I - Proferido despacho sobre o modo como deve ser organizada a partilha, nos termos do disposto no art. 1110.º, n.º 2, al. a), do Cód. Proc. Civil, no qual o tribunal afirma que os bens a partilhar são os identificados na relação de bens apresentada pelo cabeça de casal, que não sofreu reclamações, não pode o tribunal a quo, em despacho ulterior, remeter os interessados para os meios comuns quanto a algumas das verbas dessa mesma relação de bens, com o fundamento da insuficiência dos elementos juntos para se poder afirmar que tais verbas integram a herança aberta por óbito do inventariado, por tal entrar em contradição com a anterior decisão, integrando violação de caso julgado formal.
II - Resulta da leitura conjugada do disposto nos arts. 1092.º, 1093 e 1105.º do Cód. Proc. Civil que a possibilidade de remessa dos interessados para os meios comuns se verifica:
a) quanto a questões prejudiciais suscitadas na pendência do inventário, de que de dependa a admissibilidade do processo ou a definição de direitos de interessados diretos na partilha (art. 1092.º, n.º 1, al. b), do Cód. Proc. Civil);
b) quanto a outras questões que não respeitem à admissibilidade do processo de inventário ou à definição de direitos de interessados diretos na partilha (art. 1093.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil);
c) quanto a questões atinentes à oposição, impugnação ou reclamação dos interessados diretos da partilha, nos termos previstos no art. 1104.º do Cód. Proc. Civil (ressalva efetuada na parte final do n.º 3 do art. 1105.º do Cód. Proc. Civil).
III - A decisão de remessa dos interessados para os meios comuns, quanto aos bens relacionados para serem partilhados pressupõe necessariamente uma discordância entre as partes quanto aos bens a partilhar (incluídos ou por incluir na relação de bens) em que é suscitada e está controvertida matéria de facto cuja complexidade torna inconveniente a apreciação da questão no processo de inventário, por implicar a redução das garantias das partes (em litígio).
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I – Relatório
Identificação das partes e indicação do objeto do litígio
AA intentou no Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia – Juiz 4, processo de inventário para partilha dos bens deixados por óbito de BB, falecido em 22-08-2018, requerendo a sua nomeação como cabeça-de-casal e indicando como herdeiros do falecido a própria requerente, sua viúva, e os interessados filhos CC, DD, EE e FF.
Juntou relação de bens, composta exclusivamente por imóveis.
Em 12-09-2023 foi nomeada cabeça-de-casal a requerente, e ordenada a citação dos interessados nos termos e para os efeitos do artigo 1104.º do CPC.
Citados os interessados, não foi apresentada qualquer oposição ao inventário nem qualquer reclamação à relação de bens.
Em 03-04-2024 foi ordenada a notificação das partes para, em 20 dias, “darem a forma à partilha”.
Em 09-04-2024 a cabeça-de-casal apresentou requerimento propondo a forma à partilha nos seguintes termos:
I- O inventariado faleceu no dia 22 de Agosto de 2018 no estado de casado com a cabeça de casal, segundo o regime da comunhão geral de bens, em primeiras e únicas núpcias de ambos.
II- O inventariado não fez doações, nem deixou testamento ou outra disposição de última vontade.
III- Não existem dívidas, nem activas, nem passivas.
IV- Sucedem-lhe:
a) A sua viúva, ora cabeça de casal;
b) e quatro filhos: CC, DD, EE e FF.
V- Os bens a partilhar são os identificados na relação de bens, que não sofreu reclamações.
VI- As operações de partilha são as seguintes:
1- Somam-se os valores dos bens relacionados.
2- Este valor divide-se em 2 partes iguais, das quais uma constitui a meação da cabeça de casal, que lhe pertence, constituindo a outra metade a herança a partilhar.
3- Esta divide-se em 4 partes iguais, constituindo uma quarta parte o quinhão sucessório da cabeça de casal, que lhe deverá ser adjudicado;
4- As demais ¾ da metade divide-se em 4 partes iguais, por tantos serem os filhos do inventariado, constituindo cada uma dessas partes a quota legitimária de cada um deles.
5- O preenchimento dos quinhões far-se-á conforme for acordado na conferência, ou venha a resultar das licitações, ou da venda, se tal ocorrer nos autos.
Em 08-05-2024 o tribunal a quo proferiu despacho determinando a organização da partilha nos moldes do requerimento de 09-04-2023 e designando data para a realização da conferência de interessados.
Em 11-09-2024, na conferência de interessados agendada, o tribunal a quo deu conta aos presentes que «(…) as verbas Nº 2, 16, 23, 25 a 27 estão registadas em nome de terceiras pessoas e não consta dos autos a descrição predial do prédio da verba nº numero 20.(…)», tendo o mandatário da cabeça-de-casal requerido o adiamento da conferência «(…) para poder verificar os documentos em falta e daqueles registos em nome de terceiros, para o que requer o prazo de 10 dias. (…)», o que foi deferido pelo tribunal a quo, adiando a conferência de interessados sem designação imediata de nova data «(…) por admitir que os interessados podem querer diligenciar pelo registo daqueles prédios em seus nomes (…)».
Em 23-09-2024 a cabeça-de-casal informou que «(…) promoveu a obtenção de um conjunto de documentos com os quais se propõe esclarecer a situação dos imóveis a partilhar, identificados nas verbas nº 2, 16, 20, 23, 25, 26 e 27.Logo que lhe sejam facultados esses documentos a cabeça de casal voltará aos autos com os esclarecimentos que crê serem pertinentes e relevantes. (…)».
Em 18-10-2024 o tribunal a quo ordenou a notificação dos interessados «(…) para se pronunciarem sobre a possibilidade dos bens que constam das verbas 2, 16, 23, 25 a 27 serem excluídos da relação de bens por estarem registados a favor de terceiras pessoas e, ainda o da verba 20, por não ter sido junta a descrição predial, prosseguindo quanto aos demais bens relacionados.»
Em 24-10-2024 a cabeça de casal apresentou requerimento no qual presta «(…) esclarecimentos relativamente aos bens relacionados nas verbas nºs 2, 16, 20, 23, 24, 25, 26 e 27 da relação de bens, nomeadamente, no que concerne à sua situação registral (…)», juntando diversos documentos.
Em 27-10-2024 a cabeça-de-casal requereu a junção aos autos de relação de bens retificada de acordo com os esclarecimentos prestados.
Em 06-01-2025 o tribunal a quo, considerando que dos documentos juntos pela cabeça-de-casal não resulta que os bens imóveis constantes das verbas n.º 2, 23, 25, 26 e 27 tenham sido adquiridos pelo inventariado no âmbito de um processo de inventário, decidiu, «(…) na impossibilidade de saber se este bem deve ser partilhado neste inventário (…)», remeter os interessados para os meios processuais comuns quanto a tais bens.
E, quanto à verba 20, considerando que «(…) resulta da respetiva certidão que esse bem (que estará registado com o n.º .../20090820) tem registo de aquisição a favor de pessoas diferentes do inventariado (e que não serão os interessados).», decidiu, por resultar do registo predial uma presunção de propriedade, remeter os interessados para os meios processuais comuns também quanto a tal verba.
Inconformada com esta decisão, a cabeça-de-casal interpôs recurso de apelação, apresentando as seguintes conclusões:
A- O despacho recorrido é proferido estando já esgotado o poder jurisdicional do Mmº Juiz a quo quanto à questão da definição dos bens a partilhar, por força da prolacção antecedente do despacho saneador de 8 de Maio de 2024, violando também caso julgado formal/autoridade de caso julgado deste último adveniente.
B- O Mº Juiz a quo, s.m.o., não podia, no despacho sob censura, remeter as partes para os meios comuns oficiosamente, sem que houvesse, que in casu não há, um litígio entre os interessados na partilha quanto aos bens a partilhar, traduzido na dedução por qualquer deles, no prazo legal e sob cominação, da(s) competente(s) reclamação(ões) à relação de bens.
C- A argumentação do Mº Juiz a quo constante do despacho recorrido não encontra respaldo na documentação dos autos, maxime a junta com o requerimento inicial e com o requerimento de 24 de Outubro de 2024, referência citius 49489650, e com o que aí foi alegado e não contestado por qualquer dos interessados.
D- Da certidão judicial junta como documento n.º 42 com o requerimento inicial deste inventário resulta evidente que o inventariado destes autos adquiriu por adjudicação no processo de inventário nº 84/1981 para partilha de bens do seu falecido pai, o aí inventariado GG, as verbas 2, 20, 25, 26, 27 deste inventário que, no citado processo 84/1981 estavam descritas, respectivamente, como verbas 14, 105, 114, 130 e 126 e que a sentença homologatória deste último processo transitou em julgado em 13 de Março de 1984.
E- Já da certidão judicial junta como documento nº 3 com o requerimento de 24-10-2024, resulta claro que a verba nº 23 destes autos foi adquirida por adjudicação à aqui cabeça de casal, no estado de casada em regime de comunhão geral de bens com o aqui inventariado, em processo de inventário por morte de CC que correu termos sob o nº de processo 5/1974, cuja sentença transitou em julgado em 8/11/1974, estando neste último processo descrita como verba n.º 24.
F- Nem encontra respaldo na lei, pois que as aquisições sobreditas pelo inventariado destes autos precedem a entrada em vigor, e mesmo a publicação do D.L.224/84 de 6 de Julho que instituiu o registo predial obrigatório e é o próprio Código de Registo Predial vigente que determina ser inexigível, para o registo de aquisição com base em partilha, que o(s) prédio(s) esteja(m) registados em nome de transmitente, dispensando ainda o trato sucessivo.
G- Impõe-se, pelo exposto, a revogação do despacho recorrido, devendo determinar-se a baixa do processo para designação de data para a conferência de interessados para os fins já plasmados no despacho saneador de 8/05/2024.
H- O despacho recorrido violou, por incorrecta interpretação e aplicação dos artigos 613º, nºs 1 e 3, 620º, 1093º, 1104º, 1105º e 1110º do C. P. Civil, o D.L. 224/84, de 6 de Julho, mormente o seu artigo 10º e os artigos 34º, nº 3 e 35º do Código de Registo Predial.
Conclui pela revogação do despacho recorrido.
Não foram apresentadas respostas às alegações.
Após os vistos legais, cumpre decidir.
II – Objeto do recurso:
Se o despacho recorrido viola caso julgado formal.
Inadmissibilidade de remessa oficiosa dos interessados para os meios comuns, inexistindo litígio entre as partes (1104.º, n.º 1, al. d), 1105.º e 1093.º, todos do CPC).
Existência no processo dos elementos documentais comprovativos da aquisição pelo inventariado das verbas 2, 20, 23, 25, 26 e 27, não obstando à partilha dos referidos imóveis a inscrição em nome de terceiro, atento o regime dos arts. 34.º, n.º 3 e 35º do Cód. Registo Predial.
Acresce a responsabilidade quanto a custas.
III – Apreciação dos fundamentos do recurso
Fundamentação de facto
A matéria de facto relevante para a apreciação do recurso é a referida no relatório que antecede, e ainda a seguinte:
1 – Da relação de bens (corrigida – junta ao processo de inventário em 24-10-2024, ref. 40489940) deixados por óbito do inventariado BB constam elencadas, além de outras, as seguintes verbas:
IMÓVEIS SITUADOS NA UNIÃO DE FREGUESIAS ..., ... E ..., CONCELHO DE CASTELO DE PAIVA:
Verba nº 2
Prédio urbano, constituído por uma casa de habitação de construção antiga, com rés-do-chão e 1º andar, situada em ..., ..., a confrontar do norte com caminho, do sul com HH, do nascente com o caminho, do poente com II, com a área do terreno de 358 m2, implantação do edifício de 237 m2, área bruta de construção 373 m2, área bruta dependente 237 m2, área bruta privativa 136 m2, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ..., do Livro nº ..., descrição actual nº ... da freguesia ..., inscrita na matriz sob o artigo ..., com o valor patrimonial de --------------- € 30.950,00.
(…)
Verba nº 20
Prédio rústico, constituído por terreno de mato, com a área de ha: 0,348000, situado em ..., UNIÃO DE FREGUESIAS ..., ... e ..., concelho de Castelo de Paiva, a confrontar do norte com o caminho, do sul com o ribeiro, do nascente com JJ e outro, do poente com KK, descrito na Conservatória do Registo Predial, sob o nº ..., a folhas 134 do Livro ..., que corresponde actualmente à descrição ..., da freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., com o valor patrimonial de -- € 0,70.
cfr. certidão permanente junta ao requerimento anterior como doc. nº 2.
(…)
Verba nº 23
Prédio rústico, constituído por terreno de pinhal e mato, com área de ha: 0,998000, situado em ..., União de Freguesias ..., ... e ..., concelho de Castelo de Paiva, a confinar do norte com LL, do sul com o caminho, do nascente com o caminho e MM, do poente com NN, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ..., do Livro ..., actual descrição n.º ... da freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., com o valor patrimonial de -------- € 25,54.
cfr. certidão judicial que se junta ao deante e certidão do registo predial junto ao requerimento anterior como docs. nº 3 e 4..
(…)
IMÓVEIS SITUADOS NO CONCELHO DE CINFÃES:
Verba nº 25
Prédio rústico, composto por terreno de cultura de sequeiro e vinha, conhecido por “prédio de OO”, com a área de ha: 0,330000, situado em ..., ..., freguesia ..., concelho de Cinfães, a confrontar do norte com PP, do sul e nascente com QQ, do poente com o ribeiro, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ..., do Livro nº ..., actual descrição ... da freguesia ..., inscrito actualmente na matriz sob o artigo ... com o valor patrimonial de------------------------------------------------------------------------- €152,23.
Verba nº 26
Prédio rústico, composto por terreno de pinhal, denominado “...”, com a área de ha: 0,280000, situado em ..., limites de ..., freguesia ..., concelho de Cinfães, a confrontar do norte com QQ, do sul com RR, do nascente com caminho, do poente com SS, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ..., do Livro nº ..., actual descrição ... da freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo ..., com o valor patrimonial de ----------€ 24,54.
Verba nº 27
Prédio urbano, destinado a habitação com 2 andares e quintal, situado em ..., freguesia ..., concelho de Cinfães, com a área de terreno de 466 m2, área de implantação do edifício de 86 m2, área bruta de construção 172 m2, área bruta dependente de 86 m2, área bruta privativa de 86 m2, a confrontar de todos os lados com herdeiros de GG, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...-B, Livro nº ..., actual descrição nº ... da freguesia ..., inscrito na matriz sob o artigo ... urbano, com o valor patrimonial de --------------------------------------------------------------------- € 9.713,51.
2 – A cabeça-de-casal juntou ao processo, relativamente às verbas 2, 20, 25, 26 e 27 acima referidas em 1., a seguinte documentação:
2.1. – Certidão do Processo de Inventário Obrigatório n.º 84/1981 que correu termos no Tribunal de Castelo de Paiva, junta com o requerimento inicial, instaurado por óbito do aí inventariado TT, no âmbito do qual foi cumulada, no que aqui releva, a partilha dos bens deixados pelos progenitores daquele inventariado falecido, GG e UU, sendo o aqui inventariado BB um dos filhos destes inventariados, no qual foi homologada por sentença de 01-03-1984, transitada em julgado em 23-03-1984, a partilha aí efetuada.
Da análise dessa certidão, junta com o requerimento inicial, resulta terem sido adjudicadas ao aqui inventariado BB, entre outras e no que aqui releva, as verbas aí descritas sob os n.os ..., ..., ..., ... e ..., nos seguintes termos:
Imóveis
Comuns do casal de GG e esposa UU, sitos no Lugar ..., freguesia ..., desta comarca
(…)
Verba 14
Prédio urbano composto de casa de habitação, com lagar, prensa, dependência e quinteiro, conhecida por “...”, até ao passadiço, a confrontar do nascente e norte com caminho, sul com HH, e poente com herdeiros de II, inscrito na matriz urbana sob o art. ..., com o valor matricial de onze mil setecentos e vinte escudos.
Verba 105
Prédio rústico composto de terreno de mato, conhecido por “...”, a confrontar do norte com o caminho, nascente com JJ e outros, sul com o Ribeiro e do poente com KK, inscrito na matriz sob o artigo ..., com o valor matricial de cento e quarenta escudos.
Verba 114
Prédio rústico composto de terreno lavradio, com uma corte e terreno de monte, conhecido por “Prédio do OO”, sito nos limites de ..., a confrontar do nascente com VV e outros, do poente e norte com este VV, e do sul com WW, inscrito na matriz sob os artigos ... e ..., com o valor matricial total de seis mil e setecentos escudos.
Verba 126
Prédio urbano composto de casa de habitação de dois andares e quintal, situado no ..., a confrontar por todos os lados com herdeiros de GG, inscrito na matriz sob o artigo ... com o valor matricial de seis mil setecentos e sessenta escudos.
Verba 130
Prédio rústico composto de terreno lavradio, monte e abegoaria, denominado “...”, situado em ... limites de ..., a confrontar do nascente com o rego da levada, de poente e norte com XX e do sul com herdeiros de YY, inscrito na matriz sob o artigo ... com o valor matricial de oito mil quatrocentos e quarenta escudos.
2.2. – Quanto à verba n.º 2 da Relação de Bens:
a) Fotocópia não certificada da Conservatória do Registo Predial de Castelo de Paiva, freguesia ..., referente ao prédio urbano sito em Lugar ..., aí descrito sob o n.º ..., com registo de aquisição ‘por inventário por morte’ a favor de JJ e ZZ, tendo como sujeito passivo AAA, efetuado pela Ap. ... de 1945/11/28, conforme doc. 6 junto com o requerimento inicial que, no mais, aqui se dá por reproduzido (e novamente junto, em cumprimento do despacho do tribunal a quo de 16-12-2024, ref. 466737319, com o requerimento de 19-12-2024, ref. 41074415).
b) Cópia da Caderneta Predial Urbana referente ao prédio inscrito sob o artigo matricial ... da União de Freguesias ..., ... e ..., dela constando que tal artigo matricial teve origem no artigo matricial urbano ... da extinta freguesia ..., constando como titular inscrito o inventariado BB, conforme doc. 7 junto com o requerimento inicial que, no mais, aqui se dá por reproduzido (e novamente junto, em cumprimento do despacho do tribunal a quo de 16-12-2024, ref. 466737319, com o requerimento de 19-12-2024, ref. 41074415).
2.3. – Quanto à verba n.º 20 da Relação de Bens:
a) Certidão permanente da Conservatória do Registo Predial de Castelo de Paiva, freguesia ..., referente ao prédio rústico denominado “...” sito no Lugar ..., aí descrito sob o n.º ... (Descrição em Livro n.º ..., Livro n.º ...), com registo de aquisição por ‘compra’ pelos sujeitos ativos GG, casado com UU no regime de comunhão geral de bens, e de UU, casada com GG no regime de comunhão geral de bens, tendo como sujeito passivo BBB, registo esse efetuado pela Ap. ... de 1968/10/23, conforme doc. 2 junto com o requerimento de 24-10-2024 (ref. 40489650) que, no mais, aqui se dá por reproduzido.
b) Cópia da Caderneta Predial Rústica referente ao prédio inscrito sob o artigo matricial n.º ... da União de Freguesias ..., ... e ..., dela constando que tal artigo matricial teve origem no artigo matricial ..., constando como titular inscrito o inventariado BB, conforme doc. 28 junto com o requerimento inicial que, no mais, aqui se dá por reproduzido.
2.4. – Quanto à verba n.º 25 da Relação de Bens:
a) Certidão permanente da Conservatória do Registo Predial de Cinfães, freguesia ..., referente ao prédio rústico denominado “Prédio de OO” situado em ..., aí descrito sob o n.º ... (Descrição em Livro n.º ..., Livro n.º …), com registo de aquisição por ‘Arrematação em Hasta Pública” pelo sujeito ativo GG, casado, tendo como sujeito passivo CCC, registo esse efetuado pela Ap. ... de 1959/08/24, conforme doc. 35 junto com o requerimento inicial que, no mais, aqui se dá por reproduzido (e novamente junto, em cumprimento do despacho do tribunal a quo de 16-12-2024, ref. 466737319, com o requerimento de 19-12-2024, ref. 41074415).
b) Cópia da Caderneta Predial Rústica referente ao prédio inscrito sob o artigo matricial n.º ... da freguesia ..., constando como titular inscrito o DDD, conforme doc. 36 junto com o requerimento inicial que, no mais, aqui se dá por reproduzido (e novamente junto, em cumprimento do despacho do tribunal a quo de 16-12-2024, ref. 466737319, com o requerimento de 19-12-2024, ref. 41074415).
2.5. – Quanto à verba n.º 26 da Relação de Bens:
a) Certidão permanente da Conservatória do Registo Predial de Cinfães, freguesia ..., referente ao prédio rústico denominado “...” situado em ..., aí descrito sob o n.º ... (Descrição em Livro n.º ..., Livro n.º ...), com registo de aquisição por ‘Partilha Extrajudicial” pelo sujeito ativo EEE, tendo como sujeito passivo FFF, registo esse Of. de 1966/06/07, conforme documento junto com o requerimento de 19-12-2024, ref. 41074415 (em resposta ao despacho do tribunal a quo de 16-12-2024, ref. 466737319).
b) Cópia da Caderneta Predial Rústica referente ao prédio inscrito sob o artigo matricial n.º ... da freguesia ..., constando como titular inscrito GGG – Cabeça-de casal da herança de, conforme doc. 38 junto com o requerimento inicial que, no mais, aqui se dá por reproduzido (e novamente junto, em cumprimento do despacho do tribunal a quo de 16-12-2024, ref. 466737319, com o requerimento de 19-12-2024, ref. 41074415).
2.6. – Quanto à verba n.º 27 da Relação de Bens:
a) Certidão permanente da Conservatória do Registo Predial de Cinfães, freguesia ..., referente ao prédio rústico denominado “...” situado em ..., aí descrito sob o n.º ... (Descrição em Livro n.º ..., Livro n.º ...), com registo de aquisição por “Compra” a favor do sujeito ativo HHH, casada com WW, tendo como sujeitos passivos III e mulher JJJ, registo esse efetuado pela Ap. ... de 1966/06/07, conforme doc. 39 junto com o requerimento inicial que, no mais, aqui se dá por reproduzido (e novamente junto, em cumprimento do despacho do tribunal a quo de 16-12-2024, ref. 466737319, com o requerimento de 19-12-2024, ref. 41074415).
b) Cópia da Caderneta Predial Urbana referente ao prédio inscrito sob o artigo matricial n.º ... da freguesia ..., constando como titular inscrito Estado Português, conforme doc. 40 junto com o requerimento inicial que, no mais, aqui se dá por reproduzido (e novamente junto, em cumprimento do despacho do tribunal a quo de 16-12-2024, ref. 466737319, com o requerimento de 19-12-2024, ref. 41074415).
3 – A cabeça-de-casal juntou ao processo, relativamente à verba 23 da relação de bens referida no ponto 1., a seguinte documentação:
3.1. – Certidão do Processo de Inventário Obrigatório n.º 5 de 1974 que correu termos no Tribunal de Arouca instaurado por óbito do aí inventariado CC, sendo a aqui cabeça-de-casal AA, casada segundo o regime de comunhão geral de bens com o aqui inventariado BB [uma das] filha do referido CC, no qual foi homologada por sentença de 28-10-1974, a partilha aí efetuada, tendo sido adjudicadas à “filha AA e marido BB, para pagamento do seu quinhão”, além de outro, no que aqui releva, a verba aí descritas sob o n.º ... nos seguintes termos:
Bens Imóveis sitos na comarca de Castelo de Paiva
Verba 24 (vinte e quatro)
Prédio rústico constituído por terra de mato, denominado “...”, sito no Lugar ..., a confrontar do norte com KKK e outros, sul e nascente com caminho púbico, poente com NN e outros. (…) descrito na respectiva conservatória sob o nº ..., do L.º ... e inscrito na matriz no artigo ..., com o valor matricial de cinco mil cento e vinte escudos.
Conforme doc. 3 junto com o requerimento de 24-10-2024 (ref. 40489650) que, no mais, aqui se dá por reproduzido.
3.2. – Certidão permanente da Conservatória do Registo Predial de Castelo de Paiva, freguesia ..., referente ao prédio rústico denominado “...” situado em Lugar ..., aí descrito sob o n.º ... (Descrição em Livro n.º ..., Livro n.º ...), com registo de aquisição por “Compra” a favor do sujeito ativo LLL, casado com MMM, tendo como sujeitos passivos NNN e OOO, registo esse efetuado pela Ap. ... de 1924/04/19, conforme doc. 4 junto com o requerimento de 24-10-2024 (ref. 40489650) que, no mais, aqui se dá por reproduzido (e novamente junto, em cumprimento do despacho do tribunal a quo de 16-12-2024, ref. 466737319, com o requerimento de 19-12-2024, ref. 41074415).
3.3. – Cópia da Caderneta Predial Rústica referente ao prédio inscrito sob o artigo matricial n.º ... da União de Freguesias ..., ... e ... (com origem no artigo ...), constando como titular inscrito AA, conforme doc. 32 junto com o requerimento inicial que, no mais, aqui se dá por reproduzido (e novamente junto, em cumprimento do despacho do tribunal a quo de 16-12-2024, ref. 466737319, com o requerimento de 19-12-2024, ref. 41074415).
Análise dos factos e aplicação da lei
São as seguintes as questões de direito parcelares a abordar:
1. Violação de caso julgado formal pela decisão recorrida
2. Inadmissibilidade de remessa oficiosa dos interessados para os meios comuns
3. Erro nos pressupostos da decisão recorrida
4. Responsabilidade pelas custas
1. Violação de caso julgado formal pela decisão recorrida
Alega a apelante que a decisão recorrida – proferida em 06-01-2025 – viola a autoridade de caso julgado decorrente do despacho de 08-05-2024.
É o seguinte o teor do despacho proferido pelo tribunal a quo em 08-05-2024:
«O Tribunal é o competente.
O processo é o próprio.
As partes têm personalidade e capacidade jurídica e são legítimas.
Não existem outras exceções ou questões prévias de que cumpra conhecer.
Concorda-se com a forma à partilha que consta do requerimento de 09/04/2023, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
Notifique, solicitando ainda às partes que se alguma vai requerer a avaliação dos bens, concretamente dos imóveis, não aguarde até à conferência de interessados e venha dizê-lo desde já a fim daquela diligência poder ser dada sem efeito por poder contender com o tempo que tal perícia carecer.»
Este despacho foi proferido após a notificação das partes, ordenada por despacho de 03-04-2024, «(…) para, em vinte dias, darem a forma à partilha. (…)», e após a apresentação, pela cabeça-de-casal, em resposta a tal despacho, do requerimento de 09-04-2024 em que a mesma «(…) vem dar forma à partilha nos termos seguintes: (…)».
Tais despachos e requerimentos surgem no âmbito da tramitação prevista no art. 1110.º do Cód. Proc. Civil, subsequente àquela que pode ser chamada a fase dos articulados do processo de inventário, prevista e regulada nos arts. 1097.º a 10109.º do Cód. Proc. Civil.
Ora, no caso dos autos, verifica-se que a requerente do inventário é a cabeça de casal da herança aberta por óbito do inventariado BB, tendo a mesma, logo no requerimento inicial (apresentado em 04-09-2023), indicado os elementos previstos no n.º 2 do art. 1097.º do Cód. Proc. Civil, e procedido à junção de diversos dos documentos e elementos referidos no n.º 3 do art. 1097.º do Cód. Proc. Civil, entre os quais a relação de bens (al. c) do n.º 2 do art. 1097.º do Cód. Proc. Civil).
Dispõe o art. 1100.º do Cód. Proc. Civil nos seguintes termos:
Artigo 1100.º - Despacho liminar e citação
1 - O requerimento é submetido a despacho liminar para, além das demais previstas na lei, as seguintes finalidades:
a) Verificação da existência de qualquer deficiência do requerimento, devendo seguir-se o respetivo convite ao aperfeiçoamento;
b) Confirmação ou designação do cabeça de casal.
2 - Se o processo prosseguir, o juiz:
a) Se verificar que o exercício de funções de cabeça de casal cabe ao requerente e que este prestou compromisso de honra válido, procede à sua designação e ordena a citação de todos os interessados diretos na partilha;
b) Se verificar que o cargo de cabeça de casal compete a outrem que não o requerente, ordena a citação daquele;
c) Sempre que se justifique a sua intervenção, ordena a citação do Ministério Público.
3 - O requerente que exerça o cargo de cabeça de casal é notificado do despacho que ordene as citações referidas no número anterior.
Daqui resulta que é neste despacho que cabe ao juiz verificar da (ir)regularidade do requerimento inicial e também, no que à relação de bens concerne, da observância do disposto no art. 1098.º do Cód. Proc. Civil, incluindo a verificação do cumprimento do disposto no n.º 4 do referido art. 1098.º do Cód. Proc. Civil [A menção dos bens é acompanhada dos elementos necessários à sua identificação e ao apuramento da sua situação jurídica.], por forma a poder efetuar o aí previsto convite ao aperfeiçoamento, o que pode incluir a notificação para a junção dos elementos referidos no n.º 4 do art. 1098.º do Cód. Proc. Civil.
No caso dos autos, o tribunal a quo, no despacho proferido em 12-09-2023, apenas notificou a cabeça de casal para “juntar a escritura da habilitação de herdeiros do falecido ou, caso não tenha sido feita, do incidente simplificado de habilitação para efeitos fiscais.”, tendo ordenado a citação dos herdeiros/interessados identificados no requerimento inicial, nos termos e para os efeitos do art. 1104.º do Cód. Proc. Civil.
Todos os interessados indicados foram citados e nenhum apresentou qualquer oposição ao inventário, qualquer impugnação da legitimidade dos interessados indicados ou indicação de outros interessados distintos dos indicados pela cabeça-de casal, nem qualquer reclamação contra a relação de bens apresentada pela referida cabeça-de-casal (art. 1104.º do Cód. Proc. Civil).
Face a tal, o tribunal a quo proferiu o acima referido despacho de 03-04-2024, ordenando a notificação das partes para “(…) em vinte dias, darem a forma à partilha.”
Existe neste despacho alguma incorreção terminológica, uma vez que não são as partes que dão a forma à partilha, mas sim o juiz: nos termos do disposto no art. 1110.º, n.º 1, al. b), do Cód. Proc. Civil, o juiz ordena a notificação dos interessados para, no prazo de 20 dias, proporem a forma da partilha; após tal prazo de 20 dias, o juiz, nos termos e em conformidade com o disposto na al. a) do n.º 2 do art. 1110.º do Cód. Proc. Civil, profere despacho sobre o modo como deve ser organizada a partilha, definindo as quotas ideais de cada um dos interessados.
Daqui resulta que no despacho proferido em 03-04-2024 o tribunal a quo deu cumprimento ao disposto no art. 1110.º, n.º 1, al. b), do Cód. Proc. Civil, e no despacho proferido em 08-05-2024 o tribunal a quo, embora por remissão para o requerimento apresentado pela cabeça de casal em 09-04-2024, proferiu decisão sobre o modo como deve ser organizada a partilha.
Por força desse despacho proferido em 08-05-2024 (ainda que por remissão para o requerimento da cabeça de casal, cujo teor o tribunal recorrido deu por reproduzido), afirmou o tribunal a quo que «(…) Os bens a partilhar são os identificados na relação de bens, que não sofreu reclamações. (…)».
Já no despacho de 06-01-2025, aqui em recurso (na sequência de anterior despacho, proferido na conferência de interessados marcada para 11-09-2023, em que pela primeira vez o tribunal a quo suscita questões atinentes ao facto das verbas 2, 16, 23, 25 a 27 estarem registadas em nome de terceiras pessoas, embora tal constituísse questão passível de conhecimento, desde logo, no despacho liminar proferido em 12-09-2023), o tribunal a quo, com a decisão proferida de remessa dos interessados para os meios processuais comuns ‘por impossibilidade de saber se este bem deve ser partilhado neste inventário’ quanto aos bens das verbas 2, 23, 25, 26 e 27, e por resultar da certidão do registo predial ‘registo de aquisição a favor de pessoas diferentes do inventariado (e que não serão os interessados)’, quanto à verba 20, decide que não há elementos nos autos que permitam afirmar que as verbas 2, 20, 23, 25, 26 e 27 da relação de bens integram os bens a partilhar.
Por conseguinte, o que o tribunal a quo afirma no despacho recorrido é que não pode afirmar, face ao teor dos elementos juntos e à falta de outros elementos, que as verbas 2, 20, 23, 25, 26 e 27 da relação de bens integram a herança aberta por óbito do inventariado, e por isso remete os interessados para os meios comuns quanto a tais verbas[1].
Tal decisão está em contradição com o antecedente despacho de 08-05-2024, quer na parte em que aí se afirmou que os bens a partilhar no processo de inventário em curso são os identificados na relação de bens junta aos autos, quer na medida em que tal afirmação releva na própria determinação da organização da partilha que foi determinada e que constitui a base necessária para a subsequente tramitação processual consistente na realização a conferência de interessados, atendendo aos assuntos a submeter a tal conferência, nos termos previstos no art. 1111.º do Cód. Proc. Civil.
Ocorre, pois, a invocada violação do caso julgado formal, atento o disposto nos arts. 613.º, n.º 1 e n.º 3, e 620.º, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil. Foi proferida uma segunda decisão, dentro do processo, sobre a mesma questão processual, a saber, sobre os bens relacionados que serão objeto da partilha no processo em curso: enquanto no despacho proferido em 08-05-2024 foi determinado o modo como deve ser efetuada a partilha dos bens que integram a relação de bens apresentada pela cabeça-de-casal, composta pelas 27 verbas nela relacionadas, no despacho de 06-01-2025 é proferida decisão que, diferentemente da anterior, determina que a partilha apenas abrangerá 21 das 27 verbas relacionadas na relação de bens apresentada.
2. Inadmissibilidade de remessa oficiosa dos interessados para os meios comuns
Defende ainda a apelante que a possibilidade de exclusão de bens a partilhar em processo de inventário ‘por remessa dos interessados para os meios comuns depende do impulso dos interessados, que têm que reclamar quanto à relação de bens apresentada pelo cabeça de casal’, por existir um ‘litígio prévio entre os interessados ou legitimados na partilha, do qual resulta uma pronúncia do Tribunal no sentido de se abster do conhecimento da questão suscitada com fundamento na complexidade da matéria de facto que desaconselham a sua apreciação em sede de processo de inventário por implicar uma redução da garantia das partes’, conforme ‘resulta do disposto nos artigos 1104.º, n.º 1, alínea d), 1105.º, 1093.º, todos do C.P.Civil.’.
Alega que, não tendo havido qualquer reclamação contra a relação de bens apresentada pela cabeça-de-casal, de onde resulta o acordo de todos os interessados no inventário quanto aos bens a partilhar por morte do inventariado BB, impõe-se a revogação da decisão e o prosseguimento do inventário para a realização da conferência de interessados.
A decisão recorrida, considerando que dos documentos juntos pela cabeça de casal não resulta a prova da factualidade alegada quanto à aquisição pelo inventariado das verbas 2, 23, 25 a 27 da relação de bens no âmbito de um processo de inventário, decidiu remeter os interessados para os meios processuais comuns, face à impossibilidade de saber se tais bens devem ser partilhados no processo de inventário para partilha dos bens deixados por óbito de BB.
Quanto à verba 20 da relação de bens, fundamentou igual decisão de remessa dos interessados para os meios comuns por da documentação junta resultar que «(…) esse bem (…) tem registo de aquisição a favor de pessoas diferentes do inventariado (e que não serão os interessados).», contendo o registo predial uma presunção de propriedade.
Sobre a remessa dos interessados para os meios comuns dispõem os arts. 1092.º, 1093.º e 1105.º do Cód. Proc. Civil:
Artigo 1092.º - Suspensão da instância
1 - Sem prejuízo do disposto nas regras gerais sobre suspensão da instância, o juiz deve determinar a suspensão da instância:
a) Se estiver pendente uma causa em que se aprecie uma questão com relevância para a admissibilidade do processo ou a definição de direitos de interessados diretos na partilha;
b) Se, na pendência do inventário, forem suscitadas questões prejudiciais de que dependa a admissibilidade do processo ou a definição de direitos de interessados diretos na partilha que, atenta a sua natureza ou a complexidade da matéria de facto que lhes está subjacente, não devam ser incidentalmente decididas;
c) (…);
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, o juiz remete as partes para os meios comuns, logo que se mostrem relacionados os bens.
3 - O tribunal pode, a requerimento de qualquer interessado direto, autorizar o prosseguimento do inventário com vista à partilha, sujeita a posterior alteração em conformidade com o que vier a ser decidido:
a) (…);
b) (…);
c) (…).
4 – (…).
Artigo 1093.º - Outras questões prejudiciais
1 - Se a questão não respeitar à admissibilidade do processo ou à definição de direitos de interessados diretos na partilha, mas a complexidade da matéria de facto subjacente à questão tornar inconveniente a apreciação da mesma, por implicar redução das garantias das partes, o juiz pode abster-se de a decidir e remeter os interessados para os meios comuns.
2 - A suspensão da instância no caso previsto no número anterior só ocorre se, a requerimento de qualquer interessado ou oficiosamente, o juiz entender que a questão a decidir afeta, de forma significativa, a utilidade prática da partilha.
[Secção II – Oposições e verificação do passivo
Artigo 1104.º - Oposição, impugnação e reclamação (…)]
Artigo 1105.º - Tramitação subsequente
1 – Se for deduzida oposição, impugnação ou reclamação, nos termos do artigo anterior, são notificados os interessados, podendo responder, em 30 dias, aqueles que tenham legitimidade para se pronunciar sobre a questão suscitada.
2 – As provas são indicadas com os requerimentos e respostas.
3 – A questão é decidida depois de efetuadas as diligências probatórias necessárias requeridas pelos interessados ou determinadas pelo juiz, sem prejuízo do disposto nos artigos 1092.º e 1093.º.
4 – (…).
5 – Se estiver em causa reclamação deduzida contra a relação de bens ou pretensão deduzida por terceiro que se arrogue titular dos bens relacionados e se os interessados tiverem sido remetidos para os meios comuns, o processo prossegue os seus termos quanto aos demais bens.
6 – (…).
7 – (…).
Resulta da leitura conjugada destas disposições legais que a possibilidade de remessa dos interessados para os meios comuns se verifica:
a) quanto a questões prejudiciais suscitadas na pendência do inventário, de que de dependa a admissibilidade do processo ou a definição de direitos de interessados diretos na partilha (art. 1092.º, n.º 1, al. b), do Cód. Proc. Civil);
b) quanto a outras questões que não respeitem à admissibilidade do processo de inventário ou à definição de direitos de interessados diretos na partilha (art. 1093.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil);
c) quanto a questões atinentes à oposição, impugnação ou reclamação dos interessados diretos da partilha, nos termos previstos no art. 1104.º do Cód. Proc. Civil (ressalva efetuada na parte final do n.º 3 do art. 1105.º do Cód. Proc. Civil).
É, no entanto, pressuposto necessário e indispensável da remessa dos interessados na resolução da questão em causa para os meios comuns:
a) quanto às questões prejudiciais de que dependa a admissibilidade do processo ou a definição de direitos dos interessados diretos na partilha suscitadas na pendência do inventário, que, atenta a natureza ou a complexidade da matéria de facto que lhes está subjacente, não devam ser incidentalmente decididas no processo de inventário (art. 1092.º, n.º 1, al. b), do Cód. Proc. Civil);
b) quanto às demais questões (referidas no art. 1093.º, n.º 1, e no art. 1104.º, ambos do Cód. Proc. Civil), que a complexidade da matéria de facto subjacente à questão torne inconveniente a apreciação da mesma, por implicar a redução das garantias das partes.
É certo que a relação de bens apresentada pela cabeça-de-casal não foi objeto de qualquer reclamação por parte dos demais interessados na partilha. Não há, assim, qualquer questão suscitada pelas partes carecida de resolução pelo tribunal.
Afigura-se-nos, no entanto, que a falta de reclamação dos interessados contra a relação de bens não afasta nem impede que o tribunal se pronuncie sobre uma eventual inadmissibilidade de relacionamento/partilha de bens que o cabeça-de-casal possa ter incluído na relação de bens, designadamente, se considerar que tais bens relacionados não integram o património / relações jurídicas patrimoniais da pessoa falecida. Tal faz parte dos poderes e deveres do tribunal na sua função de subsunção jurídica dos factos ao direito (aplicação no âmbito do processo de inventário das disposições legais reguladoras da sucessão hereditária, e outras possíveis disposições legais aplicáveis).
Mas também consideramos que a decisão de remessa dos interessados para os meios comuns, quanto aos bens relacionados para serem partilhados, pressupõe necessariamente uma discordância entre as partes quanto aos bens a partilhar (incluídos ou por incluir na relação de bens) em que é suscitada e está controvertida matéria de facto cuja complexidade torna inconveniente a apreciação da questão no processo de inventario, por implicar a redução das garantias das partes (em litígio).
Tal discordância aqui não existe.
O que existe é uma decisão do tribunal no sentido de considerar insuficiente a documentação junta para a prova da factualidade alegada pela cabeça de casal quanto à aquisição pelo inventariado dos bens relacionados nas verbas 2, 20, 23, 25 a 27 da relação de bens (e que das certidões do registo predial juntas resulta a inscrição dos imóveis das verbas indicadas a favor de terceiros – o que constitui presunção de propriedade).
São esses os fundamentos invocados para a decisão de remessa dos interessados para os meios comuns, sendo que a decisão não indica quais os meios comuns para os quais remete os interessados, nem quais as questões controvertidas suscitadas a resolver, nem qual é a complexidade da matéria de facto subjacente às referidas questões – que não indica de forma clara quais sejam – que torna inconveniente a sua apreciação no processo de inventário, por implicar diminuição das garantias dos interessados.
Concluímos, deste modo, pela falta de verificação, no caso, dos pressupostos de que depende a admissibilidade de remessa das partes para os meios comuns.
3. Erro nos pressupostos da decisão recorrida
Por fim, defende a apelante que a fundamentação da decisão recorrida é desconforme à prova documental junta pela cabeça de casal – designadamente, considerando a certidão judicial do processo de inventário n.º 84/1981 que havia sido junta com o requerimento inicial como documento 42, e a certidão judicial do processo de inventário n.º 5/1974, junta com o requerimento de 24-10-2024, comprovativa da aquisição no âmbito do referido processo de inventário da verba n.º 23, por óbito do pai da cabeça de casal, além da demais documentação comprovativa da correspondência entre os bens da relação de bens e os bens relacionados naqueles outros processos de inventário – e é ilegal, por os registos de aquisição dos prédios serem anteriores ao diploma legal que determinou a obrigatoriedade do registo predial em todo o país (D.L. 224/84, de 6 de Julho, que entrou em vigor a 1 de Outubro do mesmo ano) e por os arts. 34.º, n.º 3 e 35.º do Código de Registo Predial dispensarem, no caso de aquisição com base em partilha, a regra de que “o registo definitivo de aquisição de direitos depende da prévia inscrição dos bens em nome de quem os transmite”, estando dispensada ainda “a inscrição intermédia em nome dos titulares de bens ou direitos que façam parte de herança indivisa”.
Fundamentou o tribunal a quo a decisão recorrida na afirmação de que dos documentos juntos não resulta que as verbas 2, 23, 25, 26 e 27 tenham sido adquiridas pelo inventariado no âmbito de um processo de inventário, uma vez que apenas foram juntas as cadernetas prediais das verbas, as certidões de registo predial (de onde resulta que as respetivas verbas se encontram registadas em nome de uma terceira pessoa, resultando desse registo uma presunção de propriedade) e uma folha que descreve verbas, que poderá ser referente a uma relação de bens, mas que não se sabe de que inventário e a quem foram atribuídas. Quanto à verba 20, refere o tribunal a quo que resulta da certidão do registo predial uma presunção de propriedade a favor de pessoas diferentes do inventariado.
Resulta do ponto 2. dos factos provados que, contrariamente ao referido na decisão recorrida, a cabeça-de-casal, relativamente às verbas 2, 20, 25, 26 e 27, juntou aos autos (com o requerimento inicial) uma Certidão do Processo de Inventário Obrigatório n.º 84/1981 que correu termos no Tribunal de Castelo de Paiva, instaurado por óbito do aí inventariado TT, no âmbito do qual foi cumulada, no que aqui releva, a partilha dos bens deixados pelos progenitores daquele inventariado falecido, GG e UU, resultando dessa certidão terem sido adjudicados ao aqui inventariado BB (um dos filhos daqueles inventariados GG e UU), no que aqui releva:
- a verba 2 da relação de bens (correspondente à verba 14 dos bens descritos naquele processo de inventário);
- a verba 20 da relação de bens (correspondente à verba 105 dos bens descritos naquele processo de inventário);
- a verba 25 da relação de bens (correspondente à verba 114 dos bens descritos naquele processo de inventário);
- a verba 26 da relação de bens (correspondente à verba 130 dos bens descritos naquele processo de inventário);
- a verba 27 da relação de bens (correspondente à verba 130 dos bens descritos naquele processo de inventário).
E resulta do ponto 3. dos factos provados que também foi junta pela cabeça de casal uma certidão do Processo de Inventário Obrigatório n.º 5 de 1974, que correu termos no Tribunal de Arouca, instaurado por óbito do aí inventariado CC, processo de inventário esse no âmbito do qual, no que aqui releva, foi adjudicado à aqui cabeça de casal (filha do aí inventariado CC) e ao então seu marido BB (inventariado neste processo), para pagamento do seu quinhão, a verba 23 da relação de bens (correspondente à verba 24 descrita nesse processo de inventário).
Verifica-se, por conseguinte, que de tais certidões dos referidos processos judiciais de inventário juntas aos autos, conjugadas com a demais documentação igualmente referida nos pontos 2. e 3. dos factos provados, resulta que as referidas verbas 2, 20, 25, 26 e 27 foram adquiridas pelo inventariado no âmbito do processo de Inventário Obrigatório n.º 84/1981, e que a verba n.º 23 foi adquirida no âmbito do inventário n.º 5 de 1974 (integrando o património comum do casal constituído pela cabeça de casal e pelo inventariado BB – casados que foram no regime de comunhão geral de bens).
Por outro lado, como resulta do disposto no art. 9.º, n.º 2 al. a), do Cód. Reg. Predial,
a realização da partilha, designadamente, hereditária, não exige que o prédio tenha que estar inscrito em nome do de cujus. Em consonância com esta disposição legal dispõem os arts. 34.º, n.º 3 [2], e 35.º [3] do Código do Registo Predial.
Concluímos, deste modo, pela insubsistência dos fundamentos aduzidos como sustentação da decisão recorrida de remessa dos interessados para os meios comuns, por impossibilidade de determinar se os bens das referidas verbas devem ser partilhados no processo de inventário.
Procede a apelação, devendo ser revogada a decisão recorrida.
4. Responsabilidade pelas custas
Nos termos do disposto no art. 1.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP), aprovado pelo DL n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, todos os processos estão sujeitos a custas, considerando-se cada recurso como processo autónomo, desde que possa dar origem a uma tributação própria, como aqui sucede (ver arts. 529.º e 530.º do Cód. Proc. Civil e art. 6.º, n.º 1 e n.º 2, do RCP).
O art. 527.º do Cód. Proc. Civil estabelece a regra geral em matéria de custas, nos seguintes termos:
1 – A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito.
2 - Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
3 - No caso de condenação por obrigação solidária, a solidariedade estende-se às custas.
Daqui resulta que o critério de atribuição da responsabilidade por custas se funda, em primeiro lugar, no princípio da causalidade, considerando-se que dá causa às custas a parte vencida: dá causa à ação, incidente ou recurso quem perde. O critério do proveito apenas opera quando não pode operar o critério da sucumbência, por não haver vencedor nem vencido (por exemplo, como sucede nos processos de revisão de sentença estrangeira sem oposição do requerido, ficando as custas do processo a cargo da parte que impulsiona o processo, com base no critério do proveito).
No caso do presente recurso, existe um vencedor – a recorrente – mas não se pode afirmar que exista um vencido. Não se pode afirmar que a revogação da decisão recorrida, que oficiosamente decidiu remeter os interessados para os meios comuns quanto a determinados bens relacionados na relação de bens apresentada pela cabeça de casal, a qual não mereceu qualquer oposição dos restantes interessados na partilha, postergou o interesse dos requeridos.
Em casos como o presente, em que há um vencedor mas não há uma parte vencida, «(…) esta não pode ser condenada no pagamento de custas porque não se verifica a causalidade (não deu causa à acção ou ao recurso), mas também aquele não o pode ser precisamente por ter havido vencimento (o que afasta o critério do proveito).» – cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 22-01-2019, proc. 45824/18.8YIPRT-A.L1 [4].
Neste caso em concreto, da procedência do recurso apenas resulta a revogação da decisão que havia remetido os interessados para os meios comuns quanto a algumas das verbas relacionadas, o que não afeta o prosseguimento da ação, designadamente, para a finalidade a que o mesmo se destina: a partilha entre a cabeça de casal e demais requeridos interessados na partilha de todos os bens que integram a herança aberta por óbito de BB, sendo que será a final que ocorrerá a fixação da responsabilidade por custas do processo de inventáro. Estando-se aqui perante uma decisão interlocutória que se enquadra na tramitação do processo com vista à decisão final sobre o respetivo mérito, afigura-se-nos que será adequada a aplicação, com as devidas adaptações, da solução defendida no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11-01-2011, proc. n.º 277/08.3TBSRQ-F11-7, no qual se considerou o seguinte:
«(...) todo o processo tem um objectivo primordial, que é o da obtenção de uma regulação jurídica, declarada ou efectiva, de interesses de direito material; e que é o caminho para se lá chegar que tem um custo, em parte representado pelas custas a pagar.
Este núcleo duro de custas tem sempre um responsável final; alguém que se volve em sujeito passivo das custas por se reconhecer que, á luz de tudo, deve ser ele a suportar o encargo; seja por ser vencido; seja pelo proveito obtido; seja, em derradeiro critério, por ser aquele que desencadeou o funcionamento da máquina judiciária. Por isso, e em todo a caso, o artigo 659º nº 3 [...] exige, sob pena de nulidade (artigo 668º, n° 1, alínea f), do CPC), que se defina, com expressividade e clareza, quem são os responsáveis pelas custas e qual a relativa proporção da dívida.
Ora, do nosso ponto de vista, faz sentido que, na falta de uma outra referência juridicamente atendível, seja a esta derradeira distribuição que venha a aderir toda a restante responsabilidade a que, entretanto, não houvera oportunidade, ou possibilidade, de encontrar ajustado devedor. A autonomia tributária, que porventura houvesse, cede na parte da repartição de responsabilidade; e a quem seja onerado pelo custo global e final da acção acrescerá, na mesma proporção, por se entender que a essa principal responsabilidade devem ter adesão aquelas outras conexas ou meramente instrumentais, a dívida de custas gerada pelo acto ou termo a que antes se não conseguiu conhecer responsável.
A dívida interlocutória de custas adere, nesta óptica, à dívida final, referente à contrapartida global do “pacote” de serviço de justiça prestado; nascendo a respectiva obrigação na esfera daquele que, a final, venha a ser reconhecido como o devedor das principais custas da acção. É o que comummente se chama de dívida de custas pela parte que seja vencida a final; que em inúmeras situações é habitual reconhecer; e que, em consonância, faz relegar para a mesma decisão final – em regra, a sentença ou o acórdão que julguem do mérito da causa – o exacto e pontual cumprimento do mencionado artigo 659º, nº 4 do CPC. Sobre casos de condenação no pagamento de custas da parte ou das partes que a final ficarem vencidas, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Março de 2005, proc.º nº 05B531, de 17 de Abril de 2007, proc.º nº 07B956, e da Relação do Porto de 12 de Abril de 2010, proc.º nº 1057/09.4TBVFR-A.P1, todos em www.dgsi.pt. (…)
Alheio ao interesse que era latente ao recurso de apelação, e nele abstendo-se de contra-alegar, ou, de todo o modo, de intervir, não se mostra razoável que seja ele a suportar as custas da apelação. Ao obterem vencimento nesse recurso, também aos apelantes não é reconhecível o nascimento da vinculação no pagamento das custas. Por conseguinte, a solução de equilíbrio é considerar que as custas do recurso de apelação devem acrescer às custas devidas pelo processo principal que está na sua génese, sendo o(s) mesmo(s) o(s) sujeito(s) passivo(s), e na mesma exacta proporção, de umas e de outras. (…)».
Em conformidade, atento o vencimento da apelante e o facto de os apelados não terem dado causa à decisão recorrida, nem terem ficado vencidos no recurso, as custas do recurso ficam a cargo da parte que ficar vencida a final, na respetiva proporção.
IV – Decisão:
Pelo exposto, na procedência do recurso, acorda-se na revogação da decisão recorrida.
Notifique.
Sem custas.