SEGURO DE ACIDENTES PESSOAIS
SINISTRO
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
Sumário

I - Um seguro de acidentes pessoais é um seguro facultativo, regulado pela responsabilidade contratual, e não tem natureza indemnizatória.
II - Não lhe são aplicáveis as regras de indemnização por responsabilidade civil extracontratual ou pelo risco, nem o cálculo indemnizatório consignado no art.º 564º do CC ou o recurso à equidade. Quer os danos a reparar, quer os montantes a pagar serão os previstos nos termos e nas condições da apólice.
III - Tendo as partes consignado expressamente no clausulado do contrato de seguro que o apuramento da IPP seria efetuado de acordo com a Tabela anexa ao mesmo, não é de considerar a Tabela Nacional de Incapacidades em Direito Civil.

Texto Integral

Apelação nº 1804/22.9T8PNF.P1





ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

I – Resenha do processado

1. AA instaurou ação contra A... Insurance PLC-Sucursal em Portugal, pedindo a sua condenação a pagar-lhe €15.000,00, acrescidos de juros moratórios.

Para fundamentar tal pedido, alegou ter celebrado com a Ré um seguro de acidentes pessoais, a fim de cobrir o risco da verificação de lesão corporal, invalidez, temporária ou permanente, ou morte da pessoa segura. Tendo sofrido um acidente pessoal, do qual resultou uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 15%, a Ré apenas considerou tal IPP de 6%. Invoca ainda danos morais.

Em contestação, a Ré impugnou a percentagem da IPP, bem como os danos alegados.

Realizada audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença condenando a Ré a pagar ao Autor € 14.500,00, acrescidos de juros moratórios.

2. Para assim decidir, a sentença considerou a seguinte factualidade:

Factos provados

1. Autor e Ré celebraram um acordo denominado de contrato de seguro denominado A... Família Activa – Motoristas Profissionais, titulado pela apólice n.º ...48, com início em 6.7.2020 e renovando-se anualmente.

2. Através do referido contrato, o Autor transferiu para a Ré a responsabilidade civil emergente de acidentes pessoais relativa ao mesmo.

3. Estando cobertos os riscos de lesão corporal, invalidez temporária ou permanente, morte da pessoa segura.

4. No dia 15 de fevereiro de 2021, pelas 11.30 horas, o Autor quando estava com uma máquina elétrica a fazer alguns serviços domésticos, esta escorregou-lhe da mão.

5. Tendo-lhe provocado a perda da 3.ª falange do 2.º dedo da mão direita e esfacelo do 3.º dedo da mão direita.

6. Após o acidente, o Autor deslocou-se ao Hospital ..., onde lhe foram prestados os primeiros socorros.

7. E no dia 17 de fevereiro de 2021 efetuou o primeiro curativo no Centro de Saúde ....

8. A Ré por conta das lesões referidas em 5 transferiu para o Autor a quantia de €3.000 (três mil euros).

9. O Autor submeteu-se a vários tratamentos, designadamente de fisioterapia.

10. As lesões consolidaram-se em 15.4.2021.

11. Em consequência do referido em 4 e 5 o Autor sofreu dores, num quantum de grau 3 numa escala de 1 a 7.

12. E ficou a padecer de uma IPP fixável em 4 pontos numa escala de 1 a 100 pontos.

13. O Autor ficou com dificuldades em executar gestos como apertar cordões.

Factos não provados

a) O Autor ficou a padecer de uma IPP de 15%;

b) E em consequência do acidente, o Autor deixou de fazer trabalhos de natureza profissional e domésticos durante seis meses de recuperação;

c) A Ré pagou ao Autor as seguintes quantias: €25 (vinte e cinco euro); €58 (cinquenta e oito euros); €15,33 (quinze euros e trinta e três euros) e €14,28 (catorze euros e vinte e oito cêntimos).

3. Inconformada com tal decisão, dela apelou a Ré, formulando as seguintes conclusões:

1. O Tribunal a quo laborou em erro, por desconsiderar de todo o contrato de seguro celebrado entre as partes, seu conteúdo e disposições, apesar de ter julgado o mesmo integralmente provado nos pontos 1, 2 e 3, bem como, por ser manifestamente excessivo o montante atribuído ao Autor, em face da prova produzida nos autos relativamente à verificação e extensão dos danos.

2. Resultou provado, que entre o Autor e Ré foi celebrado um contrato de seguro de acidentes pessoais denominado A... Família Activa – Motoristas Profissionais, que abrange, na sua cobertura, os danos por morte ou invalidez permanente, despesas de tratamento e repatriamento, incapacidade temporária, internamento hospitalar e despesas de funeral.

3. O Tribunal a quo sempre deveria cingir a pretensão do Autor ao contratualizado, nomeadamente, ao pagamento das importâncias peticionadas e que se incluíssem nas categorias particulares definidas e até ao limite da cobertura contratualizada.

4. O contrato de seguro celebrado abrange exclusivamente o ramo de acidentes pessoais, respondendo apenas pelas coberturas e capitais seguros expressamente acordados - danos por morte ou invalidez permanente, despesas de tratamento e repatriamento, incapacidade temporária, internamento hospitalar e despesas de funeral.

5. Todos os pagamentos indemnizatórios devem obedecer aos critérios consignados no contrato, além do fixado nas condições particulares, ao expressamente fixado nas condições especiais da apólice – cláusula 2.ª, 8.ª e 9ª e nas condições gerais da apólice, nomeadamente, na cláusula 23.º;

6. Em caso de omissão, para o cálculo indemnizatório, a Tabela Nacional de Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23-10 (Anexo II).

7. O Autor nem sequer fundamentou ou alegou a que título peticiona da Ré o pagamento da quantia de €15.000,00 (quinze mil euros), provavelmente por bem saber que não teria direito a ser indemnizado pelas importâncias requeridas e a título de danos não contratualizados;

8. O Tribunal a quo, por não ter considerado ou justificado a existência do contrato de seguro não obrigatório e cujo clausulado não foi colocado em crise e, por ter decidido nos termos gerais de direito, como se se tratasse da transferência de responsabilidade civil extracontratual de um seguro obrigatório, viola de forma flagrante a lei contratual civil, o que impõe corrigir.

9. Considerando os factos julgados provados, nunca o valor indemnizatório poderia ultrapassar as coberturas contratualizadas, quer porque não foi colocado em crise pelo Autor, quer porque o próprio nem sequer peticionou de forma fundamentada os danos cuja indemnização requereu.

10. Considerando os danos alegados pelo Autor, a cobertura aplicável e no âmbito da qual resultou provado que a Ré já havia pago a importância de €3.000,00 (três mil euros), tinha um limite de 5.000,00 (cinco mil euros) – despesas de tratamento e repatriamento.

11. O seguro de acidentes pessoais não é um seguro de danos, designadamente de responsabilidade civil, mas um seguro de pessoas, desenvolvido a partir do seguro de vida, estando em causa valores humanos de natureza não patrimonial e permitindo a inclusão – se assim for convencionado, de acordo com o princípio da liberdade contratual – da cobertura do risco quanto a danos não patrimoniais ou morais.

12. Resultou provado que o seguro objeto dos presentes autos não inclui a cobertura do risco quanto a danos não patrimoniais ou morais como peticionado pelo Autor.

13. Pelo que, impõe-se a revogação da sentença proferida e a substituição por outra que julgo improcedente o pedido do Autor, em virtude das disposições do contrato de seguro objeto dos presentes autos.

14. O Autor padeceu de dores físicas e psíquicas desde o acidente até à data da consolidação das lesões foram avaliadas em 3 pontos, numa escala de 7 pontos de gravidade crescente;

3. O dano estético do Autor foi valorizado, mas nem sequer é indicado na sentença em crise;

4. Em termos de lazer, não resultou provado que o Autor desenvolvia qualquer atividade;

5. Resultou provado que as sequelas são, em termos de repercussão permanente na atividade profissional, compatíveis com o exercício da atividade habitual, sendo que não foi provado que o Autor exercesse qualquer atividade;

6. A indemnização fixada a título de danos patrimoniais e não patrimoniais deve aproximar-se a casos semelhantes, sob pena de não ser justa, por tratar de maneira diferente situações idênticas;

7. Considerando a, felizmente, menor gravidade das lesões sofridas pelo Autor a sua idade, em comparação com arestos citados e os montantes aí arbitrados a título de compensação por danos não patrimoniais, todos os factos provados e recorrendo ainda a critérios de equidade, entende a recorrente que o valor da compensação pelos danos não patrimoniais não deverá exceder os 2.000,00 euros (dois mil euros), até considerando o limite da cobertura contratual aplicável;

8. O valor indemnizatório do dano biológico consistente numa IPG de 1 ponto reconhecida ao Autor deveria ser calculado de acordo com as previsões da Portaria 337/2008 de 26 de Maio, revista pela Portaria 679/2009 de 25 de Junho, ou não o sendo, não deveria ultrapassar os valores que têm vindo a ser jurisprudencialmente fixados para situações idênticas;

9. Autor sofreu dores, que de forma alguma se pretendem desvalorizar, mas não ficou definitivamente portador de nenhuma enfermidade significativa;

10. A douta sentença recorrida ao reconhecer ao Autor sinistrado uma indemnização de Euros 14.500,00 (catorze mil e quinhentos euros) apenas com base na ficcionada incapacidade de 4 pontos e três pontos de quatum doloris, por danos não patrimoniais e patrimoniais, violou o princípio do indemnizatório que, como é consabido, proíbe a acumulação de indemnizações para os mesmos danos;

11. A douta sentença sob censura violou as regras dos artigos 483º, 496º, 562º, 563º e 564º e 566º do Código Civil;

12. A douta sentença sob censura violou as regras dos artigos 483º, 496º, 562º, 563º e 564º e 566º do Código Civil;

13. Deve o Tribunal “ad quem” reapreciar a decisão proferida e, em conformidade, julgar inequivocamente como exagerada a indemnização atribuída, decorrente da repercussão das sequelas de que ficou (definitivamente) a padecer, reduzindo a mesma a valor não superior a 2.000,00 Euros (dois mil euros);

14. Em face do exposto, pugna-se pela revogação da douta decisão recorrida, substituindo-a por outra que absolva a Apelante/Ré no pagamento da indemnização a que foi condenada a título de danos não patrimoniais e patrimoniais, no valor que exceda os 2.000 Euros, porque apenas assim se cumprirá a Lei, realizando-se o Direito e fazendo-se a desejada Justiça!

Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida com todas as legais consequências, assim se fazendo a esperada JUSTIÇA!

4. O Autor contra-alegou, sustentando a improcedência da apelação.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO

5. Apreciando o mérito do recurso

O objeto do recurso é delimitado pelas questões suscitadas nas conclusões dos recorrentes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras: art.º 615º nº 1 al. d) e e), ex vi do art.º 666º, 635º nº 4 e 639º nº 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (CPC).

No caso, trata-se de decidir se estão verificados os requisitos para a condenação da Ré.

5.1. Subsunção dos factos ao direito

§ 1º - O art.º 210º da Lei do Contrato de Seguro (LCS) [[1]], estabelece a seguinte noção: No seguro de acidentes pessoais o segurador cobre o risco da verificação de lesão corporal, invalidez, temporária ou permanente, ou morte da pessoa segura, por causa súbita, externa e imprevisível.

E, na medida em que “compreende a cobertura de riscos relativos à vida, à saúde e à integridade física de uma pessoa ou de um grupo de pessoas nele identificadas” (art.º 175º da LCS), o seguro de acidentes pessoais pertence ao ramo “seguro de pessoas”, e não “seguro de danos”.

É também consensual que as prestações devidas pelas Seguradoras no caso de seguros do ramo “seguro de pessoas”, não têm natureza indemnizatória.

Assim, tratando-se de responsabilidade contratual, e do ramo “seguro de pessoas”, quer os danos a reparar, quer os montantes a pagar serão os consignados nas condições e nos termos da apólice.

«A prestação do segurador é fixada à forfait nas apólices, sendo devida não obstante a inexistência concreta de um prejuízo. Mesmo nos seguros contra acidentes pessoais, em que, no caso de incapacidade permanente, a prestação do segurador varia conforme a percentagem de desvalorização resultante de tabelas contidas nas apólices, se abstrai do dano sofrido, pois à desvalorização física verificada pode não corresponder um prejuízo para o segurado e, de qualquer modo, aquela prestação é sempre função da quantia segura, arbitrariamente fixada na apólice.» [[2]]

No mesmo sentido:

«I - No caso em apreço, o contrato de seguro celebrado entre a A. e o Município é um seguro de acidentes pessoais, compreendendo prestações convencionadas ou pré-determinadas, em que o montante a pagar já se encontrava previamente definido (150.000,00 €), dependendo a concretização de tal pagamento apenas da verificação de determinado evento (v.g. morte do bombeiro segurado).

II - Assim a A., ao proceder ao pagamento da prestação pré-definida a que se vinculou com a celebração do contrato de seguro de acidentes pessoais com o Município, fê-lo por se tratar do cumprimento de uma obrigação própria, de acordo com o contrato que celebrou, e não de uma obrigação de terceiro, inexistindo qualquer possibilidade de sub-rogação.» [[3]]

Consequentemente, é de entender assistir razão à Apelante quando refere não ser de utilizar aqui as regras de indemnização por responsabilidade civil extracontratual ou pelo risco, nem o cálculo indemnizatório consignado no art.º 564º do Código Civil (CC) ou o recurso à equidade.

Na verdade, no caso dum contrato de seguro facultativo, há apenas que entrar em linha de conta com a verificação da ocorrência do sinistro previsto no contrato e se estão verificadas as condições (gerais e particulares) para a obrigatoriedade de pagamento por parte da Seguradora.

§ 2º - No caso em apreciação, o Autor efetuou com a Ré um seguro de acidentes pessoais que lhe pudessem advir, cobrindo os riscos de lesão corporal, invalidez temporária ou permanente e morte da pessoa segura.

Donde, ser incontroverso que o litígio se insere no âmbito da responsabilidade contratual e nas relações imediatas Seguradora-Segurado.

Neste domínio, e desde que não desrespeitem leis imperativas, é permitida às partes a livre fixação do conteúdo dos contratos, os quais, uma vez firmados, devem ser pontualmente cumpridos: art.º 405º e 406º nº 1 do CC.

Olhada a apólice, dela apenas consta que para o risco “morte ou invalidez permanente”, a cobertura seria de um máximo de € 50.000,00.

E, nos termos das Condições Gerais do seguro contratado, resulta da cláusula 23ª, 3.2. al. a), que, em caso de invalidez permanente, a Seguradora “pagará, a parte correspondente do capital seguro determinado pela Tabela de Desvalorizações, a qual faz parte integrante desta apólice, com exceção dos seguros obrigatórios em que deverá ser aplicada a Tabela Nacional para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil.”

§ 3º - Aqui chegados, importa ainda deixar consignado o seguinte:

Consta como facto provado 12 que o Autor ficou a padecer de uma IPP fixável em 4 pontos numa escala de 1 a 100 pontos.

Sucede que essa foi a IPP considerada pelo Instituto de Medicina Legal na perícia efetuada ao Autor no âmbito dos presentes autos.

Verifica-se do relatório pericial que essa IPP foi fixada de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades em Direito Civil.

E tal não pode ser, face ao que se referiu nos § 1º e 2º deste acórdão. Estamos perante um seguro facultativo, uma situação de responsabilidade contratual, tendo as partes consignado expressamente no clausulado do contrato que o apuramento da IPP seria efetuado de acordo com a Tabela anexa ao contrato, e não com a Tabela Nacional de Incapacidades em Direito Civil.

§ 4º - Na sentença operou-se com as regras indemnizatórias próprias da responsabilidade por factos ilícitos ou pelo risco (art.º 562º a 564º do CC), o que já vimos não ser o mais correto. No domínio da responsabilidade contratual, trata-se apenas de obrigar o devedor (Seguradora) a cumprir a prestação a que se obrigou.

«A entrega judicial ao credor da coisa que lhe é devida (…) não constituem, rigorosamente, uma indemnização.» [[4]]

E, porque se trata de uma obrigação pecuniária, o prejuízo referido no art.º 798º do CC consubstancia-se em juros moratórios (art.º 806º nº 1 do CC).

Trata-se então agora de proceder ao apuramento da quantia a pagar em conformidade com o contratado e a Tabela anexa às Condições Gerais do mesmo. Vejamos.

Em consequência do sinistro, o Autor sofreu a perda da 3.ª falange do 2.º dedo da mão direita e esfacelo do 3.º dedo da mão direita.

E, como melhor se esclarece no ponto “B. Exame Objetivo” do relatório médico do IML: “Membro superior direito: Perda quase total da extremidade distal (F3) de D2 com coto razoavelmente almofadado e rigidez ligeira a moderada da articulação interfalângica proximal (IFP) de D2 e hipostesia da face volar de F3 de D3, sem limitação funcional com dificuldade na preensão e pinça fina com as extremidades de D2 e D3”. (sublinhados nossos)

Segundo a referida Tabela de cálculo (ponto 811 das condições gerais), vemos que a invalidez permanente parcial contempla as seguintes percentagens no que toca à mão direita:

· Amputação do indicador (2º dedo) – 15

· Amputação do médio (3º dedo) - 8

Verifica-se também que a Tabela não contempla perda parcial das falanges dos dedos, como foi o caso do Autor segundo o facto provado 5.

Na verdade, a mão é composta por carpo, metacarpo e dedos. Cada um dos dedos é constituído por falanges, 3 em cada dedo, à exceção do polegar, que só tem duas falanges. Em linguagem comum, as falanges denominam-se falange, falanginha e falangeta, denominação considerada a partir do metacarpo.

Donde, se o Autor sofreu a perda da 3ª falange do 2.º dedo da mão direita, tal significa na linguagem comum que sofreu apenas a perda da falangeta do 2º dedo, e não a amputação total.

O mesmo se diga do 3º dedo, que apenas sofreu “esfacelo”, e não amputação. Esfacelo, contudo, que implicou a perda de sensibilidade (hipostesia), sem limitação funcional, mas com dificuldade na preensão e pinça fina com as extremidades de D2 e D3.

Estamos, portanto, perante perdas parciais, e não amputações totais.

Já vimos que a Tabela anexa ao contrato não contempla perdas parciais. Porém, segundo a al. e) do ponto 3.2. da cláusula 23ª, “as lesões não enumeradas na Tabela (…), mesmo de importância menor, são indemnizadas em proporção da sua gravidade comparada com a dos casos enumerados (…)”.

Na procura da gravidade das lesões, e respetiva fixação, à míngua de outros dados de facto que tivessem ficado provados, entendemos ser de colher o que resulta do relatório pericial do IML. Aí se considerou que as sequelas são analisadas na globalidade, considerando o corpo, suas funções e situações da vida, tendo-se concluído que são compatíveis com o exercício da atividade profissional habitual, mas implicando esforços suplementares.

Assim, consideramos ajustado considerar 7 pontos para a perda da 3.ª falange do 2.º dedo da mão direita (correspondente aos 15 pontos previstos na Tabela para a amputação total) e 2 pontos para o esfacelo do 3º dedo da mão direita (correspondente aos 8 pontos previstos na Tabela para a amputação total).

· 7% do capital máximo de € 50.000,00 corresponde a € 3.500,00.

· 2% do capital máximo de € 50.000,00 corresponde a € 1.000,00.

O Autor teria então direito a € 4.500,00.

Sucede que a Ré já pagou ao Autor a quantia de € 3.000,00 pelo que resta apenas pagar os mil e quinhentos euros em falta.

§ 5º - Por fim, quanto aos danos morais, terá de concluir-se não serem os mesmos devidos, pela simples razão de o contrato os não contemplar. Da mesma forma, e pela mesma razão, que não é de equacionar o dano biológico ou estético.

6. Sumariando (art.º 663º nº 7 do CPC)

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III. DECISÃO

7. Pelo que fica exposto, acorda-se nesta secção cível da Relação do Porto em revogar parcialmente a sentença recorrida, decidindo-se agora condenar a Ré a pagar ao Autor mil e quinhentos euros (€ 1.500,00), para lá dos três mil já pagos, bem como juros moratórios sobre esses mil e quinhentos euros, à taxa legal, a contar da data do presente acórdão.

Custas da ação e do recurso a cargo do Autor e da Ré, na proporção do decaimento.

Porto, 20 de março de 2025

Relatora: Isabel Silva

1º Adjunto: Francisca Mota Vieira

2º Adjunto: João Venade

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[[1]] DL n.º 72/2008, de 16 de abril, com as alterações de que foi objeto, a última das quais pela Lei n.º 82/2023, de 29/12.
[[2]] Moitinho de Almeida, “O Contrato de Seguro no Direito Português e Comparado”, Livraria Sá da Costa Editora, 1971, pág. 303.
[[3]] Acórdão do STJ, de 27/11/2024, processo nº 28/24.5T8CTB.S1, disponível em www.dgsi.pt/, sítio a atender nos demais arestos que vierem a ser citados sem outra menção de origem.
[[4]] Pires de Lima e Antunes Varela, “Código Civil Anotado”, Coimbra Editora, vol. I, anotação 2 ao artigo 562º.