COMPRA E VENDA DEFEIITUOSA
DANOS INDEMNIZÁVEIS
DENÚNCIA
CADUCIDADE
Sumário

I – O impedimento da caducidade da denúncia do defeito só ocorrerá se intentada a respectiva acção ou, mediante o reconhecimento do direito do comprador por parte do vendedor, sendo que o reconhecimento tem de ser claro e inequívoco, isto é, em termos de não subsistirem dúvidas sobre a aceitação, pelo devedor, dos direitos do credor.
II - Os danos relacionados com custos de remoção e substituição dos monopostes constituem danos reflexos/sucedâneos, directamente causados pelo cumprimento defeituoso da obrigação, assente esta no facto de ter sido feito o fornecimento defeituoso dos monopostes, não ter sido feita a reparação, nem a substituição dos mesmos, pelo que lhe é aplicável o prazo de 6 meses de caducidade de 6 meses e não o prazo de prescrição de 20 anos.
III - Havendo dolo, o comprador não tem o ónus de denunciar o vício ou a falta de qualidade da coisa (artigo 916.º/1 do Código Civil) e, por conseguinte, o prazo a considerar é o fixado genericamente no artigo 287.º do Código Civil, ou seja, o prazo de um ano subsequente à cessação do vício que lhe serve de fundamento, contado a partir do momento em que o declarante se apercebeu do dolo.

Texto Integral

Proc. nº 613/21.7T8PNF.P1
Tribunal Judicial da Comarca Do Porto
Juízo Central Cível V. N. Gaia - Juiz 3

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Relator: Juiz Desembargador Álvaro Monteiro
1º Adjunto: Juiz Desembargador Paulo Duarte Mesquita Teixeira
2º Adjunto: Juíza Desembargadora Isabel Silva
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Sumário:
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I - Relatório:
A..., Lda., NIPC ... e B... Unipessoal, Lda., (atualmente C..., S.A.), NIPC ..., intentaram a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra D... Unipessoal, Lda., NIPC ....
Peticionam serem os Réus condenados solidariamente a pagar:
a) à Autora A..., Lda., a título de indemnização por danos patrimoniais sofridos e compensação por danos não patrimoniais o montante total de € 119.802,50 acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento;
b) à Autora C..., S.A., a título de indemnização por danos patrimoniais sofridos e compensação por danos não patrimoniais o montante total de €463.751,82 acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento.
Para o efeito alegaram, sumariamente, que no âmbito da sua atividade celebraram contratos de compra e venda de monopostes publicitários com a Ré, em datas e termos que descrevem, com descrição das características técnicas a que a Ré se obrigou a executar; que no dia 13 de outubro de 2018 dois dos monopostes executados e vendidos pela 1ª Ré à 2ª Autora partiram e tombaram; que tal foi comunicado telefonicamente à 1ª Ré no dia 14 de outubro de 2018 e através de carta de 17 de outubro de 2018, com teor que descreve, tendo solicitado a remoção dos monopostes caídos, a sua substituição e a verificação dos demais monopostes fornecidos pela Ré; que foram remetidas comunicações posteriores, que descrevem;
Que a Ré não aceitou o solicitado, tendo alegado que os mesmos caíram em consequência de tempestade; que foi solicitado parecer ao IPMA, que informou as Autoras em termos que reproduzem; que os monopostes deviam suportar os ventos verificados; que outro existentes no local, fornecidos por terceiros, não caíram;
Que face à posição assumida pela Ré solicitaram estudo a terceira entidade relativamente aos dois monopostes que tinham tombado em 13 de outubro de 2018 e que do mesmo resultou que a Ré não seguiu as especificações do projeto, tendo reduzido a espessura da chapa em 40%, de 10mm para 6mm; que, em consequência desse resultado, preocupadas com o estado dos monopostes fornecidos pela Ré, solicitaram a outra entidade relatório pericial por amostragem a 3 monopostes publicitários edificados em três locais diferentes;
Que do relatório efetuado consta que os monopostes não possuíam as características contratadas;
Que no dia 19 de dezembro de 2019 caiu um outro monoposte; o que comunicaram à Ré por carta 14 de janeiro de 2020, interpelando a 1ª Ré para proceder no à substituição do monoposte caído e à revisão e reparação de todos os monopostes que lhe haviam sido adquiridos; que a Ré se remeteu ao silêncio; que as Autoras suportaram, em consequência, custos que descrevem; que voltaram a interpelar a Ré por carta de 20.07.2020, em termos que descrevem; que a reparação e substituição dos monopostes ascende a € 317.800,00;
Que remeteram nova comunicação à Ré em 01.10.2020 reiterando o antes comunicado e comunicando, ainda, o risco de queda de um outro monoposte; que mais uma vez a Ré nada disse; que o 2º Réu foi o responsável técnico pelos parâmetros e especificações técnicas ao abrigo dos quais os monopostes deveriam ser montados e construídos, tendo aliás atestado a conformidade dos mesmos, sem o ter verificado; que interpelaram o 2º Réu por carta de 29.07.2020, em termos que descrevem e que, face à conduta da Ré, estão as Autoras a diligenciar pela substituição dos monopostes.
Mais alegam que os factos ocorridos causaram danos na imagem das Autoras e na sua capacidade de negociação e captação de novos clientes, que configuram como danos não patrimoniais e computam no montante total de €150.000,00.
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Os Réus foram regularmente citados.
O 2º Réu não apresentou contestação.
A 1ª Ré apresentou contestação com defesa por exceção dilatória e peremptória (incompetência em razão do território, coligação ilegal, formulação de pedido ilegal por genérico, caducidade do direito das Autoras a denunciarem, caducidade do direito de ação das Autoras) e impugnação.
Em sede de contestação alegou, sumariamente, que a queda dos monopostes de ... e ... a 13.10.2018, se deveu única e exclusivamente aos efeitos da passagem do furacão “Leslie”; o mesmo se verificando quanto à queda do monoposte de ... a 19.12.2019, que se ficou a dever à depressão “Elsa; que respondeu às comunicações das Autoras por carta de 09.11.2018, em termos que descreve;
Que a única causa das quedas foram os ventos sentidos no local e momento das mesmas, superiores a 100km/h; que, nas mesmas condições, os monopostes também cairiam se tivessem 10mm de espessura; que as Autoras não diligenciaram pela manutenção exigida pelos monopostes e fizeram alterações nos mesmos que diminuíram a sua resistência e estabilidade.
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Convidadas para o efeito, as Autores responderam à matéria de excepção alegada pela Ré, pugnando pela sua improcedência.
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Por decisão proferida a 01.11.2021 o Juízo Central Cível da Comarca de Porto Este declarou-se territorialmente incompetente e competente este Juízo Central Cível do Tribunal de Vila Nova de Gaia, da Comarca do Porto.
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Procedeu-se à realização de audiência prévia no âmbito da qual foram decididas as exceções referentes à ilegalidade do pedido por genérico, legitimidade das partes e da sua coligação.
Foi relegada para a decisão a proferir a final a apreciação das excepções peremptórias de caducidade da denúncia e de caducidade do direito de propor a ação.
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Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com observância de todas as formalidades legais, tendo sido prolatada a sentença com a seguinte decisão:
Por tudo o exposto, decide-se julgar procedente a invocada exceção perentória de caducidade do direito de ação das Autoras e, em consequência, absolver os Réus D... Unipessoal, Lda. e AA dos pedidos formulados.
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Custas a cargo das Autoras – artigos 527º/1 e 2, do Código de Processo Civil.
Registe e Notifique.
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É desta decisão que, inconformadas, as Autoras interpõem recurso, terminando as suas alegações com as seguintes
CONCLUSÕES:
1- A ação colocada pela Autora foi considerada intempestiva, uma vez que o prazo de seis meses para propositura da ação teria alegadamente terminado em 29 de novembro de 2020, mesmo considerando a suspensão dos prazos processuais de 9 de março a 29 de maio de 2020, conforme previsto na Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março.
2- Nos termos do artigo 325º do Código Civil, o prazo de caducidade interrompe-se pelo reconhecimento, por parte do devedor, do direito que lhe é exigido.
3- O silêncio da ré perante interpelações repetidas e baseadas em relatórios técnicos constitui um reconhecimento tácito do defeito, nos termos do artigo 325.º, do Código Civil, uma vez que não contestou os factos apresentados nem rejeitou as pretensões das autoras de forma substancial.
4- Consequentemente, o prazo de caducidade de seis meses previsto no artigo 917.º do Código Civil deveria ter sido reiniciado em 1 de outubro de 2020, permitindo a propositura da ação até 1 de abril de 2021. Como a presente ação foi instaurada em 2 de março de 2021, é manifestamente tempestiva.
5- Pelo que a sentença recorrida viola o art.325º do Código Civil.
6- Para além disso, a sentença recorrida aplicou o prazo de caducidade previsto no artigo 917.º do Código Civil de forma indiscriminada a todos os pedidos formulados pelas autoras, ignorando a natureza distinta de alguns danos alegados.
7- No caso concreto, os danos relacionados com custos de remoção e substituição de monopostes e danos reputacionais não são danos inerentes aos defeitos físicos dos monopostes, mas sim consequências colaterais, pelo que deveriam ser analisados à luz do regime geral de prescrição de 20 anos previsto no artigo 309.º do Código Civil
8- Este entendimento é corroborado pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30/04/2024 (Proc. 3052/20.3T8STR.E1.S1), que refere expressamente que, em casos de danos colaterais, aplicam-se as regras gerais de responsabilidade civil e não os prazos de caducidade específicos.
9- Relativamente a este assunto, o tribunal “a quo” apenas referiu “ A questão apenas se poderia colocar relativamente aos danos não patrimoniais peticionados pelas Autoras, que se poderiam considerar não serem inerentes ao defeito, mas ocorridos em consequência do mesmo. No entanto, como as mesmas não lograram provar a existência de danos não patrimoniais, fica prejudicada a apreciação de tal questão.” o que se tem por ser completamente falso, uma vez que mesmo não sendo os danos quantificados por meio de prova, teria este assunto que ser relegado para execução de sentença, entendimento corroborado pelo Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 09/09/2024 (Proc. 3221/22.1T8GDM.P1) .
10- Pelo que a sentença recorrida viola o disposto no art.798º e 309º do Código Civil.
11- Ainda, e sem prescindir dos fundamentos anteriormente referidos, o tribunal “a quo” afastou o dolo como fundamento para o afastamento da caducidade, desconsiderando factos provados que evidenciam o conhecimento prévio da ré sobre os defeitos dos monopostes.
12- Ora, os factos provados nos presentes autos demonstram inequivocamente a prática de dolo pela Ré, conforme disposto no artigo 253.º do Código Civil, e faz com que o prazo aplicável para propositura da ação seja o previsto no artigo 287.º do Código Civil: um ano a contar do conhecimento do dolo, independentemente de denúncia prévia.
13- Considerando que as autoras tiveram conhecimento dos defeitos em julho de 2020, o prazo para intentar a ação deveria ser contado até julho de 2021, tornando a ação, uma vez mais, tempestiva.
14- Pelo que a sentença recorrida viola o disposto nos arts. 253º e 287º do Código Civil.
15- Finalmente, e independentemente da aplicação dos prazos de caducidade, a ré violou os deveres de conformidade e segurança impostos pelo artigo 762.º do Código Civil, uma vez que o dever de boa fé referido neste artigo abrange, no caso de um contrato de compra e venda, a obrigação do vendedor de entregar bens que correspondam ao que foi acordado contratualmente e que sejam adequados ao fim a que se destinam.
16- A responsabilidade da Ré pelos danos causados não se limita aos prazos específicos de denúncia ou caducidade previstos nos artigos 916.º e 917.º do Código Civil, mas decorre do regime geral da responsabilidade contratual previsto no artigo 798.º do mesmo diploma legal. Este artigo estabelece que: “O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor.”
17- Assim, o decurso do prazo de seis meses previsto no artigo 917.º não pode afastar o direito da Autora de serem indemnizadas pelos prejuízos resultantes do comportamento culposo da Ré, pelo que a sentença recorrida viola os artigos 762º e 798º do CC.
Conclui pela revogação da sentença recorrida, ordenando-se o prosseguimento dos autos para apreciação do mérito da causa.
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A Ré apresentou contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso.
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
No exame preliminar considerou-se nada obstar ao conhecimento do objecto do recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II - OBJECTO DO RECURSO
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos recorrentes, não podendo este tribunal conhecer de questões nelas não incluídas, salvo se forem de conhecimento oficioso (cf. artigos 635.º, n.º 4, 637.º, n.º 2, 1.ª parte, e 639.º, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (C. P. Civil).

Assim, partindo das conclusões das alegações apresentadas pelos Apelantes, as questões a decidir no presente recurso, são as seguintes:
a) Saber se é de revogar a sentença recorrida por não se verificar a excepção da caducidade.
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III - FUNDAMENTAÇÃO
1. OS FACTOS
1.1. Factos provados
O tribunal de que vem o recurso julgou provados os seguintes factos:
1. As Autoras são empresas cuja atividade principal é a publicidade exterior. (cf. certidões permanentes juntas com a petição inicial e a 07.12.2021, que se dão por reproduzidas)
2. As Autoras fazem parte do grupo C....
3. As Autoras celebram com a 1ª Ré D... Unipessoal, Lda. em agosto de 2014, 31 de dezembro de 2014 e 4 de novembro de 2015 contratos de compra e venda de monopostes publicitários.
4. A Autora A... celebrou com a Ré D.... Unipessoal, Lda. em agosto de 2014 contrato de compra e venda de monopostes publicitários que teve por objeto 5 monopostes para publicidade. (Documento 1 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
5. Nos termos dos considerandos do contrato celebrado a 1ª Ré iria vender à 1ª Autora monopostes com 2 faces com 10x5 mts iluminadas, suportados por um único poste com 12 metros de altura afixado no solo.
6. Da cláusula segunda do contrato consta que o preço pela prestação de serviços da 1ª Ré à 1ª Autora é de € 12.000,00 por cada monoposte, totalizando um valor total de €60.000,00 acrescido de IVA.
7. Na cláusula oitava consta que a 1ª Ré assume a sua exclusiva responsabilidade por qualquer dano provocado pelos monopostes a terceiros, nomeadamente provocados por deficiências na matéria-prima ou método de construção utilizado no monoposte e na sua fundação e montagem.
8. Os serviços técnicos da 1ª Ré entregaram à 1ª Autora as características técnicas do monoposte que iria ser executado ao abrigo do contrato em 08/08/2014. (Documento 2 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
9. Em 21 de agosto de 2014 o 2º Réu elaborou memória descritiva em que referiu que “A intervenção consiste na execução de um pilar metálico com um diâmetro de 610 mm e uma espessura de 10 mm devidamente encastrado com chumbadouros numa fundação de betão armado. Para receber o painel publicitário estão previstas madres em tubo RHS”. (Documento 3 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
10. Da memória descritiva constam os cálculos justificativos quanto ao dimensionamento do pilar - determinação das cargas, determinação dos esforços e determinação das tensões - e quando ao dimensionamento da fundação. (Documento 4 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
11. A 1ª Ré executou o seu serviço de montagem dos cinco monopostes tendo para o efeito emitido a fatura nº ... de 01/09/2014 e vencimento em 01/10/2014 no montante de €73.800,00 que a 1ª Autora liquidou na integra. (Documento 5 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
12. Com data de 31 de dezembro de 2014 a Autora B... (atualmente C..., S.A.) celebrou com a Ré D.... Unipessoal, Lda. contrato de compra e venda de monopostes publicitários que teve por objeto 10 monopostes para publicidade. (Documento 6 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
13. Consta dos considerandos do que a 1ª Ré iria vender à 2ª Autora monopostes com 2 faces com 10x5 mts iluminadas, suportados por um único poste com 12 metros de altura afixado no solo.
14. Consta da cláusula segunda do contrato que o preço pela prestação de serviços da 1ª Ré à 1ª Autora é de € 12.000,00 por cada monoposte, totalizando um valor total de € 120.000,00 acrescido de IVA.
15. Da cláusula oitava consta que a 1ª Ré assume a sua exclusiva responsabilidade por qualquer dano provocado pelos monopostes a terceiros, nomeadamente provocados por deficiências na matéria-prima ou método de construção utilizado no monoposte e na sua fundação e montagem.
16. Com data de 4 de novembro de 2015 a Autora B... (atualmente C..., S.A.) celebrou com a Ré D.... Unipessoal, Lda. contrato de compra e venda de monopostes publicitários que teve por objeto 20 monopostes para publicidade e uma estrutura de dupla face em “V” para instalar em poste já existente. (Documento 7 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
17. Consta dos considerandos do contrato que a 1ª Ré iria vender à 2ª Autora monopostes com 2 faces com 10x5 mts iluminadas, suportados por um único poste com 12 metros de altura afixado no solo e uma estrutura com a dimensão de 6x12mts, com 2 faces, a ser instalada, conforme projeto apresentado, num poste em betão já instalado na freguesia ..., em Loures.
18. Da cláusula segunda do contrato consta que o preço pela prestação de serviços da 1ª Ré à 1ª Autora é de € 12.000,00 por cada monoposte, e de € 10.000,00 para a construção e montagem da estrutura em “V” no ..., totalizando um valor total de €250.000,00 acrescido de IVA.
19. Na cláusula nona consta que a 1ª Ré assume a sua exclusiva responsabilidade por qualquer dano provocado pelos monopostes a terceiros, nomeadamente provocados por deficiências na matéria-prima ou método de construção utilizado no monoposte e na sua fundação e montagem.
20. De todos os contratos celebrados consta sob a cláusula 4ª que a Ré “compromete-se a entregar os respetivos projectos, (…) devidamente assinado por pessoa singular com poderes para o acto e devidamente inscrita na Ordem dos Engenheiros. 2. É condição essencial para a entrada em vigor do presente contrato a entrega pela primeira contraente e aprovação por parte da segunda contraente, dos projectos (…)”.
21. As características técnicas dos monopostes que iriam ser executados eram iguais em todos os contratos.
22. O 2º Réu elaborou em 16 de dezembro de 2015 memória descritiva em que referiu que “A intervenção consiste na execução de um pilar metálico com um diâmetro de 610 mm e uma espessura de 10 mm devidamente encastrado com chumbadouros numa fundação de betão armado. Para receber o painel publicitário estão previstas madres em tubo RHS”. (Documento 8 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
23. Da memória descritiva consta os cálculos justificativos quanto ao dimensionamento do pilar - determinação das cargas, determinação dos esforços e determinação das tensões - e quando ao dimensionamento da fundação são iguais às da memória descritiva referida em 10.
24. A 1ª Ré executou o seu serviço de montagem dos dez monopostes tendo para o efeito emitido a fatura nº ... de 31/12/2014 e vencimento em 30/01/2015 no montante de € 147.600,00 que a 2ª Autora liquidou na integra. (Documento 9 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
25. A 1ª Ré executou o seu serviço de montagem dos vinte monopostes e da estrutura em “V” tendo para o efeito emitido a fatura nº ... de 16/12/2015 e vencimento na mesma data no montante de €307.500,00 que a 2ª Autora liquidou na integra. (Documento 10 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
26. O 2º Réu foi o responsável técnico pelos parâmetros e especificações técnicas ao abrigo dos quais os monopostes deveriam ser montados e construídos.
27. O 2º Réu não confirmou as especificações de cada um dos monopostes.
28. A 1ª Autora adquiriu à 1ª Ré cinco monopostes que se encontram implantados nas seguintes localizações e georeferenciações:
- Maia A3 sentido Braga/Porto, Km 1,5 após confluência com A4, antes nó de acesso Hospital ... ...;
- Vila Nova de Gaia A1 sentido Gaia/Porto, antes da Pte. ... e antes nó de acesso .../... ...;
- Vila Franca de Xira A1, sentido Porto/Lisboa, antes das portagens e do nó de acesso a ... ...;
- Santa Maria da Feira, A1, sentido Lisboa/Porto, 500 m antes do nó de acesso a ... ...;
- Santa Maria da Feira A1, sentido Lisboa/Porto, Km 278,7, antes das portagens ... ....
29. A 2ª Autora adquiriu à 1ª Ré os monopostes que se encontram implantados nas seguintes localizações e georeferenciações:
- Santa Maria da Feira A1, sentido Lisboa/Porto, Km 281,3, antes das portagens ... ...;
- Alcanena A1, sentido Porto/Lisboa, Km 95, antes da saída para A23 ... ...
- Vila Franca de Xira A1, sentido Sul/Norte, Km 12,6, antes da saída para ..., antes das portagens ...;
- Vila Franca de Xira A1, sentido Sul/Norte, antes da saída para ..., antes das portagens ...;
- Loures A1, sentido Porto/Lisboa, início da 2.ª circular, antes do nó do ... ...;
- Maia A3, sentido Braga/Porto, após confluência com A4, antes do nó de acesso ao Hospital ... ...;
- Vila Nova de Gaia A1, sentido S/N, após o nó da A29, em direção à ponte ... ...;
- Albufeira A2, sentido Lisboa/Algarve, após as portagens e antes do nó da A22 ...;
- Silves A2, sentido Lisboa/Algarve, a 3 Km das portagens do Algarve ...;
- Braga A3, sentido Porto/Braga, antes da saída para .../... ...
- Santarém A1, sentido Porto/Lisboa, antes da saída para Santarém (A2/A6/A13) ...;
- Alcochete A12, sentido Montijo/Lisboa, entrada na Ponte ... (lado direito) ...;
- ... A2 sentido Algarve/Lisboa, após a saída ... e a 1Km da saída para ... ...;
- Maia A3 sentido Braga/Porto, antes do nó da A4, acesso à ... ...;
- ... A1 sentido Lisboa/Porto, antes da saída para ... ...;
- Silves A2 ..., norte/sul ...;
- Barcelos A3 sentido Ponte de Lima/Braga ...;
- Mangualde A25, sentido Guarda/Viseu ...;
- Alcobaça A8, sentido Leiria/Lisboa ...;
- Seixal A2, sentido Seixal/Lisboa ...;
- Elvas A6, sentido Badajoz/Évora ...;
- Faro A22, sentido Olhão/Faro ...;
- Santa Maria da Feira A1, sentido Porto/Lisboa ....
30. No dia 13 de outubro de 2018 dois dos monopostes executados e vendidos pela 1ª Ré à 2ª Autora partiram e tombaram.
31. Tal facto foi comunicado telefonicamente à 1ª Ré no dia 14 de outubro de 2018 e através de carta datada de 17 de outubro de 2018. (Documento 11 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
32. Consta da referida carta que dois dos monopostes fornecidos pela Ré, um sito em ... e outro em ..., partiram e tombaram; que não obstante a intempérie ocorrida na mesma zona existiam outros que ficaram intactos, o que a faz crer ter havido algum problema com a conceção, fabrico ou instalação dos mesmos; que já é a terceira situação em que ocorre queda de monoposte fornecido pela Ré e que a queda lhe causou prejuízos.
33. Da mesma carta solicitam à Ré a remoção dos monopostes caídos no prazo de 7 dias e a sua substituição por novos no prazo de 30 dias.
34. Pede, ainda, a verificação de todos os monospostes fornecidos.
35. Por carta data de 31 de outubro de 2018 a 2ª Autora envia nova comunicação à Ré, da qual consta que a Ré não procedeu à remoção dos monopostes caídos e que, por isso, procedeu à sua remoção. (Documento 12 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
36. Da mesma comunicação consta que findo o prazo concedido à Ré “procederemos à compra e montagem de novos monopostes”, cujo custo será imputado à Ré.
37. A Ré, por carta datada de 9 de novembro de 2018, respondeu às cartas de 17 e 31 de outubro de 2018, referindo que a queda dos monopostes se tinha ficado a dever à “Tempestade Leslie” cujo pico teria ocorrido entre as 22h de 13/10/2018 e as 03h de 14/10/2018. (Documento 13 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
38. Atentos os motivos invocados na carta da 1ª Ré foi solicitado um parecer ao IPMA (Instituto Português do Mar e da Atmosfera, IP) que referiu que “(…) na zona de ..., distrito de Aveiro: Entre as 20h00 do dia 13 de Outubro de 2018 e as 08h00 do dia 14 de Outubro de 2018: O vento tenha soprado do quadrante oeste, aumentando de moderado (20 a 35 km/h) a muito forte (56 a 75 km/h) temporariamente excepcionalmente forte (76 a 85km/h ); A intensidade máxima instantânea do vento rajada máxima) tenha atingido ou ultrapassado ligeiramente 120 km/h”. (Documento 14 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
39. Segundo o relatório do 2º Réu as estruturas teriam que aguentar 87,505 Km/h de vento.
40. Mais nenhum monoposte com a mesma dimensão e na mesma zona caiu ou tombou.
41. As Autoras preocupadas com a segurança dos 35 monopostes executados, montados e vendidos pela 1ª Ré e porque a Ré não procedeu à sua substituição pediu um estudo à sociedade E... relativamente aos dois monopostes que tinham tombado em 13 de outubro de 2018.
42. Nesse estudo, datado de 6 de dezembro de 2018, foram analisados os dois monopostes caídos e localizados nos seguintes locais: Poste 1 - A1 (sentido Norte - Sul) - ... ... e Poste 2 - A1 (sentido Norte - Sul) - ... ....
43. Das conclusões do relatório consta expressamente que a execução dos mesmos não seguiu as especificações do projeto, tendo sido reduzida a espessura da chapa em 40%, de 10mm para 6 mm.
44. As Autoras, preocupadas com o teor do relatório da E... solicitaram a outra entidade - F..., um relatório pericial, por amostragem a 3 monopostes publicitários edificados nos seguintes locais: - Poste 1: Rua ... - ... ...; Poste 2: ..., Rua ... - ... e Poste 3: Rua ..., ..., ....
45. Esta empresa concluiu, por relatório de 17.07.2019, que a execução dos monopostes não corresponde à espessura contratualizada e que esta diminuição contribuiu para a queda dos mesmos.
46. Dos monopostes referidos em 29., e 30., três têm valores de dimensão e espessura idênticos aos contantes do projeto.
47. Os demais têm valores de espessura inferiores aos contantes do projeto, tendo o valor médio de espessura de 6,4mm.
48. Depois da elaboração do relatório pela empresa F... um dos monopostes que tinha sido objeto do seu estudo, situado em ... - Rua ..., caiu no dia 19 de dezembro de 2019.
49. No dia 14 de janeiro de 2020 a 2ª Autora enviou carta registada à 1ª Ré a comunicar-lhe a queda do monoposte e a interpelar a mesma para proceder à substituição, bem como à revisão e reparação de todos os monopostes fornecidos, no prazo de 10 dias. (Documento 30 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
50. A 1ª Ré não respondeu à comunicação.
51. A sociedade G..., Lda. era, dentro do grupo C..., quem explorava comercialmente os monopostes montados, executados e vendidos pela 1ª Ré.
52. Por carta datada de 20 de julho de 2020 as Autoras comunicaram à Ré a realização do estudo pela empresa F... e o seu resultado e interpelaram a mesma a proceder à substituição dos monopostes fornecidos por outros que tenham as características contratadas para o que concedem prazo até 31.08.2020. (Documento 36 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
53. Da mesma comunicação fizeram constar o orçamento que tinham em seu poder para a substituição dos monopostes e os custos suportados com a remoção dos monopostes caídos.
54. A empresa H..., Lda. apresentou orçamento de €317.800,00 para a reparação e substituição de 28 monopostes que tinham sido executados, montados e vendidos pela 1ª Ré às Autoras.
55. Os 28 monopostes necessitam de ser substituídos.
56. Através de carta de 1 de outubro de 2020 a 2ª Autora informou a 1ª Ré que o monoposte situado na A2, sentido Norte-Sul, ... se encontrava na iminência de queda, que o mesmo iria ser objeto de reparação e os respetivos custos imputados à 1ª Ré. (Documento 36 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
57. A Ré não respondeu.
58. As Autoras enviaram ao 2º Réu carta datada de 29 de julho de 2020, com cópia da carta remetida à Ré em 20.07.2020, imputando-lhe a responsabilidade técnica dos projetos e solicita que diligencie junto da Ré para proceder à reparação dos defeitos em 28 monopostes. (Documento 39 junto com a petição inicial, que se dá por reproduzida)
59. Mais comunicam que se tal reparação não for efetuada irão exigir do mesmo o ressarcimento de todos os danos sofridos.
60. As Autoras têm inúmeras estruturas publicitárias no território nacional.
61. Os outdoors de grande formato são os que dão mais visibilidade e retorno financeiro às Autoras.
62. As Autoras estão a tratar de, paulatinamente, reparar e substituir os 28 outdoors fornecidos pela Ré.
63. Portugal foi assolado pelo furação “Leslie” e pela depressão “Elsa” em 13.10.2018/14.10.2028 e 19.12.2019.
64. O furação “Leslie” e a depressão “Elsa” causaram inúmeros estragos no país, nomeadamente, nos locais onde se encontravam os monopostes, com quedas de árvores e estruturas publicitárias.
65. Entre as 20:00 do dia 13.10.2018 e as 08:00 do dia 14.10.2018, na zona de ..., o vento soprou do quadrante oeste, aumentando de moderado (20 a 35km/h) a muito forte (56 a 75km/h), temporariamente excecionalmente forte (76 a 85km/h); a intensidade máxima instantânea do vento (rajada máxima) atingiu ou ultrapassou ligeiramente 120km/h.”.
66. Entre as 20:00 do dia 13.10.2018 e as 08:00 do dia 14.10.2018, na zona de ..., o vento soprou do quadrante oeste, aumentando de moderado (20 a 35km/h) a muito forte (56 a 75km/h), temporariamente excecionalmente forte (76 a 85km/h); a intensidade máxima instantânea do vento (rajada máxima) atingiu 120 a 130 km/h.”.
67. No dia 19.12.2019, em ..., o vento soprou moderado (15 a 35km/h) de sudoeste, temporariamente forte (36 a 55 Km/h) e a intensidade máxima instantânea do vento atingiu valores de 90 a 100km/h na madrugada, podendo pontualmente ter ultrapassado ligeiramente os 100km/h.” (documento nº 12 junto com a contestação, que se dá por reproduzido)
68. O furacão “Leslie” e pela depressão “Elsa” derrubaram muitas estruturas de norte a sul do país.
69. Os ventos verificados provocaram tensões muito superiores à tensão de cedência do aço.
70. A queda dos monopostes de ... e ... a 13/10/2018 e de ... a 19/12/2019 foi causada pelos ventos sentidos durante o furacão “Leslie” e a depressão “Elsa” naquelas zonas.
71. Os Monopostes foram entregues e montados pela Ré entre 2015 e 2016.
72. É necessário proceder a manutenção anual dos monospostes.
73. Mesmo que os monopostes fossem executados com um diâmetro de 610 mm e 10 mm de espessura, seriam derrubados pela ação do vento a que estiveram sujeitos.
74. A Ré sabia que estava a vender às Autoras monopostes que não estavam conformes com o fim pretendido nem cumpriam os requisitos técnicos para que fossem utilizados como monopostes de publicidade.
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2 – Factos não Provados:
1. A sociedade G..., Lda. suportou os seguintes custos, que imputou à 2ª Autora:
• Reparação dos dois monopostes caídos em 13 de outubro de 2018 em ... e ... no valor de € 20.910,17;
• Custos de remoção dos dois monopostes caídos em 13 de outubro de 2018 em ... e ... no valor de € 1.845,00;
• Substituição de monoposte situado em Barcelos por estar em risco eminente de queda no valor de € 7.555,95;
• Reparação do monoposte caído em 19 de Dezembro de 2019 em ... -Maia no valor de € 11.045,40;
• Custos de remoção do monoposte caído em 19 de Dezembro de 2019 em ..., Maia no valor de € 1.303,80.
2. O custo de substituição dos 5 monopostes adquiridos pela 1ª Autora é de € 69.802,50.
3. O custo de substituição dos 23 monopostes adquiridos pela 2ª Autora é de € 321.091,50.
4. A imagem das Autoras transmitida ao mercado sobre a qualidade dos suportes (outdoors) ficou abalada.
5. As Autoras procederam a alteração do monoposte de ..., sito no Km 179.7 da A1 (E80), já depois da montagem.
6. Acrescentaram-lhe por cima painéis solares, o que aumentou em cerca de 10m2 a área das faces do mesmo.
7. Essas alterações, à revelia da Ré, contribuíram para a queda.
8. Aumentaram o peso e o atrito/resistência ao vento.
9. A queda dos monopostes de ... e ... a 13/10/2018, deveu-se única e exclusivamente aos efeitos da passagem do furacão “Leslie” por aquelas zonas.
10. O mesmo se verificou quanto à queda do monoposte de ... a 19/12/2019, que foi causada pela depressão “Elsa”.
11. Em 2018, na data em que caíram os monopostes das Autoras caíram monopostes de outras empresas. (Fotos nº 1 a 10 da CONT não é suficiente para demonstrar).
12. Os monopostes não tiveram qualquer vistoria ou manutenção desde a sua instalação.
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2 - OS FACTOS E O DIREITO.

Os Autores/Apelantes invocam não ter ocorrido a caducidade da acção, contrariamente ao expendido pela decisão recorrida, porquanto não tinha ocorrido o prazo de 6 meses previsto no artº 917º do C. Civil.
Conhecendo:
O contrato celebrado entre as partes encontra-se caracterizado na sentença recorrida como contrato de compra e venda defeituosa previsto nos artigos 913º a 918º do Código Civil, o que não é posto em causa no presente recurso.

De acordo com o disposto no art. 913º do Código Civil, há venda de coisa defeituosa quando a coisa vendida sofrer de vício que a desvalorize ou que impeça a realização do fim a que é destinada ou quando não tiver as qualidades asseguradas pelo vendedor ou necessárias para a realização daquele fim.
O defeito da coisa constitui um desvio com respeito à qualidade corpórea que seria devida, inerente aos aspetos materiais do bem (cfr. Pedro Romano Martinez, in Cumprimento Defeituoso em Especial na Compra e na Empreitada, pág. 198).

Dispõe o Artigo 916.º (Denúncia do defeito)
1. O comprador deve denunciar ao vendedor o vício ou a falta de qualidade da coisa, excepto se este houver usado de dolo.
2. A denúncia será feita até trinta dias depois de conhecido o defeito e dentro de seis meses após a entrega da coisa.
3 - Os prazos referidos no número anterior são, respectivamente, de um e de cinco anos, caso a coisa vendida seja um imóvel.

Artigo 917.º (Caducidade da acção)
A acção de anulação por simples erro caduca, findo qualquer dos prazos fixados no artigo anterior sem o comprador ter feito a denúncia, ou decorridos sobre esta seis meses, sem prejuízo, neste último caso, do disposto no n.º 2 do artigo 287.º

“A caducidade tem por objectivo evitar o protelamento do exercício de certos direitos por lapsos de tempo dilatados, levando-os a que se extingam pelo decurso do prazo fixado. Prevalecem considerações de certeza e de ordem pública, no sentido de ser necessário que, ao fim de certo tempo, as situações jurídicas se tornem certas e inatacáveis. Estão em causa prazos peremptórios de exercício do direito”, vide AUJ 2/97 de 30 de Janeiro, in DR.

Reconduzindo-nos ao caso sub judicio, constata-se que as Autoras tiveram conhecimento dos defeitos com o recebimento do relatório de análise dos monopostes por amostragem realizado pela empresa F..., remetido a empresa do mesmo grupo em 17.07.2019.
Procederam à denúncia dos defeitos em Julho de 2020, sendo que a acção deu entrada em Juízo a 02.03.2021.
Assim, ter-se-á de concluir, tal como fez a sentença recorrida, que entre a data em que as Autoras denunciaram o defeito e a instauração da presente acção decorreram mais de seis meses, mesmo considerando que tal prazo esteve suspenso até 29.05.2020, tendo o mesmo terminado a 29.11.2020, por força do disposto do artigo 7º/3 da Lei 1-A/2020, de 19 de Março e da norma interpretativa constante dos artigos 5º e 6º da Lei nº 4-A/2020, de 06 de abril, aquela primeira previsão produz efeitos desde o dia 09.03.2020 até 29.05.2020, data em que foi revogada pela Lei nº16/2020, de 29 de Maio.

Os Apelantes invocam ainda que o prazo de caducidade interrompe-se pelo reconhecimento, por parte do devedor, do direito que lhe é exigido.
O silêncio da ré perante interpelações repetidas e baseadas em relatórios técnicos constitui um reconhecimento tácito do defeito, nos termos do artigo 325.º, do Código Civil, uma vez que não contestou os factos apresentados nem rejeitou as pretensões das autoras de forma substancial.
Consequentemente, o prazo de caducidade de seis meses previsto no artigo 917.º do Código Civil deveria ter sido reiniciado em 1 de outubro de 2020.
Conhecendo:
É entendimento uniforme na jurisprudência que o impedimento da caducidade da denúncia do defeito só ocorrerá se intentada a respectiva acção ou, mediante o reconhecimento do direito do comprador por parte do vendedor, como vem sendo considerado admissível, nos termos gerais do art. 331º, nº 2 do Cód. Civil, sendo que o reconhecimento tem de ser claro e inequívoco, isto é, em termos de não subsistirem dúvidas sobre a aceitação, pelo devedor, dos direitos do credor, vide, entre outros, Ac do STJ de 11-07-2023, processo 1499/21.7T8PVZ.P1.S1, Relator Jorge Dias e, in www.dgsi.pt.

A propósito, dispõe o art. 331º, nº 1 do Cód. Civil, só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo.
No caso sub judicio encontra-se provado em “37 - A Ré, por carta datada de 9 de novembro de 2018, respondeu às cartas de 17 e 31 de outubro de 2018, referindo que a queda dos monopostes se tinha ficado a dever à “Tempestade Leslie” cujo pico teria ocorrido entre as 22h de 13/10/2018 e as 03h de 14/10/2018.”
Relativamente ao restante é irrelevante o facto dos Autores terem interpelado a Ré, designadamente enviado estudo, e esta não ter respondido (ponto 49 e 50 dos factos provados), porquanto o silêncio, como meio declarativo, apenas vale como declaração negocial, quando esse valor lhe seja atribuído por lei ou convenção, não tendo a virtualidade de impedir ou reiniciar um novo prazo de caducidade da acção.
O reconhecimento tem de ser claro e inequívoco
Assim sendo, improcede o argumento da caducidade ter sido impedida pelo facto de ter interpelado a R.
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Invocam ainda os Autores que a sentença recorrida aplicou o prazo de caducidade previsto no artigo 917.º do Código Civil de forma indiscriminada a todos os pedidos formulados pelas autoras, ignorando a natureza distinta de alguns danos alegados, no caso concreto os danos relacionados com custos de remoção e substituição de monopostes e danos reputacionais não são danos inerentes aos defeitos físicos dos monopostes, mas sim consequências colaterais, pelo que deveriam ser analisados à luz do regime geral de prescrição de 20 anos previsto no artigo 309.º do Código Civil
Conhecendo:
Tem vindo a ser entendimento uniforme da jurisprudência, quando a causa de pedir se traduz no vício da coisa, o art. 917º do Código Civil deve ser objecto de interpretação extensiva, abrangendo as situações de fazer valer qualquer pretensão decorrente daqueles vícios, no prazo a que se reporta aquele normativo, seja a resolução do negócio, seja a redução do preço, a reparação da coisa, sua substituição, ou indemnização nos termos gerais pelos prejuízos sofridos, a tal interpretação impondo a unidade do sistema jurídico, vide Ac. do S.T.J. de 16-3-2011, rel. João Bernardo, 558/03.2TVPRT.P1.S1., Ac. do S.T.J. de 12-5-2011, rel. Tavares de Paiva, revista n.º 3867/06.5TBAVR.C1.S1, o acima citado acórdão STJ, 1499/21.7T8PVZ.P1.S1, de 11.07.2023, Ac do STJ, de 12-10-2023, processo 13330/17.3T8LSB.L2.S1, Relator: Nuno Ataíde das Neves, todos in www.dgsi.pt.
“De facto, não se compreenderia que o legislador só tivesse estabelecido um prazo para a anulação do contrato, deixando os outros pedidos à prescrição geral de vinte anos (art. 309º); por outro lado, tendo a lei estatuído que, em caso de garantia de bom funcionamento, todas as ações derivadas do cumprimento defeituoso caducam em seis meses, não se entenderia muito bem porque é que, na falta de tal garantia, parte dessas ações prescreveriam no prazo de vinte anos. (…) E se o art. 917º. não fosse aplicável, por interpretação extensiva, a todos os pedidos derivados da prestação, estava criado um caminho para iludir os prazos curtos», vide Pedro Romano Martinez, in Cumprimento Defeituoso em Especial na Compra e na Empreitada, pág. 367).
Reconduzindo-nos ao caso sub judicio, contrariamente ao alegado pelas Autoras/Apelantes, entende-se, tal como referido na sentença recorrida, que os danos relacionados com custos de remoção e substituição dos monopostes constituem danos reflexos/sucedâneos, directamente causados pelo cumprimento defeituoso da obrigação, assente esta no facto de ter sido feito o fornecimento defeituoso dos monopostes, não ter sido feita a reparação, nem a substituição dos mesmos.
“A indemnização não deixa de ser em caso algum o sucedâneo com o qual se pretende assegurar a prestação pontual que o defeito não deixou cumprir.
E é por isso que a ação respetiva não pode deixar de ser tratada no mesmo âmbito temporal que a ação definida para o essencial remédio do defeito: ou a anulação, ou a redução do preço, ou a reparação ou substituição da coisa, ou a resolução. Quer a indemnização tenha a natureza de reparação – complementar – dos danos que ficaram para além de qualquer um dos caminhos, quer seja em si mesma, ela própria, o único caminho efetivamente reparador”, vide Ac STJ de 30/04/2024, processo nº 3052/20.3T8STR.E1.S1, Relator: Maria do Rosário Gonçalves, in www.dgsi.pt.
Assim sendo, encontrando-se tais danos sucedâneos abrangidos pelo regime da caducidade da acção, a qual como já acima vimos caducou, também aqui improceder o recurso.
Relativamente aos danos não patrimoniais que se poderiam considerar não inerentes ou intrínsecos ao cumprimento defeituoso, os mesmos não se provaram, pelo que improcedem os mesmos.
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Alegam ainda os Autores/Apelantes que os factos provados nos presentes autos demonstram inequivocamente a prática de dolo pela Ré, conforme disposto no artigo 253.º do Código Civil, e faz com que o prazo aplicável para propositura da ação seja o previsto no artigo 287.º do Código Civil: um ano a contar do conhecimento do dolo, independentemente de denúncia prévia.
Também aqui não lhes assiste razão por duas ordens de razão.
Em primeiro lugar.
Face ao disposto no artigo 253º nº 1 do C. Civil entende-se por dolo qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo declaratário ou terceiro, do erro do declarante.
Contudo, diz-se no nº 2 daquele preceito que "não constituem dolo ilícito as sugestões ou artifícios usuais, considerados legítimos segundo as concepções dominantes no comércio jurídico".
A concretização do dolo pressupõe um erro da parte do declarante, determinado intencionalmente por outrem: a vítima do dolo não só se engana (como no caso do erro) como, além disso, é enganada) - "erro qualificado", vide Ac. do STJ, de 20.01.2005, Processo, 04B4349, Relator Ferreira de Almeida, in www.dgsi.pt.
Reconduzindo-nos ao caso sub judicio, da matéria de facto provada não se pode extrair a conclusão da existência de dolo por banda da Ré, atente-se não se encontrar provado o reconhecimento da R. dos defeitos e consequente dolo no fornecimento dos monopostes por não possuírem as características previstas.
Ou seja, houve incumprimento negocial no fornecimento dos monopostes, mas daqui não se pode concluir que tenha havido actuação dolosa da Ré no fornecimento do material acordado com as Autoras.

Em segundo lugar, mesmo que se considerasse haver dolo, o que não está provado, a acção também teria caducado, senão vejamos.
Nos termos do artº 287º do CC, sem necessidade de denúncia, tem o comprador o prazo de um ano para intentar a acção, sendo que esse prazo de um ano se conta a partir do momento em que as Autoras têm conhecimento do dolo.
Havendo dolo, o comprador não tem o ónus de denunciar o vício ou a falta de qualidade da coisa (artigo 916.º/1 do Código Civil) e, por conseguinte, o prazo a considerar é o fixado genericamente no artigo 287.º do Código Civil, ou seja, o prazo de um ano subsequente à cessação do vício que lhe serve de fundamento, vide Ac. do STJ, de 13/02/2014, processo nº 1115/05.4TCGMR.G1.S1, Relator Salazar Casanova, in www.dgsi.pt.
Não é, portanto, o prazo geral de prescrição do artigo 309.º do Código Civil que importa, mas o prazo de um ano que se conta, " no caso do erro e do dolo […] a partir do momento em que o declarante se apercebeu deles" (Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol I, 4.ª edição, pág. 264).
Como bem refere a sentença recorrida, o conhecimento da existência de monopostes com espessura inferior à contratada ocorreu com o conhecimento do teor do relatório em 17.07.2019, o que impunha, sob pena de caducidade, que a acção fosse proposta dentro do prazo de um ano a contar dessa data.
Ora, tendo a acção dado entrada em Juízo a 02.03.2021, manifesto é a extemporaneidade da acção.
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Atento o exposto, é de negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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IV. – Dispositivo
Pelo exposto, acordam os Juízes que integram a 3ª secção deste Tribunal da Relação do Porto em:
a) Em negar provimento ao recurso das Autoras/Apelantes, mantendo-se a sentença recorrida.

Custas pelos AA/Apelantes – artigo 527º do Código de Processo Civil.
Notifique.

Porto, 20 de Março de 2025.
Álvaro Monteiro
Paulo Duarte Teixeira
Isabel Silva