RESOLUÇÃO DO CONTRATO
CONTAGEM DO PRAZO DE CADUCIDADE DO DIREITO
PERÍODO DE SUSPENSÃO DO CONTRATO
Sumário

I – O prazo de caducidade de 30 dias para o trabalhador resolver o contrato com invocação de justa causa previsto no n.º do artigo 395.º do Código do Trabalho conta-se a partir do momento em que o trabalhador tem conhecimento de todos os factos que lhe permitem ajuizar da dimensão da lesão dos seus direitos e exercer o direito de resolução do contrato.
II – Estando fixado temporalmente por lei o prazo para o exercício de um direito – como é o caso do direito de resolução do contrato de trabalho com invocação de justa causa – a única forma de evitar a caducidade é exercer o direito dentro do prazo correspondente.
III –Durante o período de suspensão do contrato de trabalho, ficando suspensos os direitos, deveres e garantias das partes na medida em que pressuponham a efetiva prestação do trabalho (n.º 1 do artigo 295.º do Código do Trabalho), não se suspende, porém, o prazo de caducidade para invocação, pelo trabalhador, de justa causa para a resolução do contrato de trabalho (n.º 3 do mesmo normativo).

Texto Integral

Recurso de apelação nº 2418/23.1T8MTS.P1

Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo do Trabalho de Matosinhos, Juiz 1

Relatora: Germana Ferreira Lopes
1º Adjunto: Nelson Nunes Fernandes
2ª Adjunta: Teresa Sá Lopes

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I - Relatório

AA, intentou a presente ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra A...-Delegação ....

Invocando justa causa de resolução do contrato de trabalho e créditos referentes a férias, subsídio de férias e proporcionais de férias e de subsídios de férias e de Natal, formulou o seguinte pedido:

“I. “Julgar procedente, por provada, a presente ação e declarada a justa causa de despedimento.

II. Em consequência, ser a R. condenada a pagar à A. a quantia global de €22.674,60 (vinte e dois mil, seiscentos e setenta e quatro euros e sessenta cêntimos), repartida do seguinte modo:

a. €19.094,40 (dezanove mil e noventa e quatro euros e quarenta cêntimos) a título de indemnização, calculada com base em 45 dias, nos termos do disposto no artigo 396º do CT.

b. €795,60 (setecentos e noventa e cinco euros e sessenta cêntimos) respeitante a subsídio de férias não prestado no ano de 2021;

c. €1.591,20 (mil quinhentos e noventa e um euros e vinte cêntimos) referente a férias e subsídio de férias vencidas no dia 1 de janeiro de 2022;

d. €1.193,40 (mil cento e noventa e três euros e quarenta cêntimos) referente a proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal respeitante ao ano do despedimento;

e. Acrescida de juros à taxa legal, vencidos desde a data da citação e vincendos até integral pagamento, e ainda, as custas e procuradoria.”

Após citação e frustrada a conciliação em sede de audiência de partes, apresentou a Ré contestação, invocando a exceção perentória de caducidade do direito de a Autora resolver o contrato por justa causa, e, bem assim, impugnando os fundamentos invocados pela Autora. Peticionou a condenação da Autora como litigante de má fé em multa e indemnização.

Foi dispensada a realização de audiência prévia, fixado o valor da causa em € 22.674,60, proferido despacho saneador tabelar, abstendo-se de proferir o despacho previsto no artigo 596.º do Código de Processo Civil (artigo 49.º, n.º 3, do Código de Processo de Trabalho).

Foi realizada a audiência final de discussão e julgamento.

Foi proferida sentença que conclui com a decisão seguinte (transcrição):

“Em conformidade, julgo a presente ação parcialmente provada e procedente e em consequência condeno a ré a pagar à autora as seguintes quantias:

- € 795,60 a título de subsídio de férias devido em 2021

- € 1591,20 título a férias e subsídio de férias vencidas em 1 de janeiro de 2022;

- €104,64 a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, quantias estas acrescidas de juros de mora à taxa legal para as operações civis devidos desde a citação até efeito e integral pagamento, no mais se absolvendo a ré.

Custas a cargo da autora e ré na proporção do decaimento.

Registe e notifique.”.

A Autora interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem[1]:

«O Tribunal a quo, na opinião da Apelante, mal andou e decidiu, isto porque:

I. Considerou que, desde 06/12/2021, a Apelante tinha conhecimento da posição da Recorrida, ficando “logo com a consciência e em condições de ajuizar os seus efeitos na dinâmica do seu contrato”.

II. Entendeu que não ocorreram factos posteriores àquela data que alterasse a posição da Recorrida.

III. Invocou que a aquando da comunicação da Apelante em 29/06/2022, o seu direito já se encontrava extinto por caducidade.

IV. Andou mal o Tribunal ao considerar que a decisão da Apelante podia ter sido tomada em momento anterior, porquanto, já possuía conhecimento dos factos que integram a justa causa de resolução do contrato.

V. Da análise dos e-mails junto aos autos, bem como da prova produzida em audiência de julgamento, não se afigura verossímil a posição do Tribunal a quo.

VI. Aproximando-se o término da licença parental, a Apelante transmitiu à Recorrida que pretendia gozar a licença de amamentação.

VII. Informou, ainda, que era sua pretensão trabalhar no horário compreendido entre as 9h00-12h00 e as 14h00-17h00.

VIII. No dia 06/12/2021, em resposta ao pedido solicitado pela Apelante, a Recorrida, endereçou-lhe o seguinte e-mail: “Após discussão com a direção da Delegação ..., decidiu-se que o gozo das horas de amamentação, sendo negociadas entre empregador e funcionário devem também ter em conta as necessidades da entidade empregadora. Dada a necessidade de efetiva de mais um funcionário que proceda ao retorno das 17h, entende esta direção que o horário de amamentação deve ser gozado de manhã 1h e 1h no intervalo de almoço. Este horário permite intervalos de 3h de atividade laboral intercaladas por 3h de descanso.”

IX. Entende o Tribunal que os factos integradores da justa causa ocorreram em virtude da posição vertida pela Recorrida na comunicação acima transcrita, a partir da qual dispunha do prazo de 30 dias para resolver o contrato.

X. Sendo o prazo previsto no artigo 395º nº 1 do Código do Trabalho um prazo de caducidade, considerou o Tribunal que os trinta dias de que dispunha a Apelante terminaram no dia 05/01/2022.

XI. Da análise do referido e-mail, a Apelante não concluiu que a decisão da Recorrida era irredutível e definitiva.

XII. Não se trata aqui de analisar o que o douto tribunal retira da letra do referido email, mas sim de compreender se a Apelante teve logo perceção da gravidade da atuação da Recorrida e se ficou logo em condições de ajuizar as implicações de tal atuação no contrato.

XIII. É importante referir que no mesmo dia (06/12/2021), a Apelante informa a Recorrida que não aceita o horário proposto, uma vez que inviabiliza a amamentação da menor.

XIV. Nos dias 7, 9 e 10 a Apelante regressa ao trabalho.

XV. Após essa data, apresenta atestado de incapacidade, ficando até junho de 2022 impedida de exercer a sua atividade profissional.

XVI. No decurso deste período, ou seja, entre dezembro e junho, Apelante e Recorrida trocaram e-mails relativamente ao horário de amamentação, como decorre da sentença.

XVII. Logo, esta temática não se encontrava encerrada.

XVIII. No dia 10/12/2021, já depois da posição assumida pela Recorrida no dia 06/12/2021, a Apelante rececionou um e-mail com o seguinte teor: “Muito agradeço que me informe qual o horário de trabalho que pretendia exercer, para averiguar da sua possibilidade”.

XIX. Ora, da comunicação acima transcrita, constatamos que a posição assumida pela Recorrente no dia 06/12/2021 não era definitiva, caso contrário, reafirmava a posição já tomada, ao invés, de questionar a Apelante sobre o horário pretendido.

XX. No mesmo dia, a Apelante respondeu: “Exmos. Senhores, atento o v. e-mail cumpre-me informar que é minha pretensão exercer o direito de amamentação no horário seguinte das 8h às 9h e das 17h às 18h. A escolha do período designado prende-se unicamente com a idade e as exigências alimentares da menor(...)”.

XXI. No dia 20/12/2021, volvidos 10 dias, a Recorrida respondeu: “O horário de trabalho sugerido não se revela de todo conciliável com os interesses e dinâmica de funcionamento da Delegação ... da A..., não ocorrendo possibilidade de aceitação numa primeira instância, prejudicada, pelo conhecimento dos direitos que tem. Com efeito, numa ótica conciliadora de todos os interesses envolvidos e por forma a compatibilizar, em especial atendendo a concreta situação, sugerimos (sublinhado nosso) o seguinte modelo de horário de trabalho: manhã 09h00-12h00 tarde 15h00-18h00 (...), aguardando-se assim a sua pronúncia”.

XXII. Conforme resulta da análise do e-mail referido anteriormente, a Recorrida sugere um horário e refere expressamente que fica a aguardar que a Apelante se pronuncie.

XXIII. O que uma vez mais comprova que a sua posição não era definitiva.

XXIV. Aproximando-se o termo da incapacidade, e já prevendo o regresso ao trabalho, a Apelante enviou à Recorrida um e-mail, datado de 12/06/22, com o seguinte teor: “Boa tarde, segue em anexo a prorrogação da baixa médica e declaração de amamentação e informar que finda a baixa irei realizar o horário das 9h às 12h e das 14h às 17h por forma a levar a cabo o direito de amamentação”.

XXV. Cumpriu a Apelante o disposto no artigo 48º do CT.

XXVI. Ao e-mail enviado pela Apelante, datado de 12/06/22, a Recorrida não respondeu.

XXVII. No dia 29 de junho, data prevista para o regresso ao trabalho, a Apelante rececionou pelas 03h45, quando já nada o fazia prever (até pela hora), um e-mail enviado pela Recorrida com a rota de transportes a realizar.

XXVIII. Após analisar a comunicação, constatou que lhe foi atribuído o transporte de um doente com início às 17h10.

XXIX. É apenas neste momento que a Apelante tem consciência da gravidade do comportamento da Recorrida e conclui pela impossibilidade da manutenção do contrato.

XXX. Para a Apelante, a efetiva violação do seu direito, ocorreu no dia 29/06/2022.

XXXI. Só nesta data é que a Recorrida assumiu uma postura concreta e definitiva.

XXXII. Apesar da posição vertida nos vários e-mails, esta só se materializou com a elaboração da rota a realizar pela Apelante.

XXXIII. Foi neste momento que a Apelante ficou ciente da irredutibilidade e gravidade da posição da Recorrida, pondo termo ao contrato por justa causa.

XXXIV. “Para o preenchimento valorativo da cláusula geral da resolução pelo trabalhador ínsita no nº 1 do art. 394º do Código do Trabalho, não basta a verificação da materialidade fáctica susceptível de, em abstracto, consubstanciar justa causa de resolução, devendo esta, também, reconduzir-se à impossibilidade/inexigibilidade de o trabalhador manter a relação laboral e ser apreciada nos termos do nº 3 do artigo 351º, preceito que dispõe que «Na apreciação da justa causa, deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e o seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes.» Não basta, pois, a verificação material de qualquer dos comportamentos descritos no nº 2 do preceito, sendo ainda necessário que desse comportamento resultem efeitos suficientemente graves, em si ou nas suas consequências, que tornem inexigível ao trabalhador a continuação da sua actividade em benefício do empregador.”(Acórdão TRP de 04/04/2022, processo nº3191/20.0T8MTS-A.P1).

XXXV. Ocorrendo justa causa de resolução do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador, prescreve o n.º 1 do art.º 395.º do CT que "O trabalhador deve comunicar a resolução do contrato ao empregador, por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos".

XXXVI. Contudo, como refere João Leal Amado, em “Contrato de Trabalho”, Coimbra Editora, 4ª edição, pág. 451 “Suscitam-se, porém, dificuldades de tomo relativamente à determinação do dies a quo de tal prazo, isto é, do exacto momento a partir do qual tal prazo começará a correr, dada a multiplicidade e a heterogeneidade das condutas patronais susceptíveis de integrarem a referida justa causa de demissão.

XXXVII. “Com efeito, este prazo de caducidade poderá funcionar, sem dificuldades de maior, para as infracções de tipo instantâneo (...), caso em que a resolução deverá ser comunicada ao empregador no referido prazo de 30 dias. Há porém muitos casos de violações contratuais continuadas, as quais exprimem um incumprimento patronal que, por vezes, a passagem do tempo só torna ainda mais grave (…)”

XXXVIII. Como refere a este propósito Pedro Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, 4ª edição, pág. 579, «A contagem do prazo de 30 dias inicia-se com o conhecimento dos factos que integram a justa causa de resolução invocada pelo trabalhador. A interpretação-aplicação desta regra tem de se fazer em articulação com a própria noção de justa causa, como tem sido salientado pelos tribunais. Significa isto que o prazo «se inicia, não no momento do conhecimento da pura materialidade dos factos, mas sim quando no contexto da relação laboral assumem tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna imediatamente impossível, não sendo exigível ao trabalhador a manutenção daquela relação». Em suma, o prazo em causa conta-se a partir do momento em que os comportamentos do empregador assumem uma gravidade tal, que tornam impossível a manutenção da relação laboral.”

XXXIX. Conforme resulta do Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 21/10/2021, processo Nº2284/20.9T8BRG-A-G1, “Nas situações em que o trabalhador não tiver logo a exacta percepção das implicações/consequências do acto instantâneo do empregador, designadamente por estar convencido de que se trata de uma situação temporária, é de entender que o prazo de caducidade se inicia apenas quando no contexto da relação laboral o trabalhador fique ciente da sua efectiva gravidade e a mesma seja de molde a tornar inexigível a partir de então a manutenção da relação. Tem de avaliar-se o caso concreto de forma a poder aferir-se se o trabalhador, quando tomou conhecimento dos factos que invoca como fundamento da justa causa, ficou logo em condições de ajuizar das implicações de tal acto no âmbito do seu contrato.”

XL. No mesmo sentido se tem pronunciado o STJ, designadamente no Ac. do STJ de 19.11.2014, Processo nº 72/05.1TTLSB.L2.S1, "(...)o prazo em causa conta-se a partir do momento em que o trabalhador tem conhecimento de todos os factos que lhe permitam ajuizar da dimensão da lesão dos seus direitos e exercer o direito de resolução do contrato.”

XLI. “Se o trabalhador não ficou em condições de avaliar as consequências para o cumprimento do contrato do facto constitutivo da justa causa para a sua resolução, ainda que instantâneo o prazo de caducidade para o exercício desse direito inicia-se não no momento do conhecimento da materialidade do facto. Antes, quando, segundo a cognoscibilidade do trabalhador e no contexto da relação laboral, esse facto assuma tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna a partir da então imediatamente impossível.” (Tribunal da Relação de Guimarães no Acórdão de 23/05/2019, processo 960/17.2T8BRGAG1).

XLII. Mal decidiu o Tribunal à quo quando concluiu que, no dia 06/12/2021, a Apelante ficou, de imediato, com a exata consciência dos factos, estando logo em condições de ajuizar os seus efeitos na dinâmica do seu contrato, considerando extinto o seu direito por caducidade.

XLIII. O douto Tribunal desconsiderou os factos ocorridos após aquela data, nomeadamente, a factualidade do dia 29/06/2022.

XLIV. Em face do exposto, deve ser revogada a decisão que considerou sem justa causa a resolução do contrato de trabalho operada pela autora, em virtude de, na data da comunicação de 29/06/2022, estar já extinto por caducidade o direito à invocação daqueles fundamentos, substituindo-a por outra que atente ao peticionado pela Apelante.».

Terminou, dizendo que deverá ser dado provimento ao recurso, revogada a sentença recorrida, com a declaração da justa causa de resolução do contrato operada pela Autora e a condenação da Ré a pagar à Autora o montante de € 19.094,40 a título de indemnização.

A Ré não apresentou resposta ao recurso da Autora.


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Foi proferido despacho pelo Tribunal a quo a admitir o recurso, a subir imediatamente, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer (artigo 87º, nº 3, do Código de Processo do Trabalho), no sentido de o recurso não merecer provimento.

A Apelante respondeu ao dito parecer, reiterando a posição assumida no recurso apresentado.

Procedeu-se a exame preliminar, foram colhidos os vistos e o processo foi submetido à conferência.

Cumpre apreciar e decidir.


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II – Questões a decidir

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação apresentada, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, que não tenham sido apreciadas com trânsito em julgado e das que se não encontrem prejudicadas pela solução dada a outras [artigos 635.º, n.º 4, 637.º n.º 2, 1ª parte, 639.º, n.ºs 1 e 2, 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil[2], aplicáveis por força do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho[3]].

Não pode igualmente este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objeto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de prévias decisões judiciais (destinam-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação).

Assim, a questão a decidir consiste em saber se a sentença recorrida errou na aplicação do direito no que respeita à questão da caducidade do direito à resolução do contrato com invocada justa causa.


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III – Fundamentação

1) Em termos fácticos

O recurso apresentado não coloca em crise a sentença recorrida no que respeita à decisão da matéria de facto, não sendo apresentada impugnação da matéria de facto provada e não provada, sendo ainda certo que não se justifica qualquer intervenção oficiosa a este nível.

Os factos considerados provados na primeira instância são os seguintes (transcrição):

“A) A autora foi admitida ao serviço da ré, em 1 de novembro de 2008 para, sob as suas ordens e instruções, desempenhar as funções inerentes à categoria profissional de socorrista.

B) A atividade desenvolvida pela autora era prestada de segunda a sexta-feira, no horário compreendido entre as 08h00 e as 18h00.

C) Como contrapartida do seu trabalho, a autora auferia a retribuição mensal de €795,60.

D) No dia 25 de março de 2021 a autora foi mãe.

E) A autora gozou licença parental.

F) Quando regressou ao trabalho e com o propósito de respeitar os horários de alimentação da filha, a autora solicitou a prestação da sua atividade no período entre as 09 horas e as 17.00 horas passando a entrar uma hora mais tarde e a sair uma hora mais cedo.

G) No dia 7/12 está registado que a autora trabalhou das 9.00h. às 12.59h. e das 14.53h. às 18.00 h, no dia 9/12 a autora tem um registo de trabalho das 9.55 h. às 13.03 h. e das 14.55h às 18.05 h e no dia 10/12 das 9.45 h. às 13.03 h. e das 14.42 h. às 18.11 horas.

H) A ré em 6/12/2021 às 20.27 escreveu à autora o seguinte email

I) A este email respondeu a autora também por email datado de 6/12.2021 e onde refere:


J) Este email obteve a resposta da ré através de email em 10/12/2021 e onde refere

L) A autora respondeu em 10/12/2021 às 18.13 h. e onde refere

M) A ré respondeu em 20/12/2021 às 11.44 h.

N) A autora esteve de baixa médica pelo menos desde 17 de janeiro de 2022.

O) Durante os períodos de ausência da autora a sua substituição foi efetuada por outros trabalhadores da ré ou voluntários.

P) Em 02.05.2022 às 16.52 h a autora enviou um email à ré onde refere além do mais que “ finda a baixa irei realizar o horário das 9 h às 12 horas e das 14h as 17 horas por forma a levar a cabo o direito de amamentação”

Q) A 08.05.2022[4] às 23.03 horas a ré respondeu à autora “ (…) Lamentavelmente, e como certamente do vosso conhecimento, o horário de trabalho sugerido por V. Ex.ª não se revela de todo conciliável com os interesses e dinâmica de funcionamento da Cruz Vermelha, não ocorrendo possibilidade de aceitação numa primeira instância, prejudicada, pelo conhecimento dos direitos que tem. O seu horário compelia à contratação de um trabalhador das 17 h às 18 h

Assim, propomos o seguinte horário, que protege os interesses das partes, a saber: 9h.00 - 12h00 e 15h00-18h00.

Assim e porque o horário apresentado não é lesivo desses interesses, tão nobres como o da amamentação, permitindo respeitar, no período da tarde o intervalo máximo de 4 horas de amamentação. (…)

R) Em 12 de junho de 2022 às 16.01 a autora envia novo email à ré onde refere “(…) Segue em anexo, a prorrogação da baixa médica e declaração de amamentação e informar que finda a baixa irei realizar o horário das 9 h as 12 h e das 14 h as 17 horas por forma a levar a cabo o direito de amamentação (…).

S) Com o horário proposto pela entidade empregadora das 9.00 h. às 12.00 h. e das 15.00 h às 18.00 horas a autora não conseguia cumprir o horário de amamentação que entendia adequado ao desenvolvimento da menor.

T) No dia 29.06.2022 pelas 3.45 horas a autora receciona um email referente à rota de transportes de serviço a efetuar no dia 29.06.2022 constando do mesmo o transporte de um doente às 17.10 horas.

U) Em face deste email e porque foi destacada para efetuar um transporte de doente às 17. 10 e uma vez mais confrontada com a não aceitação por parte da ré de executar o horário por si proposto a autora decide por termo ao seu contrato de trabalho.

V) Tendo enviado à ré uma carta que foi por esta rececionada, datada de 29.06.2022 e onde sob o assunto “Resolução do Contrato de Trabalho Com Justa Causa” a autora refere:

X) A esta carta enviada pela autora datada de 29.06.2023 respondeu a ré a

Z) A autora não auferiu o subsídio de ferias em 2021.

AA) A autora não gozou as férias vencidas em 01.01.2022 nem recebeu o subsídio de férias.

BB) A autora não recebeu os proporcionais de ferias e subsídio de férias e subsidio de natal no ano da cessação do contrato.”

Quanto aos factos não provados, consta da sentença recorrida o seguinte:

“Não se provaram outros factos com relevo para a descoberta da verdade que estejam em contradição com os dados como provados sendo designadamente factos não provados que:

- ré tivesse ordenado à autora que ficasse sentada sem trabalhar no período por si designado para a amamentação;

- alguns superiores ao serviço da ré criassem um ambiente hostil empregando palavras pouco amistosas quando se dirigiam à autora;

- situação que afetou o foro psicológico da autora deixando-a ansiosa para o trabalho e que após consulta médica fosse prescrita incapacidade temporária para o trabalho;

- estivesse previsto o regresso da autora a 29.06.2022;

- a autora não tenha comprovado (e após os primeiros 12 meses) a amamentação através de declaração médica.”


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2) Aplicação de direito/Conhecimento

Da questão da caducidade do direito de resolução do contrato com invocação de justa causa

A factualidade a atender para o conhecimento do direito do caso é aquela que foi fixada pelo Tribunal recorrido.

A Recorrente discorda do decidido em 1.ª instância ao ter considerado extinto o direito de resolução por caducidade, com a argumentação que fez plasmar nas conclusões já transcritas. Sustenta, em síntese, que a posição da Ré não era definitiva quanto à temática do horário de amamentação e que para si a efetiva violação do seu direito ocorreu no dia 29-06-2022, sendo que só nessa data é que a Recorrida assumiu uma postura concreta e definitiva e apenas após analisar a comunicação rececionada nessa data a Recorrente teve consciência da gravidade do comportamento da Recorrida.

Por sua vez, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, referindo que a argumentação da Recorrente não pode subsistir em confronto com a criteriosa fundamentação expendida na sentença recorrida.

Consta da sentença recorrida em sede de fundamentação de direito o seguinte:

«Como decorre do art.º 212 n.º 1 do Código de Trabalho (CT) é ao empregador que compete definir o horário de trabalho do trabalhador, dentro dos limites da lei, (…)

Por sua vez, o artigo 47.º do CT sob a epigrafe “Dispensa para amamentação ou aleitação -, dispõe:

“1 - A mãe que amamenta o filho tem direito a dispensa de trabalho para o efeito, durante o tempo que durar a amamentação.

(…)

3 - A dispensa diária para amamentação ou aleitação é gozada em dois períodos distintos, com a duração máxima de uma hora cada, salvo se outro regime for acordado com o empregador.

(…)”

E estatui o artigo 48.º do CT quanto ao procedimento de dispensa para amamentação ou aleitação que para “ o efeito de dispensa para amamentação, a trabalhadora comunica ao empregador, com a antecedência de 10 dias relativamente ao início da dispensa, que amamenta o filho, devendo apresentar atestado médico se a dispensa se prolongar para além do primeiro ano de vida do filho.”.

Em face da factualidade dada como provada dúvidas inexistem quanto à ausência de acordo entre as partes relativamente ao horário em que a autora pretendia exercer o seu direito de alimentação.

Como refere Catarina Carvalho in A protecção da Paternidade e da Maternidade no novo Código do Trabalho, RDES, 2004, ano XLV, pág. 41 e sgs., na falta de acordo entre entidade patronal e trabalhadora parece que não poderá, de modo algum, ser o empregador a fixar estes períodos de acordo com as conveniências da empresa e citado também por Júlio Vieira Gomes, in Dt.º do Trabalho, Vol. I, pág. 447 “(…) a alimentação da criança não pode secundarizar-se em função dos interesses empresariais”.

Daqui decorre que o horário de trabalho estabelecido pelo empregador há-de respeitar as necessidades de amamentação do lactante sofrendo as compressões que se imponham.

E esses períodos terão que respeitar as necessidades de amamentação da criança, sob pena de se frustrar a finalidade para que essas dispensas são concedidas.

No caso em apreço verifica-se que o horário estabelecido pela entidade empregadora - apesar de se abranger dois períodos distintos - não coincide com o proposto pela autora no período da tarde, porquanto a autora pretendia gozar o período das 17 horas às 18 horas e a ré pretendia que fosse das 14 horas às 15 horas.

Assim na ausência de acordo entre as partes, a autora que tinha direito à dispensa diária de dois períodos distintos, cada um deles com a duração máxima de 1 hora poderia gozá-lo das 17.00 horas às 18.00 h.

Com efeito e não obstante a divergência se reportar apenas a um dos períodos não podemos deixar de salientar o nosso entendimento que o empregador, ao estabelecer o horário de trabalho de uma mãe que amamenta o mesmo tem ser fixado, tendo em conta as necessidades de amamentação relegando, assim, para segundo plano, eventuais interesses da empresa no cumprimento de horários por si fixados.

Concluiu-se, assim que, em situações como a presente, em que não foi possível acertar os interesses de ambas as partes, os interesses do lactente devem sobrepor-se aos interesses da ré.

Resulta do disposto no art. 394.º do CT que o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato (com justa causa, sem necessidade de aviso prévio) nos casos aí previstos.

A resolução (com justa causa) do contrato de trabalho pelo trabalhador tem que observar o formalismo/procedimento previsto no art. 395.º do CT, que tem o seguinte teor:

Artigo 395.º

Procedimento para resolução de contrato pelo trabalhador

1 - O trabalhador deve comunicar a resolução do contrato ao empregador, por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos.

(…)

Da exigência a que se alude no disposto no n.º 1 do citado art. 395.º da comunicação da resolução do contrato de trabalho pelo trabalhador ao empregador, por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, resulta − conforme referido no Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 20-11-2017 (Processo n.º 10948/14.0T8PRT.P1), disponível na íntegra em http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf − que «(…) a resolução do contrato de trabalho, por parte do trabalhador, com invocação de justa causa, está dependente da observância por este de um requisito formal, sob pena de a resolução ser ilícita. Tal requisito tem natureza ad substantiam, delimitando, o seu conteúdo, a invocabilidade, em juízo, dos factos suscetíveis de serem apreciados para tais efeitos.

Ou seja, a resolução operada pelo trabalhador só se mostrará licita se observar os requisitos de natureza procedimental previstos no artº 395º, nº 1 do Código do Trabalho, dela dependendo a atendibilidade dos factos invocados pelo trabalhador para justificar a cessação imediata do contrato. (…).

Acrescenta-se, ainda que, apenas a factualidade que integra o conteúdo escrito da comunicação enviada pelo trabalhador à entidade empregadora poderá ser equacionada na alegada fundamentação de justa causa.

No caso concreto, apenas são atendíveis os factos na comunicação datada de 29 de junho de 2022 e que contendem com o horário atribuído à autora,

A questão que se coloca agora é a de saber se ocorreu (ou não) a caducidade do direito da autora.

Defende a autora que foi a posição da ré no dia 29 de junho de 2022 - comunicando-lhe a existência de um transporte às 17.10 horas - que esteve na base da sua resolução do contrato de trabalho.

Por seu turno refere a ré que os factos integradores da justa causa de resolução ocorreram no dia 06.12.2021 pelo que o prazo de 30 dias de que dispunha a autora terminou a 05.01.2022.

No que a esta questão concerne apraz-nos referir que prazo previsto no apontado artigo 395º, n.º 1 do Cód. de Trab. - que é um prazo de caducidade- não se interrompe por força de eventual suspensão do contrato de trabalho, designadamente por baixa por doença do trabalhador, pois durante o período de suspensão mantêm-se os direitos, deveres e garantias das partes que não pressuponham a efetiva prestação de trabalho. (neste sentido ver Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 25.02.2013, Processo n.º 203/11.2.TTBCL.P1) nem mesmo em caso de licença parental atento o estatuído no art 65 n.º1, al. c) do CT que refere que “ não determinam a perda de qualquer direitos, salvo quanto à retribuição e são consideradas como prestação efetiva do trabalho as ausências por licença parental.

Daqui decorre que prazo de caducidade não se interrompeu for força da suspensão do contrato de trabalho, nomeadamente devido às baixas apresentadas pela autor a partir de 17 de janeiro mantendo-se o direito desta de resolver o contrato com a invocação da justa causa.

Decorre do contexto factológico apurado que através do email de 06.12 a ré assumiu já a posição de não permitir à autora que gozasse o segundo período de amamentação a partir das 17.00 horas.

Vejamos, agora, o que se nos oferece dizer relativamente a contagem do prazo de 30 dias relacionando-se tal questão com a caraterização dos factos.

Como se refere no Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 17-11-2014 (Processo n.º739/12.8TTMTS..P1), disponível na íntegra em http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf − “a contagem do prazo de 30 dias inicia-se com o “conhecimento” pelo trabalhador dos factos que integram a justa causa de resolução invocada, conhecimento este que, em princípio, coincide com a data por ele alegada para a sua verificação, atendo o estreito envolvimento pessoal das partes no contrato de trabalho e o facto de, por definição (cfr. o artigo 394.º, n.ºs 2 e 3), o facto que integra a justa causa se reflectir de imediato na pessoa do trabalhador, envolvido no devir de um contrato que é executado diariamente, com excepção dos períodos de fins de semana, feriados e férias. Este necessário nexo cronológico entre a decisão de resolver o contrato e os factos invocados mais não constitui do que “uma manifestação do princípio da actualidade da justa causa que traduz a regra de que a resolução se deve seguir imediatamente à verificação da situação de impossibilidade, até em consonância com a finalidade do direito de resolução – evitar situações insustentáveis”[…].

Seja como for, a interpretação desta regra “tem de se fazer em articulação com a própria noção de justa causa”[…], o que se nos afigura determinar que, consoante o tipo de factos invocados em fundamento da justa causa, se devam adoptar diferentes perspectivas na fixação do dies a quo para a contagem do prazo que a mesma prevê.

Com a fixação de um prazo de caducidade, o legislador parte do princípio de que, se depois de tomar conhecimento dos factos que fundamentam a resolução, o trabalhador não reagiu por mais de 30 dias, é de supor que o acto do empregador não impossibilitou a prossecução da relação, não havendo por isso justa causa para a resolução.

Assim, tratando-se de factos instantâneos, em que a conduta é uma só, realizada ou executada em dado momento, factos estes que se esgotam com o respectivo acto concretizador, aquele prazo inicia-se no momento do conhecimento da materialidade dos factos.

Já no caso de o comportamento ilícito do empregador ser continuado (p. ex. no caso de violação do direito de ocupação efectiva), o prazo de caducidade só se inicia quando for praticado o último acto de violação do contrato (o conhecimento da situação ilícita renova-se permanentemente enquanto ela se mantiver), ao invés do que ocorre com os factos instantâneos que se esgotam com o respectivo acto concretizador, embora os seus efeitos possam protrair-se no tempo (p. ex. em determinados casos de baixa de categoria profissional ou de redução da retribuição)[…].

Mas nestas últimas hipóteses, assentes em factos instantâneos, mas com efeitos duradouros susceptíveis de agravamento com o decurso do tempo, tem-se entendido que aquele prazo se inicia, não no momento do conhecimento da materialidade dos factos, mas quando assumem tal gravidade no contexto da relação laboral que a subsistência do contrato de trabalho se torna imediatamente impossível[…]. Assim, se o trabalhador não tiver logo a exacta percepção das implicações do acto instantâneo do empregador (p. ex. por estar o trabalhador convicto de que se trata de uma situação temporária), deve entender-se que o prazo se inicia, não no momento inicial do conhecimento da pura materialidade dos factos mas, sim, quando no contexto da relação laboral o trabalhador fique ciente da sua efectiva gravidade e a mesma seja de molde tornar inexigível a partir de então a manutenção da relação. Deve pois nestas hipóteses fazer-se um juízo perante cada caso concreto no sentido de aferir se o trabalhador, quando conheceu os factos que invoca em fundamento da justa causa, ficou logo em condições de ajuizar das implicações de tal acto no devir do contrato.”

É precisamente na fixação do momento a partir do qual se torna inexigível para a autora a manutenção da relação laboral que reside a especificidade do caso dos autos.

Constituirá, então, o momento relevante para o “conhecimento” do trabalhador dos factos que integram a justa causa de resolução o envio do email de 29 de junho.

Entendemos que não como se passará a explicitar.

Desde a comunicação de 06.12 que a autora tem conhecimento da posição da ré, posição esta que em momento algum altera para além de negar sistematicamente à autora a sua pretensão de gozar a licença de amamentação no período da tarde a própria autora alega que em 29 de junho é confrontada uma vez mais com a posição da ré – cfr. art. 28º da p.i..

Ainda que se possa aceitar que que tal factualidade que decorre no período de possa ser qualificada de factos instantâneos com efeitos para o futuro, o certo é que nada permite concluir que após o seu conhecimento – logo em 6.12- a autora não tenha ficado de imediato com a exata consciência do que tais factos poderiam representar e de que não haveria reversão da situação ficando logo com a consciência e em condições de ajuizar os seus efeitos na dinâmica do seu contrato.

Não é alegado qualquer conhecimento posterior à ocorrência dos factos reiterando-se que a posição da ré se manteve sendo certo que a manifestação também sistemática pela autora de querer gozar determinado horário não tem o efeito de interromper a caducidade.

Assim a decisão que a autora toma em 29.06 podia ter sido tomada em momento anterior – porquanto possuía já conhecimento dos factos e tendo estado de baixa desde 17 de janeiro não se verifica que aquela dependesse de qualquer ponderação com base na efetiva prestação de trabalho.

E, assim sendo considera-se que na data da comunicação estava já extinto por caducidade o direito à invocação daqueles fundamentos, pelo que se considera sem justa causa a resolução do contrato de trabalho operada pela autora, consequente ficará prejudicada a apreciação do pedido de indemnização formulado com fundamento na resolução com justa causa do contrato de trabalho.».

Em consequência o Tribunal a quo absolveu a Ré dos pedidos formulados no que respeita à declaração de justa causa da resolução e à condenação da Ré no pagamento à Autora da quantia de € 19.094,40 a título de indemnização pela resolução do contrato.

Ponderando a transcrita fundamentação, tendo por base a factualidade provada e o quadro normativo aplicável, diremos, desde já adiantando a solução que, sempre ressalvando o devido respeito por posição divergente, consideramos não assistir razão à Recorrente na sua pretensão de ver alterado o julgado, concordando-se com o sentido decisório da sentença recorrida quanto à questão em análise.

Explicitemos, então, as razões deste nosso entendimento.

Está em causa o prazo previsto no n.º 1 do artigo 395.º, do Código do Trabalho de 2009[5], que prescreve que o trabalhador deve comunicar a resolução do contrato ao empregador, por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos.

Constitui entendimento pacífico que se trata de um prazo de caducidade[6], ainda que não de conhecimento oficioso.

A contagem do prazo de caducidade inicia-se com o conhecimento pelo trabalhador dos factos que integram a justa causa de resolução invocada pelo trabalhador.

Sobre este conspecto, por ser extremamente elucidativo, passaremos a transcrever o que se escreveu no Acórdão desta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto de 20-05-2024 (identificado na nota de rodapé 6, relatado pelo Desembargador Nelson Fernandes, aqui 1.º Adjunto).

Assim, expõe-se no citado Acórdão, que aqui se acompanha, o seguinte (transcrição, sem o teor das notas de rodapé):

«(…) tratando-se de um prazo de caducidade [16], atento o que resulta do n.º 2 do artigo 298,º do Código Civil (CC)[17], pode desde logo entender-se que deve contar-se a partir do momento do “conhecimento dos factos”, ou seja, independentemente do momento em que o titular do direito, depois de ter tomado conhecimento efetivo dos factos, toma consciência da respetiva gravidade – enquanto prazo de caducidade, determinado por razões objetivas de segurança jurídica, sem que o mesmo possa ser suspenso[18][19], iniciar-se-á, como resulta da norma citada, com o conhecimento dos factos –, admitindo-se, porém, como aliás o temos dito em outros Arestos, que esse conhecimento se possa referir, nomeadamente nas hipóteses assentes em situações de efeitos duradouros suscetíveis de agravamento com o decurso do tempo, não ao conhecimento da materialidade dos factos propriamente dita e sim, noutros termos, quando, no contexto da relação laboral, assumem tal gravidade que tornem imediatamente impossível a subsistência do contrato de trabalho, situação esta, porém, que diz respeito a efeitos na relação laboral e não porventura na saúde do trabalhador.

A respeito do referido prazo escreve João Leal Amado[20]: “Com efeito, este prazo de caducidade poderá funcionar, sem dificuldades de maior, para as infracções de tipo instantâneo (aplicação de uma sanção abusiva ou ofensa à integridade física do trabalhador, p.ex.), caso em que a resolução deverá ser comunicada ao empregador no referido prazo de 30 dias. Há, porém, muitos casos de violações contratuais continuadas, as quais exprimem um incumprimento patronal que, por vezes, a passagem do tempo só tornam ainda mais grave – pense-se p.ex., na falta de condições de segurança e saúde no trabalho, na violação de garantias do trabalhador (como seja a garantia de ocupação efectiva), na falta de pagamento da retribuição (caso em que, à medida que o período de mora patronal se avoluma, é óbvio que a situação contratual tende a degradar-se do ponto de vista do trabalhador, podendo mesmo tornar-se insustentável). Neste tipo de casos, dir-se-ia, enquanto persistir a violação, enquanto se mantiver o incumprimento patronal, não poderá correr o prazo de caducidade da faculdade de o trabalhador resolver, com justa causa, o respectivo contrato. Contudo, em matéria de falta de pagamento da retribuição, o CT esclarece agora que, nas hipóteses contempladas no n.º5 do art.394.º (falta de pagamento que se prolongue por período de 60 dias, ou em que o empregador declare a previsão de não pagamento até ao termo desses 60 dias) «o prazo para resolução conta-se a partir do termo do período de 60 dias ou da declaração do empregador» (n.º 2 do art.395.º). Ou seja, nestes casos parece que o trabalhador terá de resolver o contrato algures entre o 61.º e o 90.º dia de mora patronal, sob pena de esta faculdade de resolução caducar.”

Também Pedro Furtado Martins[21], a esse respeito, refere o seguinte: “A resolução tem de ser comunicada ao empregador nos 30 dias subsequentes ao cumprimento do ao conhecimento pelo trabalhador dos factos que a justificam (art.395.º, n.º 1) ou, tratando-se de resolução fundada no incumprimento culposo da obrigação retributiva, nos 60 dias subsequentes (art.395. n.º 2). A contagem do prazo de 30 dias inicia-se com o conhecimento dos factos que integram a justa causa de resolução invocada pelo trabalhador. A interpretação-aplicação desta regra tem de se fazer em articulação com a própria noção de justa causa, como tem sido salientado pelos tribunais. Significa isto que o prazo «se inicia, não no momento do conhecimento da pura materialidade dos factos, mas sim quando no contexto da relação laboral assumem tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna imediatamente impossível, não sendo exigível ao trabalhador a manutenção daquela relação. O ponto tem especial relevância nas situações em que os factos que integram a justa causa de resolução revestem caráter duradouro, susceptíveis de agravamento com o decurso do tempo. É o que tipicamente sucede com a falta de pagamento da retribuição, para a qual existe a regra especial do artigo 395º, n.º 2. Aí se esclarece que o prazo para a resolução se começa a contar quando se completa o período de 60 dias de atraso no pagamento da retribuição. Trata-se de uma explicação de uma regra geral: residindo a justa causa na situação de impossibilidade de manutenção do vínculo contratual, o prazo para exercer o direito de resolução inicia-se quando ocorrer essa situação.”

Ainda a propósito do prazo de caducidade previsto no n.º 1 do artigo 395.º do Código do Trabalho, resulta do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19/11/2014[22] que esse “conta-se a partir do momento em que o trabalhador tem conhecimento de todos os factos que lhe permitam ajuizar da dimensão da lesão dos seus direitos e exercer o direito de resolução do contrato”.

Escreve-se, por sua vez, no Acórdão da Relação de Guimarães de 13 de outubro de 2022[23], que “na análise da caducidade do direito de resolver o contrato pelo trabalhador que invoca justa causa tem de se distinguir as infrações continuadas das instantâneas”, sendo que, não suscitando dúvidas quanto às últimas o momento em que se iniciará a contagem do prazo, “o mesmo não acontece com os factos continuados, que se repetem e se perpetuam no tempo, que se vão somando uns aos outros, que se vão avolumando e que, por isso, somente em certo momento adquirem um peso tal que impulsionam o trabalhador a rescindir o contrato” – “No caso das violações continuadas que vão degradando a relação laboral, a passagem do tempo só as torna mais graves. Pode-se dizer que só no momento em que se tornam insustentáveis é que o prazo se inicia”.».

Com pertinência para o caso, importa também ter presente o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14-09-2011[7], no qual (estando alegada uma situação de retirada de funções que a trabalhadora havia desempenhado até abril de 2006) se escreveu que carece de fundamento legal o entendimento de que só após a cessação desse comportamento – que se traduziria naquele caso na atribuição à autora do conteúdo funcional que lhe havia sido retirado - é que se iniciaria o cômputo do prazo de trinta dias previsto no nº 1 do artigo 395º (no Acórdão refere-se o n.º 1 do artigo 442.º, mas o entendimento é transponível para o normativo correspondente do CT de 2009), “solução que não tem na letra da lei um mínimo de correspondência verbal e que, portanto, não pode ser considerada pelo intérprete (artigo 9º, nº 2, do Código Civil), acrescendo que, a partir desse momento, já nem subsistiria o comportamento ilícito fundamentador da resolução”. Esta linha jurisprudencial foi reafirmada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-11-2014[8].

Do mesmo passo, haverá que ter também presente o que se escreve no Acórdão desta Secção Social de 16-12-2015[9] e que se mostra sintetizado no respetivo sumário:

“I – O trabalhador dispõe do prazo de 30 dias para resolver o contrato, prazo este de caducidade e que se inicia com o conhecimento dos respetivos factos por parte daquele – n.º 1 do artigo 395.º, do C.T. Estes factos podem não se esgotar num só comportamento (numa só conduta executada num dado momento) mas constituírem violações continuadas ou podem, ainda, configurar factos instantâneos com efeitos duradouros. No entanto, estando o A. em condições de ajuizar a dimensão da lesão dos seus direitos e exercer o seu direito de resolução do contrato, deve fazê-lo nos 30 dias subsequente ao seu conhecimento.

II – Só assim não será quando resulte da matéria de facto apurada que o trabalhador apenas ficou ciente da efetiva gravidade dos factos e da sua implicação na relação laboral em data posterior à do conhecimento dos factos, só então, podendo, decidir pela manutenção ou não do contrato de trabalho, ou seja, quando a decisão de pôr fim ao contrato tenha dependido de posterior ponderação por parte do trabalhador com base na efetiva prestação de trabalho.

(…)”.

Por outro lado, inexistem dúvidas de que a suspensão do contrato de trabalho – nomeadamente devido a doença do trabalhador que se prolongue por mais de um mês (artigo 296.º do Código do Trabalho) – não tem efeitos no decurso do prazo de caducidade[10]. Ou seja, o prazo de caducidade não se interrompe por força da suspensão do contrato de trabalho, mantendo-se o direito do trabalhador à resolução do contrato com invocação de justa causa (cfr. artigo 295.º, nº 3, do Código do Trabalho, do qual decorre que “a suspensão não tem efeitos no decurso do prazo de caducidade, nem obsta a que qualquer das partes faça cessar o contrato nos termos gerais”).

Por outro lado, ainda, importa também deixar expresso que a comunicação por escrito, com indicação dos factos que justificam a resolução do contrato de trabalho, prevista no n.º 1 do artigo 395.º do CT/2009, delimita a invocabilidade em juízo dos factos suscetíveis de serem apreciados para efeito de aferir da resolução do contrato de trabalho com justa causa, como resulta do n.º 3 do artigo 398.º do mesmo diploma.

Revertendo ao caso dos autos, lendo a carta de resolução, datada de 29-06-2022, verifica-se que a Autora invoca para resolver o contrato a violação do seu direito de dispensa para amamentação, dizendo que apesar de cumpridos os formalismos legais pela trabalhadora, “a entidade patronal tem desrespeitado o seu direito, negando-se a atribuir o horário pretendido”. Aí se refere ainda que, prevendo-se o regresso ao trabalho, no dia 29-06-2022, foi-lhe remetida a rota de transporte referente ao serviço a efetuar no dito dia 29-06-2022, e que, confrontada com o horário dos serviços a efetuar, “viu novamente violado o seu direito de dispensa para amamentação”.

Resulta dos factos provados que: o horário da Autora estava compreendido entre as 8 horas e as 18 horas; no dia 25-03-2021, a Autora foi mãe; a Autora gozou licença parental e, quando regressou ao trabalho e com o propósito de respeitar os horários de alimentação da filha, a Autora solicitou a prestação de trabalho no período entre as 9 horas e as 17 horas, passando a entrar uma hora mais tarde e sair uma hora mais cedo; por email de 6-12-2021 a Ré comunicou à Autora que após discussão com a Direcção, “decidiu-se que o gozo das horas de amamentação, sendo negociadas entre empregador e funcionário devem também ter em conta as necessidades da entidade empregadora. Dada a necessidade de efetiva de mais um funcionário que proceda ao retorno das 17 h, entende esta direção que o horário de amamentação deve ser gozado de manhã 1h e 1 h no intervalo de almoço. Este horário permite intervalos de 3 h de atividade laboral intercaladas por 3 de descanso”; a Autora respondeu a este email no mesmo dia 6-12-21, manifestando a não aceitação do horário indicado, referindo que o mesmo inviabilizava a amamentação da filha, apelando ao entendimento da CITE, no sentido de que cabe à mãe definir o período de amamentação na ausência de acordo com a entidade patronal e referindo que na impossibilidade de gozo do horário pretendido agiria em conformidade junto daquela entidade; a Ré respondeu a este email da Autora em 10-12-2021 nos seguintes termos “muito agradeço que me informe qual o horário de trabalho que pretende exercer, para averiguar da sua possibilidade”; ao que a Autora respondeu na mesma data a informar ser sua pretensão “exercer o direito de amamentação no horário seguinte das 8 h às 9 h e das 17 h às 18h”, aduzindo que “a escolha do período designado prende-se unicamente com idade e as exigências alimentares da menor” e apelando à cooperação e compreensão da Ré no respeito pelo direito da menor; a esta comunicação da Autora respondeu a Ré em 20-12-2021 dizendo que o horário de trabalho indicado pela Autora não se revelava de todo conciliável com os interesses e dinâmica de funcionamento da Ré e que não havia possibilidade de aceitação do mesmo, propondo um horário de trabalho manhã 9h-12h tarde 15h-18h; a Autora esteve de baixa médica pelo menos desde 17-01-2022; em 2-05-2022, a Autora enviou um email à Ré onde referia além do mais que “finda a baixa irei realizar o horário das 9h às 12 horas e das 14h às 17 horas por forma a levar a cabo o direito a amamentação”; a 8-05-2022 a Ré respondeu à Autora, reafirmando a posição de não aceitação do horário indicado no que se reporta ao segundo período de amamentação a partir das 17 horas e a proposta do horário das 9h-12h e 15h-18h; em 12-06-2022, a Autora envia novo email onde refere que seguia em anexo a prorrogação da baixa médica e a declaração de amamentação e informava “finda a baixa irei realizar o horário das 9h às 12 horas e das 14h às 17 horas por forma a levar a cabo o direito a amamentação; com o horário proposto pela entidade empregadora das 9h às 12 h e das 15h às 18 horas a Autora não conseguia cumprir o horário de amamentação que entendia adequado ao desenvolvimento da menor; no dia 29-06-2022 a Autora receciona um email referente à rota de transportes de serviço a efetuar no dia 29-06-2022 constando do mesmo o transporte de um doente às 17.10 horas.

Por sua vez, não ficou provado que estivesse previsto o regresso da Autora a 29-06-2022.

Concorda-se inteiramente com a decisão recorrida quando conclui que o momento relevante para “o conhecimento” da trabalhadora dos factos que integram a justa causa de resolução incocada não se reconduz ao envio do email de 29-06-2022.

Doutro passo, é verdade que no email de 6-12-2021 a Ré assumiu a posição de não permitir à Autora que gozasse o segundo período de amamentação a partir das 17 horas. No entanto, perante a resposta da Autora dessa mesma data, a Ré por email de 10-12-2021 solicitou à Autora que informasse qual o horário de trabalho que pretendia exercer para averiguar da sua possibilidade.

Nesta consonância, considera-se que o momento relevante para o “conhecimento” em referência é, sim, o da resposta dada pela Ré à Autora na comunicação de 20-12-2021.

Nessa comunicação - efetuada já depois de a Autora ter invocado o entendimento da CITE em situações de falta de acordo com a entidade patronal no sentido de caber à mãe definir o período de amamentação e de anunciar que na impossibilidade de gozo do horário pretendido iria agir em conformidade junto da entidade competente pela fiscalização, e, bem assim, de a Autora ter respondido à comunicação de 10-12-2021 voltando a reiterar a sua pretensão de exercer o direito de amamentação no horário das 8 h às 9h e das 17h às 18 h -, a Ré informa a Autora que não aceita o horário de trabalho pretendido pela mesma - dizendo que o mesmo não é de todo conciliável com os interesses e dinâmica de funcionamento da delegação da Ré por colocar em crise a execução desse período de funcionamento definido e “a adensar a situação está o facto de se não poder abrir precedente para as florescentes situações análogas” - e propõe o horário de trabalho das 9h-12h e das 15h-18h. Ou seja, ficou claro nesta comunicação a posição da Ré de não aceitar o horário pretendido pela Autora para o gozo da dispensa diária para amamentação, mais precisamente no que respeita ao segundo período dessa pretendida dispensa entre as 17h e as 18h.

Com essa resposta de 20-12-2021 a posição da Ré ficou, assim, definida no sentido de não permitir à Autora que gozasse o segundo período de amamentação no horário pretendido pela Autora a partir das 17 horas.

Assim, pelo menos desde essa comunicação de 20-12-2021 que a Autora tem conhecimento dessa posição definida pela Ré (depois de esta ter remetido o email de 10-12-2021), posição essa que em momento algum altera.

Atente-se que, no email de resposta de 8-05-2022, a Ré limita-se a replicar a posição que já havia definido e assumido anteriormente. Tanto assim, que no email de 2-05-2022 a Autora não faz qualquer solicitação à Ré no sentido de esclarecer/definir a sua posição quanto à solicitada dispensa do trabalho para amamentação, limitando-se a comunicar à Ré que finda a baixa iria realizar o horário que havia comunicado pretender – das 9h às 12h e das 14h às 17h – por forma a levar a cabo o direito a amamentação. E, depois do email da Ré de 8-05-2022, a Autora no email de 12-06-2022, em que envia a prorrogação da baixa médica, limita-se também a reiterar que finda a baixa iria realizar o horário das 9h às 12h e das 14h às 17h por forma a levar a cabo o direito a amamentação. A própria Autora na carta de resolução refere que a Ré “tem desrespeitado o seu direito a dispensa de trabalho para amamentação, negando-se a atribuir o horário pretendido”, sendo certo que na petição inicial alega mesmo que em 29-06-2022 é confrontada uma vez mais com a posição da Ré (uma vez mais, a Autora foi confrontada com a não aceitação por parte da Ré de executar o horário pretendido – artigo 36º da p.i.).

No caso concreto, quer do teor da carta de resolução, quer dos factos considerados provados, nada permite concluir que após o seu conhecimento da referida posição da Ré – pelo menos em 21-12-2021 -, a Autora “não tenha ficado de imediato com a exata consciência do que tais factos poderiam representar e de que não haveria reversão da situação, ficando logo com a consciência e em condições de ajuizar os seus efeitos na dinâmica do contrato” (sic decisão recorrida). Reitere-se que, como evidenciado pelo Tribunal a quo, a posição da Ré se manteve, sendo certo que a manifestação também sistemática pela Autora de querer gozar determinado horário não tem qualquer efeito interruptivo da caducidade. O email de 29-06-2022 nada de novo acrescenta à posição já anteriormente assumida pela Ré, para além de que nem sequer resultou provado que estivesse previsto o regresso da Autora ao trabalho a 29-06-2022. Tenha-se presente a situação de baixa em que a Recorrente se manteve, durante um período considerável de tempo, sem que, aliás, antes de ter enviado a carta de resolução, tenha sequer retomado a prestação do trabalho. Nessa medida, pelo menos com a comunicação da Ré de 20-12-2021, a Autora teve conhecimento dos factos que lhe permitiam ajuizar da dimensão da lesão dos seus direitos, sendo que entrou em situação de baixa médica desde 17-01-2022 e assim permaneceu, sem que tivesse retomado o trabalho.

Nada permite, pois, assentar a conclusão de que a Autora apenas ficou consciente da gravidade dos factos e da sua implicação na relação laboral em data posterior à do conhecimento dos factos – ou seja, da posição da Ré de não aceitação do pretendido gozo do segundo período de dispensa do trabalho para amamentação entre as 17h e as 18h -, sendo certo que tendo a Autora estado de baixa desde 17-01-2022 não se verifica que a decisão de pôr termo ao contrato dependesse de qualquer ponderação com base na efetiva prestação do trabalho.

Em conclusão, porque, pelo menos desde 20-12-2021 e a data em que foi remetida a carta a comunicar a resolução do contrato de trabalho com justa causa, em 29-06-2022, decorreram mais de 30 dias, concluímos que não merece censura a decisão de julgar procedente a exceção de caducidade.

Improcede, pois, sem necessidade de considerações mais desenvolvidas, toda a argumentação da Recorrente, e, consequentemente, improcede o recurso.

As custas do recurso ficam a cargo da Recorrente (artigo 527.º do CPC).


*

IV – DECISÃO:

Em face do exposto, acordam os Juízes Desembargadores da Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em julgar o recurso improcedente, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do CPC, anexa-se o sumário do presente acórdão, da responsabilidade da relatora.

Notifique e registe.


*
(texto processado e revisto pela relatora, assinado eletronicamente)
Porto, 7 de abril de 2025
Germana Ferreira Lopes
Nelson Fernandes
Teresa Sá Lopes
________________
[1] Consigna-se que em todas as transcrições será respeitado o original, com a salvaguarda da correção de lapsos materiais evidentes e de sublinhados/realces que não serão mantidos.
[2] Adiante CPC.
[3] Adiante CPT.
[4] Consigna-se que foi corrigido o lapso material manifesto constante da sentença recorrida, na qual neste ponto se referia o ano de 2023, mas como decorre inquivocamento do quadro factual apurado e documento respeitante à comunicação em causa, o que se pretendia escrever era efetivamente o ano de 2022.
[5] Adiante CT/2009.
[6] Está em causa um prazo para o exercício de um direito (artigo 298.º, n.º 2, do Código Civil).
Cfr., na jurisprudência, entre muitos outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 17-11-2016 (processo n.º 861/13.3TTVIS.C1.S2, Relatora Conselheira Ana Luísa Geraldes) e o Acórdão desta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto de 20-05-2024 (processo n.º 3321/22.8T8MTS.P1, relatado pelo aqui 1º Adjunto Desembargador Nelson Fernandes e com intervenção como Adjunta da aqui 2ª Adjunta Desembargadora Teresa Sá Lopes) - disponíveis na base de dados da dgsi, acessível por internet in www.dgsi.pt – local onde se encontram acessíveis os demais Acórdãos infra a referenciar, desde que o sejam sem menção expressa em sentido adverso.
[7] Processo n.º 296/07.7TTFIG.C1.S1, Relator Conselheiro Pinto Hespanhol.
[8] Processo n.º 72/05.1TTLSB.L2.S1, Relator Conselheiro Mário Belo Morgado.
[9] Processo n.º 45/14.3TTVFR.P1, Relatora Desembargadora Paula Maria Roberto.
[10] Cfr. Acórdãos desta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto de 4-03-2013 (processo n.º 259/11.8TTOAZ.P1, relatado pela hoje Juíza Conselheira Paula Leal de Carvalho), de 25-02-2013, processo nº 203/11.2TTBCL.P1, Relatora Desembargadora Paula Maria Roberto) e o já citado de 20-05-2024.