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EXECUÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE FACTO
PRAZO DA PRESTAÇÃO
PRESTAÇÃO POR TERCEIRO
CASO JULGADO
LIMITES
Sumário
I – Na execução para prestação de facto, estando o prazo da prestação previsto no título executivo, não há lugar à fixação de novo prazo para o efeito nem à citação ou notificação do executado para prestar ele próprio o facto exequendo, sem prejuízo deste poder fazê-lo nos 20 dias posteriores à sua citação para os termos da execução e de, não podendo completar-se nesse prazo a prestação já iniciada, dever ponderar-se a suspensão da instância pelo tempo necessário, depois de ouvidas as partes. II – O caso julgado incide sobre a decisão enquanto conclusão de determinados fundamentos, apenas atingindo estes fundamentos, de facto ou de direito, enquanto pressupostos daquela decisão. III – A realização da prestação por outrem pode ser feita com custeamento prévio (cfr. artigo 870.º do CPC) ou com custeamento posterior (cfr. artigo 871.º do CPC). IV – No primeiro caso, a economia processual impõe que a indemnização moratória que tenha sido pedida seja liquidada e o paga em cumulação com a liquidação e o pagamento do custo das obras.
Texto Integral
Processo: 13702/22.1T8PRT.P1-A
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I. Relatório AA intentou contra BB execução para prestação de facto, com base em sentença datada de 12.06.2017, homologatória da seguinte transação: Cláusula Primeira: O Demandado confirma que procedeu à demolição de parte do muro em tijolo em causa nos Autos de Acção de Processo Comum, que correm seus termos na Comarca do Porto, Póvoa de Varzim Instância Local Secção Cível J3, com o n.º 1267/16.8T8PVZ, e compromete-se a repará-lo, na parte em que ficou danificado, por forma a que também fique assegurada a impermeabilização e suporte do muro pré-existente e que se encontra no alinhamento da habitação da Demandante, colocando tijolo nas partes em que o muro se encontra descarnado, fazendo o enchimento em cimento (ceresitar) no alinhamento do muro pré-existente à habitação da Demandante, usando os materiais e técnicas de construção civil que permitam quer a devida impermeabilização, quer o suporte do dito muro pré-existente. § Único: O Demandado compromete-se a efectuar as obras, nos termos da presente cláusula, até ao dia 30 de Junho de 2017. Cláusula Segunda: O presente acordo põe termo aos Autos à margem referenciados, designadamente, tratando-se os presentes Autos de processo de Mediação Extra Competência a correr termos no Julgado de Paz da Trofa, Demandante e Demandado acordam, em pôr termo aos Autos de Acção de Processo Comum, que correm seus termos na Comarca do Porto, Póvoa de Varzim - Instância Local - Secção Civel J3, com o n.º 1267/16.8T8PVZ nada mais tendo a reclamar reciprocamente no âmbito dos mesmos.
Mais solicitou a condenação do executado no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, no valor diário de 10,00 € por cada dia de incumprimento da transação, calculada desde 01.07.2017, que liquida provisoriamente em 18.530,00 €.
Solicitou ainda a condenação do executado no pagamento de uma indemnização dos danos que sofreu com a não realização da prestação, em valor não inferior a 5.000,00 €.
Cumprido o disposto no artigo 868.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), o executado veio opor-se à execução mediante embargos, que foram julgados parcialmente procedentes, tendo-se ordenado a prossecução da execução para prestação de facto e absolvido o executado do pedido de pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, mais se referindo que o pedido referente à indemnização moratória, no valor não inferior a 5.000,00 €, seria oportunamente analisado, nos termos do artigo 871.º, n.º 2, do CPC, sendo um incidente da instância a tramitar no processo principal.
Posteriormente, em 04.10.2024, nos autos principais de execução, foi proferido o seguinte despacho: Em 30/05/2017, no Julgado de Paz da Trofa, no âmbito do processo n.º 1267/16.8T8PVZ, do Tribunal da Comarca do Porto, Juízo da Instância Local da Póvoa de Varzim, Seccão Civel, J3, foi celebrada entre a Exequente e o Executado uma transação, homologada por sentença, datada de 12 de Junho de 2017, nos referidos autos, com o seguinte teor: “O demandado confirma que procedeu à demolição de parte do muro em tijolo em causa (…) e compromete-se a repará-lo, na parte em que ficou danificado, por forma a que também fique assegurada a impermeabilização e suporte do muro préexistente à habitação da Demandante, colocando tijolo nas partes em que o muro se encontra descarnado, fazendo o enchimento em cimento (ceresitar) no alinhamento do muro pré-existente à habitação da Demandante, usando os materiais e técnicas de construção civil que permitam quer a devida impermeabilização, quer o suporte do dito muro pré-existente”. Atendendo ao teor do relatório pericial realizado nos autos em apenso, bem como tendo em conta os esclarecimentos do Sr. Perito, estando assente na sentença, transitada em julgado, que o valor dos trabalhos seria de € 330,00: Assim, ao abrigo do disposto no art. 871º, nºs 1 e 2 do CPC, fixo o valor do custo da prestação em € 330,00, e determino a conversão desta execução para prestação de facto em execução para pagamento de quantia certa, no referido valor, pelo que deverá proceder-se à penhora de bens suficientes e necessários para o pagamento daquela quantia exequenda e das custas prováveis (vide art. 541º, do CPC), após trânsito.
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Inconformada, a exequente apelou desta decisão, apresentando a sua alegação, que termina com as seguintes conclusões:
«I. O presente recurso vem interposto do douto despacho dos presentes autos a fls (…), datado de 7 de Outubro de 2024, com a Ref. Citius n.º 464245992, onde o Tribunal determinou que, ao abrigo do disposto no art. 871º, nºs 1 e 2 do CPC, fixar o valor do custo da prestação em € 330,00, e, concomitantemente, determinou ainda a conversão desta execução para prestação de facto em execução para pagamento de quantia certa, atribuindo o mencionado valor.
II. Com o presente recurso, a Apelante pretende que o despacho seja revogado atendendo que, salvo melhor entendimento, o Tribunal deveria ter pugnado pela realização da prestação por parte do Executado;
III. E, após a recusa do executado, o mesmo deveria ter ordenado a elaboração de um relatório pericial no âmbito dos autos principais que contemple todas as tarefas a executar e tenha em consideração os materiais a realizar assim como a mão de obra para o efeito, não devendo uma perícia realizada num apenso ser aproveitada para os autos principais.
IV. Isto posto, Exequente e Executado são vizinhos, sendo que o ultimo destruiu um muro da propriedade da primeira;
V. Sem alternativa, a Exequente intentou a ação declarativa que deu origem à presente ação executiva – Processo n.º 1297/16.8T8PVZ que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Local Cível da Póvoa de Varzim, Juiz 3 – de modo a conseguir a condenação do Executado à reconstrução do referido muro e à instalação da caleira de modo a sanar esta questão. No entanto, com o intuito de restaurar as relações de vizinhança e cordialidade entre as partes, a Exequente, aqui Apelante, aceitou chegar a um consenso com o Executado, Apelado, de modo a que o mesmo reparasse os danos sofridos na sua habitação através da reconstrução do muro que propositadamente destruiu.
VI. Não obstante a questão de direito aqui colocada com a interposição do presente recurso, a Apelante, espera, que, no caso de manutenção do presente despacho, que a execução de quantia certa contemple, igualmente, as indeminizações no requerimento executivo.
VII. Com a presente execução, a Apelante pretende: a) o cumprimento da transação judicial, ou seja a construção do muro que o Executado destruiu e concomitantemente, a remoção das grades e do portão que o mesmo instalou, requerendo a prestação de facto que o mesmo está obrigado; b) a sua condenação ao pagamento de uma sanção pecuniária compulsória à razão diária de € 10,00 (dez euros), por cada dia de incumprimento da transacção, a ser fixada em sede de acção executiva, calculada desde 01/07/2017 até à data em que os factos se vieram a demonstrar como efectivamente prestados, o que se liquida, ainda que provisoriamente, até ao momento da propositura da presente execução, em 18530,00€ (dezoito mil quinhentos e trinta euros) e, por fim, ao pagamento dos danos sofridos com a não realização da prestação a que o Executado estava adstrito, em valor nunca inferior a 5.000,00€.
VIII. Ora, o Apelado deduziu embargos, dos quais foram considerados improcedentes. Nesta ótica, entende a Exequente, aqui Apelante, que o douto Tribunal, no âmbito dos autos principais, deveria ter pugnado pelo cumprimento da prestação, concedendo um prazo para que o mesmo iniciar-se os trabalhos.
IX. No entanto, o douto Tribunal limitou-se a converter a presente execução numa de quantia certa, o que, o deveria ter feito em momento posterior, quando estivessem esgotadas todas as vias para a realização da obra em questão.
X. Com a devida vénia, o douto Tribunal deveria primeiro ter pugnado pelo cumprimento da prestação por parte do Executado. Caso tenha que ser a Exequente a executar a obra – o que se revela de cariz impossível atendendo que o Executado não deixa ninguém entrar na sua propriedade – o douto Tribunal não deveria ter ignorado o orçamento junto com o requerimento executivo pela mesma atendendo que o relatório pericial que utilizou por base na sua decisão foi feito no âmbito do apenso A e não contemplou todas as tarefas que terão que levar a cabo, designadamente, a remoção da grade e dos ferros que o Executado ilegitimamente instalou no local.
XI. Sem prescindir, o relatório que o Sr. Perito juntou aos autos no Apenso A revelasse mais ajustado da realidade, sendo que o valor posteriormente avançado de 300,00€ foi feito em jeito de desabafo, sem cuidado em calcular o custo dos materiais e a mão de obra, nem tão pouco, contemplou todas as tarefas que são necessárias levar a cabo para o cumprimento da prestação e que estão esplanadas no orçamento junto ao processo principal, relatório esse que o Tribunal ignorou.
XII. Caso a presente execução se converta em quantia certa, deverá a mesma assumir o valor de 1800,00€ plasmados no orçamento junto aos autos com o requerimento executivo, que deverá ser considerado totalmente procedente.
XIII. Nesta senda, nos termos do artigo 870.º do CPC, deveria o Tribunal ter ordenado a nomeação de um perito nos autos principais, relevando o que se passou no apenso A.
XIV. Em respeito pelo artigo 870.º do CPC, o Tribunal deveria ter nomeado um perito nos autos principais ou, em alternativa, requerer ao perito nomeado no apenso A para apresentar um novo relatório, desta forma, com base, nos elementos fotográficos dos autos e com aquilo que observou, atendendo à confusão ocorrida nos embargos em que o Sr. Perito muda a sua opinião, de forma repentina e sem qualquer fundamentação.
XV. No âmbito do artigo 871.º do CPC, para que a exequente, aqui Apelante, possa fazer, ou mandar fazer sob a sua orientação e vigilância, as obras e trabalhos necessários para a prestação do facto, pese embora, com 300,00€ esta não consegue que nenhum profissional lhe realize as obras necessárias.
XVI. Sendo o orçamento junto aos autos realizado pelo profissional que conhece o local atendendo que foi o mesmo que construiu o muro antes do Apelado o ter destruído.
XVII. Face ao circunstancialismo exposto, a Exequente requer que o despacho recorrido seja objeto de revogação, devendo, o douto Tribunal, ordenar a prestação do facto ao Executado ou, em alternativa, que ordene a realização de uma perícia nos autos principais onde contemple todas as tarefas inerentes para a construção do muro destruído pelo Executado, desconsiderando o relatório realizado no apenso A, ou em alternativa, a execução deverá ter o valor do orçamento apresentado nos autos principais».
Não foi apresentada resposta a esta alegação.
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II. Fundamentação 1. O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, como decorre do disposto nos artigos 635.º, n.º 4, e 639.º do CPC, não podendo o Tribunal conhecer de quaisquer outras questões, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso (cfr. artigo 608.º, n.º 2, do CPC). Não obstante, o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e é livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do citado diploma legal).
Tendo em conta o teor das conclusões formuladas pela recorrente, são as seguintes as questões a decidir:
- Saber se, antes de determinar a conversão da execução, o tribunal deve determinar a prestação do facto pelo executado, concedendo-lhe um prazo para iniciar os trabalhos;
- No caso de recusa do executado, saber se o tribunal deve ordenar a realização de uma perícia para avaliação do custo da prestação, em vez de aproveitar a perícia realizada no apenso de oposição à execução;
- Assim não se entendendo, se o valor da execução para pagamento de quantia certa deve ter em conta o orçamento junto com o requerimento executivo, no valor de 1800,00 €;
- E se deve contemplar igualmente, as indemnizações pedidas no requerimento executivo.
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2. A primeira questão suscitada pela recorrente consiste em saber se, antes de ter determinado a conversão da execução para prestação de facto em execução para pagamento de quantia certa, o tribunal a quo devia ter determinado a prestação do facto pelo executado.
Vejamos o regime legal.
Nos termos do disposto no artigo 868.º, n.º 1, do CPC, se alguém estiver obrigado a prestar um facto em prazo certo e não cumprir, o credor pode requerer a prestação por outrem, se o facto for fungível, bem como a indemnização moratória a que tenha direito, ou a indemnização do dano sofrido com a não realização da prestação; pode também o credor requerer o pagamento da quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória, em que o devedor tenha sido já condenado ou cuja fixação o credor pretenda obter no processo executivo.
Resulta desta norma que, ao propor a execução para prestação de facto positivo, fungível e com prazo certo, o exequente deve optar entre:
a) A prestação do facto por outrem (execução específica), podendo cumular este pedido com a indemnização moratória a que tenha direito; ou
b) A indemnização do dano sofrido com a não realização da prestação (execução sucedânea).
Alguns autores consideram que esta norma não concede ao exequente a possibilidade de optar livremente entre a execução específica (eventualmente cumulada com a indemnização moratória) e a execução sucedânea, defendendo que a primeira está reservada para os casos de mora e a segunda para os casos de incumprimento definitivo. Sobre esta questão vide Rui Pinto, A Acção Executiva, AAFDL Editora, Lisboa, 2020, pp. 1014 e 1015.
Se estiver em causa a prestação de um facto infungível, o exequente terá naturalmente de optar pela indemnização do dano sofrido com a não realização da prestação, podendo também requerer o pagamento da quantia devida a título de sanção pecuniária compulsória, nos termos da parte final da norma em análise.
Em qualquer dos casos, o devedor é citado para, no prazo de 20 dias, deduzir oposição à execução, mediante embargos, conforme previsto no n.º 2, do mesmo artigo 868.º.
Não sendo deduzida oposição à execução ou sendo a oposição que suspendeu a execução julgada improcedente, a tramitação subsequente depende da opção inicial tomada pelo exequente.
Se este pretender a indemnização do dano sofrido com a não realização da prestação, o artigo 869.º do CPC manda observar o disposto no artigo 867.º do mesmo código, ou seja, a execução para prestação de facto é convertida numa execução para pagamento de quantia certa, cabendo ao exequente deduzir o incidente de liquidação do valor do dano sofrido, de acordo com o preceituado nos artigos 358.º, 360.º e 716.º do CPC, com as necessárias adaptações. Definido o valor da indemnização, a execução prossegue com a penhora dos bens necessários ao respectivo pagamento e com os demais termos da execução para pagamento de quantia certa.
Se o exequente optar pela prestação do facto por outrem, requer a nomeação de perito que avalie o custo da prestação, observando-se os demais termos previstos nos artigos 870.º a 873.º do CPC. Assim, também neste caso a execução prossegue como execução para pagamento de quantia certa, tendo em vista obter o valor necessário ao pagamento do custo da prestação. A diligência pericial destinada a definir este valor deve decorrer com observância do princípio do contraditório (cfr. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 2.ª ed., Almedina, 2022, p. 315, citando no mesmo sentido Lebre de Freitas). Sendo esta a opção, o exequente pode ainda pedir uma indemnização moratória.
O que a lei não prevê, em nenhuma destes casos, é a citação ou notificação do executado para prestar, ele próprio, o facto que não prestou no prazo previsto no título executivo.
Tal citação está apenas prevista quando o prazo para a prestação não está determinado no título executivo, caso em que o exequente indica logo no requerimento executivo o prazo que reputa suficiente e requer que, citado o devedor para, em 20 dias, dizer o que se lhe oferecer, o prazo seja fixado judicialmente, seguindo-se os demais termos previstos nos artigos 874.º e 875.º do CPC.
O que se pode discutir – e tem sido discutido – é se o executado ainda pode prestar o facto e até que momento o pode fazer. A este respeito, Abrantes Geraldes e outros (ob. cit., p. 314) escrevem o seguinte:
«Apesar da controvérsia doutrinal, é de admitir que, na sequência da citação, o executado ainda cumpra a prestação de facto (fungível ou infungível) a que estava adstrito. Por um lado, se o exequente requereu a prestação por outrem, não se vê razão para negar tal possibilidade ao próprio devedor, mais a mais se isso ocorrer dentro dos 20 dias subsequentes à citação. No caso de o cumprimento, embora iniciado, não poder completar-se nesse período, será de equacionar a possibilidade de o juiz, mediante audição das partes, decretar a suspensão da instância pelo tempo necessário, na condição de o executado cumprir o que restar da prestação, sob pena de cessar a suspensão.
(…) Por outro lado, quando o exequente tenha optado pela indemnização compensatória, sem que tenha sido resolvido o contrato, sendo a prestação ainda possível, será igualmente de admitir a realização da prestação pelo executado nos 20 dias seguintes à sua citação. Fora desse estrito quadro, isto é, se o cumprimento, ainda que iniciado, extravasar esse limite, a eventual suspensão da instância, nos termos acima equacionados, deverá depender da aceitação do exequente».
Entendimento semelhante é preconizado por Rui Pinto (cit., p. 1017) escreve o seguinte:
«No mesmo prazo de 20 dias o executado pode cumprir a prestação, como dissemos. Esse facto deve ser atestado pelo agente de execução.
CASTRO MENDES, e bem, defendia que se o cumprimento da prestação exigir prazo superior a estes 20 dias e “o executado se mostrar seriamente pronto a realizá-la” existe motivo justificado para suspensão da instância executiva ao abrigo do artigo 279° n°1, atual artigo 272° n° 1 in fine. Tal solução continua a ser a correta, cabendo ao juiz aferir se pode ou não a execução ser suspensa. Pode é discutir-se se o exequente deve dar a sua concordância a essa suspensão, quando não seja ele a requerê-la».
Mas, repete-se, a lei não impõe nem permite que o tribunal convide o executado a prestar o facto ou lhe fixe novo prazo para o efeito antes de o processo prosseguir como execução para pagamento de quantia certa.
Tanto basta para concluirmos pela improcedência da argumentação esgrimida pela recorrente nesse sentido. 3. A segunda questão colocada pela recorrente consiste em saber se o tribunal devia ter ordenado a realização de uma perícia para avaliação do custo da prestação, em vez de aproveitar a perícia realizada no apenso de oposição à execução.
Tal como está pressuposto na decisão recorrida e na alegação do recurso, está em causa um facto positivo fungível e a exequente pretende a sua prestação por outrem, nos termos previstos nos artigos 868.º, n.º 1, 1.ª parte, e 870.º a 873.º, todos do CPC.
Por conseguinte, findo o prazo estabelecido para a oposição à execução ou, tendo a execução sido suspensa, julgada improcedente a oposição deduzida, tinha lugar a realização da perícia prevista no n.º 1, daquele artigo 870.º, tenho em vista a avaliação do custo da prestação.
É certo que a exequente não requereu de forma explícita a nomeação de um perito para o efeito, fosse no requerimento executivo ou em requerimento posterior à decisão que julgou improcedentes os embargos de executado (na parte relativa ao pedido de prestação do facto), fazendo-o apenas na alegação deste recurso. Porém, tal pedido está, naturalmente, implícito na opção inicial de requerer a prestação do facto por outrem.
De resto, infere-se da decisão recorrida que o tribunal a quo não nomeou perito para avaliar a prestação exequenda no âmbito dos autos principais de execução apenas porque tal avaliação já tinha sido realizada no apenso de embargos de executado e porque está assente na sentença aí proferida, já transitada em julgado, que o valor dos trabalhos seria de 330,00 €.
Porém, começando por este último argumento, não cremos que a decisão de fixar o custo da prestação em 330,00 € pudesse repousar no trânsito em julgado da referida sentença.
Sobre os efeitos e o alcance do caso julgado material regem os artigos 619.º e seguintes do CPC, preceituando este artigo 619.º que «[t]ransitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º», acrescentando o artigo 621.º que «[a] sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga».
Como se refere no sumário do ac. do STJ, de 12.07.2011 (proc. n.º 129/07.4TBPST.S1), tem-se entendido que «[a] expressão “limites e termos em que julga”, constante do art. 673.º do CPC [correspondente ao actual artigo 621.º], significa que a extensão objectiva do caso julgado se afere face às regras substantivas relativas à natureza da situação que ela define, à luz dos factos jurídicos invocados pelas partes e do pedido ou pedidos formulados na acção». Com efeito, toda e qualquer decisão assenta em concretos pressupostos, quer de facto, quer de direito, sendo o caso julgado referenciado com um âmbito extensivo a certos fundamentos.
Como se diz no mesmo sumário, «[r]elativamente à questão de saber que parte da sentença adquire, com o trânsito desta, força obrigatória dentro e fora do processo – problema dos limites objectivos do caso julgado –, tem de reconhecer-se que, considerando o caso julgado restrito à parte dispositiva do julgamento, há que alargar a sua força probatória à resolução das questões que a sentença tenha tido necessidade de resolver como premissa da condenação firmada» (cfr., no mesmo sentido, os acs. do STJ, de 23.11.2011, proc. n.º 644/08.2TBVFR.P1.S1, e de 22.09.2016, proc. n.º 106/11.0TBCPV.P2.S1).
«Não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo considerado no seu todo: o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge estes fundamentos enquanto pressupostos daquela decisão» (Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 1997, p. 578 e 579).
Na verdade, como refere Manuel de Andrade (Noções Elementares de Processo Civil, p. 306), «[s]eria intolerável que cada um nem ao menos pudesse confiar nos direitos que uma sentença lhe reconheceu; que nem sequer a estes bens pudesse chamar seus, nesta base organizando os seus planos de vida; que tivesse constantemente que defendê-los em juízo contra reiteradas investidas da outra parte, e para mais com a possibilidade de nalgum dos novos processos eles lhe serem negados pela respectiva sentença».
Decorre do exposto que o valor do caso julgado não incide sobre os factos julgados provados (ou não provados), isoladamente considerados, mas antes sobre a decisão enquanto conclusão de determinados fundamentos, apenas atingindo tais fundamentos, de facto e de direito, enquanto pressupostos da decisão.
No caso em análise, na sentença que decidiu os embargos opostos à execução, o tribunal a quo julgou provado que o custo da obra necessária para dar cumprimento integral à sentença que serve de base à execução ascende a 330,00 €. Porém, é de linear clareza que este facto se revelou totalmente irrelevante para a decisão dos embargos, não constituindo fundamento da decisão que determinou a prossecução da execução para prestação do facto exequendo, nem da decisão que absolveu o executado do pedido de pagamento de uma sanção pecuniária compulsória.
Esta baseou-se na circunstância de estar em causa um facto fungível e a sanção pecuniária compulsória só ser possível em relação às obrigações de facere ou non facere infungíveis.
Aquela fundou-se na circunstância de não se ter provado que o executado tivesse realizado a prestação em causa, como alegou, sendo o custo dessa prestação totalmente irrelevante para sustentar tal decisão. A única utilidade do ponto 4 dos factos julgados provados na sentença em causa parece ser a remissão que faz para o relatório pericial junto aos autos, na parte relativa aos trabalhos a realizar, na medida em que corrobora a ausência de prova sobre o cumprimento da prestação exequenda.
Nestes termos, por não configurar um pressuposto da decisão, não podemos considerar abrangido pela força do caso julgado o custo da obra considerado provado no referido ponto 4, pelo que o tribunal a quo não podia fixar o custo da prestação com fundamento no trânsito em julgado (na autoridade do caso julgado) daquela sentença.
Resta saber se podia dispensar a perícia prevista no artigo 870.º, n.º 1, do CPC, substituindo-a pela perícia realizada no apenso de embargos de executado (não apenas o relatório pericial apresentado por escrito, mas também os esclarecimentos prestados pelo perito em sede de audiência de julgamento, sendo certo que o valor fixado não corresponde ao mencionado no relatório, mas antes ao indicado nos esclarecimentos prestados oralmente pelo perito).
O valor extraprocessual das provas está regulado no artigo 421.º do CPC, nos seguintes termos: 1 – Os depoimentos e perícias produzidos num processo com audiência contraditória da parte podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 355.º do Código Civil; se, porém, o regime de produção da prova do primeiro processo oferecer às partes garantias inferiores às do segundo, os depoimentos e perícias produzidos no primeiro só valem no segundo como princípio de prova. 2 – O disposto no número anterior não tem aplicação quando o primeiro processo tiver sido anulado, na parte relativa à produção da prova que se pretende invocar.
Aparentemente, o regime de produção de prova pericial da oposição à execução não oferece menores garantias do que o regime previsto no artigo 870.º do CPC para a avaliação a realizar na execução para prestação de facto.
Poder-se-ia até considerar que oferece maiores garantias, na medida em que permite a realização de uma segunda perícia, ao abrigo do disposto nos artigos 487.º a 489.º do CPC, sendo, pelo menos discutível, que essa faculdade exista no âmbito do artigo 870.º do CPC. Neste sentido, cfr. Rui Pinto, cit., p. 1021.
Mas esta aparência pode ser falaciosa, tendo em conta que a inadmissibilidade da segunda perícia encontra justificação na circunstância de a avaliação poder ser confirmada ou desmentida pela realização das obras. Como escreve Rui Pinto, «se o produtoobtido for suficiente para o custeamento pretendido, o credor então fará “os contratos que quiser para efectuar a prestação, ou efectua-la-á ele próprio, com o ónus de prestar contas ao tribunal” (CASTRO MENDES). A avaliação pode ser confirmada ou desmentida pela realização das obras. Daí que, no âmbito deste processo, não seja admissível segunda avaliação». Em sentido próximo, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa (cit., p. 315) escrevem que «[a] avaliação assim feita destina-se a fornecer uma estimativa do custo provável das despesas, não sendo definitivo o valor indicado pelo perito, até porque haverá lugar à prestação de contas (cf. art. 872º), em incidente próprio».
Seja como for, na situação concreta, cremos que aquelas garantias se revelaram, em substância, efectivamente inferiores.
Como vimos anteriormente, o custo da prestação do facto exequendo não tinha qualquer relevância para a apreciação e decisão da oposição à execução. Por isso, na nossa opinião, o Tribunal a quo não se devia ter pronunciado sobre esse facto e, por conseguinte, não devia ter produzido prova sobre o mesmo. O que interessava apurar era, como também já dissemos, se o executado havia prestado o facto exequendo, conforme alegou. Neste contexto, a prova pericial devia incidir (apenas) sobre este facto.
E a verdade é que a referida prova incidiu (também) sobre esse facto. Por isso, na motivação da decisão sobre matéria de facto vertida na sentença dos embargos, o Tribunal a quo afirma que «[o] tribunal não deu como provado a factualidade descrita na alínea a), considerando o teor do relatório pericial, tendo sido ouvido o Sr. Perito em sede de audiência final, que confirmou a ausência de trabalhos – refere que apenas foi colocado cimento em parte do muro». Porém, numa argumentação a outrance, acrescenta que o perito «explicou a forma como procedeu à quantificação dos trabalhos a realizar, tendo esclarecido que, em face da dimensão do muro em causa o valor dos trabalhos seria de € 330,00, e não o indicado, por ter-se baseado numa área do muro mais alargada e não na que seria a parte referente à dos autos».
Por outro lado, no relatório que apresentou, o perito nomeado avaliou o custo das obras em 1.400,00 € mais IVA. Sem questionar as parcelas que compõem este “orçamento”, a exequente embargada pediu esclarecimentos, requerendo que o perito incluísse no relatório outras obras (cfr. requerimento de 07.09.2023). Porém, este pedido de esclarecimentos não chegou a ser apreciado pelo tribunal a quo (cfr. despacho de 12.10.2023, onde se refere apenas o pedido de esclarecimentos apresentado pelo embargante executado, e a resposta apresentada pelo perito em 28.11.2023).
Neste contexto, perante um relatório pericial que infirmava a prestação do facto alegada pelo embargante e perante a irrelevância do custo desta prestação para a decisão a proferir naquela sede, é de admitir que a exequente embargada não se tenha empenhado em insistir na resposta ao seu pedido de esclarecimentos ou que não tenha tomado a opção de requerer uma segunda perícia, ao abrigo do disposto nos artigos 487.º a 489.º do CPC, por considerar que o custo da prestação seria apreciado nos autos principais, nos termos previstos no artigo 870.º do CPC, sendo aí contempladas todas as obras a realizar para o efeito. De resto, o custo indicado no relatório pericial é incomparavelmente superior ao custo que o tribunal acabou por considerar provado com base nos esclarecimentos prestados pelo perito em audiência de julgamento.
Por fim, a perícia foi requerida pela embargada no âmbito da oposição à execução, nunca tendo o tribunal esclarecido que a mesma seria considerada para os efeitos dos autos principais de execução, dispensando e substituindo a avaliação prevista no artigo 870.º do CPC.
Pelas razões expostas, tal como começámos por afirmar, entendemos que e perícia realizada nos autos de oposição à execução ofereceu garantias inferiores às que seriam asseguradas pela diligência prevista no artigo 870.º do CPC, pelo que assista razão à recorrente quando afirma que deve ser ordenada a realização desta diligência.
Fica, assim, ultrapassada a questão de saber se o valor da execução para pagamento de quantia certa deve ter em conta o orçamento junto com o requerimento executivo, no valor de 1800,00 €. 4. A última questão suscitada pela recorrente consiste em saber se a execução para pagamento de quantia certa deve contemplar igualmente, as indemnizações pedidas no requerimento executivo, incluindo aqui a sanção pecuniária compulsória e a indemnização moratória (cfr. conclusões VI e VII).
Quanto à sanção pecuniária compulsória, o tribunal já decidiu por sentença transitada em julgado que a mesma não é devida. Ao contrário do que a recorrente sugere na conclusão VIII, os embargos não foram julgados improcedentes, mas sim parcialmente procedentes, tendo obtido êxito precisamente na parte relativa ao pagamento da sanção pecuniária compulsória.
Nos termos do disposto no artigo 619.º do CPC, transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º. Nestes termos, o pedido de pagamento de uma sanção pecuniária compulsória já foi definitivamente julgado, não podendo essa decisão ser sindicada por via de recurso, pelo que improcede a pretensão da recorrente de ver aqui satisfeito esse pagamento.
No que concerne à indemnização moratória, vimos que, na mesma sentença que decidiu os embargos opostos à execução, o Tribunal a quo se limitou a referir que o respectivo pedido seria oportunamente analisado, nos termos do artigo 871.º, n.º 2, do CPC, sendo um incidente da instância a tramitar no processo principal.
Desta decisão, associada ao facto de o tribunal a quo nada ter dito a respeito da liquidação da indemnização moratória no despacho em que fixou o valor do custo da prestação em 330,00 € e determinou a penhora de bens suficientes e necessários para pagamento dessa quantia, parece decorrer que o tribunal a quo considera que, mesmo quando o facto é prestado depois de concluída a avaliação, nos termos previstos no artigo 870.º, n.º 2, do CPC, a liquidação da indemnização moratória apenas tem lugar com a prestação de contas, invocando para o efeito a norma do artigo 871.º, n.º 2, inserida no regime legal aplicável quando o exequente faz ou manda fazer as obras necessárias para a prestação do facto, mesmo antes de terminada a avaliação.
Esta liquidação da indemnização moratória juntamente com a prestação de contas faz todo o sentido nos casos em que a realização da prestação por terceiro é feita com custeamento posterior (cfr. Rui Pinto, cit., p. 1022).
Quando essa realização é feita com custeamento prévio e, por isso, os «actos de execução da obra – por terceiro ou pelo próprio exequente – já consubstanciam uma actividade extraprocessual» (cfr. Rui Pinto, cit., p. 1021, onde se acrescenta que «obtido o valor para a levar a cabo deverá extinguir-se a execução, pois nada mais se precisa do devedor executado»), não se vislumbra qualquer fundamento ou vantagem para que assim seja. Nestes casos, afigura-se inteiramente acertado o entendimento expresso pelo mesmo autor (loc. cit.):
«O credor que queira executar o direito à prestação requererá a nomeação de perito que avalie o custo provável da prestação (artigo 870° n° 1). Esse pedido pode ser feito logo no requerimento executivo, mas também mais tarde.
Por outro lado, como o artigo 868° n° 1 autoriza a que o credor peça, além do cumprimento por terceiro, também o pagamento de indemnização moratória a que tenha direito, a economia processual impõe que a indemnização seja liquidada e paga em cumulação com a liquidação e pagamento do custo das obras».
Assim, no caso concreto, a liquidação da indemnização moratória deve ser, desde já, cumulada com a liquidação do custo da prestação prevista no artigo 870.º do CPC, não tendo de aguardar o eventual incidente de prestação de contas. 5. Pelas razões expostas, na procedência parcial da apelação, importa revogar a decisão recorrida e determinar o prosseguimento dos autos, tendo em vista a liquidação do custo da prestação, nos termos previstos no artigo 870.º do CPC, e a liquidação da indemnização moratória, nos termos previstos no artigo 868.º, n.º 1, do mesmo código.
Perante esta procedência parcial da apelação, as respectivas custas são suportadas por ambas as partes, na respectiva proporção (artigo 527.º do CPC), tendo-se em conta os valores discriminados no título executivo para cada uma das pretensões apreciadas.
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Sumário (artigo 663.º, n.º 7, do CPC):
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III. Decisão
Pelo exposto, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto julgam parcialmente procedente a apelação e, consequentemente, revogam a decisão recorrida e determinam o prosseguimento dos autos, com a liquidação do custo da prestação, nos termos previstos no artigo 870.º do CPC, e a liquidação da indemnização moratória, nos termos previstos no artigo 868.º, n.º 1, do mesmo código.
Custas por recorrente e recorrido, na proporção do respectivo decaimento.
Registe e notifique.
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Porto, 25 de Março de 2025
Artur Dionísio Oliveira
Pinto dos Santos
Anabela Miranda