Ups... Isto não correu muito bem. Por favor experimente outra vez.
INVERSÃO DO TÍTULO DE POSSE PELO HERDEIRO
PARTILHAS VERBAIS
NULIDADE DA PARTILHA
USUCAPIÃO
Sumário
.1- O acordo de partilhas, mesmo que nulo por razões formais, pelo qual um herdeiro recebe o bem que fazia parte da herança de todos os demais herdeiros é suscetível de alterar a detenção que este tinha desse bem em verdadeira posse, pelo que vale como inversão do título de posse. .2- Não vale pela sua força negocial, mas por implicar, de facto, uma alteração do título de posse, perante os herdeiros. .3- Assim, decorrido que seja o prazo da usucapião este adquire o bem por força desse título.
Texto Integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães .I- Relatório
Recorrente e Autor: AA
Recorrida e Ré: Herança Ilíquida e Indivisa Aberta por óbito de BB, representada pelos herdeiros CC, DD e EE
Autos de: ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum
O Autor formulou os seguintes pedidos:
-- que fosse declarada a nulidade do registo efetuado pela Ap. ...90, de 06/09/2016, a favor dos herdeiros da Ré, em comum e sem determinação de parte ou direito, sobre o prédio urbano composto por casa de rés-do-chão destinado a comércio e primeiro andar destinado a habitação com terreno anexo, sito no Lugar ..., que passou a estar descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...21 e inscrito na respetiva matriz sob o artigo ...22.º da União das Freguesias ..., ... e ... e que fosse ordenado o cancelamento do registo do referido prédio;
-- que fosse reconhecido como comproprietário na quota-parte de ½, sobre o prédio supra identificado;
- que a Ré fosse condenada a pagar ao Autor a quantia de €850,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos, acrescida dos juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da citação até efetivo e integral pagamento
Invoca, em súmula, que após o óbito do seu marido BB, a herdeira CC registou o prédio objeto dos autos, tendo indicado como únicos sujeitos ativos, proprietários do bem, ela própria e os seus dois filhos, em comum e sem determinação de parte ou direito, o que fez de forma abusiva e ilícita, porquanto o prédio urbano em causa apenas pertence à Herança Ilíquida e Indivisa aberta por óbito de BB na proporção de ½, pertencendo a outra metade à herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de FF, pai do Autor, irmão de CC.
Esclarece que este prédio integrava o património dos seus avós, GG falecida a ../../1983 e AA falecido a ../../1993, que deixaram como únicos herdeiros os seus dois filhos, FF, já falecido e CC. Entretanto, o Autor e a sua irmã, HH, procederam à partilha da metade do referido imóvel, bem como do restante acervo que compunha o património do seu falecido pai, FF, sendo que aquela metade foi adjudicada ao Autor. Contudo, atendendo à atual situação registal do prédio, o Autor não consegue proceder ao registo da referida aquisição.
A Ré apresentou contestação, alegando, em súmula, que tal bem lhe passou a pertencer por inteiro, na sequência de partilhas verbais que realizou com o seu irmão, FF, comportando-se, desde então, como sua legítima proprietária, o que se verifica há mais de 30 anos, de forma ininterrupta, à vista de toda a gente e sem oposição de quem quer que seja, tendo, assim, adquirido a propriedade do prédio por usucapião.
Foi, após a produção de prova, prolatada sentença que julgou a ação improcedente e absolveu a Ré do pedido.
É desta decisão que a Recorrente apela, apresentando as seguintes conclusões:
(…)
A Recorrida respondeu, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
(…) .II- Questões a apreciar
Importa verificar:
- Se deve ser alterada a matéria de facto no sentido pugnado pelo Recorrente, verificando do cumprimento dos requisitos necessários para a impugnação da matéria de facto para e se cumpridos, se foi feita correta avaliação da prova;
- caso ocorra a alteração da matéria de facto se a mesma determina a procedência da ação;
- caso se mantenha a matéria de facto, se a falta de prova da intervenção do avô dos Autores e do consentimento do cônjuge do herdeiro na partilha verbal do imóvel, com a sua atribuição à Ré herdeira apenas pelo único seu irmão, determina que não se possa considerar operante a inversão do título de posse.
.III- Fundamentação de Facto
Segue o elenco da matéria de facto provada e não provada a considerar, indicando-se os factos selecionados na sentença (os quais, mantendo-se, são reproduzidos sem qualquer menção adicional)
Factos provados
1 - Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o n.º ...21 e inscrito na respetiva matriz sob o artigo ...22.º, o prédio urbano composto por casa de rés-do-chão destinado a comércio e primeiro andar destinado a habitação com terreno anexo, sito no Lugar ..., a confrontar do norte, sul e poente com estrada e do nascente com CC e estrada, com registo de aquisição pela Ap. ...90 de 06-09-2016, a favor de CC, DD e EE, sem determinação de parte ou direito.
2 - O prédio referido em 1 constituía o único bem que integrava o acervo patrimonial da herança aberta por óbito de GG, falecida no dia ../../1985 e AA, falecido no dia ../../1993.
3 – GG e AA deixaram como únicos e universais herdeiros os seus dois filhos, FF e CC.
4- FF faleceu no dia ../../2004, no estado de casado com II e deixou dois descendentes, HH e AA.
5- II faleceu no dia ../../2016.
6- No dia ../../2005 faleceu BB, no estado de casado com CC e deixou dois descendentes, DD e EE.
7– Em data não concretamente apurada dos anos de 1985 e 1993, CC e FF, na presença, designadamente, do Autor e de HH, acordaram verbalmente que o prédio referido em 1 seria adjudicado à primeira.
8– Desde o ano de 1993 que BB, até à data do seu falecimento, e CC, habitam no prédio referido em 1, limpando-o e conservando-o, nele realizando obras de remodelação, designadamente, substituição de portas interiores, colocação de taco, substituição de louças e revestimento de paredes, limpando e cultivando o respetivo logradouro, o que fazem à vista de toda a gente, de forma ininterrupta e sem oposição de ninguém, na convicção de quem exerce poderes sobre coisa que lhes pertence por inteiro e de que não lesam direitos ou interesses de outrem.
Factos não provados
Da prova produzida e com relevância para a decisão a proferir, não resultaram provados quaisquer outros factos, designadamente, não se provou que:
A – O acervo patrimonial da herança aberta por óbito de FF era composto por metade indivisa do prédio referido em 1.
B - Os herdeiros da Ré procederam ao registo do prédio referido em 1 conscientes de que o mesmo não lhe pertencia, provocando, com a sua atuação, desgosto e transtorno no Autor.
C – Como consequência da atuação dos herdeiros da Ré, o Autor sentiu-se ansioso, revoltado e deprimido.
IV- Fundamentação de Direito
A.a) Dos critérios para a apreciação da impugnação da matéria de facto
Na reapreciação dos meios de prova deve-se assegurar o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria - com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância -, efetuando-se uma análise crítica das provas produzidas.
É á luz desta ideia que deve ser lido o disposto no artigo 662º nº 1 do Código de Processo Civil, o qual exige que a Relação faça nova apreciação da matéria de facto impugnada.
Como explanado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-10-2012 no processo 649/04.2TBPDL.L1.S1, (sendo este e todos os acórdãos citados sem menção de fonte consultados no portal www.dgsi.pt) “A reapreciação das provas que a lei impõe ao Tribunal da Relação no art. 712.º, n.º 2, do CPC, quando haja impugnação da matéria de facto que haja sido registada, implica que o tribunal de recurso, ponderando as razões de facto expostas pelos recorrentes em confronto com as razões de facto consideradas na decisão, forme a sua prudente convicção que pode coincidir ou não com a convicção do tribunal recorrido (art. 655.º, n.º 1, do CPC). A reapreciação da prova não se reduz a um controlo formal sobre a forma como o Tribunal de 1.ª instância justificou a sua convicção sobre as provas que livremente apreciou, evidenciada pelos termos em que está elaborada a motivação das respostas sobre a matéria de facto.”
Assim, visto que vigora também neste tribunal o princípio da livre apreciação da prova, há que mencionar que esta não se confunde com a íntima convicção do julgador.
A mesma impõe uma análise racional e fundamentada dos elementos probatórios produzidos, estribando-se em critérios de razoabilidade e sensatez, recorrendo às regras da experiência e aos parâmetros do homem médio.
A formação da convicção não se funda na certeza absoluta quanto à ocorrência ou não ocorrência de um facto, em regra impossível de alcançar, por ser sempre possível equacionar acontecimento, mesmo que muito improvável, que ponha em causa tal asserção, havendo sempre a possibilidade de duvidar de qualquer facto.
É obvio que “as provas não têm forçosamente que criar no espírito do juiz uma absoluta certeza acerca dos factos a provar, certeza essa que seria impossível ou geralmente impossível: o que elas devem é determinar um grau de probabilidade tão elevado que baste para as necessidades da vida”, como explica Vaz Serra in Provas – Direito Probatório Material”, in BMJ 110/82 e 171.
“Por princípio, a prova alcança a medida bastante quando os meios de prova conseguem criar na convicção do juiz – meio da apreensão e não critério da apreensão – a ideia de que mais do que ser possível (pois não é por haver a possibilidade de um facto ter ocorrido que se segue que ele ocorreu necessariamente) e verosímil (porque podem sempre ocorrer factos inverosímeis), o facto possui um alto grau de probabilidade e, sobretudo, um grau de probabilidade bem superior e prevalecente ao de ser verdadeiro o facto inverso. Donde resulta que se a prova produzida for residual, o tribunal não tem de a aceitar como suficiente ou bastante só porque, por exemplo, nenhuma outra foi produzida e o facto é possível.” cf. o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26-06-2014 no processo 1040/12.2TBLSD-C.P1.
A convicção do julgador é obtida em concreto, face a toda a prova produzida, com recurso ao bom senso, às regras da experiência, quer da vida real, quer da vida judiciária, à diferente credibilidade de cada elemento de prova, à procura das razões que conduziram à omissão de apresentação de determinados elementos que a parte poderia apresentar com facilidade, a dificuldade na apreciação da prova por declarações e a fragilidade deste meio de prova.
Igualmente importa a “acessibilidade dos meios de prova, da sua facilidade ou onerosidade, do posicionamento das partes em relação aos factos com expressão nos articulados, do relevo do facto na economia da ação.” (mesmo Acórdão).
Concretização
Ouvida a prova entendemos que a sentença decidiu bem ao concluir que foram realizadas partilhas verbais entre CC e FF, acordo que foi repetido perante terceiros após a morte da mãe destes, foi entre si reafirmado após a morte do seu pai e sempre assumido por estes ao longo dos anos que decorreram desde a morte dos seus pais.
Da mesma forma também entendemos que se demonstrou que essa partilha, com a inerente aquisição do prédio, foi assumida pela herdeira CC, que desde logo inverteu o título de posse, arrogando-se a exclusiva propriedade do prédio, praticando todos os atos no imóvel com a convicção que este lhe pertencia por inteiro e de que não lesava direitos/interesses de outrem.
Tal ajuda a justificar que durante toda a sua vida o pai do Autor não desencadeasse partilhas (este seria o mais interessado nelas pois, caso não quisesse, como estamos convictos que quis e declarou nesse sentido, que o prédio ficasse para a irmã, estava dele despojado, sem receber quaisquer proventos do mesmo, sendo seu o principal interesse em fazer a divisão dos bens).
A tal também nos convenceu o depoimento da herdeira da Ré, CC, “corroborado que foi pelo depoimento claro, escorreito e isento das testemunhas HH e JJ e, ainda, pelos depoimentos das testemunhas AA, EE, KK e LL, com o aporte das faturas juntas com a contestação sob a ref.ª ...22.”.
Decorre desse depoimento que foi a mesma que acabou a construção, que nela fez mais obras de melhoramento depois da morte da sua mãe, que nela prosseguiu o negócio com o qual sustentou os seus pais na invalidez, o qual continuou sem que nenhuma contrapartida lhe fosse pedida.
Também nós, perante as duas versões antagónicas apresentadas pelo Autor e pela Ré, entendemos que a segunda é mais credível, tendo em conta, quer o tempo passado após a morte dos avós do Autor sem que o seu pai tenha agido no sentido de receber o seu quinhão, bem como à forma como as testemunhas JJ e HH prestaram o seu depoimento, sem qualquer interesse material nos autos e de forma que também nos pareceu coerente e desinteressada.
O Recorrente afirma que esta segunda testemunha foi despedida pelo Recorrente e até que recebeu quantia indemnizatória por processo que intentou contra este, mas nada se provou neste sentido.
Relativamente à testemunha JJ, o Recorrente realça a inegável relação de proximidade que tiveram por terem partilhado a casa por mais de 15 anos, embora há mais de 20 anos, sendo uma empregada da outra. Mas esse facto, por si só não significa nem que a relação terminasse em bem, nem que isso obstasse a que esta respondesse de forma isenta ao que lhe era perguntado, sem demonstrar pretender fazer sobressair uma versão sobre a outra ou ter tomado partidos emocionalmente.
O Recorrente afirma que as versões da herdeira da Ré e da testemunha JJ não são coincidentes quanto aos seus intervenientes, mas não logramos concordar com ela: uma coisa são os intervenientes na conversa, outra quem assistiu à mesma. E esta testemunha nenhuma intervenção teve na conversa, que lhe não dizia respeito.
Não choca que nessa conversa não estivessem os filhos da Ré, ainda muito jovens, que não eram herdeiros diretos e em nada saíam prejudicados com a partilha efetuada.
É credível a explicação dada, nomeadamente pela testemunha JJ, para a ausência do cônjuge sobrevivo de GG nessa conversa que ocorreu na sua presença, na qual o irmão declarou que a casa passava a pertencer a CC: tal ocorreu por força da falta de capacidade de querer e entender de que aquele padecia desde o acidente que sofrera.
Como veremos, o que importa neste caso é a inversão do título de posse operado pelas partilhas, somada à posse boa para usucapião, não a validade jurídica dessas partilhas. Estas servem enquanto facto demonstrativo e representativo da alteração do tipo de posse da herdeira, que deixa de ser fundada nessa simples qualidade, mas passa a possuir o bem em nome próprio.
Pode-se, no entanto, ter em conta que a declaração de que as partilhas estavam feitas com a atribuição do imóvel a CC foi reiterada aquando da morte do pai.
Não se vê qualquer razão que determine a alteração do ponto 7º da matéria de facto provada.
Afirma ainda o Recorrente que não resultou provado que, a partir do ano de 1993, BB e, posteriormente, CC, tenham passado a comportar-se de maneira diferente de como se comportavam até então, ou seja, que a partir desse momento tenham passado a atuar na convicção de que aquela casa lhes pertencia por inteiro.
Refere que na sua esmagadora maioria os atos referidos pela Meritíssima Juiz a quo no ponto 8 da matéria de facto dada como provada foram praticados antes de 1993, isto é, ainda em vida de AA. No entanto, o que resultou da prova é que desde que a CC e o irmão acordaram que o imóvel dos autos ficaria para esta, após a morte da mãe, esta passou a agir como dona dele, fazendo obras de maior vulto, continuando a agir dessa forma desde então, nomeadamente após a morte do pai, quando o irmão lhe reforçou que o prédio ficava para ela.
É certo que CC poderia regularizar a situação do imóvel mais cedo, mas a verdade é que este critério também se aplicaria ao irmão, que era quem, se não o tivesse feito de livre vontade, estava despojado do prédio e sem título nem posse, que o ajudasse a acautelar a sua situação e logo teria mais interesse em defender o que seria seu, caso não o tivesse oferecido à sua irmã.
Refere ainda a falta de pagamento da totalidade do IMI e a declaração do modelo 1 de IMI por óbito do seu marido BB e inerente participação do imposto de selo.
Convencem-nos neste aspeto os argumentos apresentados na sentença, fundados na realidade documental do prédio, tal como inscrito na matriz, mesmo que desfasada da realidade, o que determinou que estes factos jurídicos não pudessem ser praticados de outra forma. Veja-se que a CC apenas adquire a propriedade com o decurso do prazo da usucapião, não a podendo invocar antes, apesar das partilhas verbais realizadas (momento a partir do qual se considerava dele proprietária).
Como se diz motiva na sentença, de forma esclarecida e totalmente esclarecedora e que entendemos ser de sufragar: “Os factos 2 a 6, resultam da narrativa, nesta parte, concordante de Autor e Ré, alicerçada nas certidões de assento de nascimento e de óbito juntas com a petição inicial como doc. n.ºs 1 a 14, divergindo as partes, essencialmente, quanto à questão da propriedade do prédio referido em 1 e invocada convicção pela Ré de exercício de poderes sobre coisa que lhe pertence. Relativamente aos factos 7 e 8 (com contraponto no facto não provado A), o Tribunal estribou-se no depoimento prestado por CC, corroborado que foi pelo depoimento claro, escorreito e isento das testemunhas HH e JJ e, ainda, pelos depoimentos das testemunhas AA, EE, KK e LL, com o aporte das faturas juntas com a contestação sob a ref.ª ...22. Senão vejamos. CC afirma que sempre viveu na casa em questão e que o seu irmão, FF, lhe afiançou, à morte dos pais, que essa casa passaria a ser sua, pelo que, desde então se passou a comportar em conformidade, na convicção de que a casa lhe pertencia a si e ao seu agregado. O Autor, em declarações, não nega que CC e o seu agregado tenham vivido sempre naquela casa, o que se deveu, porém, à boa vontade do seu pai, FF, que permitiu que a irmã ali permanecesse enquanto fosse viva, negando, todavia, a existência de quaisquer partilhas verbais ocorridas entre os irmãos. Autor e Ré são partes na causa, ambos com naturalinteresse no desfecho da lide, pelo que, a valoração das respetivas declarações/depoimentos, alinhados com as posições divergentes vertidas nos respetivos articulados, impõe especiais cautelas e a procura de elementos externos, corroborantes das versões por si trazidas. No caso, entendemos que tais elementos existiram no que diz respeito à narrativa dos factos preconizada pela Ré, com particular enfoque nos depoimentos das testemunhas HH e JJ. A primeira confirma ter presenciado uma conversa protagonizada pelo Sr. FF, na presença dos filhos deste e de CC e na qual aquele terá dito que os filhos não tinham direito a nada ali e que a casa pertencia à sua irmã. A segunda relata que por diversas vezes em contexto de trabalho e em tom de desabafo quando a sua irmã, CC, se lamuriava, aquele FF afirmava que esta tinha sido bem paga porque tinha ficado com a casa de ..., referindo-se ao prédio mencionado em 1. Os depoimentos destas duas testemunhas, a quem não se assaca qualquer interesse na causa ou especial relação de proximidade com nenhuma das partes, a que acresce a espontaneidade e objetividade com que foram prestados, imprimindo maior credibilidade às suas narrativas, permitiram acomodar o depoimento de CC e a versão dos factos aventada pela Ré quanto à existência das invocadas partilhas verbais e a convicção por esta sentida de que a casa lhe passou a pertencer desde então. Ademais, também as faturas juntas pela Ré com o seu articulado, em alinhamento com o depoimento das testemunhas AA, EE, KK e LL, relativas às obras/intervenções realizadas no prédio - com particular acuidade nestas últimas testemunhas que, através de depoimentos claros e escorreitos, depuseram sobre os trabalhos levados a cabo no prédio referido em 1 a pedido de CC -, permitem alicerçar a narrativa dos factos trazida pela Ré, pois que não se justifica a realização de quaisquer obras, a suas expensas, se não estivesse convicta de que a casa lhe pertencia por inteiro. Não se olvida que as declarações do Autor foram secundadas pelos depoimentos das testemunhas, sua irmã, HH, seu cunhado, MM e sobrinha, NN, convocando todos uma conversa que terá ocorrido com o filho da Ré, AA, em contexto hospitalar e na qual este terá comunicado que iam realizar obras na casa, o que, na sua ótica, contraria a afirmada convicção de pertença sentida por CC e seu agregado. Todavia, como já se disse, o Autor é parte interessada, sendo certo que as testemunhas agora indicadas, para além da relação familiar que as une entre si e ao Autor, têm, também elas próprias, especial interesse no desenlace da ação. É que, pese embora não sejam parte na causa, não tendo, por essa razão, deduzido qualquer pretensão contra a Ré, caso o Autor veja improceder o pedido formulado, terão de lhe pagar o valor de 30.000,00 EUR como perda pela partilha já realizada por óbito de FF (e que incluiu o metade indivisa do prédio referido em 1, adjudicada ao Autor). Impõe, pois, a prudência especial cautela na valoração dos respetivos depoimentos e das versões por si trazidas, sendo certo que, para além de os seus depoimentos serem infirmados pela demais prova produzida, apresentam elas próprias fragilidades que põem em causa a sua credibilidade. Para além de tais declarações/depoimentos serem contrariados pelos depoimentos das testemunhas HH e JJ, nos moldes que já referimos, a afirmada conversa é contraditória nos seus próprios termos e incompreensível até na ótica da narrativa do Autor. Com efeito, a ter existido e no pressuposto sentido de um pedido de autorização, então não se compreenderia o teor da conversa (que, de acordo com o narrado mais se assemelhou a um comentário), nem a circunstância de o assunto não ter merecido qualquer continuidade. É que, se aquele interlocutor procurasse a autorização dos visados conforme se procurou fazer crer, muito se duvida que a questão – atenta a importância do assunto abordado e que se prendia com a realização de obras na casa - tivesse ficado sanada e resolvida no contexto descrito, fugaz e fortuito. Ademais, na ótica da narrativa do Autor e da testemunha, sua irmã, se a casa efetivamente pertencia à herança por óbito de seu pai FF, muito se espanta que, tendo herdado parte dessa casa, não tivessem também eles tido interesse e procurado saber que intervenções eram essas que se pretendida concretizar, indagando junto dos seus familiares em conformidade, optando, ao invés, por deixar o assunto sem qualquer continuidade, circunstância que torna inverosímil a sua versão dos factos. Por outro lado, questionado quer o Autor, quer testemunha HH, se após a morte do pai nunca abordaram a sua tia, CC, no sentido de perceber qual o destino da casa, ambos responderam que nunca o fizeram porque o pai costumava afirmar que enquanto fosse viva a sua irmã poderia continuar a viver ali. Contudo, entendemos que não é minimamente plausível, nem consentâneo com as regras da normalidade das coisas, que, afirmando-se titulares de metade daquele prédio, em quinze anos, nunca o Autor e sua irmã tivessem conversado com a sua tia sobre o destino da casa e sobre a pretensão desta de ali efetivamente permanecer até à sua morte, ainda que com o intuito de respeitar aquela que, na versão dos factos que apresentam, era a vontade do seu pai. Conatural seria que, na qualidade de afirmados titulares daquele bem, se preocupassem com o destino do mesmo. Não se olvida a natureza e teor dos documentos juntos com a petição inicial, apresentados que foram por CC após o óbito do seu marido (máxime, modelo 1 do Imposto Municipal sobre Imóveis e respetivo anexo I) e que, numa primeira interpretação poderiam anular a narrativa da Ré, contrariando-a, aliando-se aqui a circunstância de, ao longo dos anos, a Ré apenas ter suportado metade do I.M.I. do imóvel, facto que a própria não põe em causa. Acontece que, o facto de a Ré ter apresentado tais documentos, naqueles termos, em nada contradiz a sua narrativa, uma vez que, para todos os efeitos, era aquela a realidade do prédio na matriz e, da prova produzida, com particular referência ao depoimento da testemunha OO, não resulta pacífico que outro pudesse ter sido o comportamento da representante da Ré, tornando plausível o sentido do seu depoimento de que não podia ter procedido de outra forma. Além disso, à data do óbito do marido, ocorrido no ano de 2005, não se vislumbra de que forma podia a aquela CC convocar uma qualquer propriedade total com fundamento na usucapião, figura que é caracterizada pelo decurso de determinado lapso de tempo que, naquela data, não tinha decorrido, conforme se explicitará infra. Por fim, a versão dos factos trazida por CC e afirmação de que não se apercebeu de que estava apenas a suportar metade do valor do I.M.I. relativo ao prédio em causa, não é desmentida pelo facto objetivamente considerado, uma vez que, estando o prédio inscrito na proporção de metade, natural se torna que a Ré recebesse, apenas, os dados para pagamento da sua parte sem qualquer referência ao remanescente, tornando, assim, plausível a justificação por aquela apresentada.” Assim, mantêm-se na íntegra os factos dados como provados.
Pretende também o Recorrente que se provem os três factos dados como não provados.
A afirmação de que “A – O acervo patrimonial da herança aberta por óbito de FF era composto por metade indivisa do prédio referido em 1” é uma conclusão de direito que para ser traduzida em factos teriam que ser fixados no tempo.
Como é sabido, para determinar o acervo hereditário de alguém, isto é o património que adquiriu (seja por morte, seja por outra forma), há que invocar e atentar nos factos que determinaram a aquisição da propriedade.
Os factos subjacentes à alínea à A) da matéria de facto não provada, são os que levaram à aquisição da propriedade pelos pais de FF. Embora se considere que existe uma presunção que estes a mantiveram até à sua morte e que nada entre a morte destes e a de FF impediu que funcionassem as normas da sucessão, no presente caso a parte contrária alegou e provou factos que afastaram essa presunção.
Dos factos subjacentes a esta alegação alguns já estão provados (de forma algo conclusiva, mas que se depreende naturalmente, atento o acordo de todos na sua verificação) e outros são o cerne da discussão destes autos, não podendo logo traduzir-se nessa conclusão:
- a aquisição do prédio pelos avós paternos do Autor está assente no ponto dois da matéria de facto provada (apesar de conclusivo, podia facilmente ser traduzido em factos, atento o acordo de todos na sua verificação): que GG e marido AA haviam declarado comprar tal prédio, somando os período em que exerceram os atos de posse com a convicção de proprietários aos dos seus antecessores, perfazendo o tempo necessário para a usucapião (concluindo-se, pois, que eram seus proprietários, por o terem adquirido por usucapião).
- No ponto três da matéria de facto provada está fixado que estes faleceram e só tiveram dois filhos, vivos na data do seu óbito, sendo um deles o FF.
O que ora se discute é se a representante da Ré adquiriu o imóvel por usucapião no período que decorreu entre a morte dos seus pais e a data da petição inicial.
Assim, impossível seria levar à matéria de facto provada a alínea A) nos termos pretendidos.
Entendendo-se, como se entende, que a primeira herdeira da Ré estava convicta que o prédio lhe pertencia, como temos vindo a justificar, não pode proceder a impugnação da alínea B), sendo que nenhuma prova é invocada, nem se vislumbra, capaz de demonstrar o teor da alínea C).
Termos em que se mantém a matéria de facto provada e não provada, nos termos em que foi assente, julgando-se improcedente a impugnação de facto.
Aplicando o Direito
-A usucapião
A usucapião é a constituição, facultada ao possuidor, do direito real correspondente à sua posse, desde que esta, dotada de certas características, se tenha mantido pelo lapso de tempo determinado na lei (cfr A. Menezes Cordeiro, Teoria Geral dos Direitos Reais, 1979, p 467).
A posse manifesta-se na atuação de uma pessoa sobre uma coisa (corpórea) de forma correspondente ao exercício de um direito real (artigo 1251º do Código Civil).
O artigo 1251º do Código Civil define a posse como o poder que se manifesta quando alguém atua por forma correspondente ao direito de propriedade ou de outro direito real. Adquirida a posse, mesmo que não sejam exercidos atos materiais sobre a coisa, a mesma mantém-se enquanto o possuidor tiver a possibilidade de a exercer, como decorre do artigo 1257º n.º 1 do Código Civil.
Por este motivo, pode-se afirmar que o corpus, mais do que traduzir-se no exercício de poderes de facto sobre a coisa é um conceito normativo que exprime o poder de controlar, que pode ser exercido pelo próprio ou por outrem.
No entanto, apesar de ser discutido, tem sido jurisprudência maioritária, com que se concorda, aceitar que a posse exige, a par do exercício ou possibilidade de exercer tal domínio concreto sobre a coisa, também a intenção de o fazer com referência a determinado direito real, de forma a ser possível diferenciá-la da mera detenção. Destarte, a posse dessa coisa baseia-se no exercício do poder de facto sobre uma coisa com a convicção de agir como beneficiário do direito - artigos 1251º e 1253º do Código Civil, encontrando-se nesta categoria jurídica duas vertentes: o “corpus” consubstanciado na relacionação da pessoa com a coisa, traduzida normalmente em atos materiais e o “animus”, que se traduz na intenção de agir como o beneficiário do direito (por recente e em demonstração do afirmado, quanto à já pacificidade deste entendimento na jurisprudência, cf o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, de 12/10/2019 no processo 1808/03.0TBLLE.E1.S1).
Tem-se por posse originária aquela que foi obtida unilateralmente, sem transmissão operada por outrem, sem recurso a vínculos com o anterior possuidor, como a ocupação e a apropriação.
Embora se presuma, em caso de dúvida, a posse naquele que exerce o poder de facto (artigo 1252º nº 2 do Código Civil, havendo ainda que atender ao Acórdão com força uniformizadora que sobre ele incidiu, de 14/05/1996, no processo com o nº 085204 publicado no D.R. nº. 144/96 – II Série, de 24/06/1996), há que ter em atenção que também se presume que a posse continua em nome de quem a começou (artigo 1257º nº 2 do Código Civil).
“Desde que se prescindiu, para a manutenção da posse, de atos efetivos de atuação sobre a coisa, correspondentes ao corpus da posse, por se entender que a prática pode não os exigir do possuidor, tal como nem sempre os exige do verdadeiro titular do direito sobre a coisa, não podia o legislador deixar de admitir, em qualquer caso, a presunção da continuidade da posse por parte de quem a começou".(Pires de Lima e Antunes Varela, “ Código Civil Anotado", vol. III, 2ª edição revista, 1987, pág 16).
Em consequência, “enquanto na aquisição originária da posse o corpus faz presumir o animus, o mesmo já não acontece na aquisição derivada da posse, tanto quanto é certo que o artigo 1255º prescinde da existência do corpus nos casos em que ocorre a sucessão em posse anterior (basta a mera possibilidade de continuar a praticar os actos correspondentes - art. 1257º, nº 1”). Cf acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05/28/2002, no processo 01B1466.
Como se viu, presume-se que a posse continua em nome de quem a começou, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 1257.º do Código Civil. E esta presunção prevalece sobre a presunção de posse naquele que exerce o poder de facto, como decorre do artigo 1252º nº 2 deste código.
E, por isso, como igualmente se concluiu no acórdão de 14/10/2014, proferido no processo 3173/12.6TBVIS.C1, disponível no portal dgsi.pt., há que entender que: “Presumindo-se que a posse continua em nome de quem a começou (art. 1257º, nº 2, do C.C.) e determinando o art. 1255º do mesmo diploma que, por morte do possuidor, a posse continua nos seus sucessores, independentemente da apreensão material da coisa, deverá presumir-se que a posse exercida por um sucessor/herdeiro do inicial possuidor, após a morte deste, não é uma posse nova mas mera continuação da posse inicial que, como tal, não é exercida em nome próprio, mas sim em nome da herança aberta por óbito do possuidor inicial, ainda que os demais sucessores não tenham praticado qualquer acto material sobre a coisa. II – Nestes termos, a posse assim exercida pelo sucessor, sem que tenha sido demonstrado qualquer acto capaz de inverter o título de posse, não terá aptidão para facultar ao sucessor a aquisição do direito por usucapião e apenas releva para efeitos de aquisição do direito, por usucapião, a favor da herança aberta por óbito do anterior possuidor.”
- A inversão do título de posse e a declaração de partilhas
Resulta do disposto no artigo 1265º do Código Civil que “A inversão do título da posse pode dar-se por oposição do detentor do direito contra aquele em cujo nome possuía ou por acto de terceiro capaz de transferir a posse”, ou seja, pode dar-se por dois modos: a inversão por oposição do detentor e inversão por ato de terceiro.
A inversão do título é a constituição da posse por parte do detentor. Como porém, o detentor já exercia poderes possessórios terá de se verificar uma «operação jurídica que transforme a detenção em posse, isto é, que modifique a justificação, o título, pelo qual não havia posse», exigindo-se, pois, se for por oposição do detentor uma atuação ou um comportamento que ultrapasse os simples atos de uso, mesmo que exclusivo, públicos e pacíficos, acompanhado da respetiva convicção: Impõe-se, também, que sejam necessariamente conhecidos pelos primitivos titulares do direito de forma a que se possa dar conteúdo à sua inação.
As partilhas efetuadas entre o irmão da representante da ré e esta, quer antes da morte do último progenitor, reiteradas depois, não têm o valor que decorre da força de um ato negocial válido, por serem nulas por vícios de forma, mas valem como um ato capaz de transferir a posse e demostrativo da alteração do título subjacente à mesma.
A aquisição da propriedade pela representante da ré (ou pelo casal a que esta pertencia) não se dá por força desse acordo de partilhas, nulo, mas com base na usucapião, a saber, na posse por determinado tempo. Esta posse só aparece juridicamente quando deixa de se poder confundir com a mera detenção do herdeiro, o que ocorre com a declaração de partilhas assumida por todos os herdeiros (ou seus representantes).
Neste caso tal ocorreu, pelo menos, após a morte do pai da representante da ré e de FF, data em que se reiterou tal acordo. O acordo de partilhas concede, pois, outra valoração jurídica aos atos materiais exercidos sobre a coisa pela representante da Ré, bem como outro animus nessa posse, não vale por si como ato de transmissão da propriedade.
Só a posse com determinadas características e por tempo, que só se vislumbra após tal acordo, se atribui a propriedade, através do instituto da usucapião.
Tal acordo, implicando que a parte que beneficiou da coisa a recebe dos demais interessados, passando de imediato a ter outro título de posse de que se arroga para a poder exercer, vale como inversão do título de posse. Não vale pela sua força negocial, mas por implicar, de facto, uma alteração do título de posse, perante os herdeiros.
Como diz o Recorrente: “De facto, tem sido entendimento da jurisprudência que “a partilha verbal, mesmo que juridicamente irrelevante, faz inverter o título da posse, de tal modo que cada herdeiro passa a ter uma posse exclusiva sobre certa parte determinada da herança, possibilitando assim a aquisição por usucapião dos imóveis entregues ao herdeiro” (cfr. o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 13/07/2022, processo n.º 17759/20.01T8PRT.P1, disponível em www.dgsi.pt).
E mais recentemente, o acórdão proferido por este Tribunal da Relação de Guimarães, no processo nº127/22.8T8PTB.G1, em 31-10-2024, com o seguinte sumário: “A partilha verbal, mesmo que nula por vício de forma, faz inverter o título da posse, de tal modo que cada herdeiro passa a ter uma posse exclusiva sobre certa parte determinada da herança, possibilitando assim a aquisição por usucapião dos imóveis entregues ao herdeiro.”
Assim, se era duvidoso que ao ter sido dado como provado que se realizou uma partilha verbal entre CC e FF após a morte da mãe de ambos, se pudesse entender que havia sido invertido o título de posse (porque nada se dizia quanto ao seu pai, também herdeiro, embora resulte da prova produzida a sua incapacidade de facto), o mesmo não ocorre quando se dá a reiteração do mesmo acordo relativo a todo o acervo patrimonial desse falecido casal, após a morte desse último membro, por todos os seus filhos, continuados que foram os respetivos atos possessórios.
Com efeito, para que a inversão do título de posse opere, seja por oposição, seja por ato de terceiro suscetível de transmitir a posse, no que toca a bens determinados na detenção de herdeiros, é necessário que todos os interessados diretos dela sejam participantes (passivos ou ativos). Como se escreveu no acórdão de 7 de Julho de 2010, processo n.º 23/2000.P1.S1, relativamente à inversão do título de posse por oposição: «Para que haja inversão do título de posse determinante do início do prazo necessário para que ocorra usucapião, importa, quando o imóvel detido se integre numa herança indivisa, que a oposição do detentor seja feita mediante actos positivos (materiais ou jurídicos) praticados contra e perante todos ou com o consentimento de todos e cada um dos herdeiros».
Nesse momento todos os herdeiros reiteraram o acordo quanto à atribuição da posse do imóvel a um só, que o detinha e o passou a possuir.
E a tanto não obsta uma simples falta de consentimento do cônjuge do herdeiro: importante é que este fosse dela cognoscível, como não pode deixar de se entender por dele ter sido dado conhecimento aos seus filhos e a posse tenha prosseguido com esta nova justificação.
Posse esta que resulta do ponto 8 da matéria de facto provada, sem necessidade de ter ímpeto reforçado, por derivar da atribuição efetuada pelo único interessado e não de uma oposição frontal a uma mera tolerância.
- Requisitos da posse para usucapir
Para conduzir à aquisição do direito por usucapião, a posse tem que ser uma pública e pacífica (por força do disposto no artigo 1297º do Código Civil) e tem que ser uma posse efetiva (que corresponde, segundo o disposto no art. 1251º, ao poder que se manifesta quando alguém atua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real) e não uma detenção ou posse precária. Caso seja não titulada e não registada, a usucapião só pode dar-se ao fim de quinze anos, se a posse for de boa-fé, e de vinte anos, se fosse de má-fé (artigo. 1296º do Código Civil).
Em fevereiro de 2013 completou-se tal prazo, por se considerar que a posse efetiva se iniciou pelo menos com a morte do avô do autor, em fevereiro de 1993.
Assim, perante os factos apurados, não podemos deixar de acompanhar o raciocínio seguido na decisão recorrida, concluindo, como aí se concluiu, que os recorridos são os proprietários do imóvel em disputa nestes autos :” Da factualidade apurada, perpassa, pois, que o prédio foi entregue a CC, casada com BB, como se fosse seu e estes, em estado de espírito de proprietários praticaram sobre a coisa entregue, durante lapso de tempo relevante, atos materiais correspondentes ao direito de propriedade, circunstância que era conhecida e foi querida pelo outro único herdeiro.
Estão, assim, reunidos os pressupostos de que depende a aquisição da propriedade por usucapião, tendo a Ré logrado provar, conforme lhe competia, os factos impeditivos do exercício do direito do Autor.
Nestes termos, porque a contitularidade do Autor sobre o prédio referido em 1 é contrariada pela propriedade plena da Ré, deverá improceder a pretensão daquele, inexistindo fundamento para a pretendida nulidade do registo pois que os factos aí consignados estão em conformidade com a realidade das coisas.”
Termos em que há que confirmar a sentença recorrida.
.V -Decisão
Por todo o exposto, julga-se totalmente improcedente o recurso e em consequência confirma-se a decisão recorrida.
Custas pelo Recorrente (artigo 527º nº 1 e 2 do Código de Processo Civil).
Guimarães, 27-03-2025
Sandra Melo Elisabete Coelho de Moura Alves Anizabel Sousa Pereira