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PRESTAÇÃO ESPONTÂNEA DE CAUÇÃO
PREMATURIDADE
INDEFERIMENTO LIMINAR
Sumário
O executado apenas pode deduzir incidente de prestação espontânea de caução como meio de obter a suspensão da execução no caso de ter deduzido embargos e destes terem sido recebidos, sem que tal consubstancie qualquer violação ao princípio da proporcionalidade ou ao seu direito constitucional à tutela jurisdicional efetiva, antes, o contrário é que seria verdadeiro, na medida em que o entendimento por ele propugnado (em ver suspensa a execução, para a qual ainda não foi citado, mediante prestação de caução) violaria o princípio da proporcionalidade para com o exequente, que tem o seu direito de crédito acertado em sentença judicial transitada em julgado, além de que postergaria o seu direito à tutela jurisdicional efetiva, ao privá-lo de obter a satisfação coerciva do seu direito de crédito, corporizado em título executivo, quando esse seu direito creditício nem sequer foi ainda colocado em crise pelo executado nos termos legalmente prescritos – mediante oposição à execução por embargos que tivessem sido recebidos.
Texto Integral
Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães no seguinte:
I- RELATÓRIO
Por apenso aos autos de execução de sentença para pagamento de quantia certa que EMP01..., S.A., com sede na Rua ..., ... ..., instaurou contra AA, residente na Rua ..., ... ..., veio o executado deduzir incidente de prestação espontânea de caução requerendo que fosse admitido a prestar caução, mediante depósito autónomo da quantia de 15.704,94 euros, e se ordenasse a suspensão da execução.
Para tanto alegou, em suma, que: até ao momento não foi citado para os termos da execução, de que apenas teve conhecimento informal; reside em ..., onde tem toda a sua família direta (filhos e netos), onde recebe a sua pensão e passa a maior parte do seu tempo e não tem quem cuide dos seus afazeres e negócios em Portugal; a manutenção da execução acarreta-lhe elevados prejuízos de difícil reparação, pelo avolumar dos juros e de vir a ser surpreendido, a qualquer momento, com a penhora de bens e de direitos superior à obrigação, o que poderá acarretar consequências graves para a sua saúde, na medida que é doente cardíaco, com recomendação de que deve evitar emoções fortes e elevados níveis de stress, além de poder ficar impedido de fazer face às suas despesas e às da sua família; procurou junto do agente de execução saber o montante da soma da dívida exequenda, juros de mora, sanção pecuniária compulsória e despesas prováveis da execução à presente data, que o informou que esse valor ascende a 15.704,94 euros; propõe-se depositar a referida quantia à ordem dos autos, a qual se mostra suficiente e idónea para satisfazer os interesses do exequente.
Por despacho proferido em 12/12/2024, indeferiu-se liminarmente o incidente por intempestivo, constando esse despacho do seguinte teor: “Veio AA executado na ação executiva a que o presente incidente está apenso e em que é exequente EMP01... S.A. requerer a prestação espontânea de caução com vista, em suma, a evitar a penhora e que lhe fossem causados prejuízos. Apreciando O incidente de caução não pode ser intentado previamente ao processo de que é apenso e sem norma substantiva que lho permita, tendo, no caso de caução com o fito de suspender a execução, ser deduzida simultaneamente ou depois do oferecimento dos embargos – cfr. art. 733º, nº 1, al. a) do Cód. Proc. Civil. Assim, constata-se ser o presente incidente intempestivo por precoce e, nessa medida, indefere-seliminarmente o mesmo. Fixa-se à causa o valor oferecido para caucionar – art. 304º, nºs 1 e 2, do Cód. Proc. Civil – e a taxa de justiça em 2 Ucs – art. 7º, nº 4, do RCP e tabela II anexa ao mesmo diploma”.
Inconformado com o assim decidido, o requerente do incidente/executado interpôs recurso, em que formulou as seguintes conclusões:
I - A decisão recorrida cometeu erro de julgamento ao interpretar o artigo 733.º, n.º 1 alínea a), do Código de Processo Civil (CPC) de forma literal e restritiva, limitando a possibilidade de prestação de caução apenas após a dedução de embargos.
II - Tal interpretação não reflete adequadamente os princípios fundamentais do ordenamento jurídico português, nem as orientações doutrinárias e jurisprudenciais predominantes.
III - A interpretação sistemática e teleológica do artigo 733.º permite uma aplicação mais ampla, adequando-se melhor aos princípios da proteção dos direitos e à busca por uma solução justa e equilibrada.
IV - A doutrina é unânime em afirmar que a caução não deve ser vista apenas como um instrumento postergado a embargos, mas como uma medida preventiva que visa evitar danos irreparáveis, em casos de risco iminente.
V - Além disso, a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, em particular o acórdão de 15 de janeiro de 2019 (Processo n.º 186/17.0T8LRA), tem sustentado que, em casos de risco iminente de danos irreparáveis, a caução pode ser prestada antes da dedução de embargos.
VI - A decisão recorrida também viola o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP).
VII - O princípio da proporcionalidade exige que a aplicação da lei seja realizada de forma adequada, necessária e equilibrada, de modo a garantir que as medidas adotadas sejam eficazes, sem causar danos desproporcionais aos direitos das partes envolvidas.
VIII - No caso em questão, a decisão de rejeitar liminarmente a prestação de caução não atende aos requisitos do princípio da proporcionalidade.
IX - A medida proposta pelo Apelante, o depósito da caução, é não apenas adequada, mas também necessária, uma vez que garante, de forma imediata, os interesses do exequente, sem a necessidade de medidas mais gravosas.
X - Ao rejeitar a caução, o tribunal coloca o Apelante em uma situação de vulnerabilidade irreparável, uma vez que a demora no processo poderá acarretar danos significativos à sua situação patrimonial e à sua saúde.
XI - A violação do princípio da proporcionalidade é ainda mais evidente pela inexistência de uma medida alternativa menos gravosa.
XII - No presente caso, a recusa da caução liminar não apenas compromete a proteção patrimonial do Apelante, mas também ameaça a sua dignidade, expondo-o a uma situação de vulnerabilidade desnecessária.
XIII - Além disso, a decisão recorrida compromete a efetividade da tutela jurisdicional, em violação ao artigo 20.º da CRP, que assegura o direito à proteção jurisdicional efetiva.
XIV - A recusa liminar da caução proposta impede essa tutela imediata, criando um risco de danos irreparáveis para o Apelante.
XV- Em face do exposto, a decisão recorrida aplica a norma do artigo 733º n.º 1 alínea a) do CPC de forma literal e restritiva, na interpretação de que o incidente de caução não pode ser intentado previamente ao processo de que é apenso e sem norma substantiva que lho permita, tendo, no caso de caução com o fito de suspender a execução, ser deduzida simultaneamente ou depois do oferecimento dos embargos, violando o disposto nos artigos 18º e 20º da CRP.
XVI- Além de que a decisão viola ainda os princípios fundamentais de interpretação das normas.
Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência:
a) Revogar-se o despacho recorrido, admitindo o incidente deprestação de caução requerido pelo Apelante, através dedepósito provisório da quantia de €15.704,94 como caução,com vista à suspensão dos atos executivos, nos termos doartigo 915.º do CPC.
b) Ordenar-se a notificação do exequente para se pronunciarsobre o incidente, assegurando o contraditório.
d) Determinar-se a suspensão provisória da execução, nostermos do artigo 272.º do CPC, enquanto se aprecia aprestação de caução.
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A 1ª Instância admitiu o recurso como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo, o que não foi alvo de modificação no tribunal ad quem.
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Citada a exequente para os termos do recurso e do incidente, não apresentou contra-alegações, mas deduziu oposição ao incidente.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DO OBJETO DO RECURSO
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC.
Acresce que, o tribunal ad quem também não pode conhecer de questão nova, isto é, que não tenha sido, ou devesse ser, objeto da decisão sob sindicância, salvo se se tratar de questão que seja do conhecimento oficioso, dado que, sendo os recursos os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, mediante o reexame de questões que tenham sido, ou devessem ser, nelas apreciadas, visando obter a anulação da decisão recorrida (quando padeça de vício determinativo da sua nulidade) ou a sua revogação ou alteração (quando padeça de erro de julgamento, seja na vertente de erro de julgamento da matéria de facto e/ou na vertente de erro de julgamento da matéria de direito), nos recursos, salvo a já enunciada exceção, não podem ser versadas questões de natureza adjetivo-processual e/ou substantivo material sobre as quais não tenha recaído, ou devesse recair, a decisão recorrida[1].
No seguimento desta orientação cumpre ao tribunal ad quem apreciar uma única questão que consiste em saber se o despacho recorrido (ao indeferir liminarmente o incidente de prestação espontânea de caução por parte do recorrente – executado – com fundamento de que aquele com o fito de suspender a execução tem de ser deduzido simultaneamente ou depois do oferecimento da oposição à execução mediante embargos) padece de erro de direito e se, em consequência, se impõe a sua revogação e ordenar o prosseguimento do incidente.
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III- DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos que relevam para apreciar o objeto do recurso são os que constam do «I-Relatório» supra exarado.
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IV- DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
A questão decidenda no âmbito do presente recurso resume-se em saber se é legalmente consentido ao executado deduzir incidente de prestação espontânea de caução com o fito de obter a suspensão da execução antes de ter deduzido oposição mediante embargos, e, inclusivamente, como acontece no caso sobre que versam os autos, antes de ter sido citado para os termos da execução.
A resposta a essa questão passa, a nosso ver, por se indagar das finalidades prosseguidas pela ação executiva e pelos interesses que nela se visa primacialmente tutelar.
Como é sabido, as ações executivas são os meios processuais que a lei adjetiva coloca ao dispor do credor, no caso de inadimplência do devedor, para obter dele (diretamente ou através de terceiro) a satisfação coerciva do direito de crédito (pagamento de quantia pecuniária, entrega de coisa determinada ou prestação de determinado facto, positivo ou negativo) que lhe foi reconhecido em sentença judicial transitada em julgado ou já acertado em título executivo extrajudicial.
O exercício do direito de ação, na sua vertente executiva, pressupõe, portanto, sempre a apresentação de um documento, a que a lei atribua natureza de título executivo, cujo elenco se encontra enunciado, de modo taxativo, no art. 703º do CPC (diploma onde constam todas as disposições legais que se venham a referir sem menção em contrário), atento o princípio da tipicidade dos títulos executivo que vigora no ordenamento jurídico processual civil nacional.
Diferentemente das ações declarativas (cujo objetivo fundamental é resolver o conflito de direitos ou de interesses explanada na ação que contrapõe os litigantes, ou seja, a declaração pelo juiz da solução concreta que decorre do direito substantivo para a relação jurídica material controvertida explanada na ação, mediante a emanação de um dictat autoritário, vinculativo e definitivo quanto ao modo como esse conflito é resolvido), as ações executivas visam obter a satisfação coativa de uma prestação não cumprida pelo devedor, no caso do direito deste já se encontrar corporizado num documento judicial (sentença transitada em julgado) ou em documento para-judicial ou extrajudicial a quem a lei reconheça a natureza de título executivo, por transportar uma forte, ainda que variável, presunção da existência e da titularidade do direito de crédito do exequente (credor) sobre o executado (devedor)[2].
Para a instauração da ação executiva não basta, portanto, a invocação pelo exequente de um direito de crédito sobre o executado e a alegação do incumprimento, mas é necessário que o direito de crédito em causa já se encontre reconhecido numa sentença judicial transitada em julgado ou em documento para-judicial ou extrajudicial, a quem a lei atribua a natureza de título executivo, sendo através deste pelo qual se determina o fim e os limites da ação executiva (arts. 10º, n.º s 4 a 6 e 703º).
O título executivo constitui a chave que abre a porta da ação executiva, ou seja, constitui “o ponto de partida da ação executiva, pois a realização coativa da prestação pressupõe a anterior definição dos elementos (subjetivos e objetivos) da relação jurídica de que ela é objeto. O título executivo contém esse acertamento; daí que se diga que constitui a base da execução, por ele se determinando o fim e os limites da ação executiva, isto é, o tipo de ação e o seu objeto, assim como a legitimidade, ativa e passiva, para ela, e, sem prejuízo de poder ter que ser complementado, em face dele se verificando se a obrigação é certa, líquida e exigível”[3].
O fim da ação executiva é o de conseguir para o credor o mesmo benefício que lhe traria o cumprimento voluntário da obrigação por parte do devedor[4].
Dito por outras palavras, perante o não cumprimento voluntário pelo devedor de direito de crédito reconhecido ao credor e corporizado num título executivo, a lei reconhece-lhe o direito a recorrer ao ius imperi do Estado, lançando mão da ação executiva a fim de executar o património do devedor, por forma a conseguir para si o mesmo beneficio que teria caso o devedor tivesse cumprido voluntariamente com a obrigação.
Acresce que, estando o direito de crédito incumprido pelo devedor corporizado num título executivo, conforme expende Teixeira de Sousa, “a tramitação do processo executivo orienta-se primordialmente para a satisfação efetiva do direito do exequente e só admite a discussão da existência ou validade da pretensão exequenda num processo declarativo de natureza incidental – os chamados embargos de executados”[5].
No âmbito do processo executivo comum para pagamento de quantia certa sob a forma ordinária, os embargos de executado encontram-se regulados nos arts. 728º a 734º, e quando essa execução deva seguir a forma sumária, nos arts. 856º e 857º.
O processo executivo para pagamento de quantia certa segue a forma sumária nos casos em que a execução tenha como título executivo os previstos no n.º 2, do art. 552º, sem prejuízo do seu n.º 3, e segue a forma ordinária em todas as situações em que aquela não deva seguir a forma sumária.
A principal nota distintiva entre essas duas formas processuais consiste na circunstância de, no processo ordinário, ocorrer a intervenção liminar do juiz e, com a ressalva da situação prevista no art. 727º, proceder-se à citação do executado previamente à penhora, enquanto no processo sumário, a execução inicia-se pela penhora de bens e só depois de efetuada esta se procede à citação do executado.
Em ambas as formas de processo (ordinário ou sumário), uma vez citado o executado ou este paga voluntariamente a quantia em dívida e as custas, ou deduz oposição à execução mediante embargos (arts. 726º, n.º 6 e 856º, n.º 1).
A oposição à execução mediante embargos consubstancia-se do ponto de vista estrutural como uma contra-acção à ação executiva, de natureza declarativa, enxertada no processo executivo, que corre por apenso a ele, por via do qual o executado exerce o seu direito de defesa perante o pedido do exequente, requerendo que o tribunal julgue extinta, total ou parcialmente, a execução, “seja pelo não preenchimento dos pressupostos substantivos ou processuais da exequibilidade extrínseca ou intrínseca, seja pela verificação de um vício de natureza formal que obste ao prosseguimento da execução”[6].
A referida contra-acção, de natureza declarativa, à ação executiva, a que se reconduz a oposição à execução por embargos, encontra-se sujeita a uma fase liminar, em que o juiz deverá rejeitá-la liminarmente quando tiver sido deduzida fora do prazo, se assentar em fundamentos diferentes dos legalmente permitidos ou se for manifesta a sua improcedência (art. 732º, n.º 1). Não havendo fundamento para o indeferimento liminar dos embargos, recebidos estes liminarmente pelo juiz, este determina a notificação do embargado (exequente) para os contestar, querendo, no prazo de vinte dias, seguindo-se, sem mais articulados, os termos do processo executivo (n.º 2 do art. 732º).
O recebimento liminar dos embargos não determina a suspensão da ação executiva, salvo nos casos taxativamente previstos no n.º 1 do art. 733º, os quais se reconduzem: a) a prestação de caução pelo embargante; b) tratando-se de execução fundada em documento particular, o embargante tiver impugnado a genuinidade da respetiva assinatura, apresentando documento que constitua princípio de prova, e o juiz entender, ouvido o embargado, que se justifica a suspensão sem prestação de caução; c) tiver sido impugnada, no âmbito da oposição deduzida, a exigibilidade ou a liquidação da obrigação exequenda e o juiz considerar, ouvido o embargado, que se justifica a suspensão sem prestação de caução; ou d) a oposição tiver por fundamento qualquer das situações previstas na alínea e) do art. 696º, ou seja, se fundar em sentença judicial transitada em julgado, proferida em ação declarativa que correu termos à revelia do executado e este deduza embargos alegando que faltou a sua citação ou que é nula a citação feita; que não teve conhecimento da citação por facto que não lhe é imputável; ou que não pôde apresentar a contestação na ação declarativa por motivo de força maior.
Com efeito, não tendo o executado (devedor) cumprido voluntariamente perante o exequente (credor) com o direito de crédito já acertado em documento (título executivo) que o legislador considera dispor do grau de segurança e de fiabilidade quanto à existência desse direito para consentir que o titular dele, perante a inadimplência do devedor recorra à ação executiva, a fim de obter a satisfação coativa do mesmo, a circunstância do executado ter deduzido embargos e destes terem sido recebidos pelo juiz não é suficiente para colocar em crise o direito de crédito do exequente corporizado no título executivo e, assim, levar à paralisação da execução.
Apenas não será assim nos casos taxativamente enunciados no n.º 1 do art. 733º, em que no confronto dos interesses prevalentes do exequente prosseguidos pela ação executiva, com os interesses atendíveis do executado, perante a defesa apresentada nos embargos recebidos pelo juiz, fazendo-se a necessária ponderação daqueles por referência ao princípio constitucional da proporcionalidade/proibição do excesso, o legislador considere dever suspender-se a execução por não existir qualquer interesse atendível do exequente que é afetado pela paralisação daquela (como é o caso em que, na sequência do recebimento dos embargos, o embargante preste caução), ou que os interesses que são afetados pelo executado/embargante com o prosseguimento desta devem sobrepor-se aos dos exequente que são afetados por esse não prosseguimento, uma vez que existe um elevado grau dos embargos virem a ser julgados procedentes e, em consequência, a ação executiva ser julgada extinta (situações a que se reportam as als. b) a d) do n.º 1 do art. 733º).
Com interesse, na senda do que se vem dizendo, expende Miguel Teixeira de Sousa que “A execução visa a satisfação efetiva da prestação exequenda, pelo que não pode admirar que, para atingir essa finalidade, a lei conceda uma especial importância à posição do exequente e dos outros credores que venham a intervir na execução. São vários os preceitos legais que estão imbuídos deste favor creditoris. Assim, o recebimento dos embargos de executado não suspende, em princípio a execução (…). A prevalência dos interesses do exequente não deve fazer esquecer os interesses atendíveis do executado. Dessa prevalência resulta que, na ponderação dos interesses do exequente e do executado, qualquer proteção deste último pressupõe necessariamente que os seus interesses devam ser sensivelmente mais fortes do que o interesse do exequente na realização coativa da sua pretensão. A proteção do executado é atualmente um reflexo dos princípios orientadores do Estado social de direito (art. 2º CRP)”. E conclui que “essa proteção demonstra-se na proporcionalidade da penhora, na impenhorabilidade de certos bens e no respeito de certos direitos fundamentais do executado”[7].
Na mesma linha do que se vem dizendo, referindo-se especificamente aos casos em que as als. b) a d) do art. 733º preveem que o recebimento dos embargos suspende o prosseguimento da execução, sem que seja prestada caução pelo embargante/executado, escreve-se no acórdão desta Relação de 24/02/2022, que:
“A suspensão da execução sem prestação de caução, está orientada para que se ponderem interesses conflituantes – o interesse do executado/embargante em evitar o ataque ao seu património em processo executivo que não cumpre requisitos legalmente exigidos (exigibilidade e liquidez da obrigação exequenda – art. 713º do CPC) e o interesse do exequente/embargado em não ver paralisada a execução em consequência de uma gratuita e não consistentemente sustentada arguição da inexigibilidade e/ou iliquidez da obrigação exequenda. Justificar-se-á, pois, suspender a execução (trazendo justo equilíbrio à relação de interesses opostos e conflituantes), ao abrigo da alínea c), do n.º 1 do art 733º do CPC, quando os elementos carreados aos autos (conjugando os que constem do processo executivo com os carreados aos embargos) permitam concluir (num juízo forçosamente sumário e não definitivo – prévio ao que a contraditoriedade da audiência permitirá formular a final), pela consistência da argumentação, ou seja, quando os elementos existentes nos autos imponham concluir estar abalada (pelo menos consistentemente questionada) a exigibilidade e liquidez da obrigação exequenda. Não se verificando esses elementos, não deve a execução ser suspensa sem se prestar caução”[8].
E é este justo equilíbrio dos interesses conflituantes de embargante/executado versus embargado/exequente que, ao abrigo do princípio da proporcionalidade, exige que nos casos previstos nas als. b) e d) do n.º 1 do art. 733º se faça prevalecer o interesse do primeiro.
Na verdade, na situação da al. b) prevê-se que, tratando-se de execução fundada em documento particular e sendo impugnada nos embargos recebidos pelo juiz a veracidade da assinatura e seja apresentado documento que constitua princípio de prova desse fundamento, o juiz, ouvido o embargado, deverá ponderar sobre a suspensão (ou não) da execução sem prestação de caução. Deve suspender a execução quando em função da análise sumária da prova carreada pelo embargado e da ponderação dos demais elementos existentes na ação executiva se convença da probabilidade séria de que o título dado à execução não terá sido assinado pelo executado/embargante[9].
E no caso da al. d) o que justifica a suspensão da execução sem que o embargante/executado, cujos embargos foram liminarmente recebidos, preste caução é a circunstância de os fundamentos previstos nessa alínea, relacionados com o efetivo contraditório, serem suscetíveis de motivar a interposição de recurso extraordinário de revista da sentença que serve de título executivo à execução, pelo que mal se compreenderia que esses fundamentos não levassem à suspensão da execução até ser proferida decisão final nos embargos[10].
Fora dos casos vindos a referir o recebimento dos embargos não suspende a execução, a não ser que o embargante preste caução, conforme comando expresso da al. a) do n.º 1 do art. 733º, e isto mesmo que alegue e prove indiciariamente que do prosseguimento da execução lhe advirão prejuízos irreparáveis[11].
Valendo-nos novamente dos ensinamentos de Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “partindo o legislador da pressuposição, ainda que não totalmente segura, de que o título executivo retrata fielmente uma relação jurídica creditícia, que tem como polos subjetivos o exequente e o executado e que reflete a existência de um direito de crédito e da correspondente obrigação nos termos por aquele configurados, a simples dedução de embargos de executado não poderia justificar, por si só e de forma automática, a sustação da atividade executiva. Ainda que persista o risco de ocorrer uma atividade executiva injusta, foi dada clara prevalência aos interesses do credor. No confronto entre a segurança e a eficácia do processo executivo, a opção legislativa vai neste sentido, embora o sistema tenha mecanismos que permitem atenuar e, no limite, neutralizar, os efeitos de tal opção (é o que resulta, entre outras, das disposições contidas nos arts. 733º, n.ºs 4 e 5, 817º, n.º 4 e 839º, n.ºs 1, al. a) e 3)”[12].
Debruçando-nos sob a caução que, quando for prestada pelo embargante/executado e os embargos por ele apresentados tenham sido liminarmente recebidos, nos termos da al. a), do n.º 1 do art. 733º, determina a suspensão da execução.
Nos casos em que o executado deduza embargos requerendo que a execução que contra ele foi instaurada seja julgada extinta pelos fundamentos processuais e/ou substantivos que alegou na petição inicial e esses embargos sejam recebidos pelo juiz, a prestação da caução tem como objetivo específico por parte daquele a suspensão da execução, isto é, a sua prestação é ditada por razões eminentemente processuais, tendo por escopo viabilizar a suspensão.
Todavia, porque o interesse prevalecente na execução é o do exequente, para que essa suspensão possa ser determinada impõe-se que seja garantido o direito do exequente à satisfação do seu crédito.
Escrevia Alberto dos Reis que “a função da caução é (…) garantir ao exequente a satisfação do seu direito, caso os embargos improcedam”[13]. Estando a execução suspensa por via do recebimento dos embargos, a prestação da execução pelo embargante/executado leva a que o direito do credor/exequente/embargado fique prevenido conta os riscos de possíveis manobras dilapidatárias levadas a cabo pelo devedor/executado/embargante durante o tempo da suspensão no caso dos embargos virem a improceder, garantindo-se, assim, o justo equilíbrio determinado pelo princípio da proporcionalidade entre o interesse do embargante em que a execução não prossiga, para não ver o seu património penhorado e vendido, e o interesse prevalecente do embargado/exequente, que, não obstante a suspensão da execução vê o seu interesse satisfeito porque tem a segurança de que, se os embargos improcederem, encontrará à sua disposição valores que lhe asseguram a realização do seu crédito[14].
Considerando as finalidades da caução, por um lado, o seu valor deve garantir o pagamento da quantia exequenda, dos juros de mora que se vierem a vencer durante o período de tempo previsível da suspensão da execução (trânsito em julgado da sentença que venha a recair sobre os embargos), as custas prováveis da execução, honorários e despesas do agente de execução[15] e, por outro, o embargante apenas pode requerer a prestação da caução após o recebimento dos embargos e até ao julgamento definitivo dos embargos de executado[16].
Assentes nas premissas vindas a referir, pretende o recorrente que ao indeferir liminarmente o incidente de prestação de caução com fundamento de que esse incidente apenas pode ser deduzido simultaneamente com ou depois do oferecimento dos embargos, o julgador a quo incorreu em erro de julgamento, dado que aquele deduziu o incidente com o objetivo de suspender a execução que lhe foi movida pela exequente EMP01..., S.A. e evitar danos irreparáveis ao seu património e saúde, conforme alegou no requerimento inicial do incidente, onde sustentou que, apesar de ainda não ter sido formalmente citado, reside em ... e tem condições de saúde delicadas, com risco de agravamento devido ao processo, onde se propôs depositar a quantia de 15.704,94 euros, correspondente à divida, juros e despesas do processo, como garantia para assegurar os interesses do exequente e evitar prejuízos, como a penhora dos bens.
Aduz que a decisão recorrida assenta numa interpretação literal e restritiva do art. 733º, n.º 1, al. a), ignorando os princípios fundamentais do ordenamento jurídico português e os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais que conferem uma maior amplitude ao instituto da prestação da caução, que defendem a admissibilidade desta antes da dedução de embargos, como forma de suspender a execução em casos de urgência comprovada, o que seria o seu caso, “na medida em que demonstrou claramente os prejuízos iminentes, nomeadamente: a) o risco de penhora de bens e direitos de valor superior ao crédito exequendo, e b) a sua saúde fragilizada, que pode ser agravada por situações de stress emocional”, e enuncia uma série de arestos que suportarão a posição jurídica que perfilha.
Conclui que a interpretação jurídica feita pela 1ª Instância é violadora do princípio da proporcionalidade consagrado no art. 18º, n.º 2 da CRP e do seu direito à tutela jurisdicional efetiva que lhe é assegurado pelo art. 20º daquela lei fundamental.
Sem razão.
Quanto ao risco invocado pelo recorrente de lhe serem penhorados bens e direitos de valor superior ao crédito exequendo, cumpre referir que a lei processual civil prevê no art. 784º, n.º 1, al. a), parte final – oposição à penhora – mecanismos que lhe permitem reagir contra esse eventual excesso de penhora que se venha a verificar, sendo certo que, conforme resulta do que se vem dizendo, esse risco nunca seria fundamento para aquele prestar caução com vista a obter a suspensão da execução, dado que a prestação daquela tem como pressuposto que o mesmo tenha deduzido embargos de executado à execução que lhe foi instaurada e que estes tivessem sido recebidos.
E, no que respeita à sua alegação de que teria demonstrado claramente a sua condição de saúde fragilizada, que pode ser agravada por situações de stress emocional, apraz referir que é certo que o mesmo alegou essa situação no requerimento inicial em que deduziu o incidente de prestação de caução, mas nenhuma prova juntou com vista a demonstrá-la, pelo que se quedou pela alegação.
Finalmente, cumpre referir que apesar de termos feitas aturadas buscas na base de dados da DGSI com o escopo de localizarmos os acórdãos que são identificados pelo recorrente, não os logramos detetar, certamente, porque ou não se encontram publicados nessa base de dados ou porque, estando-o, aquele incorreu em erro de escrita ao identificar a data da respetiva prolação e do número de processo em que foram proferidos na medida em que fizemos a dita busca recorrendo a ambos os elementos facultados pelo recorrente.
Independentemente do que se vem dizendo, urge dizer que, salvo o devido respeito pela jurisprudência invocada pelo recorrente não se perfilha a mesma.
Com efeito, sendo o título executivo a base da ação executiva e contendo esse título o acertamento do direito de crédito nele reconhecido ao exequente (credor) de modo considerado suficientemente seguro pela lei para que, perante a inadimplência do devedor, lhe abrir as portas da ação executiva, a fim de obter a satisfação coativa desse direito, o princípio da proporcionalidade consagrado no art. 18º da lei fundamental determina que, na ação executiva, o interesse preponderante tutelado pelo legislador seja o do exequente (credor) em ver satisfeito o seu direito de crédito perante o incumprimento do devedor (executado), a quem apenas faz prevalecer os seus interesses, determinando a suspensão da execução nos casos taxativamente enunciados no art. 733º, n.º 1, onde se conta a situação em que deduza oposição à execução mediante embargos, estes sejam recebidos e aquele preste caução de montante suficiente para, no caso dos embargos virem a improceder, garanta o pagamento do crédito do exequente (capital e juros) e as custas da execução, honorários e despesas do agente de execução (e não, conforme pretende o exequente “o montante resultante da soma da dívida exequenda, juros de mora e da sanção pecuniária compulsória e das despesas prováveis com a execução à presente data – destacado nosso).
Destarte, o fundamento que legitima o executado a deduzir incidente de prestação espontânea de caução é a circunstância daquele ter deduzido embargos de executado, enxertando no processo executivo uma ação de natureza declarativa, alegando factos suscetíveis de preencherem pressupostos substantivos e/ou processuais que ponham em causa o acertamento constante do título executivo e requerendo com base neles que a execução seja, total ou parcialmente, extinta e desses embargos terem sido recebidos.
Daí que, salvo o devido respeito por entendimento contrário, na senda do que já ficou enunciado, sem que exista dedução de embargos à execução por parte do recorrente (executado) e sem que estes sejam recebidos pelo tribunal não existe fundamento legal para se suspender a execução e, consequentemente, para que aquele recorra ao incidente de prestação espontânea de caução como meio de suspender aquela, impondo-se indeferir liminarmente o incidente de caução. Primo: porque não estando em discussão o direito de crédito acertado no título executivo (na medida em que o executado ainda nem sequer deduziu embargos à execução e, por isso, não pôs aquele direito em crise, nem o tribunal pôde aquilatar se estão (in)verificados os pressupostos para o seu recebimento e consequente discussão dos fundamentos que por ele foram invocados), face à prevalência de se ter de dar satisfação ao direito de crédito do exequente, postergar-se-ia, isso sim, de forma violadora do princípio da proporcionalidade o direito que lhe assiste, privando-o do direito à tutela jurisdicional efetiva de ver satisfeito esse seu direito de crédito. Secundo: ao admitir-se o incidente de prestação espontânea de caução por parte do executado sem que este tivesse deduzido oposição à execução mediante embargos e estes tivessem sido recebidos incorria-se na prática de uma atividade processual proibida pelo princípio da limitação dos atos (art. 130º), por potencialmente inútil, na medida em que essa atividade ficaria dependente do executado vir a deduzir embargos à execução e destes virem a ser recebidos.
Em suma, o executado apenas pode deduzir incidente de prestação espontânea de caução como meio de obter a suspensão da execução no caso de ter deduzido embargos e destes serem recebidos, sem que tal consubstancie qualquer violação ao princípio da proporcionalidade ou ao seu direito constitucional à tutela jurisdicional efetiva, antes, o contrário é que seria verdadeiro, na medida em que o entendimento por ele propugnado violaria o princípio da proporcionalidade para com o exequente, que tem o seu direito de crédito acertado em sentença judicial transitada em julgado, além de que postergaria o seu direito à tutela jurisdicional efetiva, ao privá-lo de obter a satisfação coerciva do seu direito de crédito, corporizado em título executivo, quando esse direito nem sequer foi ainda colocado em crise pelo executado nos termos legalmente prescritos para o efeito – dedução de oposição à execução por embargos que tivessem sido recebidos.
Decorre do excurso antecedente que o despacho recorrido, ao indeferir liminarmente o presente incidente de prestação de caução por precoce, não incorreu em nenhum dos erros de direito que lhe são assacados pelo recorrido, devendo o recurso improceder e confirmar-se o mesmo.
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V- Decisão
Nesta conformidade, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar o recurso improcedente e, em consequência, confirmam o despacho recorrido.
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Custas do recurso pelo recorrente uma vez que ficou “vencido” (art. 527º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
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Notifique.
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Guimarães, 02 de abril de 2025
José Alberto Moreira Dias – Relator
Susana Raquel Sousa Pereira – 1ª Adjunta
Alexandra Maria Viana Parente Lopes – 2ª Adjunta
[1] Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, vol. II, 2015, Almedina, págs. 395 e 396. [2] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, 2ª ed., Almedina, pág. 17. [3] José Lebre de Freitas, “A Ação Executiva À Luz do Código de Processo Civil de 2013”, 6ª ed., Coimbra Editora, págs. 43 a 44.
Ainda, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. II, Almedina, 2020, pág. 15: “O título executivo contém em si, com o grau de segurança suficiente, o acertamento do direito, de tal modo que, por princípio, a coberto desse título e sem necessidade de outras indagações, haverá de ser desenvolvida a atividade processual adequada a obter o pagamento da quantia exequenda, a entrega de certa coisa ou a prestação de facto positivo ou negativo (art. 10º, n.º 5). Ressalva-se a necessidade de diligências liminares tendentes a assegurar os requisitos de certeza, exigibilidade e liquidação da obrigação exequenda, nos termos dos arts. 713º a 716º, ou daqueles que fundamentam o pedido, nos termos do art. 724º, n.º 1, al. e)”. [4] Ac. R.C., de 05/11/2019, Proc. 3141/18.4T8PBL-B.C1, in base de dados da DGSI, onde constam todos os arestos que se venham a citar sem menção em contrário. [5] Miguel Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, Lisboa 1997 pág. 620. [6] Marco Carvalho Gonçalves, “Lições de Processo Civil”, 2016, Almedina págs. 195 e 196.
No mesmo sentido, José Lebre de Freitas, “A Ação Executiva À Luz do Código de Processo Civil de 2013”, 6ª ed., Coimbra Editora, págs. 193 e 194: “A oposição do executado visa a extinção da execução, mediante o reconhecimento da atual inexistência do direito exequendo ou da falta dum pressuposto, específico ou geral, da ação executiva. Constituindo os embargos de executado uma verdadeira ação declarativa, que corre por apenso ao processo de execução, nela é possível ao executado, não só levantar questões de conhecimento oficioso mas também alegar factos novos, apresentar novos meios de prova e levantar questões de direito que estejam na sua disponibilidade”. A fls. 212 e 213 acrescenta: “Diversamente da contestação da ação declarativa, a oposição à execução, constituindo, do ponto de vista estrutural, algo de extrínseco à ação executiva, toma o caráter duma contra-acção tendente a obstar à produção dos efeitos do título executivo e (ou) da ação que nele se baseia. Quando veicula uma oposição de mérito à execução, visa um acertamento negativo da situação substantiva (obrigação exequenda), de sentido contrário ao acertamento positivo consubstanciado no título executivo (judicial ou não), cujo escopo é obstar ao prosseguimento da ação executiva mediante a eliminação, por via indireta, da eficácia do título executivo (…). Quando a oposição tem um fundamento processual, o seu objeto é, já não uma pretensão de acertamento negativo do direito exequendo, mas uma pretensão de acertamento, também negativo, da falta de pressuposto processual, que pode ser o próprio título executivo, igualmente obstando ao prosseguimento da ação executiva, mediante o reconhecimento da sua inadmissibilidade”.
Ainda, Rui Pinto, “A Ação Executiva”, 2018, AAFDL Editora, págs. 365 a 369: “A oposição à execução é o meio processual pelo qual o executado exerce o seu direito de defesa perante o pedido do exequente. Contudo, são diferentes os termos e a função específica da defesa em sede de ação executiva e em sede de ação declarativa. Na ação declarativa o direito de defesa corporiza-se num ato, quase sempre articulado – a contestação – e visa obviar à declaração do direito alegado pelo autor. (…). Já na ação executiva, (…), o direito de defesa corporiza-se num pedido do executado de extinção da execução com fundamentos que para os títulos diversos da sentença têm, em geral, o teor próprio da contestação, mas que, na oposição à execução de sentença, além de mais restritos, se aproximam dos fundamentos do recurso de revisão por ilegalidade e das ações de reabertura do contraditório, i.e., dos meios de defesa contra uma decisão judicial. Processualmente, a defesa do executado não integra o procedimento de execução: tem a natureza de uma petição inicial que impulsiona uma ação declarativa, incidental à execução, fisicamente correndo por apenso. Nela o autor é o executado e o réu é o exequente. No final a sentença ditará a procedência ou improcedência do pedido de extinção da execução do autor-executado, parte passiva da execução. Trata-se de uma contra-acção (…), dotada de autonomia de instância, mas acessória da ação executiva, porquanto justificada pela sua estrita função de defesa de uma pretensão executiva: sem execução não há oposição. Desta acessoriedade decorre, ainda, tratar-se de uma ação especial, pelo objeto e pelo procedimento. (…) é uma ação declarativa processual e acessória e eventualmente, uma ação de simples apreciação da existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda. (…) no plano dos efeitos da sentença a procedência do pedido de oposição é estritamente processual – a extinção da execução”. [7] Miguel Teixeira de Sousa, ob. cit., págs. 640 e 641. [8] Ac. R.G., de 24/02/2022, Proc. 5242/20.0T8VNF-C.G1. [9] Acs. R.G., de 22/09/2011, Proc. 3582/10.5TBGMR-B.G1; de 27/11/2002, Proc. 658/02-2; R.P., de 09/02/2010, Proc. 5704/04.YYPRT-B.P1; de 07/04/2005, Proc. 0531715. [10] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., vol. II, pág. 93. [11] Ac. STJ., de 09/05/1991, Proc. 081821; R.L., de 09/05/1991, Proc. 0029526. [12] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., vol. II, págs. 93 e 94. [13] Alberto dos Reis, “Processo de Execução”, vol. 2º, Coimbra Editora, pág. 67. [14] Alberto dos Reis, ob. cit., pág. 66; Rui Pinto, ob. cit., págs. 416 e 417; Acs. R.P., de 11/03/2004, Proc. 0431008; R.C., de 05/11/2019, Proc. 3141/18.4T8PBL-B.C1. [15] Marco Carvalho Gonçalves, ob. cit., pág. 223; Acs. RL., de 01/02/2011, Proc. 3108/07.8TBCSC-B.L1-7; R.P., de 12/12/2002, Proc. 0232206; RC. de 05/11/2019, Proc. 3141/18.4T8 [16]Rui Pinto, ob. cit., pág. 416: “Apenas o executado-embargado, após o despacho de recebimento, pode requerer a prestação da caução para efeito de suspensão da execução, a qual não está sujeita a qualquer prazo, podendo ter lugar a todo o tempo. Portanto, trata-se de simples faculdade do executado e a execução só deverá ser suspensa depois de e se prestada a caução” (destacado nosso).
Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., vol. II, pág. 92, em que escrevem que o despacho de recebimento de embargos não suspende a execução, “a não ser nos casos taxativamente previstos, como ocorre quando o embargante preste caução (n.º 1, al. a)). Numa clara intenção de compatibilizar os interesses contrapostos do exequente e do executado, esta suspensão é justificada pelo facto de a prestação da execução, depois da admissão liminar dos embargos de executado, acautelar suficientemente o direito do exequente e simultaneamente revelar a seriedade da defesa do embargante. A caução assim prestada garante o cumprimento coercivo da prestação, na medida em que se os embargos forem julgados improcedentes, a satisfação do direito de crédito do exequente será feita através do acionamento da caução”. A fls. 95 adiantam que: “Se a petição inicial de embargos for liminarmente rejeitada por qualquer dos fundamentos do n.º 1 do art. 732º, não há que suspender a execução (mesmo que tenha sido interposto recurso de tal rejeição) e, consequentemente, não tem qualquer utilidade a prestação de caução que, por isso, nem sequer deve ser admitida (RP., de 19-02-2009, Proc. 0835843). Mas, se, entretanto, o tribunal de recurso revogar a decisão e mandar prosseguir os embargos, reabre-se a possibilidade de obter a suspensão da execução, apreciando-se então o requerimento de prestação de caução deduzido pelo embargante”.
Acs. R.P., de 16/06/2003, Proc. 0350283; R.L., de 14/05/1996, Proc. 0006741.