas à total ausência de arrependimento demonstrado pelo arguido; razões inerentes à personalidade manifestada pelo arguido; razões associadas à conduta anterior e posterior à prática do crime; razões atinentes à gravidade dos crimes cometidos, sua natureza, determinam que ao arguido, ora recorrente, não seja aplicado o mencionado regime.
4 - Apesar de à data da prática dos factos o arguido ter apenas 17 anos de idade, preenchendo, por força disso, formalmente, um dos pressupostos legais para a aplicação do aludido regime, concordamos, na íntegra com a douta decisão do Tribunal a quo que, para o afastamento do “Regime Penal Especial” para jovens delinquentes, previsto no Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de setembro, ponderou, e bem, o facto de o arguido ter já condenações por três crimes idênticos, tendo já sido condenado numa pena de prisão suspensa e não ter contribuído para o apuramento dos factos já que não quis prestar declarações.
Este é o entendimento que perfilhamos.
Exªs, porém, farão a costumada JUSTIÇA.»
Colhidos os vistos e indo os autos à conferência, cumpre apreciar e decidir.
2.1-QUESTÕES A DECIDIR
Conforme jurisprudência constante e assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se delimita o objeto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior.
Face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, a questão a apreciar e decidir é a da aplicação do regime penal para jovens delinquentes.
Tendo em conta as questões objeto do recurso, da decisão recorrida importa evidenciar: a fundamentação da matéria de facto e da fundamentação de direito a parte da qualificação jurídica e a determinação da pena.
2.2.1- Fundamentação da matéria de facto (transcrição integral):
«II.FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Da prova produzida, resultaram os seguintes:
1.FACTOS PROVADOS:
Da acusação pública:
1) No dia 30/07/2022, o arguido e os seus acompanhantes - cuja identidade não se logrou apurar, apenas se sabendo serem dois do sexo masculino e dois do sexo feminino - acordaram entre si um plano para, em conjugação de esforços e intentos, se apoderarem de dinheiro e outros objetos de valor que encontrassem na posse de transeuntes, atingindo-os na sua integridade física e / ou recorrendo a intimidações, de modo a provocar medo e receio nas vítimas.
2) Assim, nesse mesmo dia 30/07/2022, pelas 06h45m, o arguido e os outros quatro elementos do grupo, viram BB, que caminhava sozinho, na Rua ..., no Porto e decidiram abordá-lo e apoderar-se de bens e valores que o mesmo trouxesse consigo.
3) Na prossecução dos seus intentos, o arguido e os outros quatro elementos do grupo interpelaram o ofendido, pedindo-lhe dinheiro, tendo o mesmo negado.
4) O dito BB foi rodeado pelo arguido e demais indivíduos, que o começaram a revistar, mexendo-lhe nos bolsos.
5) BB conseguiu fugir, dirigindo-se aos taipais das obras do metro, saltando para o interior do estaleiro, não lhe tendo sido subtraído qualquer bem.
6) O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, com o propósito não concretizado, de se apoderar de bens do ofendido, fazendo-os seus, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que atuava sem autorização e contra a vontade do seu proprietário. Para o efeito utilizou violência e força física, da forma supra descrita, como forma de intimidar o ofendido e de o pôr na impossibilidade de resistir.
7) Logo de seguida, o arguido e os elementos do seu grupo viram CC a sair sozinho do estabelecimento comercial denominado “A...”, sito na Rua ..., Porto.
8) Abordaram-no e, de forma súbita e inesperada, desferiram-lhe um soco na face, começando o ofendido a sangrar.
9) O ofendido, assustado e com medo, começou a correr, tendo o arguido e os restantes elementos do grupo ido atrás dele e, já na Rua ..., agarraram-no e desferiram-lhe vários pontapés e murros pelo corpo, deixando-o, inconsciente.
10) De seguida, o arguido e seus colegas apoderaram-se de um telemóvel, marca “IPhone ...”, com o IMEI ..., no valor de €1.000 (mil euros), propriedade do ofendido.
11) Após, o arguido e os restantes elementos do grupo saíram do local, levando consigo o referido objeto que integraram entre os seus bens.
12) O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, conjuntamente e em comunhão de esforços, na sequência de um plano previamente delineado, com o propósito de se apoderar do referido objeto, fazendo-o seu, bem sabendo que o mesmo não lhe pertencia e que atuava sem autorização e contra a vontade do seu proprietário.
13) Para o efeito, o arguido e os restantes elementos do grupo, usaram violência e força física, da forma supra descrita, como forma de intimidar o ofendido e de o por na impossibilidade de resistir.
14) Sabia que a sua conduta era reprovável e contrária à lei.
15) CC deu entrada nas urgências do Hospital ..., no dia 30/07/2022, pelas 07h33m (cfr. fls. 163 a 165).
16) À entrada nas Urgências, o ofendido apresentava ferida traumática na pirâmide nasal, com epistaxis abundante, tendo suturado a ferida com 4 pontos. Observou-se ainda fratura de ambos os ossos próprios do nariz, cominutivas, com desalinhamentos múltiplos e com afundamento à esquerda, identificando-se também fratura da apófise frontal da maxila, bilateralmente, alinhada à direita, mas com desalinhamento à esquerda (cfr. fls. 163 a 166).
17) Em consequência direta e necessária das agressões o ofendido CC – beneficiário n.º ... da Segurança Social - ficou com: ferida corto-contusa na pirâmide nasal, fratura de ambos os ossos próprios do nariz, cominutivas, com desalinhamentos múltiplos e cm afundamento à esquerda, fratura da apófise frontal da maxila, bilateralmente, alinhada à direita, demandando tais lesões para a sua consolidação 45 dias, com afetação da capacidade de trabalho geral e profissional de 15 dias.
Do pedido de indemnização civil:
18) No exercício da atividade que desenvolve, a UNIDADE LOCAL DE SAÚDE ..., E.P.E. prestou assistência hospitalar a CC no dia 30/07/2022, devido a lesões que apresentava e que foram resultado das agressões físicas perpetradas pelo arguido e pelos restantes elementos do grupo que integrava, nesse mesmo dia, pelas 07 horas.
19) Da assistência prestada pela demandante UNIDADE LOCAL DE SAÚDE ..., E.P.E. prestou resultaram despesas que ascendem a €246,67 (duzentos e quarenta e seis euros e sessenta e sete euros).
Das condenações do arguido:
20) O arguido tem as seguintes condenações (cfr. CRC junto aos autos, emitido a 04/10/2024):
-por sentença datada de 15/12/2022, transitada em julgado em 27/01/2023, proferida no âmbito do Proc. n.º 561/21.0GAVCD, foi o arguido condenado pela prática, em 03/09/2021, de um crime de roubo, na pena de 12 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos.
Das condições pessoais, familiares, profissionais e socioeconómicas do arguido:
21) O arguido nasceu no dia ../../2005, tendo atualmente 19 anos de idade, sendo que, à data dos factos (30/07/2022), tinha 17 anos de idade.
22) Resulta ainda dos autos (cfr. teor do relatório social, datado de 24/10/2024, juntos aos autos):
-Na data a que respeitam os factos que deram origem ao presente processo, AA, de 17 anos, encontrava-se integrado no agregado composto pelos seus pais, DD, de 42 anos, operário da construção civil; EE, de 39 anos, empregada doméstica e o irmão, de 6 anos, estudante.
-O agregado habitava apartamento arrendado, de tipologia 2+1, que reúne boas condições de habitabilidade e conforto, inserido em meio social onde não se vislumbram problemáticas significativas.
-Atualmente, o arguido mantém residência na morada dos autos e integração no agregado de origem, sendo referida uma dinâmica familiar coesa e funcional. Os pais mostram-se apoiantes e preocupados com o percurso dos descendentes, expressando particular apreensão pela situação jurídica do arguido e processo de integração.
-O grupo doméstico subsiste através dos vencimentos auferidos pelos progenitores, ambos integrados laboralmente. Apresentam rendimentos no valor de cerca de 1860€, com o qual assumem o pagamento das despesas do quotidiano, dos quais destacam o pagamento da renda, no valor de 650€, considerando o pai que a situação económica é restritiva, exigindo rigor na gestão.
-Este agregado, de origem brasileira, encontra-se a residir em Portugal desde 2019, tendo o processo de adaptação à nova realidade vivencial decorrido com normalidade, à exceção do arguido, que contava anos e que referiu ter sentido muitas dificuldades nesse processo de transição, designadamente a nível escolar, porquanto considera ter registado obstáculos na apreensão da matéria lecionada, que está a tentar ultrapassar. Também ao nível das interações sociais, o arguido refere estar a tentar adaptar-se e a estabelecer amizades, verbalizando não dispor de grupo de pares formal.
-AA encontra-se inscrito no curso educação e formação para jovens, para obter equivalência ao 3º ciclo, na área administrativa. Em contexto escolar tem registado comportamento ajustado e de respeito para com os professores, alunos e regras escolares, não obstante, desde o início do corrente ano letivo (2024/2025), registar absentismo, que, segundo referiu, se prende com a desmotivação para a frequência letiva, estando a ponderar sobre o seu projeto de vida futuro.
-Ao fim de semana, AA tem desenvolvido atividade laboral juntamente com o pai, em regime de biscate, no ramo da construção civil, sendo os valores auferidos por si direcionados para os seus gastos pessoais.
-O arguido apresenta um quotidiano organizado em função da frequência letiva, sendo o tempo livre passado maioritariamente em casa ou com a namorada, mantendo contacto virtual com grupos de amigos, com os quais se dedica à composição de música, que refere ser o seu hobby.
-AA encontra-se condenado pela prática de um crime de roubo, na pena de 12 meses de prisão, suspensa pelo período de dois anos, sujeita a regime de prova, com monitorização nesta Equipa da DGRSP, cuja decisão transitou em julgado a 02/02/2023, prevendo-se o término a 02/02/2025, estando a demonstrar adesão e cumprimento ao judicialmente determinado e ao respetivo plano de reinserção social.
-Mantém o apoio e retaguarda dos familiares coabitantes.
2.FACTOS NÃO PROVADOS:
Com relevância para a discussão da causa não existem
3.MOTIVAÇÃO:
Tendo presente que a prova judiciária não visa alcançar uma certeza ontológica, mas apenas uma certeza judiciária – que, no plano dos princípios, deveria coincidir com a verdade material – e em obediência ao disposto no art. 374º, n.º 2 do CPP, bem como ao consagrado no art. 205º, n.º 1 da CRP, proceder-se-á indicação e ao exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, explicitando o processo de formação dessa convicção.
Cumpre igualmente salientar que, na falta de elementos de prova que sustentem, cabalmente e com o rigor e a segurança exigíveis, a factualidade imputada à arguida, persistirá a dúvida razoável sobre a verificação e/ou a autoria dos factos, pelo que, de acordo com o princípio fundamental da presunção de inocência do arguido, plasmado no art. 32º, n.º 2, da CRP, tal incerteza não poderá desfavorecê-la (in dubio pro reo).
Assim, o Tribunal fundou a sua convicção, no que respeita à factualidade provada e não provada, na conjugação dos depoimentos prestados pelas testemunhas BB (ofendido), CC (ofendido), FF (ia a passar no local no dia factos), GG (encontrava-se com a testemunha FF no dia dos factos) e HH (agente da PSP) e os documentos juntos aos autos, designadamente o auto de notícia de fls. 3 e 3 verso, o aditamento de fls. 4, o aditamento n.º 4 de fls. 15, elementos clínicos de fls. 28 a 30, reportagem fotográfica de fls. 31 a 35 (fotografias tiradas pela testemunha FF logo após os factos) e reportagem fotográfica de fls. 36 a 41 (fotogramas extraídos da plataforma Instagram, com o perfil de um dos suspeitos a partir de uma pesquisa efetuada pelo aqui ofendido CC), tudo conjugado com as conclusões que derivam da aplicação de regras da lógica e da experiência comum ao caso concreto.
O Tribunal teve ainda em conta a prova pericial, consubstanciada no Relatório da Perícia de avaliação do dano corporal em Direito Penal de fls. 8 e 9.
Em fase anterior à do julgamento, o arguido não prestou declarações perante autoridade judiciária (Ministério Público e / ou Juiz de Instrução) sobre os factos de que vêm acusados, pelo que não há declarações a valorar quanto a esta matéria, nos termos dos arts. 141º, n.º 4, alínea b), 144º, n.º 1, 355º, n.ºs 1 e 2 e 357º, n.º 1, alínea b) e n.ºs 2, 3 e 4, do CPP.
Na audiência de discussão e julgamento, o arguido não quis prestar declarações, fazendo uso de um direito que lhe assiste e pelo qual não será prejudicado (art. 61º, n.º 1, alínea d), do CPP), contudo, não pudemos colher a sua versão dos factos. Deste modo, relativamente às perguntas que lhe são feitas sobre a questão da culpa, isto é, sobre os factos que lhe são imputados e que podem configurar elementos constitutivos de infração criminal, o arguido tem o direito ao silêncio, tanto podendo calar-se como responder afirmativa ou negativamente. E daqui deriva que ele não pode ver desfavorecida a sua posição por não ter exercido o direito ao silêncio, o qual não pode ser de modo algum valorado como indício ou presunção de culpa, nem tão pouco como circunstância influenciadora da dosimetria concreta da pena.
A testemunha BB, aqui ofendido, descreveu a abordagem que lhe foi feita, por banda de um grupo de indivíduos, dizendo que quando passava na Rua ... foi abordado e rodeado por um grupo de cinco pessoas, de ambos os sexos, que lhe começou por pedir um cigarro, depois dinheiro e que, após ser rodeado, percebeu que ia ser assaltado, tendo então conseguido fugir, a correr, em direção às obras do metro, tendo aí se refugiado. Mais referiu que, pouco depois, esteve com o outro ofendido e com as testemunhas que presenciaram os factos relativamente ao CC, pessoa que aliás não conhecia, tendo-se apercebido, pela descrição feita, que ambos tinham sido assaltados pelo mesmo grupo de pessoas. Referiu ainda que não conseguiu identificar ninguém, não conhece o arguido, nem o consegue associar ao grupo em causa.
A testemunha CC, à semelhança da testemunha anterior, descreveu os acontecimentos de que foi alvo, esclarecendo que tinha acabado de sair do Bar “A...”, seguindo sozinho, quando é atingido, com violência, com um murro na face, não tendo tido qualquer hipótese de reação, nem conseguindo aperceber-se por quem foi desferido. Por uma questão de instinto começou a correr, desorientado, em direção à Rua ..., não tendo noção depois do sucedido, pois perdeu os sentidos, apenas se recordando de estar a ser assistido no local. Mais referiu que apenas tomou conhecimento do que lhe sucedeu pelo relato de testemunhas que a tudo assistiram e que lhe disseram que ele foi perseguido por um grupo de pessoas (rapazes e raparigas), que tentaram fazê-lo cair pregando-lhe rasteiras e que o agrediram com socos e pontapés, acabando por lhe retirar o telemóvel Iphone que trazia consigo e que, posteriormente, deu por falta dele. Disse ainda não ser capaz de identificar quem o agrediu e quem lhe retirou o telemóvel. Quanto às lesões por si sofridas, referiu que lhe partiram o nariz e que ficou fortemente ferido.
Estas testemunhas, ofendidos nos autos, prestaram depoimentos espontâneos, a todos os títulos sérios e credíveis.
Essenciais foram os depoimentos das testemunhas FF e GG que, por se encontrarem a passar no local, de tudo se aperceberam, mormente da agressão de que o ofendido CC foi alvo. Estas testemunhas referiram que se encontravam ali na Rua ..., na esquina com a Rua ..., quando viram um rapaz (que depois vieram a saber tratar-se do ofendido CC) a correr, ferido, em direção à Rua ..., e um grupo de indivíduos, composto por rapazes e raparigas, no seu encalço, fazendo-lhe rasteiras para que o mesmo caísse ao chão, acabando por o alcançar e agredindo-o com pontapés e murros, tendo a testemunha GG visualizado a retirada do telemóvel. Perante tal cenário decidem chamar a polícia e ainda tirar fotografias aos indivíduos quando os visualizam a apanhar um Uber. Nesse momento, conseguem captar o Uber com alguns dos indivíduos já dentro do carro (fls. 32), ficando dois dos elementos do grupo fora do Uber por já não terem espaço, acabando por seguir apeados – cfr. fotos de fls. 32 a 34.
Referiram ainda, de forma perentória e sem qualquer hesitação, que não têm qualquer dúvida que o individuo que se vê na foto de fls. 32 e 34, trajando de vermelho e preto e com uma carteira à tiracolo, fazia parte do grupo que momentos antes tinha abordado e agredido o ofendido CC e lhe retirado o telemóvel.
Ora, comparando a fotografia captada pelas referidas testemunhas – fls. 32 e 34 - é possível concluir, sem margem para qualquer dúvida, que a pessoa visível na foto de fls. 34 (foto tirada pela testemunha logo após os factos de um dos elementos do grupo) é a mesma pessoa visível no perfil de Instagram de fls. 38, 39 e 40 e que corresponde, claramente, ao cliché existente na polícia e referente ao aqui arguido – cfr. auto de comparação de imagens de fls. 54 a 56 e que é a mesma pessoa que no julgamento se apresentou perante o Tribunal. Se o arguido atualmente está fisicamente diferente, designadamente com o cabelo mais longo, não há dúvida, em termos das feições, da estatura e da compleição física, que é a mesma pessoa que se vê nas fotografias de fls. 32 e 34, tiradas pela testemunha que presenciou os factos e que, na verdade, também correspondem com os clichés existentes na Polícia, aí até com um visual mais aproximado ao visual que tinha no dia dos factos – cfr. clichés de fls. 54, 55 e 56 versus fls. 32 e 34.
Assim, as circunstâncias de tempo, modo e lugar em que ocorreram os factos, a sucessão e dinâmica dos mesmos, provaram-se com base na conjugação das declarações dos próprios ofendidos com as testemunhas FF e GG, sendo que, quanto à identificação do coautor dos factos, aqui arguido, foram essenciais os depoimentos destas duas testemunhas, em conjugação com o suporte fotográfico existente nos autos.
Desta feita, entendemos não existirem dúvidas sobre a coautoria dos factos por banda do arguido porque as testemunhas foram perentórias em afirmar que a pessoa que retrataram logo após os factos – fls. 32 e 34 – é uma das pessoas que fazia parte do grupo que havia abordado, agredido e assaltado o ofendido CC momentos antes, sendo certo que, não obstante não conseguirem identificar o arguido em julgamento, o certo é que não existe, para nós, qualquer dúvida que a pessoa que se vê na foto de fls. 32 e 34 é o arguido que se nos apresenta à frente em julgamento (embora com o cabelo diferente) e a mesma pessoa do cliché de fls. 54, 55 e 56, o que nos permite alcançar a certeza e a segurança necessárias de que o arguido foi o seu coautor. Por outro lado, sabemos que o ofendido BB foi abordado momentos antes pelo mesmo grupo, pela descrição dada, com igual abordagem, pelo que dúvidas também não ficaram sobre a ocorrência desses factos em relação a esse ofendido. Por fim, nenhuma outra prova foi exibida que colocasse o arguido noutro local, eximindo-o da responsabilidade
Este reconhecimento da pessoa do autor dos factos enquadra-se na apreciação da prova valorada pelas juízas que compõem este Tribunal nos termos previstos no art. 127º do CPP e de acordo com a sua conjugação crítica com os demais elementos de prova e com as regras da experiência comum, tal como acima foi por nós justificado.
É forçoso, no entanto, concluir que o arguido não atuou sozinho, tendo atuado em conjugação de esforços e intentos, com outros indivíduos, mas não existe qualquer dúvida para o Tribunal que o arguido fazia parte do grupo que assaltou o ofendido CC e tentou assaltar o ofendido BB, estando assim demonstrado o seu envolvimento direto nos factos, ainda que sob a forma de coautoria.
Quanto às consequências que advieram para o ofendido CC da ação do grupo, as mesmas ficaram demonstradas com base na conjugação das suas declarações, com os elementos clínicos de fls. 28 a 30 e ainda o teor do relatório pericial de fls. 91 e ss., lesões estas perfeitamente compatíveis com a descrição feita da agressão perpetrada. Desta feita, os elementos objetivos juntos aos autos, designadamente os elementos clínicos, descrevem-nos lesões perfeitamente compatíveis com a versão que nos foi trazida pelas testemunhas que viram a agressão ao ofendido CC. Na verdade, as lesões apresentadas e referidas são perfeitamente compatíveis com a dinâmica relatada pelas testemunhas, ou seja com a agressão levada a cabo pelo grupo onde se encontrava o arguido: murro no nariz e murros e pontapés no corpo.
Assim, quanto às consequências concretas que advieram para os ofendidos dos factos aqui em apreço, o Tribunal ficou convencido, designadamente através da conjugação das suas declarações, com as regras da experiência comum e ainda com os elementos clínicos (relativamente ao ofendido CC).
Da conjugação dos depoimentos supra referidos e nos termos explanados, suportados ainda pela restante prova nos termos referidos, ficou o Tribunal convencido que as coisas se passaram conforme vêm descritas nos factos provados.
O encadeamento sequencial e lógico dos factos provados e as regras da experiência comum permitem-nos concluir pela verificação dos elementos subjetivos.
No que se refere às condições pessoais, familiares, económicas, sociais e profissionais do arguido, teve-se em conta o teor do relatório social junto aos autos e datado de 24/10/2024.
As condenações do arguido provaram-se com base no CRC junto aos autos, emitido em 04/10/2024.
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2.2.2- Fundamentação de direito (transcrição dos segmentos relevantes):
« III.ENQUADRAMENTO JURÍDICO-PENAL DOS FACTOS
(…)
IV.ESCOLHA DA PENA E DETERMINAÇÃO DA MEDIDA CONCRETA DA PENA
1. DO REGIME ESPECIAL PARA JOVENS:
Antes de prosseguirmos para a determinação da medida concreta da pena, deve-se ter em atenção que o legislador criou um regime legal especial para jovens delinquentes, cuja idade se situa entre os 16 e os 21 anos.
Os arts. 1º, n.º 2 e 4º do DL n.º 401/82, de 23 de setembro (“Regime Penal Especial para Jovens com idade compreendido entre os 16 e os 21 anos”) estabelecem que se for aplicável pena de prisão a jovem que à data dos factos tivesse completado 16 anos sem ter ainda atingido os 21 anos, deve o juiz atenuá-la especialmente se tiver sérias razões para crer que da atenuação especial resultam vantagens para a reinserção social do jovem condenado.
Tal regime encontra-se previsto no art. 9º do CP e no citado DL, fundando-se na ideia que no direito penal dos jovens imputáveis se deve dar prioridade aos princípios e modelos protetivos e reeducadores, visto que existe nos jovens uma maior capacidade de ressocialização, importando prevenir os efeitos estigmatizantes que neles, com maior facilidade, desencadeia uma longa pena privativa da liberdade.
É neste contexto que o art. 4º, do citado DL, prevê uma atenuação especial relativa aos jovens, a operar nos termos dos arts. 72º e 73º do CP.
O regime especial para jovens tem a sua justificação “na necessidade de encontrar respostas e reacções que melhor parecem adequar-se à prática por jovens adultos de factos qualificados pela lei como crime. O direito penal dos jovens adultos surge, assim, como categoria própria, envolvendo um ciclo de vida, correspondendo a uma fase de latência social que faz da criminalidade um fenómeno efémero e transitório” (exposição de motivos do DL n.º 401/82).
Trata-se de instituir um direito mais reeducador do que sancionador, sem esquecer que a reinserção social, para ser conseguida, não poderá descurar os interesses fundamentais da comunidade, e de exigir, sempre que a pena prevista seja a de prisão, que esta possa ser especialmente atenuada, nos termos gerais, se para tanto concorrerem sérias razões no sentido de que, assim, se facilitará aquela reinserção.
Conforme se refere no Acórdão do STJ de 14/05/2003 (recurso 03P518): “(...) subjazem aos objectivos do regime especial dos jovens imputáveis, com idades compreendidas entre os 16 e os 21 anos, constante desse diploma, relevantes interesses públicos de justiça e de política criminal. Resulta expressivamente do preâmbulo do Decreto-Lei n.° 401/82 que esses objectivos se traduzem no intuito de, sempre que possível e adequado às exigências concretas de prevenção especial e geral, se optar, relativamente aos jovens imputáveis, por medidas ou sanções que, tendo em conta o processo real de desenvolvimento do jovem, promovam a sua responsabilização e socialização ou ressocialização sem os referidos riscos evitáveis de efeitos criminógenos de estigmatização e de marginalização frequentemente ligados às medidas institucionais, designadamente às penas de prisão. Em harmonia com tais objectivos, esse regime especial prescreve, além do mais, no seu artigo 4.° que, no caso de ser de aplicar pena de prisão, ela deve ser especialmente atenuada - independentemente da verificação das circunstâncias com os efeitos previstos na segunda parte do n.° 1 do art. 72.° do Código Penal, indicadas, a título exemplificativo, no n.° 2 deste artigo - sempre que o Tribunal tenha sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado (...)“.
O regime especial previsto neste diploma não é de aplicação automática, já que está dependente de se considerar que da atenuação especial resulta uma vantagem relevante para a reinserção social do jovem condenado.
Trata-se de um poder-dever que implica que a aplicação dessa atenuação dependa da existência de sérias razões para pensar que dela resultem vantagens para a reinserção social do jovem delinquente.
O art. 4º do citado diploma estatui a aplicação do instituto da atenuação especial da pena aos jovens delinquentes quando o juiz tiver sérias razões para crer que da atenuação resultam vantagens para a reinserção do jovem condenado.
Ora, a mera existência de um regime penal especial para jovens não significa que estes tenham necessariamente de dele beneficiar, antes indicando que a aplicabilidade do mesmo deve ser sempre ponderada, sendo obrigatoriamente aplicado nos casos em que se mostrem satisfeitos os respetivos requisitos.
Como se disse, e conforme se entende na maioria da jurisprudência, este regime não é de aplicação automática, devendo resultar de um conjunto de elementos que levem à atenuação especial da pena. Assim, não basta que o arguido tenha uma idade situada no referido escalão etário –ou seja, entre 16 e 21 anos-, para que a atenuação tenha logo lugar; torna-se necessário que, no caso concreto, existam “razões sérias para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado” (entre outros, os Acórdãos da Relação do Porto de 13/03/2002 e 24/05/2006, em www.dgsi.pt).
Haverá, assim, que fazer um “juízo de prognose favorável à reinserção social do jovem condenado perante circunstâncias concretas” e que terá como limite “a necessidade de defesa da sociedade e de prevenção da criminalidade” (cfr. Acórdão do STJ, de 09/05/2002, CJ II, pág. 193; Acórdão da Relação do Porto de 12/09/2007, www.dgsi.pt).
A mera existência de um regime penal especial para jovens não significa que estes tenham necessariamente de dele beneficiar, antes indicando que a aplicabilidade do mesmo deve ser sempre ponderada, sendo obrigatoriamente aplicado nos casos em que se mostrem satisfeitos os respetivos requisitos.
Assim, deve atender-se à personalidade do arguido, a todo o circunstancialismo que envolveu a conduta criminosa, bem como a possibilidade do meio envolvente, familiar ou comunitário, poder suportar essa reintegração. Deste modo, há que atender à situação pessoal, familiar e socioprofissional do arguido, mas também à relação que é necessário estabelecer entre a personalidade do mesmo e à prognose quanto ao seu comportamento futuro.
No juízo de prognose a formular sobre a existência de vantagens para a reintegração na sociedade do arguido devem ser tidas em conta todas as circunstâncias ocorrentes atinentes à ilicitude do facto (gravidade e suas consequências), à culpa (tipo e intensidade do dolo e fins que subjazem ao ilícito) e às necessidades de pena, tendo presentes a personalidade do jovem e suas condições pessoais, com destaque para o comportamento anterior e posterior aos factos.
Pelo que, a avaliação das vantagens da atenuação especial da pena para a reinserção do jovem tem de ser equacionada perante as circunstâncias concretas do caso e o percurso de vida daquele.
Vejamos:
-o arguido nasceu no dia ../../2005, tendo atualmente 19 anos de idade, sendo que, à data dos factos (30/07/2022), tinha 17 anos de idade.
-atualmente já tem uma condenação e por três crimes idênticos, tendo sido condenado numa pena de prisão suspensa;
-não quis prestar declarações, não tendo contribuído para o apuramento dos factos.
Aplicando as considerações supra vertidas, considera-se que o arguido não deverá beneficiar da atenuação especial contida no art. 4º do citado DL. Na verdade, o arguido não quis prestar declarações, não tendo contribuído para o apuramento dos factos (o silêncio não o pode prejudicar, mas também não o beneficia), sendo que, posteriormente, já foi condenado por três crimes idênticos. De tudo isto não redunda um juízo positivo que permita concluir existirem vantagens na atenuação especial da pena no âmbito do regime jurídico para jovens adultos em relação ao arguido, não estando reunidas as condições para que o arguido se consciencialize da necessidade de adotar uma conduta normativa.
Em face destas razões, decide-se não aplicar o regime especial para jovens adultos.
2.ESCOLHA DA MEDIDA DA PENA:
O crime de roubo consumado é punido com uma pena de 1 ano a 8 anos de prisão e o crime de roubo tentado é punido com a pena de 1 mês a 5 anos e 4 meses de prisão
O Código Penal traça um sistema punitivo que parte do princípio basilar de que as penas devem ser executadas com um sentido pedagógico e ressocializador.
Efetivamente, o art. 40º do CP elege como fins das penas e das medidas de segurança a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente infrator na sociedade.
Em articulação com este preceito, o n.º 1 do art. 71º do diploma legal citado, estabelece que a determinação da medida da pena é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
No processo de escolha da medida da reação criminal a culpa assume, assim, a dignidade de pressuposto incontornável de toda e qualquer punição.
Como considera Figueiredo Dias (“Direito Penal Português - As consequências Jurídica do Crime”, Editorial Notícias), a culpa e a prevenção constituem os dois vetores fundamentais em que assenta a operação de determinação da medida da pena.
“Através do requisito de que sejam levadas em conta as exigências de prevenção, dá-se lugar à necessidade comunitária da punição do caso concreto e, consequentemente, à realização in casu das finalidades da pena. Através do requisito de que seja tomada em consideração a culpa do agente, dá-se tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime - ligada ao mandamento incondicional de respeito pela imanente dignidade da pessoa do agente – limite de forma inultrapassável as exigências de prevenção.”
Também sobre esta temática, Anabela Miranda Rodrigues (in RPCC, 12 (2002), “O modelo de prevenção na determinação da medida concreta da pena”) sustenta que “a medida concreta da pena é encontrada em função das necessidades de prevenção especial de socialização do agente ou, sendo estas inexistentes, das necessidades de intimidação e de segurança individuais. Finalmente, a culpa não fornece a medida da pena, mas indica o limite máximo da pena que, em caso algum pode ser ultrapassado em nome de exigências preventivas.”.
Assim, e como se disse, dentro dos limites estabelecidos no tipo legal, a determinação da medida da pena faz-se em função da culpa do arguido e as exigências de prevenção, sendo, nesses aspetos, determinantes os fatores de determinação da pena a que se referem as várias alíneas do n.º 2 do art. 71º do Código Penal.
A função da culpa é estabelecer o máximo de pena concreta (art. 40º, n.º 2 do Código Penal). Até ao máximo consentido pela culpa, “é a medida exigida pela tutela de bens jurídicos – ou, o que para nós é o mesmo, pela estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada – que vai determinar em definitivo a medida da pena. (…). É como uma espécie de “moldura de prevenção”; moldura cujo máximo é constituído pelo ponto mais alto consentido pela culpa do caso e cujo mínimo resulta do quantum de pena imprescindível, também no caso concreto, à tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias. (…) Dentro da “moldura de prevenção” actuam irrestritamente as finalidades de prevenção especial. Isto significa que devem aqui ser valorados todos os factores de medida da pena relevantes para qualquer uma das funções que o pensamento da prevenção especial realiza – seja a função primordial de socialização, seja qualquer uma das funções subordinadas de advertência individual ou de segurança ou de inocuização” (FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal 2, pág. 303, 306, 308).
Deste modo, na determinação da medida concreta da pena deve o Tribunal atender a todas as circunstâncias que deponham a favor ou contra o agente, abstendo-se, no entanto, de considerar aquelas que já fazem parte do tipo de crime cometido (salvo nos casos em que a sua intensidade concreta supere aquela que foi considerada pelo legislador para efeitos de determinação da moldura em concreto).
Assim sendo, relativamente ao arguido é tido em consideração o seguinte:
-O grau de ilicitude e o modo de execução dos factos é importante, mormente no que se refere à segunda situação em que o grupo, onde estava o arguido, agride de forma violenta o ofendio CC, deixando inconsciente, tendo-lhe fraturado o nariz. Além do mais, neste tipo de crimes, o receio que provoca nas pessoas que ficam como que “paralisadas”, deixando-as impotentes e sem qualquer hipótese de reagir, como aconteceu no caso que curamos.
-A intensidade do dolo, na sua modalidade mais grave - dolo direto.
-O valor dos bens em causa: um telemóvel Iphone ....
-O tribunal entendeu diferenciar a intensidade do crime de roubo em função da situação concreta, tendo valorado de forma mais negativa a segunda situação, em relação ao ofendido CC, em que o roubo foi consumado e houve uma agressão violenta.
-O número de vezes que o arguido cometeu estes factos, sendo certo que eles ocorreram num curto espaço de tempo.
-O arguido nada assumiu.
-As condições pessoais e sociais do arguido espelhadas nos factos provados.
-A prevenção geral é elevada, uma vez que está em causa a segurança e a paz públicas dos cidadãos, tanto mais que cada vez é em maior número a prática deste tipo de crimes, muitas vezes com consequências bastante gravosas. Na verdade, este tipo de crimes prolifera, o que coloca as necessidades de prevenção geral numa fasquia bastante elevada, na medida que este tipo de crime gera um forte sentimento de insegurança e gera medo e receio na população. Por fim se diga que se nota um aumento deste tipo de criminalidade direcionado aos jovens, aproveitando o facto de estes terem sempre bens “apetecíveis” para subtrair, entre eles dinheiro e telemóveis, aliado aos facto de poder ser mais fácil abordá-los, designadamente nos meios onde os jovens se costumam mover.
-Em ponto neutro, sem qualquer valoração positiva ou negativa, o facto de não se ter conseguido apurar a real motivação do arguido para ter cometido tais atos.
Assim, tudo visto e ponderado, o Tribunal decide aplicar as seguintes penas:
-para o crime de roubo tentado (ofendido BB): a pena de 8 (oito) meses de prisão;
-para o crime de roubo consumado (ofendido CC): a pena de 3 (três) anos de prisão.
3.CÚMULO JURÍDICO:
Determinadas as penas concretas que cabem a cada crime praticado pelo arguido, proceder-se-á à determinação da pena única do concurso de acordo com o art. 77º do CP. Tal pena deverá ser determinada dentro de uma moldura calculada nos termos do art. 77º, n.º 2: o máximo correspondendo à soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e o mínimo fixando-se na mais alta das penas concretamente aplicadas.
No caso sub judice, essa moldura será então de um mínimo de 3 (três) anos de prisão a um máximo de 3 (três) anos e 8 (oito) meses de prisão.
Dentro da moldura assim determinada, a pena única fixar-se-á tendo em conta, em conjunto, os factos e a personalidade do agente - art. 77º, n.º 1, in fine, do CP. Esta avaliação deve centrar-se na ideia de “gravidade do ilícito global” que os factos analisados no seu conjunto nos ofereçam, bem como na resposta que os mesmos dêem “à questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade” - FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português II - As Consequências Jurídicas do Crime, Editorial Notícias, 1993, pág. 291, §421.
Isto não significará que se valorarão novamente os fatores anteriormente ponderados aquando da determinação das penas concretas, procurando-se, pelo contrário, realizar uma análise genérica e consequencial de toda a factualidade, de modo a fazer corresponder a punição aos factos e às exigências pessoais e sociais que a sua prática suscitou, com o máximo rigor e acerto.
Assim sendo, efetuando uma avaliação de conjunto da factualidade em causa, afigura-se-nos adequado fixar a pena única do concurso dos crimes de roubo (dois crimes de roubo – um consumado e um tentado) em 3 (três) anos e 3 (três) meses de prisão.
4.PENA DE SUBSTITUIÇÃO:
No que toca à pena de prisão assim determinada, e uma vez que a mesma não é superior a cinco anos, deve analisar-se a suscetibilidade da sua substituição por uma das penas de substituição previstas no Código Penal.
A aplicação de uma pena de prisão não significa que a efetiva privação da liberdade seja necessária à realização dos fins da pena, sendo que o legislador prevê penas de substituição para determinados casos (cfr. Anabela M. Rodrigues, “Pena de prisão substituída por pena de prestação de trabalho a favor da comunidade”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal, 2001, n.º 11, Coimbra, pág. 664).
No tocante às penas de prisão, a substituição só deverá ser afastada quando a execução da prisão se mostre necessária face às exigências de prevenção especial de socialização, cabendo ao julgador optar pela pena de substituição que julgue mais adequada à realização das finalidades preventivas da punição ou que mais se aproxime dessa realização, tendo em vista os critérios legalmente estabelecidos para cada pena.
Atendendo à medida concreta da pena de prisão ora aplicada ao arguido (superior a um ano), não é possível substituí-la por pena de multa (art. 45º, n.º 1, do CP, na redação introduzida pela Lei n.º 94/2017, de 23 de agosto).
Não é igualmente possível optar pela execução da pena de prisão em regime de permanência na habitação, nem aplicar a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade, porquanto estas só são equacionáveis quando a pena de prisão concretamente aplicada não seja superior a 2 anos (arts. 43º, n.º 1, alíneas a) e b), e 58º, n.º 1, do CP, na mesma redação).
Vejamos assim a possibilidade de aplicação da suspensão da execução da pena de prisão.
Prescreve o art. 50º do CP que:
“O Tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”.
A Jurisprudência tem assim vindo a acentuar, como sucede com o Acórdão do STJ de 09/01/2002 (Proc. n.º 3026/01 - 3.ª Secção), divulgado em http://www.stj.pt, que: “A suspensão da pena é uma medida penal de conteúdo pedagógico e reeducativo que pressupõe uma relação de confiança entre o tribunal e o arguido condenado”, em que na sua base está sempre um juízo de prognose social favorável ao agente, baseada num risco de prudência, em que se deverá “reflectir sobre a personalidade do agente, sobre as condições da sua vida, sobre a sua conduta ante et post crimen e sobre o circunstancialismo envolvente da infracção.”.
Vejamos a situação concreta:
Verifica-se o pressuposto formal previsto no citado preceito legal - pena de prisão concretamente aplicada não superior a cinco anos. Importa agora analisar se está preenchido o pressuposto material, ou seja, se atendendo à personalidade do arguido e às circunstâncias do facto, é possível concluir ou não por um prognóstico favorável relativamente ao seu comportamento e de que a simples censura do facto e a ameaça da pena de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
A finalidade político-criminal que a lei visa consagrar com o instituto da suspensão da execução da pena de prisão é o afastamento do arguido, no futuro, da criminalidade. Esta medida de conteúdo pedagógico e reeducativo só deve ser decretada quando o Tribunal concluir, em face da personalidade do agente, das condições da sua vida e outras circunstâncias, ser essa medida adequada a afastar o delinquente da criminalidade.
“O Tribunal deverá correr um risco prudente, uma vez que esperança não é seguramente certeza, mas se tem sérias dúvidas sobre a capacidade do réu para compreender a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, a prognose deve ser negativa” (Leal-Henriques e Simas Santos, Código Penal, I volume, em anotação ao art. 50º).
No caso em apreço, e como já dissemos, o arguido não tinha, à data, antecedentes criminais e é muito jovem, tendo apenas 19 anos de idade. Por outro lado, o arguido tem o apoio dos seus familiares e mantém integração no agregado de origem, beneficiando de uma dinâmica familiar coesa e funcional. Os pais do arguido mostram-se apoiantes e preocupados com o percurso dos filhos, e também do arguido, expressando particular apreensão pela situação atual. Além do mais, o arguido encontra-se inscrito no curso educação e formação para jovens, para obter equivalência ao 3º ciclo, na área administrativa e tem registado, em contexto escolar, comportamento ajustado e de respeito para com os professores, alunos e regras escolares. Ao fim de semana, o arguido tem desenvolvido atividade laboral juntamente com o pai, em regime de biscate, no ramo da construção civil, sendo os valores auferidos por si direcionados para os seus gastos pessoais. Por fim, o arguido apresenta um quotidiano organizado em função da frequência letiva, sendo o tempo livre passado maioritariamente em casa ou com a namorada, mantendo contacto virtual com grupos de amigos, com os quais se dedica à composição de música, que refere ser o seu hobby, sendo que, ao nível da outra condenação, tem demonstrado adesão ao PRS.
Assim, não obstante o cometimento do tipo de ilícito em causa reivindicar necessidades de prevenção geral muito consideráveis, uma vez que tutela valores jurídicos muito importantes para a ordem jurídica comunitária, como se disse, estamos em crer que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam, de forma idónea e bastante, as finalidades da punição.
Assim, e de acordo com os pressupostos previstos no n.º 1 do art. 50º do CP, entendemos adequado e eficaz suspender a execução da pena de prisão, considerando-se que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizarão de forma adequada e suficiente as finalidades da punição quanto aos crimes praticados pelo arguido.
Atualmente (desde a entrada em vigor da redação do n.º 5 do art. 50º do CP introduzida pela Lei n.º 94/2017, de 23 de agosto), o período da suspensão continua a ser fixado entre 1 e 5 anos, embora sem limitação à medida concreta da pena quando esta seja superior a 1 ano (art. 50º, n.º 5, do CP, na redação anterior à citada Lei).
Tal significa que, in casu, o “período de prova” pode alargar-se até ao máximo de 5 anos, pois os crimes foram praticados já no domínio da lei nova.
Considerando que não há elementos seguros de que o arguido não voltará a praticar crimes contra as pessoas e contra o património, entendemos adequado e preventivo estender o período da suspensão da execução da pena de prisão aplicada a 5 (cinco) anos.
Face ao exposto, conclui-se pela aplicabilidade ao caso da suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido pelo período de 5 (cinco) anos (art. 50º, n.ºs 1 e 5 do CP), com regime de prova, em conformidade com o preceituado nos arts. 50º, n.ºs 2 a 4, 52º, n.º 1, alínea b), n.ºs 3 e 4, 53º, n.ºs 1 e 2 e 54º, n.ºs 1 a 3, do CP e ainda com a condição de o arguido proceder ao pagamento às vítimas dos montantes em que for condenado em sede de arbitramento de compensação, no prazo de 1 (um) anos após o trânsito em julgado do Acórdão (art. 51º, n.º 1, alínea a) e art. 50º, n.º 3, ambos do CP). *** »
2.3.1- Da aplicação do regime penal para jovens delinquentes.
A determinação da pena (em sentido amplo) comporta três operações distintas: a determinação da moldura da pena (pena aplicável); a determinação concreta da pena (pena aplicada); e a escolha da pena, que pode ocorrer logo na determinação da pena aplicável no caso de estar prevista no tipo legal de crime a pena de multa alternativa[1].
Nos termos do art.º 40º, nº 1, do Código Penal as finalidades das sanções penais são a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, não podendo nunca a pena ultrapassar a medida da culpa (art.º 40º, nº 2).
Dito de outro modo, a pena visa finalidades exclusivas de prevenção geral e especial, sendo que, dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva (necessidade de manutenção da confiança da comunidade na validade da norma posta em crise pelo cometimento do crime) devem atuar as exigências de prevenção especial (necessidade de preparação do agente para, no futuro, não cometer crimes).
O artigo 70º do Código Penal, por outro lado, estabelece as regras de escolha da pena e dispõe o art.º 71º, nº 1, que «a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção». Acrescentando-se no nº 2 deste último artigo que na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando, nomeadamente as que aí se encontram elencadas nas alíneas a) a f).
A primeira questão a considerar nesta sede é a da aplicação do regime penal especial para jovens delinquentes.
À data dos factos, o recorrente tinha 17 anos de idade.
O artigo 9º do Código Penal remete para legislação especial o regime penal dos indivíduos maiores de 16 e menores de 21 anos.
A consagração pelo legislador de um regime penal específico para os jovens delinquentes revela uma opção de política criminal humanista em que prevalece a reintegração social do jovem delinquente, partindo da ideia de que o fenómeno da delinquência juvenil e dos jovens adultos tem caráter transitório, procurando evitar-se a estigmatização e os efeitos criminógenos acrescidos das penas de prisão nos jovens que são retirados do meio onde é suposto inserirem-se progressivamente.
Com efeito e reforçadamente no caso dos jovens delinquentes, temos de ter em conta que é necessário evitar a dessocialização do jovem, o qual entrando na prisão fica sujeito a duas tensões de sinal contrário: uma no sentido da intimidação para a adaptação às regras de vida em sociedade; outra de sentido contrário, sendo segregado da sociedade e sujeito às subculturas delinquentes e à aprendizagem de novas técnicas criminosas.[2]
Assim, para privilegiar a ressocialização e evitar a desssocialização do jovem delinquente, foi criado o regime especial para jovens delinquentes com a finalidade de reduzir ao mínimo possível a aplicação da pena de prisão efetiva, como também de reduzir os tempos de cumprimento de pena na cadeia e procurar que o cumprimento da pena de prisão tenha lugar em estabelecimentos ou centros destinados aos jovens ou, até, substituir por meras medidas de correção.
Daí que naturalmente tenha surgido com a sua forte formulação o artigo 4º do Decreto-Lei nº 401/82: «Se for aplicável pena de prisão, deve o juiz atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 73.º e 74.º do Código Penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.».
Esta atenuação especial constitui o regime regra aplicável a todos os arguidos que tenham entre 16 e 21 anos de idade à data da prática dos factos e quando seja aplicável pena de prisão (superior a 2 anos – artigo 5.º do DL 401/82), desde que verificados os pressupostos materiais que condicionam a sua aplicação, ou seja, quando houver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.
Chegando-se à conclusão, no caso concreto, que da atenuação resultam vantagens para a ressocialização do jovem condenado, a sua aplicação é obrigatória[3].
Na maioria dos casos, a conclusão a retirar será, dada a natureza das coisas – da imaturidade da personalidade ainda em desenvolvimento do jovem delinquente e das consequências dessocializadoras, criminógenas e duras da prisão, nessa ‘região mais sombria do aparelho de justiça’, como lhe chama Michel Foucault[4]-, a de que da atenuação resultam vantagens para a ressocialização do jovem condenado, que assim verá a sua pena reduzida e com mais probabilidades de escapar total ou parcialmente às pressões negativas daquele meio.
Terá sido por essa razão, por o normal ser haver sérias razões para crer no natural benefício para o - imaturo e em desenvolvimento - jovem da atenuação especial do artigo 4.° do DL 401/82, de 23-09 que se afirmou no Supremo Tribunal de Justiça, que esta só não deve ser aplicada quando houver sérias razões para crer que tal medida não vai facilitar a ressocialização do jovem delinquente[5].
A aplicação aos jovens do regime da atenuação especial da pena não é excecional, mas antes o regime-regra para os jovens delinquentes, como também referiu o Supremo Tribunal de Justiça:[6] «A aplicação deste regime não constitui, assim, um regime excepcional e uma faculdade do juiz, mas antes o regime penal regra de determinada categoria etária, que se apresenta como um poder-dever vinculado que o juiz deve (tem de) usar sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos; a aplicação é, em tais circunstâncias, tanto obrigatória, como oficiosa.»
Assim, é partindo da análise das circunstâncias concretas caso, da natureza e modo de execução do crime e do que revelam sobre a personalidade do arguido e do seu percurso de vida que se se concluirá ou não pelas vantagens da atenuação especial da pena para a reinserção social do jovem condenado, ou seja, para que no futuro deixe de cometer crimes.
O acórdão recorrido justificou a não aplicação o regime penal especial para jovens no caso concreto, concluindo «Aplicando as considerações supra vertidas, considera-se que o arguido não deverá beneficiar da atenuação especial contida no art. 4º do citado DL. Na verdade, o arguido não quis prestar declarações, não tendo contribuído para o apuramento dos factos (o silêncio não o pode prejudicar, mas também não o beneficia), sendo que, posteriormente, já foi condenado por três crimes idênticos. De tudo isto não redunda um juízo positivo que permita concluir existirem vantagens na atenuação especial da pena no âmbito do regime jurídico para jovens adultos em relação ao arguido, não estando reunidas as condições para que o arguido se consciencialize da necessidade de adotar uma conduta normativa.».
Ou seja, em resumo e lidas as coisas sem eufemismos as duas razões para a não aplicação do regime penal especial para jovem delinquente, com 17 anos de idade à data dos factos, foram:
-Ter-se remetido ao silêncio (não quis prestar declarações, não tendo contribuído para o apuramento dos factos);
- Posteriormente, já foi condenado por três crimes idênticos.
Vejamos, então se estas duas circunstâncias são de natureza a afastar a possibilidade de se fazer um juízo positivo como pretende a decisão recorrida.
Comecemos pela segunda afirmação, a de que o arguido «posteriormente, já foi condenado por três crimes idênticos.» Ora, lendo e relendo os factos provados não vemos em lado algum onde o arguido posteriormente (aos factos dos autos, presume-se) ‘já tenha sido condenado por três crimes idênticos’. O que consta dos factos provados é que o arguido foi condenado por sentença datada de 15/12/2022, transitada em julgado em 27/01/2023, proferida no âmbito do Proc. n.º 561/21.0GAVCD, pela prática, em 03/09/2021, de um crime de roubo, na pena de 12 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos.
Ou seja, o que sucedeu foi que o arguido posteriormente aos factos dos autos foi condenado em pena suspensa pelo cometimento de um crime de roubo cometido em data anterior (23.09.2021) aos factos dos autos – roubo tentado e roubo consumado - que ocorreram um na sequência do outro no mesmo dia (30/07/2022), coisa bem diferente de ter sido condenado posteriormente por três crimes de roubo.
Ora, com este panorama, as circunstâncias relativas ao comportamento anterior aos factos dos autos são muito menos relevantes, no sentido da sua gravidade, do que a ideia que se dá na decisão recorrida, quase a de haver uma sucessão epidémica de episódios criminosos cometidos pelo jovem arguido.
Quanto à outra circunstância, a de o arguido se ter «remetido ao silêncio (não quis prestar declarações, não tendo contribuído para o apuramento dos factos)», haverá de se dizer desde logo que o silêncio não pode ser valorado contra o arguido em sede de determinação da pena, e no caso foi-o de forma implícita ou explícita, mas claramente.
O direito ao silêncio do arguido é ‘sagrado’ no processo penal das nações civilizadas, como a nossa pretende ser, e não o pode prejudicar, dele não se podendo retirar qualquer conclusão ou consequência, designadamente que o arguido ao exercer o seu direito ao silêncio impede que se conclua pela vantagem para a sua ressocialização da atenuação especial do regime penal especial dos jovens delinquentes.
Nada mais errado do que retirar do silêncio e falta de confissão a impossibilidade de se concluir pela vantagem da aplicação do regime dos jovens delinquentes. Seguindo esse caminho, só os jovens delinquentes que confessassem teriam direito à atenuação especial de pena para eles prevista como regime-regra, o que vai manifestamente contra a finalidade deste regime.
Afastado está nas nações civilizadas o tempo em que o arguido estava sujeito ao dever de verdade, sendo até em tempos mais antigos o acusado ‘ajudado’ pelo recurso à tortura de modo a ser obtida uma confissão, pois entendia-se que o valor central da comunidade transcendia os interesses conflituantes no processo e obrigava os participantes a colaborar na descoberta da verdade.
Tal dever de verdade seria insuportável num Estado de Direito Democrático e Social fundado na dignidade da pessoa humana como o nosso - artigo 1º da Constituição - e por isso que a nossa lei fundamental no artigo 32º, n.º 1 estabelece que o processo criminal, assegura todas as garantias de defesa, entre as quais se encontra o direito à não autoincriminação e o correlativo direito ao silêncio, o qual constitui um princípio constitucional não escrito.
Parafraseando o que se referiu no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29.05.2024[7], a propósito de se considerar como agravante da pena a falta de confissão ou arrependimento, diremos que:
I-A ausência de confissão do arguido que se remeteu ao silêncio em sede de audiência é circunstância sem qualquer relevo para a conclusão pela vantagem da atenuação especial do regime penal especial dos jovens delinquentes.
II- Considerar como circunstância impeditiva da aplicação do regime especial para jovens delinquentes a ausência de confissão dos factos, é impor ao arguido um peso que ele não deve suportar.
III - A regra do «ou confessas ou não aplicamos a atenuação de pena do regime especial dos jovens delinquentes» em que acaba por descambar tal consideração da necessidade de confissão é insuportável num Estado de Direito Democrático e Social fundado na dignidade da pessoa humana como o nosso.
IV - É e tem de ser inexigível dos arguidos o cumprimento dum qualquer dever de verdade, de confissão dos factos e/ou de arrependimento, dada a pressão a que estão sujeitos e a ameaça da pena e de estigma que sobre eles recai.
V - Na verdade, essa ideia do ‘dever de confissão’, cujo cumprimento só seria razoavelmente de esperar de um herói moral, de um santo ou do mártir, mais parece tratar-se de uma crença de natureza mística ou religiosa na necessidade de um ato de arrependimento, contrição ou confissão para se concretizar o ‘salvamento social’ da pessoa agente de um crime.
VI - Ora, o todo o direito penal, incluindo o aplicável aos jovens delinquentes, é feito para as pessoas comuns, com as suas forças e fraquezas de todos os dias, não para heróis, santos ou mártires.
Desconsideremos então a falta de confissão, bem como o exagero de crimes erradamente imputados ao arguido na decisão recorrida e vejamos o que se retira dos factos provados quanto à questão do benefício da atenuação especial de pena para a ressocialização do arguido.
É certo que os factos dos autos – um crime de roubo consumado e um crime de roubo tentado cometidos pelo arguido um de seguida ao outro - são graves, violadores de bens jurídicos de natureza pessoal (integridade física e psíquica das vítimas) e patrimonial, o que se reflete nas molduras penais aplicáveis, e revelam uma personalidade em desconformidade com a pressuposta pela ordem jurídica. Acrescendo um outro crime de roubo cometido anteriormente, mas julgado após o cometimento destes factos
Mas, por outro lado, é preciso não esquecer que o arguido tinha apenas 17 anos de idade à data da prática dos factos e não há notícia de antecedentes ou outros factos por si cometidos, além do referido.
Tem apoio familiar. Integra-se numa dinâmica familiar coesa e funcional. Os pais mostram-se apoiantes e preocupados com o percurso dos descendentes, expressando particular apreensão pela situação jurídica do arguido e processo de integração. O grupo doméstico subsiste através dos vencimentos auferidos pelos progenitores, ambos integrados laboralmente. Apresentam rendimentos no valor de cerca de 1860€, com o qual assumem o pagamento das despesas do quotidiano, dos quais destacam o pagamento da renda, no valor de 650€, considerando o pai que a situação económica é restritiva, exigindo rigor na gestão. Este agregado, de origem brasileira, encontra-se a residir em Portugal desde 2019, tendo o processo de adaptação à nova realidade vivencial decorrido com normalidade, à exceção do arguido, que contava anos e que referiu ter sentido muitas dificuldades nesse processo de transição, designadamente a nível escolar, porquanto considera ter registado obstáculos na apreensão da matéria lecionada, que está a tentar ultrapassar. Também ao nível das interações sociais, o arguido refere estar a tentar adaptar-se e a estabelecer amizades, verbalizando não dispor de grupo de pares formal.
O arguido encontra-se inscrito no curso educação e formação para jovens, para obter equivalência ao 3º ciclo, na área administrativa. Em contexto escolar tem registado comportamento ajustado e de respeito para com os professores, alunos e regras escolares, não obstante, desde o início do corrente ano letivo (2024/2025), registar absentismo, que, segundo referiu, se prende com a desmotivação para a frequência letiva, estando a ponderar sobre o seu projeto de vida futuro. Ao fim de semana tem desenvolvido atividade laboral juntamente com o pai, em regime de biscate, no ramo da construção civil, sendo os valores auferidos por si direcionados para os seus gastos pessoais. Apresenta um quotidiano organizado em função da frequência letiva, sendo o tempo livre passado maioritariamente em casa ou com a namorada, mantendo contacto virtual com grupos de amigos, com os quais se dedica à composição de música, que refere ser o seu hobby.
Fazendo o balanço entre a personalidade imatura do arguido, desconforme com a pressuposta pela ordem jurídica face aos factos cometidos – dois crimes de roubo, um consumado com uso efetivo de violência e outro tentado -, algumas dificuldades de integração em Portugal, mas considerando todos os fatores positivos, desde o apoio familiar coeso, o estudo, o trabalho, a namorada, o hobby da música, a imaturidade própria dos 17 anos de idade, tudo junto, afigura-se que desde que seja devidamente apoiado há razões sérias para se formar um juízo favorável no sentido de a atenuação especial da pena ser vantajosa na criação de condições para a ressocialização do arguido, no sentido de no futuro não voltar a praticar crimes.
Assim, entendemos ser de aplicar o regime penal para jovens delinquentes e a atenuação especial de pena nele prevista.
As molduras abstratas para os crimes cometidos pelo arguido, especialmente atenuadas, nos termos dos artigos 4º do Decreto – Lei n.º 401/82, de 23 de setembro e 73º do Código Penal, passam a ser as seguintes:
- crime de roubo - 1 mês a 5 anos e 4 meses de prisão.
- crime de roubo na forma tentada - 1 mês a 3 anos 8 meses e 20 dias.
A ilicitude dos factos, dentro de cada um dos tipos de ilícito cometidos, é elevada, visto o modo de execução, em grupo e no roubo consumado com agressão física, e não esquecendo que o valor do bem apropriado relativamente ao crime de roubo consumado.
A culpa é elevada por força do dolo intenso.
As exigências de prevenção especial são de importância algo elevada. Não obstante, pesa a favor do arguido a sua idade muito jovem (17 anos) e o apoio familiar coeso, a integração escolar e laboral.
As exigências de prevenção geral são elevadas, dada a natureza e o modo como os crimes foram cometidos, suscetíveis de provocar alarme social dado o sentimento de insegurança que a sua notícia causa na generalidade das pessoas.
Tudo considerado afigura-se adequado fixar as seguintes penas:
(1) um ano e oito meses de prisão pelo roubo consumado.
(2) seis meses de prisão pelo roubo tentado.
Para a determinação da pena única aplicável cabe considerar como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (cf. artigo 77º, n.º 2).
A pena única aplicável ao arguido é de 1 ano e 8 meses a 2 anos e 2 meses de prisão.
Apurada a moldura penal do concurso, cabe ao tribunal proceder à determinação, dentro dos limites da mesma, da medida concreta da pena conjunta do concurso, o que se fará em função das exigências gerais de culpa e de prevenção (artigo 71º do Código Penal), bem como, nos termos do artigo 77º, n.º 1, segunda parte do Código Penal, tendo em consideração, em conjunto, os factos e a personalidade do agente (cfr. neste sentido Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, § 420; e Maria João Antunes, Consequências Jurídicas do Crime, Lições, Coimbra 2010-2011, págs. 42-43).
No caso em apreciação é de ter em conta, por um lado, a algo elevada gravidade do conjunto dos factos, um roubo consumado com agressão física e um tentado, cometidos num mesmo espaço de tempo, e por outro a personalidade do arguido, ainda muito jovem, imaturo, bem a tempo de arrepiar caminho e levar uma vida no futuro sem cometer crimes.
Tudo ponderado, afigura-se adequado fixar a pena única em: 1 ano e 10 meses de prisão.
Dada a medida da pena fixada haverá de se ponderar a possibilidade da substituição da pena de prisão.
Considerando o já exposto, designadamente a sua juventude e o apoio familiar, bem como o início de inserção laboral, afigura-se que a pena aplicada ao arguido, embora não deva ser substituída por multa por razões de prevenção, poderá ser suspensa na sua execução pelo período de três anos, ao abrigo do disposto no artigo 50º, por se afigurar que a simples censura do facto e ameaça da sanção, desde que acompanhadas de regime de prova – nos termos do artigo 53º, n.º 3-, realizam de forma adequada as finalidades preventivas presentes no caso.
O regime de prova, a elaborar pela DGRSP nos termos do artigo 494º, n.º 3 do Código de Processo Penal, deverá assentar num plano individual de readaptação com incidência na procura/manutenção de inserção laboral.
Deverá ainda acrescer, nos termos do artigo 51º, n.º1 al. a) do Código Penal, face ao facto de o arguido já ter alguma integração laboral e por se mostrar com interesse para o desenvolvimento e aprofundamento da consciência de responsabilidade do jovem delinquente, a obrigação – nos termos também decididos na decisão recorrida - de pagar aos ofendidos as quantias de €300 (trezentos euros) ao ofendido BB; e de €1.000 (mil euros) ao ofendido CC, no prazo de 1 (um) ano a contar do trânsito em julgado do Acórdão, devendo comprovar tal pagamento nos autos.
Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação do Porto em conceder provimento ao recurso do arguido e, em consequência:
a) Atenuar especialmente as penas por aplicação do disposto nos artigos 4º do Decreto-Lei nº 401/82, de 23 de Setembro e 73º, nº 1, alíneas a), do Código Penal, condenando-se o mesmo pela prática, em coautoria material e concurso efetivo, de um crime de crime de roubo simples na forma tentada, dos artigos 14º, n.º 1, 22º, 23º, 26º, 73º, n.º 1, alíneas a) e b) e n.º 2, 210º, n.º 1, do Código Penal, na pena de seis meses de prisão e de um crime de roubo simples, dos artigos 14º, n.º 1, 26º, 210º, n.º 1, do Código Penal artigo 210.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de um ano e oito meses de prisão, e em cúmulo jurídico na pena única de um ano e dez meses de prisão, suspensa por três anos, com regime de prova, nos termos dos artigos 50º, nº 1 e 53º do mesmo diploma e a obrigação de pagar aos ofendidos as quantias de €300 (trezentos euros) ao ofendido BB; e de €1.000 (mil euros) ao ofendido CC, no prazo de 1 (um) ano a contar do trânsito em julgado da presente decisão, devendo comprovar tal pagamento nos autos.
b) No mais, manter a decisão recorrida.
Notifique.