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INTERVENÇÃO PRINCIPAL
LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
IMPUGNAÇÃO DE PATERNIDADE
Sumário
I. É pressuposto da intervenção processual principal espontânea que o requerente faça valer nos autos um direito próprio, paralelo ao do autor ou do réu, apresentando com estes uma relação de litisconsórcio voluntário, necessário ou conjugal. II. Enquanto se não mostrar decidida, com trânsito em julgado, a acção de impugnação de paternidade proposta com vista a obter a declaração da paternidade sobre o menor, o autor desta não é titular de um interesse igual ao da mãe e legal representante do menor. III. Consequentemente, não assiste ao autor da acção de impugnação de paternidade pendente, a faculdade de intervir espontaneamente como parte principal fundada em litisconsórcio voluntário, na acção de indemnização por danos patrimoniais e morais próprios sofridos pelo menor em acidente de viação, intentada pela mãe em representação deste. (Sumário do Relator)
Texto Integral
Apelação 1793/15.6T8STR-A.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo Central Cível de Santarém – Juiz 4
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SUMÁRIO (artigo 663.º, n.º 7, do CPC): (…)
Acordam os Juízes na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora, sendo
Relator: Ricardo Miranda Peixoto;
1º Adjunto: Susana Ferrão da Costa Cabral; e
2ª Adjunto: Filipe César Osório.
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I. RELATÓRIO
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A.
Veio (…), na qualidade de legal representante de (…) e legítima herdeira de (…), na presente acção declarativa comum proposta contra “(…) Seguros, Companhia de Seguros de (…), S.A.” e (…) e, solidariamente, “Fundo de Garantia Automóvel”, pedir a condenação dos Réus, por si, na proporção da sua responsabilidade ou solidariamente, a pagar aos Autores:
1. Pela morte de (…), a quantia de € 350.000,00, sendo: a) € 75.000,00 pelo dano moral de vítima; b) € 100.000,00 pelo direito à vida; c) € 175.000,00 a título de danos morais assim repartidos: - € 100.000,00 para a mãe do menor (…); e - € 75.000,00 para o irmão (…);
2. Pelos danos sofridos pelo menor (…) a quantia de € 94.651,80, sendo: a) € 34.651,15 a título de danos patrimoniais; b) € 60.000,00 a título de danos não patrimoniais.
Em qualquer dos casos, acrescidas de juros legais, contados desde a data da citação até integral pagamento.
Alegou para o efeito que os montantes peticionados correspondem à indemnização de que os Autores são beneficiários por danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes da morte do seu filho, irmão do representado, em consequência de acidente de viação que consistiu no embate do veículo automóvel de matrícula (…), conduzido pelo Réu (…), onde os Autores seguiam como passageiros e que não dispunha de seguro de responsabilidade civil automóvel, com o veículo automóvel de matrícula (…), conduzido por (…), segurado pela Ré “(…) Seguros”.
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B.
Com data de 11.03.2024 (ref.ª Citius 48237911), (…), na qualidade de pai, representante e herdeiro dos menores (…) e (…), requereu a sua intervenção principal espontânea por litisconsórcio necessário activo e, subsidiariamente, intervenção principal espontânea por litisconsórcio voluntário activo.
Alegou, como fundamento do pedido principal que, pese embora não figurar averbada no registo civil a paternidade do menor (…), propôs já acção de impugnação de paternidade e perfilhação que corre os seus termos com o n.º 544/24.9T8STR no Juízo de Família e Menores de Santarém, Juiz 2, na qual pede a declaração de que os menores são filhos do Requerente. Nesses autos, foi proferido despacho referindo que, pretendendo o Requerente perfilhar o falecido (…), terá de o fazer por declaração prestada perante o funcionário do registo civil, de acordo com o disposto nos artigos 1853.º e 1854.º do Código Civil por tal perfilhação não ser possível através de acção judicial, prosseguindo esta apenas relativamente ao menor (…). Sendo o Requerente pai do menor falecido e vindo a verificar-se que é pai do menor (…), a Autora (…) padece de ilegitimidade para sozinha representar os seus dois filhos menores nos presentes autos, nos termos do disposto nos artigos 16.º e 33.º do CPC.
Em abono do pedido de intervenção subsidiário sustentou que, por procuração outorgada no notário, no dia 23 de Dezembro de 2019, a Autora (…), atribuiu e concedeu ao Requerente, plenos poderes irrevogáveis de representação e mandato, nomeadamente quanto aos presentes autos. Tal procuração foi lavrada porque, na mesma data, foi outorgado pela Autora (…), um acordo particular autenticado por notário, onde esta declara dar todas as indemnizações e valores que advenham a seu favor no âmbito dos presentes autos, ou outros que venham a ser instaurados por apenso, ou não, a estes. Assim, a Autora deixou de ter interesse material nos presentes autos.
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C.
Por requerimento junto com a ref.ª Citius 48588639, veio o (…) requerer a junção aos autos das certidões:
- do registo n.º (…) do ano de 2024 da Conservatório do Registo Civil de Lisboa, referente ao Assento de Perfilhação n.º (…) do ano de 2024, do qual consta o ora signatário como perfilhante do seu filho (…), A. nos presentes autos;
- do assento de óbito n.º (…) do ano de 2011 da Conservatória do Registo Civil de Santarém, do A. (…), disponível por consulta no portal do “Civil Online” com o código de acesso (…), do qual consta o Averbamento n.º 1, de 2024-04-01 com a menção de “Completado no sentido de passar a constar que o nome do pai do falecido é (…).”
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D.
Na data de 28.05.2024, foi proferido o despacho com a ref.ª Citius 96634315 com o seguinte teor (transcrição integral, sem sublinhados e negrito da origem):
“Pedido de intervenção principal espontânea deduzido por (…)
Em requerimento dado entrada em juízo a 11 de Março de 2024, veio o acima referido para lá do pedido de suspensão dos autos a apreciar mais abaixo, pedir a sua intervenção principal provocada espontânea por litisconsórcio voluntário activo. Alega que a Autora (…) lhe atribuiu e concedeu plenos poderes irrevogáveis de representação e mandato, quanto aos presentes autos, através de procuração outorgada em 23 de Dezembro de 2019. Da simples leitura da procuração resulta que a A. possibilitou ao Requerente que este a representasse nos autos a todo o tempo podendo ainda substabelecer. E fê-lo porque, na mesma data (23 de Dezembro de 2019) foi outorgado pela própria Autora (…), um acordo particular, onde esta declara dar todas as indemnizações e valores que advenham a seu favor no âmbito dos presentes autos ou outros que venham a ser instaurados por apenso ou não a estes, conforme Acordo Particular Autenticado no Cartório Notarial de Santarém a cargo do Notário (…), que se junta como Doc. 6 e, se dá aqui por integralmente reproduzido. Assim, a Autora deixou de ter interesse material nos autos e o Interveniente tem interesse em nela intervir.
Foram juntos documentos e exercido o contraditório
Apreciando:
1- Em 29 de Junho de 2015 a A. (…) propôs a presente acção contra (…) Seguros, S.A. (…) e Fundo de Garantia Automóvel.
2- Em acta de audiência prévia de 27 de Janeiro de 2020 foi a A. considerada parte legítima para demandar, proferido saneador, selecionados os termas da prova e indicado o objecto do litígio.
3- Em 14 de Dezembro de 2023 foi designada data para julgamento, a saber o dia 14 de Março de 2024.
4- Em 11 de Março de 2024 foi apresentado o requerimento supra.
5- Em 23 de Dezembro de 2019 (…) outorgou procuração a favor do Requerente onde além do mais que aqui se reproduz se deixou escrito:
E por ela foi dito:
Que, pelo presente instrumento, constitui seu bastante procurador o Sr. (…), solteiro, maior, natural da Roménia, de nacionalidade romena, consigo residente, NIF (…), portador do Certificado de Registo de Cidadão da União Europeia n.º (…), válido ate 29.12.2022, emitido pela Câmara Municipal de Alpiarça e portador do passaporte n.º (…), válido até 18.05.2022, emitido pelas entidades competentes da Roménia, a quem confere plenos poderes para a representar em qualquer Tribunal ou Juízo, apresentar queixas criminais, usando para o efeito de todos os poderes forenses em direito permitidos, podendo ainda transigir, confessar, desistir ou por qualquer forma obrigar-se por acordo em qualquer ação ou pleito, ato ou diligência judicial e, ainda, praticar o mais que for necessário, podendo substabelecer em quem couber, com a obrigação de o fazer em relação aos poderes forenses, em advogado ou pessoas legalmente habilitadas, quando tenha que recorrer a juízo, nomeadamente no processo judicial número 1793/15.6T8STR, que corre os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca Santarém, Juízo Central Cível de Santarém, Juiz 4, aplicando-se contudo, tais poderes aqui mandatados, a quaisquer outros processos atos ou diligências. Mais lhe confere ainda os necessários poderes ao mandatário para receber quaisquer valores, indemnizações, custas, juros ou outros que venham a ser concedidos no âmbito de quaisquer processos judiciais, nomeadamente o supra identificado, sem restrição na forma de pagamento ou valor a receber.
Que a presente procuração e mandato são irrevogáveis, nos termos do n.º 23 do artigo 265.º e do n.º 2 do antigo 1170.º ambos do Código Civil, em virtude de serem conferidos também no interesse do mandatário, sendo que a mandante dá desde já o consentimento previsto no n.º 1 do artigo 261º do Código Civil, podendo o mandatário celebrar negócio consigo mesmo.
É ainda atribuída a faculdade ao mandatário ou procurador, nos termos do artigo 264.º do Código Civil, de se fazer substituir por outrem na prática dos atos para que se encontrar mandatado, podendo ainda substabelecer a presente procuração, total ou parcialmente, com ou sem reservas, devendo porém, substituir-se por advogado ou procurador habilitado, sempre que tenha de estar em juízo ou que tal se mostre necessário ou conveniente.
6- Na data indicada em 6 foi reconhecido por termo de autenticação um acordo celebrado entre (…) e o Requerente com o seguinte conteúdo:
«Cláusula Primeira
A Primeira Outorgante dá ao Segundo Outorgante, e este por seu turno aceita para si, todas as indemnizações e valores que venham a ser decretadas a favor da Primeira Outorgante no âmbito do Processo Judicial n.º 1793/15.6T8STR, que corre os seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo Central Cível de Santarém, Juiz 4 e, ainda de outros processos que venham a ser instaurados, por apenso ou não, desta ação.
Cláusula Segunda
A Primeira Outorgante expressamente declara que autoriza, após o recebimento das quantias acima mencionadas, que o Segundo faça seu e o que entender aos valores que venha a receber, nada podendo reclamar ou exigir depois ao Segundo Outorgante.
Cláusula Terceira
Os valores ora prometidos na cláusula antecedente são resultantes de todas as despesas e valores suportados pelo Segundo à Primeira Outorgante para sua subsistência.
Cláusula Quarta
Ambas as partes convencionam que todos os valores a receber sejam pagos por transferência bancária para o IBAN PT50 (…), do Banco da Caixa Geral de Depósitos de que o Segundo Outorgante é titular.
Cláusula Quinta
A Segunda Outorgante reconhece a presente confissão de dívida força executiva nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 703.º do Código de Processo Civil.
Santarém, 23 de dezembro de 2019
A Primeira Outorgante,
O Segundo Outorgante, (…).»
Dispõe o artigo 313.º do CPC que:
“1 - A intervenção do litisconsorte, realizada mediante adesão aos articulados da parte com quem se associa, é admissível a todo o tempo, enquanto não estiver definitivamente julgada a causa. 2 - A intervenção por mera adesão é deduzida em simples requerimento, fazendo o interveniente seus os articulados do autor ou do réu. 3 - O interveniente sujeita-se a aceitar a causa no estado em que se encontrar, sendo considerado revel quanto aos atos e termos anteriores, gozando, porém, do estatuto de parte principal a partir do momento da sua intervenção. 4 - A intervenção não é admissível quando a parte contrária alegar fundadamente que o estado do processo já não lhe permite fazer valer defesa pessoal que tenha contra o interveniente.”
Segundo o artigo 314.º do CPC:
“A intervenção mediante articulado só é admissível até ao termo da fase dos articulados, formulando o interveniente a sua própria petição, se a intervenção for ativa, ou contestando a pretensão do autor, se a intervenção for passiva”.
Voltando ao caso dos autos, verifica-se que o pedido de intervenção não foi feito por mera adesão do Interveniente ao articulado da Autora mas ao invés mediante articulado próprio, parecendo até, vista a alegação, que pretenderia substituir a Autora que lhe terá outorgado procuração para passar a ser representada nestes autos por ele, mais dizendo que a Autora lhe terá concedido os direitos que lhe venham a ser atribuídos nesta demanda.
Pois bem, é de indeferir o pedido de intervenção por ter sido feito fora do prazo a que alude o artigo 314.º do CPC, e bem assim pela circunstância de o Interveniente não pretender associar-se à Autora ao invés substituí-la.
Ora a A. é parte legítima neste demanda, e a acção pode e deve prosseguir do lado activo apenas com ela, tendo já sido a sua legitimidade apreciada não apenas tabelarmente mas por despacho que depois de analisados os argumentos invocados nos autos concluiu por essa mesma legitimidade.
E a legitimidade, ou seja, o interesse na demanda afere-se à data em que a acção foi proposta, a saber, 2015 momento muito anterior ao da procuração acima mencionada no ponto 5.
Pelo exposto, e porque foi esse o pedido formulado, aqui chegados não se admite a intervenção principal provocada espontânea do lado activo de (…).
Custas pelo incidente a cargo do Interveniente no montante de 4 UC já liquidados.
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Suspensão da instância pedida pelo Interveniente (…).
Pede o acima indicado a suspensão da presente instância até seja decidida acção de impugnação de paternidade/perfilhação por ele intentada na qual pretende sejam declarados (…) e (…) como seus filhos.
A Autora representa nestes autos o menor (…) e apresenta-se como herdeira do falecido (…).
Apreciando:
Diz o artigo 272.º do CPC que: 1 - O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado. 2 - Não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens. 3 - Quando a suspensão não tenha por fundamento a pendência de causa prejudicial, fixa-se no despacho o prazo durante o qual estará suspensa a instância. 4 - As partes podem acordar na suspensão da instância por períodos que, na sua totalidade, não excedam três meses, desde que dela não resulte o adiamento da audiência final.
Ora a decisão desta causa não está dependente do julgamento da acção de impugnação de paternidade/perfilhação, a qual seja procedente ou improcedente nenhum relevo tem para a matéria a apreciar nestes autos – trata-se neste processo de acidente de viação e indemnizações eventualmente a atribuir à A. enquanto herdeira de um seu falecido filho e representante legal de um outro filho menor - e mesmo que tivesse não se ordenaria a suspensão, já que a causa dependente, esta está tão adiantada – já havia sido marcado julgamento – que os prejuízos da suspensão sempre superariam as vantagens.
Pelo exposto indefere-se o pedido de suspensão da instância. (…)”.
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E.
Inconformado com o assim decidido, o Requerente (…) interpôs, a 21.06.2024 (ref.ª Citius 49280022), recurso de apelação.
Concluiu as suas alegações nos seguintes termos (transcrição, mantendo as referências em itálico da origem):
“(…)
1. O Recorrente não se conforma com a decisão recorrida, desde logo, porque o seu primeiro pedido, mormente a intervenção principal espontânea por litisconsórcio necessário activo, não ter sido sequer analisado no despacho recorrido.
2. O despacho recorrido fundamenta a sua decisão de indeferimento, limitando-se a apreciar apenas e, tão só, o pedido de intervenção principal espontânea por litisconsórcio voluntário activo e da suspensão da instância.
3. O Recorrente além da suspensão da instância por via da qual, ainda aguarda os ulteriores termos da Ação Declarativa de Impugnação de Paternidade quanto ao A. (…), requereu a sua intervenção principal espontânea por litisconsórcio necessário activo quanto ao A. (…).
4. Sendo que a paternidade do A. (…) estava apenas dependente da concretização do registo na Conservatória do Registo Civil aquando da entrada do requerimento do incidente, cujo registo logo que foi lavrado, foi junto aos presentes autos pelas competentes certidões de nascimento e óbito (antes de ser proferido o douto despacho).
5. Sucede que tal qualidade não foi sequer apreciada, circunscrevendo-se inclusivamente ao pedido central submetido pelo Recorrente, que merecia toda a atenção do Tribunal, desde logo porque motiva um caso de litisconsórcio necessário, que diga-se é de conhecimento oficioso.
6. Além de que, o facto do Tribunal a quo ter ignorado todos os factos acima expostos, bem como, o pedido intervenção principal espontânea por litisconsórcio necessário activo, constitui uma nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, porquanto ser um dever do julgador resolver as todas as questões submetidas pelas partes à sua apreciação, nos termos do artigo 608.º, n.º 2, do CPC.
7. Nulidade que o Apelante expressamente vem arguir.
8. Quanto ao pedido de intervenção principal espontânea por litisconsórcio voluntário activo, veio o Tribunal a quo indeferir o pedido do Recorrente, baseando-se no disposto artigo 314.º do CPC, por um lado, por estar fora de prazo e, por outro porque o Recorrente apenas pretendia substituir a Autora (…) ao invés de se associar à mesma.
9. Porém, não pode o Recorrente conformar-se com tal indeferimento, desde logo, porque, o seu pedido/requerimento não foi fundamentado nos termos do disposto no artigo 314.º do CPC – aliás, diga-se, nem sequer foi mencionado tal preceito legal para sustentar o seu pedido – nem o seu requerimento versou sobre a sua própria petição, como estipula tal mecanismo de intervenção.
10. Com a devida vénia, não pode o Tribunal a quo invocar um mecanismo legal – Intervenção mediante articulado próprio – quando não foi sequer invocado pelo Recorrente no seu requerimento, nem tão pouco se verifica em todo o seu teor algum indício concreto que pudesse levar o Tribunal a quo a aplicar ou a relacionar com tal instituto.
11. Ora, se o Recorrente não apresentou qualquer petição, ou seja, um articulado próprio, parece intrínseco que o Recorrente o que pretendia – através do seu requerimento simples – era, pois, aderir aos articulados já constantes dos autos, nos termos do artigo 313.º do CPC, até porque é o mecanismo passível de admitir a sua intervenção a todo o tempo, enquanto não estiver definitivamente julgada a causa.
12. De salientar por outro modo, que o Recorrente não limitou o seu pedido à eventual substituição da Autora (…), aliás, ao longo dos artigos 19.º e 20.º do seu requerimento, pretendeu deixar claro que os seus interesses nos autos seriam iguais ao da posição da Autora (…), sendo o seu pedido claro no sentido de: “Deverá ser deferida a intervenção principal, espontânea por litisconsórcio voluntário activo”.
13. O Tribunal a quo pelos documentos juntos depreendeu, diga-se, erradamente, que o intuito do Recorrente seria apenas a substituição da Autora (…), contudo, este apenas pretendeu fundamentar e demonstrar ao tribunal o seu propósito para intervir nos autos também nessa qualidade e, por tais motivos que se arrogam nos referidos documentos.
14. Nesta vertente o despacho recorrido deverá ser revogado, considerando que o Recorrente deverá ser admitido a intervir nos autos por litisconsórcio voluntário do lado activo, aderindo, aceitando e fazendo seus, todos os articulados da Autora (…).
15. No que refere ao indeferimento da suspensão da instância, alega entre o demais que a Autora (…) é parte legitima para sozinha representar os Autores (…) e (…), atento o facto de, tal questão já ter sido apreciada nos autos por Despacho.
16. Acontece, porém e, o Tribunal a quo não o equacionou, que as circunstâncias analisadas aquando do despacho que apreciou a exceção dilatória da legitimidade da Autora (…), alteraram na medida em que:
17. No que concerne à paternidade do Autora (…) não havia qualquer registo no seu assento de nascimento, logo a administração da herança era exercida apenas pela mãe.
18. E, no que concerne à representação do Autora (…) há um acordo de regulação dos poderes paternais do anterior marido da Autora (…).
19. Situações que vieram a ser alteradas, primeiro através do registo da paternidade do Recorrente relativo ao Autor (…) e, segundo através da ação de impugnação de paternidade que se encontra a decorrer quanto ao Autor (…).
20. O Tribunal a quo apenas relacionou e, ponderou a pertinência da ação de paternidade com a própria matéria a apreciar nos autos e com o julgamento da ação – indemnização dos Autores menores derivados de um processo de acidente de viação, sendo que o relevo de tal matéria suscitada em nada se relaciona com a ação per si mas antes com os intervenientes em causa.
21. Ou seja, por um lado, o (…), menor sendo incapaz do exercício de direitos, não dispõe de capacidade judiciária (artigo 9.º do CPC, artigos 122.º, 123.º e 124.º do CC), sendo apenas suprida a sua incapacidade, com a representação em juízo pelos dois progenitores, o que sucede com estes pais na vida corrente do menor, aguardando-se apenas decisão judicial para a sua aplicação legal e judiciária, o que levou o Recorrente a requerer a suspensão da instância dos presentes autos.
22. E, e por outro da administração da herança do Autor (…), sendo que “os direitos relativos à herança só podem ser exercidos conjuntamente por todos os herdeiros ou contra todos os herdeiros”, não havendo dúvidas que o alcance de que tal pressuposto do artigo 2091.º, n.º 1, do CC se cumpre apenas com a presença de todos os herdeiros nos presentes autos.
23. Atento o demais, que nesta parte – de intervenção por herdeiro do Autor (…) – nem sequer se põe em causa a necessidade de suspensão da instância, como à luz do Tribunal a quo foi erradamente analisada, como se percebe entre outras pelo seguinte: “(…) até seja decidida acção de impugnação de paternidade/perfilhação por ele intentada na qual pretende que sejam declarados (…) e (…) como seus filhos.”
24. Dado o registo de paternidade, já se encontrar registado sobre o (…) e, a ação já nem correr quanto a este, mas somente quanto à paternidade do (…).
25. Como tal, o litisconsórcio necessário sobre o Autor (…) devia ter merecido uma análise distinta da suspensão por via do litisconsórcio necessário sobre o Autor (…).
26. Devendo o Recorrente ser admitido a intervir nos autos como herdeiro do Autor (…) e, por outro lado, não sendo intrínseco nem cumulativo,
27. Ser a instância suspensa até que seja decretado a paternidade sobre o Autor (…) e, de assim poder representá-lo em juízo conjuntamente com a sua mãe, Autora (…).
Termos em que e, nos que serão objecto do Douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se o Despacho Recorrido, em conformidade com o alegado e fundamentado, com o que se fará JUSTIÇA!”
*
F.
Os Recorridos não responderam às alegações do Recorrente.
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G.
Por despacho proferido a 24.10.2024 com a ref.ª Citius 97845859, a Sr.ª Juíza de 1ª instância conheceu da nulidade suscitada no recurso interposto e, declarando a omissão de pronúncia quanto à apreciação do requerimento de intervenção principal espontânea por litisconsórcio necessário activo, supriu-a nos seguintes termos (transcrição parcial):
“Lê-se no artigo 312.º do CPC que o interveniente principal faz valer um direito próprio, paralelo ao do autor ou do réu, apresentando o seu próprio articulado ou aderindo aos apresentados pela parte com quem se associa.
E no artigo 313.º do CPC lê-se: 1 – A intervenção do litisconsorte, realizada mediante adesão aos articulados da parte com quem se associa, é admissível a todo o tempo, enquanto não estiver definitivamente julgada a causa. 2 – A intervenção por mera adesão é deduzida em simples requerimento, fazendo o interveniente seus os articulados do autor ou do réu. 3 – O interveniente sujeita-se a aceitar a causa no estado em que se encontrar, sendo considerado revel quanto aos atos e termos anteriores, gozando, porém, do estatuto de parte principal a partir do momento da sua intervenção. 4 - A intervenção não é admissível quando a parte contrária alegar fundadamente que o estado do processo já não lhe permite fazer valer defesa pessoal que tenha contra o interveniente.
Quanto ao processado, dispõe o artigo 315.º, n.º 1, do CPC, que, requerida a intervenção, o juiz, se não houver motivo para a rejeitar liminarmente, ordena a notificação das partes primitivas para lhe responderem, decidindo logo da admissibilidade do incidente.
Assegurado o contraditório às partes, a Autora apresentou requerimento (datado de 22/03/2024), opondo-se à intervenção de (…), alegando, em síntese, que, independentemente de ser pai de (…) e de (…), ao contrário do alegado na petição inicial, o mesmo foi um dos causadores do acidente que se discute nos autos, enquanto condutor do veículo interveniente no referido acidente, e não, como erradamente se fez constar na petição inicial, (…), quando este, à data, sequer estava em território nacional. Sob essa alegação, requereu a intervenção na ação de (…), enquanto Réu, coligado com o FGA, o que foi indeferido no despacho judicial datado de 28/05/2024.
(…), requerendo a sua intervenção nos autos, do lado ativo, com vista a, na qualidade de pai, representar o seu filho menor (…), e, na qualidade de herdeiro, representar o seu filho falecido (…), deduziu incidente de intervenção principal espontânea e necessária ativa. Sustenta o seu pedido sob a alegação que, sendo pai dos referidos (…) e (…), representados em Juízo apenas pela sua mãe, a Autora (…), deve intervir na ação nos termos do disposto nos artigos 16.º e 33.º do CPC.
Deste modo, (…) invoca um interesse/direito próprio, igual e paralelo ao da Autora. E fê-lo sem que tivesse apresentado um articulado próprio. Por outro lado, uma vez reconhecida a alegada paternidade, deve o mesmo ser admitido a intervir nos autos, na qualidade que se arroga, uma vez que, de acordo com o disposto no artigo 16.º do CPC, 1 – Os menores (...) só podem estar em juízo por intermédio dos seus representantes, exceto quanto aos atos que possam exercer pessoal e livremente 2 – Os menores cujo exercício das responsabilidades parentais compete a ambos os pais são por estes representados em juízo, sendo necessário o acordo de ambos para a propositura de ações.
Uma vez que a presente causa ainda não está julgada e não tendo o requerente apresentado um articulado próprio, o requerimento para intervenção do lado ativo é tempestivo.
Importa agora aferir do mérito do pedido de intervenção principal espontânea.
Relativamente a (…), filho da Autora e falecido a 7/09/2011 (antes da propositura da presente ação), o requerente juntou aos autos assento de perfilhação n.º 22 do ano 2024, através do qual (…) figura como perfilhante de (…), e assento de óbito deste, no qual se mostra averbado o nome do pai do falecido como sendo (…).
Pelo que, por força da perfilhação ocorrida na pendência da presente ação, reconhecida que está a paternidade de (…) relativamente ao falecido (…), tendo este falecido no estado de solteiro e sem deixar descendentes, os herdeiros legais são os seus ascendentes, progenitores (cfr. artigo 2133.º, n.º 1, alínea b), do Código Civil), a saber: (…) e (…).
E, enquanto herdeiro legal de (…), (…) tem um direito próprio, paralelo ao da Autora (…) para intervir nos autos.
Pelo que, diante de tudo o exposto, admite-se a intervenção principal espontânea de (…) para figurar na ação como parte ativa ao lado de (…), na qualidade de herdeiro legal de (…).
Relativamente a (…), a paternidade de (…) não se mostra reconhecida, estando pendente ação judicial com vista a tal reconhecimento. Por esse motivo, o requerente pediu a suspensão da instância até prolação da respetiva sentença.
Ora, não estando a paternidade de (…) reconhecida / demonstrada por qualquer forma, como, de resto, o próprio reconhece, apesar de alegada, não se observa qualquer direito próprio do requerente, paralelo ao da Autora (…) para intervir nos autos.
Sem prejuízo, conforme se consignou no despacho saneador, a respeito da invocada ilegitimidade ativa, da certidão de nascimento do menor em causa (fls. 137) e da sentença judicial proferida no processo de divórcio (fls. 224 verso a 230 verso), o exercício do poder paternal / responsabilidades parentais, foi atribuído em exclusivo à Autora (…), situação esta que se mantém.
Pelo que, indefere-se o pedido de intervenção principal espontânea de (…) para figurar na ação como parte ativa ao lado de (…), na qualidade de herdeiro legal de (…).
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Quanto à suspensão da instância requerida até prolação da ação que corre termos sob o processo n.º 544/24.9T8STR no Juízo de Família e Menores de Santarém – Juiz 2, tendo o Tribunal expressamente se pronunciado sobre a mesma, no despacho objeto de recurso, não ocorre qualquer nulidade que cumpra sanar, o mesmo se dizendo quanto ao pedido de intervenção principal espontânea por litisconsórcio voluntário ativo na qualidade de representante, procurador e mandatário da Autora (…).
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De acordo com o disposto no artigo 644.º, n.º 2, alínea c), do CPC, cabe recurso de apelação da decisão que decrete a suspensão da instância.
Ora, tendo o despacho, objeto do recurso, decidido indeferir o pedido para suspensão a instância, o mesmo não é passível de recurso.
Razão pela qual, por inadmissibilidade legal, não se admite o recurso quanto a esse segmento decisório.
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Quanto à decisão proferida sobre os pedidos de intervenção principal espontânea, tratando-se de incidente processado nos autos de forma autónoma, é passível de recurso de apelação autónoma nos termos do n.º 1 (parte final) do artigo 644.º do CPC.
A par, o recurso foi interposto em tempo e o requerente tem legitimidade, nos termos previstos nos artigos 638.º, n.º 1 e 631.º do CPC, respetivamente.
O recurso sob em separado – artigo 645.º, n.º 2, do CPC.
O recorrente requereu que fosse atribuído efeito suspensivo ao recurso, dizendo que a execução da decisão causar-lhe-á prejuízo considerável e ofereceu-se a prestar caução, nos termos do n.º 4 do artigo 647.º do CPC.
Sucede que, sem embargo de ter alegado um prejuízo considerável, o recorrente não o concretizou, nem o fundamentou. Importaria, pois, que o recorrente, alegasse factos cuja apreciação cuja apreciação permitisse ao Tribunal concluir pela verificação do específico periculum a que a lei se reporta.
Pelo que indefere-se a atribuição de efeito suspensivo ao recurso.
O recurso tem efeito meramente devolutivo – artigo 647.º, n.º 1, do CPC.
Concluindo, admite-se o requerimento para interposição de recurso de apelação autónoma do despacho judicial datado de 28/05/2024, com ressalva do aí decidido a respeito da suspensão da instância por inadmissibilidade legal, a subir em separado e com efeito devolutivo.
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Sem prejuízo, face ao decidido neste despacho a respeito da nulidade invocada, notifique o recorrente nos termos e para os efeitos previstos no n.º 3 do artigo 617.º do CPC. (…)”
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H.
Com data de 09.12.2024, foi proferido despacho (ref.ª Citius 98329318) contendo, entre outro, o seguinte teor:
“Nos termos constantes do despacho que antecede, notificado o recorrente (…), nos termos e para os efeitos previstos no n.º 3 do artigo 617.º do CPC, nada disse, decorrido que se mostra o prazo legal para o efeito.
Pelo que, a fim de tramitar-se o recurso aí admitido, crie-se o competente apenso e instrua-o, nos termos determinados no despacho que antecede, fls. 7.”
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G.
Colheram-se os vistos dos Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos.
*
H.
Questões a decidir
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações dos Recorrentes, sem prejuízo da sua ampliação a requerimento dos Recorridos (artigos 635.º, n.º 4, 636.º e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).
Não é, assim, possível conhecer de questões nelas não contidas, salvo se forem do conhecimento oficioso (artigo 608.º, n.º 2, parte final, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, parte final, ambos do CPC).
Também está vedado o conhecimento de questões novas (que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de questões prévias judiciais, destinando-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente confirmação, anulação, alteração e/ou revogação.
No caso vertente, o recurso apresentado pelo Recorrente incide sobre dois despachos distintos, ambos proferidos no dia 28.05.2024:
a) Um, julgando improcedente o pedido de intervenção principal espontânea fundado em situação de litisconsórcio voluntário activo, por si formulado nos presentes autos; e
b) Outro, indeferindo o pedido de suspensão da instância até que seja decidida acção de impugnação de paternidade / perfilhação por ele intentada, referente a … e … (acção que, actualmente, apenas tem por objecto a impugnação da paternidade sobre o …).
a)
Relativamente ao primeiro despacho objecto do recurso, as questões suscitadas nas alegações de recurso são as seguintes:
a.i.
Nulidade por omissão de pronúncia do despacho que julgou improcedente o pedido de intervenção espontânea por si formulado.
O conhecimento desta nulidade encontra-se prejudicado pela oportuna apreciação, por despacho proferido pela Sr.ª Juíza de 1ª instância a 24.10.2024, da questão que havia sido omitida, consistente no fundamento da existência de litisconsórcio necessário activo para a requerida intervenção processual.
Está, assim, sanado o primeiro fundamento do recurso.
a.ii.
Contrariamente ao que pressupôs o despacho recorrido, o pedido de intervenção principal espontânea baseando em situação de litisconsórcio voluntário activo, não foi formulado na modalidade da apresentação de articulado próprio, nem o Recorrente pretendeu substituir-se à Autora (…).
Uma vez que por despacho proferido a 24.10.2024, apreciando o fundamento que havia sido omitido no despacho de 28.05.2024, foi entretanto admitida a intervenção principal espontânea do Recorrente ao lado de (…), na qualidade de herdeiro legal de (…) e de litisconsorte necessário activo, o objecto do recurso encontra-se agora limitado à parte em que o Recorrente se arroga a qualidade de herdeiro legal de (…) e de litisconsorte voluntário activo, relativamente à qual o despacho de 24.10.2024, julgando improcedente o pedido de intervenção espontânea fundado em alegado litisconsórcio necessário, não produziu qualquer alteração na situação processual do Recorrente que havia sido determinada pelo despacho recorrido.
b)
Relativamente ao segundo despacho recorrido – que julgou improcedente a requerida suspensão da instância –, o recurso não foi admitido, conforme decorre do despacho do dia 24.10.2024.
Está, por isso, fora do objecto de pronúncia do presente acórdão.
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Deste modo, é apenas uma, a questão, exclusivamente jurídico - processual, em apreciação no presente recurso:
1. Se é admissível, por se verificar situação de litisconsórcio voluntário activo, a intervenção processual principal espontânea do Recorrente nos presentes autos, enquanto herdeiro legal do Autor (…), nos termos do artigo 313.º do CPC, aderindo, aceitando e fazendo seus todos os articulados da Autora (…).
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II. FUNDAMENTAÇÃO
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A. De facto
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O recurso é exclusivamente de direito e os elementos relevantes para a decisão constam do relatório antecedente.
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B. De direito
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Dos pressupostos da intervenção processual principal espontânea
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Invoca o Recorrente a incorrecta apreciação do pedido subsidiário de intervenção principal espontânea por litisconsórcio voluntário activo, alegando que:
- por um lado, foi formulado com vista a aderir aos articulados já constantes dos autos, nos termos do artigo 313.º do CPC, sendo admissível a todo o tempo enquanto, enquanto não estiver definitivamente julgada a causa;
- por outro, não limitou o seu pedido à eventual substituição da Autora (…), tendo deixado claro, nos artigos 19.º e 20.º do seu requerimento, que os seus interesses nos autos seriam iguais aos da posição da Autora (…).
Vejamos se lhe assiste razão.
De acordo com a previsão legal do artigo 311.º do CPC, “estando pendente causa entre duas ou mais pessoas, pode nela intervir como parte principal aquele que, em relação ao seu objeto, tiver um interesse igual ao do autor ou do réu, nos termos dos artigos 32.º, 33.º e 34.º”.
O incidente em apreço permite “…a integração na lide de alguém que aí deveria ou poderia (conforme os casos) estar desde o início, em regime de litisconsórcio necessário ou conjugal (artigos 33.º e 34.º) ou litisconsórcio voluntário (artigo 32.º).”[1]
Deste modo, o recurso a esta figura de modificação subjectiva da instância pressupõe a existência de uma situação de litisconsórcio voluntário, necessário ou conjugal entre o interveniente e uma das partes da acção.
Através do incidente de intervenção em apreço, o terceiro faz valer um direito próprio, paralelo ao do autor ou do réu (cfr. artigo 312.º do CPC), podendo limitar-se a aderir ao articulado apresentado pela parte a que se associa ou, se o pretender, oferecer “…o seu próprio articulado, aduzindo argumentos que lhe sejam convenientes ou lhe digam mais especificamente respeito, ou mesmo, no caso de litisconsórcio voluntário ativo, deduzindo pretensão especifica.”[2]
Relativamente à intervenção por mera adesão, modalidade que o Recorrente invoca ter visado com o requerimento apresentado em juízo, prevê o artigo 313.º do CPC que:
“1 - A intervenção do litisconsorte, realizada mediante adesão aos articulados da parte com quem se associa, é admissível a todo o tempo, enquanto não estiver definitivamente julgada a causa.
2 - A intervenção por mera adesão é deduzida em simples requerimento, fazendo o interveniente seus os articulados do autor ou do réu.
3 - O interveniente sujeita-se a aceitar a causa no estado em que se encontrar, sendo considerado revel quanto aos atos e termos anteriores, gozando, porém, do estatuto de parte principal a partir do momento da sua intervenção.
4 - A intervenção não é admissível quando a parte contrária alegar fundadamente que o estado do processo já não lhe permite fazer valer defesa pessoal que tenha contra o interveniente.”
Segundo Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Filipe Pires de Sousa, “a intervenção por mera adesão tem um carácter mais limitado do que a expressa pela apresentação de articulado próprio, pela simples razão de que, no caso da adesão, o objeto da causa está balizado pela atuação anterior da parte a que o interveniente se associa. (…) É este carácter limitado da adesão que justifica que tal forma de intervenção seja possível a todo o tempo (…) enquanto não houver decisão definitiva sobre a causa (artigo 628.º). Este tipo de intervenção, exatamente porque o interveniente nenhum argumento aduz, é feito por simples requerimento, limitando-se o terceiro a fazer seus os articulados já constantes dos autos e apresentados pela parte à qual se associa. É também por isso que o interveniente por mera adesão fica vinculado a tudo quanto se processou nos autos até ao momento em que intervém, tendo de aceitar a causa no estado em que a mesma se encontrar, gozando já de autonomia e capacidade de atuação quanto ao que se processar daí em diante.”[3]
O Requerente invoca, como fundamento do seu pedido, a qualidade de pai do menor (…) e que o exercício das responsabilidades parentais, entre as quais a representação em juízo, é conferida por lei aos progenitores.
E, na verdade, prevê o n.º 2 do artigo 16.º do CPC que “os menores cujo exercício das responsabilidades parentais compete a ambos os pais são por estes representados em juízo, sendo necessário o acordo de ambos para a propositura de ações.”
Sucede que, como o Recorrente também refere nas alegações de recurso, a paternidade do menor (…) não se encontra atribuída no registo civil ao Recorrente, tendo sido por este proposta acção de impugnação de paternidade que corre os seus termos com o n.º 544/24.9T8STR no Juízo de Família e Menores de Santarém, Juiz 2, na qual pede a declaração de que o menor é seu filho.
Enquanto a acção n.º 544/24.9T8STR não tiver decisão transitada em julgado favorável à pretensão do aqui Recorrente, este, para todos os efeitos legais, não é considerado pai do menor (…), pelo que o fundamento da responsabilidade parental de representação dos filhos invocado para o pedido de intervenção deduzido na presente acção, pelo menos por ora, não colhe.
Como se disse, é imposição dos artigos 311.º e 312.º do CPC que o Interveniente principal faça valer nos autos um direito próprio, paralelo ao do Autor ou do Réu, apresentando com este uma relação de litisconsórcio voluntário, necessário ou conjugal.
O litisconsórcio voluntário, ocorre quando a relação material controvertida respeita a várias pessoas (cfr. n.º 1 do artigo 32.º do CPC).
A Autora (…), a quem o Recorrente pretende associar-se como interveniente espontâneo, apresenta-se, nos presentes autos, na condição de legal representante do menor (…), arrogado titular de indemnização por danos patrimoniais e morais próprios sofridos no acidente e por danos morais próprios decorrentes da morte do irmão (…).
Não sendo legalmente considerado progenitor, legal representante do menor ou a pessoa a quem foi, por qualquer outra via, confiado o exercício do poder parental, ainda que em conjunto com a mãe (…), o Requerente não demonstra a titularidade de um direito ou de uma posição própria semelhante à da Autora (…), no que ao menor (…) respeita, o que contraria a alegação contida nos artigos 19º e 20º do requerimento de intervenção, repisada na conclusão 12ª das alegações de recurso.
Assim, quanto ao menor (…), falta o pressuposto essencial da admissão da intervenção principal suscitada pelo Recorrente que consiste no interesse igual ao da Autora (…).
Trata-se de um requisito que, por ser necessário a qualquer das modalidades da intervenção principal espontânea – por mera adesão (artigo 313.º) ou mediante articulado próprio (artigo 314.º) – torna irrelevantes os argumentos recursivos de que:
- o pedido do Recorrente foi formulado com vista a aderir aos articulados já constantes dos autos, nos termos do artigo 313.º do CPC (e, por isso, admissível a todo o tempo); e
- admite também a possibilidade de acompanhar a Autora (…) na lide.
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Deste modo, não colhem as razões invocadas no recurso interposto, devendo manter-se o despacho recorrido, sem prejuízo da alteração ditada pelo despacho de apreciação da nulidade por omissão de pronúncia proferido no dia 24.10.2024.
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Custas
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Não havendo norma que preveja isenção (artigo 4.º, n.º 2, do RCP), o presente recurso está sujeito a custas (artigo 607.º, n.º 6, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, ambos do CPC).
No critério definido pelos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2 e 607.º, n.º 6, ambos do CPC, a responsabilidade pelo pagamento dos encargos e das custas de parte assenta no vencimento ou decaimento na causa ou, não havendo vencimento, no proveito.
No caso vertente, o Recorrente foi vencido, pelo que deverá suportar as custas do recurso.
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III. DECISÃO
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Nestes termos, acordam os Juízes Desembargadores que compõem o coletivo da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora, em:
Julgar improcedente a presente apelação, confirmando o despacho recorrido, sem prejuízo da alteração ditada pelo despacho de apreciação da nulidade por omissão de pronúncia, proferido pela Sr.ª Juíza de 1ª instância no dia 24.10.2024.
Condenar o Recorrente no pagamento das custas do presente recurso.
Notifique.
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Évora, 13 de Março de 2025
Ricardo Miranda Peixoto (Relator)
Susana Ferrão da Costa Cabral (1ª Adjunta)
Filipe César Osório (2º Adjunto)
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[1] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Filipe Pires de Sousa, in “Código de Processo Civil Anotado”, volume I, Almedina, 3ª edição, pág. 400, anotação 2 ao artigo 311.º.
[2] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Filipe Pires de Sousa, in “Código de Processo Civil Anotado”, volume I, Almedina, 3ª edição, pág. 401, anotação 2 ao artigo 312.º.
[3] In Op. Cit., pág. 402, anotação 2 ao artigo 313.º.