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AÇÃO ESPECIAL DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL DA REGULARIDADE E LICITUDE DO DESPEDIMENTO ARTICULADO MOTIVADOR DO DESPEDIMENTO
INEPTIDÃO
Sumário
I – Com a instituição da nova acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, após a revisão do CPT/2009, passou a competir ao empregador, pese embora, ser a parte contra quem é instaurada a acção, o ónus de alegar e provar os factos que estiveram subjacentes ao despedimento e defesa da sua validade, apresentando o articulado motivador do despedimento a que se refere o art. 98º-J do CPT. II – Nesta acção, dando o trabalhador o impulso processual à impugnação do despedimento, através da apresentação de formulário electrónico, conforme o disposto no art. 98º-D, o empregador passa a assumir processualmente uma posição muito semelhante à de um autor, já que lhe compete, a ele, apresentar, junto do tribunal, um articulado que motive o despedimento, para o que oferecerá todas as provas, sendo depois o trabalhador notificado para responder, querendo. III – Assim, o articulado motivador assume, sem dúvida, a natureza de uma petição inicial, onde o empregador deverá motivar o despedimento, apresentar as provas respectivas e formular o correspondente pedido, designadamente a validade do procedimento disciplinar e a licitude do despedimento. IV - Tendo a Ré/empregadora no requerimento apresentado, como seu articulado motivador do despedimento, apenas, dado como reproduzido o procedimento disciplinar, sem que tivesse alegado qualquer facto, susceptível de prova, que permita concluir pela licitude do despedimento é de considerar inepto tal articulado, cfr. art.s 186º, nº 2, al. a) e 552º, nº 1, als. d) e e) do CPC. V - Havendo falta de indicação de causa de pedir, no “pretenso” articulado motivador, não há que formular convite ao seu aperfeiçoamento, o mesmo, apenas se justificará, no caso, daquele articulado ser insuficiente ou deficiente.
Texto Integral
Processo: 3683/24.2T8MAI-A.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho da Maia - Juiz 1
Recorrente: A..., Lda.
Recorrido: AA
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto
I – RELATÓRIO
Vem o presente recurso, em separado, interposto por A..., Lda., com sede na avenida ..., ... ..., na acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, Proc. nº 3683/24.2T8MAI, intentada por AA, residente na rua ..., ... Santo Tirso, contra aquela, através da apresentação de requerimento no formulário próprio a que se referem os art.s 98º-C e 98º-D do CPT, (Código de Processo do Trabalho – diploma a que pertencerão os demais artigos a seguir citados sem outra indicação) opondo-se à sanção de despedimento que lhe foi aplicada por aquela, sua Entidade Empregadora, requerendo que seja declarada a ilicitude ou a irregularidade daquele.
Designada e realizada a audiência de partes, como decorre da acta de 23.08.2024, dada a ausência da Ré/empregadora, foi determinada a sua notificação “para no prazo de 15 dias, apresentar articulado para motivar o despedimento, bem como, juntar o procedimento disciplinar, apresentar o rol de testemunhas e requerer quaisquer outras provas – artigo 98.º-I, n.º 4, alínea a) do Código de Processo do Trabalho, sob a cominação estatuída no artigo 98.º-J, n.º 3, do mesmo diploma legal, caso não o faça”.
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Veio, então, a empregadora, em 09.09.2024, juntar aos autos o seguinte requerimento: “notificada para o efeito, vem pelo presente requerer a junção aos Autos de:
1. Cópia do processo disciplinar, sendo que os originais se encontram na posse do trabalhador;
2. Prova testemunhal, a notificar:
(…)
3. Explicação dos motivos para o despedimento, o que faz nos seguintes termos e fundamentos:
Sem prejuízo do exposto no procedimento disciplinar, para o qual se remete, sempre cumprirá dizer que o despedimento do trabalhador AA foi motivado nos termos do artigo 351.º, n.º2, alínea g) do Código de trabalho, pelas faltas injustificadas no total de superior a 5 seguidas, a par de violação dos deveres propugnados no artigo 128.º do Código de Trabalho, bem como a retirada indevida, por parte do trabalhador, de elementos concernentes à atividade da entidade patronal, mormente das chaves do edifico, código do alarme, telemóvel da entidade patronal e lista de clientes contidos numa pasta de documentos, fulcrais para o desempenho da sua atividade, em violação não só das regras de conduta, como da cláusula sétima do seu contrato de trabalho.
O trabalhador fê-lo consciente de que tal não tinha sido autorizado pela entidade empregadora, que não tinha legitimidade para tal e que as informações contidas em tal pasta, a par do telemóvel com contactos de clientes, chaves e códigos de alarme, se revelavam do mais essencial para o cabal desempenho da atividade prosseguida pela entidade patronal, e que a privação dos mesmos, ou o revelar de conteúdo a terceiros, traria consequências patrimoniais imensuráveis, o que veio a ocorrer.
O trabalhador sabia que sobre ele impendia a obrigação de comparecer ao trabalho, de forma pontual e assídua, o que não fez, bem sabendo também que a sua ausência deveria ser informada e justificada o mais brevemente possível, o que só veio a fazer decorridos quase 20 dias da data de primeira ausência.
Perante tais factos, atenta gravidade dos factos praticados pelo trabalhador e a quebra de confiança existente entre as partes, tendo a entidade patronal, efetivamente, interrompido a atividade/setor pelo qual o trabalhador era o único responsável, sendo o único ciente dos códigos de acesso e do funcionamento do programa computorizado essencial a tal atividade de rent-a-car, comportando tal transtornos nas mais diversas áreas, tornou-se insustentável a manutenção do vínculo laboral que unia entidade empregadora e trabalhador, pelo que foi movido o competente procedimento disciplinar com vista à aplicação de despedimento por justa causa, cumprindo as formalidades legalmente exigidas para tanto, como se comprova pelos documentos juntos em anexo.
4. Provas a apresentar, mormente prova documental, para o qual se solicita prazo adicional, nunca inferior a 10 dias para o efeito.”.
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Notificado, o A. veio contestar, por excepção e impugnação e deduzir reconvenção, nos termos do articulado junto, em 23.09.2024.
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A Ré, veio responder à contestação/reconvenção do Autor, nos termos do articulado, junto em 07.10.2024, terminando que deve:
“- Ser considerado improcedente a exceção de caducidade invocada pelo Autor;
- Sem considerada improcedente a ineptidão invocada pelo Autor;
- Ser considerado improcedente, por não provado e não devido, o peticionado a título reconvencional, nomeadamente a quantia de 11.005,33, referente ao peticionado de 60 a 62,
- Ser considerado improcedente por não devido o peticionado a título de danos morais, de 64 a 67 na contestação/reconvenção.
- Ser considerado improcedente a peticionada condenação da Ré, absolvendo-se a mesma, no pagamento das retribuições que o Autor deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento.
Absolvendo-se, como tal, a Ré do peticionado pelo Autor, declarando-se a licitude e regularidade do despedimento.”.
*
De seguida, o A. veio apresentar requerimento, onde diz: “1- dispõe o n.º 4 do Art.º 98-L do CPT que “Se o trabalhador tiver deduzido reconvenção, nos termos do número anterior, pode o empregador responder à respetiva matéria no prazo de 15 dias.”.
2- Ora, salvo outro entendimento, a R. só pode responder à matéria da Reconvenção e da má-fé.
3- Ou seja, aos artigos 7 a 12 e 59 a 68 da Contestação.
4- Pelo que devem ser considerados como não escritos os artigos 1 a 7 e 9 a 30 da Resposta, o que se requer.”.
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Em 12.11.2024, a Mª Juíza “a quo” proferiu o seguinte despacho:
«Notifique a Ré para apresentar articulado de motivação do despedimento aperfeiçoado cumprindo a definição de articulado estatuída no artigo 147.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, no prazo de 10 dias.
Caso a Ré aceda ao convite do Tribunal, o Autor disporá de igual prazo para o exercício do contraditório.
Notifique.».
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De seguida, em 26.11.2024, a Ré juntou aos autos requerimento com o seguinte teor: “notificada para o efeito, vem pelo presente remeter explicação dos motivos para o despedimento, o que faz nos seguintes termos e fundamentos:
1. Sem prejuízo do exposto no procedimento disciplinar, para o qual se remete e dá como integralmente reproduzido, sempre cumprirá dizer que o despedimento do trabalhador AA foi motivado nos termos do artigo 351.º, n.º2, alínea g) do Código de trabalho, pelas faltas injustificadas no total de superior a 5 seguidas, a par de violação dos deveres propugnados no artigo 128.º do Código de Trabalho, bem como a retirada indevida, por parte do trabalhador, de elementos concernentes à atividade da entidade patronal, mormente das chaves do edifico, código do alarme, telemóvel da entidade patronal e lista de clientes contidos numa pasta de documentos, fulcrais para o desempenho da sua atividade, em violação não só das regras de conduta, como da cláusula sétima do seu contrato de trabalho.
2. O trabalhador fê-lo consciente de que tal não tinha sido autorizado pela entidade empregadora, que não tinha legitimidade para tal e que as informações contidas em tal pasta, a par do telemóvel com contactos de clientes, chaves e códigos de alarme, se revelavam do mais essencial para o cabal desempenho da atividade prosseguida pela entidade patronal, e que a privação dos mesmos, ou o revelar de conteúdo a terceiros, traria consequências patrimoniais imensuráveis, o que veio a ocorrer.
3. O trabalhador sabia que sobre ele impendia a obrigação de comparecer ao trabalho, de forma pontual e assídua, o que não fez, bem sabendo também que a sua ausência deveria ser informada e justificada o mais brevemente possível, o que só veio a fazer decorridos quase 20 dias da data de primeira ausência.
4. Perante tais factos, atenta gravidade dos factos praticados pelo trabalhador e a quebra de confiança existente entre as partes, tendo a entidade patronal, efetivamente, interrompido a atividade/setor pelo qual o trabalhador era o único responsável, sendo o único ciente dos códigos de acesso e do funcionamento do programa computorizado essencial a tal atividade de rent-a-car, comportando tal transtornos nas mais diversas áreas, tornou-se insustentável a manutenção do vínculo laboral que unia entidade empregadora e trabalhador, pelo que foi movido o competente procedimento disciplinar com vista à aplicação de despedimento por justa causa, cumprindo as formalidades legalmente exigidas para tanto, como se comprova pelos documentos juntos em anexo.
E.D.”.
*
Após, em 27.12.2024, a Mª Juíza “a quo”, proferiu sentença que terminou com a seguinte DECISÃO: «Por todo o exposto, decide o Tribunal: - declarar a ilicitude do despedimento do Autor; - condenar a Ré a pagar ao Autor a indemnização substitutiva da reintegração, correspondente ao montante de três salários base do Autor; - condenar a Ré a pagar ao Autor as retribuições que este deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado desta decisão que declara a ilicitude do despedimento, deduzindo-se: a) as importâncias que o Autor aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento; b) a retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da ação, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento; c) o subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado desta decisão, devendo a Ré entregar essa quantia à Segurança Social. Custas a cargo da Ré nos termos do artigo 527.º do Código de Processo Civil. Notifique e registe.».
*
Inconformada com esta decisão, a Ré apresentou recurso, nos termos das alegações juntas, em 15.01.2025, que finalizou com as seguintes “CONCLUSÕES:
i. Veio o presente recurso interposto da sentença proferida em 30-12-2024.
ii. A recorrente não pode conformar-se com a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, na medida em que declarou a ilicitude do despedimento do Autor, por, alegadamente, não ter sido apresentado articulado nos termos do artigo 98.º-J.
iii. Condenando, neste seguimento, “a Ré a pagar ao Autor a indemnização substitutiva da reintegração, correspondente ao montante de três salários base do Autor;” e “condenar a Ré a pagar ao Autor as retribuições que este deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado desta decisão que declara a ilicitude do despedimento”
iv. Entende-se que a sentença, face ao decurso processual, factos e elementos carreados, funda-se em premissas incorretas, julgando, consequentemente, de forma errada a matéria de facto e fazendo errada aplicação do direito, pelo que a bem da justiça terá de ser revogada.
v. O processo decorreu os seus trâmites legais para uma ação deste tipo, procedendo-se, uma vez frustrada a conciliação, à notificação da Ré para juntar o articulado de motivação de despedimento e o procedimento disciplinar, o que a mesma fez.
vi. Após notificação de tal contestou o Autor e deduziu reconvenção.
vii. Tendo sido a Ré notificada para aperfeiçoamento do articulado de motivação do despedimento, considerou o Douto Tribunal a quo que a mesma não o fez, equiparando-o à falta de junção do dito articulado, com os efeitos previstos no artigo 98.º-J, n.º3 do Código de Trabalho, declarando, como tal, a ilicitude do despedimento.
viii. Decisão com a qual não pode a Ré, ora recorrente, concordar.
ix. caso o Douto Tribunal a quo considerasse que não fora cumprido com o estatuído cumprimento de aperfeiçoamento, ao abrigo das regras de cooperação e economia processual, sempre deveria ter proferido novo despacho a este motivo, com indicação das partes que pretendia ver esclarecidas e com as cominações legais do seu não cumprimento.
x. Ao aplicar com essa interpretação o Art.º 98º-J, n.º 3 do CPT, o tribunal a quo está a violar o disposto no Art.º 20º, n.º 1 e n.º 4 da Constituição da República sobre o acesso à justiça e ao direito, sancionado a recorrente de forma desproporcional e não equitativa, em conformidade com o Art.º 18º da CRP.
xi. Considerando que o articulado de motivação de despedimento não foi junto, sem mais!
xii. Quando sempre poderia considerar que foi feito de maneira deficitária, mas do qual sempre se conseguiu extrair o seu conteúdo,
xiii. Como, aliás, o fez o Autor, ao ter respondido ao mesmo através da contestação e inclusive deduzido reconvenção!
xiv. A apelante entendeu que a retranscrição dos mais de 50 factos constantes na nota de culpa, os quais também fazem parte do Relatório Final e da Decisão do processo disciplinar, ao Tribunal, constituía uma formalidade desnecessária e possivelmente protelatória.
xv. em nenhum momento se ignorou a obrigatoriedade do Tribunal de tomar conhecimento integral dos factos, uma vez que todos os documentos e peças processuais estavam consolidados em um único arquivo digital.
xvi. a apelante cumpriu com o disposto no artigo 522.º do CPC.
xvii. os factos encontravam-se plasmados no procedimento disciplinar e para aí foram remetidos, como aliás, consta da própria Douta sentença.
xviii. remeteram os factos dados como provados para Documento junto, por uma simples questão de adequação formal.
xix. poderemos chamar a este Articulado do Empregador, um Articulado “deficiente”, mas não inexistente.
xx. Em última instância, pode-se apenas afirmar que existe uma descrição dos factos constitutivos por remissão.
xxi. No entanto, em nenhum momento se pode sustentar que o Autor não tenha compreendido os factos de que era acusado ou que estes não sejam evidentes
xxii. O Autor conseguiu atingir quais os factos em causa e exercer plenamente o seu contraditório, como se compreende pela contestação com reconvenção por si apresentada.
xxiii. Os documentos juntos com a petição devem considerar-se parte integrante desta e por isso suscetíveis de suprir as lacunas de que a petição possa enfermar.
xxiv. Analisando o articulado apresentado pela Ré, a conclusão que se impõe é que o articulado do empregador é claro e suficientemente compreensível para que qualquer pessoa, colocada na posição do real destinatário, consiga entender.
xxv. Ocorre a sanação do vício de ineptidão da petição inicial consistente na falta ou ininteligibilidade da causa de pedir desde que o réu, não obstante arguir o vício, conteste e se verifique que interpretou corretamente o pensamento do autor expresso na petição, valorando-se, para o efeito, a aceitação implícita do autor dessa interpretação decorrente do teor da réplica.
xxvi. O Tribunal a quo não entendeu nesses termos, antes tendo aplicado a cominação e decisão foi francamente mais gravosa e comporta uma gritante injustiça com a qual não poderão V.Exas. compadecer.
xxvii. Não se pode adotar uma abordagem excessivamente rígida quanto à tramitação processual estabelecida para a ação especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, uma vez que existem situações que demandam a superação das dificuldades interpretativas, recorrendo, se necessário, à adequação formal prevista no artigo 547.º do CPC
xxviii. A factualidade exposta na sentença é claramente conclusiva, não sendo possível identificar, até porque nada foi indicado a esse respeito, qual a base factual que levou o tribunal a quo a concluir que seria insuficiente para descortinar quais os factos in casu e quais deveria considerar como provados e não provados.
xxix. Até porque estes encontram-se suficientemente balizados, indicados e comprovados no procedimento disciplinar.
xxx. Consideramos que o Tribunal baseou a sua decisão em um alegado 'requerimento' que a apelante nunca apresentou, ignorando por inteiro o articulado que fundamentou o despedimento, bem como o respetivo procedimento disciplinar, e que foi corretamente juntado aos autos.
xxxi. Impunha-se que o tribunal a quo, antes de decidir sobre a verificação ou não da existência dos factos e da motivação de despedimento, obtivesse informações complementares, debruçando-se sobre os elementos juntos ao processo, mormente a nota de culpa, contestação e decisão de despedimento.
xxxii. Faltam elementos necessários à decisão sobre a verificação ou não da possibilidade de obter os factos por outra forma, para o qual foi remetida.
xxxiii. Esta situação comporta uma manifesta deficiência, ou mesmo total ausência, de fundamentação de facto, o que sempre implicaria, neste segmento, a necessidade de anulação da decisão proferida, cf. o artigo 662º, nº 2, alínea c), do CPC.
xxxiv. Neste ponto, entendemos que não se deve manter a decisão relativa à ineptidão do articulado do empregador, uma vez que existe um conjunto de factos controvertidos no articulado apresentado pela Ré, ora apelante, que foram devidamente interpretados pelo Autor no exercício do contraditório, tanto por exceção quanto por impugnação.
xxxv. Assim, é imprescindível que os autos sigam o seu curso normal, sem prejuízo de um convite à parte para corrigir eventuais deficiências apontadas pelo Tribunal a quo, reafirmando a primazia da decisão de mérito sobre questões de natureza formal.
xxxvi. Também por esta via, não poderá o despacho recorrido ser mantido, o que implica, consequentemente, a revogação do despacho e ser o recurso admitido.
xxxvii. O despacho proferido pelo Tribunal a quo violou as disposições legais dos artigos 18.º, 20º da Constituição da República Portuguesa, artigo 9º e 236º do Código Civil, e artigos 6º, n.º 1 e 2, 186º, n.º 1, 2, al a) e 3, e 590º, n.º 2, 3 e 4 do Código de Processo Civil.
xxxviii. Deve ser concedido provimento ao presente recurso, considerando-o totalmente procedente e, como consequência, revogar a decisão proferida, substituindo-a por outra em que se reconheça não verificada a ineptidão do articulado do empregador nem a ilicitude do despedimento, determinando-se o prosseguimento da causa.
xxxix. Caso necessário, deverá ser feito um convite à Ré, ora apelante, para aperfeiçoar a matéria de facto inicialmente alegada
Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Ex.ª certamente suprirá, sempre deverá ser dado provimento ao presente Recurso, e, em consequência:
a) Deverá o Tribunal a quo revogar a decisão proferida, substituindo-a por outra em que se reconheça não verificada a ineptidão do articulado do empregador nem a ilicitude do despedimento, determinando-se o prosseguimento da causa
b) E como consequência aceitar as alegações de recurso apresentadas;
Fazendo-se, desta forma, a costumada JUSTIÇA!.”.
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O A. não apresentou contra-alegações.
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A Mª Juíza “a quo” admitiu a apelação, a subir em separado, fixou o valor da acção em € 2.000,00, ordenou a instrução do apenso e a sua subida a este Tribunal.
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Já, neste apenso, o Ministério Público emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso, na consideração de que, “não merece reparo ou censura a douta sentença em recurso, que, em nossa opinião, deverá ser mantida.
Evitando desnecessárias repetições a ela se adere, e às razões de facto e de direito que determinaram a sua procedência.”.
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Cumpridos os vistos legais, há que apreciar e decidir.
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É sabido que, salvas as matérias de conhecimento oficioso, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito a este Tribunal “ad quem” conhecer de matérias nelas não incluídas (cfr. art.s 635º, nº 4, 639º, nº 1 e 608º nº 2, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável “ex vi” do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10).
Assim, as questões suscitadas consistem em saber, se deverá revogar-se a decisão recorrida e substituí-la por outra em que se reconheça não verificada a ineptidão do articulado da empregadora nem a ilicitude do despedimento, determinando-se o prosseguimento da causa ou, se devia o Tribunal “a quo” ter proferido despacho de convite para corrigir eventuais deficiências daquele, como defende a recorrente.
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II - FUNDAMENTAÇÃO
Os factos a considerar para apreciação da questão, são os que decorrem do relatório que antecede e que se encontram devidamente demonstrados nos autos, reproduzindo-se, ainda pelo seu interesse para o conhecimento do recurso, o seguinte da decisão recorrida: «Cumpre decidir.
Dispõe o artigo 98.º-G, n.º 1, alínea a) do Código de Processo do Trabalho que “1 – Se o empregador não comparecer na audiência de partes, nem se fizer representar nos termos do n.º 2 do artigo anterior, nem justificar a sua falta nos 10 dias subsequentes à data marcada para a audiência, tendo sido ou devendo considerar-se regularmente citado, o juiz: a) Ordena a notificação do empregador para, no prazo de 15 dias, apresentar articulado para motivar o despedimento, juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, apresentar o rol de testemunhas e requerer quaisquer outras provas”.
Dispõe, o artigo 98.º-J, n.º 1 do Código de Processo do Trabalho que “O empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador”.
Com a leitura destas duas normas se conclui que o empregador tem o ónus de juntar o procedimento disciplinar e, apresentar articulado de motivação do despedimento alegando os factos que sustentam o despedimento, sem contudo, invocar factos que não estejam descritos na decisão do procedimento disciplinar – factos estes que naturalmente constituem a causa de pedir.
No caso dos autos a empregadora não alega factos, apenas tece as suas considerações e conclusões relativamente ao despedimento, sem ser da forma articulada.
Com efeito, quem não alega factos não tem necessidade de os articular tal como exige o artigo 147.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
Decidiu o Tribunal da Relação de Guimarães no Acórdão de 20/09/2018, com o n.º de processo 57/18.8T8BCL.G1, relatado pelo Venerando Juiz Desembargador Eduardo Azevedo, disponível para consulta in www.gde.mj.pt/jtrg que “1 - Da alegação da causa de pedir, deve poder-se extrair a relação jurídica e a pretensão em conformidade. 2 – No articulado motivador do empregador se se procede a simples remissão para o acervo documental que se junta respeitante ao procedimento disciplinar sem a formulação de qualquer factualidade constitutiva do direito ao decretamento da sanção disciplinar como causa então deve-se concluir que existe falta de indicação da causa de pedir.3 – Para o efeito não há lugar ao convite de aperfeiçoamento”.
Explica-se no corpo deste Aresto “Não se enquadrando completamente na estrutura e conceptualização do direito à ação dos nossos regimes adjetivos tem de se admitir por analogia. E ainda que a sua natureza partilhe a sua razão de ser com o requerimento em formulário previsto no artº 98.º-C mas que este tem por função apenas desencadear o processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento e de permitir o encadeamento de ação declarativa de simples apreciação (art.º 10.º do CPC) a que corresponde a possibilidade do empregador apresentar esse articulado. Mal ou bem assim foi desenhada este processo especial sem se olvidar que apresentado o articulado segue-se a denominada contestação (art.º 98.-ºL do CPT) com consequências legais idênticas à da sua congénere do processo comum (revelia, reconvenção, resposta, entre outras) e, na mesma linha, prosseguem os termos posteriores aos articulados (art.º 98.º-M do CPT). (…) Segundo a dita equiparação do articulado em causa com a petição inicial decidiu-se que o destes autos padecia de ineptidão por omissão da causa de pedir. Foi transcrito no relatório os termos desse articulado. Para além da relação laboral estabelecida constata-se que a recorrente não enuncia no respetivo texto qualquer factualidade constitutiva do seu direito a decretar a sanção disciplinar (essencial, instrumental ou complementar) e, assim, pela qual tivesse entendido instaurar o respetivo procedimento disciplinar e, depois, cominar o recorrido com o despedimento. Nem ao pretender enquadrar a sanção aplicada no direito substantivo resume qualquer factualidade de forma categorial sendo certo que nem a indicação abstrata dos deveres do trabalhador aí previstos logram validamente colmatar a necessidade da particularização de tal factualidade. (…) Ora, a causa de pedir são factos. Da sua alegação extraem-se a relação jurídica e a pretensão em conformidade. Mas se daqueles não de poder deduzir uma unidade individualizável não se pode concluir que se alegou a causa de pedir. Sem mais, se da simples remissão para o acervo documental que se junta é alcançável a utilidade probatória já não é suscetível de satisfazer esse desiderato para o acesso à tutela judicial de forma equitativa e com garantias processuais se a mesma não foi ancorada na alegação de matéria fáctica que serve de complemento, ou seja a única forma de se afirmar que “As afirmações contidas nos documentos juntos com os articulados, na medida em que podem complementar as alegações neles contidas, devem, logicamente, ser consideradas como compreendidas nesses articulados.” (Ac. STJ, de 27.5.2010)”. Face a este conspecto, portanto, não se vislumbra como deixar de concordar com o decidido no que concerne à conclusão de que não foi alegada causa de pedir e nestas circunstâncias em conformidade não se dever formular o convite ao aperfeiçoamento. (…) Reitere-se que resulta da formulação ínsita no referido art.º 98.º-I n.º 4 al. a) do Cód. Proc. Trabalho, que o legislador impôs ao empregador, não apenas a junção do procedimento disciplinar mas igualmente que o mesmo motivasse o despedimento mediante a apresentação de um articulado. Daqui decorre que o legislador impôs que através do referido articulado a entidade empregadora expusesse os fundamentos de facto e de direito da ação no sentido da declaração da licitude do despedimento; sem que se possa entender o cumprimento de tal ónus pela mera junção de requerimento dando por reproduzidos os factos constantes do despedimento disciplinar ou da nota de culpa, como aquele que foi junto a fls. 26 e segs. De resto, caso o legislador se bastasse com a junção do procedimento disciplinar, não teria imposto igualmente a necessidade de junção de articulado motivando o despedimento. Face a todo o exposto, impõe-se concluir que o requerimento junto pela entidade empregadora não preenche os requisitos legais para que se entenda cumprido o ónus de apresentação do articulado a que aludem os art.ºs 98.º-I n.º 4 al. a) e 98.º-J do Cód. Proc. Trabalho. Por outro lado, cumpre ainda concluir que está vedado ao Tribunal proferir qualquer despacho em ordem ao aperfeiçoamento do referido requerimento, ou de admissão do articulado apresentado pela entidade empregadora entretanto com essa finalidade, ao abrigo do disposto no art.º 27.º al. b) do Cód. Proc. Trabalho e 590.º, n.º 2, al. b) do Cód. Proc. Civil, por remissão dos art.ºs 61.º n.º 1 e 98.º-M do Cód. Proc. Trabalho. Isto porque tal aperfeiçoamento implica, em termos mínimos, que haja algo a aperfeiçoar, designadamente quando deixem de ser alegados alguns factos com relevo para a boa decisão da causa e não nos casos em que inexiste qualquer facto articulado, como a situação em apreço nos autos, em tudo equiparada à ineptidão prevista no artigo 186 do Cód. Proc. Civil, face à total ausência de factos motivando as razões que presidiram a despedimento e suscetíveis de levar a conclusão da sua licitude”. (…) Para justificar a não alegação dos “factos essenciais que constituem causa de pedir” (art.º 552.º, n.º 1, alª d), do CPC invoca ainda a circunstância do empregador “de acordo com o artigo 98.ºJ n.º 1 (…) apenas pode invocar factos e fundamentos da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador”. De todo isto não é correto. Para além de qualquer defesa antecipada poderia alegar por exemplo no sentido da incompetência do tribunal, da ilegitimidade da parte, da caducidade da ação ou da exclusão da reintegração (artigo 98.º-J, n.º 2 do CPT). Temos necessariamente que concluir que a recorrente sempre estava obrigada a cumprir o dispositivo legal (…) Ao caso não pode ser chamado o disposto no art.º 186.º, n.º 3 do CPC: “1 – É nulo todo o processo quando for inepta a petição inicial”.
Com efeito, face ao enquadramento processual desta ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento se se aplicasse esta regra, bastaria a entidade empregadora apresentar um articulado de motivador do despedimento inepto para ser anulado todo o processado e, nesta conformidade, impedir o trabalhador de impugnar o despedimento.
A solução tem de ser a configurada neste Aresto considerar que o articulado motivador do despedimento não preenche os requisitos impostos pelos artigos 98.º-G, n.º 4, alínea a) e 98.º-J do Código de Processo do Trabalho, cuja consequência é a que se mostra estatuída no artigo 98.º-J, n.º 3 do mesmo diploma legal.
Revertendo ao caso dos autos.
A Ré apresentou um requerimento com quatro parágrafos, iniciando a sua exposição com “Sem prejuízo do exposto no procedimento disciplinar, para o qual se remete e dá por integralmente reproduzido”, afirma que o despedimento foi motivado nos termos do artigo 351.º, n.º 2, alínea g), pelas faltas injustificadas.
Quais faltas injustificadas? Em que dias é que o trabalhador faltou?
E pela violação dos deveres propugnados no artigo 128.º do Código do Trabalho, bem como a retirada indevida das chaves do edifício….
Quando é que o trabalhador retirou estes itens e em que circunstâncias?
Depois dedica três parágrafos a concluir que o trabalhador fê-lo conscientemente, sabia o que estava a fazer e, que tais factos são tão graves pelo que foi movido procedimento disciplinar com vista à aplicação de despedimento com justa causa.
Tendo em consideração estas generalidades, conclusões e considerações (em parágrafos) o Tribunal entendeu convidar a Ré ao aperfeiçoamento cumprindo a forma estatuída para os articulados, estatuída no artigo 147.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
O que a Ré fez foi sublinhar a negrito que remete para o procedimento disciplinar que dá como reproduzido e colocou 1 algarismo á frente de cada parágrafo.
Muito pragmaticamente pergunta-se: que factos deste articulado é que o Tribunal vai julgar como provados ou não provados?
Vai julgar como provado que;
- “o despedimento foi motivado nos termos do artigo 351.º, n.º 2, alínea g) do Código do Trabalho, pelas faltas injustificadas, no total de superior a 5 seguidas” ?, isto não é um facto;
“a par da violação dos deveres propugnados no artigo 128.º do Código do Trabalho, bem como da retirada indevida, por parte do trabalhador de elementos concernentes à atividade patronal, mormente chaves….”, isto também não é um facto.
A Ré não acedeu ao convite do Tribunal para apresentar um articulado motivador do despedimento, alegando os factos concretos e precisos que consubstanciam a causa de pedir: em que dias é que o trabalhador faltou, em que dia é que retirou chaves…. (que teriam de constar da decisão proferida em sede de procedimento disciplinar)
Face a todo o exposto, impõe-se concluir que o requerimento junto pela entidade empregadora, não preenche os requisitos legais para que se entenda cumprido o ónus de apresentação do articulado a que alude os artigos 98.º-G, n.º 4, alínea a) e 98.º-J do Código de Processo do Trabalho.
Nesta sequência, dispõe o artigo 98.º-J, n.º 3 do Código de Processo do Trabalho que “Se o empregador não apresentar o articulado referido no número anterior, ou não juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, o juiz declara a ilicitude do despedimento do trabalhador, e:
(…).».
*
Analisando.
Acompanhamos, sem dúvida, a decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, dada a fundamentação da mesma que, subscrevemos e quando afirma, relativamente ao requerimento apresentado nos autos pela Ré que, “tal requerimento não cumpre com os requisitos legais para que se entenda cumprido o ónus de apresentação do articulado a que aludem os artigos 98.º-G, n.º 4, alínea a) e 98.º-J do Código de Processo do Trabalho, pelo que, se impõe a declaração da ilicitude do despedimento do Autor com a consequente condenação da Ré…”.
Pois que, analisado o requerimento apresentado pela Ré, no qual, além de remeter para o procedimento disciplinar que dá como integralmente reproduzido, no ponto 1 do mesmo, antecedido da expressão, “sempre cumprirá dizer que o despedimento do trabalhador… foi motivado…”, diz apenas, “nos termos do artigo 351.º, n.º 2, alínea g) do Código do Trabalho, pelas faltas injustificadas, no total de superior a 5 seguidas, a par da violação dos deveres propugnados no artigo 128.º do Código do Trabalho, bem como da retirada indevida, por parte do trabalhador de elementos concernentes à atividade patronal, mormente chaves do edifício,…, em violação não só das regras de conduta, como da cláusula sétima do seu contrato de trabalho”, o que manifestamente, como bem se concluiu naquela, não constitui qualquer facto que o Tribunal possa, eventualmente, julgar como provado ou não provado, só possamos concluir, tal como na decisão recorrida se concluiu, que o requerimento junto pela entidade empregadora não preenche os requisitos legais para que se entenda cumprido o ónus de apresentação do articulado a que aludem os art.s 98.º-I n.º 4 al. a) e 98.º-J.
Expliquemos.
Em situações de acções especiais, como é o caso, de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, após a revisão do CPT/2009, cuja tramitação acontece, nos termos prescritos nos art.s 98º-B a 98º-P, a mesma, inicia-se mediante a apresentação pelo trabalhador de requerimento em formulário próprio (cfr. art. 98º-D) e, logo na audiência de partes, frustrada a conciliação, o juiz, conforme dispõe o nº 4 do art. 98º-I, al. a) “procede à notificação imediata do empregador para, no prazo de 15 dias, apresentar articulado para motivar o despedimento, juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, apresentar o rol de testemunhas e requerer quaisquer outras provas;”.
Nos termos do art. 98º-J, nº 3 – “Se o empregador não apresentar o mencionado articulado, ou este for apresentado intempestivamente, ou, mesmo que apresentado, não juntar o procedimento disciplinar ou os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades exigidas, o juiz declara a ilicitude do despedimento do trabalhador, e:
(…)”.
Ou seja, diferente do que antes acontecia, em que o trabalhador que instaurasse uma acção de impugnação de despedimento tinha que elaborar uma petição inicial e, nela, expor as razões de facto e de direito que fundamentavam a sua posição, agora, com a referida revisão do CPT e com a instituição desta nova acção especial, de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, passou a competir ao empregador o ónus de alegar e provar os factos que estiveram subjacentes ao despedimento e defesa da sua validade, apresentando o articulado motivador do despedimento referido naquele art. 98º-J.
Nesta nova acção, dando o trabalhador impulso processual à impugnação do despedimento, o empregador passa a assumir processualmente uma posição muito semelhante à de um autor. Pois, pese embora, ser a parte contra quem é instaurada a acção é, a ele, empregador que compete apresentar, junto do Tribunal, um articulado a motivar o despedimento, para o que oferecerá todas as provas, sendo depois o trabalhador notificado para responder, querendo.
Assume, assim, o articulado motivador do despedimento, sem dúvida, a natureza de uma petição inicial, onde o empregador deverá motivar o despedimento, apresentar as provas respectivas e formular o correspondente pedido, designadamente a validade do procedimento disciplinar e a licitude do despedimento.
Ora, sendo desse modo, como bem se considerou na decisão recorrida e vem sendo considerado, entre outros, vejam-se o douto acórdão seguido na decisão recorrida e do mesmo TRG, o (Acórdão de 07.05.2020, Proc. nº 5804/19.8T8VNF.G1 in www.dgsi.pt) dúvidas não se suscitam, também, que, em situações em que o empregador no seu articulado motivador do despedimento tenha, “apenas dado como reproduzido o procedimento disciplinar e a nota de culpa, sem que tivesse alegado qualquer facto que permita concluir pela licitude do despedimento é de considerar inepto tal articulado por falta de indicação de causa de pedir, não havendo lugar ao seu aperfeiçoamento. Este só se justificaria se o articulado fosse insuficiente ou deficiente, o que não é o caso”.
Sobre os requisitos da petição inicial, enquanto articulado através do qual o autor propõe a acção, constituindo a peça fundamental de todo o processo, delimitando o objecto da causa e conduzindo a certa pretensão de tutela jurisdicional, com a menção do direito e dos fundamentos respectivos, dispõe o art. 552º, nº 1, do CPC que, nela deve o autor: al.s “d) Expor os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à acção;
e) Formular o pedido.”.
A petição inicial, segundo (Rodrigues Bastos, in Notas ao Código Processo Civil, Vol. I, 3ª edição, pág. 253) que a “(...), há-de expor um facto jurídico (causa de pedir) e tirar dele, como conclusão, um efeito de direito, que o autor impetra lhe seja reconhecido (pedido). Se não se formula qualquer pedido ou se não se expõe a causa de pedir, ou se se faz aquela formulação, ou esta exposição em termos incompreensíveis, só materialmente se poderá falar em p.i., porque substancialmente é evidente que o não é. Tal peça jurídica, com falta desses requisitos, não se mostrará apta a reproduzir, em juízo, o litígio – daí a sua ineptidão”.
Dispõe o art. 186º, nº 2, al. a) do CPC que, diz-se inepta a petição, “quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir;”.
Como ensinou o (Prof. Alberto dos Reis, in Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 2º, Coimbra 1945, pág. 372), a este respeito, “importa, porém, não confundir petição inepta com petição simplesmente deficiente. Claro que a deficiência pode implicar ineptidão: é o caso de a petição ser omissa quanto ao pedido ou à causa de pedir; mas aparte esta espécie, daí para cima são figuras diferentes a ineptidão e a insuficiência da petição. Quando a petição, sendo clara e suficiente quanto ao pedido e à causa de pedir, omite factos ou circunstâncias necessárias para o reconhecimento do direito do autor, não pode taxar-se de inepta; o que então sucede é que a acção naufraga”.
Ora, o aqui em análise, “Articulado de motivação do despedimento”, como articulado que é, está sujeito às regras processuais no que diz respeito à sua existência e requisitos. E, consequentemente, o empregador deve expor, nele, os factos e as razões de direito que servem de fundamento à acção, através da “dedução por artigos dos factos que interessem à fundamentação do pedido ou da defesa, sem prejuízo dos casos em que a lei dispensa a narração de forma articulada” (cfr. nº 2 do art. 147º, do CPC) – o que a Mª Juíza “a quo” tentou acautelar, veja-se despacho de 12.11.2024) e formular o pedido, (cfr. al.s. d) e e) do nº 1 do referido art. 552º) sendo que, nas situações, como é o caso, da acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, atento o disposto no nº 1, do referido art. 98º-J, “o empregador apenas pode invocar factos e fundamentos constantes da decisão de despedimento comunicada ao trabalhador”.
Regressando ao caso e tendo em conta o que antecede, face ao teor do requerimento junto pela empregadora, em 26.11.2024, como já supra dissemos, sem a alegação de quaisquer factos, susceptíveis de prova, apenas, remetendo para o procedimento disciplinar, sem qualquer descrição e discriminação dos factos que integrariam a justa causa de despedimento e sem a formulação de qualquer pedido, designadamente, a validade do procedimento disciplinar e a licitude do despedimento, não podemos, como bem o considerou a Mª Juíza “a quo”, qualificar aquele requerimento como articulado de motivação do despedimento que a, agora, recorrente comunicou ao A./trabalhador e que fundamentou o formulário que deu início à presente acção.
Bem diferente do que a recorrente conclui (veja-se conclusão xxiv) analisado aquele, a conclusão que se impõe é que o mesmo não é claro nem suficiente, mas sim, inepto, por completa inexistência dos requisitos a que está sujeita a peça processual em causa, ou seja, como articulado motivador do despedimento, já que substancialmente não o é.
Pois, ao contrário do que diz, no requerimento que juntou aos autos, em 26.11.2024, a Ré não motivou o despedimento que comunicou ao trabalhador.
Assim, não só os autos não deviam seguir, como foi decidido, como face à inexistência/ineptidão, que concluímos padece, fica excluída a possibilidade de qualquer convite com vista ao seu aperfeiçoamento e, consequentemente, precludida a pretensão deduzida na conclusão xxxv da alegação da recorrente.
A situação não é susceptível de ser considerada de insuficiência do articulado, pois, não se mostram minimamente cumpridos os requisitos legais para que se considere cumprido o ónus imposto à recorrente de apresentação do articulado em causa, como bem se concluiu na sentença recorrida.
Improcedem, assim, todas ou são irrelevantes as conclusões da apelação.
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III – DECISÃO
Face ao exposto, acorda-se nesta secção em julgar a apelação totalmente improcedente e mantém-se a decisão recorrida.
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Custas a cargo da apelante.
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Porto, 7 de Abril de 2025
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O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos,