PRESUNÇÃO DERIVADA DO REGISTO PREDIAL
USUCAPIÃO
Sumário

I - No nosso ordenamento jurídico o registo predial tem natureza declarativa e não constitutiva, uma vez que não dá nem tira direitos, destinando-se a dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário.
II – No art. 7º do Cód. Registo Predial consagra-se a presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, a qual, porém, sendo “juris tantum”, poderá ser elidida por prova em contrário nos termos do art. 350º, nº 2 do Cód. Civil.
III – Assim, provando-se factualidade integrativa da usucapião, esta como é uma forma de aquisição originária, não pode ser prejudicada pelas eventuais inscrições registais existentes.
IV – A presunção do art. 7º do Cód. Registo Predial não se estende aos limites ou confrontações dos prédios ou à sua área, em suma à sua identificação física, uma vez que estes elementos são suscetíveis de assentar em meras declarações dos interessados, escapando ao controlo do Conservador do Registo Predial.
V - Todavia, a descrição terá de conter um conjunto de elementos identificativos, que constituirão um âmbito mínimo ou núcleo essencial indispensável à definição ou identificação da coisa sobre a qual incide a inscrição do direito, sob pena de não se saber sobre que coisa incide o facto inscrito.

Texto Integral

Proc. nº 4800/17.4 T8MTS.P1

Comarca do Porto – Juízo Local Cível de Matosinhos – ...

Apelação

Recorrentes: AA e BB [autoras]; CC e DD [réu e interveniente]

Relator: Eduardo Rodrigues Pires

Adjuntos: Desembargadoras Anabela Andrade Miranda e Alexandra Pelayo

Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto:

RELATÓRIO[1]

As autoras AA e BB vieram propor a presente ação de condenação com processo comum contra o réu CC, pedindo que este seja condenado a:

a) Reconhecer que as autoras são donas e legítimas proprietárias do prédio rústico melhor identificado no art.º 1º da petição inicial e declarar-se que o são;

b) Na reposição do muro ou parede divisória do seu armazém a Norte, onde confrontava com o prédio das autoras;

c) Abster-se de qualquer ato que possa perturbar o direito de posse exclusiva que as autoras têm sobre a sua propriedade, até ao limite do muro do armazém do réu voltado para a propriedade das autoras;

d) Abster-se de entrar ou ocupar qualquer área do terreno das autoras, que se situa para lá do limite do muro do armazém que foi demolido e voltado para Norte;

e) Pagar sanção pecuniária compulsória diária de 100,00€ por cada vez que violar a decisão após o seu trânsito em julgado.

Alegaram, para tanto e em resumo, que sem determinação de parte ou direito, são donas e legítimas proprietárias de um prédio rústico, destinado a cultura, sito no Lugar .../Rua ..., a confrontar do Norte com EE, Sul com Rua ..., Nascente com Rua ... e Poente com Rua ..., inscrito na respetiva matriz rústica da União das Freguesias ..., ... e ... sob o art. ...69, por o terem adquirido por sucessão por óbito de FF e GG, que deixaram um único filho de nome HH, casado com a A. AA que, veio a falecer antes da sua mãe, GG, pelo que entretanto tendo também esta falecido, sucedeu-lhe, por direito de representação, a sua única neta, a ora autora BB.

Tal propriedade encontra-se registada a favor da autora AA e da finada GG, pela descrição nº ...97/20020403 da Conservatória do Registo Predial de Matosinhos, pela apresentação 46 de 2002/04/03, mas mesmo que título não tivessem, sempre o teriam adquirido por usucapião.

O réu diz que é o proprietário de um armazém que se situa na estrema Sul/Poente do identificado terreno com saída para a Rua ..., ao que diz por o ter adquirido por usucapião da sua anterior proprietária e sogra II e está inscrito na matriz urbana de ... sob o art. ...34, e tem uma área coberta inferior a 90 m2 e sem ter qualquer área descoberta.

O referido armazém tinha uma forma triangular, sendo a base mais larga junto da entrada para a Rua ..., a Poente, terminando em ponta aguda, a Nascente, confrontando do Norte e Nascente com o terreno das autoras e do Sul com a Rua ..., e Poente com a entrada pela Rua ..., e para além da entrada por um portão em folha, de correr, não tem qualquer outra entrada ou qualquer abertura, janela ou fresta em qualquer uma das suas paredes delimitativas.

No dia 5.9.2017 o réu começou a demolir o seu armazém, só deixando de pé os muros que deitam diretamente para a via pública a Sul da Rua ... e a Poente para a Rua .... Porém, no limite a Norte com a propriedade rústica das autoras, o réu destruiu o muro e não deixou qualquer vestígio do alicerce do armazém e pintou umas marcas a tinta vermelha na guia junto ao solo na Rua ... e no muro de pedra da Rua ..., dizendo este que o limite do seu terreno na confrontação com o rústico das autoras é a linha reta entre essas duas marcas, com o que pretende ocupar uma extensa área de terreno das autoras, muito para além dos muros divisórios do armazém demolido, sendo que o dito armazém não possuía qualquer área descoberta, muito menos do lado Nascente/Norte onde confronta com o terreno das autoras.

Com as marcas que colocou no solo e diz que vai unir com divisória em linha reta, invade em várias dezenas de metros o terreno das autoras.

Citado, o réu apresentou contestação na qual deduziu a exceção de ilegitimidade passiva, com fundamento em que é casado com DD sob o regime de comunhão de adquiridos e que o prédio identificado nos arts. 5º e segs. da petição inicial pertenceu em partes iguais ao réu e sua esposa, por o terem adquirido em conjunto, por força do instituto jurídico da usucapião.

Mais alegou, em resumo, que ele e sua esposa foram exclusivos donos e legítimos possuidores do prédio urbano de rés-do-chão amplo, destinado a armazém, sito na Rua ... e Rua ..., da freguesia ..., do concelho ..., com inscrição matricial sob o art. ...34º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos, sob o nº. ...80, com a área total, coberta e descoberta, de 120,56 m2, propriedade que adquiriram através do instituto jurídico da usucapião, reconhecida em sentença proferida no dia 16.7.2003, no processo nº. ...4/2001, do 5º Juízo Cível, do Tribunal Judicial de Matosinhos.

O referido armazém era servido por um logradouro, cuja existência ficou demonstrada, através da matéria dada como provada, nomeadamente da asserção do armazém se encontrar implantado numa parcela de terreno “com a área de pelo menos 95 m2”, sendo que, após a entrada da ação nº. ...4/2001, mas no ano de 1979, o réu e a sua esposa acordaram com a então proprietária do prédio confinante a norte, II, fazer a delimitação do logradouro com base na linha que liga os pontos A e B, da planta que junta como doc. nº 3.

Desde 1979 o réu e sua esposa, por si e familiares, amigos e conhecidos, à vista e com conhecimento de toda a gente, sem oposição de quem quer que fosse, nomeadamente, das autoras, de forma continuada e sem interrupção no tempo, e convictos do exercício de um direito próprio e sem lesão de interesses de terceiros, exerceram a posse sobre o descrito prédio até à demolição do armazém ocorrida no dia 5.9.2017 e sobre o solo e o logradouro que fazia parte integrante do armazém até 21.9.2017 que usaram em proveito próprio, por ele passando com familiares, amigos e conhecidos, guardando coisas e objetos, limpando-o e como apoio ao armazém, o que tudo fizeram na convicção de estar a usufruir coisa exclusivamente sua. Pelo que também adquiriram este prédio pela forma de aquisição originária da usucapião, o que, expressamente, invoca.

O armazém nunca teve forma triangular, nem nunca terminou em ponta aguda a nascente e jamais confrontou com terreno das autoras, sendo as confrontações as seguintes: a norte anteriormente com II e atualmente com JJ; a sul, nascente e poente com caminho.

No dia 21.9.2017, os réus venderam o seu prédio a “A..., Lda.”.

Deduziu ainda reconvenção pedindo que se declare que o réu foi proprietário, por via da usucapião, do prédio urbano de rés-do-chão amplo destinado a armazém, com uma área global coberta e descoberta de 120,56 m2 confrontante a norte, com II a sul, nascente e poente com caminho, inscrito na matriz sob o art. ...34º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº. ...80, até à data da venda, ocorrida no dia 21.9.2017.

As autoras apresentaram réplica, na qual pugnaram pela improcedência da reconvenção, alegando, em resumo, que só o réu marido é que intentou ação contra a própria sogra, para adquirir por usucapião a garagem que as autoras identificam na petição inicial, o art. ...34 urbano da freguesia ..., que terá adquirido por usucapião nessa ação, mas que nunca teve descrição predial, tendo sido registado na Conservatória Predial pela primeira vez, em 30.7.2008. O artigo ...34, já nessa altura da ação, não era qualquer terreno, mas sim um prédio de rés-do-chão amplo destinado a armazém, e tinha a área coberta de 80 m2, sem qualquer área descoberta, sendo que a sentença acolhe que o sobredito prédio tinha a área coberta de 95 m2 e se encontra implantado em parcela de terreno com a área de, pelo menos, 95 m2, ou seja, não tinha, nem nunca teve qualquer área descoberta, sendo que nessa ação nunca foi invocado que existia logradouro.

O réu sempre só teve a posse de área coberta do dito armazém, nunca acedeu a qualquer logradouro nem tinha qualquer acesso a ele, donde, por isso, o armazém de que obteve a usucapião terá quando muito a área coberta de 95 m2, embora no art. ...34 se diga que é de 80 m2.

As autoras vieram, ainda, requerer a intervenção principal provocada passiva de DD, cônjuge do réu, e de "A..., Lda.", adquirente do imóvel do réu em 21.9.2017, o que veio a ser deferido.

Citada, veio a interveniente DD apresentar contestação em tudo idêntica à apresentada pelo réu, mais alegando, em resumo, que o prédio que as autoras indevidamente pretendem declarar como seu, que tem a área total de 2.160,76m2, melhor identificado a carmim no documento n.º 1 que junta, pertence a terceiros, nele se incluindo uma língua de terreno identificada pela letra “B”, que esteve na posse de GG, sogra e avó das autoras e que representa apenas a percentagem de 10,13% desse prédio único.

O prédio de que as autoras se dizem, indevidamente, possuidoras e proprietárias e confrontante a Norte com EE, a Nascente com a Rua ..., a Poente com a Rua ... e a Sul anteriormente com o réu e atualmente com “A..., Lda.” pertence aos comproprietários e compossuidores que identifica, comproprietários e compossuidores, bem como os seus antecessores, que sempre tiveram a consciência de que era, e sempre o trataram, como um prédio único.

Todavia, por razões de comodidade e para facilitar a sua agricultação, podendo cada um colher os produtos hortícolas que mais lhe interessassem, definiram entre si espaços físicos para poderem agricultar o terreno, uma vez que não lhes interessava uma agricultação coletiva, sendo que o prédio não era passível de fracionamento.

Mais alegou que a parte identificada no referido documento n.º 1 com a letra “A”, com a área de 1.253,15m2, é agricultada por KK, LL, MM, NN, OO, PP, QQ, RR, SS, TT, UU e VV, descrevendo a forma como adveio à sua posse e propriedade.

A parte identificada no documento n.º 1 com a letra “C”, com a área de 688,40m2, que é a parte confinante com o prédio que pertenceu ao réu é agricultada por DD e CC, WW, XX dos

, JJ e YY, descrevendo a forma como adveio à sua posse e propriedade.

O registo invocado pelas autoras foi feito de forma abusiva e de má-fé, com plena consciência que a totalidade do prédio não pertencia às pessoas nele identificadas e feito com fundamento na transmissão por dissolução da comunhão conjugal e sucessão por morte de FF, quando este nunca foi seu proprietário ou possuidor.

Os comproprietários e compossuidores apenas sabiam que o prédio se encontrava inscrito na matriz, por esta informação ter sido prestada por HH, que reuniu com todos os comproprietários e compossuidores e informou que ia legalizar o prédio, para o dividir em talhões com reconhecimento da propriedade de todos, tendo sido com este acordado que o valor do Imposto Municipal sobre Imóveis referente ao prédio seria dividido por todos, o que veio a acontecer durante todos estes anos, pois têm vindo a pagar, anualmente e em dinheiro, a respetiva quota-parte do valor do IMI ao HH e, após a sua morte, à autora AA, até ao ano de 2017, altura em que esta recusou o seu recebimento. O referido HH e a autora AA sempre os tranquilizaram, garantindo que, quando o prédio fosse vendido, o valor do mesmo seria distribuído por todos. Por assim ser, foi recebida pelos comproprietários do prédio uma proposta de aquisição, dividindo-se o produto da venda por todos, que foi transmitida à autora AA, e que apenas não foi aceite por esta pretender valor mais alto.

Deduziu reconvenção pedindo que:

- Se declare que a ré ora interveniente e o réu seu marido foram proprietários, por via da usucapião do prédio urbano de rés-do-chão amplo destinado a armazém, com uma área global coberta e descoberta de 120,56 m2 confrontante a norte, com II a sul, nascente e poente com caminho, inscrito na matriz sob o artigo ...34º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº. ...80, até à data da venda, ocorrida no dia 21.9.2017.

- Se declare serem a ré interveniente e o réu seu marido exclusivos proprietários e legítimos possuidores da quota parte de 14,212% do prédio identificado em 37º e 38º da contestação, confrontante a Norte com EE, a Nascente com a Rua ..., a Poente com a Rua ... e a Sul anteriormente com o réu e atualmente com “A..., Lda.”, com a área de 2.160,76m2.

- Se declare serem as pessoas identificadas nos arts. 43º e 44º da contestação, com exclusão da ré interveniente e do réu seu marido, exclusivos proprietários e legítimos possuidores, em regime de compropriedade, da quota parte de 75,63% do prédio identificado nos arts. 37º e 38º da contestação, confrontante a Norte com EE, a Nascente com a Rua ..., a Poente com a Rua ... e a Sul anteriormente com o réu e atualmente com “A..., Lda.”, com a área de 2.160,76m2.

Mais requereu a intervenção principal provocada passiva, em associação ao réu e à interveniente DD, de KK, e marido ZZ, de LL, de MM, de NN, e marido AAA, de OO, de PP, de QQ, e marido BBB, de RR e de SS, todos na qualidade de herdeiros de CCC, de TT, e marido DDD, de UU, e marido EEE, de VV, e mulher FFF, de WW e mulher GGG, de XX, e mulher HHH, de JJ, por si, e na qualidade de cônjuge meeira e herdeira de III e do filho pré-falecido JJJ, e de YY, na qualidade de herdeira de III, que foi indeferida.

Citada, veio a interveniente “A..., Lda.” apresentar contestação, na qual, em resumo, alega que enquanto terceiro adquirente na compra e venda mencionada nos autos, baseou-se nas informações que constavam da certidão predial permanente do prédio para averiguar se efetivamente os outros intervenientes da compra e venda seriam os proprietários do prédio, certidão na qual os réus constavam como proprietários do prédio em causa e que as autoras invocam que o prédio cuja propriedade pertencia aos réus teria uma área apenas de cerca de 90m2 compostos por um armazém, entretanto demolido mas que tal não corresponde às informações que constam do histórico de registo do prédio, já que no modelo I do IMI apresentado em 6.9.2017 no Serviço de Finanças de Matosinhos I a área de implantação do prédio é de 105m2.

Mais alega que à ré apenas é exigível o conhecimento dos factos constantes da certidão predial permanente do prédio e dos documentos oficiais que serviram para instruir a escritura de compra e venda perante um oficial público, pelo que, ainda que se comprovasse que os réus estariam a vender coisa alheia, não pode a nulidade do ato resultante desse facto ser oponível à ré (art. 892º do Cód. Civil).

Aquando da celebração da compra e venda, o prédio era apenas composto por um terreno para construção e o mesmo consta da certidão de registo. Na sua boa fé, a ré comprou um terreno para construção com uma área de 120,56m2 e não pode ver o seu direito de propriedade do prédio com 120,56m2 de área prejudicado por uma situação que lhe é alheia.

No dia 22.9.2017, um dia após a celebração da compra e venda, a ré registou a seu favor o direito de propriedade do referido prédio. Estando, assim, o direito de propriedade registado a favor da ré, de uma área de terreno de 120,56m2, não pode o direito pretendido pelas autoras ser oponível à ré.

As autoras apresentaram réplica, na qual, no que à contestação da interveniente “A..., Lda.” se refere alegaram que o que se discute é a área do terreno que os vendedores possuíam e que transmitiram. Que o terreno seja da ré, as autoras não discutem, mas sim a área que podia ser transmitida, pelo que não há aqui qualquer questão de terceiros para efeitos de registo, senão a área em causa que está, também, registada a favor das autoras, muito antes da escritura da ré e, até, do registo invocado pelos vendedores do terreno, pelo que deve a ação ser julgada procedente em relação à ora ré.

Relativamente à contestação/reconvenção da interveniente DD, alegaram, em resumo, que a ré DD e o seu marido CC, venderam em 21.9.2017 o imóvel que se discute nos autos, pelo que já não têm interesse direto em contradizer. Se as autoras, que intentaram a ação em 10.10.2017, tivessem sabido antes que já não eram donos, a ação teria sido intentada só contra o possuidor, a identificada empresa "A..., Lda.". Logo, os referidos DD e CC, são parte ilegítima na ação, e como tal têm de ser absolvidos da instância e a consequência é que não podem pedir a intervenção de quem quer que seja e muito menos deduzir qualquer reconvenção pois não são réus na ação.

No mais, reproduzem o já alegado na réplica apresentada à contestação do réu e alegam que as pessoas que a interveniente invoca como sendo comproprietários, são na verdade, pessoas que cultivam o terreno por mero favor e gratuitamente, bem sabendo que nada lhes pertence. Comparticipam em algumas despesas, por essa mesma razão de não pagarem nada pela ocupação. Nunca, em tempo algum, colocaram em causa a propriedade do terreno que sempre souberam e sabem pertencer às autoras.

O réu e a interveniente DD vieram pugnar pela improcedência da deduzida exceção de ilegitimidade.

Convidado para o efeito, o réu veio declarar aderir ao pedido reconvencional deduzido pela interveniente DD correspondente ao ponto 3. do pedido:

“Se declare serem a R. Interveniente e o R. seu marido exclusivos proprietários e legítimos possuidores da quota parte de 14,212% do prédio identificado em 37º e 38º da contestação, confrontante a Norte com EE, a Nascente com a Rua ..., a Poente com a Rua ... e a Sul anteriormente com o R. e actualmente com “A..., Lda.”, com a área de 2.160,76m2.”.

Foi proferido despacho saneador que considerou as partes legítimas, fixou o objeto do litígio e enunciou os temas da prova, o qual não foi objeto de reclamação.

Procedeu-se à realização da audiência final com observância do legal formalismo.

Por fim, foi proferida sentença que julgou a presente ação parcialmente procedente e, em consequência, declarou que as autoras são donas e legítimas proprietárias do prédio identificado em 1) dos factos provados, absolvendo-se o réu e as intervenientes dos restantes pedidos formulados nos autos.

Julgou-se a reconvenção parcialmente procedente e, em consequência, declarou-se que o réu e a interveniente DD, foram proprietários, por via da usucapião, do prédio urbano de rés-do-chão amplo destinado a armazém, com uma área global coberta e descoberta de 120,56 m2 confrontante a norte, com o prédio referido em 1) dos factos provados, a sul, nascente e poente com caminho, inscrito na matriz sob o artigo ...34º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº. ...80, até à data da venda, ocorrida no dia 21.9.2017.

Inconformadas com o decidido, as autoras AA e BB interpuseram recurso de apelação, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões:

I - As AA. intentaram a acção invocando que eram donas do prédio rústico melhor identificado no artº 1º da PI.

II - E juntaram o registo Predial com a inscrição a seu favor, e pelo trato sucessivo desde o dono originário até à actualidade.

III - E que a M.ª Juiz deu como provado nos itens 1 a 5 dos Factos Provados.

IV - Por isso e porque o registo não foi impugnado como falso pelos RR., as AA. beneficiam da presunção que o direito registado lhes pertence, de acordo com o artº 7º do Código de Registo Predial, não necessitando de provar o facto que a ela conduz, de acordo com o artº 350 nº 1 do C.C..

V - Porém, interpretando mal todos estes conceitos, a M.ª Juiz "a quo" acabou por concluir que as AA. não beneficiavam da presunção do registo.

VI - O que está em plena contradição com a decisão, quando reconheceu que tal prédio pertence às AA..

VII - Para além disso, as AA. fizeram prova como o terreno lhes pertence e já era dos seus antecessores, que as pessoas que cultivam o terreno, até lhes pagam renda, como reconheceu a testemunha dos RR. e ocupante, KK.

VIII - Destarte, tem de ser acrescentado na parte decisória que o imóvel das AA. está inscrito no artigo ...69 da União das Freguesias ..., ... e ....

IX - Como em consequência disso tudo, também tem de ser levado aos factos provados o que consta da alínea a) dos factos não provados.

X - Em parte alguma do processo e dos factos provados, se diz que as pessoas que cultivam o imóvel, em duas parcelas, o fazem por direito próprio.

XI - Pelo contrário, pagam às AA. para ocuparem o imóvel.

XII - E a consequência é que se tem de levar aos factos provados o item g) dos factos não provados.

XIII - Dos factos invocados pelos RR./Reconvintes e que foram julgados Não Provados das alíneas d), e) e f), é a prova que os RR. não conseguiram ilidir a presunção do Registo de que as AA. beneficiam.

XIV - Ninguém, para além das AA. conseguiu provar, nem os RR., que eram donos de qualquer parte, ou área, do prédio reivindicado.

XV - Não se pode deixar de considerar que todas as testemunhas oferecidas pelos RR. tinham sido chamadas como intervenientes mas, esse pedido foi indeferido.

XVI - Ou seja, têm interesse no desfecho da acção, pois até queriam ser parte e, se o tivessem sido, não poderiam depor como testemunhas.

XVII - Mas intentaram uma acção contra as AA. que corre os seus termos no Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim.

XVIII - O seu depoimento não é genuíno, antes motivado, para beneficiarem da versão dos RR., e que as AA. não são donas do imóvel identificado no artº 1º da PI.

XIX - Donde não se pode atribuir qualquer credibilidade ao seu depoimento.

XX - Os próprios RR. e a Ré mulher confessa no seu depoimento supra identificado e que todos pagavam ao Sr. HH (marido e pai das AA.).

XXI - A testemunha KK, uma das que cultiva uma parte do terreno disse que era um ALUGUER.

XXII - Outra - KKK, que era uma contribuição.

XXIII - Todas as demais que pagavam anualmente ao Sr. HH uma importância, que diziam ser IMI e tinham documentos disso mas nada provaram.

XXIV - Se pagavam às AA. e seus antecessores é a prova concludente que todos reconhecem as AA. como donas do prédio reivindicado.

XXV - Sobre a Reconvenção, não só pelo depoimento de várias testemunhas, cujas passagens estão invocadas no texto destas alegações, nomeadamente da testemunha KKK e LLL, são unânimes em dizer que os RR. nunca ocuparam qualquer área para além da restrita área coberta do armazém.

XXVI - O próprio R. Marido, em resposta à pergunta do seu Mandatário se o armazém tinha logradouro, responde espontaneamente que não – m 37,32 e 37,42 – do seu depoimento supra transcrito.

XXVII - Depois, temos toda a factualidade que é invocada na acção de justificação contra incertos.

XXVIII - Juntam a caderneta predial que pertencia à doadora, D. II, artigo ...34 urbano, que é um armazém amplo e que só tem 80 m2 de área coberta e nenhuma área descoberta.

XXIX - Mais invocam que o terreno teria 95 m2.

XXX - Mas também nenhuma área descoberta.

XXXI - As áreas dos imóveis não crescem.

XXXII - A própria planta junta aqueles autos da acção intentada pelos RR., para ilustrar a situação do imóvel, não apresenta qualquer área descoberta.

XXXIII - E não termina em ponta aguda mas sim rectangular.

XXXIV - Ao contrário da planta que já foi apresentada nos autos com a Contestação.

XXXV - A D. II, sua sogra, não podia dar mais do que tinha.

XXXVI - E deu o artigo ...34 que tinha 80 m2 de área coberta.

XXXVII - Se ela deu o que tinha e não fizeram prova de que ela tivesse mais área ou propriedade que aquela, se os RR. estão ou querem ocupar mais área, pelo menos mais 25 m2, é óbvio que ela pertence ao terreno das AA..

XXXVIII - Porque mais ninguém tem lá qualquer propriedade.

XXXIX - Não há provas, não foram apresentadas, que a sua sogra, D. II, fosse dona ou proprietária de qualquer parcela de terreno a Norte.

XL – O próprio relatório pericial indica que pelos vestígios ainda visíveis da construção, do que tinha sido o armazém, a área coberta era de 85 m2.

XLI - O Modelo 1 de 6/9/2017 que juntam com a PI., anexo ao doc. 1, quando participaram o armazém ao Fisco, e é feito pelo R. CC, já escrevem que a área de implantação e de construção é de 105 m2.

XLII - Ou seja, a área andou sempre ao sabor dos tempos.

XLIII - Pelo que os itens 7º, 8º, 10º, 21º e 22º dos factos provados, tem de ser alterados para não provados.

XLIV - É CONCLUDENTE que na Sentença, que se descreve no item 14 dos Factos Provados, só se faz referência ao artigo ...34 que deu origem à acção.

XLV - E quanto a áreas, só é descrito 95 m2, nunca 120 m2.

XLVI - Pelo que a fundamentação da M.ª Juiz assenta em premissas que não se verificam e áreas erradas e que não constam do processo do 5º Juízo Cível de Matosinhos, nº ...4/2001.

XLVII - E é essa acção que os RR. invocam para fazer prova da sua propriedade e área da mesma.

XLVIII - Que tudo tem como consequência a total improcedência da Reconvenção.

Termos em que deve a Sentença da M.ª Juiz "a quo" ser alterada no que concerne ao pedido das AA. que elas beneficiam da presunção do Registo Predial, aditando à identificação da propriedade o seu artigo matricial e registo predial, bem como que foi feita prova da aquisição derivada e originária, e ser a acção julgada totalmente procedente por provada e a Reconvenção ser julgada totalmente improcedente por não provada, tudo por erro de aplicação e interpretação do disposto no artigo 7º do Código do Registo Predial, artigos 350 nº 7, 1311, nº 1, 1308 e 483, todos do C.C. (…).

Também inconformados com o decidido interpuseram recurso o réu CC e a interveniente DD, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões:

1ª) A sentença recorrida declarou, correctamente, que R. e Interveniente foram proprietários, por via da usucapião, do prédio urbano de rés-do-chão amplo destinado a armazém, com uma área global coberta e descoberta de 120,56 m2 confrontante a norte, com o prédio referido em 1) dos factos provados, a sul, nascente e poente com caminho, inscrito na matriz sob o artigo ...34º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº. ...80, até à data da venda, ocorrida no dia 21 de Setembro de 2017;

2ª) A sentença, deferente do pedido reconvencional, mais não faz do que corroborar e reiterar o que já tinha sido judicialmente declarado, por sentença há muito transitada em julgado e proferida em 16 de Julho de 2003, no Processo n.º ...4/2001, do 5º Juízo Cível, do Tribunal Judicial de Matosinhos, pois já os R. e Interveniente tinham sido declarados proprietários, por usucapião, de prédio a cuja propriedade as AA. se arrogavam;

3ª) O prédio descrito em 1º da P.I. e que é objecto do pedido formulado na alínea a) do petitório das AA, de acordo com o alegado por estas, teria as seguintes confrontações segundo descrição das AA.: do Norte com EE, do Sul com Rua ..., de Nascente com Rua ... e de Poente com Rua ...;

4ª) O prédio a que se refere o pedido da alínea a) formulado pelas AA., é constituído pelo somatório das partes A a I do terreno total em discussão nos autos, com confrontação a Sul com a Rua ... – como resulta da planta constante do citado Anexo II do Relatório Pericial – abrangendo, portanto, o prédio do R. e da Interveniente;

5ª) Para que o prédio mencionado na alínea a) do pedido das AA. fosse declarado destas e com as confrontações descritas pelas AA., o prédio que foi declarado nos autos ser do R. e da Interveniente não poderia ser destes, pois estaria integrado no prédio das AA., já que corresponde à parcela I;

6ª) Para que as AA. pudessem obter procedência de algum pedido, face à inelutável conclusão de que o prédio do R. e da Interveniente não integra a propriedade das AA., estas teriam que ter formulado um pedido subsidiário que teria que ter consistido em requerer que fosse declarado que era sua a propriedade de um prédio com diferentes confrontações, a saber, que do Sul confrontasse com o R. e a Interveniente ou, eventualmente do Sul com “A..., Lda.”, o que não fizeram;

7ª) Apenas se as AA. tivessem formulado um pedido subsidiário é que o Tribunal, face à inevitável procedência do pedido reconvencional dos R. e Interveniente, poderia ter parcialmente deferido esse pedido subsidiário;

8ª) Não existindo tal pedido subsidiário, e estando o Tribunal limitado, na sua apreciação, ao pedido que foi formulado pela parte e com os contornos e características por esta fixados, por força do deferimento do pedido a) formulado pelas AA., verifica-se uma condenação extra vel ultra petitum, nos termos previstos pelo artigo 615º, n.º 1, alínea e) do C.P.C.;

9ª) Bem como uma impossibilidade fáctica da procedência do pedido reconvencional e do pedido a) das AA., pois o bem do R. e da Interveniente não poderia, simultaneamente, estar integrado em bem das AA.;

10ª) Para que o pedido das AA. obtivesse a procedência que lhe foi dada, teria que tratar-se de prédio com diferentes confrontações e que não incorporasse o prédio do R. e da Interveniente;

11ª) Sem prescindir, mesmo que se equacionasse – para efeitos de raciocínio, por dever de patrocínio e sem conceder – a possibilidade de o Tribunal a quo determinar que as AA. seriam proprietárias de prédio com características diversas daquele que é identificado no pedido, sempre o pedido da al. a) das AA. teria que improceder considerada a prova produzida;

12ª) A Mma. Juíza a quo, para efeitos de procedência do pedido reconvencional, considerou, e bem, o teor dos depoimentos das testemunhas e declarações de parte, credibilidade, conhecimento e convicção exibidas por essas pessoas, na medida em que conheciam a história do prédio;

13ª) Mas, para efeitos de derrogação dos efeitos decorrentes de um registo falso da autoria das AA., ignorou os depoimentos dessas mesmas pessoas, e as informações e factos que trouxeram aos autos, e considerou que não tinha sido ilidida a presunção estabelecida pelo registo;

14ª) Só que, não pode, para efeitos de atribuição da propriedade ao R. e à Interveniente, aceitar-se a história fáctica do prédio e ignorá-la para efeitos de ilisão do falso registo levado a cabo pelas AA.;

15ª) Isto porque, os factos que demonstram e explicam as razões pelas quais o terreno onde foi construído o armazém lhes adveio à sua propriedade são exactamente os mesmos que explicam porque seria impossível que as AA. fossem declaradas proprietárias do terreno identificado no artigo 1º da P.I. e mencionado na al. a) do seu pedido e em 1) dos factos provados e que impõem que a presunção estabelecida pelo registo seja ilidida;

16ª) A forma como o prédio de que se trata nos autos (constituído pelo somatório das parcelas A a I identificadas na Planta Topográfica constante do Anexo II do Relatório Pericial) adveio à posse e propriedade de todos os seus actuais proprietários consta com clareza dos artigos 38º a 83º e 109º a 116º da Contestação da Interveniente e verte dos depoimentos prestados;

17ª) Essa história factual explica como a parcela do R. e Interveniente adveio à posse e propriedade destes e descreve a história de uma família que deteve as parcelas E, F, G, H e I, na pessoa de uma antepassada comum e matriarca chamada MMM, que era avó, bisavó e sogra de AA., R. e Interveniente e que distribuiu pelos seus filhos, em várias parcelas, o terreno que detinha e que estes foram sucessivamente passando à sua descendência até as respectivas parcelas chegarem às AA. e R. e Interveniente;

18ª) E explica por que razão o tribunal concluiu que não ficou demonstrado, como resulta do Facto Não Provado a), que as AA. tenham adquirido por usucapião o prédio a cuja propriedade se queriam arrogar;

19ª) E explica o Facto Não Provado g), pois era impossível às AA. provar que as pessoas que cultivam o prédio e parcelas referidas em 1) e 19) dos factos provados cultivam o terreno por mero favor e gratuitamente, bem sabendo que nada lhes pertence e sabendo pertencer às AA.;

20ª) Além disso, não podem simplesmente ser ignorados todos os testemunhos, que são categóricos na corroboração dos factos alegados pela Interveniente que ilidem totalmente a presunção do registo falsamente promovido pelas AA. e sendo certo que a prova produzida em julgamento impõe uma decisão em sentido contrário à prolatada;

21ª) Explica também porque se conclui que se as parcelas são agricultadas por 8 pessoas diferentes e apenas uma delas – a das AA. - é agricultada por conta das AA., como resulta do Facto Provado n.º 20, pois que, necessariamente, as restantes pessoas cultivam as parcelas por direito próprio;

22ª) Atendendo à prova testemunhal produzida, impõe-se alterar o elenco dos factos provados, aditando o mesmo e dando-se como provados os factos descritos nos artigos 12º da Contestação do R. e 8º, 37º, 38º, 86º, 87º, 88º a 99º, 101º, 102º, 109º, 110º, 112º a 114º da Contestação da Interveniente, bem como dar como provados os factos d), e) e f) dos factos não provados;

23ª) Devem, ainda, ser dados como provados os factos acima identificados como A, B, C, D, E, F, e G, a saber:

24ª) Do prédio referido em 1) dos factos provados só uma faixa que representa 10,13% desse prédio, pertence às AA.;

25ª) As pessoas identificadas em 43º e 44º da contestação da interveniente DD, em comum e em partes desiguais, sem determinação de parte ou direito, são exclusivos donos e legítimos possuidores do prédio rústico referido em 1) dos factos provados;

26ª) O R., a Interveniente e as pessoas identificadas em 43º e 44º, por si e antepossuidores, vêm possuindo, usando e fruindo o imóvel descrito em 1) dos factos provados há mais de 1, 2, 5, 10, 20, 30 e mais anos, à vista e com o conhecimento de toda a gente, de forma ininterrupta, de boa fé e pacificamente, sem oposição de ninguém, na convicção que é um bem próprio delas e não lesar direitos alheios, cuidando do terreno, cultivando-o por si ou por interpostas pessoas com a sua autorização, pagando os inerentes impostos;

27ª) A Interveniente DD e seu marido R. exerceram a posse, de boa fé, pública e pacificamente, e com o animus de proprietário desde, pelo menos, há mais de 20, 30, 40, 50, 60 anos ininterruptamente, em relação a 14,212% do prédio referido em 1) dos factos provados;

28ª) O registo de propriedade promovido pelas AA. foi feito à revelia dos legítimos possuidores e proprietários e com intenção de apropriação ilícita de bem que não é seu e com a consciência de que a totalidade de prédio não pertence às AA.;

29ª) O prédio identificado em 1º da P.I., na al. a) do pedido das AA. e em 1) dos factos provados nunca foi propriedade do marido e pai das AA., que dele apenas herdou a parcela identificada com a letra E) na Planta 2 do Anexo 2 do relatório Pericial;

30ª) As pessoas identificadas em 43º e 44º sempre pagaram a respectiva parte da contribuição autárquica ou IMI devidos pelas parcelas de que são proprietários;

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, e, decidindo-se em conformidade com as conclusões:

1) Revogar-se a decisão recorrida na parte em que julgou procedente o pedido formulado em a) do petitório das AA;

2) Julgarem-se procedentes os pedidos reconvencionais formulados pela Interveniente.

O réu CC e a interveniente DD apresentaram também contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:

1ª) Vieram as AA. requerer, em sede de recurso, que fosse corrigida a sentença passando a declarar-se que as mesmas beneficiam da presunção do registo predial, bem como a acção ser julgada totalmente procedente e a reconvenção improcedente;

2ª) Não há, nem foram invocados, fundamentos de facto, nem de Direito, que suportem a pretensão das AA.;

3ª) A sentença recorrida declarou, correctamente, que os RR. foram proprietários, por via da usucapião, do prédio urbano de rés-do-chão amplo destinado a armazém, com uma área global coberta e descoberta de 120,56 m2 confrontante a norte, com o prédio referido em 1) dos factos provados, a sul, nascente e poente com caminho, inscrito na matriz sob o artigo ...34º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº. ...80, até à data da venda, ocorrida no dia 21 de Setembro de 2017;

4ª) A sentença, deferente do pedido reconvencional, mais não faz do que corroborar e reiterar o que já tinha sido judicialmente declarado, por sentença há muito transitada em julgado e proferida em 16 de Julho de 2003, no Processo n.º ...4/2001, do 5º Juízo Cível, do Tribunal Judicial de Matosinhos, pois já os RR. tinham sido declarados proprietários, por usucapião, de prédio a cuja propriedade as AA. se arrogaram;

5ª) A Mma. Juíza a quo, para efeitos de procedência do pedido reconvencional, considerou, e bem, o teor dos depoimentos das testemunhas, bem como das declarações de parte, e a credibilidade, conhecimento e convicção exibidas por essas pessoas, na medida em que conheciam a história do prédio;

6ª) Esses mesmos depoimentos, necessariamente, derrogam os efeitos decorrentes de um registo falso da autoria das AA., ilidindo a presunção estabelecida pelo registo;

7ª) O desrespeito pela verdade, por parte das AA., fica evidente nas conclusões, ao afirmarem, despudoradamente, que o registo não foi impugnado como falso pelos RR., facto que resulta das Contestações do R. e da R.;

8ª) É correcto o afastamento da presunção do registo impugnado, face à prova produzida e o afastamento da aquisição derivada e as AA. não indicam factos que imponham decisão diversa;

9ª) Não há qualquer trato sucessivo do terreno porque, para o efeito, teriam as AA. que ter demonstrado a aquisição pelos seus antecessores – o que também não fizeram;

10ª) O bem em questão e descrito no artigo 1º da P.I. nunca foi propriedade de FF, nem de HH, pelo que nunca poderia ter sido lavrado o registo constante da descrição ...97/20020403, que foi feito sem qualquer suporte legal, em resultado de mera declaração do seu requerente e à revelia da realidade e da vontade dos reais seus proprietários;

11ª) Também é correcta a conclusão que resulta do Facto Não Provado a), de que as AA. não conseguiram demonstrar a aquisição originária por via da usucapião;

12ª) Não se pode, para efeitos de atribuição da propriedade ao R. e à Interveniente, aceitar a história fáctica do prédio e, simultaneamente, ignorá-la para efeitos de ilisão do falso registo levado a cabo pelas AA.;

13ª) Isto porque, os factos que demonstram e explicam as razões pelas quais o terreno onde foi construído o armazém adveio à propriedade dos RR. são exactamente os mesmos que explicam porque seria impossível que as AA. fossem declaradas proprietárias do terreno identificado no artigo 1º da P.I. e mencionado na al. a) do seu pedido e em 1) dos factos provados e que impõem (…) a ilisão da presunção estabelecida pelo registo;

14ª) A forma como o prédio de que se trata nos autos (constituído pelo somatório das parcelas A a I identificadas na Planta Topográfica constante do Anexo II do Relatório Pericial) adveio à posse e propriedade de todos os seus actuais proprietários é a que consta com clareza dos artigos 38º a 83º e 109º a 116ºda Contestação da R. Interveniente e verte dos depoimentos prestados;

15ª) Essa história factual explica como a parcela dos RR. e Interveniente adveio à posse e propriedade destes e descreve a história de uma família que deteve as parcelas E, F, G, H e I, na pessoa de uma antepassada comum e matriarca chamada MMM, que era avó, bisavó e sogra de AA., R. e Interveniente e que distribuiu pelos seus filhos, em várias parcelas, o terreno que detinha e que estes foram sucessivamente passando à sua descendência, até as respectivas parcelas chegarem às AA. e RR.;

16ª) E explica por que razão o tribunal concluiu que não ficou demonstrado, como resulta do Facto Não Provado a), que as AA. tenham adquirido por usucapião o prédio a cuja propriedade se queriam arrogar;

17ª) E explica o Facto Não Provado g), pois era impossível às AA. provar que as pessoas que cultivam o prédio e parcelas referidas em 1) e 19) dos factos provados cultivam o terreno por mero favor e gratuitamente, sabendo que nada lhes pertence ou considerando que pertencia às AA.;

18ª) Além disso, não podem simplesmente ser ignorados todos os testemunhos, que são categóricos na corroboração dos factos alegados pela R. Interveniente que ilidem totalmente a presunção do registo falsamente promovido e sendo certo que a prova produzida em julgamento impôs uma decisão em sentido diverso do pretendido pelas AA.;

19ª) Explica também porque se conclui que se as parcelas são agricultadas por 8 pessoas diferentes e apenas uma delas – a das AA. - é agricultada por conta das AA., como resulta do Facto Provado n.º 20, necessariamente, as restantes pessoas cultivam as parcelas por direito próprio;

20ª) Do prédio referido em 1) dos factos provados só uma faixa que representa 10,13% desse prédio, pertence às AA. sendo o restante desse prédio propriedade das pessoas identificadas em 43º e 44º da contestação da R. DD, em comum e em partes desiguais, sem determinação de parte ou direito;

21ª) Os RR. e as pessoas identificadas em 43º e 44º, por si e antepossuidores, vêm possuindo, usando e fruindo o imóvel descrito em 1) dos factos provados há mais de 1, 2, 5, 10, 20, 30 e mais anos, à vista e com o conhecimento de toda a gente, de forma ininterrupta, de boa fé e pacificamente, sem oposição de ninguém, na convicção que é um bem próprio delas e não lesar direitos alheios, cuidando do terreno, cultivando-o por si ou por interpostas pessoas com a sua autorização, pagando os inerentes impostos;

22ª) O registo de propriedade promovido pelas AA. foi feito à revelia dos legítimos possuidores e proprietários e com intenção de apropriação ilícita de bem que não é seu e com a consciência de que a totalidade de prédio não pertence às AA.;

23ª) O prédio identificado em 1º da P.I., na al. a) do pedido das AA. e em 1) dos factos provados nunca foi propriedade do marido e pai das AA., que dele apenas poderá ter a parcela identificada com a letra E) na Planta 2 do Anexo 2 do relatório Pericial;

24ª) As pessoas identificadas em 43º e 44º sempre pagaram a respectiva parte da contribuição autárquica ou IMI devidos pelas parcelas de que são proprietários;

25ª) O registo não dá, nem confere direitos, sendo tal o entendimento unânime, na doutrina, na jurisprudência e como resulta da sentença em análise;

26ª) As AA. tentam trazer à liça factos, alegadamente, constantes do Processo n.º ...4/2001 para tentar justificar a necessidade de revogação da decisão proferida, afirmando que a decisão assenta em premissas que não se verificam e áreas erradas e que não constam do processo do 5º Juízo Cível de Matosinhos, n.º ...4/2001;

27ª) Pretendiam as AA. que o Tribunal a quo, em vez de atender à prova produzida nos presentes autos, proferisse uma decisão reportada a matéria e prova produzida noutro processo e criam uma confusão, relativamente a áreas, com referências não levadas em consideração pela sentença e provenientes desse outro processo;

28ª) Nos presentes autos foi realizada uma perícia, por perito nomeado pelo Tribunal, que reuniu os elementos de facto relativos às medidas e configuração das parcelas em discussão e a decisão proferida sustentou-se, como devia, na perícia realizada na presente causa;

29ª) Ao Tribunal a quo não cabe sindicar qualquer matéria resultante de outros autos mas, e sem prescindir, os elementos resultantes do processo anterior não contradizem os elementos resultantes da perícia realizada nos presentes autos, antes se complementariam perfeitamente;

30ª) As AA. chegam ao ponto de negar, em sede de recurso, que os RR. tenham construído o armazém em terreno doado pela mãe da R. DD, afirmando, a fls. 41 – linhas 3 e 4, do seu recurso, que a doadora já teria doado um terreno urbano com o armazém, quando é, como resultou provado e consta da sentença, uma “afirmação unânime de todas as testemunhas”, incluindo as das AA., que o R. é que construiu uma garagem no terreno doado pela sua sogra;

31ª) Por outro lado, nunca poderia proceder o pedido formulado em sede de recurso relativo ao benefício da presunção do registo, nem quanto à prova da aquisição derivada e originária, nem podendo a acção [ser] julgada totalmente procedente por outra ordem de argumentos;

32ª) O prédio descrito em 1º da P.I. e que é objecto do pedido formulado na alínea a) do petitório das AA, de acordo com o alegado por estas, teria as seguintes confrontações segundo descrição das AA.: do Norte com EE, do Sul com Rua ..., de Nascente com Rua ... e de Poente com Rua ...;

33ª) O prédio a que se refere o pedido da alínea a) formulado pelas AA., é constituído pelo somatório das partes A a I do terreno total em discussão nos autos, com confrontação a Sul com a Rua ... – como resulta da planta constante do citado Anexo II do Relatório Pericial – abrangendo, portanto, o prédio dos RR.;

34ª) Para que o prédio mencionado na alínea a) do pedido das AA. fosse declarado destas e com as confrontações descritas pelas AA., o prédio que foi declarado nos autos ser dos RR. não poderia ser destes, pois estaria integrado no prédio das AA., já que corresponde à parcela I;

35ª) Para que as AA. pudessem obter procedência de algum pedido, face à inelutável conclusão de que o prédio dos RR. não integra a propriedade das AA., estas teriam que ter formulado um pedido subsidiário que teria que ter consistido em requerer que fosse declarado que era sua a propriedade de um prédio com diferentes confrontações, a saber, que do Sul confrontasse com o R. e a Interveniente ou, eventualmente do Sul com “A..., Lda.”, o que não fizeram;

36ª) Apenas se as AA. tivessem formulado um pedido subsidiário é que o Tribunal, face à inevitável procedência do pedido reconvencional dos RR., poderia ter parcialmente deferido esse pedido subsidiário;

37ª) Não existindo tal pedido subsidiário, e estando o Tribunal limitado, na sua apreciação, ao pedido que foi formulado pela parte e com os contornos e características por esta fixados, por força do deferimento do pedido a) formulado pelas AA., verificar-se-ia uma condenação extra vel ultra petitum, nos termos previstos pelo artigo 615º, n.º 1, alínea e) do C.P.C. caso houve a pedida procedência total da acção;

38ª) Bem como uma impossibilidade fáctica da procedência do pedido reconvencional e do pedido a) das AA., pois o bem dos RR. não poderia, simultaneamente, estar integrado em bem das AA.;

39ª) Para que o pedido das AA. obtivesse a procedência que lhe foi dada, teria que tratar-se de prédio com diferentes confrontações e que não incorporasse o prédio do R. e da Interveniente;

40ª) Sem prescindir, mesmo que se equacionasse – para efeitos de raciocínio, por dever de patrocínio e sem conceder – a possibilidade de o Tribunal a quo determinar que as AA. seriam proprietárias de prédio com características diversas daquele que é identificado no pedido, sempre os pedidos das AA. teriam que improceder considerada a prova produzida e tudo o expendido supra.

Pela Mmª Juíza “a quo” foi consignado o seguinte para os efeitos do art. 617º, nº 1 do Cód. Proc. Civil:

“Foi invocada pelos Recorrentes Réu e Interveniente, a nulidade da sentença, nos termos do disposto no art. 615º, nº 1, al. e) do C.P.C..

Cumpre, em obediência ao disposto no art. 617º, nº 1 do C.P.C., proferir despacho que a aprecie, suprindo-a, sendo caso disso.

Nos termos do disposto no art. 615º, nº 1, al. e), do CPC, é nula a sentença quando o juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.

No caso dos autos, entendemos, face ao pedido e à causa de pedir constante da petição inicial, que a decisão proferida se contém no pedido formulado.

Em face do exposto, indefere-se a arguida nulidade.”

Os recursos foram admitidos como apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Cumpre então apreciar e decidir.


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FUNDAMENTAÇÃO

O âmbito dos recursos, sempre ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, encontra-se delimitado pelas conclusões que neles foram apresentadas e que atrás se transcreveram – cfr. arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Cód. do Proc. Civil.


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As questões a decidir são as seguintes:

I. A nulidade da sentença ao abrigo do art. 615º, nº 1, al. e) do Cód. Proc. Civil;

II. A impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto;

III. O âmbito da presunção decorrente do registo prevista no art. 7º do Cód. Registo Predial existente a favor das autoras e a sua consequência na procedência ou improcedência da ação e da reconvenção.


*

Os factos provados são os seguintes:

1. Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...97/20020403, o prédio rústico sito na freguesia ..., Lugar ..., Rua ..., com a menção de que se encontra omisso na matriz, que confronta a norte com EE, a sul e nascente com Rua ... e a Poente com a Rua ..., e que tem a área de 2.000m2, conforme documento junto com a p.i. sob o nº 4, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

2. O prédio referido em 1) encontra-se inscrito na matriz da União das Freguesias ..., ... e ..., sob o art. ...69, conforme documento junto aos autos com a p.i. sob o nº 1, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

3. O prédio referido em 1) encontra-se registado, através da Ap. ...6 de 2002/04/03, a favor de HH (casado com AA no regime de comunhão geral), de GG e de AA (cada com HH), por dissolução da comunhão conjugal e sucessão por morte,

4. O referido HH faleceu em ../../2012, outorgou testamento em que legou, por conta da quota disponível, ao seu cônjuge, o usufruto de todos os bens imóveis que façam parte da herança e instituiu herdeira da sua quota disponível o referido cônjuge, tendo deixado como únicos sucessores o seu cônjuge, AA, e a filha BB (aqui Autoras), conforme documento junto com a p.i. sob o nº 3, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

5. A referida GG faleceu em ../../2014, tendo deixado como única sucessora a sua neta BB (aqui Autora), filha do seu filho pré-falecido, HH, conforme documento junto com a p.i. sob o nº 2, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

6. Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº ....80/20080730, o prédio urbano sito na Rua ... e Rua ..., em ..., conforme documentos juntos com a contestação do Réu sob os nºs 1 e 2, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

7. Em 03/03/2017, o prédio referido em 6) encontrava-se descrito com a menção de que é composto por um armazém, que se encontra inscrito na matriz sob o art. ...12, que confronta a norte com II e a nascente, sul e poente com caminho público e que tem a área total de 120,56m2, sendo 95m2 de área coberta e 25,56m2 de área descoberta.

8. Em 18/09/2017, o prédio referido em 6) encontrava-se descrito com a menção de que é composto por um terreno para construção, que se encontra inscrito na matriz sob o nº ...53..., que confronta a norte com II, a sul e nascente com Rua ... e a Poente com a Rua ..., e que tem a área de 120,56m2.

9. O prédio referido em 6) foi registado, pela Ap. ...9 de 30/07/2008, a favor de CC e DD (aqui Réu e Interveniente), casados no regime de comunhão geral, por decisão judicial.

10. Por escritura pública outorgada em 21/09/2017, CC e DD, declararam vender a “A..., Lda.” o prédio urbano composto por terreno para construção, com a área de 120,56m2, referido em 6) e 8), conforme documento junto com a contestação da interveniente “A..., Lda.” sob o nº 1, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

11. O prédio referido em 6), 8) e 9) foi registado, pela Ap. ...09 de 22/09/2017, a favor de “A..., Lda.”, por compra a CC e DD, conforme documento junto com a contestação da interveniente “A..., Lda.” sob o nº 2, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

12. CC propôs, em 05/04/2001, acção especial de justificação notarial, que correu termos no 5º Juízo do Tribunal de Matosinhos, sob o nº ...4/2001, pedindo que se reconheça e declare o direito de propriedade do autor para efeitos de registo predial, sobre o prédio urbano de rés-do-chão amplo, destinado a armazém, que confronta a norte com II, a sul, nascente e poente com caminho, sito na Rua ..., freguesia ..., Matosinhos, inscrito na matriz sob o art. ...34, e que não se encontra descrito na Conservatória do Registo Predial local, conforme certidão junta aos autos em 14/05/2019, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

13. No processo referido em 11) foi proferida sentença transitada em julgado em 29/09/2003 que julgou a acção procedente por provada e procedente e justificado o direito do autor, declarando-o proprietário, por via da usucapião, do prédio urbano de rés-do-chão amplo, destinado a armazém, que confronta a norte com II, a sul, nascente e poente com caminho, sito na Rua ..., freguesia ..., Matosinhos, inscrito na matriz sob o artigo ...34.

14. Na sentença referida em 12) foram considerados provados, entre outros, os seguintes factos:

- Na Rua ..., da freguesia ..., Matosinhos, existe um prédio de rés do chão amplo, destinado a armazém, que confronta a norte com II, a sul, nascente e poente com caminho, inscrito na matriz respectiva sob o art. ...34;

- Tal prédio não se encontra descrito na Conservatória do Registo Predial local;

- O sobredito prédio, com a área coberta de 95m2, encontra-se implantado numa parcela de terreno, com a área de pelo menos 95m2, que fez parte de um terreno, com a forma rectangular e as medidas de 29,50m, 32,70m, 22,10m e 22,60m, pertencente a II;

- No início do ano de 1979, a II, abdicou do uso e fruição da parcela de terreno, em forma rectangular, com as dimensões de 14,30m, 11,25m, 5,35m e 15,00m, que cedeu ao autor seu genro;

- Este, imediatamente, entrou em poder de tal parcela de terreno e aí fez construir, sob a sua orientação e a expensas suas, um armazém, em blocos, com reboco a cimento, cobertura em chapas de fibrocimento, passando, também a dispor de logradouro.

15. O armazém referido em 7) e 12) a 14), para além da entrada por um portão em folha, de correr, não tinha qualquer outra entrada ou qualquer abertura, janela ou fresta em qualquer uma das suas paredes delimitativas.

16. Entrava da Rua ... e saía directamente para a Rua sem possibilidade de ir para qualquer outro lado.

17. No dia 5 de Setembro de 2017, o R. começou a demolir o seu armazém, só deixando de pé os muros que deitam directamente para a via pública a Sul da Rua ... e a Poente para a Rua ....

18. Com as máquinas pesadas demoliu o armazém, retirou os materiais e pintou umas marcas a tinta vermelha na guia junto ao solo na Rua ... e no muro de pedra da Rua ..., dizendo que o limite do seu terreno na confrontação com o rústico referido em 1) é a linha recta entre essas duas marcas.

19. O prédio referido em 1) encontra-se fisicamente divido em 8 parcelas que perfazem a área global de 2.162,74 m2.

20. As referidas parcelas são agricultadas por 8 pessoas diferentes, sendo que uma delas é agricultada por terceiro por conta das AA..

21. O prédio referido em 6) tem a área total (coberta e descoberta) de 120,56m2 e confronta a norte com o prédio referido em 1) e 18), a nascente e sul com Rua ... e a poente com a Rua ....

22. Desde 1979, o R. e mulher, a interveniente DD, à vista e com conhecimento de toda a gente, sem oposição de quem quer que fosse, nomeadamente, das AA., de forma continuada e sem interrupção no tempo, e convictos do exercício de um direito próprio e sem lesão de interesses de terceiros, exerceram a posse sobre o prédio referido em 6) até à demolição do armazém ocorrida no dia 05/09/2017 e sobre o solo e o logradouro que fazia parte integrante do armazém até 21/09/2017 que usaram em proveito próprio, na convicção de estar a fruir coisa exclusivamente sua.


*

Não se provaram quaisquer outros factos dos alegados nos articulados, nomeadamente, e com interesse para a decisão da causa, que:

a) As AA. por si e antepossuidores, vêm possuindo, usando e fruindo o imóvel descrito em 1) dos factos provados há mais de 1, 2, 5, 10, 20, 30 e mais anos, à vista e com o conhecimento de toda a gente, de forma ininterrupta, de boa fé e pacificamente, sem oposição de ninguém, na convicção que é um bem próprio delas e não lesar direitos alheios, cuidando do terreno, cultivando-o por si ou por interpostas pessoas com a sua autorização, pagando os inerentes impostos.

b) O R. após a demolição do armazém, com a marcação referida em 18), ocupou/invadiu em várias dezenas de metros o prédio referido em 1) dos factos provados.

c) O prédio referido em 6) e 7) não possuía qualquer área descoberta.

d) Do prédio referido em 1) dos factos provados só uma faixa que representa 10,13% desse prédio, pertence às AA..

e) As pessoas identificadas em 43º e 44º da contestação da interveniente DD, em comum e em partes desiguais, sem determinação de parte ou direito, são exclusivos donos e legítimos possuidores do prédio rústico referido em 1) dos factos provados.

f) A Interveniente DD e seu marido R. exerceram a posse, de boa fé, pública e pacificamente, e com o animus de proprietário desde, pelo menos, há mais de 20, 30, 40, 50, 60 anos ininterruptamente, em relação a 14,212% do prédio referido em 1) dos factos provados.

g) As pessoas que cultivam o prédio e parcelas referidas em 1) e 19) dos factos provados cultivam o terreno por mero favor e gratuitamente, bem sabendo que nada lhes pertence, comparticipam em algumas despesas, por essa mesma razão de não pagarem nada pela ocupação e nunca, em tempo algum, colocaram em causa a propriedade do terreno que sempre souberam e sabem pertencer às AA..

h) O terreno anexo ao armazém era cultivado por um senhor à ordem das AA..


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Passemos à apreciação do mérito dos recursos.

I. A nulidade da sentença ao abrigo do art. 615º, nº 1, al. e) do Cód. Proc. Civil

1. O réu e a interveniente no seu recurso vieram invocar que na sentença recorrida ocorreu uma situação de condenação “extra vel ultra petitum”, uma vez que o prédio cuja propriedade é reconhecida às autoras com a procedência do pedido a) por elas formulado na petição inicial abrange também o prédio que em sede reconvencional foi reconhecido ser dos ora recorrentes.

Ora, para que as autoras, face ao resultado da reconvenção, pudessem lograr a procedência de um qualquer pedido, tornava-se necessário que tivessem formulado um pedido subsidiário que teria consistido em requerer que fosse declarado que era sua a propriedade de um prédio com diferentes confrontações, o que, porém, não fizeram.

Não existindo esse pedido subsidiário, a 1ª Instância ao julgar procedente, sem mais, o pedido formulado na petição inicial sob a alínea a) cometeu a nulidade prevista no art. 615º, nº 1, al. e) do Cód. Proc. Civil.

Diz-se neste preceito que a sentença é nula quando «o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido», o qual se articula com o art. 609º, nº 1 do mesmo diploma onde, sob a epígrafe «limites da condenação», se estatui, em igual sentido, o seguinte:

«A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.»

Tal significa que estando o juiz, limitado pelos pedidos das partes, não pode, na sentença, deles extravasar: a decisão, seja condenatória, ou absolutória, não pode pronunciar-se sobre mais do que o que foi pedido ou sobre coisa diversa daquela que foi pedida.

O objeto da sentença coincide com o objeto do processo, não podendo o juiz ficar aquém nem ir além do que foi pedido – cfr. LEBRE DE FREITAS e ISABEL ALEXANDRE, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2º, 4ª ed., págs. 714/715.

2. No caso “sub judice” o pedido formulado pelos autores como remate da sua petição inicial, sob a alínea a), foi no sentido da condenação do réu “a reconhecer que as AA. são donas e legítimas proprietárias do prédio rústico melhor identificado no art. 1º desta PI e declarar-se que o são.”

Por seu turno, na sentença recorrida, depois de se julgar a ação parcialmente procedente, declarou-se “que as AA. são donas e legítimas proprietárias do prédio identificado em 1) dos factos provados”, absolvendo-se o réu e a interveniente dos restantes pedidos formulados nos autos.

O prédio identificado em 1) corresponde ao prédio identificado no art. 1º da petição inicial.

Assim, confrontando o pedido formulado em a) pelas autoras com a condenação proferida pela 1ª Instância teremos naturalmente que concluir que esta não extravasou aquele pedido, nele se tendo contido.

Aliás, condenou precisamente no que fora peticionado em a), o que não implica que essa condenação não seja isenta de censura no confronto com a procedência do pedido reconvencional deduzido pelo réu, conforme adiante melhor se analisará.

Por conseguinte, sem necessidade de outras considerações, improcede a nulidade invocada, no seu recurso, por réu e interveniente.


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II. A impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto

1. As autoras, no recurso que interpuseram, insurgiram-se contra a decisão factual da 1ª Instância, pretendendo, em primeiro lugar, que os factos não provados constantes das alíneas a) e g) [a) As AA. por si e antepossuidores, vêm possuindo, usando e fruindo o imóvel descrito em 1) dos factos provados há mais de 1, 2, 5, 10, 20, 30 e mais anos, à vista e com o conhecimento de toda a gente, de forma ininterrupta, de boa fé e pacificamente, sem oposição de ninguém, na convicção que é um bem próprio delas e não lesar direitos alheios, cuidando do terreno, cultivando-o por si ou por interpostas pessoas com a sua autorização, pagando os inerentes impostos; g) As pessoas que cultivam o prédio e parcelas referidas em 1) e 19) dos factos provados cultivam o terreno por mero favor e gratuitamente, bem sabendo que nada lhes pertence, comparticipam em algumas despesas, por essa mesma razão de não pagarem nada pela ocupação e nunca, em tempo algum, colocaram em causa a propriedade do terreno que sempre souberam e sabem pertencer às AA.] transitem para o elenco dos factos provados.

Pretendem, em segundo lugar, que os factos provados com os nºs 7, 8, 10, 21 e 22 [7. Em 03/03/2017, o prédio referido em 6) encontrava-se descrito com a menção de que é composto por um armazém, que se encontra inscrito na matriz sob o art. ...12, que confronta a norte com II e a nascente, sul e poente com caminho público e que tem a área total de 120,56m2, sendo 95m2 de área coberta e 25,56m2 de área descoberta; 8. Em 18/09/2017, o prédio referido em 6) encontrava-se descrito com a menção de que é composto por um terreno para construção, que se encontra inscrito na matriz sob o nº ...53..., que confronta a norte com II, a sul e nascente com Rua ... e a Poente com a Rua ..., e que tem a área de 120,56m2; 10. Por escritura pública outorgada em 21/09/2017, CC e DD, declararam vender a “A..., Lda.” o prédio urbano composto por terreno para construção, com a área de 120,56m2, referido em 6) e 8), conforme documento junto com a contestação da interveniente “A..., Lda.” sob o nº 1, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 21. O prédio referido em 6) tem a área total (coberta e descoberta) de 120,56m2 e confronta a norte com o prédio referido em 1) e 18), a nascente e sul com Rua ... e a poente com a Rua .... 22. Desde 1979, o R. e mulher, a interveniente DD, à vista e com conhecimento de toda a gente, sem oposição de quem quer que fosse, nomeadamente, das AA., de forma continuada e sem interrupção no tempo, e convictos do exercício de um direito próprio e sem lesão de interesses de terceiros, exerceram a posse sobre o prédio referido em 6) até à demolição do armazém ocorrida no dia 05/09/2017 e sobre o solo e o logradouro que fazia parte integrante do armazém até 21/09/2017 que usaram em proveito próprio, na convicção de estar a fruir coisa exclusivamente sua] sejam havidos como não provados.

No sentido destas alterações indicam excertos dos depoimentos de parte do réu CC, das declarações da interveniente DD e dos depoimentos das testemunhas KKK, NNN, LLL e KK, bem como o relatório pericial, a caderneta predial e a documentação registal.

2. O réu CC e a interveniente DD, no seu recurso, insurgem-se também contra a decisão proferida sobre a matéria de facto pretendendo que as alíneas d), e) e f) da factualidade não assente [d) Do prédio referido em 1) dos factos provados só uma faixa que representa 10,13% desse prédio, pertence às AA.; e) As pessoas identificadas em 43º e 44º da contestação da interveniente DD, em comum e em partes desiguais, sem determinação de parte ou direito, são exclusivos donos e legítimos possuidores do prédio rústico referido em 1) dos factos provados; f) A Interveniente DD e seu marido R. exerceram a posse, de boa fé, pública e pacificamente, e com o animus de proprietário desde, pelo menos, há mais de 20, 30, 40, 50, 60 anos ininterruptamente, em relação a 14,212% do prédio referido em 1) dos factos provados] sejam havidas como provadas.

Entendem que também devem ser aditados os seguintes factos:

A - Do prédio referido em 1) dos factos provados só uma faixa que representa 10,13% desse prédio, pertence às AA.;

B - As pessoas identificadas em 43º e 44º da contestação da interveniente DD, em comum e em partes desiguais, sem determinação de parte ou direito, são exclusivos donos e legítimos possuidores do prédio rústico referido em 1) dos factos provados;

C - O R., a Interveniente e as pessoas identificadas em 43º e 44º, por si e antepossuidores, vêm possuindo, usando e fruindo o imóvel descrito em 1) dos factos provados há mais de 1, 2, 5, 10, 20, 30 e mais anos, à vista e com o conhecimento de toda a gente, de forma ininterrupta, de boa fé e pacificamente, sem oposição de ninguém, na convicção que é um bem próprio delas e não lesar direitos alheios, cuidando do terreno, cultivando-o por si ou por interpostas pessoas com a sua autorização, pagando os inerentes impostos;

D - A Interveniente DD e seu marido R. exerceram a posse, de boa fé, pública e pacificamente, e com o animus de proprietário desde, pelo menos, há mais de 20, 30, 40, 50, 60 anos ininterruptamente, em relação a 14,212% do prédio referido em 1) dos factos provados;

E - O registo de propriedade promovido pelas AA. foi feito à revelia dos legítimos possuidores e proprietários e com intenção de apropriação ilícita de bem que não é seu e com a consciência de que a totalidade de prédio não pertence às AA.;

F - O prédio identificado em 1º da P.I., na al. a) do pedido das AA. e em 1) dos factos provados nunca foi propriedade do marido e pai das AA., que dele apenas herdou a parcela identificada com a letra E) na Planta 2 do Anexo 2 do relatório Pericial;

G - As pessoas identificadas em 43º e 44º sempre pagaram a respectiva parte da contribuição autárquica ou IMI devidos pelas parcelas de que são proprietários.

Na sua impugnação fáctica aludem também, na conclusão 22ª, ao aditamento aos provados dos factos descritos nos arts. 12º da contestação do réu e 8º, 37º, 38º, 86º, 87º, 88º a 99º, 101º, 102º, 109º, 110º, 112º a 114º da contestação da interveniente.

Sucede, porém, que todos estes pontos factuais já se acham, de algum modo, abrangidos pela demais impugnação factual efetuada pelo réu e pela interveniente, com ela se sobrepondo, no sentido do aditamento dos factos atrás discriminados de A a G e da passagem das alíneas d), e) e f) para o elenco dos factos provados.

Nesse sentido indicam excertos dos depoimentos de parte do réu CC, das declarações da interveniente DD e dos depoimentos das testemunhas WW, JJ, OOO, KK, PPP, KKK, NNN e LLL.

3. Considerando-se cumpridos os ónus previstos no art. 640º do Cód. Proc. Civil procedeu-se à audição de todos os depoimentos referidos.

O réu CC, em sede de depoimento de parte, disse que a sua sogra (II), que era a dona, lhe deu um bocado de terreno – 120m2 –, onde construiu um armazém, que ocupou 95m2. As autoras também lá têm um talhão, acrescentando até que “todos têm lá um terreno”. Nega que alguma vez tenha ocupado terreno que pertença às autoras. Mais referiu que quando fez a garagem (armazém), passado algum tempo, chamou um topógrafo e este mediu os talhões todos, pois está tudo dividido, sendo oito pessoas que lá cultivam. Os 25m2 que tem, para além dos 95m2, são pegados ao armazém para norte.

A interveniente DD, ouvida em declarações de parte, disse que a sua mãe, depois de terem vindo de Moçambique em 1976, lhes deu um terreno para construírem uma garagem/armazém. A mãe disse que lhes dava 150m2, mas não gastaram essa área. O armazém tinha 95m2 e foi construído em 1978/79. Como havia mais terreno (25m2), que cultivavam, vieram a vender 120m2. Referiu ainda que pagava o IMI – 5 euros e tal – ao Sr. HH, que era marido da autora, mais esclarecendo que são oito pessoas naqueles terrenos e que todas pagavam IMI àquele Sr. HH. Cada um pensava que o respetivo bocado de terreno era seu. “Ninguém quer nada de ninguém, só esse senhor é que quer tudo.”

A testemunha KKK é vizinha. Disse que o terreno estava nas mãos do marido da D.ª AA (autora) – HH -, tendo assistido a pessoas irem lá pagar-lhe a contribuição. Sabe disto porque ajudava na papelaria que pertencia ao Sr. HH e viu pessoas irem lá fazer esse pagamento. No entanto, não conseguiu dar pormenores concretos quanto a tais pagamentos. No que toca à garagem que lá existia disse que era do Sr. CC (réu), referindo depois que esta não tinha nenhum terreno a rodeá-la que fosse cultivado.

A testemunha NNN vive nas proximidades. Disse que “fez” o terreno que fica pegado à garagem que era do Sr. BB (réu) durante quatro ou cinco anos com autorização da D.ª AA (autora). Deixou de o “fazer” há dez anos, porque a D.ª AA lhe pediu para deixar o terreno para o Sr. QQQ, o que aceitou porque não precisava, tinha muitos terrenos. O Sr. BB nunca ocupou qualquer área de terreno fora do armazém. O terreno, que se divide em outros oito terrenos, é da D.ª AA e da filha, o que afirma por serem eles que pagam IMI, conforme lhe foi dito.

A testemunha LLL é irmão do réu, mas está de relações cortadas com ele desde 2017. Disse que o seu irmão tinha lá uma garagem e que depois fez um “aumentozito” para meter uma carrinha de 9 lugares. Sobre os terrenos não sabe definir nada, mas salienta que ele além da garagem não ocupava mais nada.

A testemunha KK viveu nas proximidades. Disse que a sua mãe, já falecida, tinha um talhão naquele terreno, que agora está a ser feito pelos filhos (são nove irmãos). Há lá oito talhões e a D.ª AA também lá tem um. Mais adiante disse que a sua mãe pagava por ano seis contos ao Sr. HH, porque ele tinha tratado dos papéis para pôr os terrenos legais, mas não sabe como é que isso foi feito. Também referiu que, pelo que diziam, aquilo eram “terrenos baldios”.

A testemunha WW é primo da interveniente DD e a autora AA, por seu lado, foi casada com o seu primo HH. Disse que são oito ou nove talhões que ali estão seguidos. Tem lá um talhão, tal como sucede com a D.ª AA e com a D.ª DD. Quando vieram de África, como precisavam de comer, agarraram-se àquele terreno e dividiram-no entre os familiares. O terreno estava todo dividido em parcelas, mas a determinada altura para se poder legalizar teve que se pôr aquilo num só. Combinou-se então em pôr tudo no nome do Sr. HH e, quando chegasse a altura da venda, o valor seria distribuído de acordo com aquilo a que cada um teria direito. Quanto a encargos disse que pagava parte do IMI ao Sr. HH, tal como os outros também pagavam. Embora constasse o registo em nome do Sr. HH o terreno era de quem lá estava a trabalhar.

A testemunha JJ é irmã da interveniente DD. Disse que o prédio em causa nos autos está a ser agricultado por oito ou nove pessoas, tendo sido dividido sem oposição de ninguém. Referiu que foi ao escritório do Sr. HH e que este lhe disse que o terreno tinha que ficar no nome de uma só pessoa, porque se não fosse assim a Junta ou a Câmara podia tomar conta dele, isto porque não tinha dono. Como confiavam no Sr. HH acha que este legalizou o prédio no seu nome. Disse também que pagavam a respetiva contribuição às Finanças, entregando o dinheiro correspondente ao Sr. HH. Mais referiu que o Sr. CC, seu cunhado, pediu à sua mãe que lhe dispensasse um bocado de terreno para fazer uma garagem, tendo-se efetuado uma reunião familiar, de irmãos, na qual lhe foi dado esse terreno, que concretizou em 120m2.

A testemunha OOO é irmão da interveniente DD. Disse que aquilo é um terreno que pertence a oito famílias e cada uma tem a sua parte nesse terreno. Está dividido em talhões. O seu primo HH fez uma reunião com as pessoas a quem aquele terreno pertencia e disse que a Câmara iria tomar conta dele, acrescentando que era preciso registar. Propôs-se assim registar em nome dele, com o consentimento de todos, mas esclarecendo que todos eram proprietários do terreno. Pensa que ele o fez, uma vez que se pagava IMI anualmente, tocando um tanto a cada família. Mais referiu que por volta de 1979 o seu cunhado construiu a garagem, na altura em que a sua mãe lhe cedeu para esse efeito cerca de 120m2, tendo feito uma marca com uma sachola, um “carreirozito”, a marcar a separação do terreno.

A testemunha PPP vive nas proximidades. Disse que o terreno aqui em causa tem muitos “lotinhos” que as pessoas cultivam. A D.ª II (mãe da interveniente DD) cedeu um bocado do seu terreno à filha e ao genro para fazerem uma garagem. Depois desta ter sido feita sobrou ainda um “biquinho” de terreno, que era cultivado.

Considerou-se igualmente toda a prova documental constante dos autos, com relevo para a documentação matricial e registal, bem como para as fotografias juntas ao processo, a escritura de compra e venda celebrada em 21.9.2017, as peças processuais extraídas do processo com o nº ...4/2001 do antigo 5º Juízo Cível de Matosinhos (onde se inclui a sentença aí proferida) e o relatório pericial efetuado, donde constam em anexo fotografias e plantas topográficas.

4. O art. 662º, nº 1 do Cód. Proc. Civil diz-nos que «a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos por assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa

Vejamos então se há fundamento para alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, principiando pela impugnação efetuada pelas autoras/reconvindas, as quais pretendem se dê como assente, em primeiro lugar, que, por si e antepossuidores, vêm possuindo, usando e fruindo o imóvel descrito em 1) dos factos provados há mais de 1, 2, 5, 10, 20, 30 e mais anos, à vista e com o conhecimento de toda a gente, de forma ininterrupta, de boa fé e pacificamente, sem oposição de ninguém, na convicção que é um bem próprio delas e não lesar direitos alheios, cultivando-o por si ou por interpostas pessoas com a sua autorização, pagando os inerentes impostos.

Já, em segundo lugar, pretendem que se dê como assente que as pessoas que cultivam as parcelas referidas no nº 19 dos factos provados o cultivam por mero favor e gratuitamente, bem sabendo que nada lhes pertence, comparticipando nalgumas despesas, sempre tendo sabido que o mesmo pertence às autoras.

Por outro lado, pretendem que a matéria fáctica assente relativamente ao prédio referido no nº 6, registado em nome do réu CC e da interveniente, sua mulher, DD, e que estes depois venderam à sociedade “A..., Lda.”, seja havida como não provada no que toca à sua área total de 120,56m2 e também quanto aos atos de posse nele praticados pelo réu e pela interveniente.

Ora, face à prova testemunhal produzida em julgamento, que acima se deixou sintetizada, e também ao que resulta da prova pericial realizada, entendemos não se ter provado que as autoras, e antepossuidores, estejam a usar e fruir da totalidade do imóvel referido nº 1 de forma pública e pacífica, sem que exista qualquer dúvida quanto à sua propriedade sobre o prédio.

Da avaliação que fazemos da prova produzida nos autos concluímos que esse prédio está há muito dividido em parcelas (“talhões”), sendo oito o número de pessoas que o agricultam. Por razões que se prenderam com a sua legalização, viria a ser registado em nome de apenas uma dessas pessoas – HH, já falecido e que foi casado com a autora -, com o consentimento dos demais, até porque de modo algum se pode considerar provado que todos os outros “ocupantes” do prédio trabalhavam aqueles “talhões” por mera condescendência ou favor daquele HH.

O que, a nosso ver, emerge dos meios probatórios reunidos nos autos é que todas aquelas pessoas que agricultavam as parcelas o faziam numa posição de paridade com o referido HH e depois com as autoras, assumindo-se todas como donos.

Da mesma forma, relativamente ao prédio referido em 6, registado em nome do réu e da interveniente, o que se provou, em consonância com os elementos documentais, testemunhais e periciais disponíveis, é que a sua área total é efetivamente de 120,56m2, abrangendo 95m2 de área coberta (armazém/garagem) e 25,56m2 de área descoberta, respeitando esta a uma zona de logradouro que também era fruído pelo réu e pela interveniente.

Fruição esta que abrangendo a garagem e o logradouro adjacente se iniciou por volta de 1979, mantendo-se ininterruptamente desde então e sem oposição de quem quer que seja, designadamente das autoras.

Neste contexto, não se vislumbrando razão para divergir da convicção probatória formada pela 1ª Instância, que se considera devidamente alicerçada nos meios de prova produzidos nos autos, entendemos ser de improceder a impugnação fáctica efetuada pelas autoras.

5. Passemos agora à impugnação factual do réu/reconvinte e da interveniente, no que teremos em atenção o que já atrás se escreveu no ponto 2.

Quanto às percentagens do prédio referido em 1) que pertencem, por um lado, às autoras (10,13%) e, por outro, ao réu e à interveniente (14,212%) – als. d) e f) não provadas -, o que, desde logo, há a salientar é que não dispomos de elementos probatórios que nos permitam avaliar da correção destes valores percentuais, sendo certo que os dois pontos em causa também revestem manifesto cariz conclusivo, donde não poderão ser dados como assentes.

No que concerne à identificação das diversas pessoas que ocupam tal prédio, a que a interveniente DD procedeu nos arts. 43º e 44º da sua contestação – al. e) não provada -, também aqui a prova produzida não é de molde a confirmar que são estas, sempre havendo a sublinhar que tais pessoas aí mencionadas não são partes nos presentes autos, sendo que o litígio a decidir, nesta sede, envolve apenas, de um lado, as autoras AA e BB e, do outro, o réu CC e a interveniente DD.

Quanto ao registo da propriedade do prédio referido em 1) ter sido feito à revelia das pessoas que lá tinham parcelas e com intenção da sua apropriação ilícita por parte das autoras, ou melhor pelo seu antepossuidor HH, também aqui não temos elementos probatórios que o confirmem. Com efeito, a prova testemunhal produzida (WW; JJ; OOO) aponta no sentido deste ter efetuado o registo do prédio em seu nome, tendo em vista a sua legalização, com a concordância de todos os outros e, na perspetiva de em caso de venda, o valor obtido ser distribuído de acordo com aquilo a que cada um teria direito.

No que respeita ao eventual pagamento de verbas referentes a IMI por parte das pessoas identificadas nos arts. 43º e 44º da contestação da interveniente referir-se-á não ser absolutamente seguro que os valores que se menciona terem sido entregues a HH se destinassem a este pagamento, destacando-se aqui a ausência de suportes documentais que o confirmem.

Deste modo, também a impugnação fáctica efetuada pelo réu e pela interveniente improcederá na totalidade.


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III. O âmbito da presunção decorrente do registo prevista no art. 7º do Cód. Registo Predial existente a favor das autoras e a sua consequência na procedência ou improcedência da ação e da reconvenção

1. As autoras intentaram a presente ação pedindo que se reconheça o seu direito de propriedade sobre o prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº ...97/20020403 e que nenhum ato seja praticado que possa perturbar tal direito, o que consideram ter ocorrido quando foi demolido o armazém implantado no prédio do réu descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº ....80/20080730. Sustentam as autoras que com essa demolição o réu ocupou terreno rústico do seu prédio, uma vez que adjacente ao armazém do réu não existia qualquer área descoberta.

Por seu lado, em sede de contestação, o réu CC veio também deduzir reconvenção na qual peticionou ser declarado proprietário, por via da usucapião, do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº. ...80, com a área global coberta e descoberta de 120,56m2, até à data da sua venda ocorrida em 21.9.2017.

Em suma, discute-se nos presentes autos se o espaço adjacente ao armazém que foi objeto de demolição se integra, ou não, no prédio rústico de que as autoras, com base no registo, alegam ser proprietárias.

2. É sabido que no nosso ordenamento jurídico o registo predial tem natureza declarativa e não constitutiva, uma vez que do art. 1º do Cód. Registo Predial decorre que este apenas se destina a dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário.

Ou seja, o registo não dá nem tira direitos.[2]

Contudo, no art. 7º, nº 1 do Cód. Registo Predial estatui-se que «o registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define.»

Consagra-se aqui uma presunção no sentido de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, presunção que, sendo “juris tantum”, poderá ser elidida por prova em contrário nos termos do art. 350º, nº 2 do Cód. Civil.

Assim, provando-se factualidade integrativa da usucapião, esta como é uma forma de aquisição originária, não pode ser prejudicada pelas eventuais inscrições registais existentes.[3]

Por conseguinte, a circunstância de um imóvel se encontrar registado em nome de alguém não impede que o reconhecimento do direito de propriedade sobre esse imóvel se efetive em nome de outra pessoa, com fundamento na usucapião.

Prosseguindo, há também a salientar que a presunção do art. 7º do Cód. Registo Predial não se estende aos limites ou confrontações dos prédios ou à sua área, em suma à sua identificação física, uma vez que estes elementos são suscetíveis de assentar em meras declarações dos interessados, escapando ao controlo do Conservador do Registo Predial.[4]

É que nenhum destes elementos é atestado pela autoridade ou funcionários competentes com base nas suas perceções.

Todavia, a descrição terá de conter um conjunto de elementos identificativos, que constituirão um âmbito mínimo ou núcleo essencial indispensável à definição ou identificação da coisa sobre a qual incide a inscrição do direito, sob pena de não se saber sobre que coisa incide o facto inscrito.[5]

Neste contexto, não se mostra questionável que a presunção do art. 7.º do Cód. Registo Predial abranja apenas os factos jurídicos inscritos de onde se deduzem as situações jurídicas publicitadas pelo registo e não também a totalidade dos elementos de identificação física, económica e fiscal dos prédios, objeto da descrição predial e a sua única finalidade.

Deste modo, tal como se afirma na sentença recorrida, uma coisa são as confrontações, a área, as estremas ou o valor dos prédios, outra aquilo que os define ou identifica na sua essencialidade.

Por isso, da descrição fazem parte não só os elementos materiais essenciais à identificação dos prédios como também os elementos meramente complementares ou acessórios.

Os primeiros, como que são inerentes à própria inscrição, pelo que só os segundos devem estar fora do alcance da presunção do art. 7.º do Cód. Registo Predial, sob pena de esta não ter qualquer relevância prática.

Portanto, das inscrições constam os factos jurídicos sujeitos a registo, conforme o elencado no art. 2.º do Cód. Registo Predial, ou sejam, constam deles os factos da vida real, que, por força da lei, produzem determinados efeitos jurídicos, no caso, constitutivos, aquisitivos, modificativos ou extintivos do direito de propriedade.

Ora, como tal direito incide sobre coisas a inscrição tem de as identificar, o que faz por referência à descrição, sendo certo que alguns desses elementos identificativos são essenciais, no sentido de que, sem eles, não se sabe sobre que coisa incide a inscrição (ou melhor, o facto inscrito).

Esse núcleo essencial da descrição não pode deixar de estar protegido pela presunção do art. 7.º sob pena de se presumir a propriedade de coisa nenhuma.

Daí que, conforme se escreve no Ac. STJ de 12.2.2008 (p. 08A055, relator SEBASTIÃO PÓVOAS, disponível in www.dgsi.pt.), “se no registo um prédio vem descrito como tendo uma área descoberta, ou logradouro, ou como tendo, apenas, um terraço descoberto, tais elementos, – que não limites, áreas precisas, valores, identificação fiscal, confrontações e âmbito – fazem parte do referido núcleo essencial descritivo, que, no fundo são marcas diferenciadoras, ou de identificação, do prédio, que estão a coberto da presunção do artigo 7.º do Código do Registo Predial.”

3. Regressando ao caso dos autos verifica-se que as autoras, relativamente ao prédio identificado no nº 1 da factualidade assente, invocaram como título de aquisição do direito, tanto o registo como a usucapião.

Porém, o sucesso da pretensão das autoras quanto à parcela de terreno que, ao cabo e ao resto, está aqui em discussão, sempre dependeria da prova de que essa parcela estava integrada no prédio registado a seu favor na Conservatória do Registo Predial, sendo que essa prova não foi feita por elas.

E se é certo que o réu CC e a interveniente DD não lograram ilidir a presunção decorrente do registo no que se refere à propriedade das autoras no tocante ao prédio mencionado em 1) dos factos provados, já quanto ao prédio identificado no ponto 6) da mesma factualidade conseguiram demonstrar tê-lo adquirido por usucapião, tal como decorre do nº 22 dessa factualidade cuja redação é a seguinte:

- Desde 1979, o R. e mulher, a interveniente DD, à vista e com conhecimento de toda a gente, sem oposição de quem quer que fosse, nomeadamente, das AA., de forma continuada e sem interrupção no tempo, e convictos do exercício de um direito próprio e sem lesão de interesses de terceiros, exerceram a posse sobre o prédio referido em 6) até à demolição do armazém ocorrida no dia 05/09/2017 e sobre o solo e o logradouro que fazia parte integrante do armazém até 21/09/2017 que usaram em proveito próprio, na convicção de estar a fruir coisa exclusivamente sua.

O prédio referido no nº 6, descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº ....80/20080730, em 3.3.2017, era composto por um armazém e tinha a área total de 120,56m2, sendo 95m2 de área coberta e 25,56m2 de área descoberta – cfr. nº 7.

4. Pretendem as autoras, com o seu recurso, com fundamento na não elisão da presunção decorrente do art. 7º do Cód. Registo Predial, que os pedidos que formularam na petição inicial deveriam ter sido julgados todos procedentes e simultaneamente a reconvenção totalmente improcedente.

Ora, se se entende que a dita presunção registal de que as autoras beneficiavam em relação ao prédio identificado em 1) não foi ilidida, o que se verifica, tal como já foi exposto, é que não abrangendo essa presunção nem a área total do prédio, nem as suas estremas ou confrontações, o réu e a interveniente conseguiram provar quanto à parcela aqui em litígio que a mesma não se integrava no prédio das autoras, mas sim no seu prédio referido em 6) que adquiriram por usucapião.

Desta forma, o seu recurso está votado à improcedência.

5. Por seu turno, o réu e a interveniente, ambos reconvintes, sustentam no seu recurso que o pedido formulado em a) pelas autoras deveria ter sido julgado improcedente e que, por outro lado, os pedidos reconvencionais deduzidos pela interveniente deveriam proceder.

Importa destacar mais uma vez que a presunção derivada do registo que favorecia as autoras relativamente à propriedade do prédio identificado em 1) não foi ilidida, desde logo porque embora se tenha provado nos nºs 19 e 20 que este prédio se encontrava fisicamente dividido em oito parcelas agricultadas por oito pessoas diferentes, sendo uma delas agricultada por um terceiro por conta das autoras, não se provou factualidade da qual resultasse a aquisição por usucapião de tais parcelas.

Aliás, relativamente a essas parcelas nunca a presunção registal podia ser tida como ilidida, isto porque as diversas pessoas que as agricultam não são partes nos autos e, por isso, não se mostram alegados factos que permitam concluir no sentido da sua aquisição por usucapião.

E não sendo partes, face à delimitação subjetiva da instância [arts. 260º a 263º do Cód. Proc. Civil], naturalmente que não poderiam nestes autos, tendo-se a presunção registal por afastada, serem declarados proprietários e legítimos possuidores de tais parcelas.

Neste ponto, convém referir que a interveniente DD ao apresentar a sua contestação veio requerer a intervenção principal provocada de todas as pessoas que ocupam tais parcelas, ao abrigo do art. 316º do Cód. Proc. Civil, pretensão que foi indeferida pela Mmª Juíza “a quo”.[6]

De qualquer modo estas pessoas, a quem não é oponível o decidido nos presentes autos, não estão impossibilitadas de demandar as autoras, com vista à ilisão da presunção registal e ao eventual reconhecimento do seu direito de propriedade, com fundamento na usucapião, sobre as parcelas respetivas.

Todavia, antes de finalizar, não poderá deixar de se considerar que a procedência simultânea do pedido reconvencional e do pedido formulado sob a alínea a) pelas autoras, tal como sustentam o réu e a interveniente no seu recurso, introduz elementos de conflitualidade entre as duas decisões de procedência, uma vez que da sua leitura poderá resultar, numa primeira abordagem, que o prédio cuja propriedade é reconhecida, em sede reconvencional, ao réu e à interveniente estaria também integrado no prédio das autoras, identificado no ponto 1) da factualidade assente.

Por isso, entendemos que, para melhor clarificação, a parte dispositiva da sentença, no seu primeiro segmento, deverá ser alterada, de modo a não se considerar abrangido no prédio das autoras o prédio que agora se reconhece, em reconvenção, pertencer ao réu e à interveniente.

No demais, o recurso interposto por réu e interveniente improcede.


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Sumário (da responsabilidade do relator – art. 663º, nº 7 do Cód. Proc. Civil):

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DECISÃO

Nos termos expostos, acordam os juízes que constituem este Tribunal em julgar improcedente o recurso interposto pelas autoras AA e BB e parcialmente procedente o recurso interposto pelo réu CC e pela interveniente DD e, em consequência, altera-se o decidido pela seguinte forma:

- Declara-se que as autoras são donas e legítimas proprietárias do prédio identificado em 1) dos factos provados, no qual não se integra o prédio urbano de rés-do-chão amplo destinado a armazém, com uma área global coberta e descoberta de 120,56 m2, inscrito na matriz sob o artigo ...34º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o nº. ...80.

No mais mantém-se o decidido.

As custas relativas ao recurso interposto pelas autoras serão por elas suportadas, face ao seu decaimento.

As custas relativas ao recurso interposto por réu e intervenientes serão suportadas na proporção do decaimento que se fixa em 1/5 para as autoras e 4/5 para réu e interveniente.

Porto, 11.3.2025

Eduardo Rodrigues Pires

Anabela Andrade Miranda

Alexandra Pelayo



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[1] Seguiu-se o relatório constante da sentença recorrida.
[2] Cfr., por ex., Ac. STJ de 3.3.2016, p. 373/11.0 TBLLE.E1.S1, relator ORLANDO AFONSO, disponível in www.dgsi.pt.
[3] Cfr., por ex., Acs. STJ de 3.3.2016, p. 373/11.0 TBLLE.E1.S1, relator ORLANDO AFONSO e da Rel. Lisboa de 10.10.2019, p. 299/14.5 T8CSC.L1-2, relator TIBÉRIO SILVA, disponíveis in www.dgsi.pt.
[4] Cfr., por ex., Ac. STJ de 18.1.2018, p. 668/15.3 T8FAR.P1 (JOSÉ RAINHO), Ac. Rel. Porto de 18.6.2024, p. 1176/21.9 T8LOU.P1 (ALEXANDRA PELAYO), Ac. Rel. Coimbra de 3.12.2013, p. 149/09.0 TBPBL.C1 (JOSÉ AVELINO GONÇALVES), Ac. Rel. Lisboa de 2.2.2020, p. 602/17.6 T8MFR.L1-7 (PIRES DE SOUSA), todos disponíveis in www.dgsi.pt. 
[5] Cfr. Ac. STJ de 22.2.2005 (ALVES VELHO) citado no Ac. STJ de 12.2.2008.
[6]  Despacho que se considera transitado em julgado, porquanto o recurso então interposto não foi admitido, por se entender não estar preenchida a situação da al. h) do nº 2 do art. 644º do Cód. Proc. Civil e no recurso interposto a final pela interveniente esta não impugnou aquele despacho nos termos do nº 3 do dito art. 644º.